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BIOQUÍMICA II

DISLIPIDEMIAS E ATEROSCLEROSE
Parte 1: as lipoproteínas
As lipoproteínas têm a seguinte estrutura: têm formato esférico, com duas partes:

 Concha hidrossolúvel: parte externa composta por fosfolípides,


apolipoproteínas e colesterol livre.
 Centro hidrofóbico: parte interna composta por colesterol esterificado e
triglicerídeos.
As lipoproteínas diferem na densidade, nas composições das apolipoproteínas e no
conteúdo de colesterol e triglicerídeos:
Quilomícron: 90-99% de triglicerídeos, são produzidos em resposta à alimentação e
refletem, então, o que comemos. Transportam apenas os Ácidos graxos de mais de 16
carbonos, e tem como apoproteína a APO B 48 (também tem A1, A2, C, E)
VLDL: reflete lipídeo hepático e contém 60% de TAG. É, junto com os quilomicrons,
transportador de TAG no sangue. A apoproteína é APO B 100, uma que possui um
domínio hidrofóbico muito grande, não podendo ser intercambiada. (possui também C
e E)
IDL: 50% de TAG e 50% de colesterol. Possui APO B 100 e APO E e APO C
LDL: possui 20% de proteína, 50% de colesterol e 8% de TAG. Toda a proteína está em
um APO B100. Por possuir muito mais colesterol, é sua transportadora do fígado para
os tecidos, que preferem captar via externa do que produzi-lo via HMG.
HDL 2 E HDL3: São transportadoras que possuem 40% de proteína e 30% de
fosfolípides, sendo altamente hidrossolúveis. Também transporta colesterol. Possuem
as maiores densidades e os menores diâmetros. Possuem APO A1, A2, C, E
Funções das apolipoproteínas

 Ativar enzimas envolvidas no metabolismo de lipídeos (LCAT e LPL)


 Manter a integridade estrutural do complexo lipídeo-proteína
 Transportar lipídeos para as células por meio de receptores de superfície.
 A: co-fator para LCAT. A1 estimula e A2 inibe atividade dessa enzima
 C2: co-fator para lipase lipoproteica
 B e E: ligantes de receptores de superfície
 (a): estruturalmente semelhante ao plasminogênio, mas sem capacidade de
clivagem da rede de fibrina, impedindo que o trombo se desfaça.
Metabolismo das lipoproteínas
Na via intestinal, os AG saturados em volta de B 48 estimulam o “englobamento” dos
TAG pelos quilomícrons. Eles então são absorvidos pela linfa, vão para o ducto torácico
e encontram a circulação sanguínea. Lá, o quilomicron é enriquecido pela HDL com
APO C e APOE, chega nos capilares e no tecido adiposo, onde, com ajuda da APO C II,
sofre ação da lipase lipoproteica, que transforma os TAG em AG + glicerol, para
incorporação no adipócito dos AG (e o glicerol vai para o fígado). A perda de centro
hidrofóbico torna necessária a perda da concha também, que volta para o HDL
(discoide) e transforma o quilomícron em quilomícron remanescente. O quilomícron
remanescente vai ser incorporado pelo fígado por meio de 3 receptores: a APO E se
liga aos receptores LDLr e LRP, e a APO B 48 se liga aos receptores de heparan sulfato,
dando estabilidade (HSPG)
Na via hepática, o fígado secreta VLDL em resposta ao que a pessoa comeu, rico
também em TAG. Também ocorre, no sangue, a transferência de APO C e APO E, e,
com a apo C II, ocorre novamente a formação de AG livre e glicerol por ação da LPL.
Ocorre perda da concha novamente, para formar outro HDL nascente, e o VLDL
remanescente é o IDL. O IDL consegue se ligar também ao LDLr (por meio de APO B
100) ou ao LRP (por meio de APO E) e é incorporado pelo fígado, mas nem todo IDL
consegue sê-lo.
O IDL que não conseguiu ser recaptado pelo fígado sofre modificações: ocorre um
intercâmbio com HDL de forma que o HDL fornece colesterol esterificado para o IDL e
o IDL fornece TAG e APO E para o HDL. Isso ocorre por meio de CETP, proteína de
transferência de éster de colesterol.
Após ganhar colesterol e perder TAG e APO E, o IDL se torna LDL, que vai ser a forma
de transmissão do colesterol para os tecidos periféricos. Funciona assim:
LDL se liga ao seu receptor (LDLr) por meio de B 100, e a clatrina promove a endocitose
do ligante + receptor, de forma que o receptor é reciclado. O colesterol na célula é
bem regulado, por meio de 2 mecanismos: ocorre a sua esterificação (por meio de
ACAT) para armazenamento, ou ocorre inibição de HMG CoA-redutase, enzima que
realiza a formação de colesterol endógeno. O problema dessa regulação é o excesso de
colesterol, que impede que LDL entre inteiro, e no ambiente vascular ele sofre
alterações, tornando-se minimamente oxidado.
Na hipercolesterolemia familiar, ocorre ausência ou ineficácia dos receptores de
LDL nos tecidos periféricos. Com isso, o intestino absorve e o fígado sintetiza
VLDL normalmente, sem que haja interiorização do colesterol pelos tecidos e por
ele, o que dá hipercolesterolemia e colesterol intracelular normal (pela regulação
interna). O tratamento geralmente é transplante hepático (pelo menos o fígado
consegue diminuir) e nos casos de serem heterozigotos, as statinas conseguem
melhorar um pouco. Sinais clínicos dessa doença são xantomas (nódulos na pele
por acúmulo de LDL no interstício, que é fagocitado pelos macrófagos) e
xantelasma (arco senil da íris em indivíduos mais novos).
A formação do HDL tem 2 vias: a que já discutimos ao longo de todo o processo, que
envolve a perda da concha hidrofílica, ou a síntese por hepatócitos, macrófagos e
outras células.
A APO A 1 é característica de HDL, e é produzida pelo fígado e pelo intestino. Quando
ela se aproxima das células, a ABCA1 transporta o colesterol para próximo dela. O
complexo APO A1 + colesterol livre + as outras proteínas é o HDL 3. A enzima LCAT, na
presença de APO A 1, então, irá esterificar esse colesterol, pegando um fosfolípide
para isso. À medida que o HDL vai ganhando colesterol esterificado, ele vai se
tornando HDL 2 A (que possui a CETP) e HDL 2 B (que ganhou TAG já).
O HDL não precisa do VLDL para transferir o colesterol e o TAG para as células. Ele
utiliza, para isso, SRB1, liberando o conteúdo lipídico para a célula. O que ficou é
novamente HDL remanescente.
Isso explica por que LDL alto é ruim (indica excesso de colesterol, que fica retido no
sangue) e HDL é bom (indica alta reciclagem)
A APO (a) é uma apolipoproteína que fica em LDL e é aterogênica, pois cobre o coágulo
e impede que o ativador de plasminogênio (tPA) funcione, ao ativar PAI-1.
Parte 2: aterogênese
Para iniciar a história da formação do ateroma, primeiro deve-se saber que os 3 pilares
para que ele se consolide são: o colesterol, a inflamação e o coágulo.
Nas artérias, em regiões de tortuosidade, ocorre diminuição da força de cisalhamento,
o que leva ao turbilhonamento do sangue. É nessas regiões que ocorre a formação do
ateroma.

Consideração importante: a medição de colesterol no sangue é feita ou por


dosagem Col total- HDL- TAG/5 (LDL) ou por Col total – HDL (colesterol não HDL).

O LDL em excesso no sangue pode sofrer diversas modificações, como por exemplo,
glicação ou oxidação, o que o impede de ser captado pelas células. Ele, então,
consegue passar pelo endotélio e chegar na íntima ou por via paracelular ou por via
transcelular (pela expressão de CD36). Como consequência, ele induz o endotélio a
expressar moléculas de adesão (ICAM, VCAM) e fatores quimiotáticos para
macrófagos, atraindo-os. Inicia-se a resposta inflamatória. Depois, esses macrófagos
expressam CD36, produzem radical livre e fagocitam cada vez mais o LDL, tornando-se
células espumosas, ou seja, células com lipídeos ocupando o citoplasma e levando o
núcleo para a periferia. As células espumosas atraem cada vez mais monócitos, e elas
começam a expressar metaloproteínas e fatores de crescimento para proliferação
celular de células musculares lisas, que também migram para a região. Essas células
musculares lisas começam a se tornar células espumosas também, e ocorre migração,
também, de LTH1. O ateroma está formado, e seu centro é isquêmico, havendo
angiogênese para tentar conter esse processo (mas esses vasos podem trombosar
também). Ocorre, também, a formação de uma capa fibrótica, que mantém o ateroma
preso na íntima do vaso (assim, quanto mais estável essa capa, mais difícil é romper o
endotélio).
O rompimento do endotélio é o maior problema de todo o processo, pois com isso há
formação de trombo ou de êmbolo, por ativação da cascata de coagulação. Como isso
ocorre em um processo longo, geralmente o organismo consegue abrir vasos colaterais
e desviar o fluxo sanguíneo para eles, a fim de impedir o infarto. Se isso não dá tempo,
porém, ocorre o infarto.
As lesões do ateroma são classificadas em primária (só existem células espumosas),
intermediária (existe a capa fibrótica, mas não há necrose) ou madura (existe capa e
necrose).
Qual o papel do HDL?
1. Inibe a expressão de moléculas de adesão do endotélio para ativar monócitos
2. Promove efluxo de colesterol por meio de ABCA1 (aquela molécula que na
presença de APO A 1 leva o colesterol ao seu encontro), impedindo que os
macrófagos se tornem células espumosas.
3. Não reduz o ateroma, mas diminui a velocidade de formação dele.
Parte 3
Fatores de risco de infarto:

 Hipercolesterolemia: por si só já aumenta os riscos de infarto


 Hipertensão
 Hiperglicemia aumentam em sequência os riscos (junto c col)
 Tabagismo
 HDL baixo

1. Histórico familiar de doença coronariana prematura (homens abaixo dos 55 e


mulheres abaixo dos 65)
2. Idade: mulher > 55 e homem >65 influência hormonal
3. HDL <40 (HDL>60 é fator de proteção)
4. Hipertensão
5. Tabagismo
Obs: diabético nem é tido como fator de risco pois já é tratado como uma pessoa que
já infartou, ainda que não tenha infartado.
Estratificação do risco:
Para se saber a estratificação do risco, deve-se realizar 3 etapas:
1) Determinar se existe doença aterosclerótica
2) Utilizar os escores de predição do risco
3) Reclassificação do risco pelos fatores agravantes dele
O risco absoluto final, após esse processo, fica:
BAIXO H e M <5%
MÉDIO H: 5<x<20 M: 5<x<10
ALTO H: >20 M: >10
1)doenças ateroscleróticas e equivalentes são: diabetes mellitus, doença renal crônica,
aterosclerose (pode ser na forma subclínica também, sem haver infarto mas com
achados nos exames)  já são classificados como alto risco!!!
2)se não houver critério para preencher o 1, o indivíduo passa por um escore de risco,
com características pessoais (não leva em conta o IMC!!).
3)Se o risco encontrado for médio, deve-se atentar para os seguintes agravantes, que,
se presentes, classificam em alto risco:
- doença coronariana em parentes de PRIMEIRO GRAU (<65 H e <55 M)
-síndrome metabólica
-proteína C reativa alta
-índice íntima/média das artérias alto
Meta terapêutica com hipolipemiantes
LDL N HDL
Baixo risco: <160 <190
Médio risco: <130 <160
Alto risco: <100 <130
Diabetes e <70 <100
Aterosclerose:
HDL Triglicerídeos
Homens ≥40 <150
Mulheres ≥ 50 <150
O que significa colesterol não HDL? São os valores conjuntos de LDL, IDL e Lp(a), que
correspondem às partículas aterogênicas e se relacionam bem com os valores de APO
B.
Valores de colesterol:
Ótimo Desejável Limítrofe Alto Muito alto
Col total: <200 200 a 239 ≥ 240
LDL: <100 100 a 129 130 a 159 160 a 189 >190
N HDL : <130 130 a 159 160 a 189 >190
Mudanças no estilo de vida
Para reduzir LDL:

 Reduzir gordura saturada (<7%)


 Reduzir colesterol (<200mg/dia)
 Esteroides vegetais
 Gordura monoinsaturada (<20%)
Influência dos AG no colesterol
Em relação aos carboidratos, todos os AG aumentam o HDL.
Os AG SAT aumentam tanto o HDL quanto o LDL
Os AG PI diminuem ambos
Os AG MI aumentam o HDL e diminuem o LDL
Os AG TRANS aumentam o LDL e diminuem o HDL, e são encontrados em biscoitos,
margarina em barra, pães. (Ingestão usual: apenas 2-3% da energia total)
Os AG ω-3: reduzem a produção de VLDL pelo fígado (aumentam o catabolismo e
diminuem TG), reduzem a viscosidade do sangue, promovem maior relaxamento do
endotélio e tem efeitos anti-arrítmicos, mas, apesar disso tudo, diminuem o HDL e são
mais passíveis de oxidação. Em indivíduos normais, não altera o colesterol, mas pode
aumentar o LDL em hipertg. É anticoagulante e anti-inflamatório.
Os AG ω-9: exercem os mesmos efeitos que ω-3 sem abaixar o HDL. São encontrados
em azeite de oliva, oleaginosas (nozes, castanhas, amêndoas), abacate
Influência das fibras
As fibras solúveis reduzem o tempo de transito gastrointestinal, e a absorção dos sais
biliares (que obriga o fígado a captar mais colesterol para garantir mais bile). Em
algumas pessoas, ao invés disso, ocorre aumento de HMG CoA redutase
As fibras insolúveis aumentam a saciedade, reduzindo a ingesta calórica
Recomendação: 25 a 38g/dia. Para reduzir colesterol é necessário ingerir 10 a 15 g/dia
Influência do colesterol alimentar
Não há muitas evidências sobre o colesterol alimentar aumentar o LDL. Sabe-se que
100mg/dia de colesterol ingerido o colesterol total aumenta de 2-6mg
Influência das proteínas
Proteína animal aumenta a colesterolemia comparada com a proteína vegetal (maior
quantidade de B100)
A soja reduz a colesterolemia de 5 a 10% em relação à caseína
Influência dos esteroides de plantas
Eles interferem na absorção do colesterol pelas micelas, pois elas terão mais os
esteroides vegetais e menos o colesterol. Com isso, não há indução à saída de VLDL
pelo fígado. Não altera a absorção de gorduras
Redução total do colesterol:

Gordura saturada (10%) + colesterol alimentar (3%) + fibras (3%) + fitoesterois (10%)
=26% só de redução com a dieta

Alcool: efeito dúbio

Em baixas quantidades, o álcool pode prevenir doenças ateroscleróticas. Em altas


doses, porém, ele estimula a presença delas.

Exercício físico

Recomendação são 30 min por dia por no mínimo 5 dias na semana (o ideal seria todos
os dias). Com perda de 5 kg o LDL abaixa de 5 a 10% e o TG 15%. Com o exercício
regular, abaixa o TG 24% e o HDL aumenta 8%

Tabagismo

É um fator de risco independente para a aterosclerose. Pacientes devem ser


acompanhados para evitar recaídas e melhorar o enfrentamento. Como tratamento,
pode-se utilizar goma de mascar, adesivo de nicotina, norptilina, bupropiona

Medicamentos

 Estatinas: inibem a HMG-CoA redutase, o que diminui o colesterol no interior


da célula. O baixo colesterol intracelular estimula maior produção de LDLr, o
que aumenta a absorção de LDL do sangue. Esse baixo colesterol intracel
diminui também a secreção de VLDL
 Ezetimibe: inibe a proteína NPC1-L1, responsável por transportar o colesterol
para os enterócitos e promover sua absorção. Com isso, há menos colesterol
chegando ao fígado, menos LDLr no fígado e menos colesterol nas lipoproteínas
aterogênicas. (reduz LDL 10 a 25%)
 Inibidor da PCSK9, uma proteína que direciona o receptor pra degradação. Com
isso, ocorre menor degradação e o receptor fica por mais tempo.
 Resinas de troca iônica: ligam-se aos ácidos biliares de forma covalente, e com
isso aumentam a necessidade de captação dele pelo fígado e abaixa o LDL de 3
a 30%
 Niacina: diminui tg por diminuir a mobilização de AG para o fígado, o que
diminui VLDL. Aumenta HDL em 25%, reduz LDL em 15-18% e TG em 20-40%.
REDUZ Lp(a) em 30%
 Fibratos: aumentam a sensibilidade à insulina

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