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ANÁLISE EXPERIMENTAL E NUMÉRICA DE CASCAS DE CONCRETO DE

ULTRA-ALTO DESEMPENHO REFORÇADO COM FIBRAS

Jefferson Heleno Brandão

TESE SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DA COORDENAÇÃO DOS


PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE DOUTOR EM CIÊNCIAS
EM ENGENHARIA CIVIL.

Aprovada por:

______________________________________________
Prof. Eduardo de Moraes Rego Fairbairn, D.Ing.

______________________________________________
Prof. Ronaldo Carvalho Battista, Ph.D.

______________________________________________
Prof.ª Michèle Schubert Pfeil, D.Sc.

______________________________________________
Prof. Romildo Dias Tolêdo Filho, D.Sc.

______________________________________________
Prof.ª Eliane Maria Lopes Carvalho, D.Sc.

______________________________________________
Prof. Paulo Batista Gonçalves, D.Sc.

RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL


MARÇO DE 2005
BRANDÃO, JEFFERSON HELENO
Análise Experimental e Numérica de Cascas
de Concreto de Ultra-Alto Desempenho Refor-
çado com Fibras [Rio de Janeiro] 2005
XVI, 128 p. 29,7 cm (COPPE/UFRJ, D.Sc.,
Engenharia Civil, 2005)
Tese – Universidade Federal do Rio de
Janeiro, COPPE
1. Concreto de Ultra-Alto Desempenho
2. Concreto Armado com Fibras
3. Modelagem Numérica
4. Cascas
5. Fissuração.
I. COPPE/UFRJ II. Título (série)

ii
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais Silvio (in memorian) e Olinda pela abnegação para que eu
pudesse viver este momento.
À minha esposa Eurly pelo carinho, incentivos constantes e por absorver, na
minha ausência, parte das atribuições que eram minhas na condução da família.
Aos meus filhos Verônica, Rosamaria, José Elias e sobrinha Adilene, pela
compreensão da minha ausência e pelos encorajamentos.
À minha cunhada Ana Maria pelo apoio a minha família e pelos telefonemas de
incentivos.
Aos professores Eduardo de Moraes Rego Fairbairn e Ronaldo Carvalho Battista
eternos agradecimentos pelos empenhos e orientações cujas idéias motivaram-me a
registrar os aspectos desta experiência. Impossível não dar lugar de destaque à paciência
demonstrada pelo professor Eduardo (Dudu), durante esta jornada.
Aos professores do PEC/COPPE, em especial a Webe pela presença amiga e a
Romildo pela participação ativa em nosso trabalho, além da amizade.
Aos professores Lílian, Adnauer e Cláudio, da UFMT, pelo grande apoio.
Aos funcionários do Laboratório de Estruturas, na pessoa do técnico Flávio.
Aos pesquisadores do Laboratório de Estruturas, Miguel, Guilherme e Sidiclei,
pelas suas contribuições na realização desta tese.
Aos amigos conquistados durante nossa estada na COPPE, Beth, Lea, Kátia,
Catarina, Luciana, Reila, Silvoso, Hishasi, Alex, Eugênia, Tiago, Walber, Emerson,
Jardel, Gadea, Vinicius, Roberto, Santiago, Paulo e outros não citados, pela falha da
memória, pelos agradáveis momentos.
Às Secretárias, Luzidelle e Sandra, por todo apoio administrativo.
Aos Bibliotecários, Zoraide, Geriel, Guilherme e Solange, pelas atenções
dispensadas.
À Universidade Federal de Mato Grosso e à COPPE por terem me
proporcionado a oportunidade da capacitação.
A Paul Acker da Lafarge-França que nos cedeu graciosamente o material
DUCTAL®.
À CAPES que financiou parte desta pesquisa dentro do quadro do Projeto
PROCAD 0155/01-2 e pela bolsa do PICDT.
À FAPERJ que também financiou parte desta pesquisa.

iii
Resumo da Tese apresentada à COPPE/UFRJ como parte dos requisitos necessários
para a obtenção do grau de Doutor em Ciências (D.Sc.).

ANÁLISE EXPERIMENTAL E NUMÉRICA DE CASCAS DE CONCRETO DE


ULTRA-ALTO DESEMPENHO REFORÇADO COM FIBRAS

Jefferson Heleno Brandão

Março/2005

Orientadores: Eduardo de Moraes Rego Fairbaim


Ronaldo Carvalho Battista

Programa: Engenharia Civil

Um grande número de cascas finas de concreto foi construído no mundo nos


anos 50 e 60, mas o uso de tais estruturas foi gradualmente abandonado nas últimas
décadas. Este declínio deveu-se, entre outras causas, ao alto custo da construção, a
dificuldades com armaduras e formas, e à complexidade do cálculo. Entretanto, avanços
na tecnologia de computadores, modelagem do concreto e tecnologia do concreto
criaram um novo paradigma para o projeto e construção de cascas de concreto. Este é o
caso dos avanços em modelagem de concreto com o Método dos Elementos Finitos.
Nas últimas décadas modelos de esmagamento e de fissuração do concreto,
desenvolvidos principalmente no ambiente acadêmico de pesquisa, tornaram-se
operacionais e foram implementados em programas comerciais. Além disto, os avanços
em tecnologia de computação associam o desempenho de códigos de lançamento de
malha, modelagem e visualização permitindo o efetivo uso de modelos complexos de
elementos finitos para as análises cada vez mais desafiadoras. No que concerne a
evolução dos materiais cimentíceos, os concretos de alto desempenho (CAD) e os
concretos de ultra-alto desempenho reforçados com fibras (CUADRF) deixaram o
mundo da pesquisa acadêmica transformando-se em produtos comerciais. Combinando
alta durabilidade e alta resistência mecânica, estes novos materiais têm sido
recentemente aplicados na construção de pontes, passarelas, cascas, dosséis, e outras
estruturas inovadoras. Na presente tese o projeto de cascas de concreto é revisitado

iv
dentro do quadro destes novos paradigmas. Assim sendo, um código computacional
comercial (DIANA de TNO-Delft) e um CUADRF comercial (DUCTAL® de Cimentos
Lafarge) foram usados como base para o projeto de diversos tipos de cascas sem barras
de armadura e sem protensão, mostrando que seções muito esbeltas podem ser
utilizadas. Para ressaltar a precisão de tais análises, o protótipo de uma casca piramidal
foi construído e ensaiado em laboratório. Os resultados indicaram que a análise
numérica pode simular com precisão o comportamento da estrutura até à ruptura
apontando para o potencial da aplicação dos novos materiais cimentíceos no futuro
próximo.

v
Abstract of Thesis presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the
requirements for the degree of Doctor of Science (D.Sc.)

ANÁLISE EXPERIMENTAL E NUMÉRICA DE CASCAS DE CONCRETO DE


ULTRA-ALTO DESEMPENHO REFORÇADO COM FIBRAS

Jefferson Heleno Brandão


March/2005

Advisors: Eduardo de Moraes Rego Fairbairn


Ronaldo Carvalho Battista

Department: Civil Engineering

Many thin concrete shells have been built around the world from the 50’s to the
60’s, but their use has gradually declined over the past few decades. This decline has
been due mainly to the high cost of construction, difficulties in dealing with
reinforcement and formwork and the complexity of the analysis.
However, advances in computer technology, concrete modeling and concrete
technology have created a new paradigm for the design and construction of concrete
shells. This is the case of the advances in concrete modeling using the Finite Element
Method. For the last decades the crushing and cracking models developed mainly within
the framework of academic research became operational and implemented in
commercial codes. Also, the advances in computer technology combines performance
of meshing, modeling and visualization allowing the effective use of complex finite
element models for the most challenging analyses.
In what concerns the evolution of cementitious materials, the high performance
concretes (HPC) and ultra-high performance fiber reinforced concretes (UHPFRC), left
the academic world to become an industrial product. Combining high durability with
high mechanical strength these new materials have been recently applied to the
construction of bridges, footbridges, shells, canopies, and other innovative structures.
In this thesis the design of concrete shells is revisited from the point of view of these
new paradigms. In this way, a commercial computer code (DIANA from TNO-Delft)
and a commercial UHPFRC (DUCTAL® from Lafarge Cements) were used as bases to

vi
design several types of shells, without any reinforcement and prestressing, showing that
very thin sections could be used. To stress the accuracy of such analyses, a prototype of
a 10mm thick pyramidal shell made of DUCTAL® was constructed and tested in the
laboratory. The results indicated that the numerical analysis can accurately simulate the
structural behavior until failure and stressed the potential application of the new
cementitious materials in the near future.

vii
SUMÁRIO

1. Introdução............................................................................................................1
2. Estruturas de Cascas. Histórico, Declínio e Perspectivas................................4
2.1. Breve Histórico das Cascas de Concreto........................................................4
2.2. Cascas de Concreto.........................................................................................7
2.3. Perspectivas...................................................................................................18
3. Modelagem de Concreto Armado e Protendido
com Elementos Finitos: O Código Diana........................................................ 20
3.1. Elementos utilizados..................................................................................... 22
3.1.1. CQ40S – quadrilátero, 8 nós.............................................................. 22
3.1.2. CT30S – triângulo, 6 nós.................................................................... 22
3.1.3.Q8MEM – quadrilátero,1 nó................................................................ 23
3.1.4 SP1TR – 1 nó.......................................................................................23
3.2. Modelos dos Materiais.................................................................................. 24
3.2.1. Concreto............................................................................................. 24
3.2.1.1. Concreto à tração: Modelo de fissuração do concreto........... 24
3.2.1.2. Concreto à compressão: Modelo de fissuração do concreto..32
3.2.2. Armaduras.......................................................................................... 33
3.3.Procedimento de análise não linear................................................................. 34
4. O Concreto de Ultra-Alta Performace Armado com Fibras (UHPFRC)....... 36
4.1. Introdução..................................................................................................... 36
4.2. O processo de fissuração de concreto à compressão e à tração.................... 38
4.2.1. O processo de fissuração do concreto à tração...................................39
4.2.2. O processo de fissuração do concreto à compressão......................... 40
4.3. O efeito de fibras sobre duas escalas: Material e estrutura........................... 41
4.3.1. O Caso da tração................................................................................ 42
4.3.2. O Caso da compressão....................................................................... 42
4.4. Discussão sobre diferentes tipos UHPFRC................................................... 44
4.4.1.CRC.....................................................................................................44
4.4.2. BPR.................................................................................................... 45
4.4.3. MSFRC.............................................................................................. 47

viii
4.4.4. SIFCON............................................................................................. 47
4.4.5. ECC.................................................................................................... 48
4.5. UHPFRC comercial utilizado na presente tese desenvolvimentos e
desafios - DUCTAL® de Lafarge Cimento..................................................50
4.5.1. Comportamento mecânico..................................................................52
4.5.1.1. Propriedades mecânicas.........................................................52
4.5.1.2. Deformação lenta & comportamento de Retração.................53
4.5.1.3. Comportamento quando submetido ao fogo e a altas
temperaturas..........................................................................55
4.5.2. Durabilidade..................................................................................... 55
4.5.3. Aplicações..........................................................................................56
4.5.3.1. Ultra-alta resistência..............................................................57
4.5.3.2. Aplicações orientadas à durabilidade....................................58
4.5.3.3. Aplicações arquitetônicas......................................................59
4.5.4. Características e composição típica do DUCTAL® usado
na presente tese...................................................................................59
4.5.5. Conclusão............................................................................................60
5. Análise de Cascas de Concreto Armado, Protendido e de UHPFRC
até a ruptura pelo método dos elementos finitos.............................................. 62
5.1. Casca cilíndrica de concreto armado e protendida de Haas e Bouman.......62
5.1.1. Dados relativos aos materiais............................................................ 64
5.1.2.Modelagem da Transferência da Tensão de Protensão
Cabo – Concreto.................................................................................65
5.1.3. Geração da malha de elementos finitos e armaduras..........................65
5.1.4. Resultados numéricos obtidos e comparação com outros resultados
numéricos e com a experiência..........................................................66
5.2. Cascas de UHPFRC......................................................................................67
5.2.1. Relação constitutiva pós-fissura.........................................................68
5.2.2. Cobertura em chapas dobradas...........................................................71
5.2.3. Cobertura de forma parabolóide hiperbólica......................................75
5.2.4. Cobertura do tipo Groined Vault........................................................79
5.2.5. Comentários gerais sobre as análises realizadas.................................82

ix
6. Análise Experimental de uma Casca Tronco-Piramidal confeccionada
com UHPFRC ..................................................................................................... 84
6.1. Material: UHPFRC DUCTAL® de Lafarge................................................. 86
6.1.1. Produção do DUCTAL®...................................................................... 86
6.1.2. Ensaios de caracterização do material................................................. 91
6.1.3. Ensaios de familiarização com o material........................................... 92
6.2 Casca tronco-piramidal..................................................................................94
6.2.1. Plataforma de Ensaio da Casca Tronco-Piramidal.............................. 94
6.2.2. Fôrmas................................................................................................. 97
6.2.3. Concretagem....................................................................................... 99
6.2.3.1. Providências preliminares às concretagens............................. 99
6.2.3.2. Preenchimento da fôrma........................................................100
6.3. Montagem do ensaio e instrumentação...................................................... 103
6.3.1. Instrumentação.................................................................................. 104
6.4. Execução do ensaio.................................................................................... 107
6.5. Resultados.................................................................................................. 107
7. Análise Numérica.............................................................................................. 111
7.1. Introdução.................................................................................................. 111
7.2. Análise numérica da casca com apoio ideal...............................................112
7.3. Análise numérica da casca sem apoio ideal............................................... 117
8. Conclusão........................................................................................................... 123
9. Referências..........................................................................................................125

x
ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 2.1. Pantheon - Abóbada de concreto (Rome, Italy). (Retirada do site


Structurae.net [8] )...................................................................................... 5
Figura 2.2. Basílica de São Pedro (iniciada em1506) – Casca em abóbada................. 8
Figura 2.3. Casca em abóbada construída pela Companhia Zeiss de Jena, 1939........ 10
Figura 2.4. Palácio de Exposição de Nicolas Esquillan, em Paris............................... 10
Figura 2.5. Palazetto ....................................................................................................11
Figura 2.6. Igreja de Saint Louis Priori: (a) Concluída, (b) em construção................. 11
Figura 2.7. Casca de Dante Bini: a) Em construção, b) Pronta................................... 11
Figura 2.8. Casca parabolóide hiperbólica –Umbrella Shell. Aeroporto de
Oakland, Califórnia. a) Vista externa, b) Interna. (Retirado
do site nisee.berkely.edu [15])...................................................................12
Figura 2.9. Casca parabolóide hiperbólica. Fábrica de Cerveja, construída no
México projetada por Félix Candela. (Retirado do site
Ketchum.org [1]).......................................................................................13
Figura 2.10. Restaurante Xochimilco. México,1958.....................................................13
Figura 2.11. Prova de Carga de uma Casca...................................................................14
Figura 2.12. Templo de São Francisco de Assis, em Belo Horizonte, 1943.................15
Figura 2.13. Monumento dos Pracinhas, Ministério do Exército, Brasília-DF.
Casca em Concreto Armado (CA).............................................................15
Figura 2.14. Congresso Nacional, Brasília-DF. ............................................................16
Figura 2.15. Universidade Constantina, Argélia, 1969 .................................................16
Figura 2.16. Casca em concreto armado, apoiada em 4 pontos, Rio de Janeiro-RJ......17
Figure 3.1. (a) Características do elemento de casca curvo, (b) Locação dos eixos.... 21
Figura 3.2. Elemento CQ40S....................................................................................... 22
Figura 3.3. Elemento CT30S........................................................................................23
Figura 3.4. Elemento Q8MEM.....................................................................................23
Figura 3.5 Elemento SP1TR....................................................................................... 24
Figura 3.6. Exemplo de decomposição da deformação normal à fissura..................... 25
Figura 3.7. Plano de fissura.......................................................................................... 26

xi
Figura 3.8. Módulos secantes em regime de fissuração............................................... 27
Figura 3.9. Tension softening multilinear.................................................................... 28
Figura 3.10. Diagrama tensão–abertura de fissura......................................................... 28
Figura 3.11. Tension cut-off linear para estado bi-dimensional de tensões principais.. 30
Figura 3.12. Círculo de Mohr.........................................................................................33
Figura 3.13. Diagrama tensão-deformação elasto-plástico, para a armação de aço.......34
Figura 3.14. Distribuição de τ ao longo do eixo longitudinal da viga............................34
Figura 3.15. Controle de comprimento de arco: (a) Snap through,
(b) Snap-back……………………………………………….....................35
Figura 4.1. Comportamento à flexão do DUCTAL®....................................................52
Figura 4.2. Múltiplas fissuras........................................................................................53
Figura 4.3. Deformação lenta típica do DUCTAL®......................................................54
Figura 4.4. Retração do DUCTAL®: após tratamento térmico, nenhuma fissura
de retração é observada............................................................................. 54
Figura 4.5. a) Passarela Seonyu, (Coréia), b) Passarela Sakata Mirai (Japão).............57
Figura 4.6. Abrigo de DUCTAL®-FO da Estação de Trem LRT de Shawnessy,
Canadá........................................................................................................58
Figura 4.7. Ancoragens de retenção de terra de DUCTAL® - Ilha de Réunion
(França)...................................................................................................... 58
Figura 4.8. Exemplos de aplicações arquitetônicas: (a) Toldos, universidade de
La Doua, Lyon, b) e vaso de flores, Rennes, França..................................59
Figura 5.1. Casca cilíndrica: Geometria e carregamento............................................. 63
Figura 5.2. Casca cilíndrica: Armação......................................................................... 63
Figura 5.3. (a)Malha de elementos finitos, (b)Armação...............................................65
Figura 5.4. Padrão de fissuração: (a) Oñate [5] (b) Conforme análise
numérica (DIANA).................................................................................... 66
Figura 5.5. Diagrama carga - flecha. (Curvas de comparação referência [5])..............67
Figura 5.6. Malha de elementos finitos para a simulação da flexão por
3 pontos (dimensões em mm).................................................................... 69
Figura 5.7. Forma da relação constitutiva de fissuração como base para
a análise inversa......................................................................................... 69

xii
Figura 5.8. Relação constitutiva pós-fissuração, obtida por análise inversa................70
Figura 5.9. Curvas carga-deslocamento experimental e numérico para o teste de
flexão por 3 pontos.....................................................................................70
Figura 5.10. Casca em chapa dobrada (retirado deMilo Ketchum´s projects [1])..........71
Figura 5.11. Perspectiva da estação de ônibus (todas dimensões em metros)................72
Figura 5.12. Vista frontal da estação de ônibus..............................................................72
Figura 5.13. Malha de elementos finitos e condições de contornos...............................73
Figura 5.14. Relação constitutiva pós-fissuração para o elemento de casca.................. 73
Figura 5.15. Curva carga-deslocamento.........................................................................74
Figura 5.16. (a) Configuração deformada da casca, (b) Padrão de fissuração............... 74
Figura 5.17. Casca parabolóide hiperbólica (retirado de Structural Engineering
Slide Library [15])..................................................................................... 75
Figura 5.18. Perspectiva do parabolóide hiperbólico (retirada de [16]) ....................... 76
Figura 5.19. Malha de elementos finitos e condições de contorno.................................76
Figura 5.20. Curva carga-deslocamento.........................................................................77
Figura 5.21. Configuração deformada da casca............................................................. 78
Figura 5.22. Padrão de fissuração...................................................................................78
Figura 5.23. Casca Groined Vault (retirado de [15])..................................................... 79
Figura 5.24. Perspectiva da cobertura............................................................................ 80
Figura 5.25. Malha de elementos finitos e condições de contornos.............................. 80
Figura 5.26. Curva carga-deslocamento........................................................................ 81
Figura 5.27. Configuração deformada da casca............................................................. 81
Figura 5.28. Padrão de fissuração.................................................................................. 82
Figura 6.1. Cobertura do Centro de Pesquisa da Petrobrás (CENPES) Rio de
Janeiro/RJ.................................................................................................. 84
Figura 6.2. Casca tronco-piramidal: planta, corte e locação dos eixos x, y e z........... 85
Figura 6.3. Etapas de adição dos componentes da mistura dadas em função da
energia demandada.................................................................................... 87
Figura 6.4. Equipamentos de aquisição de dados:
(a) conjunto batedeira + amperímetro + computador;
(b) apresentação gráfica da energia demandada........................................ 88

xiii
Figura 6.5. Etapas da produção do DUCTAL®............................................................ 90
Figura 6.6. (a) Ensaio à flexão por 4 pontos da placa de DUCTAL®;
(b) Multifissuração da placa de DUCTAL® ensaiada à flexão................. 91
Figura 6.7. (c) Resposta carga x deslocamento de viga chata de DUCTAL® sob
flexão ( Figura 6.6 )................................................................................... 92
Figura 6.8. Teste de conectores e preenchimento de fôrma com concreto auto-
adensável ...................................................................................................92
Figura 6.9. a) Concretagem da placa com DUCTAL®, b) Ensaio, c) Fotografia da
face inferior depois do ensaio.....................................................................93
Figura 6.10. Croqui do ensaio: a) tirante, b) célula de carga, c) atuador hidráulico,
d) quadro horizontal de concreto armado sobre colunas de blocos de
cimento, e) casca........................................................................................94
Figura 6.11. Gabarito de madeira................................................................................... 95
Figura 6.12. Levantamento da parede de alvenaria........................................................95
Figura 6.13. Vigas do quadro horizontal: a) Detalhe, b) vista da fôrma e
escoramento............................................................................................... 96
Figura 6.14. (a) Detalhe do apoio da casca, (b) Vista superior de um trecho do
apoio continuo........................................................................................... 97
Figura 6.15. a) Fôrma, b) Vista inferior; c) Vista superior............................................ 98
Figura 6.16. Nivelamento da fôrma............................................................................... 99
Figura 6.17. a)Pilão e seu êmbolo, b) Balde de P V C.................................................100
Figura 6.18. (a) Forma de enchimento adotada; (b) Vista da primeira concretagem...101
Figura 6.19. (a) Vista da junta de concretagem; (b) Lançamento do concreto
na 2ª concretagem.....................................................................................102
Figura 6.20. Vista da 2ª concretagem: (a) com fôrma; (b) sem fôrma..........................102
Figura 6.21 a) Levantamento, b) translado do conjunto: casca-forma,
c) Instalação e d)Vista superior............................................................... 103
Figura 6.22. Casca suspensa (depois de retirada da fôrma)......................................... 104
Figura 6.23. Croqui de Instalação dos extensômetros e transdutores elétricos
de deslocamento (TED)............................................................................105
Figura 6.24. (a) Vista superior mostrando extensômetro E1P, E2P, E3P, E6O,

xiv
E7O, E14O e o TED FH1; (b) TED FV1 ................................................105
Figura 6.25. a) Base de fixação dos TED verticais e do ativador servo-hidráulico;
b) Vista parcial da instrumentação na face inferior.................................106
Figura 6.26 Equipamentos: (a) Sistema Aquisição de Dados, (b) Controle do
Ativador Hidráulico marca MTS.............................................................106
Figura 6.27. Ensaio da casca........................................................................................107
Figura 6.28. Resposta experimental carga-deslocamento do nó central......................108
Figura 6.29. Variação carga x deslocamentos verticais nos pontos FV1 a FV6..........108
Figura 6.30. Variação carga x deformações medidas com os extensômetros
E2P, E8P, E11P e E13P experimentais....................................................109
Figura 6.31. Fissuração da casca................................................................................. 109
Figura 6.32. Fotografias dos vértices da casca nas respectivas posições.
(Sem escala).............................................................................................110
Figura 7.1. Malha de elementos finitos para simulação da flexão por 4 pontos
(dimensões em mm.)............................................................................... 111
Figura 7.2. Relação constitutiva pós-fissuração, obtida por análise inversa..............112
Figura 7.3. Curvas carga-deslocamento no meio do vão obtidos experimental
e numericamente para o teste de flexão por 4 pontos..............................112
Figura 7.4. Malha de Elementos Finitos e Condições de Contorno...........................113
Figura 7.5. Relação constitutiva pós-fissura para o material da casca.......................113
Figura 7.6. Curva carga-deslocamento vertical no centro da casca...........................114
Figura 7.7. Configuração deformada da casca...........................................................114
Figura 7.8. Padrão de fissuração para o último estágio de carga.............................. 115
Figura 7.9. Variação das reações de apoio em vários pontos do contorno (bordos
da casca) para etapas de carregamento (ST), sendo 1 e 231 apoios
extremos do bordo da face de colapso.....................................................116
Figura 7.10. Vista superior da casca após primeira concretagem................................117
Figura 7.11. Croqui do vínculo casca-quadro de apoio ............................................. .117
Figura 7.12. Superfície deformada da casca apoiada sobre molas...............................118
Figura 7.13. Deslocamento da casca ao longo das arestas...........................................118
Figura 7.14. Fissuração: (a) Experimental; (b) Numérica (12.8KN)........................... 119

xv
Figura 7.15. Curva carga-deslocamento experimental e numérica..............................120
Figura 7.16. Exemplo de segregação de fibras............................................................121
Figura 7.17. Mapeamento da distribuição de fibras nos lados da casca......................121
Figura 7.18. Correlação entre as respostas carga x deslocamento vertical no
centro da casca, obtidos experimental e numericamente (com dados
da casca “as built” [43])..........................................................................122

xvi
1. INTRODUÇÃO

As cascas de concreto são estruturas com grande potencial de aplicação


arquitetônica, cuja leveza e liberdade de formas permitem a execução de projetos
arrojados, funcionais e belos. As cascas de concreto armado tiveram sua época áurea
nos anos 50 e 60, tendo sido gradualmente diminuída sua utilização nas décadas que se
seguiram. Ketchun [1] enumera diversas possíveis causas para esta decadência, podendo
ser citadas, entre outras, a grande complexidade do cálculo e da execução refletindo-se
no custo final e a concorrência de outros tipos de estruturas como as metálicas e as
tenso-texteis.
Além destes fatores podemos ainda acrescentar que os movimentos
arquitetônicos são antes de tudo movimentos culturais e que correspondem à atuação de
líderes carismáticos responsáveis pela propagação de idéias novas ou pelo renascimento
de ideais clássicos sob renovada roupagem artística e/ou tecnológica. Assim, a
disseminação das estruturas de cascas de concreto armado na metade do século passado
deveu-se em grande parte à atuação de personalidades como Felix Candela. Engenheiro,
matemático, arquiteto, construtor e empresário, possuía todo o ferramental que
possibilitou a execução das mais diversas formas estruturais e ao Engenheiro Eduardo
Torroja.
Atualmente, os progressos científicos e tecnológicos na área de modelagem,
projeto, ciência dos materiais e execução das estruturas de concreto colocaram novos
paradigmas para as estruturas de casca. Grandes progressos foram realizados na área de
modelagem numérica do concreto que, associados à evolução dos computadores
(memória e velocidade de processamento), permitem a análise até à ruptura de
estruturas com elementos tridimensionais submetidas aos mais diversos tipos de
carregamentos. Além disso, a facilidade de uso de programas para lançamento de
malhas de elementos finitos e de visualização de resultados contribui para a realização
de análises mais rápidas, precisas e elucidativas.
No que concerne a evolução dos materiais, novos compostos à base de cimento
têm sido desenvolvidos nas últimas décadas, podendo ser citados os concretos de alto
desempenho com a introdução de pozolanas finas e aditivos plastificantes, concretos
reforçados com fibras e microfibras, e os concretos de altíssimo desempenho que são
uma combinação destes componentes que incluem ainda microfibras minerais, pós
reativos e superplastificantes de última geração otimizados dentro do quadro teórico da
compactação máxima. Estes novos concretos vêm sofrendo constantes melhorias
aumentando espetacularmente sua resistência, sua ductilidade e sua durabilidade, já que
suas microestruturas menos porosas constituem-se em uma barreira aos agentes
agressivos.
Do ponto de vista da execução, a utilização dos novos materiais fibrosos pode
evitar totalmente a utilização de barras de armadura, facilitando a construção da
estrutura. Além disso, o domínio das técnicas de bombeamento, assim como a
possibilidade de utilização dos concretos auto-adensáveis abrem novas possibilidades
para a execução de cascas de concreto.
Neste trabalho, procurou-se utilizar ferramentas de cálculo e materiais existentes
no mercado internacional para o projeto e construção de cascas de concreto.
Sendo assim, utilizou-se um novo material de ultra-alto desempenho reforçado
com fibras, DUCTAL® [2], produzido e comercializado por cimentos Lafarge para os
mercados europeu, asiático e norte-americano. Este material pode atingir resistência à
compressão de até 250MPa assegurando excelente ductilidade pela ação de um grande
volume de fibras.
O programa de elementos finitos, utilizado para a realização das análises
numéricas é também comercial, DIANA 8.0 de TNO-Delft [3]. Este código vem sendo
desenvolvido em estreita ligação com a Universidade Técnica de Deft sendo um
programa de elementos finitos com ênfase em concreto armado, possuindo diversos
modelos de fissuração e de plasticidade.
O presente trabalho de tese constou inicialmente da verificação dos
procedimentos de cálculo automático para uma casca cilíndrica de concreto armado e
protendida buscando subsidiar as análises seguintes. Esta casca, referenciada na
literatura técnica foi ensaiada em laboratório [4] e também simulada
computacionalmente por outros autores [5].
Diversas estruturas hipotéticas de cascas sem armadura ativa ou passiva, cujo
material é DUCTAL®, foram então analisadas até à ruptura indicando que a utilização
deste material permitiria a execução de cascas extremamente finas sem a utilização de
armadura passiva ou ativa.
Em seguida uma casca tronco piramidal de 3,00m x 3,00m x 0,01m construída
com DUCTAL® foi ensaiada em laboratório até à ruptura o. A equação constitutiva do
material submetido à tração foi deduzida a partir da análise inversa de um ensaio de

2
flexão por quatro pontos. A casca, que resistiu a uma carga equivalente a 5 vezes o seu
peso próprio, foi analisada pelo programa DIANA, que foi capaz de simular o
comportamento estrutural até o momento da ruptura .
A pesquisa, desenvolvida neste presente trabalho, de tese está organizada da
seguinte forma:
No Capitulo 2, é apresentado um breve histórico sobre cascas de concreto
armado e protendido, sendo analisadas as causas de sua decadência a partir dos anos 70.
No Capítulo 3, é apresentada uma introdução sobre a aplicação dos Elementos Finitos
para análise de concreto e um sumário sobre a utilização do código DIANA. No
Capítulo 4, é apresentado um histórico sobre a evolução recente dos concretos,
abordando os concretos de alto e ultra-alto desempenho armados com fibras. Apresenta-
se também neste capítulo o material DUCTAL® e suas principais características
mecânicas e de durabilidade. O Capítulo 5 trata da verificação dos procedimentos de
cálculo automático para uma casca cilíndrica de concreto armado e protendido e em
seguida é apresentada a análise até a ruptura de 3 cascas hipotéticas de UHPFRC de
10mm de espessura. No Capítulo 6 é apresentada a análise experimental de uma Casca
Tronco Piramidal de 10mm de espessura e 3 x 3 m de projeção quadrada construída
com DUCTAL®. No capítulo 7 é apresentada a análise numérica desta casca ensaiada
em laboratório e, finalmente, no Capítulo 8, são apresentadas as conclusões e sugestões
para pesquisas futuras.

3
2. ESTRUTURAS DE CASCA.
HISTÓRICO, DECLÍNIO E PERSPECTIVAS.

2.1. Breve Histórico do Concreto

Desde os tempos pré-históricos, a vida do homem tem sido completamente


condicionada pela capacidade de dominar o uso dos materiais a ponto de os
historiadores definirem os materiais como marcos de épocas históricas: Idade da Pedra,
Idade do Bronze e Idade do Ferro.
A indústria da construção, importante vertente da atividade humana, é também
caracterizada pelos materiais utilizados. O concreto é um dos materiais de maior
importância para a evolução desta indústria, sendo hoje o material de construção mais
utilizado em escala planetária.
Para que se possa traçar um breve histórico do concreto é necessário, antes de
tudo, que se defina tal material. Podemos tomar, por simplicidade, a definição do
dicionário Aurélio [6]:
“Concreto: Mistura, em proporções prefixadas, de um aglutinante com
água e um agregado constituído de areia e pedra, de sorte que venha a
formar uma massa compacta e de consistência mais ou menos plástica, e
que endurece com o tempo”.
Se não estão introduzidas as pedras na mistura, teremos uma argamassa, e se a
cal é o material ligante, teremos argamassa de cal que foi, muito provavelmente,
inventada em tempos pré-históricos [7]. Este material já era conhecido, pelas mais
antigas civilizações, como a babilônica, que o usava em alvenaria de pedra. Os egípcios,
além do uso da argamassa de cal, adicionavam agregados graúdos à mistura, isto é, eles
sabiam como elaborar um material que, correspondendo à definição acima, poderia ser
considerado como “concreto”.
Avançando alguns milênios, chega-se até à antiga civilização romana, que
embora utilizando um tipo de cimento diferente do atual cimento Portland, não há
dúvida de que, pela definição acima, utilizava o concreto nas suas construções.
A argamassa romana consistia-se de cal virgem e argila queimada ou materiais
naturais predominantemente de origem vulcânica, que continham sílica ativa. O mais
conhecido depósito deste material foi encontrado próximo à Vila de Pozzuoli, nas
adjacências de Nápolis. Este é o motivo pelo qual tal material é chamado de pozolana.
Uma das mais impressionantes estruturas de concreto romana é o Pantheon,
apresentado na figura 2.1. Concluída em 126 d.C, sua cúpula de 43.3m de diâmetro
construída com um tipo de “concreto leve” (agregados de tijolo, de tufo, pedra-pome)
não foi ultrapassada até o Século XIX.
Deve-se aqui fazer também referência à obra de Vitruvio que, além de ter sido o
engenheiro militar e o arquiteto de César, escreveu os “Dez Livros de Arquitetura”
fazendo explicitamente referência ao concreto [7].

Figura 2.1. Pantheon - Abóbada de concreto (Roma, Italia).


(Retirada do sitio Structurae.net [8] ).

A cal associada à pozolana, originando os concretos pozolânicos, continuou a ser


usada intermitentemente até que, em 1756 o inglês John Smeaton deu o grande passo no
desenvolvimento do cimento, conseguindo obter um produto de alta resistência por
meio de calcinação de calcários moles e argilosos. Em 1818, o francês Vicat obteve
resultados semelhantes aos de Smeaton e, finalmente, em 1824, Joseph Aspdin queimou
conjuntamente pedras calcárias e argila, transformando-as num pó fino. Aspdin
percebeu que obtinha uma mistura que, após secar, tornava-se tão dura quanto as pedras
empregadas nas construções, sendo que tal mistura não se dissolvia em água. Registrou
então a patente do cimento hidráulico que ele chamou de Portland devido a sua
semelhança de cor com a pedra da ilha de Portland (costa Britânica).

5
O princípio das vigas compósitas compreendendo armaduras metálicas para
responder aos esforços de tração já havia sido utilizado por Souflot e Rondelet no século
XVIII quando da construção do Pantheon de Paris. Este sucesso considerável não teve
seqüência porque era uma construção de alto custo e necessitava de uma mão-de-obra
altamente qualificada, já que era anterior à invenção dos primeiros cimentos portland.
Os primeiros usos do concreto armado podem ser creditados a J. Lambot, que
em 1848 construiu um barco em cimento armado e a J. Monier, que em 1849 construiu
grandes caixas (vasos) para plantas e árvores (tendo patenteado o processo em 1867) e a
F. Coignet que em 1852 executou uma construção em St. Denis [9] [10].
Estas primeiras aplicações resultaram de aproximações empíricas sucessivas.
Sem ainda fazer menção a experimentação e modelagem, F.Hennebique abre, por volta
de 1875 as vias do cálculo moderno. A partir de fórmulas muito simples, ele
“dimensiona” numerosos projetos particularmente audaciosos, dentre os quais a
primeira laje armada com ferros redondos (1880). Após ter depositado a primeira
patente de viga com estribos (1892) ele realiza a primeira ponte em arco (Esternay,
1898) e o famoso primeiro imóvel totalmente em concreto armado (1, Rue Danton, em
1899) e a célebre ponte de Chatellerault (144m de comprimento) (1899).
Em 1884 o concreto armado chegou à Alemanha tendo os direitos de aplicação
industrial sido adquiridos por empresas que passaram a operar em diversas regiões. Em
1886 a empresa Freytaje e Wayss foi estabelecida e coube à Wayss desenvolver estudos
pioneiros sobre o novo material [11].
Em 1898 Rabut ministra na École Nationale des Ponts et Chaussées em Paris o
primeiro curso, no mundo, de concreto armado. Em 20 de outubro de 1906, aparece na
França a primeira norma de cálculo das obras em concreto armado.
Deve ser citado que na Alemanha, em 1902, foi publicada uma importante teoria
para o cálculo do concreto armado, calcada em experimentos devidamente
comprovados. Seu autor foi Mörsch, engenheiro e cientista, que estabeleceu os
dimensionamentos nos estádios I e II, além da conhecida teoria que modela o
comportamento ao cisalhamento através da analogia com uma treliça.
Após o concreto armado, a grande invenção que possibilitou o lançamento de
estruturas de concreto com maiores vãos coube ainda aos franceses. Em 1912, a
construção de uma ponte em arco sobre o rio Allier, permitiu a Freyssinet dominar pela
primeira vez os efeitos diferidos e refletir sobre o problema que o conduziria 15 anos
mais tarde à invenção do concreto protendido [9] [12], diagnosticando a necessidade de

6
adoção dos aços de alta resistência, a fim de que, mesmo com as perdas de tensão que
iriam ocorrer ao longo do tempo, ficasse o aço tensionado da armadura com uma força
útil ainda apreciável [12].
O concreto armado chegou ao Brasil na segunda década do século XX, tendo
sido bem aceito pela indústria de construção. Um dos engenheiros que mais contribuiu
para o desenvolvimento do concreto armado no Brasil foi Emilio H. Baumgart.
Graduado pela Escola Politécnica, trabalhou como calculista na Companhia Construtora
Nacional, tendo fundado o primeiro escritório de cálculo de concreto armado no Brasil.
Projetou o primeiro arranha-céu em concreto armado no mundo, o edifício A Noite, no
Rio de Janeiro, em 1931, com 22 pavimentos.
O Engº Emilio Baumgart utilizou pela primeira vez, a construção em balanço
sucessivos para a Ponte sobre o Rio do Peixe (1931). Esta ponte calculada por P.
Fragoso, então engenheiro do Escritório E. H. Baumgart, foi durante muito tempo
recorde mundial de vão em concreto armado com seus 68 m.
Deve ser citada a evolução da arquitetura brasileira, cujo arranjo e riqueza de
formas, reconhecidos internacionalmente, exigiram soluções ousadas da engenharia.
Dois nomes não podem deixar de ser citados, que são os do Arq. Oscar Niemeyer e seu
parceiro Engº Joaquim Cardoso, renomado calculista de estruturas de concreto armado.

2.2. Cascas de Concreto

Uma viga suporta cargas, principalmente por flexão. Um arco, em virtude de sua
curvatura, transmite a mesma carga aos apoios por ação direta, isto é, uma compressão
axial com pequena ou nenhuma flexão se a carga for uniformemente distribuída. Em
duas dimensões, o equivalente da viga é a placa, que pode suportar cargas somente por
flexão fora do seu plano. Uma estrutura de casca, em contraste, suporta as cargas
principalmente através da ação de membrana. Isto é uma maneira muito mais eficiente
de suportar cargas; e, como resultado, cascas de parede fina podem muito bem suportar
cargas de peso próprio e outras sobrecargas, cobrindo amplos espaços abertos.
Uma das primeiras aplicações das estruturas de cascas de concreto foi a Domus
Áurea (casa de ouro), uma cúpula de 15m de diâmetro construída pelo imperador Nero
em 65 d.C. A partir desta construção, deu-se um desenvolvimento acentuado das
cúpulas de concreto, sendo exploradas em várias construções imperiais romanas. Tal

7
movimento teve como ponto culminante a construção do Pantheon, monumento
construído no império de Adriano entre 118-125 (ver figura 2.1), que constitui uma das
obras-primas da engenharia estrutural de todos os tempos
No final do império romano, as construções de concreto experimentaram um
declínio, sendo retomadas técnicas de construção com pedras cortadas e arranjadas em
conjunto, características das construções da Idade Média, e conseqüentemente as cascas
de concreto não foram mais construídas.
O renascimento viu ressurgirem as estruturas de casca principalmente através
dos domos em alvenaria. Os mais expressivos exemplos dessas estruturas são
encontrados na Itália, podendo ser citados o domo de Florença com 39m de diâmetro
(1420-1436) e o domo da Basílica de São Pedro, figura 2.2, iniciada em 1506 com 49m
de diâmetro, construído sob a supervisão de Michelangelo. Cabe ser citado também o já
referenciado Pantheon de Paris (1758) onde são já encontrados alguns princípios do
concreto armado.

Figura 2.2. Basílica de São Pedro (iniciada em1506) – Casca em abóbada.

A primeira pesquisa quanto à capacidade de carga de uma casca de parede fina é


atribuída a Lamé e Clapeyron que introduziram a teoria de membrana, na qual a casca
era considerada capaz de resistir a cargas externas por tensões extensionais ou de

8
membranas internas. Mais tarde no século XIX, G. B. Airy e A. E. H. Love
desenvolveram as teorias de membrana e flexão para cascas [13] [14].
É atribuída a Dischinger a primeira tentativa de projetar um telhado de casca de
concreto, propriamente dita, em 1923. Essa análise não foi bem sucedida dada a
dificuldade matemática envolvida. No entanto, mais tarde, uma versão simplificada da
primeira análise obteve êxito, sendo a execução acompanhada de extensivos testes
experimentais.
A primeira estrutura de concreto de casca de parede fina moderna foi construída
pela Companhia Zeiss de Jena na Alemanha nos anos vinte do século passado, baseada
na teoria desenvolvida por Franz Dischinger e Ulrich Finsterwalder (figura 2.3) [7].
Menos de 30 anos separa tal construção do Palácio de Exposições de Nicolas Esquillan
em Paris (figura 2.4). Com um vão de 218m e uma área coberta de mais de 22000m2, o
Palácio de Exposições é ainda uma das maiores estruturas de casca do mundo. A
construção de cascas de parede fina abriu novas possibilidades para engenheiros e
arquitetos. O Palazetto construído por Luigi Nervi para as Olimpíadas de Roma em
1960 indica claramente, tanto a partir de uma vista interior quanto exterior, como as
cargas são transferidas para as fundações (Figura 2.5).
Outro exemplo é a Igreja de Saint Louis Priori, projetada pela firma de
arquitetura de Hellmuth, Obata & Kassabaum e construída por Mario Salvadori. Ela
ilustra a quantidade considerável de trabalho necessário para a construção da casca (ver
figura 2.6). Dado o alto custo da mão-de-obra, tais estruturas podem não ser
economicamente viáveis a menos que o projetista ou construtor proponham algum
esquema inovador para reduzir o custo da construção. A solução de Dante Bini é
mostrada nas figuras 2.7a e b. Ele coloca uma lona no solo, instala a armadura, concreta,
cobre a estrutura com uma segunda lona, e então infla a estrutura levando-a a sua forma
pré-determinada. Após o concreto ter endurecido, as membranas de lona são removidas
ou cortadas.
Outras técnicas utilizam princípios simples aprendidos a partir da observação da
natureza: uma corrente suspensa a partir de dois pontos assume a forma ideal de uma
catenária, porque as forças de tração na corrente estão em equilíbrio perfeito com a
força da gravidade sem nenhuma flexão. Virando a corrente de baixo para cima, obtém-
se um arco de uma forma igualmente ótima exceto que as forças são agora de
compressão. Este fato simples embasou o projeto de cascas por Heinz Isler que
suspendeu um tecido por alguns pontos pré-determinados e pulverizou água. Tendo

9
submetido o tecido molhado a temperaturas abaixo de zero, o material congelado pode
ser invertido indicando a forma de uma casca ideal. Técnicas similares, utilizando fios
de algodão (barbantes) ou fibras, foram empregadas no passado por Leonardo da Vince
e pelo arquiteto espanhol Antônio Gandí. Nessas técnicas, pesos eram pendurados na
malha de fios em pontos apropriados para dar a forma buscada para qual a malha
resultava totalmente retesada.

Figura 2.3. Casca em abóbada construída pela Companhia Zeiss de Jena, 1939.

Figura 2.4. Palácio de Exposição de Nicolas Esquillan, em Paris.

10
Figura 2.5. Palazetto

(a) (b)

Figura 2.6. Igreja de Saint Louis Priori: (a) Concluída, (b) em construção.

(a) (b)

Figura 2.7. Casca de Dante Bini: a) Em construção, b) Pronta.

11
Na figura 2.8 pode ser contemplada uma cobertura notável com a utilização de
cascas. A construção feita no Aeroporto de Oakland, Califórnia, em 1927, utiliza cascas
do tipo parabolóide hiperbólico, em que cada conjunto de quatro peças é
independentemente sustentado por uma longa coluna central. Estas cascas poderiam ter
sido construídas em pré-moldado, visando redução de custo.

(a) (b)

Figura 2.8. Casca parabolóide hiperbólica – Umbrella Shell. Aeroporto de Oakland,


Califórnia: a) Vista externa, b) Interna. (Retirado do site nisee.berkeley.edu [15]).

A aceitação das cascas foi muito grande principalmente após 1956, como comenta
Ketchum em [1], tendo em Félix Candela seu maior projetista, alcançando notável
desenvolvimento com seus trabalhos, sobretudo as cascas parabolóides hiperbólicas
(figura 2.9).
Considerado um dos maiores projetistas de cascas do Século XX, Candela nasceu
em Madrid em 1910, tendo começado a praticar a arquitetura após sua emigração para o
México em 1939.
Candela acreditava que a força deveria vir da forma e não da massa. Esta
convicção conduziu a uma exploração extensa de estruturas de cascas.
Freqüentemente forçado a agir como o arquiteto, engenheiro estrutural e
contratante para avançar seu trabalho, Candela via os arquitetos como engenheiros que
possuem a habilidade para projetar grandes catedrais e construções de baixo custo.

12
Alguns dos seus trabalhos mais famosos são: Hotel & Apartamentos em Acapulco
em associação a Bringas (1940); Igreja Medalla de la Virgen Milagrosa (México D.F.,
1953); Capela Nuestra Señora de la Soledad (México D.F., 1955); Restaurante
Xochimilco (México, 1958), figura 2.10; Igreja San José Obrero (México D.F., 1959); e
Palácio dos Esportes para os XIX Jogos Olímpicos (México D.F, 1968).

Figura 2.9. Casca parabolóide hiperbólica. Fábrica de Cerveja, construída no


México projetada por Félix Candela. (Retirado do site Ketchum.org [1])

Figura 2.10. Restaurante Xochimilco. México,1958.

13
Alguns modelos teóricos de cascas foram acompanhados de ensaios experimentais
em modelos reduzidos e até em verdadeira grandeza, realizados pelo próprio Candela,
como mostrado na figura 2.11, em Las Estructuras de Candela [16].

Figura 2.11. Prova de Carga de uma Casca.

No Brasil, o uso das estruturas em concreto armado em formas curvas ou em


cascas e as explorações inéditas das possibilidades estéticas da linha reta obtiveram
grande destaque com Oscar Niemeyer. Inicialmente, a influência corbusiana é notável
nas obras de Niemeyer. Porém, pouco a pouco o arquiteto adquire sua marca: a leveza
das formas curvas cria os espaços que transformam o programa arquitetural em
ambientes inusitados; portanto, harmonia, graça e elegância são os adjetivos mais
apropriados para o trabalho de Oscar Niemeyer. As adaptações que o arquiteto produziu
conectando o vocabulário barroco ao modernismo arquitetônico possibilitaram
experiências formais com volumes espetaculares, que foram concretizadas por
calculistas famosos, entre eles o brasileiro Joaquim Cardoso, José Carlos Sussekind e o
italiano Pier Luigi Nervi [17].
As tendências de Niemeyer se traduziram em fábricas, arranha-céus, espaços para
exposições, residências, teatros, templos, edifícios-sede de empresas dos setores público
e privado, universidades, clubes, hospitais e equipamentos para diversos programas
sociais, podendo ser citados dentre muitos outros o conjunto arquitetônico da Pampulha,
com o Cassino, o Restaurante e o Templo de São Francisco de Assis, em Belo

14
Horizonte (figura 2.12), o Monumento dos Pracinhas, Ministério do Exército, em
Brasília-DF (figura 2.13), Congresso Nacional, Brasília-DF (figura 2.14), Universidade
Constantina, Argélia, 1969 (figura 2.15)

Figura 2.12. Templo de São Francisco de Assis, em Belo Horizonte, 1943.

Figura 2.13. Monumento dos Pracinhas, Ministério do Exército, Brasília-DF.


Casca em Concreto Armado (CA)

15
Figura 2.14. Congresso Nacional, Brasília-DF.

Figura 2.15. Universidade Constantina, Argélia, 1969.

Pode se destacar ainda, a casca em concreto armado, projetada pelo Engenheiro


Professor Jayme Mason, no Rio de Janeiro-RJ (Figura 2.16).

16
Figura 2.16. Casca em concreto armado, apoiada em 4 pontos, Rio de Janeiro-RJ

A partir dos anos 70 as construções em casca de concreto apresentaram um


declínio, sendo seu emprego cada vez mais raro. A seguir serão apresentados alguns
fatos que podem ter contribuído para tal declínio:

1. O custo elevado da construção poderia ser uma razão. Para estruturas


industriais e comerciais as estruturas de aço de pequeno vão são muito
mais baratas. Porém quando o vão cresce, as cascas de concreto tornam-
se cada vez mais competitivas. Se levarmos em conta o binário custo-
benefício, sobretudo para estruturas monumentais, para as quais a razão
arquitetônica é predominante e não o material estrutural, a casca de
concreto leva nítida vantagem [1].
2. Poucos engenheiros da época áurea das cascas de concreto realmente
entenderam o projeto estrutural das cascas e as suas possibilidades. [1].
3. O cálculo das cascas de concreto armado, a depender da forma, pode
conduzir a cálculos laboriosos; a execução da armadura é na maioria das
vezes altamente complexa e da concretagem não muito menos, com
problemas especiais advindos na reologia do concreto. As imperfeições
nas formas das cascas em comparação com a seção de membros
acabados são maiores que em viga e lajes projetadas, por causa da
espessura relativamente fina neste tipo de construção. É sempre

17
necessária a especificação do grau de precisão geométrica de execução
por parte do projetista, além de coordenadas suficientemente claras das
superfícies que compõem a casca, [18].
4. A remoção da fôrma é outro aspecto de grande relevância, mormente no
caso de cúpula e casca de chapa dobrada, que são projetadas para baixa
sobrecarga. Um projeto bem elaborado deve ser seguido à risca, pois, se
por uma razão qualquer neste procedimento, o conjunto
casca/escoramento, geralmente mais pesado que a sobrecarga da
estrutura, agarrar na casca sobrecarregando assim a nova estrutura de
concreto, poderá levar a casca a um colapso [18].
5. A execução da fôrma em alguns tipos de cascas é extremamente
complexa exigindo mão-de-obra especializada; sendo esta de alto custo,
mesmo em países cujo trabalho dos profissionais da construção civil seja
pouco valorizado.
6. O reaproveitamento das fôrmas nas construções de cascas não é em geral,
possível; ao passo que, nas estruturas de concreto convencionais constitui
uma pratica corrente.
7. A adaptabilidade do imóvel a outros fins quanto a sua utilização, no caso
das cascas, nem sempre é viável, como ocorrido no terminal do
Aeroporto Internacional JKF em New York [19].

Deve ser acrescentado que nas áreas onde o custo da mão-de-obra é baixo, em
relação aos preços dos materiais de construção, muitos dos argumentos aqui usados não
têm validade.

2.3. Perspectivas

Hoje, as estruturas de casca têm importantes aliados, diferentemente do que


ocorrera no passado. O concreto bombeado facilita sobremaneira a aplicação do
concreto em formas elevadas requeridas nas coberturas. Com o advento do computador
e dos programas de cálculo automático, a análise estrutural tornou-se muito mais viável
e projetar uma casca ficou muito menos laborioso.

18
No que se refere à evolução dos materiais, novos compostos à base de cimento
têm sido desenvolvidos nas últimas décadas, podendo ser citados como os mais novos
deles, os concretos de altíssimo desempenho (Capítulo 4) que, dadas as suas
características mecânicas e de durabilidade permitirão atenuar, e mesmo eliminar
muitos dos pontos que contribuíram para o desaquecimento das construções de cascas
de concreto.

19
3. MODELAGEM DE CONCRETO ARMADO E
PROTENDIDO COM ELEMENTOS FINITOS: O CÓDIGO
DIANA.

O código computacional DIANA [3] de TNO-Delft-Holanda é um programa


comercial baseado no método dos elementos finitos que tem sido desenvolvido com
especial atenção para o material concreto.
Este programa, cujas implementações são baseadas nas pesquisas realizadas pelo
grupo da Technical University (TU) de Delft, possui, além dos modelos dedicados aos
problemas mais comuns em engenharia, diversas rotinas, algoritimos, equações
constitutivas e módulos de lançamento de malha e visualização dedicados ao concreto.
Os elementos de casca curvos no código DIANA são baseados nos elementos
isoparamétricos curvos degenerados de elementos tridimensionais (figura 3.1) por
introdução de duas condições básicas: em primeiro lugar, assume que as normais
permanecem retas após deformação, todavia não necessariamente normais à superfície
de referência. Aqui a deformação transversal de cisalhamento é introduzida de acordo
com a teoria de Mindlin-Reissner; em segundo lugar, assume que a componente da
tensão normal na direção da camada base seja nula, camada esta que corresponde a um
sistema de coordenadas local (xl, yl) definido em cada casca com os eixos xl e yl
tangentes ao plano (ξ, η) e com o eixo zl perpendicular a este plano. As cargas
concentradas F podem atuar em qualquer direção entre a perpendicular e a tangente à
superfície; já a carga momento M deve girar em torno de um eixo da face do elemento.
As deformações nas camadas intermediárias εxx , εyy e γxy variam linearmente na
direção da espessura. Já as deformações de cisalhamento transversais γxz e γyz são
forçadas a serem constantes na direção da espessura.
Todos os nós do elemento têm cinco graus de liberdade, sendo três translações e
duas rotações.
Na modelagem de estruturas de concreto ou em geral nas estruturas construídas
de matérias quase-frágeis o código DIANA oferece uma variedade grande de elementos.
O comportamento constitutivo dos materiais quase-frágeis tem como características: a
fissuração à tração, o esmagamento à compressão e os efeitos de tempo como a retração
e a fluência.
A fissuração pode ser modelada com um modelo de fissuração multi-direcional
com tensão Softening e um modelo de retenção de cisalhamento, sendo que o modelo de
tensão softening pode ser do tipo frágil, linear, multi-linear e não linear.
Em um estado multi-axial de tensões a tensão de compressão pode exceder a
resistência à compressão do material e, neste caso, o modelo de fissuração pode ser
combinado com o modelo de plasticidade que descreve o esmagamento do material.
Na presente tese foi utilizado o modelo de Mohr-Coulomb. O Código
computacional DIANA possui diversos critérios de iniciação de fissura, sendo que no
presente trabalho optou-se pelo critério linear de transição entre tração e compressão.
A armação na estrutura de concreto armado pode ser modelada embutida nos
elementos estruturais, sendo que o seu comportamento constitutivo pode ser modelado
como um material elastoplástico.
O elemento de mola utilizado no presente trabalho tem a função de simular o
apoio da casca sobre o pórtico na qual está pousada (ver o capítulo 7 desta tese). A
necessidade do uso de tal elemento vem do fato que o apoio só reage se a solicitação
sobre ele for de compressão, sendo que a tendência à solicitação de tração (tendência da
casca separar-se do pórtico) não origina reação do apoio.
No presente capítulo, nos itens que se seguem será indicado, em detalhe o
emprego do programa DIANA para a simulação de cascas de concreto armado,
protendido e concreto fibroso.

a) b)

Figura 3.1. (a) Características do elemento de casca curvo,


(b) Locação dos eixos.

21
3.1 – Elementos utilizados

Nos subitens que se seguem serão apresentados em detalhe os elementos


utilizados na presente tese.

3.1.1 - CQ40S – quadrilátero, 8 nós

O elemento CQ40S é um elemento de casca, curvo, quadrilátero e


isoparamétrico, de oito nós (figura 3.2). Os polinômios para a translação u e rotação φ
podem ser expressos por:

ui(ξ , η) = a0 + a1ξ + a2η + a3ξη + a4ξ2 + a5η2 + a6ξ2 η + a7ξη2 (3.1)

φ i(ξ , η) = b0 + b1ξ + b2η + b3ξη + b4ξ2+ b5η2 + b6ξ2 η + b7ξη2 (3.2)

Figura 3.2. Elemento CQ40S.

3.1.2. - CT40S – triângulo, 6 nós

O elemento CT40S é um elemento de casca, curvo, triangular e isoparamétrico


de seis nós (figura 3.3). Os polinômios para a translação u e rotação φ podem ser
expressos por:

ui(ξ , η) = a0 + a1ξ + a2η + a3ξη + a4ξ2 + a5η2 (3.3)

φ i(ξ , η) = b0 + b1ξ + b2η + b3ξη + b4ξ2+ b5η2 (3.4)

22
Figura 3.3. Elemento CT30S.

3.1.3. Q8MEM – quadrilátero 4 nós

O elemento Q8MEM é um elemento quadrilátero isoparamétrico de 4 nós em


estado plano de tensões (figura 3.4). O polinômio para as translações ux e uy pode ser
expresso por:

(3.5)

Figura 3.4. Elemento Q8MEM

3.1.4. SP1TR – 1 nó

O elemento SP1TR dedicado à simulação do apoio da casca sobre o pórtico é


uma mola de translação de um nó (figura 3.5). No modelo de plasticidade (ativado)
especificam-se a mínima e a máxima força admissíveis (mola de translação) ou
momento (na mola de rotação). No caso do presente trabalho é utilizada uma mola de
translação interposta verticalmente ligando a casca à plataforma de ensaio como mostra
a figura 7.14 do capítulo 7, sendo a carga de compressão e a de tração os parâmetros
que definem as forças admissíveis (as reações de apoio máximas).

23
Figura 3.5 Elemento SP1TR.

3.2. Modelos dos Materiais

Os modelos de materiais disponíveis no código DIANA [3] e usados nos


exemplos analisado na presente tese são apresentados nas seções seguintes. O concreto
tem seu comportamento simulado por meio de dois modelos: a) o modelo de fissuração
que é acionado para carregamentos prioritariamente de tração quando um determinado
limite de fissuração é atingido e b) modelo elasto-plástico para descrever o
comportamento do concreto sob estado multiaxial de tensões principalmente
compressivas. Para as barras de armadura é usado o modelo de plasticidade.

3.2.1 Concreto

3.2.1.1 Concreto à tração: Modelo de fissuração do concreto

Dentre os diversos modelos de fissuração disponíveis no código DIANA optou-


se pelo modelo de fissuração repartida fixa multi-direcional com decomposição de
deformações. Uma descrição detalhada deste tipo de modelo pode ser vista nas
referências [20] e [21] e um resumo pode ser encontrado em [3]. A seguir, indicaremos
os conceitos básicos deste modelo.
As suposições básicas do modelo utilizado são a decomposição do campo de
deformação total ε do material fissurado em uma deformação de fissura εcr e uma
deformação do material sólido εco entre as fissuras, e a suposição de que a deformação
εcr é o resultado da divisão da deformação de fissura ωcr (concentrada em uma região
muito estreita) por uma largura de banda (fictícia) denominada h [22]:

ε = εco + εcr (3.6)

εcr = ω
cr
(3.7)
h

24
A principal vantagem desta concepção é que permite tratar o comportamento da
fissura separadamente do comportamento do concreto existente entre as fissuras e
também modelar um certo número de fissuras que ocorrem simultaneamente. A figura
3.6 mostra a decomposição da deformação na direção normal à fissura. Uma
conseqüência desta formulação é que a fissuração pode ser combinada com outros
componentes não-lineares do material. Por exemplo, além da parcela elástica, sempre
presente, parcelas plásticas, viscoelásticas, térmicas ou de fluência podem ser
consideradas. No modelo utilizado, o comportamento do concreto íntegro é considerado
como linear elástico em tração.

Figura 3.6. Exemplo de decomposição da deformação normal à fissura.

As deformações da fissura, referenciadas ao eixo global de coordenadas x, y e z,


são representadas por um vetor de seis componentes:

{
εcr = ε xxcr ε yy
cr
ε zzcr ε xycr ε cryz ε xzcr }T (3.8)

Para a representação local das deformações adota-se o eixo local de coordenadas


n, s e t da fissura, como mostra a figura 3.7. Desta forma, as deformações locais da
fissura e cr são dadas por:

{
ecr = ε nn
cr
γ nscr γ crnt }T (3.9)

25
Onde ε nn
cr
é a deformação normal referente ao modo I de fissuração, que representa a

abertura de fissura, e os componentes γ nscr e γ ntcr são as deformações cisalhantes do

modo II e do modo III, respectivamente. As três outras deformações de fissura no eixo


local não têm significado físico e podem ser omitidas.

Figura 3.7. Plano de fissura.

A relação entre as deformações locais e globais da fissura é dada por:

εcr = N.ecr (3.10)

Onde N é a matriz de transformação refletindo a orientação da fissura.


Da mesma forma, as tensões globais σ e as tensões locais no plano da fissura scr
são representadas pelos vetores:

σ = {σ xx σ yy σ zz σ xy σ yz σ xz } T (3.11)

{
scr = σ nn
cr
τ nscr τ ntcr }T (3.12)

A relação entre as tensões globais e locais é dada pela matriz NT.

scr = NT . ecr (3.13)

A relação constitutiva para o concreto íntegro é dada por:

σ = Dco . εco (3.14)

26
A matriz Dco traduz a lei de comportamento do material não fissurado. Quando o
concreto íntegro é considerado como linear elástico, a matriz Dco é a matriz elástica
usual obtida a partir da lei de Hooke.

A relação constitutiva para o concreto fissurado é dada pela relação:

scr = Dcr . ecr (3.15)

A matriz Dcr relaciona as tensões às deformações da fissura, incluindo as


propriedades da fissura nos modos I, II e III. A matriz Dcr possui a seguite forma:

⎡D I 0 0 ⎤
⎢ ⎥
Dcr = ⎢0 D II 0 ⎥ (3.16)
⎢0 0 D III ⎥
⎣ ⎦

onde D I , D II e D III são módulos de deformação secantes em regime de fissuração


conforme ilustrado pela figura 3.8:

cr
s nn τ nscr
τ ntcr
gf = Gf/h

II III
I
Dsec Dsec ante Dsec ante
ante

ε nncr γ nscr γ ntcr


Figura 3.8. Módulos secantes em regime de fissuração.

O módulo DI que relaciona σ nn


cr
a ε nn
cr
é derivado da relação constitutiva com
abrandamento de tensões multilinear (multilinear tension softening), ilustrado na figura
3.9.

27
gf = Gf/h

Figura 3.9. Tension softening multilinear

Conforme foi dito acima, a deformação ε nn


cr
é o resultado da divisão da abertura
de fissura ωcr localizada em uma estreita região por um comprimento de banda fictícia
h. Levando em consideração que o parâmetro intrínseco ao material é a energia
específica de fissuração G f (Nm/m²) necessária para abrir uma fissura, deve-se levar

este fato em consideração para a manutenção da objetividade da malha de elementos


finitos, mantendo o valor de G f constante para qualquer tamanho de elemento finito

utilizado. Assim sendo, sabendo-se que o valor de G f é dado pela área sob o diagrama

σ nncr - ωcr, conforme mostrado na figura 3.10:

Gf

ω cr

Figura 3.10. Diagrama tensão–abertura de fissura.

e, sabendo-se que o diagrama σ nn


cr
- ε nn
cr
é obtido dividindo-se ωcr por uma largura de
banda h que depende do tamanho do elemento finito, é importante que se tenha em
mente que o diagrama σ nn
cr
- ε nn
cr
deverá variar de elemento para elemento para que o

valor de G f seja constante para todos os elementos. Tal consideração implica em que a

área sob o diagrama σ nn


cr
- ε nn
cr
deve ser igual a gf = G f / h, conforme indicado nas

figuras 3.8 e 3.9.

28
É importante ressaltar que apenas algumas equações constitutivas
implementadas no código DIANA ajustam automaticamente os diagramas para que se
tenha constância de G f para todos os tamanhos de elementos. Tal não é o caso do

modelo tension softening multilinear ficando este trabalho aos cuidados do analista ao
determinar os diagramas multilineares que serão utilizados na análise.
O modelo constitutivo de fissura necessita também da determinação dos
módulos DII e DIII que são definidos conforme se segue:

D II = D III = ∞ no caso de retenção total (3.17)


β s
D II = D III = G ; 0< β <1 para o caso de retenção parcial (3.18)
1− β

D II = D III = 0 para o caso de retenção nula (3.19)

A retenção ao cisalhamento expressa pelas expressões (3.17) a (3.19)


corresponde ao fenômeno chamado de engrenamento que é originado pela rugosidade
que existe nas fissuras de elementos estruturais de concreto. No caso da presente tese,
1
utilizou-se retenção parcial com β =
1 + 4447ε nn
cr

O modelo constitutivo fica completamente definido se o critério para início da


fissuração e a relação entre a tensão e a deformação de fissuração forem conhecidos. O
início da fissuração é regido pela tension cut-off e um ângulo inicial entre duas fissuras
sucessivas. Para início da fissuração o código DIANA aplica os seguintes critérios, os
quais devem ser simultaneamente satisfeitos:

• As tensões principais de tração violam a condição de tensão máxima.


• O ângulo entre a fissura existente e a tensão principal à tração excede o
valor do ângulo inicial de fissuração.

Dentre os modelos de tension cut-off disponíveis foi utilizado o modelo linear


correspondente à figura 3.11.

29
σ2

ft

fc ft σ1

fc

Figura 3.11. Tension cut-off linear para estado bi-dimensional


de tensões principais.

A relação entre as tensões e as deformações no sistema de coordenadas globais


pode ser deduzida a partir da decomposição da deformação 3.6, resultando em:

σ = D{ε - εcr} (3.20)

Substituindo-se (3.10) na equação acima obtém-se:

σ = D{ε - N.ecr } (3.21)

Pré-multiplicando por NT e introduzindo (3.10) e (3.8) obtém-se a relação entre


as deformações locais da fissura e as deformações globais:

[
e cr = D cr + N-1Dco N ] -1 N-1 Dco ε (3.22)

A relação entre as tensões e deformações globais é obtida substituindo-se (3.17)


em (3.16).
[ [ ]
σ = D co - Dco N D cr + N-1Dco N ] -1 N-1 D co ε (3.23)

De forma compacta,

[ ]
σ = D co,cr ε (3.24)

30
Uma outra vantagem da decomposição da deformação total em uma parcela
relativa ao concreto e outra relativa à fissura é que ela permite uma sub-decomposição
da deformação da fissura em contribuições separadas de fissuras individuais que
aparecem simultaneamente em um ponto de integração:

ε cr = ε1cr + ε 2cr + ... (3.25)

Em que ε1cr é a deformação global da primeira fissura, ε 2cr a deformação da


segunda fissura e assim sucessivamente. Nesta aproximação, desenvolvida inicialmente
por [23], cada fissura fixa possui seu próprio vetor de deformações locais e icr , seu

próprio vetor de tensões locais s icr e sua própria matriz de deformação Ni. Estes vetores
e matrizes correspondentes a uma fissura podem ser agrupados sob a forma:

ê cr = {e1cr e cr2 ..........}T

ê cr = {s1 s 2 ..........}T (3.26)

N̂ = [N 1 N 2 ..........]

no qual ^ representa a reunião das múltiplas fissuras fixas. Repetindo a substituição de


(3.10) em (3.25), tem-se:

ˆ eˆ cr
ε cr = N (3.27)

ou de forma mais elaborada,

⎧ cr ⎫
⎧s1cr ⎫
⎪ cr ⎪
⎡ D11
⎢ cr
cr cr
D12 ...⎤

e1
⎪⎪ cr ⎪⎪
⎨s 2 ⎬ = ⎢D 21 D cr22 ...⎥ ⎨e2 ⎬ (3.28)
⎪ .... ⎪ ⎢ ... ... ...⎥⎦ ⎪ ... ⎪
⎩ ⎭ ⎣ ⎪⎩ ⎪⎭

Repetindo o procedimento da seção anterior, tem-se para o concreto fissurado


com múltiplas fissuras:

31
[ [
σ = D co - Dco N D̂ cr + N̂ t Dco N̂ ] -1
]
N̂ t D co ε (3.29)

3.2.1.2. Concreto à compressão: plasticidade

Para modelar o comportamento do concreto à compressão é usado o modelo


elasto-plástico perfeito (sem endurecimento) dentro do quadro da plasticidade
associativa.
O comportamento elasto-plástico do material pode ser descrito com as hipóteses
seguintes:
• Uma decomposição das deformações totais ε em uma parcela elástica εe e
uma parcela plástica εp:
ε = εe+ εp (3.30)
• Uma relação tensão-deformação elástica, que traduz a relação entre a
tensão total e a deformação elástica:

σ = D εe (3.31)

onde D é a matriz elástica do material, caracterizada pelo módulo de


elasticidade E, e pelo coeficiente de Poison ν .
• Uma condição de escoamento, que especifica o estado de tensão de inicio
do fluxo plástico. Esta condição de escoamento pode ser escrita como
uma função do vetor de tensões:

f (σ) = 0 (3.32)

• Se o valor da função de escoamento for menor que zero tem-se o estado


elástico e nenhum fluxo plástico ocorrerá. O estado em que a função de
escoamento for maior que zero é inadmissível.
• A lei de fluxo, que especifica o vetor de variação de deformação
inelástica ou plástica em função do estado de tensão. Para a plasticidade
associativa pode-se escrever:

32
n
∂& f
ε& p = ∑ λ&
j =1
j
∂σ
(3.33)

O critério de plastificação utilizado no presente trabalho foi o de Mohr-


Coulomb, que pode ser expresso pela seguinte expressão:

1 1
f(σ) = (σ1 – σ3) + (σ1 + σ3)sen φ 0 - c cos φ 0 3.34)
2 2

onde c é a coesão e φ 0 é o ângulo de atrito interno. Nos exemplos da presente tese foi

usado φ 0 = 30°, sendo a coesão calculada pela expressão:

f c (1 − senφ 0 )
c= (3.35)
2 cos φ 0

deduzida a partir do círculo de Mohr do ensaio de compressão simples conforme


indicado na figura 3.12.

φ0
c
σ

fc

Figura 3.12. Círculo de Mohr

3.2.2. Armaduras

No exemplo do item 5.1 desta tese foram usadas armaduras ativas (protensão) e
passivas. As armaduras são do tipo embutida no concreto, sendo usada uma lei elasto-
plástica (figura 3.13) com o modelo de plasticidade de Von Mises para modelar seu

33
escoamento. Na introdução das armaduras foram usadas tanto barras isoladas quanto
malha para simulação das armaduras distribuidas, ambas aceitas pelo código DIANA.

fsy

Es

Figura 3.13. Diagrama tensão-deformação elasto-plástico,


para a armação de aço.

As armaduras de protensão consideradas foram do tipo barra, sendo que a


transferência da tensão do cabo de protensão para o concreto foi considerada através da
consideração de esforços cisalhantes com distribuição de forma senoidal com a tensão
máxima de 1400 MPa no meio do vão (figura 3.14):
⎛ x⎞
τ τ = 1.4 x 109 x sen ⎜180 ⎟
⎝ l⎠

x
l
Figura 3.14. Distribuição de τ ao longo do eixo longitudinal da viga

3.3. Procedimento de análise não linear

O procedimento de análise não-linear utilizado foi o método de comprimento de


arco com Newton-Raphson.
Em um processo iterativo, a predição para os incrementos de deslocamento pode
tornar-se muito grande, como é o caso de curva carga-deslocamento quase horizontal.
Os passos de carga-deslocamentos das figuras 3.15a e 3.15b podem ser superados
usando o método de comprimento de arco, sendo que no primeiro exemplo a análise
não-linear poderia ainda ser resolvida usando outros procedimentos (controle de
deslocamentos, por exemplo).

34
(a) Snap through (b) Snap-back

Figura 3.15. Controle de comprimento de arco: (a) Snap through, (b) Snap-back

O método do comprimento de arco condiciona a norma dos incrementos de


deslocamentos para um deslocamento prescrito. Isto é feito pelas adaptações
simultâneas das dimensões dos incrementos. As dimensões são adaptadas dentro do
processo iterativo e não fixadas no inicio da iteração. Para inicio da análise serão
definidas: t
f ext como o vetor das forças externas no inicio da análise e ∆λ i f̂ o

incremento do vetor das forças externas. O fator de carga ∆λ i multiplica a unidade de

carga fˆ pode variar durante a iteração.


O incremento iterativo δ ui é dado por:

(
δu i = K i−1 ∆λi fˆ + t f int − f int,i ) (3.36)

que pode ser dividido em duas partes por:

)
δu Ii = K i−1 ( t f int − f int,i ) e δu IIi = K i−1f (3.37)

gerando a expressão incremento total:

δu i = δu Ii + ∆λi δ iII (3.38)

O fator de carga ∆λ i , ainda indefinido na análise pode ser usado para controlar o
vetor incremental dos deslocamentos.

35
4. O CONCRETO DE ULTRA-ALTO DESEMPENHO
ARMADO COM FIBRAS (UHPFRC).
O presente capítulo é baseado nos trabalhos: Ultra-High Performance Fiber Reinforced Concretes
(UHPFRC): An overview de Pierre Rossi [24 ] & DUCTAL®: Ultra-High Performance Concrete
Technology with Ductility de Mouloud Behloul, Agah Durukal, Jean-François Batoz, Gilles Chanvillard.
Lafarge, França [25].

4. 1. Introdução

Concretos de ultra-alto desempenho armados com fibras são o resultado de


pesquisas que começaram nos anos trinta do século passado, visando encontrar meios de
aumentar a resistência mecânica do concreto.
Nos anos trinta, Eugène Freyssinet demonstrou que o concreto mantido sob
pressão durante a cura poderia aumentar sua resistência. Nos anos sessenta pequenas
amostras de concreto e pasta de argamassa foram produzidos usando pressão e calor
simultaneamente em uma atmosfera saturada (i. e. sob condições hidrotérmicas), sendo
que resistências à compressão superior a 650 MPa foram atingidas com estes materiais.
Mais recentemente, dois procedimentos básicos têm sido desenvolvidos para que
possa ser aumentado o desempenho mecânico:

• O primeiro corresponde à obtenção de um concreto com matriz granular


densa conhecida como concreto DSP (do inglês “Densified Small
Particle”). Este concreto tem alto conteúdo de superplastificante e micro-
sílica, usando agregado extremamente resistente (por exemplo bauxita
calcinada ou granito). A resistência à compressão desses materiais pode
variar entre 150 e 400 MPa.
• O segundo corresponde à utilização de argamassa modificada com
polímero, conhecida como concreto MDF (do inglês “Macro Defect
Free”). O processo de polimerização preenche os poros do concreto
resultando em matrizes extremamente resistentes e compactas. Porém,
esses materiais exigem condições especiais de fabricação: é necessário o
emprego de um misturador de alto cisalhamento, sendo que a mistura
resultante deve ser passada através de rolos várias vezes para que seja
atingida uma condição de laminação. Esse processo envolve
necessariamente pressão. Soma-se a esses problemas, o fato de que o
concreto MDF apresenta deformações de fluência consideravelmente
grandes.

Em ambos os casos, os materiais resultantes são muito compactos e


consequentemente frágeis. A adição de fibras é então essencial para aumentar sua
ductilidade.
Como o MDF já é altamente viscoso, a adição de fibras à matriz pode causar
enormes problemas de lançamento. Pesquisadores e fabricantes têm então concentrado
esforços na adição de fibras às matrizes do DSP. O resultado é o atual concreto de ultra-
alto desempenho armado com fibras, UHPFRC (do inglês “Ultra-High Performance
Fiber Reinforced Concrete”).
A recente história de desenvolvimento do UHPFRC foi marcada por três linhas
principais de desenvolvimentos, que podem ser citadas, em ordem cronológica de
aparecimento:

• Os CRC (do inglês “Compact Reinforced Composites”) são UHPFRC


caracterizados por apresentarem entre 5 e 10% de fibras metálicas com 6
mm de comprimento e 0,15 mm de diâmetro. Este tipo de concreto foi
desenvolvido pela companhia Aalborg Portland (Dinamarca);
• Os RPC (do inglês “Reactive Powder Concrete”) são UHPFRC contendo
um máximo de 2,5% de fibras metálicas com 13 mm de comprimento e
0,16 mm de diâmetro. Esse tipo de concreto foi desenvolvido pela
companhia Bouygues (França);
• Os MSFRC (do inglês “Multi-Scale Fibre Reinforced Concrete”) são
UHPFRC contendo misturas de fibras metálicas curtas e longas. Esse
tipo de concreto foi desenvolvido pelo Laboratoire Central des Ponts et
Chaussées (LCPC, France).

Dois tipos de concreto fibroso foram desenvolvidos concorrentemente com


aqueles descritos acima: SIFCON (do inglês “Slurry Infiltrated Fibered Concrete”) e
ECC (do inglês “Engineered Cementitious Composites”). Estes concretos diferem
ligeiramente dos UHPFRC, já que estes dois materiais não possuem uma matriz ultra-
compacta (i.e. uma matriz com ultra-alta resistência à compressão maior que 150 MPa),

37
sendo que a resistência de suas matrizes não excedem 70 MPa. O interesse destes
concretos deve-se ao fato que, sob ação de tração uniaxial eles são dúcteis e exibem
relação constitutiva pós-pico com endurecimento apresentando múltiplas fissuras sob
tração, sendo esta a razão porque são classificados dentro do mesmo contexto do
UHPFRC.

• O SIFCON é produzido de tal maneira que as formas são preenchidas


inicialmente com grande volume de fibras, sendo em seguida injetada
uma pasta de argamassa fluida cobrindo as fibras. Essa técnica resulta em
um alto teor de fibras variando entre 7 e 15%. Para que o preenchimento
seja eficaz, é necessário que a pasta seja extremamente líquida o que
significa que a relação água-cimento deve ser muito mais alta que aquela
de outros tipos de FRC.
• O ECC é produzido usando fibras sintéticas com alto módulo de
elasticidade. O comprimento das fibras geralmente não excede 20 mm e
seu diâmetro é menor que 0,05mm.

A seguir serão revistos alguns fundamentos teóricos relativos ao efeito mecânico


das fibras no comportamento à tração uniaxial dos diferentes tipos de UHPFRC (CRC,
RPC, MSFRC) de SIFCON, e ECC.

4.2. O processo de fissuração do concreto à compressão e à tração

A discussão seguinte é extraída do trabalho publicado por Rossi [26] [27]. Antes
de descrever o papel desempenhado pelas fibras metálicas na fissuração do concreto,
começaremos descrevendo os diferentes estágios deste processo. Para isto
distinguiremos duas situações de fissuração classificadas em relação ao estado de
tensões ao qual a estrutura de concreto está submetida:

• A situação onde a fissuração é principalmente governada pelas tensões


de tração macroscópica;
• A situação onde a fissuração é principalmente governada por tensões de
compressão macroscópica.

38
São introduzidas também as seguintes definições:

• Microfissura: é a fissura cujo comprimento pode ser considerado muito


pequeno em relação à amostra ou à estrutura.
• Macrofissura: é a fissura cujo comprimento não pode ser considerado
muito pequeno em relação à amostra ou à estrutura.
• Fissura Ativa: é a fissura cujo eixo sofre deslocamento normal ou
tangencial.
• Fissura Ativa Crítica: é a fissura que leva a uma concentração de tensões
e localização de deformações em um dado volume de concreto.

Logicamente, segue-se das definições anteriores, que a macrofissura ativa é uma


microfissura ativa que se tornou crítica.
Das considerações anteriores pode também ser deduzida a seguinte sentença: a
transição do comportamento na escala material para o comportamento na escala
estrutural corresponde à transição da microfissuração ativa para a macrofissuração ativa.

4.2.1. O Processo de fissuração do concreto à tração

Simplificadamente, pode-se dizer que quando um volume de concreto está


sujeito a tensões de tração microscópicas o processo de fissuração ocorre em 3 fases:

1. Uma primeira fase de microfissuras distribuídas no volume do concreto.


2. Uma segunda fase durante a qual estas microfissuras juntam-se para
criar uma ou mais macrofissuras. Esta é a fase durante a qual a fissura
torna-se localizada.
3. Uma terceira fase durante a qual uma ou mais macrofissuras propagam
causando a fratura do volume de concreto.

A primeira fase no processo de fissuração corresponde ao comportamento na


escala material, a fase da localização corresponde à transição do comportamento na

39
escala material para o comportamento na escala estrutural, e a última fase corresponde a
um comportamento especificamente na escala da estrutura.

4.2.2. O Processo de fissuração do concreto à compressão

O mecanismo aqui envolvido pode ser dividido em três fases:


1. Durante a primeira fase de carregamento microfissuras são geradas
randomicamente no volume da amostra, com uma orientação preferencial
paralela às tensões macroscópicas. A distribuição casual da fissuração
está vinculada à natureza heterogênea do material e à existência de
pontos mais ou menos resistentes no interior da amostra. A orientação
das fissuras é governada pelo fato de que duas fases sólidas no concreto
(a pasta de cimento e as partículas de agregados) não têm a mesma
rigidez e de que quando o concreto está sujeito à compressão
longitudinal, tensões de tração desenvolvem-se na direção perpendicular
à direção da compressão, visto que estas fissuras são criadas por efeito de
tração.
2. Na segunda fase as microfissuras unem-se para formar macrofissuras as
quais ocorrem sempre paralelamente à direção das tensões de
compressão. Estas macrofissuras dividirão a amostra de concreto
internamente em pequenas colunas de variadas dimensões e formas.
3. Na última fase, aparecem fissuras diagonais dentro das pequenas
colunas. Estas fissuras juntam-se para criar um plano de deslizamento
diagonal ao nível da escala da amostra.

Na primeira e segunda fases, as microfiossuras e macrofissuras não são ativas e


são, portanto associadas com o comportamento na escala do material. Elas são ativas na
terceira fase, podendo ser associadas a um comportamento em nível estrutural.
A curva carga versus deslocamento longitudinal de um ensaio à compressão
indica que os dois primeiros estágios no processo de fissuração coincidem com um
aumento na carga, porque durante essa fase a amostra de concreto pode ser considerada
como uma coleção de pequenas colunas não danificadas (a microfissura que pode estar
presente dentro de uma pequena coluna não gera não-linearidade significante). Contudo
a carga máxima ocorre depois do surgimento da fissura diagonal. Neste estágio, a

40
amostra de concreto amolece (redução da carga com deslocamento longitudinal). Esse
comportamento é regido pela propagação da fissura oblíqua e pela fricção entre as
bordas dessa fissura.

4.3. O efeito de fibras sobre duas escalas: material e estrutural

O desenvolvimento da idéia de que fibras agem sobre duas escalas, ou o


Conceito de Multi-Escala, tem conduzido a um claro entendimento do papel das fibras
em diferentes fases do processo de fissuração do concreto:

• Durante a fase da fissuracão randômica, fibras metálicas podem costurar


fissuras ativas e atrasar o princípio de localização. Há, portanto, um
aumento na resistência e ductilidade na escala do material.
• Durante a fase de propagação das macrofissuras ativas, as fibras de
metal podem também costurar estas macrofissuras, deste modo
provendo grande capacidade de carga e ductilidade na escala da
estrutura.

Os efeitos físicos acima relatados indicam que as dimensões ótimas das fibras
metálicas para que exista ação sobre o processo de microfissuração e macrofissuração
ativas serão diferentes. No caso para o qual as fibras devem agir sobre microfissuras,
grande número delas é requisitado e seus diâmetros devem ser pequenos (alta área de
superfície específica). Entretanto, pequenas fibras interferem na trabalhabilidade do
material que é fortemente dependente da razão comprimento/diâmetro das fibras.
No caso das macrofissuras, as fibras devem ser compridas o suficiente para
ancorarem adequadamente na matriz. Tendo em vista a trabalhabilidade, as fibras
compridas devem ser usadas em menor percentagem que as fibras curtas.

È importante ser considerado que os enunciados acima são regras gerais, que
requerem algum detalhamento:

• As restrições para a utilização de uma alta percentagem de fibras


somente aplicam-se quando a trabalhabilidade é importante para
lançamento do concreto, como no caso de simples colocação,

41
bombeamento ou jateamento de FRC. Onde a trabalhabilidade não é
importante, por exemplo, no caso de um FRC muito seco compactado
com rolo ou no caso de SIFCON, uma alta percentagem de fibras longas,
de diâmetro pequeno pode ser adicionada, de forma que um único
tamanho de fibra pode atuar em ambas as escalas material e estrutural.
• O comprimento das fibras a ser usado também depende muito das
características mecânicas da matriz. Se a matriz é muito compacta e
adere bem com as fibras, uma fibra considerada curta poderia funcionar
efetivamente para ambas microfissuras e macrofissuras.

Nos subitens a seguir são vistos com mais detalhes os comportamentos


multiescala em tração e em compressão

4.3.1. O caso da tração

Em vista do que foi acima relatado, fica claro que a resistência à tração e a
ductilidade do material podem ser aumentadas usando uma alta proporção de fibras
curtas, enquanto que para aumentar a capacidade de carga e a ductilidade de uma
estrutura sob tração deve ser adicionada uma baixa porcentagem de fibras longas.

4.3.2. O caso da compressão

Conforme já foi acima relatado, sabe-se que fissuras verticais em compressão


não são consideradas ativas já que elas não exercem nenhum papel direto na transição
do comportamento em nível material para o comportamento em nível estrutural. Elas
estão, porém, na origem das fissuras diagonais, consideradas ativas.
Retardando a propagação de fissuras verticais, as fibras poderiam, então,
retardar o aparecimento de fissuras diagonais e então aumentar a resistência à
compressão do concreto. Chega-se então à conclusão que, para atingir este estágio, as
fibras poderiam agir numa escala que é muito pequena em comparação ao tamanho das
maiores partículas de agregado no concreto, isto é, na escala da pasta de cimento, e que
a porcentagem de fibras adicionadas teria que ser muito elevada para ser
economicamente justificável.

42
Pode-se, não obstante, enfatizar que, como microfissuras verticais são criadas
por tensões de tração (geradas na escala da pasta de cimento por uma natureza
heterogênea do concreto e pela diferença de rigidez entre o agregado e a pasta de
cimento), as fibras introduzirão uma heterogeneidade adicional que pode também gerar
microfissuras verticais. Portanto, não é simples avaliar os impactos positivos
(retardando a propagação de microfissuras) e os impactos negativos (criando novas
fissuras verticais).
Com respeito às fissuras diagonais, as fibras não resistem à abertura da fissura
como no caso de fissuras de tração, mas resistem principalmente aos deslocamentos
tangenciais das bordas da fissura. Porém, como a resistência à flexão das fibras é menor
que a resistência à tração, a sua efetividade mecânica será menor em caso de fissuras de
compressão oblíquas do que nas fissuras de tração.
Deve também ser notado que, quando as bordas das fissuras oblíquas movem-se
tangencialmente, elas geram deslocamentos normais nas bordas das fissuras verticais
inativas, tornando-as ativas. Sendo assim, por razões geométricas, os deslocamentos
normais das bordas das fissuras verticais, que são da mesma ordem de grandeza que
aqueles que ocorrem nas microfissuras geradas por tensões de tração uniaxial, podem
ocorrer somente com grandes deslocamentos tangenciais de fissuras oblíquas, isto é,
quando ocorre a transição entre o comportamento em escala material para aquele em
escala estrutural.
Desta maneira, fibras que são incapazes de exercer seu papel durante a criação
de fissuras verticais podem, indiretamente, estar envolvidas no desenvolvimento de
fissuras oblíquas afetando a intensidade da abertura das fissuras verticais.

Como resultado podem ser presenciadas duas situações:

1. No caso em que é adicionada uma alta percentagem de fibras curtas,


estas têm ação mecânica considerável nas microfissuras diagonais, mas
não considerável nas microfissuras verticais que têm abertura bastante
limitada. Conseqüentemente, tendo em vista que as fibras são
mecanicamente menos efetivas para as fissuras de compressão oblíqua
(deslocamentos tangenciais) do que para as fissuras de tração uniaxial
(deslocamentos normais), pode-se considerar que a adição de uma alta

43
percentagem de fibras curtas tem um efeito menos significativo sobre a
resistência à compressão que sobre a resistência à tração.
2. No caso em que é adicionada uma baixa percentagem de fibras longas, as
fibras exercem efeito mecânico sobre ambas macrofissuras, diagonal e
vertical. Elas podem, portanto, aumentar a capacidade de carga e
ductilidade na escala da estrutura.

Em resumo, fibras metálicas podem modificar a resistência à tração e a


ductilidade em ambas as escalas material e estrutural, enquanto que no que concerne as
tensões de compressão elas apenas aumentam a ductilidade na escala da estrutura.
Assim, o propósito do uso de fibras em UHPFRC é principalmente de melhorar
o desempenho sob força de tração (resistência e ductilidade) e de assegurar boa
ductilidade em compressão. O aumento da resistência à compressão é alcançado ao
melhorar a densidade e homogeneidade da matriz (usando muito baixa relação água-
cimento, alta percentagem de micro sílica, agregados muito duros, etc).

4.4. Discussão sobre os diferentes tipos de UHPFC

Nos subitens que se seguem são discutidos diversos aspectos sobre os diferentes
tipos de UHPFRC.

4.4.1. CRC

Em vista do que foi dito acima, a opção da escola dinamarquesa de usar uma alta
percentagem de fibras curtas (entre 5% e 10%) pode conduzir a uma melhoria nas
características mecânicas do material sob tração (resistência e ductilidade), mas não
pode ter um efeito significativo sobre a capacidade de carga e ductilidade de uma
estrutura, com exceção de membros estruturais muito delgados (por causa dos efeitos de
escala). Conseqüentemente, para membros estruturais mais espessos como lajes ou
vigas, os CRC são usados com uma percentagem muito alta de armadura de concreto
convencional (5 ou 10 vezes a percentagem usual). A efetividade da combinação de
altas percentagens de armadura e de fibras metálicas deve-se às seguintes razões:

44
• Como a alta percentagem de fibras curtas aumenta a resistência à tração
do material mais do que sua ductilidade, para construir uma estrutura
dúctil com esse tipo de concreto, é imperativa o uso de alta percentagem
de armadura.
• Sabe-se que estruturas são enfraquecidas quando certa percentagem de
armadura é excedida, primeiramente porque altíssimas concentrações de
tensões são criadas na superfície da estrutura levando a um grande
número de fissuras, e secundariamente porque as armaduras são
submetidas a um efeito de grupo desfavorável que reduz sua eficiência
(há mais fissuração ao redor das barras). Fibras curtas ajudam no
controle de fissuração de superfície e ao redor das barras da armadura.

Essa combinação de dois diferentes tipos de armação que operam em diferentes


escalas é, portanto, excelente. Contudo, os CRC têm alguns inconvenientes, sendo os
principais:

• É uma solução técnica extremamente cara tanto no que diz respeito ao


material como no que diz respeito à mão de obra (as barras da armação
têm instalação difícil e longa);
• Restrição da liberdade de formas de estrutura.

Pesando-se os pontos positivos e negativos desse material, fica claro que sob o
ponto de vista técnico e econômico seu mercado é restrito a estruturas que exigem
características mecânicas e durabilidade excepcionais, podendo ser citados como
exemplo, plataformas off-shore e estruturas militares.

4.4.2. RPC

Os RPC usam fibras que são duas vezes mais longas que aquelas usadas nos
CRC, mas, com mesmo diâmetro. A escolha de fibras com altíssima superfície
específica tem duas conseqüências:

45
• A primeira é que o mesmo nível de trabalhabilidade obtida pelos CRC
com percentagem entre 5 e 10% de fibras, não é possível de ser obtido
com RPC mesmo com um teor de fibras tão baixo como 2,5 %. Este
conteúdo de fibras relativamente baixo tem 2 efeitos adversos no
desempenho mecânico dos RPC:
o As fibras não elevam a resistência à tração uniaxial da matriz que
é de cerca de 8 MPa;
o O comportamento pós-fissura do material é altamente variável, já
que a matriz é extremamente frágil por não haver uma
percentagem suficientemente alta de fibras.
Isso mostra que adicionando um único tamanho de fibras metálicas a uma
matriz de ultra-alta resistência não é possível alcançar ação efetiva nas
escalas do material e da estrutura.
• A aderência fibra-matriz (CRC e RPC têm uma matriz similar) é
consideravelmente melhor no caso de RPC que do CRC. As fibras
podem, portanto, ter um efeito sobre fissuras mais largas e melhorar o
desempenho da estrutura no que concerne a capacidade de carga e a
ductilidade. O RPC ao contrário do CRC, não demanda o uso de uma
grande quantidade de armadura convencional para que sejam obtidas
estruturas dúcteis.

Quanto às aplicações industriais de RPC pode-se considerar o seguinte:

• Em vista de sua relativamente baixa resistência à tração uniaxial (8


MPa), o RPC pode ser usado somente em vigas ou lajes de concreto
armado ou protendido para substituir armadura transversal (por exemplo
para resistir a força de cisalhamento na estrutura). Além disso, o alto
custo do material de quase 1000 US$/m³ indica que para tornar-se
econômico o material deve corresponder a uma estrutura extremamente
leve e durável;
• Variações no desempenho mecânico do concreto armado com fibras
dependem da percentagem de fibras que são corretamente orientadas
com respeito às fissuras. No que diz respeito ao RPC, como a

46
percentagem de fibras em relação à resistência da matriz não é muito
alta, é essencial orientar as fibras corretamente em relação às fissuras que
aparecerão na estrutura. No caso de membros estruturais delgados esse
requerimento será verificado já que as fibras são necessariamente
orientadas de forma ortotrópica, perpendiculares às fissuras de flexão
(tais elementos estruturais são essencialmente sujeitos à tensão de
flexão). É, portanto possível obter elementos estruturais delgados de
RPC que são mecanicamente homogêneos e dúcteis.

Ambos os tipos de aplicação industrial são atualmente usados na França.

4.4.3. MSFRC

Esses materiais correspondem a uma aplicação direta do conceito de multi-


escala descrito acima. A idéia é misturar fibras curtas com longas para atuar em ambas
as escalas em nível de material (incrementando a resistência à tração) e em nível de
estrutura (incrementando a capacidade de carga e a ductilidade).
Usando esta abordagem, não existem limitações quanto à trabalhabilidade para
que se use um teor volumétrico de fibras que pode ser tão alto quanto 7%. No que diz
respeito à tração uniaxial, o material exibe comportamento de deformação com
endurecimento podendo ser atingidas resistências da ordem de 15 MPa. Um exemplo de
uma mistura de MSFRC pode ser obtido através de uma mistura realizada em
laboratório que constou de 5% de fibras de aço com 5 mm de comprimento e 0,25mm
de diâmetro e 2% de fibras de aço com 25mm de comprimento e diâmetro de 0,3mm e
gancho na extremidade, ambos tipos de fibras posicionados de forma alinhada.
Esses materiais ainda existem somente no laboratório e não tiveram nenhuma
aplicação industrial.

4.4.4. SIFCON

Como foi dito anteriormente, o princípio de elaboração do SIFCON consiste em


adicionar uma máxima quantidade de fibras procurando evitar problemas de lançamento
devido à conseqüente diminuição de trabalhabilidade do material. Para atingir tal
objetivo, a colocação das fibras e da matriz nas formas são conduzidas separadamente.

47
Essa técnica de lançamento significa que o material tem características particulares que
o diferem dos outros concretos fibrosos, podendo ser listados:

• Como a matriz é extremamente fluida, com uma alta relação água-


cimento, sua resistência à tração uniaxial é baixa, sendo que devem ser
usadas fibras com alta área superficial (alta relação
comprimento/diâmetro);
• A técnica usada para incorporar as fibras é o motivo de o material ser
altamente anisotrópico;
Estas características estruturais incomuns são refletidas nas características
mecânicas do material:
• Por causa da estrutura anisotrópica do material seu comportamento
mecânico é também altamente anisotrópico; uma viga de SIFCON, por
exemplo, tem resistência à flexão muito alta, mas pobre desempenho
quando sujeita a cisalhamento ou forças localizada.
• Sob tração uniaxial (na direção das fibras) a presença de uma altíssima
percentagem de fibras longas em uma matriz de baixa resistência conduz
a uma multifissuração e a um comportamento muito dúctil. Contudo, a
resistência permanece baixa se considerarmos a alta percentagem de
fibras adicionadas.

Como resultado da particularidade de fabricação do SIFCON, aplicações


industriais deste material são ainda limitadas. As aplicações mais promissoras do
SIFCON parecem ser a fabricação e reparos de pavimentos e lajes. Com SIFCON é
possível obter lajes industriais sem junta tendo em vista suas características de
multifissuração. Se bem que algumas destas aplicações industriais tenham sido
realizadas, estes são casos excepcionais em vista do alto custo do material.

4.4.5. ECC

A resistência à compressão deste material geralmente não é superior a 70MPa e


sua resistência à tração não excede em 10% aquela de concreto sem fibras com a mesma

48
resistência à compressão, sendo que sob tração uniaxial ele exibe deformação com
endurecimento, multi-fissuração e ductilidade.
Com o objetivo de alcançar tais características, são usadas fibras sintéticas com
baixa densidade (< 1,5) e alto módulo de elasticidade (> 40GPa). Estas fibras são
relativamente curtas, com altíssima área superficial (l ≤ 20mm e φ ≤ 0,05mm). A
percentagem máxima de fibras adicionadas é de 2%. A alta área superficial combinada
com a baixa densidade corresponde a um limite quanto à trabalhabilidade. Uma análise
cuidadosa do ECC indica diversas similaridades conceituais com o RPC. Em ambos os
casos o uso de um único tamanho de fibra que é relativamente curta, com uma alta
relação comprimento/diâmetro, permite que a fibra atue sobre ambas as escalas material
e estrutural.
Esse objetivo não tinha sido alcançado pelo RPC já que as fibras metálicas não
conseguiram ter uma ação significativa na escala do material, objetivo que foi atingido
no caso do ECC. Tal fato ocorre porque a matriz do ECC contém muito mais fibras que
a matriz do RPC, já que o comprimento das fibras sintéticas é similar àquele das fibras
metálicas mas seu diâmetro é quatro vezes menor. Além disto, as fibras sintéticas
atuam muito eficientemente na fissuração porque a sua alta área superficial contribui
para incrementar a aderência à matriz. A tensão de tração absorvida pelas fibras é
portanto maior que a baixa resistência à tração da matriz que é de 3 a 4 vezes mais alta
para o RPC.
As potenciais aplicações industriais desse tipo de material situam-se na área de
produtos e elementos industriais para os quais a resistência à compressão das fibras e o
comportamento das multi-fissuras do material sejam as principais exigências. O custo
relativamente alto de fibras sintéticas de alto módulo indica que as considerações
técnicas devem ser predominantes sobre as imposições econômicas para o emprego de
fibras em maiores teores.
Deve ser também enfatizado que a relação comprimento/diâmetro muito alta das
fibras usadas no ECC indica que este material é geralmente altamente viscoso quando
fresco, particularmente quando contém um teor volumétrico de 2% de fibras. Sendo
assim, existe dificuldade para o lançamento do ECC quando são usadas técnicas
convencionais de concretagem. A técnica de lançamento por extrusão, que é bastante
recente para concreto, parece ser mais bem adaptada ao material, visto que as fibras são
muito flexíveis, sendo que pesquisas estão sendo conduzidas nesta área.

49
4.5. O UHPFRC comercial utilizado na presente tese desenvolvimentos e desafios -
DUCTAL® de Lafarge Cimento.

Os três tipos originais de UHPFRC, junto com o SIFCON e o ECC constituíram


a base para o desenvolvimento de materiais similares ou derivados em diferentes partes
do mundo. DUCTAL® é um destes novos materiais. O DUCTAL® é em realidade um
tipo de UHPFRC próximo ao RPC (o RPC na sua forma original não é mais produzido)
que foi desenvolvido por três empresas francesas: LAFARGE, fabricante de materiais
de construção, BOUYGUES, contratante na engenharia civil e estrutural e RHODIA,
fabricante de materiais químicos. Os diversos produtos da linha DUCTAL® têm
algumas novas características se comparadas com o RPC original:

• a compacidade (e conseqüente a resistência) da matriz foi aumentada


com uso de fillers de diâmetro muito pequeno;
• a superfície das fibras foi tratada quimicamente para incrementar a
aderência com a matriz;
• a homogeneidade do desempenho mecânico foi melhorada com a
substituição de uma quantidade de areia por microfibras minerais como a
volastonita.

O DUCTAL® atende ao conceito multi-escala descrito anteriormente no presente


capítulo. As fibras que compõem o material podem ser fabricadas com aço (DUCTAL®
FM), material orgânico (DUCTAL® FO) ou uma combinação de aço e material orgânico
(DUCTAL® AF).
Os materiais do tipo UHPFRC como o DUCTAL® já, encontram recomendações
internacionais que permitem sua utilização na construção civil. Por exemplo, na França,
novas recomendações para o uso do concreto de ultra-alto desempenho armado com
fibras foram editadas em maio de 2002 [28]. Essas recomendações foram estabelecidas
pelo grupo de trabalho BFUP (Béton Fibré Ultra Performant) coordenado pelo SETRA
(service Technique des Poutes et des Autoroutes) e com representantes da indústria da
construção (contratantes, agências de controle, provedores, autoridades de certificação).

O desenvolvimento do DUCTAL® baseou-se na aplicação de conceitos de


compacidade máxima [29] originando minimização do número de defeitos tais como

50
micro-fissuras e espaços porosos, o que permitiu alcançar uma maior percentagem do
potencial da capacidade de carga de seus componentes provendo propriedades de maior
durabilidade.
A aplicação de tal conceito originou um concreto proporcionado com tamanhos
de partículas variando desde um máximo de aproximadamente 600 µm, até menos que
0,1 µm para obter uma mistura muito densa que minimiza os espaços vazios no concreto
[30] [31] [32].
O programa de desenvolvimento do DUCTAL® foi conduzido baseado nos
seguintes princípios:

• Melhoria da homogeneidade pela eliminação de agregados graúdos;


• Melhoria de densidade por otimização da mistura granulométrica;
• Melhoria da micro-estrutura por tratamento de cura térmica;
• Aumento da ductilidade por incorporação de fibras de tamanho
adequado, utilizando conceitos de multi-escala;
• Utilização de procedimentos de mistura e de lançamento tão próximos
quanto possíveis da prática existente.

Aplicando os três primeiros princípios foi possível definir um concreto com


muito alta resistência à compressão, mas com baixa ductilidade. A inclusão de fibras
adequadas aumenta drasticamente a resistência à tração e fornece um nível substancial
de ductilidade.
Para aumentar o desempenho mecânico, pode-se optar por cura térmica, sendo
que para cada aplicação, de acordo com os desafios técnicos e econômicos, a tecnologia
DUCTAL® é ajustada para alcançar o produto mais adaptado para os requerimentos da
estrutura a ser elaborada.
A mistura fresca de DUCTAL® tem propriedades muito avançadas de
fluidibilidade e auto-adensamento, sendo que os equipamentos industriais usuais são
geralmente capazes de realizar a mistura de DUCTAL® exigindo apenas ajustes
mínimos.
A matriz do DUCTAL® é muito fina e densa, e é capaz de conferir qualquer tipo
de textura à superfície do elemento estrutural. Usando pigmento adequado, uma gama
muito extensa de efeitos de coloração pode ser utilizada. Graças a essas propriedades,

51
DUCTAL® é material com grande potencial para aplicações arquitetônicas onde na
maioria das vezes altas propriedades mecânicas não são os únicos requisitos.

4.5.1. Comportamento mecânico

4.5.1.1. Propriedades Mecânicas

A figura 4.1 mostra o comportamento à flexão do DUCTAL®. Pode ser


observado que há uma resistência à flexão máxima que é superior a duas vezes a tensão
da primeira fissura e mais que cinco vezes a tensão máxima do concreto comum. Esta
alta resistência e conseqüente ductilidade permitem projetar estruturas sem nenhuma
armação passiva secundária, e sem armação de cisalhamento.

σ(MPa)

Concreto comum

Deslocamento (µm)
Figura 4.1. Comportamento à flexão do DUCTAL®

O comportamento dúctil observado no ensaio de flexão antes do pico é


caracterizado por múltiplas fissuras sem nenhuma localização de uma maior fissura
como mostrado na figura 4.2.

52
Figura 4.2. Múltiplas fissuras.

A figura 4.2 mostra múltiplas fissuras na zona de tração como observado após a
ruptura por flexão; pode-se observar que a abertura das fissuras é tão pequena, que estas
não podem ser vistas a olhos nus,sendo que a superfície deve ser molhada com álcool
para impor contraste às fissuras; o aparecimento da única fissura visível coincide com a
carga máxima (processo de localização).

4.5.1.2. Deformação Lenta & Comportamento de Retração

Deformação lenta e retração são provavelmente as melhores características do


DUCTAL®. Para um concreto normal o coeficiente de deformação lenta pode alcançar
de 3 a 4. Para um concreto de alto desempenho o coeficiente de deformação lenta é
reduzido, mas a deformação diferida é geralmente maior que a elástica. O coeficiente de
deformação lenta do DUCTAL® é menor que 0,8 e, quando um tratamento térmico é
aplicado, o coeficiente de deformação lenta é muito baixo, sendo da ordem de 0.2
(figura 4.3). Desta forma, quando se usa tecnologia de protensão, as perdas são
substancialmente reduzidas.
Como a relação de água/cimento é muito baixa, DUCTAL® não exibe
praticamente nenhuma retração de secagem (nenhuma perda de peso pode ser medida).

53
Uma alta retração autógena pode ser observada (300 para 400 microstrain), mas
quando é aplicado o tratamento a calor, essa retração é completa até o final do
tratamento, sendo que após a cura térmica nenhuma retração residual ocorre [25].

Figura 4.3 Deformação lenta típica do DUCTAL® [25]

Figura 4.4 Retração do DUCTAL®: após tratamento térmico, nenhuma


fissura de retração é observada [25].

Um estudo de retração autógena e por secagem de concreto de alto desempenho


(ConAD) foi realizado por Formangini [31], os resultados demonstraram que, aos 3
dias, a retração autógena atingiu 41% da retração final (856 µm/m – valor medido aos
90 dias), com valor médio de 355 µm/m e desvio padrão de 100 µm/m. Nas idades de 28
dias e 60 dias, a respectiva retração autógena ocorrida foi de 90% (com valor médio de
772 µm/m e desvio padrão de 83 µm/m) e 98% (com valor médio de 840 µm/m e desvio
padrão de 75 µm/m) da retração final do concreto aos 90 dias.

54
A retração por secagem, executada a partir dos prismas utilizados no ensaio de
retração autógena, apresentou valor médio de retração, decorridos 130 dias de ensaio, de
210 µm/m e desvio padrão de 33 µm/m.

4.5.1.3. Comportamento quando submetido ao fogo e a altas temperaturas

A resistência ao fogo é um dos principais temas de pesquisa e desenvolvimento


na indústria da construção. Os concretos de ultra-alto desempenho são considerados na
classe M0 (não-inflamável) que reduzem a extensão do fogo. Contudo, a porosidade
muito baixa dos UHPCs induz grandes tensões internas. Nestes materiais, a porosidade
é totalmente desconectada do exterior o que impede que o vapor d’água escape.
Com o aumento da pressão dentro do material ocorre o fenômeno de spalling.
No caso do DUCTAL® o spalling foi quase suprimido pelo uso adequado de fibras
orgânicas. Acima de 150 °C, tais fibras começam a amolecer e fundir, assim provendo
rota de escape para o vapor aprisionado. Esta abordagem foi aplicada para um novo tipo
de DUCTAL®. Como a matriz é completamente fechada quando comparada à matriz de
concretos de alto desempenho, pesquisas foram desenvolvidas para criar um tipo de
DUCTAL® que não apresente spalling quando submetido ao fogo [25] [33].
Diferentes tipos de estruturas, colunas e vigas, carregadas ou não, foram
ensaiadas, na França (CSTB) e Finlândia (VTT), sob avaliação do ISO com sucesso.
Também testes de aquecimento de tração uniaxial foram executados pelo Instituto
Politécnico di Milano.
As propriedades mecânicas desse novo DUCTAL® referidas como DUCTAL® -
AF são similares ao DUCTAL® - FM.

4.5.2. Durabilidade

A microestrutura do DUCTAL® é completamente fechada e previne a intrusão


de qualquer agente agressivo. Tais características fornecem ao material desempenho de
ultra alta durabilidade.

A completa caracterização das propriedades de durabilidade do material foi


executada em diferentes laboratórios: INSA Toulouse - Intitut National dês Sciences

55
Appliquées, LCPC – Laboratoire Cental des Ponts et Chaussées, EDF/CEMETE, ESPCI
– Ecole Supérieure de Physique de Chimie Industrielles, Minas de Nancy, LERM –
letricité de France, nos quais a distribuição de porosidade, permeabilidade de gás,
ensaio de carbonatação, ensaio de difusão de cloro, ensaio de lixiviação e ensaio de
caracterização de microestrutura MNR foram feitos. Também a estabilidade química do
material foi testada.
Ensaios de congelamento e descongelamento foram executados em amostras de
Ductal® em: CEA – Centre d´Energie Atomique e também em CEBTP - Centre
d´Etudes et de Recherches du Batiment et dês Travaux Publics. Os ensaios foram
realizados até 300 ciclos (acima dos 100 preconizados pelas normas sem nenhuma
degradação).

Ensaios de laboratório foram executados pelo CSIC (Espanha) no qual


DUCTAL® foi submetido a diferentes compostos químicos agressivos (sulfato de
cálcio, sulfato de sódio, ácido acético, sulfeto de amônia e nitrato e também água do
mar e água destilada). Os resultados exibem uma resistência muito boa para os ataques
químicos.
Outros ensaios em condições operacionais severas foram executados no Instituto
Francês de Petróleo (IFP) no qual DUCTAL® foi submetido a diferentes gases (CO2,
CH4, H2S), em altas temperaturas (120°C) e alta pressão (7 MPa) mostrando
novamente alta resistência inesperada.
Ensaios de envelhecimento também foram executados no CSTB no qual foi
demonstrada a auto-selagem do DUCTAL®.

4.5.3. Aplicações

O ultra alto desempenho do DUCTAL® proporciona aplicações em diferentes


domínios nos quais são requeridos do material, ao menos:

• Ultra-alta resistência
• Durabilidade
• Os aspectos arquitetônicos

Tais aplicações são descritas nos itens que se seguem:

56
4.5.3.1 Ultra-alta resistência

Um material com altíssima resistência última à compressão e à tração na flexão


oferece oportunidades interessantes no campo de concreto protendido. Como pode ser
esperado, a alta capacidade de tração na flexão, também dá origem à capacidade
extremamente alta de cisalhamento. Isto permite que DUCTAL® suporte carga de
cisalhamento na estrutura, sem necessidade de armação auxiliar de cisalhamento.
A eliminação de armação passiva torna possível o uso de seções mais delgadas e
uma maior variedade de formas de seção transversal inovadoras. As atuais formas
estruturais pré-fabricadas usadas para vigas protendidas em pontes e construções têm
sido definidas para concretos com menor desempenho. Sendo assim com o objetivo de
utilizar as propriedades mecânicas avançadas do DUCTAL®, podem ser desenvolvidas
novas formas no projeto de vigas protendidas, visto que o peso próprio da viga pode ser
reduzido por um fator de três.
Entre estes tipos de aplicações podem-se listar o Shepherds Trafic Bridge
construído na Austrália, 5 passarelas: Sherbrooke no Canadá – Seonyu na Coréia
(Figura 4.5) – Sermaises na França – Sakata Mirai (figura 5) e Akakura no Japão e o
abrigo da estação LRT de Shawnessy (figura 4.6).

(a) (b)

Figura 4.5 a) Passarela Seonyu, (Coréia), b) Passarela Sakata Mirai (Japão)

Cabe ainda citar um importante trabalho de pesquisa e desenvolvimento que está


sendo realizado nos EUA pela FHWA (Federal High-Way Administration) com o apoio
do MIT com o objetivo de projetar pontes de pequeno vão feitas de DUCTAL® [34].

57
Figura 4.6 Abrigo de DUCTAL® - FO da Estação de Trem LRT
de Shawnessy, Canada.

4.5.3.2. Aplicações orientadas à durabilidade

A durabilidade do DUCTAL® é tão importante quanto a resistência mecânica.


Combinando resistência e durabilidade, DUCTAL® pode ser a solução ideal para
estruturas em ambientes severos. A durabilidade do material também diminui os custos
de manutenção e corresponde a uma solução muito competitiva.
DUCTAL® foi usado em várias aplicações orientadas à durabilidade e à
resistência ao fogo, como as vigas e traves (mais de 2000) usadas para a unidade de
força da torre de resfriamento da usina atômica de Cattenom-França, as ancoragens de
retenção de terra (mais de 6000) usadas na Ilha de Réunion (figura 4.7) – França e o
DUCTAL® -AF usado para a construção de colunas compostas do Museu Reina Sofia
em Madri (Espanha).

Figura 4.7 Ancoragens de retenção de terra de DUCTAL® -


Ilha de Réunion (França)

58
4.5.3.3. Aplicações arquitetônicas

O uso de um material do tipo concreto, mas com possibilidades quase ilimitadas


de aparência, textura e cores tem entusiasmado os arquitetos por dar a eles acesso a um
inesperado mundo novo de formas e volumes. DUCTAL® foi usado em várias
aplicações orientadas arquiteturalmente como os abrigos de ônibus em Tucson (EUA),
vasos de flores em Rennes (França), cabines para banhos, toldos (figura 4.8), painéis de
fachada em Mônaco e torre de relógio em Kyoto no Japão.

(a) (b)

Figura 4.8 Exemplos de aplicações arquitetônicas: (a) Toldos, Universidade de


La Doua, Lyon, b) e vaso de flores, Rennes, França.

4.5.4. Características e composição típica do DUCTAL® usado na presente tese

O material utilizado na presente pesquisa foi o DUCTAL® FM cujas principais


características nominais são dadas na Tabela 1. Uma composição típica do material é
apresentada na Tabela 2. (ver também Acker [35], 1999 e Orange et al [29]).

59
Tabela 1: Principais características de DUCTAL® FM
Resistência à compressão 150 – 180 MPa
Resistência à flexão 32 MPa
Resistência à tração simples 8 MPa
Módulo Young 50 GPa
Energia de fratura Gf 20.000 – 30.000 J/m²
Taxa crítica de liberação de energia Gc 20 – 30 J/m².
3
Massa específica 2500 kg/m
Coeficiente de fluência 0.15 – 0.30

Tabela 2: composição típica de DUCTAL® FM


Componente Teor relativo ao cimento em massa

Cimento 1.000
Areia (sílica não ativa) 1.250
Sílica flour 0.100
Sílica ativa 0.150
Volastonita (micro fibra mineral) 0.200
Fibra de aço 0.220
Superplastificante 0.016
Água 0.210

4.5.5. Conclusão

DUCTAL® é uma nova tecnologia de concreto de ultra-alta resistência que


constitui inovação em projeto de materiais e estruturas de concreto. Essa família de
produtos é caracterizada por uma microestrutura muito densa e altíssima resistência à
compressão, atingindo e possivelmente excedendo 200MPa. Aço e fibras orgânicas ou
combinação de ambos são um dos maiores componentes do material aumentando a
resistência à flexão, a ductilidade e a resistência ao fogo.

60
As três principais categorias de aplicações são:

• Resistência mecânica: as altíssimas propriedades mecânicas combinadas


com tecnologia de protensão oferecem aos engenheiros e arquitetos
muitas oportunidades para desenvolver estruturas elegantes evitando
pesadas armações de aço. A tecnologia DUCTAL® dá acesso a várias
estruturas delgadas, esbeltas e elegantes como passarelas.
• Durabilidade: a microestrutura muito densa da matriz do DUCTAL®
oferece um material que resiste a meios muito agressivos e abre então
uma gama muito grande de aplicações.
• Arquitetural: uma gama muito grande de texturas e efeitos de cor é
acessível ao DUCTAL®. Tais propriedades fornecem aos arquitetos
potencial muito alto de projetos inovadores em todos os elementos que
construam uma nova arquitetura.

61
5. ANÁLISE DE CASCAS DE CONCRETO ARMADO,
PROTENDIDO E DE UHPFRC ATÉ A RUPTURA PELO
MÉTODO DOS ELEMENTOS FINITOS

Neste capítulo são apresentadas análises de cascas de concreto armado,


protendido e de UHPFRC pelo método dos Elementos Finitos até à ruptura com
consideração da fissuração do material. O modelo de fissuração repartida utilizado é
aquele constante do programa DIANA 8.1 [3]. Inicialmente, é apresentada a análise de
uma casca cilíndrica de concreto armado e protendido, cujo protótipo foi ensaiado por
Haas e Bouma [4] e compilado por Oñate em [5]. A análise realizada com o programa
DIANA é comparada com os resultados numéricos e experimentais previamente
realizados e relatados nas bibliografias [4] [5].
Em seguida, são analisadas cascas hipotéticas elaboradas com o UHPFRC
DUCTAL® da Lafarge. Tais análises têm como objetivo apontar as potencialidades do
uso de um material comercial de alto desempenho em conjunto com uma ferramenta
computacional comercial também de alto desempenho, para o projeto e análise de
cascas de concreto.

5.1. Casca cilíndrica de concreto armado e protendida de Haas e Bouman [4]

Neste item apresenta-se a análise realizada com o programa DIANA [3] de uma
casca cilíndrica cujo protótipo foi construído e ensaiado [4], sendo que uma análise
numérica prévia foi efetuada (ver em Oñate [5]). A casca, cujas dimensões podem ser
vistas na figura 5.1, tem as bordas laterais constituídas de vigas (tirantes) e as
extremidades frontais apoiadas em diafragma. A estrutura foi executada em concreto
armado com armadura de protensão inserida nas vigas. Uma armadura em malha é
colocada nas faces superior e inferior da casca e também nas vigas como se vê na figura
5.2. O carregamento é constituído de uma pressão radial uniforme de 7 kN/m2 e um
carregamento normal uniforme distribuído de l.41 kN/m aplicado na viga.
1.41kN/m 7.0kN/m² 1.41kN/m

339

Distâncias em mm

Figura 5.1. Casca cilíndrica: Geometria e carregamento.

φ 1c 10 φ 1c20

10

φ 1c 20

Casca

20
Estribo φ 1 c 30 Estribo φ 1 c 60
Armadura
passiva -18 φ
(11.0mm2)
100

Barras protendidas-
625 955 2 φ (28.27mm2)
Distâncias em mm
Armação da viga

Figura 5.2. Casca cilíndrica: Armação.

63
5.1.1. Dados relativos aos materiais:

a) Concreto:

Módulo de Elasticidade 32.5GPa*


Coeficiente de Poisson 0.3*
Tensão uniaxial à compressão 29 MPa*
Tensão uniaxial à tração 5MPa*
f sy
Comportamento Softening (linear) ε cru = = 0.0014
Es

Retenção de cisalhamento β=0.20**

Parâmetro para o Modelo de Plasticidade de Mohr-coulomb:


Ângulo de atrito interno (Φ) 30º**

b) Aço:

O modelo elasto-plástico foi utilizado para modelar o aço (ver figura 3.12)

Armadura passiva:

Módulo de Elasticidade 210 GPa*


Tensão de escoamento 300 MPa*

Protensão:

Módulo de Young 200 GPa*


Tensão de escoamento 1700 MPa*

*Os valores marcados com 1 asterisco foram obtidos da publicação [5]


** Os valores com 2 asteriscos foram estimados a partir de [3].

64
5.1.2.Modelagem da Transferência da Tensão de Protensão Cabo – Concreto

A transferência da tensão de protensão (σp) do cabo para o concreto se deu via


esforço cisalhante (ver item 3.2.2).

5.1.3. Geração da Malha de Elementos Finitos e Armaduras

A discretização da casca é constituída de 24 (vinte e quatro) elementos curvos de


casca, CQ40S, quadriláteros isoparamétricos com oito nós e as vigas foram
discretizadas através de 12 (doze) elementos, também CQ40S como mostra a figura
5.3a.
As armaduras foram introduzidas em forma de barra para armaduras de
protensão (posicionadas nas vigas) e malha distribuída para armadura da parte cilíndrica
e vigas, sendo que na parte cilíndrica as armaduras foram posicionadas nas faces
superior e inferior e nas vigas nas faces laterais (ver figuras 5.3a e 5.3b).

(a) (b)

Figura 5.3. (a)Malha de elementos finitos, (b)Armação.

65
5.1.4. Resultados numéricos obtidos e comparação com outros resultados
numéricos e com a experiência

A figura 5.4 apresenta a comparação do mapa de fissuração da casca, obtida em


análise numérica, no presente trabalho, com o resultado experimental compilado por
Oñate [5], sendo que o resultado numérico corresponde ao último passo da análise e que
por razões de simetria a figura 5.4a corresponde a um quarto e a figura 5.4b a metade da
peça. Nota-se certa semelhança do mapa de fissuração, sobretudo, na parte cilíndrica da
casca.

(a) (b)

Figura 5.4. Padrão de fissuração: (a) Oñate [5]


(b) Conforme análise numérica (DIANA).

Na figura 5.5, temos as curvas, carga x flecha da casca, computada no meio do


vão da viga, segundo [5] e aquela obtida na análise via DIANA.
Percebe-se que a casca, a partir da fissuração apresenta-se mais rígida para a
análise aqui realizada. Tal fato deve-se à não introdução de um modelo de deslizamento
entre armadura e concreto fissurado. A introdução de deslizamento é possível no código
DIANA desde que a armadura seja considerada de forma direta. Como na seqüência da
presente tese não foram utilizadas barras de armadura passiva, tal modelagem não foi
realizada para o presente exemplo.

66
Gráfico - Carga x Deslocam ento

5000,00

4500,00

4000,00
Carga total - Kg

3500,00

3000,00

2500,00

2000,00

1500,00

1000,00

500,00

0,00
0,00 10,00 20,00 30,00 40,00

Arnesen Experimental Roca Presente tese Deslocam ento - m m

Figura 5.5. Diagrama carga - flecha.


(Curvas de comparação referência [5]).

5.2. Cascas de UHPFRC

Neste item são analisadas cascas hipotéticas de UHPFRC. O material usado nas
análises que se seguem é o DUCTAL® tipo A, e suas característica relatadas por Orange
[29] foram detalhadas no capítulo 4 desta tese. A idéia básica é verificar a
potencialidade de um novo material comercial de altíssimo desempenho (DUCTAL® da
Lafarge) para a construção de cascas.
As cascas analisadas são uma cobertura em chapa dobrada, parabolóide
hiperbólico e uma abóbada de arestas com as projeções quadrada e retangular para o
primeiro modelo.

67
Para a realização da análise das cascas pelo método dos elementos finitos é
necessária a determinação da relação tensão-deformação sob tração após a fissuração do
material. O ensaio da tração uniaxial seria o procedimento mais direto para a
caracterização do comportamento pós-fissura. Porém este ensaio é difícil de ser
realizado devido aos problemas associados com a aplicação de carga e controle dos
deslocamentos [36]. Daí ser o teste de flexão o mais comumente utilizado na
caracterização das propriedades pós-fissura de materiais frágeis e semi-frágeis.
Sendo assim, o método dos elementos finitos também será utilizado para
encontrar a relação constitutiva pós-fissura do UHPFRC através de análise inversa [37],
tendo como ponto de referência a curva carga-deslocamento obtida experimentalmente
para uma viga à flexão por 3 pontos, construída com DUCTAL® [29] [36].
Desta forma, nos subitens que se seguem será apresentada a análise inversa para
obtenção da equação constitutiva pós-fissura (item 5.2.1) seguida da análise das cascas
(item 5.2.2 a 5.2.4), sendo finalmente apresentados comentários gerais sobre as análises
(item 5.2.5)

5.2.1 Relação constitutiva pós-fissura

A relação constitutiva pós-fissura do UHPFRC foi determinada através de um


procedimento de análise inversa realizado sobre um ensaio de flexão por 3 pontos
relatados na bibliografia por Chanvillard [36]. O corpo de prova tinha as dimensões de
40 x 40 x 250mm.

Na discretização da amostra, foram utilizados os elementos Q8MEM, elementos


quadriláteros isoparamétricos de quatro nós em estado plano de tensões (DIANA 2003).
A malha está representada na figura 5.6.

68
P/2

40

25 100

Figura 5.6. – Malha de elementos finitos para a simulação da


flexão por 3 pontos(dimensões em mm).

A curva σ nn − ε nn
cr
(figura 5.7), construída a partir dos conceitos apresentados
nos trabalhos de Aveston at al. [38], Li [39], Wecharatana e Shah [40], foi usada como
ponto de partida para a análise inversa.
σn
A
B
fct
C

Gf h D
εu
ε
cr
nn

Figura 5.7. Forma da relação constitutiva de fissuração


como base para a análise inversa.

Na modelagem do comportamento da fissuração repartida, foi usado modelo


multilinear tension softening (TENSIO 2), com fc=180MPa em conjunto com o critério
descrito no capítulo 3 desta tese (ver figura 3.11).

O concreto à compressão foi modelado com plasticidade associativa, usando


modelo de Mohr-Coulomb no escoamento, sem endurecimento, com coesão c = 52MPa
e coeficiente de atrito φ = 30 0 .
A análise inversa constituiu-se em um procedimento de tentativa e erro em que
eram definidos os valores que caracterizam os pontos A, B, C e D da figura 5.7, e
calculada a curva carga-deslocamento correspondente pelo método dos elementos
finitos. O procedimento repetia-se até que as curvas cargas deslocamento experimental e
numérica aderiam a menos de um erro admitido.

69
A relação constitutiva determinada pelo procedimento de análise inversa é
apresentada na figura 5.8.

σ nn (MPa)
13

3
Gf 12.5mm
.001 .08 .16 εnncr

Figura 5.8. Relação constitutiva pós-fissuração, obtida por


análise inversa.

As curvas carga-deslocamento, experimental e numérica (deslocamento medido


no ponto de aplicação da carga) para o ensaio de flexão por 3 pontos, estão apresentadas
na figura 5.9.

8
7
6
Carga (kN)

5
4
3
2 experimental numérico
1
0
0 0,5 1 1,5 2 2,5
deslocamento (mm)

Figura 5.9. Curvas carga-deslocamento experimental e


numérico para o teste de flexão por 3 pontos.

Os resultados apresentados na figura 5.9 indicam que a relação constitutiva da


figura 5.8 pode ser usada para simular o comportamento carga-deslocamento da viga
submetida ao teste de flexão por 3 pontos, sendo capaz de reproduzir o comportamento
dúctil do material, assim como a resistência à flexão da viga. Esta relação constitutiva
será, então, utilizada na análise apresentada neste capítulo.

70
5.2.2. Cobertura em chapas dobradas

A estrutura tratada no presente item é uma casca em chapas dobradas [1] [37].
Um exemplo de estrutura deste tipo pode ser vista na figura 5.10. Esta estrutura é do
tipo chapas dobradas em forma de Z projetada como cobertura de um ginásio esportivo,
disposta de tal forma a permitir, simultaneamente, ventilação e iluminação natural do
ambiente interior. Os suportes nas extremidades dos elementos são arranjados de tal
forma a dar a impressão de que as cascas estão flutuando com seus 76.2mm de
espessura e vão entre apoios de 15 e 18m.
A estrutura analisada, projetada com DUCTAL® é do tipo cobertura de ponto de
ônibus. Na figura 5.11, é mostrada a perspectiva da estrutura e na figura 5.12, a vista
frontal.

Figura 5.10. Casca em chapa dobrada (retirado de Milo Ketchum´s projects [1])

71
1.50

5.00

1.50

z y

Figura 5.11. Perspectiva da estação de ônibus


(todas dimensões em metros).

Figura 5.12. Vista frontal da estação de ônibus.

A cobertura de apenas10mm de espessura é projetada sem armadura passiva ou


protendida. Foi discretizada com elementos de casca, curvos e quadriláteros
isoparamétricos, de oito nós, CQ405. A malha e as condições de contorno são
apresentadas na figura 5.13.

72
P

Figura 5.13. Malha de elementos finitos e condições de contornos.

A relação constitutiva do concreto, sob tração (fissuração repartida), para o


elemento de casca, derivado da relação constitutiva obtida por análise inversa,
ponderado pela largura de banda do elemento utilizado (h=500mm) é apresentada na
figura 5.14.

σ nn (MPa)
13

3
Gf 500mm
2.10-5 .002 .004 ε cr
nn

Figura 5.14. Relação constitutiva pós-fissuração para o


elemento de casca.

Na análise não linear foi utilizado o algoritmo de Newton-Raphson com


controle de comprimento de arco e incremento de carga adaptativo.

A curva carga-deslocamento para o ponto P, marcada na figura 5.13 é


apresentada na figura 5.15, sendo o carregamento vertical.

73
2500

Carga (N/m²)
2000

1500

1000

500

0
0 20 40 60 80 100
Deslocamento (mm)

Figura 5.15. Curva carga-deslocamento.

A trajetória de equilíbrio indica que a casca analisada apresenta grande


capacidade de se deformar e suportar uma carga máxima correspondente a
aproximadamente 10(dez) vezes seu peso próprio de 250 N/m² (ver figura 5.15).
A configuração deformada da cobertura, para o último estágio de carga, é
apresentada na figura 5.16(a) e o deslocamento do ponto P foi de 100 mm (ver figura
5.15).
O padrão de fissuração para o último estágio da carga considerado é apresentado
na figura 5.16(b).

(a) (b)

Figura 5.16. (a) Configuração deformada da casca, (b) Padrão de fissuração.

74
5.2.3. Cobertura de forma parabolóide hiperbólica

A estrutura tratada no presente item é uma cobertura do tipo parabolóide


hiperbólico. Uma estrutura em concreto armado deste tipo pode ser vista na figura 5.17.
É a cobertura de um centro comercial em Denver, Colorado com as dimensões em
planta de 34 x 34.5m e espessura variando de 76.2mm a 152.4mm nas cumeeiras. O
ponto mais alto da cobertura dista 8.255m do piso.
A estrutura analisada, projetada com DUCTAL® tem 10 mm de espessura
cobrindo um quadrado de 10m de lado tendo 2.5m para altura da cumeeira relativa ao
plano dos apoios. Na figura 5.18, é mostrada a perspectiva da cobertura.

Figura 5.17. Casca parabolóide hiperbólica (retirado de Structural


Engineering Slide Library [15])

75
Figura 5.18. Perspectiva do parabolóide hiperbólico
(retirada de [16]).

A cobertura é projetada sem armadura passiva ou protendida. Foi discretizada


com elementos de casca, curvos e quadriláteros isoparamétricos de oito nós, CQ40S [3].
A malha e as condições de contorno são apresentadas na figura 5.19.

Figura 5.19. Malha de elementos finitos e condições de contorno.

76
A relação constitutiva do concreto sob tração (fissuração repartida), para o
elemento de casca, derivado da relação constitutiva obtida por análise inversa,
ponderado pela largura de banda do elemento utilizado (h=500mm) é o mesmo já
apresentado na figura 5.14.
Na análise não linear foi utilizado o algoritmo de Newton-Raphson com
controle de comprimento de arco e incremento de carga adaptativo.

A curva carga-deslocamento para o nó central é apresentada na figura 5.20,


sendo o carregamento vertical.

4000
Carga (N/m²)

3500

3000

2500

2000

1500

1000

500

0
0 100 200 300 400 500

Deslocamento (mm)

Figura 5.20. Curva carga-deslocamento.

A trajetória de equilíbrio indica que a casca analisada apresenta também grande


capacidade de se deformar e suportar uma carga máxima correspondente a
aproximadamente 15(quinze) vezes seu peso próprio de 250 N/m².
A configuração deformada da cobertura para o último estágio de carga é
apresentada na figura 5.21.
O padrão de fissuração para o último estágio da carga considerado é apresentado
na figura 5.22.

77
Figura 5.21. Configuração deformada da casca.

Figura 5.22. Padrão de fissuração.

78
5.2.4. Cobertura do tipo Groined Vault

A estrutura tratada neste item é uma cobertura formada pela interseção de duas
cascas cilíndricas circulares. Uma estrutura deste tipo pode ser vista na figura 5.23,
mostrando o terminal de passageiros do aeroporto internacional de Saint. Louis,
Missouri, USA. Tem-se uma associação de casca do tipo Groined Vault, sendo cada
módulo formado pela intercessão de quatro cascas cilíndricas gerando um quadrado de
36.5m de lados com 9.75m de altura na região central. Como pode ser visto, a entrada
de luz natural se processa tanto pelos fechamentos laterais e frontais como pela junção
entre módulos.
A estrutura analisada, projetada com DUCTAL® tem de 2.50m de flecha com
10mm de espessura, cobrindo um quadrado de 10m de lado. Na figura 5.24, é mostrada
a perspectiva da estrutura.

Figura 5.23. Casca Groined Vault (retirado de [15]).

79
Figura 5.24. Perspectiva da cobertura.

A cobertura é projetada sem armadura passiva e sem armadura protendida. Foi


discretizada com elementos de casca, curvos e triangulares isoparamétricos de seis nós,
CT30S. A malha e as condições de contorno são apresentadas na figura 5.25.

Figura 5.25. Malha de elementos finitos e condições de contornos.

Na análise não linear foi utilizado o algoritmo de Newton-Raphson com controle


de comprimento de arco e incremento de carga adaptativo.

80
A curva carga-deslocamento para o nó central é apresentada na figura 5.26,
sendo o carregamento vertical.

3000

2500

2000
Carga (N/m²)

1500

1000

500

0
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
Deslocamento (mm)

Figura 5.26. Curva carga-deslocamento.

A trajetória de equilíbrio indica que a casca analisada apresenta grande


capacidade de deformar e suportar uma carga máxima correspondente a
aproximadamente dez vezes seu peso próprio de 250 N/m².
A configuração deformada da cobertura para o último estágio de carga é
apresentada na figura 5.27.
O padrão de fissuração para o último estágio da carga considerado é apresentado
na figura 5.28.

Figura 5.27. Configuração deformada da casca.

81
Figura 5.28. Padrão de fissuração.

5.2.5. Comentários gerais sobre as análises realizadas

• A análise de cascas de UHPFRC é de relativa simplicidade se comparada


com a análise de concreto armado e protendido, pois tudo se passa como
se estivéssemos trabalhando com um material homogêneo de altíssima
resistência à compressão (180MPa) e considerável resistência à tração ( 8
a 13MPa) ao passo que, no caso do concreto armado, temos dois
materiais cujo comportamento nas interfaces é de difícil modelagem após
a fissuração.
• Durante a realização do projeto não é necessário o detalhamento da
armadura como no caso das estruturas de concreto armado, fase que
demanda uma grande quantidade de trabalho da equipe.
• A concretagem pode ser realizada tão logo a forma esteja pronta, já que
não existe necessidade da execução e colocação da armadura
antecedendo esta etapa.

82
• Devido à ductilidade do material, as cascas analisadas apresentam grande
capacidade de deformação após a fissuração. Sendo assim, apesar da
altíssima resistência do material, as estruturas não apresentam ruptura
frágil sem aviso prévio.
• As cascas de UHPFRC analisadas nos itens anteriores têm suas
espessuras da ordem de 7 a 10 vezes mais finas que estruturas
equivalentes de concreto armado.
• A esbelteza das cascas de UHPFRC, além de propiciar uma leveza das
formas arquitetônicas, corresponde a um baixo consumo de material,
propiciando a realização de estruturas com baixo peso próprio.
• O material utilizado possui alta durabilidade, o que é desejável para
qualquer tipo de estruturas, principalmente aquelas onde se ressalta o
aspecto estético.
• O UHPFRC utilizado (DUCTAL®) assim como o código computacional
(DIANA) não são produtos disponíveis apenas em ambiente de pesquisa,
mas produtos comerciais disponíveis no mercado internacional.

83
6. ANÁLISE EXPERIMENTAL DE UMA CASCA TRONCO-
PIRAMIDAL CONFECCIONADA COM UHPFRC.

No presente capítulo são apresentados os procedimentos experimentais


realizados dentro do escopo da presente tese. O objetivo principal da análise
experimental realizada foi o ensaio até a ruptura de uma casca tronco-piramidal
construída com UHPFRC. As cascas tronco-piramidais têm vasta possibilidade de
emprego arquitetônico, já que podem ter seus módulos combinados para o
desenvolvimento de diversos tipos de coberturas, como pode ser visto na figura 6.1.

Figura 6.1 Cobertura do Centro de Pesquisa da Petrobrás (CENPES) Rio de Janeiro/RJ.

A estrutura construída em laboratório tem a forma tronco-piramidal, cobrindo


um quadrado de 3.00 x 3.00m, com base menor de 0.30 x 0.30m, espessura de 10mm e
altura de 0.225 m (figura 6.2).
Y

A
0.30 3.00
X

0.30

3.00

Dimensões em m

Espessura = 0.01 Z

0.225
Corte AA

Figura 6.2. Casca tronco-piramidal: planta, corte e locação dos eixos x, y e z.

O programa experimental inclui, além do ensaio até a ruptura desta casca,


ensaios complementares que são listados a seguir:

• Ensaios iniciais de recepção e familiarização com o material;


• Ensaio de uma placa quadrada de 10 mm de espessura e de 1.00m de lado;
• Ensaios de corpos de prova cilíndricos à compressão;
• Ensaios à flexão por quatro pontos de uma placa de 17 x 100 x 400mm;
• Ensaios em fatias extraídas da casca tronco-piramidal.

85
A seguir uma descrição detalhada do programa experimental é apresentada,
sendo descritos inicialmente, a produção e caracterização do material e em seguida a
construção da casca tronco piramidal.

6.1. Material: UHPFRC DUCTAL® de Lafarge

O UHPFRC DUCTAL® utilizado na presente tese foi fornecido pelo Laboratório


Central de pesquisas da Lafarge França, através de um acordo de cooperação cientifica
entre a COPPE e este Laboratório. O DUCTAL® apresenta-se sob forma de um prémix
que contém o material granular, de um recipiente com os reagentes líquidos e de um
outro recipiente com as fibras metálicas.

6.1.1 produção do DUCTAL®

A concretagem com DUCTAL®, apesar de ser realizada dentro de princípios


similares a concretos de alto desempenho, deve ser submetida a um controle rigoroso
para que sejam obtidas as características de altíssimo desempenho do material. Assim
sendo, as concretagens da casca e dos corpos de prova para ensaios à compressão e à
flexão foram realizadas em betoneira horizontal planetária com controle da potência
consumida para determinação das situações em que deveriam ser introduzidos na
mistura os componentes químicos e as fibras metálicas.
Desta forma, a concretagem foi caracterizada pelas seguintes etapas:

Etapas preliminares

• Preparar e limpar o misturador planetário;


• Pesagem dos componentes: materiais cimentícios, agregados, microfibras, água
e dispersante;
• Medição da temperatura ambiente;
• Identificação do nome e a série da mistura;
• Adição da mistura granular seca;

86
• Adição dos líquidos em etapas obedecendo a seqüência: 1) água de
amassamento junto com metade do dispersante; 2) a outra metade do
dispersante; 3) o acelerador de pega, caso seja previsto no traço inicial.

Controle da Demanda de Energia do Misturador

Com o objetivo de padronizar o tempo exato de adição dos líquidos e das fibras
metálicas, durante o processo de mistura do concreto, garantindo assim que as
propriedades no estado fresco sejam semelhantes para diferentes misturas, todo o
processo foi monitorado e controlado pela potência requerida pelo misturador
planetário, conforme esquematizado na figura 6.3. A potência requerida pelo misturador
é medida por um amperímetro digital conectado a um computador (figura 6.4a) cujos
sinais serão processados por um sistema de aquisição de dados e apresentados na forma
gráfica (figura6.4b). Este controle é importante, pois é através dele que serão
monitorados os tempos das adições dos líquidos e das fibras à mistura, assim como o
instante do seu término.

Ponto de reversão

Aumento da velocidade Adição das fibras

Adição da água mais Pico de


metade do dispersante umedecimento

Adição da outra metade do


dispersante

Tempo

Figura 6.3. Etapas de adição dos componentes da mistura dadas em função da energia
demandada.

87
(a) (b)

Figura 6.4. Equipamentos de aquisição de dados: (a) conjunto batedeira +


amperímetro + computador; (b) apresentação gráfica da energia demandada.

Etapa da mistura.

A adição dos materiais é feita em duas fases, que são:

Primeira Fase: mistura seca.

Os materiais secos, previamente selecionados e pesados são adicionados ao


misturador planetário (figura 6.5a). Em seguida, o misturador é ligado deixando a
mistura homogeneizar durante 1 minuto, procurando evitar a projeção do pó para fora
do reservatório.

Segunda Fase: umedecimento e processamento da mistura

Nesta fase, são adicionados os líquidos e as fibras de aço de acordo com o


gráfico apresentado na Figura 6.3, conforme a demanda de energia requerida pelo
misturador para processar a mistura.

Na fase de umedecimento foi adicionada toda água junto com metade do


superplastificante num intervalo de um minuto, tomando cuidado para promover uma
boa dispersão dos grãos nos líquidos. Nesta etapa, a água adicionada umedece a

88
superfície dos grãos e as primeiras reações químicas com o cimento são iniciadas
(Figura 6.5b). Logo em seguida, a mistura apresentará um aspecto de “terra úmida",
denominado pico de umedecimento ( Figura 6.5c), caracterizado por um leve aumento
no consumo de energia requerida pelo misturador, conforme os aglomerados de
partículas são formados. Na seqüência, há uma leve queda no consumo de energia. À
medida que os aglomerados são quebrados, a água antes aprisionada é liberada para a
mistura, correspondendo ao aumento na demanda de energia do misturador. A segunda
parte do superplastificante é então introduzida (Figura 6.5d). Neste estágio da mistura, o
concreto torna-se mais líquido alcançando o ponto de reversão (figura 6.3). Logo após o
ponto de reversão ser atingido (Figura 6.5e), as fibras foram adicionadas continuamente
à mistura em movimento (Figura 6.5f). O misturador foi desligado logo após a curva
atingir o platô horizontal (Figura 6.3). Deve-se evitar prolongar a mistura além deste
ponto para não ocorrer aumento de temperatura da pasta (ou evaporação local) e não
correr o risco de acelerar a secagem da superfície ou a dessecação do concreto. Depois
de desligado o misturador, foi verificado o espalhamento do concreto, que se apresentou
homogêneo (figura 6.5h).

89
(a) material seco (b) adição da água mais metade do
superplastificante

(c) pico de umedecimento (d) adição do restante do superplastificante

(e) ponto de reversão (f) adição das fibras

(g) produto final (h) verificação do abatimento


Figura 6.5. Etapas da produção do DUCTAL®

90
6.1.2. Ensaios de caracterização do material

O material foi caracterizado através de ensaios de compressão e flexão conforme


descrito a seguir.
a) Ensaios de compressão simples foram realizados em corpos de provas
cilíndricos de 50mm de diâmetro e 100 mm de altura realizados nas idades de 7 e 40
dias (idade de ensaio da placa). Foi também realizado um ensaio adicional com a idade
de 317 dias que é mostrado na tabela 6.1 a titulo ilustrativo.

Tabela 6.1. Resistência à compressão de C P cilíndricos


de 50 x 100mm.
Idade (dias) 7 40 317
f c (MPa) 128 180 235

b) Ensaio de flexão por quatro pontos – Foram realizados ensaios à flexão por
quatro pontos de uma placa de 17 x 100 x 400mm ( figuras 6.6a e b) para a obtenção do
diagrama carga-deslocamento conforme indicado na figura 6.7. Como esperado o
material apresentou fissuração múltiplas após a carga da primeira fissura.

(a) (b)

Figura 6.6. (a) Ensaio à flexão por 4 pontos da placa de DUCTAL®;


(b) Multifissuração da placa de DUCTAL® ensaiada à flexão;

91
3

2,5

Carga total (KN)


2

1,5

0,5

0
0 5 10 15 20 25
Experimental Deslocamento (mm)

Figura 6.7. Resposta Carga x Deslocamento da viga chata de DUCTAL®


sob flexão (figura 6.6).

6.1.3. Ensaios de familiarização com o material

Tendo em vista que esta foi a primeira utilização do material DUCTAL®, foram
realizados ensaios preliminarmente para que fossem verificadas propriedades relativas à
colocação do material antes da realização da concretagem da casca.
• Antes mesmo da realização das primeiras misturas de DUCTAL®, foram
realizados alguns ensaios de preenchimento de placas de 10mm de espessura
com um concreto auto-adensável dosado no laboratório de Estruturas da
COPPE/UFRJ, como pode ser visto na figura 6.8. Tais ensaios foram realizados
para dirimir dúvidas quanto ao uso de conectores (parafusos de rosca soberba)
ligando a chapa de acrílico à chapa de compensado, materiais da forma da
estrutura da casca.

Figura 6.8. Testes de conectores e preenchimento de fôrma com concreto auto-

92
adensável.

• Foi ensaiada uma placa de dimensões 1.00 x 1.00m de lados e 10mm de


espessura construída com fôrma nas duas faces (madeira na face inferior e
acrílico na superior), e com a mesma abertura de lançamento do concreto da
casca, isto é, 0.30 x 0.30m (figura 6.9a e b). Aqui, a concretagem foi realizada
praticamente vertendo o produto. A altura de lançamento do concreto foi de
1.20m o que gerou incorporação de ar na mistura. O uso de espaçadores do tipo
parafuso de rosca soberba mostrou-se eficiente nos testes preliminares, bem
como no desprendimento do concreto da fôrma revestida com papel contact
untada com desmoldante. A partir do resultado prático obtido com o
preenchimento da referida placa com a mesma espessura da estrutura da casca,
concluiu-se pela possibilidade de concretagem desta última.

(a) (b)

(c)

Figura 6.9. a) Concretagem da placa com DUCTAL®, b) Ensaio,


c) Fotografia da face inferior depois do ensaio.

93
6.2. Casca Tronco-Piramidal

6.2.1. Plataforma de Ensaio da Casca Tronco-Piramidal

O método adotado para o ensaio da casca está ilustrado no croquis apresentado


na figura 6.10a e na fotografia mostrada na figura 6.10b. O carregamento é aplicado
pela base menor (ou capitel), ficando os bordos maiores apoiados no quadro horizontal
de concreto armado construído sobre colunas de blocos de cimento.

Figura 6.10. Croqui do ensaio: a) tirante, b) célula de carga, c) atuador hidráulico,


d) quadro horizontal de concreto armado sobre colunas de blocos de
cimento, e) casca.

Desta forma o ensaio experimental foi realizado com o auxílio de uma


subestrutura aporticada de alvenaria com a parte superior composta por um quadro de
vigas de concreto armado para servir de apoio à casca. Para a construção desta
subestrutura para ensaios, foram executados os gabaritos em madeira, sobre a laje de
reação, como mostra a figura 6.11. Nesta figura podem ser vistos também fios de
plástico definindo o ponto central dos suportes (colunas) coincidente com um dos furos
da laje de reação. Furo este que define o ponto de passagem da prumada contendo o
furo da base menor da casca (ponto de aplicação da carga externa) e o ponto de fixação
do macaco hidráulico.

94
Em seguida, procedeu-se ao levantamento das colunas de alvenaria de blocos de
concreto estrutural, tendo seção transversal “L” e seus cantos reforçados com barras de
aço, figura 6.12.

Figura 6.11. Gabarito de madeira.

Figura 6.12. Levantamento da parede de alvenaria.

No nível de 2,00m, foram construídas 4 vigas de concreto armado com grande


rigidez para servir de apoio contínuo aos bordos da casca e também para impedir
movimentos prejudiciais ao ensaio. Uma camada de regularização foi executada com
aproximadamente 15mm de espessura de argamassa autonivelante.

95
A viga de contorno de dimensões 19 x 50 cm, armada com 6 φ 8,0mm e estribos
de φ 5,0mm, foi executada com concreto de 20MPa. A fôrma de madeirite plastificada
recebeu aplicação de desmoldante. Seu esquema e respectivo escoramento podem ser
vistos na figura 6.13a e b.

(a) (b)

Figura 6.13. Vigas do quadro horizontal: a) Detalhe, b) vista da fôrma e escoramento.

Com o objetivo de melhorar a acomodação das arestas de contato da casca com o


apoio e garantir a liberação do deslocamento horizontal, foi justaposta uma camada de
borracha neoprene de 2,0 mm, untada com graxa, à camada de compensado de 5,0mm,
sobreposta à camada de regularização de argamassa autonivelante veja figura 6.14.

96
(a) (b)

borracha Casca

Chapa de
Camada de compensado
concreto
autonivelante

Viga de concreto

Figura 6.14. (a) Detalhe do apoio da casca.


(b) Vista superior de um trecho do apoio contínuo

6.2.2. Fôrmas

As fôrmas foram projetadas visando dar rigidez ao conjunto de maneira a evitar


o aparecimento de imperfeições na estrutura extremamente delgada da casca. Para a
superfície inferior foram utilizadas placas de compensados cedro-naval revestidas com
papel contact para diminuição do atrito. A superfície superior foi elaborada com placas
de acrílico para que fosse possível um maior controle visual da evolução da
concretagem. A fôrma foi montada sobre uma estrutura de nervuras de madeira para
conferir rigidez ao sistema (figuras 6.15 a e b).

97
(a) (b)

(c)

Figura 6.15. a) Fôrma, b) Vista inferior; c) Vista superior.

As seguintes providências foram também tomadas para elaboração das fôrmas:

• Foram instalados vários purgadores para garantir o preenchimento adequado da


fôrma, bem como furos para a injeção eventual do concreto.
• Optou-se preferencialmente pelas ligações com parafusos para que fossem
evitadas ações bruscas para a remoção da fôrma, com ferramentas como pés-
de-cabra, marretas, etc.
• Foi aplicado desmoldante nas superfícies em contato com o concreto.

98
• Cuidado especial foi tomado para o nivelamento da fôrma, utilizando-se para
tal um catetômetro (figura 6.16) para uniformização de miras previamente
estabelecidas.
• Foram utilizados espaçadores cilíndricos de acrílico de 10mm de diâmetro por
10mm de altura (na construção da fôrma) para manter a espessura constante,
sendo removidos após a ligação das chapas-acrílico/compensado.

Figura 6.16. Nivelamento da fôrma.

6.2.3. Concretagem

6.2.3.1. Providências preliminares às concretagens

Além dos ensaios de reconhecimento e familiarização, tema do item 6.1.3.


podemos ainda acrescentar as seguintes providências e utensílios projetados para as
concretagens:

• Pilão pressurizador – Foi desenvolvido e construído um “pilão pressurizador”


(figura 6.17a) para ser acoplado a fôrma da casca pela base menor. O concreto
seria descarregado no interior do prisma com balde até um certo volume e a
partir daí o êmbolo entraria em ação empurrando-o para dentro da fôrma.

99
• Recipiente de PVC com abertura inferior – Foi construído um recipiente
cilíndrico de PVC (figura 6.17b) para o lançamento do concreto no interior do
pilão, o mais próximo possível da fôrma, com o objetivo de minimizar a
incorporação de ar no concreto fibroso. Este procedimento mostrou-se
impraticável, sendo então abandonado.
• Entretanto um descuido foi cometido: Não foram vedadas adequadamente as
juntas das placas de acrílico; o que teve conseqüências negativas na
concretagem.

(a) (b)

Figura 6.17. a)Pilão e seu êmbolo, b) Balde de P V C

6.2.3.2. Preenchimento da fôrma

Tendo obtido a pasta de DUCTAL® conforme relatado no item 6.1, seguiu-se o


preenchimento da fôrma derramando-a na extremidade superior do pilão (figura 6.18a).
Após retirada das fôrmas verificaram-se diversas imperfeições na casca, como
bolhas, vazios de concretagem e uma grande parte da região central onde o concreto
estava totalmente danificado (figura 6.18b). Verificaram-se também o embuchamento
com fibras da região de lançamento do concreto além do “estufamento” por flexão
dessas placas. Tais imperfeições se deram, principalmente, pela falta de vedação das
juntas das placas de acrílicos, sanadas na segunda etapa de concretagem.

100
(a) (b)

Figura 6.18. (a) Forma de enchimento adotada;


(b) Vista da primeira concretagem.

Uma segunda etapa de concretagem foi programada e, aproximadamente, 30%


do volume total de concreto foi então re-executado. Nesta etapa alguns cuidados foram
tomados para a realização da junta de concretagem quais sejam: desbastamento do
material, escovação e limpeza. Outros cuidados ainda foram tomados para execução da
concretagem: fitas de espuma sintética de 1mm de espessura e 20mm de largura foram
colocadas logo abaixo da junta de concretagem, onde a espessura da casca era a de
projeto (10mm), antecedendo a recolocação das chapas de acrílico (figura 6.19a);
instalação de novos purgadores na fôrma superior como se vê na figura 6.19a; vedação
das juntas das placas de acrílico por meio de fitas plásticas adesivas (figuras 6.19b e
6.20a).

Nesta segunda etapa de concretagem o concreto foi lançado diretamente sobre a


fôrma conforme pode ser visto na figura 6.19b.

101
(a) (b)

Figura 6.19. (a) Vista da junta de concretagem;


(b) Lançamento do concreto na 2ª concretagem

O embuchamento com fibras, visto na primeira concretagem, foi evitado com


cuidados freqüentes, para evitar formação de novelos de fibras na região de lançamento
do concreto nesta etapa, proporcionando uma concretagem de qualidade (figura 6.20).
Cuidados estes que constaram em passar a colher de pedreiro entre a chapa de acrílico e
a de compensado, eliminando as fibras que atravessavam a fresta, agravado pela sua
dimensão longitudinal (13mm).

(a) (b)

Figura 6.20. Vista da 2ª concretagem: (a) com fôrma; (b) sem fôrma.

Em todas as etapas de concretagem foram dadas leves pancadas com martelo de


borracha para acelerar o escoamento do material por entre as fôrmas superior e inferior.

102
6.3. Montagem do ensaio e Instrumentação

Inicialmente foram retiradas as fôrmas superiores de acrílico. Em seguida a


casca conjuntamente com a fôrma inferior, foi içada e colocada sobre o pórtico de
ensaio onde foi retirada a fôrma inferior. O translado do conjunto casca-fôrma pode ser
visto nas figuras 6.21a, b, c e d.

(a) (b)

(c) (d)

Figura 6.21. a) Levantamento, b) translado do conjunto: casca-fôrma,


c) Instalação e d) Vista superior.

Após instalação do conjunto casca-fôrma sobre o pórtico de ensaio, procedeu-se


à retirada da fôrma (inferior) mantendo a casca de concreto suspensa até remoção total
das chapas de compensado (figura 6.22).
Vale ressaltar que os procedimentos de juntas de concretagem adotados na
presente pesquisa, tiveram excelentes resultados, abonando desta forma a execução de
cascas de DUCTAL® que devam ser concretadas em várias etapas.

103
Figura 6.22. Casca suspensa (depois de retirada da fôrma).

Estando a casca totalmente livre das fôrmas superior e inferior, procedeu-se ao


ajuste dos bordos da casca sobre a fita de borracha e em seguida, deu-se inicio à
instrumentação.

6.3.1 Instrumentação

Foram instalados extensômetros e transdutores elétricos de deslocamento (TED)


em diversos pontos da estrutura com o objetivo de registrar o comportamento da casca
durante o processo de carregamento. Um esquema da instalação dos extensômetros e
flexímetros pode ser visto na figura 6.23. Fotografias destas instalações são mostradas
nas figuras 6.24a e b e 6.25a e b.

Os instrumentos instalados foram os seguintes:

- Transdutores elétricos de deslocamentos verticais, numerados de FV1 a FV6;


- Extensômetros elétricos de resistência, instalados nas faces superior e inferior
da casca, denominados “E”. Ex.: E1P = extensômetro 1, paralelo à borda.
- Transdutores elétricos de deslocamentos horizontais numerados de FH1 a FH4.

104
FH3

E11P

E10O

E8P E9O FV1 E12O


F4H E13P F2H

E5D
FV6 E6O
FV2
E7O
FV5 E4D FV4 FV3
E3P E2P E1P

E14O

FH1

Figura 6.23. Croqui de Instalação dos extensômetros e


transdutores elétricos de deslocamento (TED)

Legenda:
Extensômetros paralelos à borda
Extensômetros ortogonais ou inclinados à borda
TED verticais
TED horizontais

(a) (b)

Figura 6.24. (a) Vista superior mostrando extensômetro E1P, E2P, E3P,
E6O, E7O, E14O e o TED FH1; (b) TED FV1.

105
(a) (b)

Figura 6.25. a) Base de fixação dos TED verticais e do ativador servo-hidráulico;


b) Vista parcial da instrumentação na face inferior.

Os sinais eletrônicos das deformações e deslocamentos, já condicionados (i.e.


amplificados e filtrados) foram registrados, automaticamente, com o programa de
aquisição e processamento de sinais AQDADOS, instalado em um micro computador
(figura 6.26a) e também com o auxílio de caixas comutadoras e leituras discretas dos
deslocamentos horizontais por meio de mostrador digital.
O carregamento foi executado em duas fases. A primeira sendo uma carga de
gravidade, realizada por cilindros metálicos (de pesos conhecidos atingindo o valor
máximo de 1 kN) colocados no tirante de solicitação da casca, para testar o
funcionamento dos equipamentos, da instrumentação e dos equipamentos de aquisição
de dados. A segunda fase de carregamento foi realizada, utilizando o atuador hidráulico
(figuras 6.26b) com controle de deslocamento, para uma carga máxima de,
aproximadamente, 10 kN.

(a) (b)

Figura 6.26. Equipamentos: (a) Sistema Aquisição de Dados


(b) Controle do Ativador Hidráulico marca MTS.

106
6.4. Execução do ensaio.

O carregamento foi realizado com um ativador servo-hidráulico ancorado na laje


de reação e tracionando o tirante de carga, acionado por um sistema eletrônico
automático com controle de deslocamento. Uma célula de carga e deformação, instalada
na extremidade externa do êmbolo do pistão de acordo com o esquema da figura 6.10,
permitiu o registro automático da variação de carga de tração aplicada no tirante.
Na figura 6.27 pode ser visto o ensaio da casca e o corpo técnico envolvido no
processo.

Figura 6.27. Ensaio da casca.

6.5. Resultados

Na figura 6.28, é apresentada a curva carga-deslocamento vertical do nó central


da casca tronco piramidal. A carga dada pela célula de carga do atuador servo hidráulico
e o deslocamento vertical registrado pelo TED FV1. Observa-se que essa curva
descreve uma trajetória que tende levemente para um patamar horizontal indicando
colapso iminente.

107
14
12
10

Carga (KN)
8
6
4
2
0
0 5 10 15 20
Experimental Deslocam ento (m m )

Figura 6.28. Resposta experimental carga-deslocamento do nó central.

Na figura 6.29 estão registradas as respostas carga x deslocamentos verticais


obtidos com as leituras FV1 a FV6. Como pode ser observado estas descrevem
trajetórias semelhantes, o que indica coerência das leituras.

14

12

10
Carga (KN)

0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Deslocamento (mm)

FV1 FV2 FV3 FV4 FV5 FV6

Figura 6.29. Variação carga x deslocamentos verticais nos pontos FV1 a FV6.

Os pares de valores, cargas aplicadas x deformações medidas pelos


extensômetros elétricos E2P E8P E11P E13P colados nas faces da casca geraram as
curvas da figura 6.30 (as deformações são dadas pela média das leituras das
deformações lidas nas faces superior e inferior em uma mesma posição vertical). As
cascas nesses pontos médios das faces deformaram igualmente.

108
12

10

8
E1P
E2P
6 E8P
E11P
4

0
0 10 20 30 40
D ef o rmação ( x E- 0 6 )

Figura 6.30. Variação carga x deformações medidas com os extensômetros


E2P, E8P, E11P e E13P experimentais.

Outros resultados obtidos foram os deslocamentos horizontais medidos pelos


TED horizontais nos pontos centrais dos bordos da casca. Os resultados finais para FH1
a FH4 foram 0.66, 0.849, 1.065 e 0.901mm, para fora do quadro horizontal,
respectivamente. Nota-se que a soma dos deslocamentos totais (em módulo) nas
direções ortogonais foram, aproximadamente, iguais (1.7mm). Tais resultados
caracterizam a semelhança de comportamentos nas direções ortogonais, esperados por
razões de simetria.
Na figura 6.31 mostra o mapa de fissuração em vários estágios de carga.
900 800

1100
700
1100

800

1100
900
1000

1100

1200
1100

900
800

900
1200 700
1000

1100
700

Figura 6.31. Fissuração da casca.

109
Figura 6.32. Fotografias dos vértices da casca nas respectivas
posições. (Sem escala).

110
7. ANÁLISE NUMÉRICA

7.1. Introdução

Inicialmente é necessário determinar a relação constitutiva do material à tração,


o que será realizado através de um procedimento de retro análise [36] [37] similar
àquele já realizado no capítulo 5 (ver item 5.2.1).
Para essa análise inversa, toma-se como referência os resultados do ensaio à
flexão da viga chata de dimensões 17 x 100 x 400mm (figura 6.6) realizado no
laboratório (COPPE/UFRJ), do qual resultou a resposta carga x deslocamento mostrada
na figura 6.7.
Para simulação computacional do ensaio de flexão por 4 pontos foram utilizados
os elementos CQ40S (ver item 3.1.1). A malha que utiliza as condições de simetria está
representada na figura 7.1.

100

50
100
50

Figura 7.1. Malha de elementos finitos para simulação da flexão por 4 pontos
(dimensões em mm.).

Os dados a partir dos quais foi realizada a análise inversa correspondem a fc =


180MPa, coesão = 52MPa e ângulo de atrito φ = 30°, tendo sido tomada como base a
equação constitutiva com a forma da figura 5.7.
A relação constitutiva obtida pela análise inversa é mostrada na figura 7.2.

σ nn (MPa)

9.5

2
Gf 50mm
.001 .05 .10 ε nncr

Figura 7.2. Relação constitutiva pós-fissuração, obtida por análise inversa.

As curvas carga x deslocamento, experimental e numérica, obtida com essa


relação constitutiva estão apresentadas na figura 7.3; onde pode-se notar a boa
correlação teórica - numérica.

3,5

2,5
Carga total (KN)

1,5

0,5

0
0 5 10 15 20 25
Experimental Numérica Deslocamento (mm)

Figura 7.3. Curvas carga-deslocamento no meio do vão obtidos


experimental e numericamente para o teste de flexão por 4 pontos.

7.2. Análise numérica da casca com apoio ideal

A análise numérica da casca foi realizada com elementos CT30S (ver item 3.1.2
capítulo 3). A malha e as condições de contorno são apresentadas na figura 7.4, sendo
que nas condições de contorno utilizadas, os movimentos verticais de todos os nós da
ligação casca-plataforma de ensaio e os movimentos de corpo rígido estão impedidos.

112
Figura 7.4. Malha de Elementos Finitos e Condições de Contorno.

A lei constitutiva à tração é aquela encontrada por análise inversa esquematizada


na figura 7.2, sendo a largura de banda alterada de 50mm para 150mm originando a
relação constitutiva da figura 7.5. Os dados são os mesmos utilizados para análise
relatada no item 7.1.

σ nn (MPa)

9.5

2
Gf / 150
0,001- .01677 .03344 ε cr
nn

Figura 7.5. Relação constitutiva pós-fissura para o material da casca.

A curva carga-deslocamento vertical no ponto central da casca é apresentada na


figura 7.6.

113
25

20
Carga total (kN)

15

10

0
0 20 40 60 80 100 120
Experimental Numérica Deslocamento (mm)

Figura 7.6. Curva carga-deslocamento vertical no centro da casca.

A configuração deformada da casca, para o último estágio de carga, é


apresentada na figura 7.7. Nesta figura, as faixas coloridas servem apenas para melhorar
a percepção da configuração deformada.
O padrão de fissuração para o último estágio da carga é apresentado na figura
7.8. As primeiras fissuras aconteceram nos elementos situados na vizinhança dos
vértices inferiores da casca sob carga total (concentrada + peso próprio) de 11.8 kN.

Figura 7.7. Configuração deformada da casca.

114
Figura 7.8. Padrão de fissuração para o último estágio de carga (P=18,4kN).

As curvas carga-deslocamento vertical no centro da casca (figura 7.6), obtidas


experimental e numericamente mostram que há diferenças acentuadas entre o
comportamento apresentado no ensaio e os resultados numéricos obtidos com o modelo
em elementos finitos. Estes últimos indicam uma maior resistência e maior dúctilidade.
Um primeiro argumento sobre diferenças entre os resultados dos modelos, numérico e
experimental corresponde às condições de apoio existentes e modelados. Uma análise
das reações de apoio indica que em diversos pontos do contorno as reações foram
negativas o que não pode ocorrer na realidade, já que os deslocamentos só são
impedidos elasticamente no sentido de cima para baixo. Assim sendo decidiu-se refazer
a análise com a introdução de condições de apoios mais realistas, simuladas através do
uso das molas não lineares descritas no capítulo 3 desta tese.
Na figura 7.9 estão indicadas graficamente por meio de histogramas as reações
de apoio em vários pontos do contorno (bordos da casca), obtidas da análise numérica
da casca tronco-piramidal com condições de contorno ideal. Pode-se observar o
desenvolvimento das reações negativas para diversas fases de análise.

115
1,50

1,00

0,50

0,00
1
Reações de apoio (kN)

112 166 204 231

-0,50

-1,00

-1,50

-2,00

-2,50

-3,00

ST9 ST11 ST13 ST15 ST17 Apoios 1...231

Figura 7.9. Variação das reações de apoio em vários pontos do contorno (bordos da
casca) para etapas de carregamento (ST), sendo 1 e 231 apoios extremos
do bordo da face de colapso.

Alguns fatos ocorridos durante o processo constitutivo vieram à tona e serviram


para esclarecer as diferenças observadas no comportamento da casca, tanto a sua
resistência, quanto o modo como se deu o colapso. Observando a figura 7.10 pode-se
notar que a primeira concretagem não foi perfeita, que muitas fibras ficaram retidas na
região por onde verteu o concreto e também ao longo das arestas o que poderiam
explicar uma resistência menor, mas não na escala observada.
A outra observação importante diz respeito as condições de apoio dos bordos da
casca sobre as fitas de borracha neoprene e madeira; estas sobre a superfície nivelada
das vigas de concreto.

116
Figura 7.10. Vista superior da casca após primeira concretagem.

7.3. Análise numérica da casca sem apoio ideal

Para simular as condições de contorno da casca ensaiada, barras biarticuladas de


baixa resistência à tração (4000Pa) foram justapostas entre a casca e a plataforma de
ensaio e, finalmente, optou-se pela substituição das barras por molas (SP1TR)
equivalentes, figura 7.11, com constante de mola Km=625E6N/m, com forças
admissíveis de -20000/10N.

Casca

Mola
Vigas de C. A.

Figura 7.11. Croqui do vínculo casca-quadro de apoio

Na figura 7.12 é apresenta a superfície deformada da casca no último estágio da


análise não-linear mostrando o levantamento do canto o qual é corroborado com a curva
carga x deslocamento para os nós das arestas (figura 7.13).

117
Figura 7.12. Superfície deformada da casca apoiada sobre molas.

4,00

2,00
Deslocamentos verticais (mm)

0,00
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21
-2,00

-4,00

-6,00

-8,00

-10,00

-12,00

-14,00
Nós 1......21 (central)

Figura 7.13. Deslocamento da casca ao longo das arestas.

As fissurações dos modelos físico e numérico são apresentadas nas figuras 7.14a
e b; e, como se vê, as fissuras aconteceram nas regiões previstas na análise numérica.

118
(a) (Figura 6.31)

900 800

1100
700
1100

800

1100
900
1000
1100

1200
1100

900
800

900
1200 700
1000

1100
700

(b)

Figuras 7.14. Fissuração: (a) Experimental; (b) Numérica (17.5KN).

119
A curva carga-deslocamento para a CTP apoiada em molas é apresentada na
figura 7.15, em conjunto com o resultado experimental.

25

20
Carga total (kN)

15

10

0
0 20 40 60 80 100 120

Experimental Apoios ideal Apoio sobre molas Deslocamento (mm)

Figura 7.15. Curvas carga-deslocamento experimental e numéricas.

O resultado da análise numérica com as condições mais realistas para os apoios


aproximou-se do resultado experimental, demonstrando que o modelo teórico –
numérico é capaz de simular o comportamento da estrutura (ver figura 7.15). Entretanto,
ainda existe uma diferença entre a carga última de ensaio e a carga última determinada
pela análise numérica. Esta diferença pode ser explicada por diversos fatores, causados
principalmente por problemas de execução da casca. Podem ser citados:

• Problemas de segregação das fibras - Constatou-se que houve segregação das


fibras, provavelmente devido ao processo de concretagem e de deficiência de
vedação das juntas, principalmente em se tratando de uma casca tão esbelta.
• Uma outra causa possível seria devido à vibração induzida pelos impactos
aplicados na superfície da chapa de acrílico (vibrações), provocando
acomodação das fibras no fundo da fôrma.

Fotografias das fibras segregadas podem ser observadas na figura 7.16 e um


mapeamento desta segregação é apresentado na figura 7.17. Cabe ressaltar que um
fenômeno semelhante foi também observado por pesquisadores de Lafarge Cimentos,
conforme relatado na referencia [41].

120
Figura 7.16. Exemplo de segregação de fibras.

Figura 7.17. Mapeamento da distribuição de fibras nos lados da casca.

• Problemas com variação de espessura da casca, que existiram mesmo com todos
os cuidados relatados no capítulo 6. No levantamento realizado após a retirada
das fôrmas (superior e inferior), foram constatadas variações de espessura,
através de medição na casca em diversos pontos, introduzindo a vareta de

121
paquímetro nos furos deixados pelos conectores, retirados na remoção das
fôrmas. Tais constatações foram corroboradas por Rosa [42] através de medição
das espessuras das fatias retiradas da casca.

O levantamento de todas as características da casca “as built” assim como o


ensaio de flexão por quatro pontos de amostras cortadas da placa foram realizados
dentro do quadro da tese de resultados de Rosa [42]. Foi então realizada uma análise
numérica com a introdução das características “as built” [42] sendo os resultados
apresentados na figura 7.18 abaixo, que indica uma coincidência perfeita entre
resultados numéricos e experimentais.

Figura 7.18. Correlação entre as respostas carga x deslocamento vertical no centro da


casca, obtidos experimental e numericamente (com dados da casca “as built” [42]).

122
8. CONCLUSÃO

Na presente tese foi utilizado um código computacional para análise de concreto


e um material cimenticeo de altíssimo desempenho para o projeto e construção de
cascas esbeltas. As análises iniciais indicaram que estes novos paradigmas vão propiciar
possibilidades arquitetônicas, de projeto estrutural e de construção que possibilitarão
avanços na construção de cascas nos anos que se seguem.
O material utilizado, um UHPFRC comercial, DUCTAL® de Lafarge permite a
execução de cascas extremamente finas e leves, sem armadura, possibilitando a
execução de formas arquitetônicas arrojadas e inovadoras.
A análise numérica executada em um código computacional comercial indicou
que o comportamento da casca de UHPFRC pode ser simulado com precisão até a
ruptura, desde que seja conhecido o diagrama carga deflexão de um ensaio de flexão por
4 pontos e o valor da resistência à compressão. É evidente também que o código
computacional deve ter modelos precisos para o material concreto tanto à compressão
como à tração (fissuração).
A análise numérica da casca pode dar indicações importantes para projeto. Por
exemplo, no caso analisado nesta tese a análise numérica indicou que uma modificação
simples nas condições de apoio que impedisse deslocamento de baixo para cima
permitiria que a casca aumentasse enormemente sua resistência e capacidade de
deformação.
Apesar de todos os cuidados com a elaboração da casca, puderam ser
constatados diversos problemas de execução. A espessura muito fina em uma fôrma do
tipo sanduíche foi responsável pela formação de novelos de fibras e por uma segregação
das fibras tanto na direção vertical quanto em planta. Foram também verificados
problemas de variação das dimensões e dificuldades de concretagem que poderiam ter
sido evitadas se houvesse menos aberturas na forma de acrílico superior.
Problemas são normais quando se trabalha com inovações. Aprende-se com eles
e caminha-se para a definição de novas tecnologias. A presente pesquisa correspondeu à
primeira utilização de um material comercial de ultra-alto desempenho armado com
fibras para construção de cascas extremamente esbeltas no Brasil.
Espera-se assim que sirva como base para futuras aplicações de engenharia com
condições, sobre processos construtivos e procedimentos de cálculo.
Sugestões para trabalhos futuros

Como a presente pesquisa correspondeu à primeira utilização de um material


comercial de ultra-alto desempenho armado com fibras para construção de cascas
extremamente esbeltas no Brasil espera-se que sejam realizados outros estudos
utilizando este material. Para tanto sugerimos o seguinte:
Executar cascas com as dimensões aqui estudadas eliminando os pontos que
comprometeram a obtenção de resistência maior para a casca tronco piramidal como,
por exemplo, execução de fôrmas estanques.
Projetar casca tronco piramidal com possibilidade de trabalhar com restrição
total dos movimentos nos apoios.
Avaliar os critérios de abertura de fissuras, bem como as limitações pertinentes
às flechas admissíveis para cascas construídas com concreto de ultra-alto desempenho
reforçado com fibras.

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