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16/12/2018 Educação Pública - Semântica dos desenhos infantis

Semântica dos desenhos infantis


Salmo Dansa
Mestrando em Design da PUC-Rio

Aparecida

A gente morava numa casa que tinha um quintal bem grande nos fundos e na
frente um jardim também. No interior tem muito disso, né? E um dia apareceu
uma cachorra, dessas cachorras vira-latas, mas era uma cachorra alta, grande
assim, sabe? Apareceu na porta de casa lá, você sabe como criança gosta de
cachorro... Aí:

- Olha a cachorra!

Ela veio, foi andando assim, meu irmão mais velho chegou... e minha mãe disse:

- Não brinca com cachorro porque é perigoso, não sabe se ele é bravo ou não!

Mas a cachorra gostou do agrado dele, foi ficando ali. Depois a gente foi
embora, foi dormir. No outro dia a cachorra estava lá de novo. Gostou, né? Todo
mundo lá, todo mundo ficou brincando com a cachorra, passando a mão e a
cachorra foi gostando, foi ficando lá. E a gente botou o nome dela de Aparecida,
porque ela apareceu lá. No final, foi a mesma história do cavalo:

- Ah, deixa mãe, deixa ela ficar, deixa!

- Não, você não sabe de onde veio.

- Deixa, deixa...

Aí a cachorra ficou. A gente dava comida , dava água. Ela não ficava dentro de
casa, era no quintal. Coitada, porque meus irmãos menores subiam, montavam
na cachorra como se fosse cavalo, e puxavam, e ficavam naquela brincadeira.
Mas lá no interior tem leiteiro, não sei se você já ouviu falar. Antigamente a
gente recebia o leite na porta de casa, o leiteiro levava, e o padeiro levava pão.
Então, eu acho que era muito de noite... a cachorra passou a perseguir o leiteiro
e o padeiro. Com a gente ela era mansinha, mas com qualquer outra pessoa da
rua ela avançava. Aí começou a dar problema, se o portão estivesse aberto era
perigoso.

Acabou que meu pai teve que dar a cachorra. Um cara foi e levou, sei lá, um
homem que passava lá e estava falando com ele levou. Levou para um sítio,
bem longe. Não é que no outro dia a cachorra voltou? A cachorra voltou
sozinha!

Mas aí não teve jeito, tivemos que nos desfazer. Foi aquela choradeira, todo
mundo chorava, queria a Aparecida.

Introdução
A história descrita acima é a transcrição literal da gravação da
Veja os desenhos
voz de D. Emilia Stibller, reproduzida oralmente para seis turmas
das crianças
de 1ª e 2ª séries do ensino fundamental, com idade média entre
7 e 9 anos, em escolas municipais do Rio de Janeiro. Esse
trabalho gerou um grupo de desenhos que foi analisado à luz do design de forma verbal e escrita, de acordo
com elementos morfológicos que se apresentam nas narrativas.

Uma análise verbal dessas imagens representa o caminho inverso do percurso da pesquisa de campo, uma
vez que ali a transposição ocorreu da linguagem verbal para a linguagem visual. Percorrer o trajeto de
retorno à linguagem verbal é uma tentativa de um ciclo.

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A proposta de partir de uma categoria específica de imagem e fazer uma leitura verbal - descritiva, crítica
ou analógica - já é em si um procedimento pertinente à semântica do produto. Figura ainda a possibilidade
de infinitas subdivisões abrangendo a descrição do processo, da forma ou da linguagem. A crítica e as
diversas vertentes filosóficas do domínio da Estética possuem ferramentas teóricas elaboradas ao longo de
séculos, no intuito de entender a linguagem das artes visuais. No entanto, a analogia entre desenho
e design é etimologicamente abrangente, uma vez que se estende desde a palavra até o objeto
do design em sua origem.

Dessa forma, levando em conta tanto semelhanças quanto diferenças, este trabalho é uma tentativa de
criar o necessário distanciamento da questão funcional e objetiva e se posicionar no cruzamento das duas
linguagens, ou seja, no ponto da visualidade.

Semântica do produto é o estudo das qualidades das formas feitas pelo homem no contexto cognitivo e
social de seus usos e a aplicação do conhecimento aos objetos de desenho industrial. O objeto de estudo
deste trabalho são imagens feitas por crianças no contexto de sua produção.

A procedência do objeto é determinante no tipo de abordagem, para que se possa enumerar e


eventualmente aprofundar os diversos itens que dizem respeito à comunicação visual dessas imagens. O
contexto no qual o processo acontece certamente inspira um olhar educacional sobre o objeto. Por outro
lado, a questão da subjetividade emerge como fator de diferenciação e legitimação da linguagem,
demarcando diferentes caligrafias a partir das mesmas ferramentas.

Apesar disso, a ideia aqui não é ver o desenho somente pelos atributos psicológicos e educacionais, mas
focalizar principalmente as características formais que lhe são peculiares. Para isso algumas providências
foram tomadas a fim de manter os desenhos livres de interferências externas ao processo e sob as mesmas
condições de realização. O mesmo tempo de realização para todos os participantes (45 minutos), o mesmo
espaço de trabalho (sala de aula), o mesmo material disponibilizado (caixa de lápis de cera de 6 cores e
uma folha de papel A4) e o mesmo narrador contando a mesma história.

É preciso, antes de qualquer coisa, perceber que esses cuidados em controlar as condições em torno do
experimento nunca mantêm o objeto totalmente "impermeável" às influências do meio ambiente em se
tratando de ciências humanas. Além disso, os fatores controlados na pesquisa de campo se referem não
somente à melhoria das condições básicas de produção e observação do trabalho, mas à relação de tempo,
espaço, matéria e observador, como um conceito estrutural do nosso mundo, inserido no discurso individual
e coletivo, abrangendo necessariamente o design.

Na semântica do produto podemos classificar esses fatores em quatro tipos de influência sobre o
relacionamento com o objeto: O tempo em função ao desgaste, obsolescência ou evolução.
A materialidade em função da estrutura, forma e configuração. O entorno em função do ambiente, situação
e inserção. E o usuário em função do repertório, gosto e ergonomia, esse último poderá ser substituído
pelo observador no caso da pesquisa. É interessante notar que esses elementos existem com a mesma
relevância nas duas instancias, podendo ser vista como um outro ponto de encontro entre a semântica do
produto e a pesquisa em questão.

A forma e o conteúdo
Desde os primeiros meses de vida, a visão é determinante para a noção de espaço e para a experimentação
do mundo no sentido do conhecimento dos objetos e pessoas à nossa volta. Essas imagens parecem formar
algo como um arquivo mental, construído inconscientemente ao longo do tempo. Mas o sistema visual não
é simplesmente uma câmera, um receptor e registrador direto de informações. O olho e o cérebro, juntos,
constituem um sistema organizado que analisa e processa a grande quantidade de dados que vem do
mundo exterior.

O mundo, cada vez mais visual, privilegia largamente os espaços


Veja os desenhos
da cognição, do prazer, do trabalho, que são viabilizados através
das crianças
de interfaces visuais. Estas interferem diretamente nas nossas
relações com o mundo e estão relacionadas aos conceitos de pós-

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modernidade. Na interface o usuário se reconhece, identifica a sua subjetividade e espera um retorno,


vinculando entendimento e confiança.

O desenho infantil participa como interface de comunicação entre dois sistemas: o sistema biológico,
psicológico e cultural do sujeito dessa linguagem, e o sistema sociocultural do mundo onde ele vive. Como
representação ele é capaz de trazer informações a respeito da subjetividade desse sujeito e de intermediar
relações apontando desejos e afirmando identidades.

Uma primeira relação entre design e desenho infantil seria a origem dessas linguagens no imaginário,
fazendo parte necessariamente da dimensão criativa (ideológica, discursiva, fantasmática, invisível,
dialética etc.) do sujeito.

...Assim podemos entender o trabalho de design como um trabalho de criação e


recriação da própria significação efetuada através das "coisas". Nesse sentido
podemos dizer que o imaginário constitui a própria matéria que é trabalhada por
essa atividade: a sua "matéria-prima".

Por outro lado, papel dos recursos visuais na comunicação passa pela ideia de qualificar o signo, atribuir
significado, argumentar com a forma. As ferramentas de que dispomos para o entendimento e re-
significação dos objetos e imagens são praticamente as mesmas para criadores e consumidores. Isso tem
transformado as nossas relações interpessoais e com as imagens em geral.

O que caracteriza o signo é o fato de ser interpretável. É a interpretação que transforma uma figuração em
signo. O design lança mão de signos como elementos de retórica, dando a eles um novo sentido e
tornando-os comuns à maioria dos objetos. Nesse contexto percebe-se uma eventual troca de papéis entre
signo/objeto e criador/usuário, num tipo de interação francamente dialógica. Essa relação signo/objeto é
encontrada na definição de signo apresentada por Santaella (citando Pierce), que explica o componente do
signo chamado de interpretante:

Um signo intenta representar, em parte pelo menos, um objeto que é , portanto,


num certo sentido, a causa ou determinante do signo, mesmo se o signo representar
seu objeto falsamente. Mas dizer que ele representa o objeto implica que ele afete
uma mente de tal modo que, de certa maneira, determine naquela mente algo que é
mediatamente devido ao objeto. Essa determinação na qual a causa imediata ou
determinante é o signo, e da qual a causa mediata é o objeto, pode ser chamada o
interpretante.
SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1994.

Um exemplo clássico da circularidade dessas relações é o computador, com seus programas gráficos que
habilitam o usuário a produzir e consumir virtualmente através da mesma ferramenta. A possibilidade de
configurar objetos ou criar interfaces de diversas formas, acessar informações e inseri-las na rede a um
custo cada vez mais baixo, facilita enormemente as práticas profissionais e satisfaz desejos de realizar
coisas que eram praticamente impossíveis sem esses recursos.

A verdade é que a fruição e a criação estão intimamente ligadas e inseridas num mesmo processo onde a
expressão e o consumo são o início e o final de um mesmo ciclo e se encontram nas extremidades do
processo. Se usuário e criador se complementam no ciclo de vida do objeto, é natural que o consumo tenha
um papel fundamental no processo criativo e vice-versa. É na formação de repertório, na aquisição de
linguagem e na vivência do processo criativo que o consumo contribui com a criação. A formulação do
discurso de qualquer natureza passa necessariamente pela experimentação desse discurso.

Da mesma forma, pode-se dizer que a expressão é uma consequência natural do consumo. O que ocorre é
que a expressão transforma o objeto em contato com a subjetividade, num processo seletivo onde a forma
de expressão é fruto de um embate entre as informações contidas no objeto e as qualidades e necessidades
do sujeito, de acordo ainda com alguns fatores como o ambiente e o contexto.

A narrativa verbal, escrita ou oral, e a comunicação visual se relacionam de forma circular numa constante
retroalimentação mútua que se percebe, de uma forma mais abrangente, desde as relações entre teoria
e práxis no design e, de uma forma mais específica, na grande quantidade de informação contida nas

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embalagens e interfaces, na publicidade e no audiovisual, que em suas diversas formas é o sistema onde
estas partes mais se aproximam.

Na relação entre o discurso oral do idoso e o discurso visual da criança existe a mesma retroalimentação
circular entre a palavra/imagem e entre a expressão/consumo. Ecléa Bosi se refere às histórias narradas
por idosos como o principal legado formador da memória no nível individual e coletivo:

Talvez a maior contribuição da tradição oral seja para com a memória; é nela que
vai se imprimir no tempo de cada um as marcas adquiridas ao longo da vida. Ao
passar adiante suas histórias, o narrador dá sentido a essa fase de sua vida. A
criança, por sua vez, recebe dos antigos não só os fatos, mas se envolve
profundamente em tudo aquilo que inconscientemente estará formulando suas
raízes. Sem essa experiência, nossos filhos podem aprender a lidar com dados do
passado, mas não com a memória.
BOSI, Ecléa. Memória e sociedade - Lembrança de velhos. 3ed. São Paulo: Cia das
Letras, 1994.

A semântica do desenho infantil em Klaus Krippendorff


No Contexto da Gênese descrito por Klaus Krippendorff, o autor
Veja os desenhos
representa a criação no design de modo mais abrangente,
das crianças
através de um gráfico chamado Ciclo de Produção e Consumo,
unindo designers, engenheiros, produtores, fornecedores,
distribuidores, anunciantes, vendedores, consumidores, usuários, gerenciadores do lixo, cientistas,
pesquisadores e agentes reguladores num contínuo processo de autopoiésis.

É nesse contexto também que o desenho se relaciona de forma mais íntima com o design, na criação de
ilustrações, sketches, plantas, descrições de usos, especificações, estratégias corporativas e campanhas
publicitárias. No entanto, a ênfase maior dada no contexto da gênese será ao fato de artefatos viverem um
contínuo processo de transição, devendo sobreviver a sucessivas transformações manifestadas pela
necessidade de sobrevivência no seu ecossistema.

A informação é o argumento do design agrupada num conjunto lógico. É o discurso que faz a ponte entre
sujeito e objeto, conduzido pelo desejo. No entanto a existência de um discurso como objeto propõe uma
troca de papéis, ou seja, o objeto passará a fazer a ponte entre o sujeito e o discurso.

Se olharmos uma coisa de frente, ou seja, com desinteresse e objetividade, não discernimos nada a não ser
uma mancha sem forma; o objeto só assume contornos discerníveis se olharmos "de um ângulo" ou seja,
com um olhar "interessado", sustentado, permeado e deformado pelo desejo. O desejo que de certa
maneira é formador da objetividade do discurso.

Klaus Krippendorff afirma que "objetos participam na comunicação humana e apoiam linguísticamente as
práticas sociais". A aplicação desse conceito a esta pesquisa se reforça à medida que ele segue afirmado a
relação em quatro itens: expressões de identidade do usuário; sinais de diferenciação e integração
social; conteúdos da comunicação; e apoio material para relacionamentos sociais.

O autor assinala em expressões de identidade do usuário a maneira como as pessoas abandonam


totalmente ou atribuem um papel secundário aos critérios técnicos e utilitários nas escolhas e relações com
objetos, em favor de uma identificação pessoal e subjetiva. "Os critérios se baseiam mais nas considerações
da Gestalt, se referindo sobretudo à forma pela qual usuários tecem suas próprias identidades dentro da
produção simbólica da sociedade.".

Citando Clare Cooper, ele identifica a casa como um lugar onde indivíduos se sentem no centro do próprio
universo autoconstruído, onde a sua identidade é indistinguível das coisas escolhidas para simbolizá-las.
Essa afirmação se aplica também às representações de casas, assim como de objetos e pessoas,
simbolizando no desenho quem ela é ou deseja ser.

Em sinais de diferenciação e integração social, Krippendorff destaca o fato de que o desejo do indivíduo de
ser diferente, de se diferenciar perante os grupos, é sempre limitado pelo desejo de pertencimento, de

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aceitação pelas pessoas na sociedade. A partir dessa premissa a individualização nunca pode ser total. "O
sentimento de pertencimento ou fazer parte de entidades sociais, classes, grupos profissionais ou
denominações religiosas é, novamente, mediado largamente através do uso deliberado de objetos
particulares".

A atividade de desenho em grupo demonstra algumas semelhanças com essa percepção, na medida em que
acontece uma troca de influências e até uma franca tentativa de "cola" entre participantes durante as
atividades. Isso acontece pela cópia na estrutura do desenho, posicionamento dos elementos no papel e em
formas de representar um arco-íris, uma casa ou uma figura, por exemplo. As semelhanças, assim como as
diferenças, parecem uma forma de autoafirmação ou cumplicidade perante um colega mais próximo ou
influência de um indivíduo de prestígio no grupo.

Coisas são diferenciadas, nomeadas e classificadas através da linguagem. Assim, objetos que não são
claramente diferenciados linguísticamente são também muitas vezes confundidos na prática. Entre outras
coisas, a linguagem pretende fornecer uma identificação média dentro do modelo cognitivo, motivação e
significação para os usuários.

O conteúdo de comunicação pode ser visto como a apropriação de uma categoria de objeto por um nome
ou rótulo de qualificação, diferenciação ou integração. Autores de diferentes áreas classificaram desenhos
de crianças em seus estudos, nomeando estágios de desenvolvimento e formas de expressão da criança,
sendo dessa forma uma nomenclatura inevitável na identificação dessas imagens.

Por mais que exista uma frequente preferência pelo modelo de imagem de casa, árvore, coração, flor etc.,
seguindo aparentemente padrões de "desenho de criança", cada criança vai proceder a uma escolha com
uma motivação particular e subjetiva. Vygotsky se refere a esse processo criativo como uma atividade
mental que se desenvolve gradualmente, estando diretamente vinculada, numa relação dialética, com a
realidade significativa. É o enlace emocional que determina a seleção de pensamentos, imagens e
expressões.

Pelo processo de seleção, a criança separa, de um conjunto, as partes que lhe são preferenciais,
conservando-as na memória. Para a fantasia, assim como para o desenvolvimento mental da criança, o
processo de seleção é fundamental.

Na sua teoria histórico-cultural, Vygotsky trata a fantasia e a imaginação como sinônimos, e afirma que a
relação do homem com o mundo é mediada por signos e instrumentos. O uso de signos conduz os seres
humanos a uma estrutura específica de comportamento que se destaca do desenvolvimento biológico,
criando novas formas de processos psicológicos enraizados na cultura. Assim o conteúdo de comunicação
dos desenhos de criança é consequência das escolhas do sujeito e fruto das relações socioculturais que ele
vive.

Relações sociais sofrem a interferência dos objetos como símbolos demarcadores de propriedade,
cumplicidade ou compromisso. Um exemplo comum é a demonstração simbólica de um tipo de relação
através de um presente. Isso se revela no desenho infantil como interface das relações sociais da criança.
Desenhos de criança são símbolos visuais carregados de forte qualificação subjetiva por remeter a uma fase
da vida repleta de descobertas. Dessa forma o desenho é um produto cultural cheio de significados, passível
de ser produzido pela criança e dado como símbolo da afetividade nas relações sociais.

A comunicação visual se apropria do desenho infantil como significante onde se pretende que o usuário
perceba esse tipo de imagem como signo num determinado contexto.

No Contexto Ecológico, Klaus Krippendorff compara populações de artefatos com os ecossistemas onde
existe interação entre diferentes tipos de produtos. Essa ideia como modelo de comparação coloca o
desenho infantil, nos ambientes onde ele aparece, como signo na identidade visual da criança em
logomarcas, design de interiores, embalagens e outros produtos relacionados à criança. No ambiente
escolar esses desenhos interagem com os outros objetos em níveis diferentes. Eles trocam influência com
imagens impressas em livros escolares e interagem com as ferramentas do desenho como o lápis,

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borrachas, papéis, cadernos, etc. Os desenhos terão ainda uma relação indireta com todos os outros
objetos que vão ocasionalmente ser referências visuais para o desenho.

Conclusão
Descrever as qualidades formais de um objeto requer uma
Veja os desenhos
posição flexível. Por um lado uma leitura subjetiva, própria da
das crianças
interpretação e da abstração na procura por uma equivalência.
Por outro, uma objetividade em organizar elementos, descrever e
sistematizar as relações e significações do objeto em relação ao meio ambiente, ao contexto e
principalmente ao usuário/observador. Por isso "qualidades" tem aqui o sentido de identificar as
características formais que diferenciam o desenho infantil pela ótica do design.

Ainda que o presente trabalho não pretenda apresentar formulações conclusivas, algumas relações
levantadas serão usadas para a formulação de questões a respeito da semântica dos desenhos infantis.

O design se apropria da linguagem abrangente do desenho em identidades visuais. No caso específico dos
desenhos infantis essa relação não ultrapassa os limites da comunicação visual mantendo no conteúdo de
comunicação dessas imagens uma relação direta com o signo e indireta com o objeto.

A imaginação é vista como "matéria-prima" do design e do desenho, este por sua vez participa no contexto
da gênese como ferramenta, se relacionando de forma mais íntima com o design, na criação de
ilustrações, sketches, plantas, descrições de usos, especificações, estratégias corporativas e campanhas
publicitárias.

O desenho é visto como ferramenta no contexto da gênese e é também um fim no âmbito da representação
da criança. Em vista disso se coloca uma questão conclusiva: de que maneira o desenho infantil se tornaria
um produto do design? Ou, melhor: seria o desenho infantil, diante de uma mudança de paradigma, capaz
de participar como atividade projetual, num contexto interdisciplinar de design de produto?

Concluo este trabalho com uma história de ficção que descreve um problema de natureza interdisciplinar.

Numa pesquisa de exploração de um planeta distante, foi lançado o desafio de criar um ser autônomo,
independente, que pudesse sobreviver num meio ambiente novo, em condições muito diferentes das
nossas. Isso reuniu algumas pessoas de diferentes áreas de conhecimento, determinadas a criar um novo
ser capaz de desbravar o lugar para uma posterior colonização humana.

Depois de muito tempo de discussões e trabalho, chegou-se àquilo que poderia se chamar de uma forma
ideal, provida das qualidades necessárias para a sobrevivência, com o pouco que se sabia daquele lugar.
Este ser tinha grande resistência e capacidade de armazenamento de dados a respeito do ambiente. As
informações necessárias à sobrevivência alimentavam um "banco de dados" com todo tipo de ocorrências
potencialmente úteis.

Assim uma população destes seres iniciou a exploração do planeta inóspito.

Depois de algum tempo, infelizmente a maioria dos indivíduos da nova espécie havia sucumbido à
adversidade daquela natureza tão rude, a despeito da sua grande resistência e capacidade de armazenar
dados, possíveis defesas para as dificuldades já experimentadas e sobrevividas.

A verdade é que o resultado, muito abaixo do esperado, se devia ao fato de que o acúmulo de experiências
só habilitaria os indivíduos a lidar com os fatos reincidentes, num mundo desconhecido e imprevisível.
Assim, cada novo problema surgia como um perigo eminente de morte. Seria preciso lidar de uma outra
forma com as dificuldades do lugar, para que as soluções pudessem ser criadas antes dos problemas.

De volta ao laboratório muitas ideias surgiram até que se chegasse à solução: seria colocada uma glândula
no interior de cada indivíduo que premiaria aqueles que fossem capazes de resolver problemas criados por
eles próprios, ou seja, a ideia era desenvolver o "dispositivo do prazer", não só para resolver, mas para
levantar problemas que munissem o "banco de dados" com soluções para questões que ainda não haviam
acontecido.
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Bibliografia
BARTHES, Roland. AULA. São Paulo. Ed. Cultrix.
BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembrança de velhos. 3ª ed. São Paulo: Cia. das Letras, 1994.
COUTO, R.M.S. & JEFERSON, A. O. (orgs.). Formas do design: por uma metodologia interdisciplinar. Rio de
Janeiro: 2AB, 1999, pp. 77-102.
FERREIRA, Sueli. Imaginação e linguagem no desenho da criança. 2.ed. São Paulo: Papirus.
KRIPPENDORFF, Klaus. On the essential contexts of artifacts or on the proposition that design is making
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MAGALHÃES, Álvaro (org.). Enciclopédia Brasileira Globo, vol 1. Rio Grande do Sul: Globo, 1969.
BUCHANAN, Richard. Declaration by Design: Rhetoric, Argument and Demonstration in Design Practice. In:
MARGOLIN, Victor (org.). Design Discourse: History, Theory, Criticism. Chicago: University Chicago Press,
1989, pp. 91-109.
SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1994.
VIEIRA, Sandra Medeiros. Um espetáculo para os olhos ou ilustração como theoria. Rio de Janeiro: PUC-Rio,
2001.
VYGOTSKY, L. S. Imaginacion y el arte en la infancia. México: Hispanicas, 1987.

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