ARTIGO,
O PSICOLOGO NO HOSPITAL
MATHILDE NEDER*
RESUMO
Este trabaiho visou primeiramente atender a solicitacdo de informes sobre 0
inicio das atividades do pstcdlogo no Hospital das Clinicas, na qualidade de protago-
nista dessa historia. Focaliza a émportdncia do embasamento filosofico para a defini-
do de objetivos e metas, com as implicagées metodologicas. Saliéncia ¢ dada as
Greas de agdo no Hospital — Assisténcia, Ensino e Pesquisa, com comentarios sobre
@ expansdo do trabatho psicolégico no Hospital das Clinicas em geral e abordando,
em particular, as atividades dos Servicos aos quats esteve ligada diretamente. Encerra
mencionando a ezisténcia da Coordenadoria das Atividades dos Psicologos no Hos-
pital das Clinicas, que desenvolve suas atividades de aprozimagéo dos diferentes
Servigas de Psicologia do HC e contribut para o desenvolvimento da Psicologia na
instituipdo, sendo essa CAPSI responsdvel pela Revista de Psicologia Hospitalar, que
com este primeiro numero se inicia.
‘Quiseram meus colegas que eu trouxesse para
‘este primeiro nuimero da Revista de Psicologia Hos.
pitalar algo sobre as atividades do psicologo no
Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina
da Universidade de Sao Paulo— FMUSP. Pergun.
tas foram feitas sobre local de inicio, campo de
atuagao, objetivos, dificuldades encontradas na
‘ocasiao; como se deu aevolugéo,como se expandiu,
‘como se deu a entrada de novos psicblogos e como
foram recebidos; as conquistas e a atuagao hoje;
dificuldades atuais.
Em 1954, no Instituto de Ortopedia e Trauma.
tologia do Hospital das Clinicas, entéo Clinica Or-
topédica e Traumatologica — COT, iniciamos nosso
trabalho psicoldgico neste Hospital, colaborando
com o Dr. Eurico de Toledo Freitas e com a equipe
de enfermagem, na Clinica Cirdrgica de Coluna,
—no atendimento preparatorio, durante o proces.
samento cirirgico e na pés-cirurgia. Compreendia
esse _atendimento o conhecimento das condicoes
do paciente e sua familia, com eles trabalhando
no hospital e no domicflio. A assisténcia terapéu-
tica era individual, grupal e também familiar. Inte.
ressavam aos médicos e a outos profissionais a ca.
acidade reativa do paciente e a forca colaborativa
vo = PU
Divisdo e Psicologia do Instituto Central do Mosptal 4s Cinicas
se ‘do Mogptal eas Chineas Prot Titular do Programs de Pos Grae
da familia, para aumento da probabilidade de su:
cesso pela cirurgia, Trabalhévamos por af
Em 1956, Aidyl Macedo de Queiroz, minha cole-
ga e amiga, iniciava sua tese de doutorado, pela
Universidade Catdlica de S. Paulo, estudando a
crianca asmatica e trabalhando também em seu
grupo controle, com outras criancas da Clinica de
Higiene Mental, da Secao de Pediatria, hoje Insti-
tuto da Crianca,
‘Em 19517 iniciei meu trabalho em Reabilitacao,
no entdo Instituto Nacional de Reabilitacao —
INAR, em funcionamento na Clinica Ortopédica
€ Traumatolégica, com extensao do atendimento
as demais Clinicas do HC!
Continuel atendimentona COT, conformea de-
‘manda, enquanto atuante no INAR.
Em 1958, a psicdloga Sonia Letaif desenvolveu
atividades psicolégicas na Clinica Psiquidtrica, ho-
Je Instituto de Psiquiatria
FMUSP. Coordenadora dat Atwidades dos Pricslogos
0 em Pacologn Cines, da PoRtiea Universidade Cetslice Se—A
Mathilde Neder
0 psicologo no hospital
Chamada para participar dos trabalhos de Rea
bilitagao, pelo professor Godoy Moreira, em 1957,
eu ja conhecia e respeltava a equipe médica da
COT, pela seriedade, avanco e forma de atuar, reco
mhecendo e valorizando a contribuicao do trabalho
psicolégico no hospital. Além do interesse e traba.
Iho com cirurgiados, era bastante importante a
acéo colaborativa que desenvolviamos com a equi:
pe de Paralisia Cerebral, liderada pelo prof. Eneas
de Brasiliense Fusco e com Grupos de Paraplégi.
cos, Hemiplégicos e Amputados, na mesma COT,
paralelamente a0 atendimento no INAR. Inicia.
‘vam-se as atividades praticas do Instituto Nacional
de Reabilitacao, para pessoas portadoras de defi
ciéneia fisica incapacitante, com apoio da Organi:
zacéo das Nacées Unidas. Excelente trabalho moti.
vaclonal, 0 do professor Godoy Moreira: compare.
endo para uma entrevista por ele solicitada, jé
no inicio dela fui por ele conduzida a presenca da
pessoa que, internada, deveria ser a candidata nt
1 para reabilitagdo — uma garota paraplégica, por
acidente de avido. Pediu-meo professor um estudo
iagnéstico e por ele fui convidada a apresentar
esse estudo e participar de sua discussao, junto
& equipe de reabilitacao, que se formava: com Mr.
Allbright, coordenador pela ONU, junto a coordenagéo
brasileira e com diferentes técnicos, especialistas
de diferentes partes do mundo, ali presentes; dentre
eles Karen Lindborg, fisioterapeuta sueca, Mr. Jen
quins, protético ortopédico dinamarques, Mr. Asen:
Jo, americano, especialista na reabilitagao de def.
‘ientes visuais, todos enviados da ONU. Do Brasil
em Servico Social, Ié estava Luiza Banducci e, como
“Voracional Counselor’, alf conheci Wilma Seabra
Mayer, ambas com especializacéo nos Estados Uni
dos, Meu interesse surgiu ¢ cresceu. Eu me encantel
‘com o trabalho organizado de um grupo capaz, de
alta considera¢do ao ser humano que, na COT,
efetivado pela Drt Lourdes de Freitas Carvalho, en.
tho diretora executiva, Aceitel a proposta de traba
Iho do Prof. Godoy Moreira, em acordo com a Dr:
Lourdes, iniciando-me, entéo, no trabalho de reabili.
tagdo em hospital. Com todos aprendi e pude dar
Ihee a colaboragdéo paicologica de que necesita
vam, ao nivel de minha formacao. Eu nao tinha
estudos especificos de psicologia para hospitais
Mas, de formago generalista, busquei a formacao
psicolégica, por onde pude. -anao tinhamos
"ursos regulares de Psicol 3s formados
em Pedagogia, Filosofia, ou Ciéneias Sociais, A for.
macdo especifica em psicologia vinha das especiali
ages, dos estagios. Atuei junto a Noemy da Sil
veira Rudolfer, na USP, como observadora e cola.
boradora no trabalho terapéutico, praticando a ob.
servacéo familiar, cont{nua, inclusive noturna,
além de assisti-la em grupos terapéuticos e de for.
mac4o de terapeutas ocupacionais que, na época,
‘ainda nao tinkam cursos regulares no Brasil; atuel,
na USP, junto a Otto Klineberg, grande mestre em
Psicologia Social, junto a Egon Schaden, a Bastice,
Alfredo Ellis, Dreyfus, Anibal Silveira e Durval
Marcondes, nas areas varias de Antropologia, So.
REY. DE PSICOLOGIA MOSPITALAK DO MC 11) 615, 1992
clologia, Filosofia, Biologia, Historia da Educacio,
Pedagogia. Orientacdo Educacional, Psicodia.
gnéstico de Rorschach e Psicanalise. Nao tinhamos,
entao, especialidades por areas, mas a Psicologia
do Trabalho se engrandecia e proporcionava em.
regos. A formacao em Psicologia Clinica se impos
eu fiz 0s dois cursos da época: no “Sedes Sapien.
tiae”, com Madre Cristina, de 1954 a 1956 ena USP
(4955 — 1956), com Anita de Castilho e Marcondes
Cabral, de que participavam Durval Mareondes,
Virginia Bicudoe Lygia Amaral. Fiz estagio no Hos.
pital Psiquiatrico do “Juqueri”, em Franco da Ro-
cha, onde eram nossos mestres Anibal Silveira, Mé
rio Yahn, Edgard Maffei. Lé estavam Krinski, A. Mi
leto, Gaiarsa, Rica convivéncia, de que nos resultava
uma aprendizagem continua. Estagiei tambem na
Clinica de Higiene Mental da Secretaria da Educa.
‘cao, novamente com Durval Marcondes e também
com Virginia Bicudo e Lygia Amaral, enquanto pro
fessores e supervisores psicanalistas do curso de es
ecializagao que eu fazia na USP. Fiz visitas e/ou
lestagios em Clinicas e Hospitais europeus e norte
americanos depois de, no Rio de Janeiro, estagiar
no Instituto de Selecéo e Orientacao Profissional
— ISOP e em clinicas psicol6gicas. Essas e outras
investidas eram feitas, entéo, a par da pratica em
magistério, Tive uma formacao diversificada, por-
tanto, com énfase na flosofia, psicologia do desen,
volvimento, psicopatologia, pedagogia, sociologia,
antropologia, neurologia, biologia e areas afins,
lem da psicologia “geral”, psicologia social, psico
logia educacional. S6 mais tarde, como grupo, iria
mos trabalhar intensamente para reunir, num Cur.
so de Psicologia, as disciplinas basicas necessérias.
Essas e outras constituiam minha experiéncia no
infcfo de minhas atividades
Em meu trabalho, na Reabilitacdo, contava
com a colaboracao dos psicdlogos Mire] Granato.
wiez, Lucia Bonilha e Eneiza Rossi. Era um traba
Iho em que se destacava sempre a abordagem da
pessoa como um todo, consideradas as diferencas
‘individuals. As pessoas eram vistas em suas intera
‘¢oes umas com as outras, na instituleao hospitalar,
na famflia, nos ambientes em que viviam, na comu
idade (Neder, 1967). Sem caracterizar as pessoas
“em funcéo da deficiéneia fisica, esta era por mim
considerada como um dos contribuintes para sua