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Isso não é uma pedra de crack

Campo Santo Leituga


Ofereço o livro ao senhor da hermenêutica e dos
espaços interdimensionais:

Laroiê Exu.

Que nenhum caminho se feche!

Que o movimento do texto seja de um todo-abertura


pra revolução!
Virgem mãe de deus

Eu tenho tesão pela virgem Maria,


porém
não tenho forças para me masturbar,
entretanto
o fetiche está a me persuadir.
Deixe estar
por aqui
mas não deixe que ajam

por ali.

A impressão que me arde é que a virgem


usa lingerie!

A roupa que cobre a verdade


reproduz e cria
a realidade,
que não é trajada de seda, mas
de cetim.

Pressupõe-se que se estiveres da sacada a contemplar a noite


tão clara,
haverá uma porta que dará
na antessala,
onde
a Virgem estará sendo estuprada
pela Mistificação.
Chimpanzé Transcendental

Jesus Cristo renascido do ventre de uma macaca!


Recitando ao mundo, telepata, porções infinitesimais de mantras tibetanos

conectando-se ao som de atabaques quânticos, premissas das capas da noite onde as árvores
sussurram transgressão!
Filósofo telecinético, Chimpanzé Transcendental hackeando bancos, pirateando comédias,
depredando patrimônios públicos,
repartições:
- Os sonhos de ascensão da Classe Média!

Andando de Skate na contramão, Jesus transplanta a vibe no asfalto, multiplica esquizo-lisérgicos,


repartidos com a multidão de proprietários do mundo livre!

Corra, Jesus! Corra! Os donos do Zoológico avançam com o retrovírus chamado


cruz.
Corra, paralisados estamos todos na santa comodidade do sangue caído em gotas no jornal.

Eles nos dizem que não fechamos a torneira do Zoológico!


Eles nos dizem que não fechamos a torneira do Zoológico!
Eles nos dizem que não fechamos a torneira do Zoológico!

Mas antes, Rabino Macaco, me diga em qual direção fica, neste chão sem estrelas, nesse chão sem
sol e lua.... Para que lado fica Meca?
Sem pátria, sem patrão
O estupro
O genocídio
Que linda miscigenação!
Ando pelas ruas feito mula
Anulado: – Sou mulato!
Iracema,
América do Sul,
Toda a beleza parou no centro do cu
Não existe pecado na banda de baixo!
– Índios lobotomizados cavalgam em mulas loucas em pleno Palácio das Américas Latinas
Bárbaras
Sem pátria
Sem patrão
Só a maloca, né não?
Sete de setembro
“Vim da selva, sou leão, sou demais pro seu quintal”
Racionais

Vamos ao desfile do Sete de setembro na Presidente Vargas?

Ver o sangue derramado límpido na praça


Ver teu coro esticado em um imenso estandarte
Ver teu amor inocente incendiado no reverso das tripas
Do primeiro ódio de um dia de domingo
Ver as cabeças das putas jorrarem pus e esperma
Às sete horas
Abrindo o Sete de setembro
Na avenida da entregação,
Eu quero estar fora
E ao mesmo tempo dentro
Em lugar algum

Queimarei a bandeira da Nação


E instalarei um novo senso indígena
Para a retransmissão do pensamento Iorubá

Tomaremos os palácios
Falaremos de tudo no nada

Não haverá portas


E meu sangue afogará toda a cidade.
Travesti

Deitado no asfalto sobre um sol a pino,


eu explodia no pretérito da saudade.
Fatias de minha cabeça,
lágrimas engravatadas no pescoço,
minha alma de asfalto
veste formas-próximas
do que queres de mim.

Eu sou o travesti
O vazio, o silêncio
Vivendo no lugar onde nunca existi!

Virgem Maria da Rio-Bahia,


mulher que não é mãe,
com asas, seios fartos e pau erguido
salto pelas ruas de minha alma!

Escarlate céu de minha ilusão,


rutilantes mundos,
velhas putas fumam na lata.
Chuva de sangue no quintal do moribundo
e os urubus fardados vagueiam na escuridão!
Soube. Sim, eu soube que aqui só havia noite:
Quem sou eu aqui?
– Sou o travesti!
Que queres tu de mim?
O parto
Quarto de motel ensanguentado.
Banheira transborda sangue, transborda fato.
O demônio glutão encarnado verme na densidade,
lábios opulentos, sorriso bonito,
mergulha no cadáver recheado de balas:
cólera nas ruas sulfurosas, o silêncio instante

Passos na calçada...tac
tac
tac
alguém nu banhado de sangue vagando,
comendo pé de galinha crua:
O sorriso, o parto, seios cacete rosas asas paz...
Crianças fumando pedra no farol
Sinal verde para a Liberdade:
A Grande Piada está cientificamente comprovada
nos rígidos padrões do padrão estabelecido.

Há uma célula fascista em cada pedra de crack


Há tumor no céu da boca do Estado
Há um estado irreversível na minha Loucura
Há um abismo velado no orifício retal da autoridade
Há um presídio no fundo do olhar de cada cidadão comum!

Há um último fôlego de vida em alguma periferia


Há uma última centelha de vida no olhar daquela moça de chinelo quebrado!
Há uma puta misericordiosa fazendo a felicidade de um milhão de operário quase
enfartados
Há uma comuna escondida em algum quarto de quaisquer cracolândias!
Noite

O sangue macio na mão


tinge o azulejo branco.
Paz em toda a imensidão.

Abra um banheiro e dê de cara com o inferno.

Noites perdidas de asfalto


em meio aos escombros dos fantasmas da br.

Demônios cegos com lanças perfuram teu ouvido...

Anjos hermafroditas trepam às escondidas ouvindo mantras de Joca,


da sacada pro meio da rua
flores vivas
rosa mulher
cheiro de pólvora
os palhaços brincam de malabaristas
e criancinhas desmontadas no ar rolam
logo ali no hospital.
(Há um resquício de natal.)

Noite infeliz,
a lua hemorrágica foge da escuridão,
enquanto Marinha me pede flores, muitas flores
desde que regadas a sangue.
Lágrimas, orgia, amor e melancolia,
tudo límpido
e eles brincam de voyeur:
– Pobre Diabo, vire de quatro!

Lixos humanos esquálidos são triturados e ofertados para gestantes de cassetes colossais!
Buracos suturados, bocetas rasgadas.
Alguém recebe setenta e tantas facadas,
que bom!
Serão setenta e tantas vaginas para um Bilac qualquer.

– Declama Cora, poeta!

Tudo aparece
e desaparece
há um verso vindo de outro lugar
não há lugar.

E morremos
e vivemos
e fodemos
e nos comemos
e as famílias nas redomas de cristal...
e os palhaços riem,
os palhaços querem
e os palhaços cheiram éter:
e a cada osso quebrado uma paz!

Correm pelos asfaltos pedras tragadas pela ilusão,


perdigueiros esquartejados vomitando universos.

Nos dizeres sertanejos despencam


Exu tiriri das sete encruzilhadas
num curto espaço de eternidade entre escombros e plenitude.

A noite me finta para além das ruínas


e tudo tem o vicio da sina humana.

Por estilhaços percorro


Perco-me
Por um instante eu sou tudo
Por uma eternidade sou todos
Cada esquina
Cada porta fechada
Cada ponto em que a energia se abre
Cada fragmento de ilusão
Dissolvo
Reintegro
Expando
Na pele negra Infinitude
Eu sou a noite!
E as estrelas, meu bem.... são velas acesas pra cada alma perdida.

O sol recolhe tudo, inclusive a vela acesa na transversal do tempo!


Realidade

As ruas com suas caras vazias


as ruas com suas toneladas de Noias
as ruas e seus cães passando fome
as ruas e todo dia é dia de domingo
as ruas e eu não precisamos imaginar tudo
as ruas são mais solitárias que as coroas putas
as ruas há muito não usam pó de arroz!

Meia-noite, eu sou a tristeza deplorável das ruas!

Daqui eu vejo:
a linda menina loira a mirar o espelho,
os cacos atravessam sua alma:
derretida
diluída.

No fundo do palácio,
trancada,
a velha mira a morte e sorri.

E as ruas permanecem iluminadas por nós ou por nada!


Planeta vermelho

Velocidade! Mais um corpo estourado


mais uma mãe em pranto
mais um ódio.

Hoje contabilizei no meu corpo:


vinte mortes!

Luzes da cidade,
a Rio-Bahia em silêncio:
o sol sempre surge com cheiro de sangue.
Eu vejo tudo e ninguém me vê

Não sei como:


saí de bar em bar
atraído pela desolação da madrugada:
(o simples vagar pelo inferno)
o suspiro dos gatos
infinitos impérios em chamas
povoam minhas retinas.

Noias camuflados de almas penadas


bestas uniformizadas caçando meu cadáver
(o luar brilha sobre o asfalto)
cidade suspensa nos colos da mãe
silvos horríveis ecoam de todos os cantos
o caos cavalga sussurrante
eu vejo tudo e ninguém me vê.
Arrochando com Rimbaud

Peço licença ao maestro Charles Bukowski

Minha face preta e descarada atravessa agreste,


de mão torta, claudicando nos bueiros:
a lucidez é o veneno motor.

Um panegírico à fuleragem,
Feirinha do bairro Brasil,
Feirinha do bairro Brasil,
Feirinha do bairro Brasil!

Devolva as putas ao convento


para ao alvorecer renovar o estoque!
Porra nenhuma,
Eu quero é mesmo arrochar!

Feirinha, guarde teus risos no saco de cola!


A insanidade do sol está no bater da lata:
O sol renitente
O sol da agonia
Partidas de futebol com crânios de bonecas de plástico.

Sangue, gordura deslizam na boca.


Cerveja, cachaça, mandinga:
retinas fritas.

Feirinha, estou falando do orvalho salgado


Bicho de porco, frieira
lama no pé, unha de tatu.

Asfalto com corrimento


Sorrisos impertinentes
Feirinha, diga à mainha que não volto por hoje.

Uma velha cega nagô


finta a evidência:
muvuca de reis destronados
caminhos perdidos
caminhos tarde: - acharei a felicidade!
Não sou poeta,
tampouco paraquedas de maluco.

Por volta das onze, sou alambique em bronze:


colossal!

Pano de pia chupa meu dedo


Meretrizes tocam em minhas flautas transversais
Anãs de uma tonelada (lá para lado do risca-faca) exalam perfume de coentro
Oziel mastiga as tripas cruas do irmão
Indicando a leitura de Bhagavad Gita, 120 Dias, Para Além do Bem e do Mal.

Jihad, o caminho suave, Krishina que me finta lá de cima do Mercadão.


O furto a conversa o arrocha corante a fumaça, Wally Salomão!

A boca tua com gosto de manga e maracujá, ares de goiabada nas coxas.
Ah! Essas mulheres dos biscoitos
Pegam nas mangas cabeludas, pegam nos biscoitos,
Passam na minha boca:
O sabor, o sabor, o sabor!
É sabor de moça do biscoito.
Moças do raiar do dia,
Moças que suplantam o meu cheiro de tabaco... hecatombe!
Moças que trincam os dentes e me mandam ir para a porra (e eu vou só)!

A gritaria, o sol, nossas mentes derretidas


fundidas
fodidas.

Feirinha, Rimbaud vivo estaria arrochando


Feirinha, o futuro atravessa hermético no meio de nós
Feirinha, acabei de vender defumador pra Asimov
Feirinha, sem nome, feirinha de qualquer feirinha:
De caruaru a Istambul.
O cu e o amor na terra do Babilônia

Saliva, meu amor


Saliva para lubrificar
Nosso amor
Para seu drama de cu
Não ser dolor
Para também não rimares
Versos de horror
Ah! Conjugar o verbo amar
Cinquenta reais a mais
E tudo se torna belo, sublime, celestial
Em nossa técnica de conjugar
O verbo sacanear
II

Toda vez que vejo


Aquele rabo
Eu tenho a impressão que o samba vem aí
A felicidade está de pau duro
Ejaculou na imensa vagina lunar
Brilha a lua o esporro do sol
Salve o sexo nos seres feitos de pedra
Pois hoje é noite de carnaval
III

Se monotonia é sinônimo de felicidade


Eu sou feliz, em parte
Monstros reluzentes nas vitrines
Céu rasgado de ponta a ponta
Um milhão de gigantes grávidas
Concebem mísseis de confete atômicos em flor
Sob milícias do Rei Momo
Que fazia odes anacrônicas dedicadas à cabeça decapitada
De São João Batista
IV

Quarta-feira de cinzas
por Umburana e Leituga

Meu peito, meu coração pernas abertas


Estrada de putas, fanáticos, malandros
Reis lunáticos
Pernas fêmeas férteis indeléveis
Meu coração é um pudendo feminino
Meu príapo imensidão

Imensidão
Em meu peito
A ti
Não basta
São pernas, fêmeas, coração
O homem a mulher
A amplidão
Somos seres cheios de nada
E a devassidão nos rege

Rex mundi
Falanges de áridos caralhos pleiteiam solenes mulheres de burca
Em plena quarta-feira de cinzas
Uma imagem memorável

Eu pensei em sair da grade, escorreguei feito geleia por entre as frestas, uma estranha paz me
alucina... o barulho dos homens trabalhando as facas os gritos o crime hediondo: os meninos jogam
bola com o crânio dos mortos. O mundo não é essa parede ilustrada onde “vencer” é somente
parede e espada sem o fio, sem navalha. Vou seguindo vento ao sol, a minha mente em estado de
calefação acompanha as massas, uma tempestade de sangue se dispersa e se reagrupa por entre as
bordas do desespero alheio; a linda cumulonimbus de sangue fez chover uma horda de estranha
paz... réquiem para as últimas ilusões e.
Uma visão memorável

Aos amigos

Gotas solenes caem sobre a cidade, não é água, elemento algum das jornadas estelares.
São sensações, é o jazz, é o teu sorriso. Sim, aquele sorriso da vida te flertando com
estranha doçura! Sim, um jato cruza as paredes do ar e o sol machuca meus olhos, saiba
que não são lágrimas em meus olhos, saiba que durmo tranquilo, enquanto o assassino
sangra as dobras do meu de-lírio. Você nem percebeu como as ruas estão estranhas,
como todos surgem de nossas entranhas e como essa gente toda é estranha... louca
vida: barulho, confusão, confissões de crimes nos ouvidos de prostitutas magistrais,
Henri em algum canto do Ceasa tentando me convencer de que fodeu com aquele tanto
de mulher, enquanto eu e Fante temos uma conversa de como sobrevivemos daquele
terrível tombo; os homens se tornam doces dessa forma, bro!

Bill Evans está por trás de cada gota, a cidade é sempre observada de algum ângulo
impertinente, porém vagaroso como a noite em que Baker me deu um soco de gravidade
e ternura! Ainda há muitos cigarros e solidão sólida em nossa alma, o bar de Jabor e
nossa amizade vêm aos meus olhos. Me segura, mulher, pois se eu cair da cadeira, eu
mergulho no abismo do chão, mas, em contrapartida, mergulho mais fundo ainda,
mergulho na palma da tua mão... sei e como sei dessas coisas, quantas vezes
mergulhamos no raso e nos mantemos tetraplégicos, irrecuperáveis!

Eu gostaria de finalizar com o raio de sol sobre a garoa que se finda e, por sobre a lama,
o baba e as meninas com bolinhas de sabão... segredo, mistério elementar!

Certas tardes... a cidade sorri!


O pior poema de todos

Eu caí do carro com os olhos amarelados, justamente na praça dominical; meus amigos
perguntando o que foi e eu não respondia, não havia mais o que vomitar, a minha
esperança era em poder dizer adeus às lindas moças de chinelos descorados, a minha
esperança era ver os pássaros da cidade em revoada em direção aos arrabaldes
sepultados pela indiferença! Com a cabeça virada ao contrário dos movimentos dos
transeuntes, eu vi a porta voltar e bater bem em minha nuca e eu não senti coisa alguma,
exceto um trompete tocado por Baker lá no fundo de minha cuca! e os meus amigos
pararam o carro e me tirarem de dentro para que eu pudesse tomar um ar e eu caía no
asfalto e eu olhava o Playground - babás negras e crianças brancas -, eu abri a boca e
não saiu som algum, mas eu imaginava que saía um jazz imbuído de jazz! Crianças
brincam, árvores sorrateiras invadem minhas retinas e explodem um colorido nefasto,
eu digo sôfrego: - hospital! Mas eles já estavam a caminho... escorei minha cabeça na
janela do carro, senti como as pessoas são lindas, lindas! e os gordos mostrando parte da
bunda carregando sacos de carvão para dentro da casa também era lindo, mas eu não
conseguia sorrir!

E lá estávamos no hospital e lá estava eu em um banco paralisado, olhando toda aquela


gente agonizando, sussurrando dor que me atravessava os tímpanos sem feri-los, minava
o fundo onde minha vontade se guardava, uma mosca pousada sobre o senhor
moribundo e os familiares tratando-o muito mal, muito mal! Alguns enfermeiros me
colocam na maca e eu seguia soft in blues com a sensação gelada das paredes calvas!
Uma injeção de vida em mim, pássaros que se estendem gota a gota aos poucos... meu
corpo, minha solução para as crises do mundo, recitei uns versos bonitos bem baixinho
para ouvir! Digo ao médico que essa é a última, digo aos amigos que me ajudaram
muito obrigado! Sigo caminhando pela cidade admirando a quase noite e os casais
lindos que atravessavam para outro lado da rua com medo de mim! Cheguei sem dar
uma palavra, minha mãe estava dopada pelas infindas dores, eu fiquei acompanhando
seu sono durante o tempo em que comia um saboroso frango com farofa, eu podia
saboreá-lo como se nunca soubesse o que era um alimento! Lavei a boca e fiquei
durante vinte minutos olhando-me no espelho e sorri! Assisti Taxi Driver pela milésima
vez admirando apenas a trilha sonora. Telefonei para Falcão, o velho Lobo do sertão,
disse que estava todo pocado e cuspindo veneno! Eu falei: – Venha com um litrão de
conhaque ou então a velha e boa – água sanitária com Sprite!

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