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N0 37 - Jul/2012 - R$10
PA R A
Jonathan
Edwards
Avivamento, Missões, Devoção, Filosofia, Teologia
Uma voz que ainda fala para nossas vidas!
Prezado leitor,
James Richard
5. O Desconhecido Jonathan Edwards
Solano Portela ............................... 37
Denham III
6. Pensamentos de Jonathan Edwards
PRESIDENTE EMÉRITO sobre Deus
James Richard Don Kistler .................................... 43
Denham Jr.
7. O ambiente teológico arminiano nos
REALIZAÇÃO
dias de Edwards
Heber Carlos Campos ...................... 51
Editora Fiel
Julho de 2012 | no 37 Epílogo: À Jonathan Edwards ............ 61
Resvi nunc fazer qualquer coisa da qual
u tivee med, caso steja vivend a ltima
hora da inha vida”.
Jonathan Edwards
F
alar sobre a importância de se Quando olhamos a história passada,
estudar biografias é quase o todavia, a aparente vantagem da per-
mesmo que falar sobre o valor spectiva pode, facilmente, fazer com
da história. Segundo o historiador que nos encantemos com os seus as-
cristão Justo González, a história é pectos mais triunfantes, mais glam-
uma forma de nos compreendermos orosos sem, contudo, percebermos
a nós mesmos; uma necessidade de que o legado que recebemos de nos-
se entender o tempo presente através sos pais na fé foi conquistado, muitas
do tempo passado para que, assim, vezes, à custa de intenso sofrimento,
determinemos nosso caminho futuro. lutas, e até da própria vida. A cada
A história do povo de Deus é uma es- página da história do povo de Deus,
pécie de biografia dinâmica, que ai- vemos o estandarte da fé marcado
nda está sendo escrita e caminhando com os sonhos, ideais, realizações,
para sua conclusão. Quando olhamos conquistas e com o sangue daqueles
os capítulos anteriores desta história que palmilharam o velho, estreito e
longa, bela e cheia de perigos, encon- batido caminho da cruz.
tramos personagens fascinantes, ho- Aqui folheamos o livro da história
mens e mulheres usados grandemente que ainda está sendo escrito e paramos
por Deus na edificação de sua igreja. nos Estados Unidos colonial do século
E quando estudamos a vida desses XVIII, no capítulo que conta a história
cristãos notáveis, aprendemos com de um dos mais eminentes cristãos que
seus erros e acertos, derrotas e triun- já entrou para a galeria dos heróis da
fos e, sobretudo, com sua fé, esperança fé: Jonathan Edwards.
e amor – marcas que, desde o apóstolo Edwards foi um farol cujo brilho
Paulo, caracterizaram a trajetória guia, até os dias de hoje, a igreja de Je-
deste povo cujo Senhor chamou de sus Cristo. Deus o utilizou como um
noiva, de igreja. E a história do povo instrumento para feitos extraordinári-
de Deus é iluminada pela Escritura e os. Ele foi um homem de aguda in-
escrita pelo Autor que, por sua mis- teligência, disciplina rigorosa, humil-
teriosa providência a determina e a dade intencional, fé resoluta, piedade
encaminha para um glorioso final. deliberada e profunda, mas, se há algo
que possa sumariar a intensa vida deste da inauguração do Jonathan Edwards
gigante, é o seu profundo anelo pela Center, que foi estabelecido em São
glória de Deus. Sendo um pecador re- Paulo, em parceria com o Centro de
dimido pela graça de Deus, Edwards Pós Graduação Andrew Jumper, da
foi alguém que se viu muito consciente Universidade Presbiteriana Macken-
de seus limites, suas lutas e pecados – zie e a Universidade de Yale, e que é
ele as relatou de forma direta e indi- coordenado pelo Dr. Heber Carlos de
reta em suas famosas Resoluções, que Campos. Queremos oferecer ao leitor
começou a escrever quando contava um pequeno vislumbre da história,
apenas 18 anos de idade. Em um jornal vida, escritos e ministério do notável
local, à época da morte de Edwards, foi Jonathan Edwards. Os artigos aqui
registrado o epitáfio que o descreveu são demonstrativos e representam
como “um grande mestre da divindade. alguns aspectos importantes da tra-
A divindade era seu estudo favorito e jetória de Edwards. Queremos incen-
o ministério, seu maior deleite”. Como tivar o leitor a aprofundar sua pesqui-
bem apontou James Boice, “Edwards sa sobre este personagem e sua vasta
defendeu cuidadosa e logicamente de produção teológica e a construir, a
que o propósito supremo de Deus é partir do legado deixado por Edwards,
glorificar a si mesmo em tudo o que um entendimento sólido, maduro e
faz”. O próprio Edwards faz esta afir- atual da teologia, que aponte para o
mação em uma de suas obras, quando povo de Deus de nossos dias o mesmo
diz que o fim para o qual Deus fez to- bom, velho e batido caminho da cruz
das as coisas é a sua própria glória. Ele de Cristo.
afirma que “tudo que é dito nas Es-
crituras como o propósito final de to-
das as obras de Deus pode ser resumi-
do na seguinte frase: a glória de Deus”.
Esta é, afinal, a pedra de toque de tudo
Tiago José dos Santos Filho: Bacharel em
quanto Edwards empreendeu em sua Direito, é o Editor-Chefe da Editora Fiel,
vida: fazer tudo para a glória de Deus. autor, professor e Deão do Seminário Martin
Bucer em São José dos Campos, SP. É fellow
Preparamos esta edição especial
do Jonathan Edwards Center no Brasil.
da Revista Fé para Hoje na esteira
4 | Revista f é pa r a h o j e
Pastorado,
Jonathan Edwards
Erudição e Avivamento em
Franklin Ferreira
|
Revista fé par a h oje 5
N
o começo do século dezoito, le tempo, comecei a ter um novo tipo
era visível nas treze colônias de compreensão e ideias a respeito de
– que em breve seriam conhe- Cristo, e da obra da redenção e do glo-
cidas como Estados Unidos – o declínio rioso caminho da salvação através dele.
da fé evangélica, provocado pela influ- Eu tinha um doce senso interior destas
ência do processo colonizador, com seu coisas, que às vezes vinham ao meu co-
subseqüente aumento populacional, su- ração; e a minha alma era conduzida em
cessão de guerras brutais e declínio da agradáveis vistas e contemplações delas.
espiritualidade dos ministros. Em 1726, E a minha mente estava grandemente
um avivamento começou a irromper engajada em gastar meu tempo em ler e
nas congregações reformadas holande- meditar sobre Cristo; e a beleza e a ex-
sas em New Jersey, com as pregações de celência de Sua pessoa, e o amável cami-
Theodore Frelinghuysen. Pouco depois, nho da salvação, pela livre graça nEle...
este avivamento alcançou os presbite- Este senso que eu tinha das coisas divi-
rianos escoceses, por meio das prega- nas frequentemente e repentinamente
ções de William Tennant, Gilbert Ten- se inflamava, como uma doce chama em
nant e Samuel Davies. meu coração; um ardor da alma, que eu
não sei expressar”.
A vinda do avivamento Após servir numa pequena igreja
presbiteriana em New York, voltou a
Jonathan Edwards nasceu em 1703, Yale como tutor. E, em 1727, foi orde-
único filho homem de Timothy Edwar- nado ao pastorado, servindo como au-
ds, que era pastor congregacional em xiliar na congregação pastoreada por seu
East Windsor, Connecticut. Pouco an- avô, Solomon Stoddart, no ministério
tes de completar 13 anos entrou no Yale de uma igreja congregacional em Nor-
College, em New Haven, Connecticut. thampton, Massachusetts. Ele diz de sua
Em 1720, recebeu o grau de bacharel, e consagração: “Dediquei-me solenemen-
aos 20 anos recebeu o grau de mestre em te a Deus e o fiz por escrito, entregando
Artes. Em abril ou maio de 1721 expe- a mim mesmo e tudo que me pertencia
rimentou a conversão: “A partir daque- ao Senhor, para não ser mais meu em
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qualquer sentido, para não me compor- cheia de amor, cheia de alegria, e cheia de
tar como quem tivesse direitos de forma temor. Havia sinais notáveis da presença
alguma... travando, assim, uma batalha de Deus em quase cada casa”. Edwar-
com o mundo, a carne e Satanás até o fim ds reconheceu que “mais de 300 almas
da vida”. Ele se casou aos 24 anos, em foram salvas, trazidas para Cristo” em
1728, com Sarah Pierrepont, filha de um Northampton. Nesta época sua cidade
pastor. Ela era uma mulher de rara inte- tinha cerca de dois mil habitantes. “Não
lectualidade, porém, como seu marido, havia sequer uma pessoa na cidade, velha
totalmente devota à gloria de Deus, e a ou jovem que não estivesse interessada
uma experiência de oração que a levava nas grandiosas coisas do mundo eterno
algumas vezes a quase falência física. (...). O trabalho de conversão era levado
Sempre acompanhava seu marido nos adiante da maneira mais surpreendente;
momentos de oração. Em seu momento as almas vinham, multidões delas, a Jesus
devocional diário, ele ia de cavalo para Cristo”. Nessa época ele escreveu uma
um bosque, e caminhava sozinho, me- obra intitulada Uma fiel narrativa da
ditando. Ele anotava suas ideias em pe- surpreendente obra de Deus, onde detalha
daços de papel e, para não perdê-los, os como a conversão cristã ocorre.
pendurava em seu casaco. Ao voltar para
casa, era recebido por sua esposa, Sarah, Refletindo sobre o
que o ajudava a tirar suas notas. Eles ti- avivamento
veram onze filhos, todos cristãos, e sua
vida familiar feliz foi um modelo para to- Ao considerarmos seus escritos, te-
dos os que o visitaram. Após a morte do mos um vislumbre de seus interesses e
avô, cujo pastorado durou sessenta anos, aptidões. Ele escreveu cerca de mil ser-
ele assumiu a igreja, em 1729. mões, e seu alvo era levar os homens a
No período de 1734-1737, durante entenderem, sentirem e responderem
uma série de pregações sobre a justifica- à verdade do evangelho. Seus sermões
ção pela graça por meio da fé, começou eram esboçados segundo o método pu-
um avivamento em sua congregação, que ritano, que incluía a exposição do texto
rapidamente se espalhou por Connecti- bíblico escolhido, apresentação da dou-
cut e New Jersey. Seus ouvintes sentiram trina (que era apoiada por outros textos
as grandes verdades das Escrituras de bíblicos) e aplicação às questões do dia-
que toda boca ficará fechada no dia do -a-dia. Ele colocava sua erudição a servi-
juízo e que “não há coisa alguma que, por ço de uma clareza deliberadamente sim-
um momento, evite que o pecador caia ples. Pecadores nas mãos de um Deus irado,
no inferno, senão o bel prazer de Deus”. pregado em Einfield, Connecticut, em
Em suas palavras, “o Espírito de Deus 1741, baseado em Deuteronômio 32.35,
começou a trabalhar de maneira extra- é seu sermão mais famoso. Antes desse
ordinária. Muita gente estava correndo sermão, por três dias não se alimentara
para receber Jesus. Esta cidade estava nem dormira; rogara a Deus sem cessar:
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ele demonstra os sinais bíblicos de uma zavam a obra de Cristo em favor deles;
obra do Espírito Santo. São elas: “Amor a conversão importava numa mudança
por Jesus, Filho de Deus e Salvador dos radical do coração; o cristianismo ver-
homens”, “agir contra os interesses do dadeiro envolvia não somente compre-
reino de Satanás, que busca encorajar e ender algo de Deus e dos fatos das Es-
firmar o pecado e fomentar as paixões crituras, como também um novo ‘senso’
mundanas nos homens”, “profunda con- da beleza, santidade e verdade divinas.
sideração pelas Sagradas Escrituras”, (...) Na mente de Edwards, as implica-
revelação dos “caráteres opostos do Es- ções para a conversão, que este concei-
pírito de Deus e dos outros espíritos que to da natureza humana subentendia,
falsificam suas obras” e “se o espírito que ocupavam o lugar principal. Dizia que
está em ação em meio a um povo opera um pecador, por natureza, nunca esco-
como espírito de amor a Deus e ao ho- lheria glorificar a Deus, a não ser que
mem, temos aí um sinal seguro de que o próprio Deus mudasse o caráter da-
este é o Espírito de Deus”. quela pessoa ou – segundo a expressão
Seu interesse por temas teológicos do próprio Edwards – implantasse um
se evidencia pela amplidão das suas novo ‘senso do coração’ para amar e ser-
obras, abordando quase todos os temas vir a Deus. A regeneração, ato de Deus,
doutrinários, legando à cristandade era a base para o arrependimento e a
um imenso acervo de livros. Às vezes conversão, que eram ações humanas”.
ele tem sido considerado um teólogo- Ele cria que o Deus onipotente exigia
-filósofo, por causa de alguns de seus arrependimento e fé das suas criaturas,
escritos, mas jamais deixou que a filoso- então ele proclamava tanto a absoluta
fia lhe ensinasse a sua fé ou que o des- soberania de Deus quanto a responsa-
viasse da Palavra de Deus. Ele extraía bilidade dos homens em responder ao
das Escrituras as suas convicções, e a chamado evangelístico.
verdadeira estatura dele deve ser aqui- Ele também escreveu um livro clás-
latada como um teólogo bíblico. Como sico de psicologia da religião, o Tratado
disse J. I. Packer: “Por toda a sua vida, das Afeições Religiosas, de 1746, baseado
alimentou sua alma com a Bíblia; por em uma série de sermões em 1Pedro 1.8.
toda a sua vida, alimentou seu rebanho Apesar de ter sido educado para ser lógico
com a Bíblia”. Edwards é mais frequen- e racional, ele argumentava que a religião
temente estudado por causa da sua des- verdadeira reside no coração, no centro
crição agostiniana do pecado humano e das afeições, emoções e inclinações. Ele
da total suficiência da graça de Deus em detalhava de forma minuciosa os tipos de
Cristo por meio do Espírito. Mark Noll emoções religiosas que, em grande medi-
diz: “[Para Edwards,] a raiz da pecami- da, são irrelevantes à espiritualidade ver-
nosidade humana era o antagonismo dadeira, terminando com uma descrição
contra Deus; Deus era justificado ao de doze marcas que indicam a presença
condenar os pecadores que menospre- da verdadeira espiritualidade cristã. Estas
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que incluíam William Carey e Andrew acontecer com vocês em suas igrejas”.
Fuller, foi tal que este escreveu: “Alguns Então, ele foi ser missionário aos índios
dizem que, ‘se Sutcliff e alguns outros ti- Mohawk e Housatonic, num posto na
vessem pregado mais de Cristo, e menos fronteira, em Stockbridge, Massachu-
de Jonathan Edwards, eles teriam sido setts. Foi lá que ele escreveu alguns de
mais úteis’”, replicando em seguida: “Se seus tratados teológicos mais importan-
aqueles que falam tes, tais como A li-
assim, pregassem berdade da vontade,
Cristo metade do a religião verdadeira O pecado original,
que Edwards fazia, O fim da criação e A
reside no coração, no centro das
e fossem metade verdadeira virtude.
tão úteis como ele afeições, emoções e inclinações” Em 1757 aceitou
foi, sua utilidade a presidência do
seria o dobro do College of New
que ela é”. Por causa da profunda impres- Jersey, que atualmente é a Universidade
são do livro de Edwards, estes homens de Princeton, em New Jersey, e, em 1758,
fundaram a Sociedade Batista Particular ao receber uma vacina contra varíola, que
para Propagação do Evangelho entre os estava sendo testada, ele morreu. Sua úl-
Pagãos (que veio se tornar a Baptist Mis- tima obra, inacabada, foi Uma história da
sionary Society), em 1792, sendo Fuller obra da redenção, uma obra ambiciosa,
seu primeiro secretário. onde ele argumenta que toda a história,
desde a criação até a consumação, é sub-
Uma rica herança serviente à obra de redenção de Cristo.
Edwards e Sarah eram profundamente
Era costume de sua igreja conceder o dedicados um ao outro, e entre suas últi-
privilégio a qualquer pessoa, mesmo sem mas palavras, estavam algumas para sua
ser membro da igreja, para participar da esposa, que ainda estava em Stockbrid-
Ceia do Senhor. Por requerer uma base ge. Ele disse: “Dê o meu mais bondoso
estrita para participar da Ceia foi demi- amor para minha esposa, e diga a ela, que
tido de sua igreja em 1750. Como Lloyd- a excepcional união, que tem subsistido
-Jones disse: “Essa foi uma das coisas entre nós por tanto tempo, tem sido de
mais espantosas que já aconteceu, e deve tal natureza, que eu creio ser espiritual, e,
servir como uma palavra de encoraja- portanto, continuará para sempre”. Pou-
mento para os ministros e pregadores. co antes de falecer, ele disse: “Confiai em
Lá estava esse altaneiro gênio, esse pode- Deus, e não precisareis temer”.
roso pregador, esse homem que estava no Há pelo menos duas aplicações que
centro do grande avivamento – e, toda- podemos destacar. Uma diz respeito à
via, foi derrotado na votação da sua igreja necessidade de avivamento, em nossa
por 230 votos a 23. Não se surpreendam, época. Nós devemos temer e combater os
portanto, irmãos, quanto ao que possa excessos que ocorrem nestes avivamentos
ravilhas. Seu nome é excelente em toda a George M. Mardsen, “Edwards e a revolução cientí-
fico-tecnológica” em Jornal Os Puritanos Ano 1, nº 3
terra, e sua glória está acima dos céus. En- (Agosto 1992), p. 17-18.
tre todos os deuses não há nenhum como Mark A. Noll, “Edwards, Jonathan” em Walter A.
Elwell (ed.), Enciclopédia histórico-teológica da igreja
Ele... Deus é a fonte de todo o bem e uma cristã [vol. 2]. São Paulo: Nova Vida, 2009, p. 7-11.
fonte inextinguível; ele é um Deus todo J. I. Packer, Entre os gigantes de Deus; uma visão puritana
suficiente, capaz de proteger e defen- da vida cristã. São José dos Campos: Fiel, 1996.
Joel R. Beeke & Randall J. Pederson, Paixão pela pure-
der... e fazer todas as coisas... Ele é o Rei za; conheça os puritanos. São Paulo: PES, 2010.
da glória, o Senhor poderoso na batalha: John Piper, Supremacia de Deus na pregação; teologia,
uma rocha forte, e uma torre alta. Não há estratégia e espiritualidade do ministério de púlpito. São
Paulo: Shedd, 2003.
nenhum como o Deus ... que cavalga no
céu...: o eterno Deus é um refúgio, e sob
Ele estão braços eternos. Ele é um Deus Franklin Ferreira: É mestre em teologia, pastor
que tem todas as coisas em suas mãos, e batista, autor, preletor, diretor do Seminário
faz tudo aquilo que Lhe agrada: ele mata e Martin Bucer, em São José dos Campos, SP. É
fellow do Jonathan Edwards Center no Brasil.
faz viver; ele leva ao túmulo e ergue de lá;
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AV I VA M EN TO
Jonathan
as perspectivas de
Edwards
arles
e
Finney
Gilson Santos
E
m muitos círculos evangéli- endossavam entendiam claramente que
cos atuais, quando se fala em a doutrina era amplamente encontrada
“avivamento”, pensa-se em nas Escrituras e na história da Igreja.
uma grande campanha evangelística, Por “avivamento” pensava-se num “der-
com várias reuniões especiais, com um ramar incomum do Espírito Santo”.
convidado especial e com uma música
especial. Este é o sentido que se asso- Jonathan Edwards e a
ciou a este vocábulo no século XIX. As soberania de Deus no
grandes campanhas evangelísticas de avivamento
Charles G. Finney (1792-1875), Dwi-
ght L. Moody (1837-1899) e Reuben Jonathan Edwards (1703-1758)
A. Torrey (1856-1928), bem como as foi um dos grandes líderes do aviva-
de outros evangelistas do gênero, exer- mento do século XVIII, que tem sido
ceram papel decisivo na sedimentação chamado pelos norte-americanos de
deste modo de pensar. Para outros, “Grande Despertamento”. Um estudo
“avivamento” seria um “borbulhar de sério acerca deste assunto terá de le-
entusiasmo na igreja”, um excitamen- var em conta o que ele fez e escreveu.
to, um cantar empolgante, um louvor D. Martyn Lloyd-Jones (1899-1981)
diferente e, até mesmo, um tipo de e J. I. Packer, ao escreverem sobre
histeria emocional seguida de sinais Edwards, entendem que é na ques-
incomuns. No século XX, a idéia de tão do avivamento que ele é preemi-
“sinais e maravilhas” passou a integrar nentemente o mestre. Avivamento é
substancialmente o cerne do conceito um derramamento do Espírito, e “se
de avivamento. vocês quiserem saber algo sobre o avi-
A palavra “avivamento” (ou reavi- vamento verdadeiro, Edwards é o ho-
vamento, do inglês revival) surge des- mem que se deve consultar”, arremata
de o século XVII e afirma-se no século Lloyd-Jones.1
XVIII, quando se começava a falar so- Em sua clássica obra A Treatise
bre o reavivamento da religião. Embo- Concerning Religious Affections (Tra-
ra o vocábulo fosse novo, aqueles que o tado sobre Afeições Religiosas), Edwards
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nos fala sobre a atuação do Espírito extremos, a um tempo similares e
Santo, dando grande atenção à expe- opostos, Edwards confrontou-se
riência pessoal.2 O anseio de Edwards com uma série de questões funda-
em diferenciar a experiência religio- mentais.3
sa verdadeira da falsa resultou de sua
preocupação pastoral no contexto do Nos seus escritos, Edwards ava-
avivamento. Ele pregou uma série de liou a experiência religiosa à luz das
sermões sobre 1 Pedro 1.8 tratando Escrituras e das suas convicções re-
do assunto, em 1742-1743. O Trata- formadas. O ponto de partida da sua
do resultou da revisão do texto desses pregação e da sua teologia foi o Deus
sermões para publicação em 1746. soberano, em sua majestade, graça e
Nesta obra, Edwards argumentou que glória. Edwards incluía uma ênfase na
o cristianismo verdadeiro não se evi- obra soberana e graciosa de Deus, ao
dencia pela quantidade ou intensidade tratar do avivamento. Segundo ele, o
das emoções religiosas, mas por um co- avivamento é uma visitação divina. É
ração transformado que ama a Deus e Deus vindo e agindo de maneira pode-
busca o seu prazer. Ele faz uma análise rosamente incomum entre o seu povo.
rigorosa das diferenças entre a religio- Utilizando a analogia do mar, o aviva-
sidade carnal e a verdadeira espiritua- mento seria como as ondas do mar, que
lidade, que toca o coração com a visão vêm e quebram sobre a praia, e nós po-
da excelência de Deus e liberta o ho- demos visualizar a história constatan-
mem do egocentrismo. Edwards lutou do essas ondas vindo e quebrando. De
em duas frentes: contra os adversários fato, a história dos avivamentos seria a
do avivamento e contra os extremistas; história do povo de Deus.
contra o perigo de extinguir o Espíri-
to e contra o perigo de deixar-se levar Num avivamento, ou experiência
pela carne e ser iludido por Satanás. religiosa genuína, o critério prin-
cipal é este: se quem está no cen-
Por um lado, tinha que argumen- tro das atenções é Deus ou o ser
tar contra aqueles que descarta- humano. Para que Deus esteja no
vam todo o avivamento como his- centro é necessário, em primeiro
teria irracional; por outro, tinha lugar, que haja nos corações um
que argumentar contra aqueles profundo senso de incapacidade,
que pareciam pensar que tudo o de dependência de Deus, e de con-
que aconteceu no avivamento era vicção da nossa pecaminosidade.
“de Deus”, não importa quão es- Além disso, é preciso que haja a
tranho, extremista ou desequili- consciência de que toda genuína
brado isso fosse (...). experiência religiosa é fruto da
Em sua tentativa de traçar um ca- atuação do Espírito de Deus, que
minho intermediário entre esses transforma e santifica os pecado-
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uma intensificação do mesmo quando haja um avivamento, e ele não segue um
em tempos normais. Não é diferente modelo previamente fixado por qual-
em essência; a diferença é de grau e não quer homem. Nós estamos amarrados à
de tipo. O Catecismo Maior de West- misericórdia de Deus. “Pois assim como
minster, na resposta à pergunta de nú- o Pai ressuscita e vivifica os mortos, as-
mero 182, diz que o Espírito Santo nos sim também o Filho vivifica aqueles a
ajuda “operando em nossos corações, quem quer” ( Jo 5.21). Isto não deveria
e despertando (embora não em todas as causar-nos desespero, mas fome, um
pessoas, nem em todos os tempos, na mes- apetite pela visitação de Deus. Deveria
ma medida) aquelas apreensões, afetos nos levar à humilhação. Na compreen-
e graças que são necessários...”.7 Al- são de Edwards, avivamento é algo que
guém recorreu à analogia entre uma acontece, não é algo que se promove.
“chuva normal” e uma “chuva for- O homem não é o agente; ele é objeto
te”. Num contexto de avivamento, os
crentes são mais zelosos, pecadores
são atraídos, e mesmo os incrédulos
que não se convertem, se vêem con-
O avivamento é
vencidos da verdade. J. I. Packer diz
que a “Escritura aponta para um pro-
uma intensificação
cesso repetido muitas vezes, mediante do cristianismo”
o qual, seguindo-se à frieza, descuido
e infidelidade existentes dentre o povo
de Deus, o próprio Deus age soberana- dessa obra do Espírito. Deus é absolu-
mente para restaurar o que estava pres- tamente soberano em cada dádiva que
tes a perecer”. E acrescenta: “E através concede. Isto é tão verdadeiro acerca do
do transbordamento evangelístico avivamento como é de qualquer grande
consequente, [Deus] torna a estender obra redentora. J. I. Packer colocou isto
ainda mais o reino de Cristo”.8 nas seguintes palavras:
Uma observação importante, que
deve novamente ser enfatizada, é que O avivamento é Deus demons-
o avivamento vem exclusivamente de trando a soberania de sua graça.
Deus. “Porventura, não tornarás a Avivamento é inteiramente obra
vivificar-nos, para que em ti se regozi- da graça, pois sobrevém a igrejas e
je o teu povo?” (Sl 85.6). O desejo do cristãos que merecem apenas jul-
salmista está voltado para Deus, pois o gamento; e Deus o faz acontecer
homem não pode operar esta façanha. É de maneira a mostrar que sua graça
Deus quem pode vivificar. O avivamen- foi decisiva nele. Os homens po-
to é uma obra soberana de Deus, pois dem organizar convenções e cam-
“o vento sopra onde quer” ( Jo 3.8). Nós panhas e buscar a bênção de Deus
não podemos dar uma ordem para que sobre elas, mas o único organizador
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Ez 37.9). O Salmo 119 descreve a Pa- nismo representado por este foi repu-
lavra de Deus como o meio para o re- diado e relegado à condição de fantasma
avivamento do povo de Deus: “Estou por aquele”.15 Finney argumentou que
aflitíssimo; vivifica-me, SENHOR, podemos alcançar o avivamento sim-
segundo a tua palavra” (Sl 119.107). plesmente utilizando adequadamente
O impulso do avivamento há de partir os meios corretos. No raciocínio de
do Senhor, como também o poder que Finney, “orar pelo reavivamento religio-
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embora alguns autores identifiquem uma enorme confiança no caráter na-
alguma mudança em suas últimas cor- tural dos poderes da própria mente que
respondências. Pelo final da vida de são despertados e excitados pela palavra
Finney, os sinais do avivamento vi- dirigida de forma clara à consciência.
nham declinando. Ele concluía que, se Embora houvesse dito que “os meios
para trazer o avivamento bastava utili- não produzirão um avivamento sem a
zar os meios corretos, a mesma lógica bênção de Deus”, de alguma maneira,
deveria aplicar-se para manter o aviva- em sua lógica matemática e forense, e
mento. Entretanto, por alguma razão, promovendo alguma confusão entre
essa lógica não se verificava na realidade causa e efeito, o avivamento ficou redu-
ao seu redor. Ele sentiu a impossibilida- zido a uma ciência. Numa observação
de de manter o avivamento pelo esforço dos escritos de Finney a este respeito,
humano, e em suas cartas teria conclu- uma leitura superficial dos títulos já é
ído que atribuiu suficiente para
muito da obra ao perceber sua tese:
homem. À luz Em todo avivamento nós somos os títulos suge-
disto, podemos distintamente conduzidos a rem ação exclu-
compreender por- siva do homem e
que Iain Murray
reconhecer a soberania de Deus”. apontam para re-
conclui que a ine- sultados seguros.
vitável tendência O avivamento é,
da visão de Finney é que, embora espere pois, o resultado do despertamento dos
encorajar a diligência e os sinceros es- poderes da consciência por meio das vá-
forços práticos, “ela irá, contudo, cedo rias técnicas, que passaram a ser exaus-
ou tarde, produzir desencorajamento”. tivamente empregadas. Assim nasceu
No final das contas, nesta visão, não há o “avivalismo”. A definição de Finney
avivamento se a desobediência continua prevaleceu entre a maioria dos cristãos
a prevalecer, pois é a obediência huma- evangélicos desde então, e “avivamento”
na que assegura o avivamento.20 e “metodologia” passaram a caminhar
Efetivamente, Finney estava rea- juntos, e com grande detrimento da
gindo a uma situação que considerava teologia. Fato, porém, é que a metodo-
grave. Além disso, ele era alguém muito logia de Finney era, clara e inescapavel-
interessado em resultados. Para ele, a mente, uma expressão de sua teologia.
única forma de afirmar a veracidade de Jadiel Martins Sousa resume bem
um método era sua eficácia em atingir tudo isto:
alvos propostos. O fato de ter experi-
mentado avivamento e ter se concentra- Até os dias de Finney, a Igreja Cristã
do em seus efeitos visíveis deu a Finney estava relativamente familiarizada
a oportunidade de desenvolver sua tese com o fenômeno do avivamento.
da produção do avivamento. Nela há Vários períodos marcados por gran-
22 | Revista f é pa r a h o j e
mento de surpresa no avivamento. Não Uma grande necessidade
era possível nem mesmo estabelecer um
modelo fixo de avivamento; Deus se A idéia completa de avivamento
reserva o direito de agir de formas va- parece que se tornou estranha a muitos
riadas, embora algumas marcas estejam bons cristãos. Isto se deve a um sério
geralmente presentes. equívoco na compreensão das Escritu-
William Sprague (1795-1876) foi ras, e a uma lamentável ignorância da
durante quarenta anos pastor da Igreja história da Igreja. Visto que em nosso
Presbiteriana em Albany, New York. Ele tempo este termo é utilizado para uma
testemunhou um período em que milha- cruzada evangelística ou para alguns
res de homens e mulheres foram conver- eventos planejados, o significado ori-
tidos. Sendo contemporâneo de Charles ginal tornou-se quase inacessível para
G. Finney, Sprague escreveu em 1832 a maioria dos cristãos.
um livro chamado Lectures on Revivals Precisamos ser conduzidos a um
of Religion (Conferências em Avivamen- grande senso de nossa própria indigni-
to). De onde procedem tais avivamentos dade e insuficiência, e que seja criado
da religião? De onde eles vêm? Sprague dentro de nós um correspondente de-
põe isto da seguinte maneira: sejo pela manifestação da glória e do
poder do SENHOR. O “seu braço não
Em todo avivamento nós somos está encolhido”.
distintamente conduzidos a reco-
nhecer a soberania de Deus. Assim As épocas de avivamento trazem
como isto é verdade e pode ser per- um profundo sentimento de que
cebido na influência pela qual uma sempre se está diante dos olhos de
única alma é convertida, certamen- Deus; as coisas espirituais tornam-
te não é menos manifesto nessas -se sobejamente reais, e a verdade
copiosas chuvas de influência pela de Deus se torna irresistivelmente
qual são convertidas centenas de poderosa, tanto para ferir quanto
pessoas. É Ele quem causa isto. É para curar; a convicção de pecado
Ele quem faz chover em uma cida- torna-se intolerável; o arrependi-
de e não em outra. É Ele quem di- mento é profundo; a fé desabrocha
rige o movimento dessas nuvens no forte e firme; a compreensão es-
mundo espiritual, das quais descem piritual cresce depressa e aguda; e
as bênçãos de reavivar e acelerar a os novos convertidos amadurecem
graça. “O vento sopra aonde quer; em período de tempo bem curto.
e ouves a sua voz, mas não sabes Os cristãos tornam-se destemidos
de onde vem nem para onde vai. no testemunho e incansáveis no
Assim é todo que é nascido do Es- serviço do seu Salvador. Eles re-
pírito». Assim, igualmente, é todo conhecem a sua nova experiência
avivamento da religião.22 como um verdadeiro antegozo da
24 | Revista f é pa r a h o j e
Jonathan Edwards chegou
Como
Joel R. Beeke
Revista fé par a h oje | 25
P
resumimos muito facilmente que
os grandes teólogos chegaram a
amar as doutrinas da graça sem
qualquer esforço. Isto não foi, de modo
algum, o que aconteceu com todos eles.
Talvez não aconteceu com nenhum deles.
Pelo menos, isso não foi o que aconteceu
com Jonathan Edwards, o eminente
pregador da Nova Inglaterra no século
XVIII. O seguinte relato mostra como
Edwards chegou a amar a soberania de
Deus somente depois de relutância inicial.
26 | Revista f é pa r a h o j e
J
onathan Edwards fez a seguinte razão assimilou a justiça e a ra-
confissão: cionabilidade disso. Entretanto,
a minha mente descansou nisso
Desde a minha infância, a minha e pôs um fim a todos aqueles so-
mente estava cheia de objeções fismas e objeções. E houve uma
contra a doutrina da soberania de mudança maravilhosa em minha
Deus em escolher quem ele qui- mente no que diz respeito à dou-
sesse para a vida eterna e rejeitar trina da soberania de Deus, des-
a quem ele quisesse, deixando-os de aquele dia até agora; por isso,
perecer eternamente e ser ator- eu dificilmente tenho levantado
mentados para sempre no inferno. objeção, no sentido pleno, contra
Isso costumava parecer uma dou- a soberania de Deus em mostrar
trina horrível para mim. Todavia, misericórdia para quem ele quer e
lembro-me muito bem do tempo endurecer a quem ele quer. A ab-
em que eu parecia estar convenci- soluta soberania e justiça de Deus
do e plenamente satisfeito quan- no que diz respeito à salvação e à
to a esta soberania de Deus e sua condenação é aquilo de que mi-
justiça em dispor os homens eter- nha mente parece descansar se-
namente assim, de acordo com gura, muito mais do que qualquer
seu prazer soberano. Mas nunca coisa que eu vejo com os olhos. É
pude dar uma explicação de como assim, pelo menos, às vezes. Des-
ou por que meios fui convencido de então, eu tenho não somente
disso, nem sequer imaginar na uma convicção, mas uma convic-
época, nem mesmo muito depois, ção prazerosa. Muitas vezes, esta
que houve uma influência extra- doutrina tem-se mostrado exce-
ordinária do Espírito de Deus dentemente agradável, esplendo-
neste convencimento; sei apenas rosa e doce. Soberania absoluta é
que cheguei a ver melhor, e minha o que eu gosto de atribuir a Deus.
28 | Revista f é pa r a h o j e
crescente aumento de conhecimento gozo e o alvo supremo de Edwards era
nas profundezas de Deus e, ao mesmo ser levado, experimental e continu-
tempo, de si mesmo – de Deus, para amente, da soberania divina à glória
sua exultação; de si mesmo, para hu- divina, a fim de gozar o próprio Deus
milhação pessoal.8 Nestes momentos, como o Deus de graça evangélica in-
Edwards desejava que ele “fosse nada e dizível:
Deus fosse tudo”;9 que ele fosse como
uma pequena flor “baixa e humilde no Os deleites e gozos mais praze-
chão, abrindo suas pétalas para rece- rosos que tenho experimentado
ber os agradáveis raios da glória do não são aqueles que surgiram de
sol”.10 Ele também falou sobre andar uma esperança de meu bom esta-
sozinho nos pastos de seu pai, con- do, e sim aqueles que procederam
templando com um senso de prazer “a de uma visão imediata das coisas
30 | Revista f é pa r a h o j e
Jonathan Edwards
A Devoção de
Wilson Porte
Revista fé par a h oje | 31
Capa do Novo Testamento de Jonathan Edwards © Yale University Beinecke Rare Book and Manuscript Library
E
ra o cair da tarde em Nor- tãos no caminho da obediência à von-
thampton. Enquanto alguns tade de Deus.
homens já desfrutavam do
descanso de seu lar, outros ainda re- Influência puritana
tornavam do campo anelando pelo
descanso da noite. Enquanto isso, Edwards era um típico congre-
muitos acenavam para um casal bas- gacional da Nova Inglaterra, confor-
tante conhecido e amado na cidade. mando-se às formulações puritanas
Eles passeavam em seus cavalos e de devoção pública e particular. Em
conversavam. Sua amizade era como seu livro, Jonathan Edwards on Wor-
um alento. Ao retornarem ao lar, e aos ship: Public and Private Devotion to
onze filhos, Jonathan e Sarah Edwards God ( Jonathan Edwards sobre ado-
tinham juntos seus momentos devo- ração: devoção pública e particular a
cionais antes de dormirem. E, assim, Deus), Ted Rivera afirma que, embo-
terminava mais um dia. ra os hábitos devocionais particulares
Dentro do pouco que conhecemos de Edwards sejam quase totalmente
sobre a piedade de Edwards, encontra- desconhecidos, o pouco que sabemos
-se sua relação com Sarah, sua esposa. é que Edwards herdou dos antigos pu-
Segundo o Dr. Alderi Souza de Ma- ritanos sua ansiedade pela segurança
tos (CPAJ-Universidade Mackenzie), da salvação, seu zelo em acabar com o
Edwards e Sarah possuíam grande pecado, e sua preocupação cuidadosa
harmonia, amor e companheirismo. por um autoexame.
Até o final de sua vida, eles mantive- Como os demais puritanos,
ram o hábito de andar a cavalo, ao cair Edwards estava muito preocupado
da tarde, para poderem conversar. An- em crescer firmemente em fé e boas
tes de dormirem, sempre tinham jun- obras. A santificação pessoal, que co-
tos seus momentos devocionais. meça com a devoção particular diá-
Jonathan Edwards viu a Bíblia, ria, resulta em boas obras que devem
acima de tudo, como um livro de ins- ser ilimitadas. Para os puritanos, uma
truções, cujo objetivo é guiar os cris- verdadeira confiança em Cristo nunca
32 | Revista f é pa r a h o j e
é infundida sem outras graças com ela, sua vez, tem como objetivo neutralizar
graças estas que sempre resultam no as tendências persistentes ao pecado.
bem do próximo. O autoexame serve também para tra-
zer energia para a vida moral, que é o
Autoexame símbolo mais seguro de uma conver-
são religiosa.
Em 1738, Jonathan Edwards pre- Como a maioria dos puritanos,
gou uma série de sermões intitulada Edwards praticava regularmente o au-
Charity and Its Fruits (Caridade e seus toexame. Seus diários, do período em
frutos) onde tratou das práticas espi- que ele era bem jovem, nos mostram
rituais, do amor divino e dos hábitos alguém buscando examinar cuidado-
dos crentes. samente suas motivações, disposições
Edwards, nestes sermões, demons- e ações. Edwards recomendava seus
trou que gostaria que sua congregação paroquianos a, regularmente, pratica-
observasse muitas destas práticas es- rem o autoexame, não apenas uma vez
pirituais particulares: exame da cons- ou duas, mas diária e continuamente,
ciência, constante avaliação espiritual, até que, por assim fazer, suas mentes
orações familiares matutinas e vesper- iriam, degrau por degrau, crescer. As-
tinas, leitura particular das Escrituras, sim, conquistariam um hábito de con-
encontros com outros cristãos, e uma sideração saudável de sua alma, além
abrangente observância do Sabbath. de uma vida e ação prudentes.
William C. Spohn, em artigo pu-
blicado no Journal of Religious Ethics A devoção: uma busca pela
(Revista de Ética Religiosa), destaca santidade
que “de seus escassos escritos autobio-
gráficos, parece que sua rotina diária John Gerstner, em seu livro Jona-
era organizada em torno destes exer- than Edwards: a mini-theology ( Jona-
cícios devocionais”. than Edwards: uma mini-teologia),
Estes sermões foram pregados dedica o capítulo nove para tratar da
após um avivamento na igreja local busca pessoal de Edwards pela san-
(Northampton), por volta de 1736-37, tidade. De seus sermões escritos, em
e pouco antes do Grande Desperta- mais de 1.200 o tema central é a san-
mento, ocorrido entre 1740-43. Estes tif icação. Além dos sermões, seus es-
sermões esboçam algumas práticas critos também estão carregados deste
específicas que foram vividas antes e tema.
durante o Grande Despertamento. Em seu livro Religious Affections
Edwards sempre praticou e reco- (Afeições Religiosas), ao tratar so-
mendou a prática do autoexame. Se- bre justif icação, opondo-se ao anti-
gundo ele, o autoexame é uma forma nomianismo e ao neonomianismo,
de manter a piedade diária que, por Edwards insiste por uma pura dou-
34 | Revista f é pa r a h o j e
ma prova de conversão ou santidade. Pouco tempo depois que comecei a
A autenticidade da experiência re- experimentar estas coisas, falei com
ligiosa não era determinada por sua meu pai sobre alguns pensamen-
intensidade ou natureza incomum, tos que passaram em minha mente.
mas pela qualidade de vida que emer- Fiquei muito afetado pela conversa
gia dela. Novos hábitos da vida cris- que tivemos. E, quando a conversa
tã, manifestariam gradualmente que terminou, caminhei sozinho para
a pessoa era, de fato, “espiritual”, ou fora, num lugar solitário nos campos
seja, que ela tinha parte na santida- de pastagens de meu pai, para medi-
de de Deus através do Espírito Santo tar. E, enquanto eu estava andando
que vive nela. lá, e olhei para o céu e nuvens, veio à
minha mente uma sensação doce da
Um exemplo final gloriosa majestade e graça de Deus,
que não sei como expressar. Pareceu-
Fredrick Youngs, escrevendo para -me vê-las em uma terna conjunção:
o Journal of the National Association of majestade e mansidão se juntaram:
Baptist Professors of Religions (Revista era uma majestade santa, doce e
car tais “antigos” hábitos devocionais. Fredrick Youngs. Jonathan Edwards, A Mystic? Jour-
nal of NABPR.
Como precisamos anelar mais a Deus
Jonathan Edwards. Letters and Personal Writings. New
do que qualquer bem que dele venha a
Haven: Yale University Press, 1998.
nós! Ele é o mais precioso bem que po-
demos encontrar. Ele se oferece a nós e
Wilson Porte: Mestre em Teologia pelo Cen-
nos convida a irmos a ele, diariamente! tro de Pós-Graduação Andrew Jumper da Uni-
Creio que, sem essa sede e fome pelo versidade Presbiteriana Mackenzie. É pastor da
Senhor, jamais experimentaremos um Igreja Batista Liberdade em Araraquara-SP e
professor no seminário Martin Bucer.
gracioso despertamento do Senhor,
36 | Revista f é pa r a h o j e
Jonathan
O desconhecido
Edwards
apreço pela natureza e ciência
e pelo Deus Criador.
38 | Revista f é pa r a h o j e
evidências do maravilhoso projeto meio do texto temos percepções in-
de Deus e nela trafegava com muita comuns para um jovem de sua idade,
competência. Com frequência, pro- com incrível precisão científica. Nes-
curava refúgio na floresta para medi- se texto, por exemplo, ele escreve:
tar e adorar. Chama atenção a forma
como ele aborda com tanta tranqui- aquilo que sobe a ascende no ar é
lidade a natureza e faz a transição da mais leve do que o ar, como aqui-
física para a metafísica, demonstran- lo que boia na água é mais leve do
do em sua vida e escritos o entrelaça- que a água.
mento que existe entre todas as áreas Ele continua, indicando que a
do conhecimento, pois tudo flui do teia que suporta a aranha “é mais
Deus Criador. do que suficiente para contraba-
Esse viés e interesse estão presen- lançar a [força de] gravidade da
tes, especialmente, nos seus escritos aranha”.
mais antigos. Em um desses, Edwar-
ds escreve sobre insetos.3 Ele indica No texto, Edwards descreve em
que aborda o que chama de “maravi- detalhes como as teias são entrelaça-
lhas da natureza”, por orientação do das, como se processa o movimento
40 | Revista f é pa r a h o j e
dizem uma a outra; além disso, o segredo está aqui. Aquilo que é
é extremamente chocante ao ra- a substância de todos os corpos
ciocínio pensar na existência do é a ideia perfeitamente estável,
puro nada, em algum lugar... As- exatamente precisa e infinita,
sim, vemos a necessidade de que que está na mente de Deus, em
este necessário ser eterno seja in- conjunto com sua estável von-
finito e onipresente. tade; que é gradualmente comu-
nicada a nós e a todas as demais
Mais adiante, ainda neste ensaio, mentes, de acordo com certas leis
Edwards fala do “globo da terra” como e métodos fixos, exatos e bem
subsistindo “neste universo criado”. estabelecidos. Ou para utilizar
Certamente o seu conceito de Deus, uma linguagem diferente, a ideia
42 | Revista f é pa r a h o j e
Jonathan
Pensamentos de
Don Kistler
Capa de um caderno de Jonathan Edwards contendo anotações sobre a História da Redenção Revista fé par a h oje | 43
© Yale University Beinecke Rare Book and Manuscript Library
J
onathan Edwards apresentou esta ele era um adolescente, Edwards dis-
razão convincente quanto à exis- se: “É totalmente impossível que haja
tência de Deus: “Deus é um ser o nada absoluto”. Tem de haver um
necessário porque é uma contradição Ser eterno, porque negar isso envol-
supor que ele não existe. Deus é um ve a impossível contradição de que o
ser necessário porque é impossível que Nada existe.
ele não exista, pois não há outra alter- Em suas “Miscelâneas”, que li-
nativa. Não há nenhuma segunda [al- dam com os temas de Deus e seu Ser,
ternativa] para fazer a disjunção. Não as quais você pode achar em nosso
há nada mais que possamos supor”. novo livro Our Great and Glorious God
Este é um bom exemplo do méto- (Nosso Grande e Glorioso Deus),
do apologético de Edwards. Em sua Edwards argumenta sobre a existência
obra clássica A Liberdade da Vontade, e a necessidade da existência de Deus
ele argumentou assim: em termos do nada:
44 | Revista f é pa r a h o j e
ma, existir, ela tem primeiramente
Edwards colocou grande ênfase de existir para escolher, de si mesma,
na lei da causalidade. Ele se referiu a existir. Mas, se houve realmente o
Deus como “a Causa eterna”. nada, quando nada existia, então, esse
nada quis, ele mesmo, existir antes que
Todos reconhecem que é autoe- existisse para fazer tal escolha. E essa
vidente que nada pode começar a possibilidade é uma impossibilidade!
existir sem uma causa... Quando
entendida, esta é uma verdade Todos reconhecem que é autoe-
que terá, irresistivelmente, lugar vidente que nada pode começar
na anuência. Portanto, se su- a existir sem uma causa. Tam-
pomos um tempo no qual nada bém não podemos provar isso de
existia, um corpo não começaria a qualquer outra maneira senão por
existir por iniciativa própria. Isto explicá-lo. Quando entendida,
é o que o entendimento abomina: esta é uma verdade que terá, irre-
que alguma coisa veio a existir sistivelmente, lugar na anuência.
quando não havia nenhuma razão Portanto, se supomos um tempo
para ela existir. no qual nada existia, um corpo
não começaria a existir por ini-
Edwards era um grande fã do ciativa própria. O entendimento
empiricista inglês John Locke. Uma abomina o fato de que alguma
das obras famosas de John Locke foi coisa veio a existir quando não
A Racionabilidade do Cristianismo. havia nenhuma forma ou razão
Edwards concordava com o fato de para ela existir. Portanto, é igual-
que todo efeito pode ter sua origem mente autoevidente que um ser
estabelecida numa causa, o que ne- não pode, quanto à maneira de
nhum cristão inteligente contestaria: seu ser, começar a existir sem uma
causa, tal como a de que, quando
É evidente que nenhuma das um corpo está em descanso per-
criaturas, nenhum dos seres que feito, ele começa a se mover sem
vemos é o princípio de sua pró- uma razão dentro ou fora dele
pria ação, mas todas as alterações mesmo. Portanto, “porque apenas
seguem uma cadeia procedente de aconteceu” não satisfará a mente,
outras alterações. de modo algum. A mente pergun-
ta qual foi a razão.
Em outras palavras, nada tem o
poder de autocriação. Cada ação en- Assim, Edwards argumenta em fa-
volve uma decisão ou escolha anterior vor da existência de Deus como sendo
para que tal ação aconteça. Contudo, necessária, porque é impossível que
para alguma coisa querer, de si mes- o nada sempre existiu. Se há ser, esse
Para ilustrar isso com um dos Para Edwards, não havia outra op-
atributos de Deus, considere a ção, exceto a existência de Deus. Essa
eternidade. É absolutamente ne- tinha de ser a única opção, porque era
cessário que a eternidade exista, impossível não ser.
e isso porque não há outra op-
ção. Afirmar eternidade ou não Há uma razão que pode ser
eternidade não é uma disjunção, apresentada para explicar por
46 | Revista f é pa r a h o j e
que Deus devia ter existência. A A natureza de Deus
razão é que não há outra alter-
nativa. Não existe algo conce- Nesta altura, Edwards começa a
bível que possa ser colocado em definir a Deus baseado na própria no-
confrontação com a existência ção de que Deus existe. Se existe um
de Deus como a outra parte da Ser eterno, a quem chamamos Deus,
disjunção. Se há, é o nada absolu- há coisas a respeito deste Ser que têm
to e universal. Uma suposição de de ser necessariamente verdadeiras.
algo é uma suposição da existên- Primeiramente, se alguma coisa
cia de Deus. A existência de Deus sempre existiu, ela tem de ser eterna.
não somente pressupõe esse algo, Ela não tem começo e não tem fim. Se
mas também o infere. Ela o infere ela tem um começo, então, algo a cau-
não somente de maneira conse- sou antes, e esse algo é o ser Eterno.
quente, mas também de maneira Todavia, qualquer que seja a origem
imediata. de todo ser, este ser tem de ser eterno.
Deus é maior do que tudo que
existe, e não há existência sem a Nada chega a acontecer sem uma
existência de Deus. Todas as coi- causa. O que é autoexistente tem
sas estão nele, e ele está em tudo. de existir desde a eternidade e tem
Mas não há tal coisa imaginável de ser imutável; mas, no que diz
como o nada absoluto. Falamos respeito às coisas que começam a
insensatez quando supomos que existir, elas não são autoexistentes
tal coisa existe. Enganamos a nós e, portanto, precisam ter fora de si
mesmos quando em nossa mente mesmas algum fundamento para a
pensamos que supomos isso ou sua existência. O fato de que tudo
quando imaginamos que o supo- aquilo que começou a existir, não
mos como algo que é possível. O havendo existido antes, precisa
que fazemos quando pensamos ter uma causa por que começou
na absoluta niilidade (se posso a existir – este fato parece ser o
falar assim) é apenas remover primeiro ditame do senso comum
uma coisa para dar lugar a outra e e natural que Deus implantou na
supor esta outra. Neste caso, não mente de toda a humanidade e o
há tal coisa como duas partes de principal fundamento de todas
uma disjunção. Quando falamos as nossas argumentações sobre a
de existência em geral, falamos de existência de coisas passadas, pre-
um único ponto sem uma disjun- sente e por vir.
ção. Portanto, Deus existe porque
não há outra alternativa. Deus Se algo é eterno, não deve ter de-
existe porque não há nada mais feito; pois, se tivesse defeitos, por fim
que possamos supor. decairia e perderia a existência. Fica-
48 | Revista f é pa r a h o j e
a si mesmo é conhecer todas as coisas. Portanto, este ser seria plenamen-
A maior coisa que este ser poderia te feliz em e consigo mesmo. Nada
fazer por qualquer coisa ou qualquer poderia ser acrescentado a ou tira-
outro ser seria revelar a si mesmo e dar do de seu gozo em si mesmo. Poucos
o conhecimento de si mesmo. Pois, se teriam ousado admitir esta doutrina
este ser original, que é eternamente que Edwards propagou! Deus é infi-
perfeito, é a soma de todo conheci- nitamente feliz, porque ele é o Deus
mento e de tudo que é bom e correto, sempre “bendito”. E, argumentando
expressar e revelar a si mesmo, para com base na imutabilidade de Deus,
ser conhecido, é o maior dom que ele se ele tem sido sempre feliz, ele tem
poderia dar. de ser eternamente feliz. Edwards o
Este ser não somente seria a fonte expressou nestes termos: “Não há ver-
de toda a existência, porque toda vida dadeiramente em Deus qualquer coisa
extrairia sua existência deste ser, mas como dor, tristeza e inquietação”.
também possuiria o único poder ine- Nesta altura, temos de admitir
rente que existe. Toda outra autorida- que alguma coisa que sempre existiu
50 | Revista f é pa r a h o j e
O ambiente
Edwards
teológico arminiano
nos dias de
Heber Carlos de Campos
52 | Revista f é pa r a h o j e
John Taylor (1694-1761) dimento, deve claramente ver isto
como não-razoável, e totalmente
Taylor começou a rejeitar a idéia inconsistente com a verdade e a
do pecado original e eventualmente bondade de Deus.6
escreveu seu tratado Scripture-doctrine
of Original Sin.5 Esse tratado contra o pecado origi-
nal foi recebido muito calorosamente
Taylor era contra a imputação do pe- e a sua influência se espalhou na Nova
cado Inglaterra e foi recebido calorosamen-
Nesse tratado ele atacou bíblica e te por muitas pessoas. David Weddle
filosoficamente essa doutrina cardeal escreve:
do pensamento calvinista. Suas pala-
vras são muito fortes contra a impu- Muitos pregadores (de gerações
tação do pecado original. Ele escreve: mais jovens, e principalmente os
graduados de Harvard) foram
Um representante de ação moral é encorajados em sua apostasia do
o que eu não posso, de modo al- Calvinismo Puritano por esta ex-
gum, digerir. Um representante, pressão sofisticada do Arminia-
a culpa de quem a conduta será nismo continental.7
imputa a nós, e cujos pecados cor-
romperão e perverterão a nossa Após a publicação do Scripture-
natureza, é um dos maiores absur- -doctrine of Original Sin, de Taylor,
dos em todo o sistema para cor- passou a existir um debate entre ele
romper a religião... Que qualquer e Edwards. Edwards disparou o ga-
homem sem meu conhecimento tilho de sua obra The Great Christian
e consentimento, me represen- Doctrine of Original Sin. Nessa obra,
te, que quando ele é culpado eu Edwards defendeu corajosa e vee-
devo ser reputado como culpado, mentemente a imputação do pecado
e quando ele transgride eu sou de Adão à raça, usando a analogia da
responsável e punível por sua árvore e seus ramos.8
transgressão, e, por causa disso,
sujeito à ira e maldição de Deus, Taylor tinha uma visão superficial do
não! Além disso, que por sua im- pecado
piedade me seja dada uma nature- O debate entre Taylor e Edwards
za pecaminosa, e tudo antes de eu foi sobre a idéia da necessidade. Smith
ser nascido, e consequentemente afirma que
enquanto estou sem capacidade
de conhecer, ajudar ou impedir o Edwards já havia tratado com a
que ele fez; certamente qualquer questão da necessidade em Free-
um que se atreve a usar seu enten- dom of the Will e em seus debates
54 | Revista f é pa r a h o j e
Adão foi tornado o cabeça federal da como não tendo nenhuma deter-
raça; (2) seu pecado foi imputado à sua minação seja para o mal ou para
progênie; (3) a corrupção da natureza o bem. Sua liberdade ele define
visitou a totalidade da raça; (4) o peca- assim: “um poder de agir a partir
do atual é uma consequência. Esta era de nós próprios, ou de fazer o que
a doutrina da “imputação imediata” queremos”. Assim, ela é livre, não
que teve muita importância na teolo- somente de uma “coação”, mas da-
gia Reformada subsequente. quilo que, em distinção disso, era
chamado “necessidade”. Numa
Daniel Whitby (1638-1726) citação de um certo Mr. Thorndi-
Whitby, o principal objeto da crí- ke a palavra “indiferença” é usada
tica de Edwards, expressava grande para descrever esta liberdade.13
insatisfação com a doutrina do peca-
do original e considerava inaceitável No entendimento de Whitby os ho-
a idéia da imputação defendida por mens possuem motivos (como promes-
Agostinho.11 sas e ameaças) que exercem influências,
Juntamente com Taylor, Whi- mas quando os motivos são apresenta-
tby “argumentava que as pessoas não dos, a decisão ainda repousa na vonta-
mereciam corretamente o louvor ou a de. Ela possui independência. Mesmo
desaprovação, se as ações delas fossem a despeito dos motivos, não existe de-
desempenhadas por necessidade. Em terminação deles. A vontade escolhe
outras palavras, se não fazemos livre- como escolhe por “auto-determinação”.
mente escolhas, como pode Deus cor- Embora Whitby não use a palavra “au-
retamente recompensar ou punir-nos to-determinação” esse é o seu conceito
por nossas decisões?”12 A acusação dos no coração de suas obras. A vontade
arminianos da época (e de hoje tam- determina-se a si mesma. A conclusão
bém!) era de que os calvinistas acabam do pensamento de Whitby é a seguinte:
tornando Deus o autor do pecado, se
é verdade que tudo o que acontece de- Não há, evidentemente, nenhu-
corre de uma necessidade. ma base racional para conhecer
Foi para responder aos livros de de antemão qual deverá ser a ação
Whitby (e o de alguns outros) que da vontade, mesmo quando todos
Edwards compôs o seu livro The Fre- os motivos operantes são suposta-
edom of the Will. mente conhecidos. A onisciência
Whitby tinha uma visão da vonta- de Deus, que abarca sua presciên-
de bem diferente da de Edwards: cia, é, portanto, um atributo in-
teiramente misterioso. Segue-se
A vontade, de acordo com Whi- também que o homem na conver-
tby, é livre não somente no sentido são não é passivo e que a graça de
de ser a faculdade de escolha, mas Deus não é irresistível.14
56 | Revista f é pa r a h o j e
Em ambas as edições do Essay on ziam que a vontade é determinada pelo
the Human Understanding, Locke tem motivo mais forte.
opiniões diferentes sobre a resposta à
pergunta: “O que determina a vontade?” Aos motivos são atribuídos, en-
Em ambas as edições ele responde: tretanto, um poder positivo. Eles
“O motivo que está diante dela”. Mas são causas, e, assim, enquanto
na primeira edição, onde a vontade uma tendência ao ocasionalis-
não tinha sido agudamente distingui- mo de Malebranche, que é evi-
da do desejo, foi o motivo objetivo, o dente em seus escritos seguintes,
bem, enquanto que agora é o motivo Edwards atribuiu a eles uma cau-
subjetivo, ou o desejo excitado pelo sação eficiente. Eles poderiam ser
bem apresentado na mente. Esta dis- calculados, e sobre um perfeito
tinção dependeu conhecimento da
da nova concep- natureza e potên-
ção que Locke cia deles, a ação
tinha adquirido
Edwards defendeu corajosa e futura de um ser
da “perfeita dis- veementemente a imputação do influenciado por
tinção” da von- pecado de Adão à raça humana” eles poderia ser
tade do desejo, predita. Nisto, as
que ele diz, “não condições subje-
devem ser con- tivas que deter-
fundidas”. 18
minam a influência dos motivos
“O que move o desejo?” Locke res- não foram negligenciadas, mas
ponde: “A alegria”, “o que tem uma ap- ainda o poder positivo foi deixado
tidão de produzir prazer em nós, é o que ao motivo objetivo.20
chamamos bem”. Mas um bem deve ser
colocado para excitar o desejo, ou ela Portanto, o motivo dominante, ou
nunca influenciará a ação. Um bem au- o motivo mais forte, é que determina
sente, por exemplo, é menos eficaz do a ação da vontade. Esse motivo mais
que algum desconforto presente.” 19
forte é determinante porque possui
um certo poder de atração ou porque
Resumo da disputa entre Edwards e é um bem aparente. Os mandamentos
Whitby e as ameaças são motivos que podem
Cada ato da vontade é um ato de ser empregados, mas o que quer que
escolha e envolve alternativas. Entre sejam os motivos, como um homem
a escolha de duas alternativas, a per- escolhe, assim é ele. Na verdade, o po-
gunta é a seguinte: O que determina a der de escolha está no homem e não
vontade a escolher um ao invés de outro? na sua vontade. A vontade não possui
Os arminianos diziam que a vontade independência em relação aos fatores
determina a si mesma. Edwards di- internos e externos que há no homem.
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lógica Reformada cairia em colapso. O definição de liberdade humana
libertarismo estava tomando conta de pela qual ele pensou numa pancada
muitos redutos outrora Calvinistas da para salvar ambos, a dignidade do
Nova Inglaterra. Winslow colocou de homem e a onipotência de Deus.
forma correta o problema: Ele concede ao homem a liberdade
de ação para levar a cabo suas pró-
Se a vontade do homem fosse livre, prias escolhas, mas insiste que essas
e ele pudesse aceitar a graça divi- escolhas são determinadas pelos
na ou rejeitá-la, então sua eterna motivos que repousam fora do con-
salvação não mais poderia ser pre- trole do homem... A contribuição
ordenada por um poder fora de de Jonathan Edwards foi fazer da
si mesmo: ele seria salvo por sua liberdade do homem um passo in-
própria escolha, não pelo decreto termediário. Ele tinha qualificado
imutável. E se isto fosse verdadeiro, antes do que negado a liberdade;
então a soberania de Deus seria li- ou, numa frase mais moderna, ele
mitada, não absoluta... Se a vontade reproduzido a liberdade humana
do homem fosse livre, a estrutura como ‘condicionada’.28
calvinista estaria arruinada.27
É do combate à liberdade libertária
O calvinismo de Edwards, portan- do arminianismo e de sua nova defini-
to, veio a negar a liberdade libertária ção de liberdade que o seu livro Free-
ensinada pelos arminianos da épo- dom of the Will trata.
ca. Edwards não poderia ficar calado
diante de perigo tão grande causado
pelo libertarismo, para a fé calvinista. 1 Jonathan Edwards, The Works of Jonathan Edwar-
ds, vol. 1, p. 347.
Por essa razão, em sua Freedom of the
2 Robert W. Jenson, America’s Theologian: A Re-
Will, Edwards atacou violentamente commendation of Jonathan Edwards (New York:
o arminianismo, fortalecendo, assim, Oxford University Press, 1988), 53-54.
11 Smith, Shelton H. Changing Conceptions of Origi- 24 Gerald R. Mc Dermott, Jonathan Edwards Con-
nal Sin: A Study in American Theology Since 1750. fronts the gods (Oxford University Press, 2000), 37.
New York: Charles Scribner’s Sons, 1955), 11. 25 Gerald R. Mc Dermott, Jonathan Edwards Con-
12 Citação de Giese, op. cit. 14. fronts the gods (Oxford University Press, 2000), 38
13 Frank Hugh Foster, A Genetic History of the New 26 Gerald R. Mc Dermott, Jonathan Edwards Con-
England Theology, 1907, encontrado no site http:// fronts the gods (Oxford University Press, 2000), 38
www.gospeltruth.net/genetic_history.htm#preface (Lecture on 2Peter 1.19, August 1737, Edwards
papers 22-23.)
14 Frank Hugh Foster, A Genetic History of the New
England Theology, 1907, encontrado no site http:// 27 Ola Elizabeth Winslow, Jonathan Edwards (Mac-
www.gospeltruth.net/genetic_history.htm#preface Millan Co., 1940; repr., New York: Collier Books,
1961), 274.
15 Citado por Foster, A Genetic History of the New
England Theology, 1907, encontrado no site http:// 28 Ola Elizabeth Winslow, Jonathan Edwards (Mac-
www.gospeltruth.net/genetic_history.htm#preface Millan Co., 1940; repr., New York: Collier Books,
1961), 275-76
16 Citado por Foster, A Genetic History of the New
England Theology, 1907, encontrado no site http://
Heber Carlos de Campos: É ministro pres-
www.gospeltruth.net/genetic_history.htm#preface
biteriano, professor de Teologia Sistemática no
17 Citado por Foster, A Genetic History of the New CPAJ e o coordenador do Jonathan Edwards
England Theology, 1907, encontrado no site http://
Center no Brasil. Palestrante e autor de vários
www.gospeltruth.net/genetic_history.htm#preface
livros e artigos. É Doutor (PhD) em Teologia
18 Observações de Foster, A Genetic History of the New
Sistemática no Concordia Theological Seminary,
England Theology, 1907, encontrado no site http://
Saint Louis, Missouri, EUA.
www.gospeltruth.net/genetic_history.htm#preface
60 | Revista f é pa r a h o j e
À
Jonathan
Edwards
Tiago J. Santos Filho
Glória a Deus, glória a Deus,
Este era seu moto, sua resolução,
Sua busca, seu encanto, sua vida,
Sua religiosa afeição,
Proporção e simetria,
Via na criação,
Divina perfeição.
Incansável erudito, de ideias, forjador.
Cientista, filósofo, escriba,
De tratados filosóficos à vida das aranhas,
Na ponta da pena, suas miscelâneas.
Pastor-missionário, de Deus escravo,
A Bíblia foi seu livro, sua luz, alento,
Sopro do Espírito, força motriz do Despertamento,
Em pronúncia eloquente o orador,
Com santa reverência despertou,
Desespero, choro e terror,
Pelas chamas do inferno e da dor,
Que se via, no rosto estampado,
Do pecador, ao ouvir estremecido,
Que está perdido, nas mãos de um Deus irado.
Mas lembrou que aos olhos de Deus,
Um pecador não é justificado,
A menos que ponha seu eu de lado,
E com fé renda-se a Cristo, crucificado.
E assim seguiu seu zelo puritano,
Fez da mesa do Senhor seu bem cabal,
Foi acuado por seu próprio pegulhal,
Herói marcado, firmou-se em seus princípios,
– Há agora tempo para pregar aos índios!
A luz brilhou forte, mas logo se apagou.
Seu gênio, virtudes, caráter iluminado,
À posteridade é sua herança, seu legado.
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“Tolle, lege, tolle, lege...”
Foi ao som destas palavras e com o texto de Romanos nas mãos que Agostinho se converteu.
Esta importante epistola também foi fundamental para estrutrar sua teologia. Lutero
tinha esta carta como “a mais importante do novo testamento”, Calvino a classificou como
“a porta de acesso aos mais profundos tesouros das escrituras”. Sem dúvida Romanos
ocupa um lugar de destaque na história da interpretação bíblica e este comentário de John
Murray é tido como um dos mais teologicamente rico e exegeticamente apurado de todos
os tempos. Tome e leia este comentário e certamente você será enriquecido com esta obra.
.do Dr Murray.
Um Per f il de
Homens Piedosos
Calvino, Spurgeon, Edwards e Knox eram homens que, a
despeito de suas limitações e pecados, pela graça de Deus se
tornaram gigantes na fé. Descubra através desta série o perfil
destes homens piedosos que dedicaram sua vida ao Senhor e
que até os dias de hoje continuam a nos ensinar através de
seu legado
As Firmes Resoluções
de Jonathan Edwards
Steven Lawson
www.editorafiel.com.br/feparahoje