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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E
HUMANIDADES
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
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I Parte – APRESENTAÇÃO
1. Trajetória Profissional e Acadêmica..........................................4
2. Relatório de atividades...............................................................6
2.1 Disciplinas cursadas.................................................................6
2.2 Produção Científica…………………………………….……15
2.3 Participação em Eventos………………………………..…....15
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Parte I – APRESENTAÇÃO
Meu nome é Fábio Eloi de Oliveira, tenho 44 anos e nasci em Santo André.
Vivi a maior parte da minha vida em São Bernardo do Campo, onde estudei da segunda
à oitava série do ensino básico na Escola Estadual “Vinte de Agosto”.
Naquele período, anos 1980, o ensino público possuía uma boa qualidade e acredito ter
recebido uma boa formação, principalmente, em Língua Portuguesa, Matemática,
Geografia e História.
As duas primeiras foram decisivas nos meus passos acadêmicos seguintes. Muito
dividido entre as minhas preferências, optei pela Matemática e fui cursar Processamento
de Dados na antiga Escola Técnica Estadual (ETE) “Lauro Gomes”. Três anos
mergulhado em operações matemáticas complexas me foram suficientes para indicar
que o meu caminho deveria ser revisto.
Isso me levou para a faculdade de Jornalismo, na Metodista, em 1992. Como quase todo
garoto, minha paixão pelo futebol me levava a imaginar um futuro como repórter ou
comentarista esportivo.
No entanto, as grandes dificuldades financeiras da minha família me levaram a trabalhar
com eventos que remuneravam muito melhor do que um estágio em jornalismo. Iniciei
a minha carreira no Grupo WCR, mega-empresa do ramo (atualmente pertencente à
holding África do publicitário Nizan Guanaes) como distribuidor de panfletos, uma
espécie de precursor dos promoters, tão na moda atualmente.
Posteriormente, passei a líder de equipe de promoção, coordenador de eventos e
organizador de eventos de grande porte como shows musicais.
Essa escalada me aproximou das noções de marketing, especialmente marketing
promocional, mas também me deu base para gestão de equipes.
Como gestor de equipes (principalmente na área de vendas) passei por empresas como
Páginas Amarelas, inIT Solutions, Global Network e Grupo TVA.
Na sequência, em 2004, fui convidado a participar da implantação da multinacional
francesa Decathlon na cidade de São Paulo.
Como gerente de hiper-varejista, tive a oportunidade de retomar minha ligação com o
esporte, assim como me especializar em todos os processos do varejo.
Ao mesmo tempo, conclui meu MBA em Gestão Estratégica de Marketing.
Já de saída da Decathlon, em 2008, fui convidado a retornar à Metodista, agora como
professor de Comunicação de Varejo no curso de Comunicação Mercadológica.
Em paralelo à atividade acadêmica, desenvolvi, em diversas agências, a minha paixão
pela planejamento publicitário. O planejamento me permitiu participar da construção de
diversas campanhas para clientes que vão de SulAmérica à Toyota.
Durante este período, até agora, tive a oportunidade de ministrar outras disciplinas
relacionadas ao Marketing Especializado, como Marketing de Serviços, Marketing
Direto, Marketing Promocional, Eventos e algumas outras nos cursos de Jornalismo,
Publicidade e Propaganda e Relações Públicas. Nos últimos anos, como professor
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convidado, tenho lecionado em cursos de pós-graduação na própria Metodista, no
SENAC, na FAAP e na Academia de Varejo.
A mistura entre o prazer de lecionar e o planejamento publicitário me levaram à
necessidade de aprofundar os meus conhecimentos. Assim, concluí o meu Mestrado em
Comunicação em 2013, com trabalho intitulado Publicidade, Imaginário e Identidades
Nacionais: o futebol e a religiosidade em tempos de Copa do Mundo, na linha de
pesquisa Comunicação Midiática nas Interações Sociais, cujo resumo pode-se ver
abaixo.
Resumo
Este trabalho se propõe a analisar as interações entre a Publicidade, as
Identidades Nacionais e o Imaginário. Para isto, foi estabelecido o objetivo
de verificar a atuação da publicidade, enquanto processo comunicacional,
como mediadora cultural por meio da conformação de vínculos de uma
marca/produto com a representação de identidade cultural nacional de um
povo, valendo-se da utilização de símbolos, mitos e de um discurso de
pertencimento presentes no imaginário social.
Para o alcance deste objetivo, foram assentadas as bases teóricas que estudam
as temáticas: imaginário; identidades culturais e sociologia do esporte. No
que diz respeito especificamente à publicidade, o estudo se concentrou nas
interações da publicidade com o consumidor em que o objetivo final é
estabelecer vínculos emocionais duradouros.
As reflexões dos teóricos Gilbert Durand, Michel de Certeau, Stuart Hall,
Raymond Williams, Eric Hobsbawm, Mário Filho, Édison Gastaldo, Kevin
Roberts e Magali Cunha foram privilegiadas.
A partir desse assento teórico foi possível desenvolver uma metodologia de
caráter qualitativo por meio da Análise de Conteúdo em bases comparativas.
A conclusão da pesquisa é que a publicidade se conecta ao imaginário social
porque ela é mais um elemento da construção deste imaginário e, em função
de ser um processo comunicacional, também se alimenta dele.
Portanto, o publicitário (e consequentemente a publicidade) busca elementos
na sua imaginação para criar e o seu repertório inclui aspectos como a
identidade nacional e relações com a religiosidade popular.
O produto final, midiatizado, vai fazer com que novos entendimentos sejam
produzidos no imaginário social, ao mesmo tempo em que pode, também,
apenas reforçar o entendimento já sedimentado acerca dessas representações.
Palavras-chave: Matriz Religiosa Brasileira - Futebol - Imaginário -
Estudos Culturais
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2. RELATÓRIO DE ATIVIDADES
Créditos: 03
Conceito: A
Profa. Dra. Magali do Nascimento Cunha
Ementa: Reflexão e investigação dos processos de comunicação como elemento de
mediação entre cultura e imaginário. A construção do imaginário como fenômeno
cultural. O lugar dos meios de comunicação social na conformação cultural (cultura
midiática) e na construção do imaginário social. O imaginário religioso e suas interfaces
com os processos comunicacionais midiáticos no Brasil contemporâneo.
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dos estudos da comunicação “dos meios às mediações”, em uma reflexão de natureza
epistemológica, que articula o pensamento comunicacional com o universo da cultura.
As matrizes teóricas dos Estudos de Recepção, com especial atenção ao pensamento
comunicacional latino-americano. A pesquisa de recepção, dos estudos de audiência ao
modelo das mediações.
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Muito em função disso, este projeto, que nasceu como um Estudo de Caso,
caminhou para uma Análise de Conteúdo, muito mais adequada e interessante para a
proposta.
Além de ajudar no entendimento das técnicas de pesquisa, a disciplina foi muito
importante no instante em que conduziu para as possibilidades de pesquisa, orientou no
sentido de buscar incansavelmente as abordagens já existentes para o tema que se
pretendia desenvolver e indicou os melhores autores para apoiar o desenvolvimento
metodológico.
Aqui, as abordagens de Bardin foram as escolhidas para a Análise de Conteúdo
dos comerciais com os quais o projeto vai trabalhar.
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principalmente do homem urbano, alguns aspectos do estudo que proponho ficariam
sem sentido.
Compreender a ruptura com o cotidiano que a Copa do Mundo representa, no
Brasil, permite visualizar a importância da vitória no esporte como metáfora da vitória
na vida.
Nestas aulas, mais do que a leitura dos textos, os intensos debates promoveram a
reflexão e estimularam a análise de inúmeros assuntos sob diversos pontos de vista.
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f) Correntes Teóricas Da Comunicação Social
Créditos: 03
Conceito: A
Prof. Dr. Laan Mendes de Barros
Ementa: Questões epistemológicas da Comunicação: delimitação do campo e
especificidade do objeto de estudo. Revisão de correntes teóricas da Comunicação
Social, desde uma perspectiva dialética: da sociedade de massas à sociedade em rede.
As correntes teóricas fundadoras do pensamento comunicacional contemporâneo: a
Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, o Funcionalismo norte-americano e o confronto
entre “apocalípticos e integrados”. Noções de Semiologia e Teoria da Informação:
influências matemáticas e econômicas no estudo da Comunicação. O Estruturalismo e a
Análise de Discurso: a ênfase na mensagem e nos produtos midiáticos. Os Estudos
Culturais e a Estética da Recepção: identidades e mediações culturais. O Pensamento
Comunicacional Latino-Americano: hibridações culturais. A Cibercultura e a
Comunicação na sociedade em rede: as tecnologias digitais do mundo contemporâneo.
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que são gerados. As contradições decorrentes desse processo são vistas como
localizadas à margem dos sistemas hegemônicos dos valores ético-políticos
disseminados na sociedade.
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personalidade de uma marca. Aqui, destaco Maingueneau, que chama de “cenografia” o
entorno em que o discurso é construído. Nessa minha proposta de trabalho, o discurso
publicitário parece encaminhado a partir de um entendimento coletivo (de nação e de
identidade) e caminha por esse entendimento para reforçar laços de forma a tornar o
discurso legítimo, ainda que ele seja publicitário – o que só torna mais interessante a
forma como os “fatos” são narrados.
Outro autor trabalhado na disciplina também vem ao encontro do que aqui me
proponho a discutir. Eliseo Verón, no livro La semiosis social: fragmentos de una teoría
de la discursividad afirma que o mais importante em uma sociedade é a sua capacidade
de produzir sentido e esta produção de sentido é composta por uma pluralidade de
materiais significativos.
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refrigerantes para se tornar um bem cultural, completamente conectado aos valores do
seu público-alvo. Esse trabalho foi um dos motivos pelos quais decidi analisar a relação
entre a Nike, a seleção brasileira de futebol e a apropriação cultural.
O aspecto mas interessante desta disciplina, para mim, foi discutir a construção
simbólica das marcas na sociedade em rede.
Destaco os estudos de Mafesolli, em especial as discussões sobre a comunidade
emocional, em que ele afirma que as pessoas se unem por uma emoção coletiva, em
laços sociais estruturados no cotidiano; e sobre aquilo que ele chama de potência
subterrânea, “força coletiva que anima”, o que ele determina como “vitalismo”. E é
nesse vitalismo que se exprime a afirmação do querer viver em sociedade. Essa
experiência compartilhada, o vivido, “constitui o essencial de todas as agregações
sociais”. Mas há uma necessidade de um interior, uma centralidade subterrânea que, eu
acredito, está diretamente ligada às identidades culturais.
Em seguida, também foram muito importantes os debates em torno do tecno-
consumidor que é o sujeito que, por meio da tecnologia, contribui para a construção e
desconstrução da imagem corporativa das marcas, não se atendo ao papel de
consumidor, mas se propondo a ser um co-produtor de conteúdo, um educador e um
advogado das marcas às quais ele se sente conectado.
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h) Mídia Impressa e Publicidade
Créditos: 03
Conceito: B
Prof. Dr. Paulo Rogério Tarsitano
Aqui, sem dúvida, o mais importante foi discutir conceito criativo. E não apenas
na superfície, mas sim com uma profundidade que procurou mergulhar em diferentes
narrativas para extrair de onde vem o texto publicitário. Entender a construção dos
textos e o seu papel em um cenário em que prevalecem as imagens e o som me permitiu
estar atento a detalhes que antes passariam sem despertar o meu interesse. A partir da
disciplina, me concentrei nas construções textuais e na sua relevância na construção das
narrativas dos comerciais. E, mesmo nos comerciais em que não há texto falado, pensar
a propaganda na TV como uma sequência que obedece a um roteiro me ajudou a ter a
dimensão do discurso implícito nas imagens.
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2.2 PRODUÇÃO CIENTÍFICA
Livro Publicado
Marketing Promocional um Olhar Descomplicado
RIVA, J. ; ELOI, Fabio ; MANSANO, K. ; BONETTI, L. ; SCHIASCHIO, M. ;
SANTOVITO, T. ; Eloi, Fabio . Marketing Promocional Um Olhar Descomplicado. 01.
ed. São Paulo: Cengage Learning, 2013. v. 01. 202p .
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II PARTE – PROJETO DE PESQUISA
1. TÍTULO
A relação entre a Nike, o Brasil e o futebol: um estudo sobre a apropriação cultural em
comerciais com o futebol brasileiro.
2. RESUMO
Este projeto estuda o fenômeno da apropriação cultural e tem por tema “A relação entre
a Nike, o Brasil e o futebol”, e, por objeto, “a apropriação cultural em comerciais com o
futebol brasileiro”. E faz isso observando como a publicidade pode se associar a
elementos culturais de uma sociedade para interagir com o imaginário coletivo,
fomentando uma percepção de pertencimento e uma ideia de nação a partir de um grupo
de características culturais emocionalmente potencializadas com um objetivo bastante
claro: vender produtos. O corpus da pesquisa é constituído por quatro peças,
audiovisuais, veiculadas na TV e na internet para lançamento de campanhas da Nike
para as Copas do Mundo de 2006 a 2018. O objetivo geral deste estudo é, assim,
identificar se o que a Nike vem construindo, durante mais de uma década, em sua
comunicação com o torcedor brasileiro, pode ser considerado apropriação cultural. A
pesquisa utiliza como referenciais teóricos a percepção de cultura por parte de Michel
de Certeau e os estudos culturais, principalmente aqueles produzidos na Escola de
Birmingham, além de produções na área da sociologia, com destaque para a sociologia
do esporte. Por fim, ela se vale dos estudos que relacionam a publicidade e o imaginário
para entender como a inspiração em características culturais pode vir a se tornar
apropriação cultural deliberada. Metodologicamente, a pesquisa bibliográfica
fundamenta a dimensão teórica da pesquisa, seguida pela aplicação do método
qualitativo por meio da Análise de Conteúdo em bases comparativas. Com isso, a
pesquisa busca mostrar como algumas das propagandas da Nike, produzidas neste
século, tendo o futebol brasileiro como ator principal, apropriam-se da noção de
identidade nacional, através de um dos seus elementos socioculturais mais significativos
(o futebol), associando a isso outros elementos como a música, a religião, a arte e a
composição étnica brasileira, com destaque para a matriz africana, deslocando o
sentimento que se origina na cultura de um povo para colá-lo em um produto, a
“Seleção Brasileira”, que pertence a uma organização privada, a Confederação
Brasileira de Futebol (CBF), como forma de vender produtos da Nike, sobretudo “a
camisa oficial do Brasil”.
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3. PROBLEMA DE PESQUISA
Durante muito tempo, promotores de marcas e produtos acreditaram que a
superexposição midiática seria suficiente para alcançar altos índices de conhecimento,
adesão e, por consequência, o sucesso de vendas. Nas últimas décadas e, especialmente,
nos últimos anos, a volatilidade do consumidor configurou um novo cenário: as pessoas
preferem comprar produtos e marcas com as quais elas possam estabelecer vínculos.
As pessoas não estão mais interessadas em serem catequizadas sobre
benefícios funcionais e características. Elas estão buscando conexões
em suas vidas e isso é o que elas esperam das marcas com as quais se
importam (ROBERTS, 2007, online).
A publicidade atual busca estabelecer vínculos, mas se esforça para que estes sejam
emocionais entre os produtos/marcas e os consumidores. E esta ligação tende a ser mais
forte na medida em que penetra nas mentes e corações aliando-se a valores, crenças e
tradições que estão arraigadas em todas as sociedades.
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No entanto, acreditamos que, em alguns casos, a publicidade vai além. Ela se apropria
dos elementos culturais para produzir um sentido próprio, vinculado a uma marca.
Com base nestas premissas, este trabalho terá como ponto de partida as seguintes
questões: o que é apropriação cultural e em que momento a publicidade se afasta da
simples inspiração no imaginário e passa a se apropriar de elementos culturais para
fortalecer a imagem de marcas e produtos?
O que a Nike faz, nos seus comerciais no Brasil, neste século, é buscar inspiração e,
consequentemente, vínculo emocional com seus consumidores em bases culturais, ou é
apropriação cultural pura e simples?
Em suma, a questão principal de pesquisa pode ser assim formulada: os comerciais da
Nike, produzidos em períodos de Copa do Mundo, podem ser considerados uma forma
de apropriação cultural com finalidade comercial?
4. HIPÓTESES
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cria verdades e fatos, com a intenção de entreter, aproximar e seduzir o consumidor por
meio do discurso verbal e do discurso embutido no show das imagens.
A hipótese, aqui levantada, é que ela faz isso, em períodos de Copa do Mundo, tomando
para si uma série de elementos culturais e conduzindo para uma percepção de que a
marca também é detentora ou, ao menos, coprodutora desses bens culturais.
5. OBJETIVOS
6. JUSTIFICATIVA
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social já seria, por si, interessante para os estudos sobre a identidade cultural em relação
à comunicação. Aqui propomos fazer isso, mas ir além.
Especificamente para o Brasil, o trabalho se torna interessante ao verificarmos a
construção da relação entre a multinacional de artigos esportivos NIKE e a Seleção
Brasileira de Futebol. Essa relação, nos últimos doze anos, se estabeleceu com a criação
de proximidade entre a “Seleção” e elementos culturais como a religião, a composição
étnica, a música, a arte e o próprio futebol.
Neste sentido, este trabalho espera contribuir para os estudos em comunicação
localizando se a publicidade atua como um processo comunicacional, agente e reagente
em interações sociais ou se ela vai além, se utilizando de uma apropriação cultural para
criar um Brasil imaginário que sirva aos interesses comerciais de uma marca, neste
caso, a Nike.
7. REFERENCIAL TEÓRICO
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como integrantes por identificação tendem a funcionar como a base de um sentimento
de identidade nacional.
Diversos autores tratam de identidade nacional e das suas manifestações.
Para observarmos como isso se processa nas sociedades em geral, escolhemos três
dentre eles: Stuart Hall, Bronislaw Backzo e Benedict Anderson.
O filósofo polonês Bronislaw Backzo contribuirá com o seu artigo “Imaginação Social”
(1985) em que trata do imaginário social como pano de fundo para a formação da
identidade de um povo.
A fim de que uma sociedade exista e se mantenha, assegurando um
mínimo de coesão, é preciso que os agentes sociais acreditem na
superioridade do facto social sobre o facto individual, que se dotem de
uma “consciência colectiva”, isto é, um fundo de crenças comuns que
exprima o sentimento da existência da colectividade. Ora, só é
possível comungar ou comunicar entre os homens através de símbolos
exteriores aos estados mentais individuais, através de signos
posteriormente concebidos como realidades. Um dos caracteres
fundamentais do facto social é, precisamente, o seu aspecto simbólico.
Na maioria das representações colectivas, não se trata da
representação única de uma coisa única, mas sim de uma
representação escolhida mais ou menos arbitrariamente a fim de
significar outras e de exercer um comando sobre as práticas.
Freqüentemente, os comportamentos sociais não se dirigem tanto às
coisas em si, mas aos símbolos dessas coisas. As representações
colectivas exprimem sempre, num grau qualquer, um estado do grupo
social, traduzem a sua estrutura actual e a maneira como ele reage
frente a tal ou tal acontecimento, a tal ou tal perigo externo ou
violência interna. Existe uma relação íntima e fatal entre o
comportamento e a representação colectiva (BACKZO, 1985, p. 306).
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Dessa forma, Hobsbawn aponta a invenção das tradições como elemento de formação
de uma identidade, enquanto Backzo indica que isso também acontece em função do
imaginário social – que, por sua vez, está mergulhado em tradições e costumes - e
Anderson conduz para a forma como isso se reflete politicamente, na formação das
identidades nacionais.
O pesquisador jamaicano Stuart Hall, um dos pilares dos Estudos Culturais, será
referência para a abordagem das identidades culturais na pós-modernidade e de que
forma elas se manifestam fortemente independente de aspectos geográficos e, também,
como elas são mediadas por diversos aspectos, sobretudo, da mídia. Mais além, Hall vai
tratar da lógica da diferença, em que uma comunidade se reconhece pelo que é, mas
principalmente pelo que não é e, assim, estabelecer o que entende como “dela” e “dos
outros”.
As obras de referência serão Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais (2008) e
A Identidade Cultural na Pós-Modernidade (1992)
No mundo moderno, as culturas nacionais em que nascemos se
constituem em uma das principais fontes de identidade cultural. Ao
nos definirmos, algumas vezes dizemos que somos ingleses ou galeses
ou indianos ou jamaicanos. Obviamente, ao fazer isso estamos falando
de forma metafórica. Essas identidades não estão literalmente
impressas em nossos genes. Entretanto, nós efetivamente pensamos
nelas como se fossem parte de nossa natureza essencial (HALL, 1992,
p.12).
1
Mário Filho (1908-1966) foi um jornalista pernambucano, radicado no Rio de Janeiro. Escreveu, em
1947, o Negro no Futebol Brasileiro, considerado a sua grande obra. Importante cronista esportivo das
décadas de 20 a 60, foi o criador da expressão Fla-Flu e Concurso de Escolas de Samba (cujo primeiro
campeonato foi realizado na Praça Onze-RJ). Um dos principais defensores da construção do Maracanã
para a realização da Copa de 1950, teve o estádio batizado com o seu nome. Até hoje, o Maracanã se
chama Estádio Jornalista Mário Filho. Foi fundador do tradicional Jornal dos Sports do Rio de Janeiro.
Atribui-se a ele também, a criação do Torneio Rio-São Paulo de futebol, o primeiro interestadual
realizado no Brasil de forma contínua. Mário Filho era, ainda, irmão do jornalista e dramaturgo Nelson
Rodrigues.
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parecem não lhe caber. Isso não é de se estranhar onde são
mobilizadas paixões tão profundas, onde tanta coisa está em jogo e
onde a deusa Fortuna tem uma influência tão decisiva (ROSENFELD,
1993, p.102)
Assim, esperamos apontar como se constrói a identidade nacional e de que forma essa
construção imaginária encontra no esporte uma forma de se manifestar.
Posteriormente, avançaremos para chegar ao tema do futebol: de que forma a identidade
nacional se manifesta por meio do futebol. Como os símbolos, mitos, heróis, a religião
e outros aspectos presentes no imaginário cultural coletivo encontram no futebol um
campo farto para se fortalecerem, para se perpetuarem, causando uma fusão em que,
aparentemente, tudo se torna uma única coisa, impossível de se dissociar: o futebol, as
tradições e a nação.
A obra clássica O Negro no Futebol Brasileiro (1947), do jornalista Mário Filho, que
aponta as relações entre a negritude e a cultura do futebol, desde o surgimento do
primeiro negro em uma equipe, será utilizada para reforçar os motivos pelos quais o
imaginário do futebol é, muitas vezes, carregado de simbolismos afro-brasileiros, uma
vez que a maioria dos grandes ídolos da história do nosso futebol foram/são negros ou
mestiços. Provavelmente mais importante do que isso seja a constatação do fenômeno
da ascensão social que sempre envolveu o futebol, desde Friedenreich2.
As narrativas tomam o futebol como espelho dos dilemas da sociedade
brasileira, deixando de explicar a singularidade das técnicas corporais
que distinguiriam o estilo de jogo brasileiro. A relevância de
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Arthur Friedenreich (1892- 1969) foi considerado o primeiro astro do futebol brasileiro. Artilheiro do
Sul-americano de 1919 (competição mais importante do futebol até então), era filho de pai com origem
alemã e mãe negra, o que o tornou a primeira celebridade esportiva mestiça do Brasil.
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apresentar a tradição é demandada pela pressão do presente que bate
na tecla de que as inovações táticas e técnicas, no contexto da
espetacularização e comercialização do esporte, teriam feito
desaparecer o futebol-arte. A intelectualidade transforma o futebol em
saudade e espelho da sociedade sem, contudo, explicar o centro da
tradição: a construção do estilo (SOARES, LUVISOLO, 2003 p.)
Por fim, visitaremos conceitos que tratam de publicidade e das relações entre a
publicidade e o imaginário, buscando entender como se dá o processo de construção da
marca no coração do consumidor, apontando como ele se identifica com o produto
através da mensagem publicitária.
O livro Lovermarks: o futuro além das marcas (2004), de Kevin Roberts, trará
os estudos mais recentes sobre o processo de construção da empatia entre marcas e
consumidores.
Neste momento, nos aproximamos do conceito de “Estrutura de sentimento”,
que Raymond Williams (1979) define “ como experiências sociais em solução, distintas
de outras formações semânticas sociais que foram precipitadas e existem de forma mais
evidente e imediata”. A partir disso, vamos averiguar como os Estudos Culturais
abordaram essa condição.
Também observaremos a relação estabelecida entre o futebol, o imaginário e a
propaganda com a ajuda do livro Pátria, chuteiras e propaganda, de Édison Gastaldo
(2002), em que o autor aponta como a imagem do brasileiro é abordada em sua relação
com o futebol e a “pátria de uniformes”.
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8. METODOLOGIA
Para o desenvolvimento do projeto será necessária uma extensa pesquisa
bibliográfica, na linha do que foi apontado, para fundamentar a dimensão teórica da
pesquisa e a aplicação do método qualitativo por meio da Análise de Conteúdo em
bases comparativas.
Bardin (1977, p. 42) conceitua a análise de conteúdo como um conjunto de
técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e
objetivos de descrição do conteúdo das mensagens. A intenção da análise de conteúdo é
a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção ou de recepção,
inferência esta que recorre a indicadores quantitativos ou não.
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O filme começa com o jogador Robinho dando um testemunho. Só então, no fundo,
ouve-se a entrada de um samba, com levada tipicamente africana, sendo a imagem
substituída por uma cena que mostra uma fábrica onde se confeccionam amuletos
da sorte (figas de madeira).
Nesse momento, sobe um GC (gerador de caracteres) com a frase “Nike
futebol.com apresenta”. Essa espécie de chamada só seria complementada com
quase um minuto e meio de comercial com o nome do filme “Mandingas”. Assim, a
construção completa do título se forma: “Nike apresenta: Mandingas”.
Começa, então, o que poderíamos chamar de introdução.
Essa introdução, retrata uma feirinha popular onde são mostrados vários amuletos
afro-brasileiros: colares de miçangas, figas, carrancas, folheto de “São Longuinho”.
Nesta feira, uma senhora negra adquire uma figa, que é levada a um pequeno altar
em que aparecem velas de várias cores, imagens de Nossa Senhora Aparecida, São
Jorge, amuletos variados, representando o sincretismo religioso que é uma
característica que, supostamente, se aplica ao povo brasileiro.
Sobre essas imagens, a voz do rapper Thaíde, que é o narrador em off de todos os textos
da peça, declama ou canta um samba com levada africana. A letra diz:
É...é da hora o baguio…
Sorte, talismã, mandinga,
Habilidade, arte, ginga.
Destino, competição,
Bola no pé, intuição.
É ou não é?
É a crença...é a nossa crença
Às vezes até parece que é até por isso
Que a barriga em que a gente vive antes de nascer é redonda
É isso mesmo. Certo?
Isso a gente tem de bastante
É isso mesmo. Certo?
Vamo que vamo...
Sou brasileiro, é pura mandinga
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a consagração como campeões mundiais; a camisa azul filmada em close e a volta das
cenas que mostram diversos tipos de amuletos e mandingas da sorte.
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Quando eu e meu irmão nascemos, né, somos gêmeos, então quando a
gente nasceu ele enterrou o nosso cordão umbilical no centro do
campo do Santa Rosa. E ali eu acho que ele fez uma reza, ou pediu a
Deus, para que um filho dele desse certo no futebol. Coube a mim
exercer esse pedido do meu pai e graças a Deus vem dando certo.
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Outro:
- Não! Tu também não, pode esquecer!
E chegou em mim:
- Tu, tu pode ser que vire um jogador. Tu tem pinta.
Beleza, né? Voltamos a jogar e ele sumiu. Sumiu! Ninguém viu ele
saindo...ninguém... desapareceu. E eu acho que ele era um anjo ali
que...enviado para dizer que eu iria virar um jogador. E hoje eu to aí,
Luís Fabuloso. Virei o Fabuloso.
Para finalizar, há uma cena em que o jogador Luís Fabiano canta um rap,
aparentemente de improviso, como se fosse um making of. A letra do rap diz:
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elementos que remetem ao futebol com cenas que procuram representar uma certa
“brasilidade” (campinhos de terra, quadras em mau estado de conservação, favelas, um
quadro de Nossa Senhora, calçados amarrados nos fios elétricos, cenas de um vestiário
de várzea etc). Essas imagens “de futebol” recebem o mesmo efeito especial aplicado
aos jovens do início. Em alguns momentos, as ”pessoas comuns” são substituídas por
recortes de astros da seleção do Brasil como Neymar, William, Paulinho, Daniel Alves,
Ronaldo Fenômeno, Ronaldinho Gaúcho, Marquinhos e Thiago Silva. O técnico Tite
também é personagem, aparentemente, comandando um time de várzea. As imagens são
rápidas, os cortes secos, o que se pretende é dar força ao texto que é cantado em forma
de RAP e que traz a seguinte letra:
A gente nasce assim, no meio de um jogo
Pegando fogo, entrando de sola,
Tirando da cartola um truque novo
É a garra de um povo
Que sem nada no saldo bancário
Vira Ronaldo Nazário
E se supera de novo
Fazendo magia feito um ilusionista, um bruxo
É poesia com um lance de Ronaldinho Gaúcho
É Davi vencendo Golias
Neymar no meio dos grandalhões
Fazendo estripulias
A gente nasce assim,
Como se Deus fizesse Sim-salabim
E de repente a gente já soubesse o que iria ser o fim
É indiscutível, inexplicável, intraduzível,
Indecifrável, imprescindível, imensurável
Não é querer ser mais que ninguém
E nem levar vantagem
Mas é que só a gente tem
Esse dom da brasileiragem
Assinatura original, nossa impressão digital
Porque quando a gente faz,
Ninguém consegue fazer igual.
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O comercial tem 2min30seg de duração e começa com uma imagem em close do ex-
atacante francês Eric Cantona declarando: “Você pode cantar como um canário. Você
pode ser um virtuoso. Mas, acredite em mim, você só faz uma música bonita se souber
como tocar em uma orquestra. Ele começa a batucar em um instrumento de percussão e
a imagem corta para um ônibus em que os jogadores Ronaldo, Ronaldinho, Roberto
Carlos e Robinho tocam samba vestidos com os agasalhos da seleção brasileira. Eles
descem do ônibus tocando e cantando simulando a situação de uma delegação que está
chegando a um estádio para um jogo. Eles se dirigem ao vestiário onde também aparece
o jogador Adriano. Então, Robinho começa a brincar com a bola e a trilha sonora é a
música “Mas que nada” de Sérgio Mendes em versão remix de Fernanda Porto. A
sequência mostra os jogadores se vestindo e se preparando para o jogo, enquanto dão
demonstrações de habilidade e controle de bola. Depois, há uma roda de oração (Pai
Nosso) onde também se vê o jogador Cicinho e os atletas se dirigem ao campo. As
imagens mostradas são, então, de um jogo Brasil e Chile no Morumbi, pelas
Eliminatórias da Copa, e exibem um gol do Brasil. Na comemoração se juntam
Robinho, Kaká, Adriano e Ronaldo. Cabe ressaltar que a música de Sérgio Mendes vai
até o final do comercial que é encerrado com o slogan JOGA BONITO.
31
em busca de um sonho. Tá me entendendo, irmão? Por um, por todos e por nós. Família,
tropa, mais do que um time. Zica da taça e a taça é o que define a sintonia nossa,
potente, sublime, quente, maloca, é classe tipo Dorival Caymmi. Meu crime aqui na
guerra e a gana dos campos de terra. Tribo: me mira e me erra, chão. Vou por. E faz da
minha coleção, um dois, três. Quantos tem? Tanto faz. Vem, traz, manda mais. Vence
“nóis” se for capaz.”. Nesse momento, entra uma música “Um filho teu, não foge à luta,
não. A hora é essa, vai com o coração, força, raça e fé. Venha quem vier”. Então, volta
o locutor: “Aí, somos 200 milhões de corações ou mais batendo junto nesse momento,
certo? É nosso momento. Com muita fé.”. Na sequência, entra a assinatura MOSTRA
SEU JOGO e fecha-se o comercial com novas imagens misturando o povo e os
jogadores entrando em campo.
A partir da análise de conteúdo das quatro peças comerciais, por meio de comparação,
buscaremos identificar a forma com que a publicidade se apropriou do imaginário
coletivo em torno do futebol e da identidade nacional para estabelecer o vínculo
emocional com os espectadores/consumidores e discutir se temos, ou não, um processo
de apropriação cultural.
32
9. REFERÊNCIAS
33
GASTALDO, Édison. Pátria, Chuteira e Propaganda: o brasileiro na publicidade da
Copa do Mundo. São Paulo: Annablume, 2002.
HELAL, Ronaldo. O que é Sociologia do Esporte. São Paulo: Editora Brasiliense, 1990.
HALL, STUART. Da Diáspora. Identidades e Mediações Culturais. Minas Gerais.
Editora: UFMG, 2008.
HALL, STUART. Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro. DP&A
Editora, 1992.
HOBSBAWM, Eric. A Invenção das Tradições. Rio de Janeiro. Paz & Terra, 1984.
MENDES, Jackeline. Quem não pode com mandinga não carrega patuá – Práticas e
usos encantatórios da escrita na diáspora negra. XI Congresso Luso Afro Brasileiro de
Ciências Sociais. Salvador, agosto de 2011.
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Protestantes, pentecostais e ecumênicos. O campo
religioso e seus personagens. São Bernardo do Campo: UMESP, 1997.
MORAES, Denis. O Imaginário Vigiado. São Paulo: José Olympio (Grupo Record). Ed.
1, 1994.
OROZCO, Guillermo Gómez. O telespectador frente à televisão. Uma exploração do
processo de recepção televisiva. In: revista Dia-logos de la comunicación, da Federação
Latinoamericana de Faculdades de Comunicação Social – FELAFACS. 2005.
ROBERTS, Kevin. Lovermarks. O futuro além das marcas. São Paulo: M.Books, 2004.
ROBERTS, Kevin. Lovermarks. O futuro além das marcas. Revista HSM Online. 08 de
agosto de 2007. Disponível em http://www.hsm.com.br/editorias/lovemarks-o-futro-
alem-das-marcas. Acesso em outubro de 2012.
ROSENFELD, Anatol. Negro, Macumba e Futebol. São Paulo: Perspectiva, 1993.
SHIMP, Terence A. Propaganda e Promoção: aspectos complementares da comunicação
integrada de marketing. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2002.
SOARES, Antonio Jorge. Futebol: A história da construção do estilo nacional. Revista
Brasileira das Ciências do Esporte, Campinas, v. 25, n. 1, p. 129-143, set. 2003.
WILLIAMS, Raymond. Marxismo e Literatura. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1979
WILLIAMS, Raymond. Culture is Ordinary. Resources of Hope: Culture, Democracy,
Socialism. London: Verso, 1958.
WILLIAMS, Raymond. Cultura e Sociedade. São Paulo. Companhia Editora Nacional,
1969.
34
10. CRONOGRAMA
Cronograma de Agosto de 2018 a Abril de 2019.
Exame de x
qualificação
Complemento x x x
pesquisa
bibliográfica
Redação x x
preliminar
da tese
Redação final x x
da tese
Entrega da x
tese
35
PARTE III - PROJEÇÃO DA TESE
1. Pré-plano da tese
Capítulo 1 – DAS TRADIÇÕES À CONSTRUÇÃO DE UMA
IDENTIDADE NACIONAL
1.1 A formação das tradições e o imaginário
1.2 As identidades culturais nacionais
1.3 Identidade nacional, cultura e pós-modernidade
RESUMO
Neste capítulo, trabalharemos os conceitos de tradição, a forma como elas podem ser
inventadas e por que motivos isso pode acontecer, observando, sobretudo, os estudos de
Eric Hobsbawm. O passo seguinte será observar como essas tradições servem para
apoiar a formação de uma identidade. De que forma elas, mesmo inventadas, adquirem
o status de força gravitacional, uma vez que em torno delas é que giram muitas das
percepções da sociedade e o próprio entendimento do que se é enquanto grupo. Neste
ponto, autores como Stuart Hall, Bronislaw Backzo, Dênis de Moraes e Raymond
Williams serão utilizados como referências. Assim, pretendemos mostrar as tradições
como aquilo que une e sedimenta o pertencimento social e, no instante seguinte, leva ao
reconhecimento da existência de uma identidade nacional que se alimenta das tradições,
mas que também serve de combustível para novas produções de sentido, realimentando
tanto o imaginário quanto produzindo novas tradições.
O objetivo deste capítulo é pesquisar o esporte enquanto fator social, apontando as suas
implicações na integração entre as pessoas, as comunidades. As obras de Anatol
Rosenfeld, Ronaldo Helal e Roberto DaMatta serão utilizados como referências nesta
36
tarefa, mas também nos conduzirão no estabelecimento das relações entre o futebol e o
imaginário.
Capítulo 3 – PUBLICIDADE, IMAGINÁRIO E A CULTURA
NACIONAL
3.1 – A publicidade e o imaginário cultural no Brasil
3.2 – A matriz religiosa brasileira
3.3 – Os comerciais. A publicidade utilizando o imaginário para criar vínculos com o
coração do consumidor.
Neste capítulo, veremos como a publicidade estabelece seus vínculos com o imaginário.
Em seguida, mostraremos como esses vínculos se estabelecem por meio do futebol e de
outros elementos culturais no Brasil. Nesta análise, pretendemos apontar como esses
vínculos estabelecidos com o imaginário social acabam por conduzir a uma relação
fortemente emocional entre o consumidor e a marca, estabelecendo o que chamamos de
vínculos no coração, tendo como principal referencial teórico os estudos de Kevin
Roberts.
Capítulo 4 – APROPRIAÇÃO CULTURAL
4.1 - O que é apropriação cultural?
4.2 - Onde está o ponto de inflexão nos comerciais abordados.
37
2. Capítulo Pré-redigido.
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religiões, conjunto de doutrinas essenciais ou dogmas não
explicitamente consignados nos escritos sagrados, mas que,
reconhecidos e aceitos por sua ortodoxia e autoridade, são, por vezes,
us. na interpretação dos mesmos. 6. aquilo que ocorre ao espírito
como resultado de experiências já vividas; recordação, memória, eco.
7. tudo o que se pratica por hábito ou costume adquirido; 7.1. uso,
costume. Ex.: a t. do feijão com arroz. (HOUAISS, on-line)
Quando entendemos que as tradições são legados culturais, referentes aos modos
de vida de um grupo, transmitidos de uma geração para outra e que carregam consigo
uma espécie de autoridade que as torna imutáveis e que, mais importante, são
referências sociais, regras implícitas, porém conhecidas e aceitas, fica mais interessante
observar os aspectos ideológicos que elas carregam.
O fato de carregar componentes ideológicos faz com que as tradições não sejam
isentas. Pelo contrário, elas existem para que se criem doutrinas sociais, a fim de que, ao
redor delas, as pessoas se agrupem em conformidade com o estabelecido
“tradicionalmente”.
Neste aspecto, torna-se importante observar que a maioria das tradições foi
simplesmente inventada para fortalecer alguma ideia (ou ideologia).
39
Hobsbawm, define a tradição inventada como:
[...] um conjunto de práticas normalmente reguladas por regras tácita
ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica,
visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da
repetição, o que implica, automaticamente; uma continuidade em
relação ao passado. Aliás, sempre que possível, tenta-se estabelecer
continuidade com um passado histórico apropriado (HOBSBAWM,
1984, p.10).
Raymond Williams coloca uma outra perspectiva e vai além. Para ele a tradição
é uma criação utilizada para defender o ponto de vista hegemônico. Ela está
intimamente ligada às instituições (sociais, políticas, econômicas, religiosas etc.) e à
manutenção das posições dentro da sociedade organizada. Portanto, trata-se de um
instrumento de dominação.
A tradição é na prática a expressão mais evidente das pressões e
limites dominantes e hegemônicos. É sempre mais do que um
segmento inerte historicizado; na verdade, é o meio prático de
incorporação mais poderoso. O que temos de ver não é apenas “uma
tradição”, mas a tradição seletiva: uma versão intencionalmente
seletiva de um passado modelador e de presente pré-modelado, que se
torna poderosamente operativa no processo de definição e
identificação social e cultural.
Habitualmente não é difícil mostrar isso de forma empírica. Pode-se
mostrar prontamente que a maioria das versões de “tradição” são
radicalmente seletivas. De toda uma possível área de passado e
presente, numa cultura particular, certos significados e práticas são
escolhidos para ênfase e certos outros significados e práticas são
postos de lado, ou negligenciados. Não obstante, dentro de uma
determinada hegemonia, e como um de seus processos decisivos, essa
seleção é apresentada e passa habitualmente como tradição, o passado
significativo. O que temos, então, a dizer sobre qualquer tradição é
que nesse sentido ela é um aspecto da organização social e cultural
contemporânea, no interesse do domínio de uma classe específica. É
uma versão do passado que se deve ligar ao presente e ratificá-lo. O
que ela oferece na prática é um senso de continuidade predisposta
(WILLIAMS, 1979, p. 118 e 119).
Segundo os autores citados, portanto, não é difícil perceber que as tradições são,
muitas vezes, criadas propositalmente.
Apesar disso, e do reconhecimento de que os estudos que se aprofundam na
ideologia presente nas tradições são fundamentais para abordagens sobre cultura, aqui
não trataremos destes aspectos.
Nossas atenções estarão centradas na forma como essas tradições, inventadas ou
não, passam a ser componente cultural ao serem apropriadas pelo imaginário.
Mas o que é, exatamente, o imaginário?
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A discussão sobre o imaginário e aquilo que ele representa na sociedade remete
à Grécia Antiga. Gilbert Durant nos apresenta a visão dos gregos, logo no primeiro
capítulo de sua obra “O imaginário: Ensaio acerca das ciências e da filosofia da
imagem”.
Sem dúvida que nossa herança ancestral mais antiga e incontestável é
o monoteísmo da Bíblia. A proibição de criar qualquer imagem
(eidôlon) como um substituto para o divino encontra-se impressa no
segundo mandamento da lei de Moisés (Êxodo, XX. 4-5). Outrossim,
como podemos constatar no Cristianismo ( João, V. 21; I. Coríntios,
VIII 1-13; Atos, XV. 29...) e no Islamismo (Corão, III. 43; VII. 133-
134; XX. 96 etc.), a influência do judaísmo nas religiões monoteístas e
que se originaram nele foi enorme. O método da verdade, oriundo do
socratismo e baseado numa lógica binária (com apenas dois valores:
um falso e um verdadeiro), uniu-se desde o início a esse iconoclasmo
religioso, tornando-se com a herança de Sócrates, primeiramente, e
Platão e Aristóteles em seguida, o único processo eficaz para a busca
da verdade. Durante muitos séculos e especialmente a partir de
Aristóteles (século 4 a.C.), a via de acesso à verdade foi a experiência
dos fatos e, mais ainda, das certezas da lógica para, finalmente, chegar
à verdade pelo raciocínio binário que denominamos de dialética e no
qual se desenrola o princípio da exclusão de um terceiro na íntegra
(Ou... ou, propondo apenas duas soluções: uma absolutamente
verdadeira e outra absolutamente falsa, que excluem a possibilidade
de toda e qualquer terceira solução).
Lógico que, se um dado da percepção ou a conclusão de um raciocínio
considerar apenas as propostas verdadeiras, a imagem, que não pode
ser reduzida a um argumento verdadeiro ou falso formal, passa a ser
desvalorizada, incerta e ambígua, tornando-se impossível extrair pela
sua percepção (sua visão) uma única proposta verdadeira ou falsa
formal.”
O filósofo Cornelius Castoriadis (1986), diz que o imaginário é a
capacidade de “produzir uma imagem que não é e nunca foi dada na
percepção”. Em outras palavras, ele é construído pela interpretação e
pela representação que fazemos daquilo que nos cerca (DURAND,
1999, p. 9).
41
imaginário, e contra o qual nenhuma objetividade alienante pode por
fim prevalecer (DURAND, 1997, p. 433)
Em outras palavras, ele aponta que o imaginário acaba por prevalecer à lógica,
uma vez que é no interior do indivíduo que se processa o entendimento das coisas e,
nesse interior/consciência, a base da compreensão é formada por uma visão particular
estabelecida no imaginário.
Quando falamos que o imaginário ao mesmo tempo cria e se apropria da
tradição, queremos dizer que ele interage com o tradicionalmente estabelecido para
formar imagens que passam a ser a representação, para aquele que imagina, da
realidade.
Utilizamos aqui o exemplo de Hobsbawn (1984), quando o imaginário busca a
representação de um juiz, provavelmente, ele projetará a imagem de um homem de
toga e peruca, com um martelo na mão. É assim porque a tradição estabeleceu esse
ritual para o personagem, mas também porque o imaginário se apropriou disto.
Outro exemplo é a imagem que temos do Natal. Essa imagem nos remete a um
cenário imaginado apoiado em uma tradição do hemisfério norte que, num país tropical,
faz com que enfeitemos as árvores de Natal com simulações de neve, com que o nosso
Papai Noel calce botas pesadas e roupas compridas, com que nossa mesa seja abastecida
de alimentos ricos em gordura (como se precisássemos de energia extra para suportar o
frio) etc., mesmo estando em pleno verão.
Por que isso acontece? Porque a tradição consolidou uma representação no nosso
imaginário. Para nós, se não fosse assim, o Natal não teria “cara de Natal”.
Portanto, a aceitação da tradição se dá no social através de elementos concebidos
no imaginário. Da mesma forma, pode-se supor que a tradição, assim, depende do
imaginário para ser transportada para a vida social e que a própria assimilação da
tradição pela sociedade faz com que o imaginário seja alimentado. Cria-se, pois , um
círculo em que a tradição tende a se fortalecer constantemente.
A partir disso é possível começar a entender como se forma o imaginário social.
Ele é formado pela reprodução de tradições, pela repetição e assimilação dos costumes e
da vida cotidiana, mas também, pela representação imagética que se faz da vida.
O imaginário social é composto por um conjunto de relações
imagéticas que atuam como memória afetivo-social de uma cultura,
um substrato ideológico mantido pela comunidade. Trata-se de uma
produção coletiva, já que é o depositário da memória que a família e
os grupos recolhem de seus contatos com o cotidiano. Nessa
dimensão, identificamos as diferentes percepções dos atores em
42
relação a si mesmos e de uns em relação aos outros, ou seja, como eles
se visualizam como partes de uma coletividade. (MORAES, 1994,
p.1)
Essa definição aponta para um ser humano dono de si, cuja consciência e razão
dependiam apenas da sua essência, que já nascia com ele. Desconsiderava, portanto,
qualquer fenômeno exterior para a formação da sua identidade . Já o sujeito sociológico
admitia a influência da sociedade na formação da sua identidade. Assumia que as
transformações do mundo geravam transformações no indivíduo e a que as identidades
eram formadas pelas relações entre o sujeito e o meio externo. Essas relações entre o
sujeito e o mundo, tenderiam a gerar uma estabilidade do indivíduo e da sociedade.
A noção de sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do
mundo moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito
não era autônomo e autossuficiente, mas era formado na relação com
outras pessoas importantes para ele, que mediavam para o sujeito os
valores, sentidos e símbolos — a cultura — dos mundos que ele/ela
habitava. [...] O sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior que é
o eu real, mas este é formado e modificado num diálogo contínuo com
os mundos culturais exteriores e as identidades que esses mundos
oferecem.
A identidade, nessa concepção sociológica, preenche o espaço entre o
interior e o exterior— entre o mundo pessoal e o mundo público. O
fato de que projetamos a nós próprios nessas identidades culturais, ao
mesmo tempo que internalizamos seus significados e valores,
tornando- os parte de nós, contribui para alinhar nossos sentimentos
subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo social e
cultural. A identidade, então, costura (ou, para usar uma metáfora
médica, sutura) o sujeito à estrutura. Estabiliza tanto os sujeitos
quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando ambos
reciprocamente mais unificados e predizíveis. (HALL, 1992, p.11)
44
Ao analisarmos o indivíduo que Hall chama de sujeito sociológico, alguns
pontos tornam-se mais interessantes para aquilo que desenvolveremos a seguir neste
estudo. Embora a descrição acima seja contínua, faremos uma divisão deste texto em
duas partes, com a intenção de tornar a análise mais detalhada.
a) O sujeito formado nas relações com o mundo exterior
A noção de sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do
mundo moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito
não era autônomo e autossuficiente, mas era formado na relação com
outras pessoas importantes para ele, que mediavam para o sujeito os
valores, sentidos e símbolos — a cultura — dos mundos que ele/ela
habitava”. (HALL, 1992, p.11)
45
Compreender que a cultura se encontra, não apenas no erudito e composto pelo
estudo, mas também no modo de vida de um grupo, permite que o entendimento de
identidade cultural abarque exatamente aquilo que, aqui faz a diferença, a formação dos
valores e entendimentos que conduzem ao pertencimento.
Assim, o ser humano projeta aquilo que ele entende como si mesmo e, também,
aquilo que ele entende como seu grupo, em uma imagem cultural que o representa. Isso
fortalece uma coleção de símbolos e imagens em que ele vai encontrar o seu reflexo
imaginado.
A partir deste reconhecimento, ele alimenta e fortalece essa identidade que, por
sua vez, lhe devolve a sensação de pertencimento, reforçando o ciclo em que ele se
sente completo como indivíduo e membro de um grupo que ele é capaz de compreender
e definir. Nas palavras de BACKZO (1985) “nenhuma relação social e, por maioria de
razão, nenhuma instituição política, são possíveis sem que o homem prolongue a sua
existência através das imagens que tem de si próprio e de outrem.”
Esse entendimento de cultura, desse modo, pode funcionar como aquilo que
sedimenta a sociedade e conecta as pessoas, dando sentido à identidade.
Hall aponta também que o sujeito sociológico é um sujeito mediado socialmente,
enfatizando que isso é feito por “pessoas importantes para ele”.
No mundo atual, a dimensão do que seriam essas “pessoas importantes para ele”
pode ser extremamente ampla, superando até a limitação da influência de “pessoas”
propriamente ditas.
Para melhor exemplificar: quando a rede de supermercados Carrefour usa a
apresentadora Ana Maria Braga como garota-propaganda, não é complicado entender
que ela é uma “pessoa” que atua como mediadora cultural ao influenciar o consumidor a
“se aproximar” da rede varejista. Isso acontece porque a opinião dela é “importante”
para milhões de consumidores. Ela funciona como uma avalista moral do Carrefour.
Neste caso, temos uma pessoa atuando como mediadora, mas também a força de um
veículo de massa (a televisão) que ajuda a transportar essa credibilidade até o sujeito
(consumidor).
A própria TV é uma mediadora atuando ao lado da “pessoa” Ana Maria Braga
que, em última instância, só é importante para o sujeito porque, ela também, entra na
casa dele através da transmissão da televisão. A credibilidade (e, portanto, a mediação)
está tão apoiada na pessoa quanto no veículo. Analisemos a questão sob três ângulos: a
TV como mediadora, a celebridade como mediadora e a pessoa importante (para o
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sujeito) como mediadora. Como parte dos Estudos Culturais latino-americanos,
Guillermo Orozco Goméz abordou a atuação da TV de maneira interessante em O
telespectador frente à televisão. Uma exploração do processo de recepção televisiva
(2005). Neste artigo, ele aponta as diversas influências da televisão atuando como
mediadora cultural.
A linguagem televisiva, audiovisual em sua essência, tem a
característica de ser fundamentalmente denotativa. Seu alto grau de
denotação (vs. conotação) permite que o código utilizado na sua
estruturação dificilmente seja percebido pelo telespectador. [...] A
denotação permite que a linguagem televisiva possua, por sua vez, um
alto grau de veracidade. A TV, portanto, não tem somente a
capacidade técnica de representar o acontecer social, mas também de
fazê-lo verossímil, verdadeiro para os telespectadores. E é
precisamente essa combinação de possibilidades técnicas do meio
televisivo que permite naturalizar seu discurso “ante os próprios
olhos” do público telespectador (OROZCO-GOMÉZ, 2005, p.29)
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Carrefour). Assim, na percepção dessa consumidora, Ana Maria Braga não é uma
celebridade, mas alguém extremamente próxima, uma amiga.
Isso permite que o endosso da garota-propaganda, soe como uma recomendação
de alguém próximo, em quem se pode confiar. “Muita gente, de pequenas cidades,
sente-se mais próxima hoje do apresentador de televisão do que do seu vizinho, pois
existe outro modo de estar com o apresentador, que não é pela presença física.”
(BARBERO, 2000).
Portanto, além das pessoas do convívio do sujeito (amigos, familiares, colegas de
trabalho, influenciadores em geral), no desenvolvimento deste estudo será importante
reconhecer a existência de uma mediação apoiada na relação do sujeito com pessoas que
são importantes para ele mesmo sem que se façam presentes fisicamente em sua vida.
b) O sujeito que precisa se costurar ao grupo.
O fato de que projetamos a nós próprios nessas identidades culturais,
ao mesmo tempo que internalizamos seus significados e valores,
tornando- os parte de nós, contribui para alinhar nossos sentimentos
subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo social e
cultural. A identidade, então, costura (ou, para usar uma metáfora
médica, sutura) o sujeito à estrutura. Estabiliza tanto os sujeitos
quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando ambos
reciprocamente mais unificados e predizíveis. (HALL, 1992, p.12)
48
Ora, ao produzir um sistema de representações que simultaneamente
traduz e legítima a sua ordem, qualquer sociedade instala também
“guardiões” do sistema que dispõem de uma certa técnica de manejo
das representações e símbolos. [...] Do mesmo modo, os guardiões do
imaginário social são, simultaneamente, guardiões do sagrado. A
margem de liberdade e inovação na produção de todas as
representações coletivas, em especial na dos imaginários sociais, é
particularmente restrita (BACKZO, 1985, p. 299-300).
Na visão de Stuart Hall, o ser humano pós-moderno não muda para acompanhar
ou se adaptar às mudanças do mundo, mas ele próprio é um ser mutante e fragmentado,
fruto da mediação de diversas culturas com as quais ele convive e interage.
Assim, diversos outros elementos aparecerão na formação da sociedade em que
esse sujeito está vivendo, mas a qual ele também está construindo.
50
industrialização e um dispositivo da modernidade (HALL, 1992,
p.49).
51