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possié A quarta onda do feminismo CARLA RODRIGUES bre oano de 2016, bastante provavel ques a Historia venba a nos permit saber 0 tamanbo e a intensidade da jevastacio que as forcas dediteitaestdo promovendo no pals. Enguanto a perspectiva y Fistorica nao nos redime das dificuldades de snalisaro cantemporisieo de modo mais agudo, falver s6 nog reste olbar pera aquilo que, apestr de todos 0s retrocessos ~ no campo social, PO- ttico institucional, para citar apenas 0s mais graves crescew em generoy nimero ¢ 590. Povderia me referit amplamente aos diferentes aovimentos de resisténcia que se insurgiram nay ras ¢ nas redes, mas quero ser mais SPe- fifica, Quero afirmar o valor a importancia dlecisiva, o carter insurgente dos feminismos ‘que, desde afprimavetadasmulheres, em ster tho de 2015, desde as manifestagbes de rua de 2013; desde a Marcha das Vadis, en. 2011, vie- am se consolidando como force politica fun- damental no cendrio da resisténcia "Essa edicdo especial retine um conjunto de textos que, se ndo pode representar toda aforga dos feminismos, tem a capacidade de ampliar 4 nossa compreensio sobre a forca dos movi ‘mentos de mulheres, O primeiro artigo é de “Magda Guadalupe dos Santos (PUC-MG) ¢ tem ‘a forga de trazerahistéria das ondas feministas, ‘A autora nos conduz nao apenas pelo tempo, sas também pelos roteiros nos quais 08 femi- nismos se desenvolvergm como um “projeto ccritico” que, ao lutar contra a opressfo as mu Iheres, acaba por reivindicar uma sociedade ais justa em diferentes aspectos. Estruturas patriarcais, capitalistas e machistas se sobre em, nos seus modos de autoritarismo, em camadas que tornam vuineraveis mulheres, ‘mas nio apenas. A cada mharcador que se acres- centa, soma-se também mais um estrato de -violénciaestatal, institucional, pol De onde vem a importincia do conceito de sgénero, trabalhado no artigo de Maria Luiza Heilborn (UERJ)? Forjado em umn certo mo- mento do século 20, a fim de enfrentar as con sequéncias da hierarquia social ¢ econdmica entre homens e mulheres, conceito de genero tem uma histérla que cresce com a segunda onda feminista e uma fortune critica que emerge a partir do final dos anos 1990, com a ie + ‘netessidade de ampliar as reivindicagbes politicas para além dos bina rismos, como masculino/feminino, sexo/género, Bra preciso desesta~ bilizar os pares que nos configuravam sempre ao-niimero dois. Se a segunda onda feininista foi marcada pela construgio do coniceito de ‘género, como explica Heilborn, a terceita onda se pautou por questionar e tensionar 6 conceito até o limite de suas possiblidades de descons- trugio, abrindo espaco para a configurasao de outros génieros, de outros stjetos de direitos e de novos modos de fazer politica. ‘Una das estratégias dessa émergéncta fol dar novos significados a termos que pretendiam ser pejorativos. Fot assim que, em 2011, um ‘grupo de mulheres em Toronto, Canadé, organizou a primeira Marcha das Vadias, como conta Carla Gomes (UFR)) em seu artigo. Tudo co- ‘mecou quando, diante de uma série de estupros no Solucionados nem contidos pela polica, um inspetor sugeriu que, $e ndo quisessem ser ‘estupradas, as mulheres deveriam parar de se vestir como vadias. Dali ‘em diante, as manifestac6es se espalharamn como rastro de pOlvora e, por onde passou, a Marcha das Vadias revigoroit 0s feminismos. Diferentes reivindicagdes de diversas geragdes de mulheres se encon- trarami nas ruas, recuperando a itreveréncia que havia marcado a se~ ‘gunda onda feminista e retomando palavras de ordem como “nosso corpo nos pertence” ou “meu corpo, minhas regras" fazendo ecoar no presente as duras batalhas dos anos 1970. ( direito a ter um corpo nfo violavel € um tema que mobiliza 05 femiinismos negros, equi apresentados pelo artigo de Djamila Ribeiro © (Unifesp), Seu texto nos coloca diante do tema da interseccionalidade, ‘passo fundamental parair além dos disctirsos identitérios. So as mu- Theres negras que, pontua Djamila, perturbam setiamente qualquer nocio de “mulher” como categorie unitiria, Perturbacio necesséria ¢ potente dentro dos feminismos que, no caso brasileiro, vio comegara sentir 0 impacto politico do movimento de mulheres negras a partir dos anos 1980, embora, como lembra a autora, desde 0s tempos da ‘escravidio as mulheres negras jf atuassem na teivindicagio de direitos, na lideranca dos quilombos, na lutacotidiana contra 8 opressio de raga, igénero e classe que até hoje infelizmente ainda se misturam. ‘Lutar contra o machismo pode ser do mesmo tempo maito dificil ‘ou muito facil. Difici, pelo seu carater por vezes impliito« traigoeiro, ‘quando se apresenta para nés como forma natural de tratar as diferen= {as sexuais. cil se « cada vez pudermos deninciar que hd machismo ‘quando um homem se dirige a uma milher de modo distinto do que faria se estivesse se dirigindo a outro homiem. Aqui esté, do meu ponto de vista, a maior contribuigio das jovens desta nova onda feminista Em um momento histérico no qual todas as nossas conquistas estio sob ameaca, é fundamental que a nova geracio valorize os avancos haistOricos e lute para que estes ndo se percam E nessa Tuta que esta ‘ediclo especial se engaj, a fim de mostrar que dentro do que 2016 reve de mais assustador, ali mesmo onde o ano poderia ser-dado como per ido, desponta a possibilidade de novas mudangas. E do encontro com ‘pior que arrancamos a nossa forga da resistencia neo9 Bat cor que se fala em ondas dos feminis | mos? Se estes nose referem apenas direitos iguais para mulheres ho- sens, qual seria o seu alcance? Sobre 6.que versa 0 seu conceito como um movimen- to plural endo unitério? Segundo Sally Scholz no livzo Feminism: A beginners guide, de 2010, “feminismo é um projeto critica” que se volta para aspectos que parecem opressivos is m- Theres, oferecendo sugestoes alternativas em termos de anilises,prticas ediscursos. A pre- feréncia atual pelo uso do termo no plural tem em vista a desconstrugio dos papéis socials © bindrios entre sexos e géneros que alimentam o patriarcado, Nesse sentido, a0 se tentar 32 BB 217 Os feminismos e suas on das entender as bases sobre as quais se assentam os feminismos, deve-se levar em consideragao a vida das mulheres como ponto de partida para teorias e prticas essltando os caminhos dos aquais as mulheres foram excluidase problema tizando as supostas caracteristicas que repro- duzem o sentido de serem mulheres. Todas essas questes nos remetem clara rente is chamadas ondas ferinistas, ou sea, as geragbes dos projetos feministas, muitas ‘yezes controversas em nivel tebric e pritico. (0 termo ondas (the waves terminology) & eb cidativo enquanto um projeto que ainda néo se completou, em dois sentidos. O primeiro corresponde a um parametro cronolégico ou

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