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Resumo: Este texto tem como proposta o estudo e a investigação da filosofia moral kantiana
como um dos fundamentos teóricos na bioética, uma vez que alguns autores descrevem o
pensamento moral de Kant como sendo de grande importância para o pensamento moderno. A
primeira parte deste texto fala sobre a filosofia moral de Kant, enquanto a segunda fala dos
aspectos da bioética, tentando demonstrar como a filosofia moral de Immanuel Kant pode
colaborar com a bioética na elaboração de políticas públicas que visem o direito à vida com
dignidade.
Abstract: This text has the purpose the study and research of the Kantian moral philosophy as
one of the theoretical foundations in bioethics, since some authors describe the moral thinking
of Kant as being of great importance to modern thought. The first part of this text talks about the
moral philosophy of Kant, while the second speaks of the aspects of bioethics, trying to
demonstrate how moral philosophy of Immanuel Kant, can collaborate with bioethics in the
development of policies to the right to life with dignity.
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1. Introdução
Durante o Iluminismo houve avanços nas pesquisas e nos estudos científicos que
proporcionaram autonomia intelectual ao pensamento europeu. Com isso, houve uma
transição do pensamento religioso para o pensamento científico, de forma a valorizar
mais as ciências do que a religião. Embora a intenção não fosse acabar com as religiões,
houve um enfraquecimento da valia do pensamento religioso em relação às explicações
científicas. Com esperanças cada vez maiores na razão, o pensamento religioso acabou
sendo deixado para um segundo plano, respondendo apenas às questões metafísicas e da
fé.
1
Graduando em Filosofia pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP. Orientador: Nelson
Vicente Junior. E-mail: alison_camargo2@hotmail.com; alisoncamargo1@gmail.com
Contribuições da filosofia moral kantiana na bioética
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2. A filosofia kantiana
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Contribuições da filosofia moral kantiana na bioética
Na obra A Crítica da Razão Pura, Marcondes (1997) entende que Kant propõe
investigar a relação do sujeito e o objeto na construção do conhecimento, e como essa
relação pode ser considerada legitima ou não. Marcondes diz ainda que esta relação
entre o sujeito e o objeto, segundo Kant, não podem ser vistas como uma relação
autônoma, mas apenas uma relação que visa conhecimento. Nas palavras de Marcondes
(1997, p. 209): “não é o sujeito que se orienta pelo objeto (o real), como quis a tradição,
mas o objeto que é determinado pelo sujeito [...] Só há objeto para o sujeito, só há
sujeito se esse se dirige para o objeto, visa apreendê-lo”.
Em Crítica da Razão Prática, Kant estabelece a vida moral como sendo
responsável por permitir que o homem conheça a liberdade. Ele (1983, p. XV) investiga
a liberdade “como a razão de ser da vida moral”. O filósofo infere que com a razão
prática pode-se alcançar a verdadeira liberdade, pois a prática da moral é em si mesma a
liberdade. Diferencia ainda as máximas morais das leis morais, uma vez que, segundo
ele, as máximas advêm do sujeito, que as seguiam levando em consideração suas
vontades; já as leis morais são objetivas, sendo válidas para todos os seres capazes de
utilizar da razão.
Segundo Leclergc, a moral kantiana está profundamente ligada ao espírito que
seria o ponto de origem dessa moral, pois Kant busca mostrar sua moral na categoria a
priori. Kant entende que o princípio moral já deve estar dentro do indivíduo, em sua
consciência, de forma a existir antes das experiências. Para fundar esta moral ele recorre
à razão, diferentemente dos demais estudiosos da moral, que até então buscavam na
metafísica ou na ideia de felicidade. O autor fala ainda que a moral kantiana se funda
em dois caminhos, que Kant chama de imperativo categórico e imperativo hipotético. O
imperativo categórico seria como quando uma pessoa sabe que realmente deve fazer
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determinado ato; ela poderia se recusar a fazer, mas sabe que é o que deveria ser feito: a
própria racionalidade diz que deve ser feito. Já o imperativo hipotético está voltado para
o desejo de uma pessoa, que não precisa realizar determinada ação e, no entanto,
gostaria de fazê-lo, pois isso a deixaria mais feliz. Desta forma o ato moral está
diretamente ligado com a questão do dever e é o imperativo categórico que diz o que é
do âmbito moral. Tais imperativos devem ser vistos como leis universais (LECLERCG,
1967). Nas palavras de Kant (1974, p. 218-219):
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A moral investigada por Kant passa pelo linear da razão, ocasionando assim que
todos os seres que tenham a capacidade de raciocinar busquem uma ação que possa ser
considerada uma lei, ou seja, que possam aplicar em todas e quaisquer situações, de
forma que essas situações não possam ser seletivas. As virtudes, para Kant, não
necessariamente demonstram a moral proposta por ele, pois apenas uma ação passada
pela racionalidade pode ser considerada moral. Nas palavras de Oliver (1998, p. 89):
Para Kant um ato virtuoso não é sinal de que uma pessoa assim seja,
pois podemos dizer que os animais também são capazes de agir
virtuosamente. É verdade que a virtude deve basear-se na ideia da lei,
pois estas transcendem os atos particulares. A lei, por sua vez, deve
ser baseada na racionalidade autônoma dos seres humanos, que são
considerados fins em si mesmos, e não seres prejulgados por uma
ordem moral específica. Portanto, a justiça existe na honestidade dos
procedimentos enquanto opostos às forças externas à racionalidade
humana.
Desta forma, Kant coloca o homem em uma posição de prestígio, pois ele o
diferencia do animal por sua racionalidade, sendo ele capaz de formar suas próprias
normas. Segundo Zimmermann (2006, p. 65-66): “Posso dizer com isso que o homem,
para Kant, assume figura central, pois sendo ele sujeito cognoscente (consciência moral)
dá a si mesmo a sua própria lei. Ele é criador e está no centro tanto do conhecimento
quanto da moral”. Kant apresenta o ser humano como sendo capaz de criar as próprias
leis, diferenciando-se assim dos animais. Com o uso da racionalidade, o homem se torna
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capaz de criar, lembrar e questionar o certo e o errado. Para Marcondes (1997, p. 213):
“O objetivo fundamental de Kant é, portanto, estabelecer os princípios a priori, ou seja,
universais e imutáveis, da moral. [...] O dever consiste na obediência a uma lei que se
impõe universalmente a todos os seres racionais”.
O conjunto de obras filosóficas de Kant investiga os limites da razão humana e
as fontes desta razão. Investiga ainda, a moral e o comportamento humano, tentando
encontrar imperativos que possibilitem na criação de uma moral universal que abranja a
todos, passando também pelas questões da estética. Suas obras influenciaram assim,
grande parte dos pensadores ocidentais póstumos a ele. Influenciou escritores,
investigações metafísicas, investigações morais e dos direitos referentes à autonomia
humana.
3. A bioética
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Pode-se dizer que Immanuel Kant, com sua proposta de moral normativa,
introduz uma forma distinta de pensar a moral, pois antes dele, a moral era atribuída
através do metafísico, mas Kant utiliza de uma visão extremamente racional para
estabelecer a moral.
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Neste princípio, a bioética tem um importante papel, pois não deveria se limitar
a não respeitar as demais visões morais, já que a preocupação dela é justamente o bem-
estar da vida. Não cabe a ela fazer justiça, mas sim minimizar o impacto das políticas da
modernidade nas relações humanas e sociais. Nesse sentido, Pegoraro (2006, p. 171)
divide a bioética nas seguintes formas: “A bioética secular afirmou-se no valor moral da
pessoa; a bioética confessional, no valor metafísico e teológico; a bioética principialista,
na autonomia; a definição política, na liberdade; e a bioética existencial, na
autoconstrução progressiva da personalidade”. Não há apenas uma linha moral que
compõem a bioética, pois, com a grande diversidade moral e cultural existente nas
sociedades, a bioética seria autoritária limitando-se a apenas uma visão moral. É
necessário que os diversos princípios morais dos fundamentos bioéticos dialoguem
entre si, para estabelecer uma linha de comunicação e de respeito à diversidade.
Entretanto, Dall'Agnol entende que a filosofia moral kantiana seja importante
para a bioética, pois com os seus princípios é possível estabelecer um padrão, uma
norma para averiguar os valores morais das ações, dos modos, das práticas do homem.
Segundo ele, para Kant, o significado de autonomia é o homem impor, a si mesmo, as
leis morais, enquanto para os principialistas, é a capacidade de escolha. Na perspectiva
de importância da moral kantiana para a bioética, o autor (2004, p. 97) diz que o que
importa “é compreender que a autonomia é um pressuposto fundamental da ética de
Kant e ver como ela pode ser aplicada para resolver problemas na bioética”. Segundo o
autor, os imperativos propostos por Kant, representam a autonomia máxima do homem,
pois cabe a ele seguir aquilo que a sua própria razão diz ser o correto. Na bioética, tal
princípio pode estabelecer as normas pelas quais, as ações em relação a vida, devam ser
pensadas e realizadas.
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4. Considerações finais
Não há como negar que a filosofia de Kant teve muita importância para a
história do pensamento ocidental, uma vez que a mesma foi propulsora de novas
possibilidades, tanto no campo de pesquisas filosóficas, quanto no pensamento jurídico,
nas teorias morais e em uma elaboração de um pensamento cada vez mais crítico e
racional. Marcou assim a época do Iluminismo, propondo um rompimento com o
pensamento moral religioso, elevando assim o pensamento racional.
Por Kant ter proposto uma filosofia moral, almejando a universalidade deste
pensamento, ele torna-se um dos filósofos mais importantes no assunto, sendo
referência para os estudos morais e éticos posteriormente a ele. Tentando demonstrar
que a atitude moral, existe a priori ao fato, Kant estabelece o Imperativo Categórico,
fundamentado na razão, que parte da premissa que a ação correta, já existe no ser e,
quando este age de acordo com este imperativo, possibilita-se vivenciar a liberdade.
A bioética, sendo responsável por estabelecer condições propícias para a
vivência humana, visa, através das morais existentes, propor relações de respeito e de
cuidados para com a vida de modo geral. A este campo da ética, cabe investigar,
observar e organizar como estão sendo propostas e estabelecidas as políticas de suportes
sociais, buscando assim, minimizar os abusos e os desrespeitos em relação à vida.
A proposta de Kant, como uma moral universal, é atrativa para a discussão dos
problemas enfrentados no século XXI, uma vez que partindo de um princípio racional,
não permite contradições entre as ações e estas são colocadas como acessíveis
universalmente, pois todos os seres humanos podem utilizar da razão. Embora a bioética
enfrente obstáculos, como a multiplicidade moral existente nas sociedades, por
exemplo, é possível, com o pensamento moral de Kant, tentar estabelecer políticas que
visem respeitar o princípio de autonomia e a liberdade das pessoas.
Segundo Kant, é através da ação moral, do imperativo categórico, que o homem
se faz livre. Embora pareça contraditório ter que seguir uma lei moral para que o
homem seja livre, é justamente nesta ação, do ato de escolher seguir esta lei, que o
homem se torna livre. O bem e o mal, o certo e o errado, são premissas a priori na
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Referências
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