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Para compor, Adélia Prado lança mão, impreterivelmente, de dois materiais, “memória
e sentimento” (Prado, 1976, p. 55), comumente encontrados na poesia lírica. Desde Platão e
Aristóteles até o século XVIII, a criação poética foi entendida como imitação da realidade.
Apesar de suas divergências, ambos afirmaram que a obra de arte mantém uma relação de
semelhança e de adequação com o real (assim lemos em Arte poética, de Aristóteles). A
doutrina da imitação sofreu declínio quando se começaram a valorizar os sentimentos e as
aspirações do artista: “os poetas românticos mais confessionais estavam interessados
principalmente em sua própria individualidade e nas coisas que faziam deles pessoas
diferentes das outras” (Hamburger, 2007, p. 58-59). O Romantismo almejou, em geral,
coincidir arte e vida e empenhou-se em fazer com que a voz lírica fosse sincera e apaixonada;
o poema deveria considerar a emoção real sentida como a geratriz da expressão poética.
Alguns poetas chegaram ao extremo dessa convicção e consideraram, como Novalis, a poesia
o “real absoluto[:] quanto mais poético, mais verdadeiro” (1992, p. 69). O objetivo desse
grupo de artistas era viver uma espécie de simbiose com o universo:
Outros escritores não acreditavam que pudessem alcançar tal amplitude, tampouco que
ela pudesse ser expressa pela linguagem – e concordavam com Schiller que “se a alma fala,
ah! então, já não é a alma que fala” (apud Staiger, 1975, p. 71). Encaminhavam-se, assim, às
proposições de Charles Baudelaire, que apostava na flexibilidade identitária do eu lírico: “o
poeta goza do incomparável privilégio de ser, à sua vontade, ele mesmo e outrem” (apud
Hamburger, 2007, p. 74). Poe, Rimbaud, Corbière, Laforgue, Valéry e Mallarmé, para citar
alguns escritores modernos, afirmavam que a arte, movida pela imaginação absoluta,
transformaria e desrealizaria o real. Para tanto, dois elementos da capacidade criativa superior,
o sonho e a fantasia, seriam essenciais na elaboração artística: ambos acumulariam imagens
apresentadas aos sentidos, de maneira a construir uma nova totalidade. Como Shelley,
acreditavam que a poesia era expressão da imaginação e da força que leva o homem a
participar “do eterno, do infinito, do uno: relativamente às suas concepções, não existe tempo,
nem espaço, nem medida” (Shelley, apud Silva, 1973, p. 170). Coleridge, outro grande
escritor que se debruçou sobre a significação da criação poética, também defendia a
imaginação como “o dom mais alto do homem (...) [uma vez que] desdobra ou projeta os
objetos e sem ela não [há] nem percepção nem juízo” (apud Paz, 1996, p. 77), e afirmava que
ela “não é apenas a condição do conhecer, [mas] é a faculdade que transforma as ideias em
símbolos e os símbolos em presenças” (Paz, 1984, p. 76).
Essas concepções românticas e modernas sobre a criação poética subjazem à
concepção adeliana: constatamos a discussão sobre eu lírico e eu empírico nos versos da
poetisa, como também a imaginação e o sonho como estruturadores dos poemas. Os traços
formais de modernidade podem ser aferidos no verso e ritmo livres, empregados na tentativa
de abarcar as flutuações existenciais e paradoxais do ser. Além disso, a autocrítica inserida
nos livros revela uma visão aguda e um julgamento ostensivo de si mesma – estratégia
moderna assumida pela maioria dos escritores do século XX, quando o artista era impelido a
posicionar-se em relação aos problemas sociais, políticos e artísticos.
A metalinguagem, fartamente encontrada na chamada Geração 60 (nome fixado por
Pedro Lyra), é vista, na literatura brasileira,
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Além da antologia de Pedro Lyra (1995, p. 40-41), outras elencam os principais poetas brasileiros da época e
incluem Adélia: a de Henrique L. Alves (1985), a de Carlos Nejar (1986), a de Denira Rozário (1989), a de
Augusto Massi (1991).
tendências pós-vanguardistas dominantes (o concretismo engajado na abolição do verso e a
poesia marginal disposta a intervir na realidade). Adélia surge em meio a um movimento
literário mineiro, em especial, de contistas, lançando-se à contemplação pungente e atenta das
raízes terrestres da vida, das experiências de felicidade e de dor. Como uma espécie de
palimpsesto, sua poesia rasura a historicidade com a imaginação lírica e o visionarismo
mítico, estabelecendo uma fronteira instável entre o real e o ficcional. Para Lyra,
Para tanto, seus textos defendem, explícita e implicitamente, uma teoria da palavra
poética. Modulada gradativamente ao longo de sua carreira, a concepção acerca do signo
linguístico não sofreu mudança abrupta entre um livro e outro; ocorreu, na verdade, um
espessamento em relação à compreensão artística e, consequentemente, renovações formais
podem ser verificadas no registro poético.
Para ratificar essas afirmações, selecionamos poemas que proporcionam uma visão
panorâmica do conceito de palavra poética defendido por Adélia. Os textos analisados adiante
seguirão uma linha cronológica, para que não percam radicalmente sua localização dentro do
livro de que fazem parte, como também dentro da obra. Primeiro, analisaremos poemas de
Bagagem (1976), O coração disparado (1978) e Terra de Santa Cruz (1981), na subseção “A
palavra poética é coisa”; em seguida, trataremos dos dois livros subsequentes, O pelicano
(1987) e A faca no peito (1988), e dos mais recentes Oráculos de maio (1999) e A duração do
dia (2010), no subcapítulo “A palavra poética flagra a beleza”.
Os três primeiros livros de poemas, espaçados de três anos no máximo (1976, 1978 e
1981), constituem um primeiro ciclo na poesia de Adélia Prado: a quantidade de textos
dedicados ao fazer poético revela a preocupação da novata com a arte e também funciona
como uma espécie de credencial de entrada na vida literária. Embora retome o tema nos
servirão. Várias situações expressam o que ela considera belo, como a inscrição da carrocinha
de doces, simples e profundo registro, encontrado no Brasil, onde ela está inserida. A beleza
da frase pode ser atestada pelo entusiasmo infundido na poetisa e nos passantes, que partilham
da mesma cultura. O título do livro – Terra de Santa Cruz – é um dos nomes arcaicos do país,
dado pelos portugueses quando ainda desconheciam a maior parte do território. Nomeando-o
religiosamente, vincularam seus atos violentos e injustos à religião; mas a prática da caridade
cristã não foi vivenciada. A rigor, o nome do livro faz jus aos antigos acontecimentos só se o
interpretarmos como metáfora da dizimação dos povos indígenas. Entretanto, um país
marcado historicamente pela injustiça pode produzir uma realidade “inefável”, ilustrada
também pelo grupo de pessoas simples que organizam um auto de Natal. Diante daquela
movimentação, o eu lírico avalia que seus “belos versos”, as linhas mais “finamente escritas”,
são como “palha seca”. A beleza registrada poeticamente está sempre aquém da do mundo
empírico e/ou sensível.
A beleza dos astros motiva o observador a expressar, por meio de vocativos, seu
encantamento. Quem está ao redor lhe pede que repita o elogio, o que nos lembra a afirmação
de Valéry sobre a tarefa do poeta, que não seria “experimentar o estado poético: essa é uma
questão particular. Tem como função criá-lo nos outros” (apud Dufrenne, 1969, p. 101). A
partir do pedido do grupo, o foco se desloca da natureza para o discurso. Cria-se um
espelhamento: a beleza empírica contagia a palavra, que, elogiada, é estimulada a se
embelezar ainda mais. O homem atende aos companheiros, mas não repete o que havia dito da
mesma maneira; modela a exclamação, enriquecendo-a com metáforas (sem resvalar no
beletrismo, no floreio verbal gratuito). A primeira, feita com simples repetições – “Estrela, ó
estrela, estrelas” –, transforma-se em “Ó noite de mil olhos, reluzente”. Vale recordar que o
primeiro verso exclamativo já havia sido declamado (com mínima diferença) pelo pai do eu
lírico de “A poesia” (Bagagem), sendo transcrito para o poema no intuito de explicar o
desabrochar da criança para a arte literária; seu reaparecimento em “Genesíaco” indica um
retorno a um tempo muito mais antigo, o do nascimento da própria poesia. O breve relato
ilustra o processo poético de Adélia, que se desenvolve de acordo com esta sequência: olhar,
contemplar, exclamar e reformular.
O título do poema sugere um retorno ao momento da criação. O homem elogia a obra
divina, que se torna mais bela ainda no discurso poético. O criador dos astros e do poeta, a
“voz do amor” (de acordo com a tradição bíblica, a palavra de Deus tudo criou), reconhece,
graças ao momento criativo, que o homem é seu filho. Em seguida, construindo um segundo
espelhamento no texto, o homem também o reconhece como pai. Logo, a palavra poética
funciona como “mediação entre o sagrado e os homens e, assim, é o verdadeiro fundamento
da comunidade. Poesia e história, linguagem e sociedade, a poesia como ponto de interseção
entre o poder divino e a liberdade humana, o poeta como guardião da palavra que nos
preserva do caos original” (Paz, 1984, p. 62).
O mútuo elogio torna o poema essencialmente exclamativo – a poesia é,
metaforicamente, uma interjeição (“os vocativos / são a origem de toda poesia”). Sobre a
utilização de elementos expressivos no texto poético, Bosi sugere que “a onomatopeia e a
interjeição teriam sido, quem sabe, formas puras, primordiais, da representação e da
expressão, funções que, no estágio atual das línguas conhecidas, foram assumidas largamente
por palavras não onomatopaicas” (1997, p. 41). Por isso, a poesia consegue expressar
subjetividades e transformar a imagem bela (impossível de ser explicada ou descrita
fielmente) em palavra, mas em palavra poética, uma vez que não apenas faz referência a um
dado extratextual, mas principalmente se desdobra em muitos significados.
A beleza é captada em coisas que tradicionalmente não são assim consideradas. A
modernidade ampliou seu sentido – em especial a partir de Baudelaire, haja vista As flores do
mal –, que se desembaraçou de um padrão, passando a abarcar inúmeras e inusitadas
realidades. A respeito do tema, Bosi lembra a conclusão de Giacomo Leopardi, semelhante à
encontrada por Schopenhauer e Nietzche: “Belo é o que nos arranca do tédio e do cinza
contemporâneo e nos reapresenta modos heroicos, sagrados ou ingênuos de viver e de pensar.
Bela é a metáfora ardida, a palavra concreta, o ritmo forte. Belo é o que deixa entrever, pelo
novo da aparência, o originário e o vital da essência” (Bosi, 1997, p. 112). Em “Fibrilações”,
cujo título indicia os tremores do ritmo inicial do poema construído por versos curtos, o eu
lírico revela:
Tanto faz
funeral ou festim
tudo é desejo
o que percute em mim.
Ó coração incansável à ressonância das coisas,
amo, te amo, te amo,
assim triste, ó mundo,
ó homem tão belo que me paralisa.
(...)
Certa erva do campo tem as folhas ásperas
recobertas de pelos,
te amo, digo desesperada
de que outra palavra venha em meu socorro.
A relva estremece,
o amor para ela é aragem (Prado, 1987a, p. 14).
No poema acima, “Em Português”, são citadas palavras caras ao eu lírico. Mais uma
vez, elas são admiradas não por sua capacidade semântica, mas pela beleza visual e auditiva.
Entretanto o registro poético cansa o eu lírico, que se lamenta e é consolado por uma frase
simplória de Jonathan. A interlocução vulgar reanima a poetisa porque ela ama o locutor e
considera o registro belo. Assim, retoma, mais otimista, a questão intransponível em que
estava embrenhada: o “defeito” das línguas permite a existência de um discurso poético que
registre as dúvidas e os sentimentos do contraditório ser humano. No mesmo sentido,
Mallarmé afirmou: "Somente, saibamos não existiria o verso: ele, filosoficamente, remunera o
defeito das línguas, complemento superior" (2010: 162).
A preocupação formal de A faca no peito é evidente: dentre os livros de Adélia, é o
que mais investe numa nova disposição dos versos, ora alinhados à esquerda, ora deslocados
para o centro da página; além disso, os enjambements são mais bruscos. Dessa maneira
convergem conteúdo e forma, haja vista a indefinição registrada em relação ao que é humano
e o que é divino, sobre quem é Jonathan e quem é Deus, sobre quem é o eu lírico. Nesse
sentido, atesta Paz:
A melancolia ameaça.
Queria ficar alegre
sem precisar escrever,
sem pensar
que labor de abelhas
e voo de borboletas
precisam desse registro.
Chorando seus casamentos
vejo mulheres que conheci na infância
como crianças felizes.
A vida é assim, Senhor?
Desabam mesmo
pele do rosto e sonhos?
Não é o que anuncio
– já vejo o fim destas linhas,
isto é um poema, tem ritmo,
obedece à ordem mais alta
e parece me ignorar.
Me acontecem maus sonhos:
a casa só tem uma porta,
casa-prisão,
paredes altas, cômodos estreitos (Prado, 2007, p. 13).
Agora é definitivo:
uma rosa é mais que uma rosa.
Não há como deserdá-la
de seu destino arquetípico.
Poetas que vão nascer
passarão noites em claro
rendidos à forma prima:
a rosa é mística (Prado, 2007, p. 129).
Tan-tan, tan-tan,
um tambor antiquíssimo na selva
(...)
tan-tan, tan-tan,
as estrelas são altas e os répteis astuciosos.
Tan-tan, meu pai, tan-tan,
ó minha mãe,
ponta de faca, dentes,
água,
água não. Um pastor com sua flauta
no rochedo,
o que nada pode erodir.
Assim meus pés descansam
e minha alma pode dormir.
Tan-tan, tan-tan,
cada vez mais fraco.
Não é meu coração,
é só um tambor (Prado, 1988, p. 37).
O discurso artístico continua em “Formas”, mas agora quem fala “uma jarra pequena /
com três rosas de plástico” (Prado, 1988, p. 43) é a própria poetisa, que reproduz a frase de
Jonathan, focalizando também “manchas de luz na parede”. A proximidade com ele gera uma
alegria imensa (apesar da tristeza que ele também lhe causa) e, em “O encontro”, ela sente
necessidade de falar porque dá um passo à frente no conhecimento do ser amado: para além
da visão e da contemplação, ela o toca:
O corpo do amado não é descrito, nem sentido, sensualmente. Ela contempla sua
beleza, como se estivesse observando uma tela, ou como se modelasse uma escultura. Isso
porque Jonathan é a encarnação da beleza divina, por isso não pode ser visto diretamente,
apenas pode ser vislumbrado – ele personifica uma tensão gerada por forças que, filosófica e
historicamente, foram afastadas: o espírito e a carne; o mal e o bem; deus e diabo:
2.2.2 Sonhos
Mais questionáveis que a memória afetiva, os sonhos também são frequentes nos
poemas de Adélia. Como os escritores românticos, que valorizavam extremamente o estrato
onírico, a poetisa também faz dele ‘“uma segunda vida’ e, mais ainda, uma ponte para atingir
a verdadeira vida, a vida do tempo do princípio. A poesia é a reconquista da inocência” (Paz,
1984, p. 86). Ao estabelecer contato com o passado e com o desconhecido, os sonhos
contribuem para o flagrante da beleza. Sua interpretação é fundamental porque eles revelam
imagens fundadoras da poesia adeliana. Em Solte os cachorros, ela revela: “O sonho encheu a
noite, extravasou pro meu dia, encheu minha vida e é dele que vou viver, porque sonho não
morre” (1987b, p. 106).
Em “No meio da noite”, de Bagagem, a cor das flores sonhadas opõe-se à do pano de
fundo:
O sujeito poético acredita na relação entre sonho e vida real, por isso não consegue,
nem ao dormir, descansar. A necessidade de expor o sentimento, como também de
compreendê-lo, continua em A faca no peito. Para isso, a parte inicial de “O conhecimento
bíblico” retoma o princípio de tudo:
Os três primeiros versos acima citados sintetizam a base poética que sustenta a
poetisa: romanticamente, ela registra sentimentos, escritos não por desejo dela, mas por
imposição; e, assumindo a tarefa irrecusável, não imita ninguém. Logo, a poetisa mineira
estreia com um dialogismo, termo empregado por Bakhtin para indicar uma escrita que se
relaciona com outra em “um movimento de discordância e concordância, de fusão e atrito
entre vozes muitas vezes parecidas, mas que também não deixam de, em muitos momentos,
apresentarem-se ‘estranhas e hostis’ entre si” (Balbino, 2005, p. 27). Aproveita, então, a
capacidade generativa do signo, que o abre “para a réplica, para o prosseguimento e para a
reinterpretação” (Cury apud Balbino, 2005, p. 28).
Outro poema do mesmo livro homenageia Drummond: em “Todos fazem um poema a
Carlos Drummond de Andrade” há duas vozes líricas, a primeira apresenta a segunda, uma
mulher que inveja o poeta e apresenta suas razões:
O primeiro eu lírico age com ironia em relação à poetisa invejosa, haja vista o título,
pois a insere em um poema que elogia Drummond. A causa da antipatia, estranhamente, são
as “extraordinárias semelhanças” entre eles, como o interesse de ambos por um mesmo
verbete, a atração que sentem pelas mesmas formas, a ideia de serem pessoas comuns, apesar
de escreverem belos textos (entretanto os “versos perfeitos” que fazem provocam risadas dos
leitores).
O eu lírico sente raiva de Drummond e de si mesmo. A poesia do renomado poeta
parece diminuir a sua, a ponto de se perguntar se é ou não uma poetisa. Assim, pelo avesso,
ela declara seu amor ao escritor que rechaçava a pieguice. Dessa maneira também debate,
antes dos críticos, o diálogo que assume com a obra drummondiana.
Outro escritor reverenciado explicitamente, Murilo Mendes, é personagem do poema
“Fraternidade”, sentimento que pode nomear as convergências entre seus textos: também
mineiro, o autor se enveredou tanto pelo viés místico (Tempo e eternidade, de 1935), quanto
pelo plástico (O visionário, de 1938). No texto adeliano, Murilo ri porque “a paciência de
Deus” lhe pisca “um código” (Prado, 1978, p. 94), ou, de acordo com Bosi, porque “perfura a
crosta das instituições e dos costumes culturais para morder o cerne da linguagem religiosa,
que é sempre ligação do homem com a totalidade” (1972, p. 498). O sentimento religioso e
poético do escritor em muito se alinha ao da poetisa, como percebemos nos versos dele:
“Amor, palavra que funde e que consome os seres, / Fogo, fogo do inferno: melhor que o céu”
(apud Bosi, 1972, p. 500). E ainda:
A poetisa revela seus temores porque acredita que a poesia de alguma forma pode
salvá-la, embora não consiga explicar isso logicamente. Vinculada àquela tradição modernista
que não simpatiza com a transparência da palavra poética, Adélia chama atenção de que
apreciamos a arte não porque abarcamos seu significado completo, mas porque captamos sua
sensibilidade.
Estratos menos clássicos também são valorizados pela escritora: em “As seis
badaladas do entardecer”, de O pelicano, o eu lírico se compara a outros artistas na tentativa
de exprimir a maravilha de um final de dia (exatamente às seis horas da tarde):