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A questão nacional

na América Latina*
Octavio lanni

Prefácio socialista, que emerge da revolução


popular; e abre outra história.
A questão nacional pode estar na base A problemática nacional revela-se de
de algumas lutas e controvérsias forma particularmente aberta quando
fundamentais dos países da América se colocam alguns dos temas clássicos
Latina. Em diferentes épocas, do pensamento latino-americano. Esses
principalmente em conjunturas temas sempre implicam em aspectos
críticas mais profundas, reabre-se a mais ou menos fundamentais das
problemática nacional. Alguns dos forças e relações sociais que
principais temas da história e organizam, desenvolvem, transformam,
pensamento latino-americanos põem ou rompem a sociedade nacional,
em causa as origens, transformações, o Estado-Nação.
crises e dilemas da sociedade nacional, Os desencontros entre a sociedade e o
do Estado-Nação. Estado são um desafio permanente
A Nação pode ser vista como uma nos países da América Latina, no
configuração histórica, em que continente e nas ilhas. Os partidos
se organizam, sintetizam e políticos e os movimentos sociais
desenvolvem forças sociais, atividades preocupam-se seriamente com eles.
econômicas, arranjos políticos, Todos que se dedicam a pensar a
produções culturais, diversidades democracia e a ditadura são obrigados
regionais, multiplicidades raciais. a examinar esse desafio. A atividade
Tanto o hino, a bandeira, o idioma, política de grupos e classes sociais, na
os heróis e os santos, como a moeda, cidade e no campo, defronta-se com
o mercado, o território e a população ele Esse é um desafio prático e teórico
adquirem sentido no contexto das fundamental para todos.
relações e forças que configuram Muitos dizem que a sociedade civil é
a Nação. A Nação pode ser uma débil, pouco organizada. Falam em
formação social em movimento; pode instabilidade política congênita.
desenvolver-se, transformar-se, Afirmam que as dualidades estruturais
romper-se. são antigas e insuperáveis:
Na América Latina, as guerras e arcaico-moderno, patrimonial-racional,
revoluções de independência estão na indo-americano, afro-americano,
origem da Nação, estabelecendo alguns costa-serra, litoral-sertão,
dos seus traços principais. As ibérico-europeu, barbárie-civilização,
revoluções burguesas são momentos caliban-ariel. São dualidades que
fundamentais do modo pelo qual empurram para a frente e arrastam
essa Nação reorganiza aqueles traços para trás; fazem o caminho tortuoso,
e elabora novos As revoluções labiríntico, mágico. O círculo vicioso
populares são outras conjunturas da da causação circular cumulativa seria a
maior importância, quando se trata de chave de uma história de miséria,
conhecer os traços e movimentos da violência, autoritarismo, tirania. Na
sociedade nacional. Tanto assim que a América Latina, a história estaria
Nação burguesa pouco tem a ver com a atravessada pelo precário, provisório,

* Texto apresentado no Simpósio Interpretações Contemporâneas da América Latina,


realização do Instituto de Estudos Avançados — Universidade de São Paulo — São Paulo,
24 e 25 de junho de 1987 - Sala do Conselho Universitário.
inacabado, mestiço, exótico, façanha destinada a emancipar a
deslocado, fora do lugar, folclórico. colônia, criar o Estado, organizar a
Nações sem povo, nem cidadãos; Nação. Retirá-la do colonialismo,
apenas indivíduos e população. absolutismo, mercantilismo,
Por isso, dizem, o Estado é forte, a acumulação originária, conferindo-lhe
democracia episódica, a ditadura um nome. A criação do Estado,
recorrente. São as elites deliberantes — segundo os princípios adotados na
militares, civis, oligárquicas, constituição, em conformidade com as
empresariais, tecnocráticas — que forças sociais, as peculiaridades da
sabem e podem. Chega-se a afirmar economia, as diversidades regionais,
que um poder estatal esclarecido, raciais e culturais, tudo isso representa
apoiado na sabedoria da ciência, ou o empenho de descobrir o perfil
iluminado pela vontade política, da Nação.
poderá educar a sociedade, dinamizar A sociedade nacional se forma aos
a economia, conferir responsabilidade poucos, de modo contraditório, em
aos partidos, criar a opinião pública, vais-e-vens, como se estivesse
lançar o país no leito da legalidade, demoradamente saindo do limbo.
legitimidade, democracia. O Paulatinamente, nas terras americanas,
autoritarismo congênito e recorrente os conquistadores vão se tornando
seria uma contingência da transição nativos, colocam-se em divergência e
do caos à ordem, dos séculos de oposição em face da metrópole,
patrimonialismo escravista à república passam a lutar pela pátria. Surgem as
democrática, do poder oligárquico ao inconfidências, insurreições, revoltas,
racional, do absolutismo ibérico à revoluções, nas quais estão presentes
liberal-democracia. Assim, a sociedade nativos, crioulos, nacionais, mestiços,
civil seria retirada da sua debilidade mulatos, índios, negros, espanhóis,
essencial; do vício para a virtude. portugueses, ingleses, franceses,
holandeses e outros. Começam a
São muitas as lutas e controvérsias
que implicam na problemática delinear-se a sociedade, o Estado, a
Nação, em torno de uma cidade,
compreendida pela questão nacional.
região, movimento, líder; ou cidades, O que há de épico nas
regiões, movimentos, líderes. Nesse lutas simbolizadas por
A Formação da Sociedade Nacional sentido é que "a nação é uma categoria Tausaint Louverture,
histórica" (PÉREZ, 1981, p. 3). O Francisco de Miranda,
A questão nacional se coloca desde o território e o povo formam-se nessa Simón Bolívar, José
início da história, no primeiro história. "É um fenômeno geralmente Artigas, José Morelos,
momento, como dilema prático e aceito que, entre os séculos XVII e Miguel Hidalgo,
teórico. As guerras e revoluções de XVIII, o nativo deixou de sentir-se Bartolomé Mitre,
independência sintetizam-se espanhol (poderíamos acrescentar Bernardo O'Higgins,
precisamente nesse dilema. O que há também português) e passou a Antonio Sucre, José
de épico nas lutas simbolizadas por considerar-se americano" (CORREA, Bonifácio, Freí Caneca,
Tausaint Louverture, Francisco de 1966, tomo VII, p. 373). Estava em Ramón Betances, José
Miranda, Simón Bolívar, José Artigas, curso a formação das nacionalidades Martí e muitos outros,
José Morelos, Miguel Hidalgo, latino-americanas. está enraizado na
Bartolomé Mitre, Bernardo O'Higgins, Esse é um momento primordial da façanha destinada a
Antonio Sucre, José Bonifácio, Frei larga, difícil e contraditória emancipar a colônia,
Caneca, Ramón Betances, José Martí e metamorfose da raça em povo, ou da criar o Estado, organizar
muitos outros, está enraizado na população de trabalhadores em povo a Nação.
de cidadãos. Mas estamos, ainda, no (VILAR, s/d, p. 50). Ainda não são
começo dessa história. "Os dirigentes um povo, em termos políticos. "Como
decididos a conquistar o poder convencê-los de que formavam parte,
político, os intelectuais teóricos da junto com a minoria nativa, da mesma
liberdade, acorrem necessariamente, 'nação', de uma mesma 'pátria'?"
em um dado momento, ao (VILAR, s/d, p. 50). Acontece que o
descontentamento das massas, à Estado nacional que começava a
revolução da miséria. Mas, aqui, as formar-se emergia como um núcleo de
massas são — em diversas proporções interesses de setores dominantes,
e segundo os diferentes países — índios, geralmente brancos. Apoiava-se na
mestiços, negros, livres ou escravos'' exploração do trabalho de escravos,
ex-escravos, encomiendados, liberdades de cada província e as
yanaconas, peões, agregados, colonos, prerrogativas de toda a Nação, solução
mineiros, artesãos, camaradas, inevitável e única que resulta da
operários e outros, compreendendo aplicação aos dois grandes termos do
índios, mestiços, negros, mulatos e problema argentino — a Nação e a
brancos de origens nacionais diversas. Província — da fórmula chamada hoje
A gênese de cada sociedade nacional a presidir a política moderna,
compreende tanto a luta contra a consistindo na combinação harmônica
metrópole como as divergências da individualidade com a generalidade,
internas, além dos conflitos com do localismo com a nação, ou seja da
vizinhos. "Alguns dos novos estados — liberdade com a associação"
Uruguai e Bolívia — encontraram sua (ALBERDI, 1981, p. 118-9).
verdadeira identidade precisamente no O problema regional tem a maior
conflito com seus vizinhos importância, na maioria dos países
americanos." Mas cabe lembrar que, latino-americanos. No Brasil, é básico,
em diversos casos, "as massas tinham pelos problemas específicos de cada
escassa devoção pelas nações em que região e suas implicações nos arranjos
viviam"; tanto assim que "os índios do poder estatal. Ressurge em
não se integraram nas novas nações'' diferentes conjunturas. Ele é um dos
(LYNCH, 1980, p. 373). Em outros segredos de Os Sertões, de Euclides da
termos, era o que acontecia com os Cunha. Esta obra está inspirada no
negros. "O sistema político dos novos incidente de Canudos, ocorrido em
estados representava a determinação fins do século XIX, em um lugarejo
nativa de controlar índios e negros, a dos confins do estado da Bahia. Diante
força rural de trabalho." Tratava-se do que se dizia ser o fanatismo e
de "conter as castas" inferiores (Idem, monarquismo de um grupo de sitiantes
p. 379-80). Simultaneamente, pobres, o Estado brasileiro foi levado
desenvolvem-se as diversidades e a mobilizar forças militares e policiais,
desigualdades entre a cidade e o bem como a imprensa e os meios
campo, as regiões. Desde o início, está políticos. A opinião pública foi
em curso a luta pela terra e pela induzida a tomar posição contra a
disciplina do trabalho. remota comunidade liderada por
Junto com as diversidades sociais, Antônio Conselheiro. No início do
econômicas, culturais e raciais, conflito a grita geral era o pedido de
formaram-se também as regionais. extermínio, feito pelos estudantes,
Logo se revelou um singular e pelos deputados e senadores, pelos
fundamental desencontro entre as intelectuais, pelos jornalistas, pelos
regiões, a cidade e o campo, a região militares. Mas no momento em que o
e a Nação. As tropelias oligárquicas, os extermínio se efetiva, todo o mundo
separatismos, o contraponto se escandaliza. Ao nível do discurso,
civilização e barbárie, ou centralismo os termos pejorativos dados aos
e federalismo, nascem nesse contexto. canudenses são substituídos pelas
O dilema estava no princípio da palavras "brasileiros" e "irmãos".
história; e entra pelo século XX, Mortos, tornam-se humanos e
naturalmente, em outros termos. O compatriotas. Muitos, que antes
desafio consiste em construir um falavam em "horda de mentecaptos",
sistema político unitário e federativo "fanáticos", "galés", "jagunços", agora
que "compreenda e concilie as recusam-se "a participar das
comemorações da vitória. A vergonha posições de direita); somente mais
nacional é geral. O Exército é coberto tarde os sentimentos nacionalistas se
de opróbrio. Passado o perigo, vem o difundem nas classes populares."
remorso. Há um processo generalizado (GERMANI, 1960, p. 54.) Mas o
de mea culpa", que "explica em grande nacionalismo das diversas categorias
parte o imediato e extraordinário êxito sociais não é o mesmo. Seria equívoco
de Os Sertões e a guindada de seu autor imaginar que o patriotismo do militar,
à celebridade. Como todo grande livro, o protecionismo do comerciante e
este também organiza, estrutura e dá industrial e o antiimperialismo de
forma a tendências profundas do meio setores populares expressam o mesmo
social, expressando-as de maneira nacionalismo. São várias e diversas as
simbólica. Tudo se passa como se o Nações que estão em causa nas
processo de expiação da culpa coletiva controvérsias nacionalistas.
tivesse atingido seu ponto mais alto No século XX, o dilema continua em
nesse livro" (GALVÃO, 1981, p. 79). aberto. Multiplicam-se os debates e
No singular e no geral, a questão estudos sobre a questão nacional, ou
nacional se coloca, reiteradamente, no seus aspectos. As pesquisas sobre
curso da história. Mas cabe reconhecer oligarquia, populismo, militarismo,
que, em certas conjunturas, ela se liberalismo e democracia, ou economia
torna mais aberta, cria desafios novos, primária exportadora, enclave,
reabre dilemas anteriores em outros industrialização substitutiva de
termos "O século XIX caracterizou-se importações, dependência,
pelas tentativas de criar nações a partir bilateralismo, multilateralismo,
das facções dispares e fragmentárias imperialismo, dívida externa, muitas
que constituíam a sociedade. Pela vezes, compreendem a problemática
altura das décadas de 1880 e 1890, o nacional. Surgem interpretações sobre
prolongado esforço para restaurar a a instabilidade política congênita, as
ordem e a unidade, em grande parte, dualidades básicas, o círculo vicioso
obtivera êxito em praticamente todas da causação circular cumulativa, a
as nações latino-americanas; o poder se marginalidade social, bem como
consolidara nas mãos dos interesses classes, movimentos sociais, partidos
oligárquicos, estreitamente associados políticos, lutas sociais, golpes de
aos elementos mercantis-empresariais, Estado, revoluções e contra-revoluções.
e de uma nova geração de caudilhos da Alguns propõem tipologias ou escalas,
'ordem e progresso'. Seguiu-se um nas quais poderiam classificar-se as
período de estabilidade, prosperidade Nações mais ou menos formadas,
e construção de infra-estruturas no continente e nas ilhas.
nacionais." (WIARDA, 1983, p. 27-8.) Vejamos um exemplo, uma espécie
O nacionalismo, portanto, não é um de escala de nacionalidades,
só; cria-se e recria-se, no âmbito das provavelmente inspirada na conjuntura
conjunturas históricas, segundo o jogo crítica dos primeiros anos da década
das forças sociais internas e externas. dos 60. Então, os governos dos
"As atitudes nacionalistas e ainda o Estados Unidos e dos países da
sentimento de pertencimento a uma América Latina estavam mobilizados
nação, começaram sendo contra a revolução socialista vitoriosa
características das classes alta e média em Cuba desde 1959. Essa revolução
(daí, entre outras coisas, suas reabria a problemática nacional e
vinculações tradicionais com as apontava outro modo de encaminhá-la,
resolvê-la. A escala sugere o "grau em no continente e nas ilhas. Houve o
que diversos países latino-americanos Chile socialista de Allende e há o
tornam-se verdadeiras sociedades fascista de Pinochet; houve a
nacionais". Toma por base "critérios, experiência socialista em Granada,
tais como a integração étnica da liderada por Maurice Bishop, e
população, a história política, no que destruída pela invasão militar
se refere à coesão ou desorganização, norte-americana; houve ditaduras
à complexidade da cidade e ao âmbito militares, de cunho fascista, na
ocupacional do sistema econômico, ao Argentina, Brasil e Uruguai,
grau de autonomia ou dependência das destroçando experiências democráticas
zonas rurais e ao poder político do e conquistas culturais da maior
campesinato, no caso de que possua importância; houve a vitória da
algum, fatores de mobilidade e assim Revolução Sandinista na Nicarágua;
por diante. São estes os países há uma revolução popular em
latino-americanos que mais próximos marcha em El Salvador. "A guerra
estão de constituir o estado-nação: dura sete anos. O exército, com um
Uruguai, Argentina, Cuba, Costa Rica efetivo de 60 mil homens bem
e Chile, talvez em escala descendente". armados pelos americanos, não
A categoria seguinte pode incluir "os
países que avançam rapidamente no
sentido do estado-nação, com sólido
consenso social apoiando essa
tendência. Em ordem descendente
discutível, tais países são: México,
Colômbia, Brasil, Venezuela e,
recentemente, a República
Dominicana. A terceira categoria
inclui os países nos quais os grupos
superiores se movem fortemente na
direção de metas nacionalistas,
enquanto que o corpo social responde
com apatia. São eles: Peru, Bolívia,
Guatemala, Equador, El Salvador e
Panamá, sempre numa ordem
discutível E, por fim, em Honduras,
Paraguai, Nicarágua e Haiti há
lentidão de movimentos, pois quase
todos os setores sociais estão
estacionários" (SILVERT, 1968,
p.16)1.

Nato é necessário dizer que essa escala


de nacionalidades foi questionada
pelos movimentos da história, no
âmbito de cada um e todos os países,

l Consultar também Gino Germani no seu livro: "Política y sociedade en una época de
transición" (1962).
consegue derrotar os seis mil troca de favores entre os dominadores
guerrilheiros que combatem o governo, da capital e os da província: se o
38% dos quais sob mulheres." gamonal da serra serve de agente
(COSTA, 1987, p.7.) político para o mandão de Lima, o
Muita coisa houve e há no curso dessa mandão de Lima defende o gamonal
história. As desigualdades e da serra quando abusa barbaramente
contradições escondidas nas do índio. "(GONZÁLEZ PRADA,
diversidades nacionais irrompem e 1982, p. 175.)
revertem periodicamente a fisionomia Esse é um tecido antigo, na colcha de
da Nação. retalhos em que se desenha o mapa da
Nação, na maioria dos países. Acontece
que a Nação burguesa formada na
Castas e Classes América Latina é uma curiosa
montagem. Parece múltipla,
A questão nacional é um dilema que . desconexa, insólita. Mas está
continua em aberto. "Na América organizada segundo os.princípios do
Latina não concluímos plenamente a mercado, da liberdade e igualdade de
travessia no sentido da unidade proprietários de mercadorias. Por isso
nacional "(PALACIOS, 1983, p. 19.) é que o seu principal tecido, as linhas
As desigualdades sociais, regionais, mestras da sua anatomia, revelam-se
raciais e culturais, que se manifestam a partir da economia política
em termos políticos e econômicos, no (PALACIOS, 1983/CORDERA e
âmbito de grupos, classes, movimentos TELLO, 1984).
sociais e correntes de opinião pública, No Brasil, as desigualdades entre
ressurgem periodicamente, como índios, negros e brancos são um
desafios. São várias as diversidades que dilema periodicamente reiterado, na
escondem desigualdades, gerando história e no imaginário. O mito da
contradições mais ou menos básicas. democracia racial não impede que as
Na Argentina, Brasil, Colômbia, desigualdades e os antagonismos
México, Peru e Venezuela, entre manifestem-se por dentro e por fora
outros países, continua importante o das diversidades, das multiplicidades
contraponto região e Nação: província que parecem coloridas. O índio
e Nação, costa e serra, planície e continua a lutar pela terra, cultura e
montanha, litoral e sertão. Os arranjos modo de vida, em condições cada vez
entre os interesses predominantes nas mais adversas. "O índio vive com
regiões e, em especial, entre as regiões independência. Não precisamos
e a capital, são básicos para a depender de ninguém." Não é verdade
manutenção de estruturas de poder. O que "o branco tenha mais sabedoria
gamonalismo, caciquismo, que índio" (JURUNA, 1982, p. 219).
Muita coisa houve e há
coronelismo, mandonismo e outras O índio "vive com o pensamento dele,
no curso dessa história.
formas de dominação patrimonial, ou ele tem sabedoria da própria vida dele.
As desigualdades e
oligárquicas, sempre têm raízes na Só não sabe explicar com palavras.
contradições escondidas
província e na capital. As Porque foi muito difícil para aprender
nas diversidades
desigualdades regionais são recriadas, a linguagem do branco" (Idem,
nacionais irrompem e
quando não criadas, nos arranjos dos p. 245). O fundamental é "reconhecer
revertem
blocos de poder que organizam o o índio brasileiro como povo, como
periodicamente a
fisionomia da Nação. governo, regime ou Estado. "Existe índio da nação e como índio da
uma aliança ofensiva e defensiva, uma tribo" (Idem, p. 259). O negro, por

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seu lado, continua a lutar contra o maioria dos índios guatemaltecos — e
preconceito, em várias formas. "Como também uma razoável percentagem de
se combater este preconceito que gera operários agrícolas de origem
marginalização econômica, social e indígena — carecem totalmente de
cultural de ponderável faixa da atual uma noção sequer geográfica do que
população brasileira? Para nós, não é a Guatemala e que, em geral, não
adiantam campanhas humanitárias, participam da pátria guatemalteca,
educacionais ou de fundo filantrópico. apesar de que a Constituição da
Necessita-se criar um universo social República os defina como cidadãos
não competitivo, fruto da economia de com todos os direitos."(MARTINEZ
uma sociedade que saia do plano da PELÁEZ, 1979, p. 591-2.)
competição e do conflito e entre na
faixa da planificação e da O que ocorre na Guatemala ocorre no
cooperação." (MOURA, 1977, p. 87.) Peru, naturalmente em outros termos.
"As comunidades ainda isoladas de
Na Bolívia, Equador, Guatemala, índios, não conhecem do Peru senão a
México, Paraguai e Peru, além das bandeira. Não sabem sequer
desigualdades regionais e outras, pronunciar o nome da pátria; o
ressaltam as que opõem índio, mestiço universo termina para eles nos limites
e branco, compreendendo as condições do distrito; não conheciam nem
sociais, culturais, econômicas e conhecem, quase todas elas, o nome da
políticas que diversificam, classificam província, muito menos o do
e antagonizam. É como se toda uma departamento. 'Bandera piruana!', sim,
larga história, desde os tempos sabem dizer. E procuram proteger-se
coloniais, estivesse sintetizada no com ela das incursões dos fazendeiros,
presente. "É inegável que a grande das autoridades políticas, dos policiais.
E a agitam quando se sentem felizes." que não entendem o espanhol" (Idem,
(ARGUEDAS, 1982, p. 272.) p. 139.)
Outra vez, as desigualdades e os Em perspectiva histórica ampla, a
antagonismos culturais, econômicos e permanência de Nações indígenas, bem
políticos emergem desde as como africanas, de permeio às
diversidades raciais. "Nossa forma de nacionais formadas desde os tempos
governo se reduz a uma grande coloniais, torna as relações, processos
mentira, porque não merece chamar-se e estruturas sociais bastante complexos
república democrática um estado em e contraditórios; muito além da
que dois ou três milhões de indivíduos multiplicidade colorida. Há padrões e
vivem fora da lei." (GONZÁLEZ valores remanescentes da sociedade de
PRADA, 1982, p. 178.) castas, produzida pelo colonialismo e
escravismo, subsistindo junto aos
A rigor, os contornos das Nações valores e padrões da sociedade de
indígenas não acompanham classes que emerge a partir do século
exatamente as mesmas linhas XIX. Tanto assim que, no século XX,
estabelecidas pelas Nações burguesas; as sociedades nacionais continuam a
têm outros desenhos. Às vezes mesclar o passado e o presente, a casta
estendem-se muito além, no espaço e e a classe, o patrimonialismo e o
no tempo, na história e no imaginário. liberalismo.
As Nações indígenas transbordam da Os séculos de colonialismo e
geografia e história. Assim como os escravismo, compreendendo índios,
três ou quatro séculos de colonialismo mestiços, negros, mulatos e brancos
invadem o século XX, também as originários de diferentes
dezenas de séculos de cultura, modo nacionalidades, produziram as linhas
de vida e trabalho de Nações indígenas de casta. Além das desigualdades e
invadem as Nações burguesas, no hierarquias sociais, econômicas e
século XX. "As fronteiras culturais e políticas, desenvolveram-se as
lingüísticas da América Hispânica raras diversidades culturais, compreendendo
vezes coincidem com as estatais, na língua, religião, família, padrões e
maioria das vezes traçadas valores culturais, modalidades de
arbitrariamente e freqüentemente consciência, visões do mundo. O
modificadas." (MALMBERG, escravismo e o colonialismo não
1974, p. 135.) subordinaram tudo. A estrutura de
castas não dissolveu nem a
Outra vez se põe o contraponto originalidade nem a força das culturas
passado e presente, isto é, presente e e modos de vida de quechuas, aymaras,
passado. "A cultura indígena de toda a guaranis, maias, astecas, caribes e
área andina da Bolívia e Peru tinha tal outras Nações indígenas. O mesmo se
força, e os índios continuaram a ser pode dizer dos membros de Nações
tão numerosos, que isto teve africanas transportados para o Novo
conseqüências duradouras na situação Mundo como escravos.
lingüística e cultural da zona. Nos
Andes peruanos, o quechua continua É claro que o fim do colonialismo, a
a ser a língua da população; inclusive, independência das antigas colônias, a
emprega-se em escolas e igrejas, para o abolição da escravatura do negro e do
ensino e a prédica religiosa. Bem perto índio, a diversificação das atividades
da capital podemos encontrar índios econômicas, a expansão do capitalismo
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no campo e cidade, a industrialização, Nesse sentido é que o poder burguês
a urbanização e outros processos expressa, principalmente, uma parte da
estruturais, criaram a sociedade de Nação. A multiplicidade não aparece
classes. O escravo se transforma em na organização do Estado nacional, a
trabalhador livre, o senhor em burguês. não ser como ideologia, colorido,
Tanto assim que emergem outros folclore. Ao contrário, a
arranjos da estrutura social, idéias multiplicidade não só esconde
diferentes, novas modalidades de lutas desigualdades como pode ser
sociais. Os dilemas da democracia, manipulada em favor dos que detêm
que floresce e fenece, simbolizam o poder econômico, político, militar.
muito do que passa a ser a sociedade Por isso a história das formas da Nação
nacional, a Nação burguesa. esconde-se na história das formas do
Estado.
Entretanto, nas estruturas de classes
subsistem as linhas de casta. O índio e São diversas e surpreendentes as
o mestiço, assim como o negro e o formas da Nação na América Latina.
mulato, sabem e sentem que a Podem ser oligárquica, liberal,
discriminação que os atinge não é populista, autoritária, democrática. O
apenas a de classe, do mercado, da que cabe ressaltar é que a forma da
sociedade competitiva, mas de raça, Nação muda ou consolida-se, nesta ou
isto é, de casta. É como se um naquela ocasião, conforme o jogo das
remanescente arqueológico, pretérito forças sociais internas e externas. A
de longe, fosse recriado constituição, hino, bandeira, idioma,
cotidianamente na trama das relações moeda, mercado, heróis e santos são apenas
de classes. Tanto assim que os alguns elementos de uma realidade
trabalhadores brancos, negros, histórico-social complexa,
mulatos, índios, mestiços e outros são contraditória, em movimento.
classificados diferencialmente pelos
que os empregam, compram a sua Terra e Liberdade
força de trabalho. Aliás, distinguem-se
entre si, na mesma fábrica, fazenda e A história da formação da sociedade
outros locais de trabalho. nacional latino-americana é a história
de uma longa luta pela terra. No
Esse problema adquire significado primeiro dia, todos ouviram o grito:
especial, quando queremos — Terra à vista! No depois, sempre, há
compreender como se forma e a colonização, bandeirismo,
re-forma a Nação. Tudo leva a crer pioneirismo, busca do ouro, coleta de
que a Nação tem a fisionomia especiarias, escambo com os nativos,
burguesa, em geral branca, organizada donatárias, sesmarias, escravização do
segundo a racionalidade do mercado, índio e do negro, economia primária
mercadoria, lucro, mais-valia, Tem a exportadora, enclave, industrialização
máscara das classes dominantes. Não substitutiva de importações,
reflete, a não ser em escassa medida, os associações de capitais, latifúndio,
segmentos subordinados da sociedade fazenda, plantação, engenho, estrada,
nacional. Sem esquecer que esses rodovia, barragem, agroindústria,
segmentos estão estruturados em uma fábrica, cidade. Sempre se repete o
forma muito singular, combinando grito: — Terra à vista! Desde o
linhas de classe e casta, passado e primeiro dia, está em andamento a
presente. luta pela terra. Desenvolve-se um
longo processo de monopolização da no qual a criação do trabalhador livre
propriedade e exploração da terra. acompanhava a transformação da
O problema agrário também está na terra em propriedade privada,
base da questão nacional, como um mercadoria.
dos seus aspectos mais importantes. A revolução agrária, provocada pela
Nos países da América Latina esse acumulação originária em curso no
problema sempre envolve índios, século XIX e entrando pelo XX,
mestiços, negros, mulatos e brancos desalojou, expulsou, proletarizou e
nacionais e imigrantes; e não apenas lumpenizou muitos trabalhadores
camponeses, operários, grileiros, rurais. Indios e mestiços aqui, negros
latifundiários, fazendeiros etc. Estão e mulatos acolá, além de brancos
em causa diferentes formas de nacionais e imigrantes em vários
organização social e técnica do lugares, muitos foram e continuam a
trabalho, produção e apropriação. A ser alcançados pelas marchas e
família, a comunidade, a cooperação, contramarchas da revolução agrária
a divisão social do trabalho, o que acompanha os desenvolvimentos
camponês e o operário mesclam-se do capitalismo no campo.
todo o tempo na produção para o Simultaneamente, criam-se,
mercado e para o autoconsumo. desenvolvem-se ou agravam-se as
Durante a época colonial, desigualdades sociais, culturais, raciais,
compreendendo a escravatura e outras regionais (MOLINA ENRÍQUEZ,
formas de trabalho compulsório, já se 1979/ROMÁN, 1979/LIMA, 1954).
estabeleciam as linhas mestres de
uma estrutura agrária problemática, Persiste, no entanto, a luta pela terra.
polarizada na sesmaria, latifúndio, Trabalhadores rurais das mais diversas
fazenda, plantação, engenho e outras categorias lutavam, e continuam a
formas de organização social e técnica lutar, pela posse e uso da terra; pela
da produção. É nessa época que se conservação, conquista ou reconquista
estabelecem algumas das marcas que da terra. Na maioria dos países, o
delimitarão o território nacional. problema agrário está na base de
alguns dilemas tais como: as
Depois da Depois da independência, com o articulações das regiões com a Nação;
independência, com o predomínio dos interesses oligárquicos as desigualdades sociais, culturais e
predomínio dos associados à economia primária outras; a metamorfose da população
interesses oligárquicos em povo.
exportadora, ao enclave, realizaram-se
associados à economia vastas operações de deslinde e Naturalmente, cabe lembrar que a
primária exportadora, demarcação de terras devolutas, reforma agrária realizou-se em alguns
ao enclave, realizaram-se indígenas, comunais, ocupadas. Muitas países, e em outros continua a
vastas operações de comunidades indígenas, Nações realizar-se. No México, Bolívia, Chile
deslinde e demarcação inteiras, foram desalojadas de suas e Peru, entre os países capitalistas,
de terras devolutas, terras, ou mesmo liquidadas. No houve distribuição de terras a
indígenas, comunais, México, Nicarágua, Argentina, Brasil e trabalhadores. No México chegou-se
ocupadas. Muitas outros países, estava em marcha a à proposta de ejido coletivo, como
comunidades indígenas, organização do Estado nacional, a uma forma de resgatar as bases
Nações inteiras, formação do mercado de trabalho, a econômicas, sociais e culturais da
foram desalojadas de monopolização da propriedade da comunidade indígena. Não há dúvida
suas terras, ou terra. Esse era um capítulo de que houve realizações notáveis em
mesmo liquidadas. fundamental da revolução burguesa, alguns países. Mas também houve e
há decepções, recuos. As famílias e sindicalismo governamental, a
núcleos camponeses criados com a assistência técnica e o crédito
reforma agrária acabam subordinados manipulados por agências do poder
aos mecanismos de mercado, são público etc. Ou seja, não se traduz em
obrigados a abrir mão de uma parcela conquistas políticas democráticas.
crescente do produto de seu trabalho, Tudo se subordina aos mecanismos do
ou transformam-se em operários mercado, às exigências da produção,
disfarçados. Há casos em que as terras produtividade, lucro.
distribuídas são as piores, menos Não há dúvidas de que no México
férteis, distantes dos meios de realizou-se uma reforma agrária de
comunicação e mercados, ou mesmo amplas proporções. Os governos dizem
impróprias para cultivo e criação. Isto que "já não há mais terras para
é, o problema agrário passa a entregar aos camponeses". De fato, a
colocar-se em outros termos, mas reforma agrária modificou
ainda adverso aos trabalhadores rurais. drasticamente as estruturas fundiárias
Acontece que a reforma agrária tem do país, destruindo "formas de
sido uma operação principalmente dominação e exploração" seculares
econômica, a despeito de Mas os camponeses passaram a
apresentar-se, à primeira vista, como defrontar-se com novas modalidades
social, política. Nem sempre é de subordinação. Estão sujeitos a
acompanhada de medidas políticas que "uma exploração mais eficaz". Há um
favoreçam o engajamento do "neolatifundismo ", resultante da
trabalhador rural no sistema nacional forma pela qual a sociedade
de poder, salvo como subalterno, camponesa passou a ser submetida ao
administrado, regulado. Implica na industrialismo. Os mecanismos de
cidadania tutelada, por meio do mercado, os processos de
financiamento, as exigências da expropriados, desenraizados de suas
maquinização e quimificação criaram condições de vida, trabalho e cultura.
novos e poderosos vínculos dos A terra não se reduz à natureza, ao
capitais industrial, bancário e território; ela é social, histórica; ganha
comercial com a produção camponesa. as formas que lhe dá o trabalho. "Às
O neolatifundismo opera com base nos vezes o camponês fala da terra como
"critérios de maximização dos de algo sagrado." (LACAYO, 1982,
rendimentos econômicos", p. 224.)
estabelecidos conforme os movimentos
dos mercados nacional e internacional. Os sentidos físicos e espirituais dele
"Surgiram novas e talvez mais estão particularmente desenvolvidos
refinadas formas de opressão, que no que se refere às suas formas. Para
mantêm o campesinato em posição ele, ela pode ser virgem, mata, campo,
subordinada, dependente, e sujeito a serrado, pampa, montanha, vale,
uma exploração mais eficaz. " desmatada, queimada, seca, úmida,
(WARMAN, 1980, p. 27-8.) fofa, fértil, gorda, semeada, cultivada,
descansada, pronta. Sem terra, o
A reforma agrária realizada no Peru, a camponês sente-se morrer, errante. "É
partir da década dos 60, não produziu como um zumbi" (LACAYO, 1982,
a emancipação do camponês, índio, p. 225), arrancado do seu elemento,
mestiço ou branco. As exigências da desenraizado. É da terra que se
indústria, comércio e banco logo se arrancam as raízes de muita gente,
tornaram imperativas. O governo e os muito povo.
grupos dominantes, nacionais e
estrangeiros, empenham-se em A revolução burguesa não tem sido
redefinir as relações do campesinato capaz de resolver o problema agrário,
beneficiado pela reforma com as no que se refere aos interesses de
exigências da economia nacional, isto amplos setores da sociedade nacional.
é, do grande capital. Trata-se de abrir Pode-se imaginar que as desigualdades
possibilidades de operação de originárias desse problema alimentam
empreendimentos agroindustriais, o contradições que podem ser decisivas
que envolve a redefinição dos limites na emergência de movimentos sociais,
da propriedade agrária; criar protestos, revoltas. Toda revolução
"dispositivos adequados para popular na América Latina conta com
capitalizar na agricultura ". Para isso, segmentos camponeses, quando não
"o governo do Peru introduzirá arranca do mundo camponês. A
mudanças na reforma agrária de história de Tupac Amaru, Wilka,
1969- 76, a fim de possibilitar o Antônio Conselheiro, Zapata, Villa,
investimento agropecuário privado, Sandino e muitos outros, desde os
que atualmente é proibido" tempos coloniais até o século XX,
(TRIVERI, 1987, p, 17), passa pelo mesmo grito: — Terra e
liberdade! A revolução socialista em
Nesse sentido é que o problema curso no continente e nas ilhas tem
agrário continua a ser um aspecto raízes distantes, longas.
importante da questão nacional,
Expressa desigualdades e antagonismos
sociais que dizem respeito a famílias, A Quinta Fronteira
grupos sociais e setores de classes,
compreendendo remanescentes de Poucas vezes a Nação se delimita na
Nações indígenas deslocados, fronteira. Tanto pode ultrapassá-la
como manter-se aquém. O território é tanto do Haiti como do México, do
um espaço que a sociedade, o povo, os Paraguai como do Brasil.
grupos e as classes criam e recriam, na Por isso é que a expressão quinta
quantidade e na qualidade. Mas o que fronteira pode ser um fato e uma
é singular no território da Nação é metáfora. No caso do Panamá, é uma
que ele é história. Por seu povo, realidade decisiva. "Começamos um
cultura, organização social, atividades processo que vai garantir às futuras
econômicas, geopolíticas etc., a Nação gerações a erradicação dessa Quinta
transborda da sua fronteira; ou nem Fronteira. Porque vejam, vejam este
chega a alcançá-la. caso: o Panamá limita ao Norte com o
A problemática nacional sempre Atlântico, ao Sul com o Pacífico, a
implica nas relações externas. A Oeste com Costa Rica, a Leste com a
fisionomia do México, no que se refere Colômbia e no centro com os gringos.
ao nacionalismo, à valorização da Onde já se viu!" (TORRIJOS,
cultura popular, às heranças astecas e 1984, p. 17.)
maias, à mexicanidade, ao Em outros países, a quinta fronteira
autoritarismo, à matança de
pode ser um fato ou uma metáfora.
Tlatelolco, naturalmente tem relação
Em 1954, uma invasão de tropas
com a história e vicissitudes da
mercenárias organizadas pelo governo
vizinhança dos Estados Unidos. "A
perda de mais da metade do território norte-americano interrompeu um
nacional para os Estados Unidos processo de reformas democráticas da
marcou a consciência política da nação maior importância na Guatemala. Em
até os nossos dias." (CASANOVA, 1965, uma invasão de forças militares
1985, p. 101.) norte-americanas e brasileiras
interrompeu uma revolução popular
Em outros termos, a questão nacional em curso na República Dominicana.
no Uruguai, Paraguai e Bolívia implica Em 1973, a assessoria norte-americana
nas relações com a Argentina e o e brasileira foi decisiva para a
Brasil, além dos Estados Unidos; sem deposição do governo socialista de
esquecer a influência da Inglaterra em Salvador Allende. Em 1983, tropas
tempos passados. Todo o Caribe faz norte-americanas invadem Granada,
parte de um capítulo fundamental da
geopolítica norte-americana. Esses e
outros fatos apontam para a
importância das relações externas
no desenho da sociedade nacional.
Na América Latina, as relações
externas constituem uma
determinação essencial; entram
decisivamente na definição do perfil
da Nação. Uns falam em
interdependência, parceria, associação
etc.; outros se referem à subordinação,
perda da soberania, administração
externa. Podem mudar as
interpretações, mas todos reconhecem
a importância das relações externas
na conformação externa e interna
interrompendo a experiência socialista manutenção da situação atual, vigente
do governo Maurice Bishop. Em 1987, desde a década dos 40, quando se
o governo norte-americano continua a formou o Estado Livre Associado. E o
financiar e organizar tropas independentista luta pela emancipação
mercenárias contra o governo nacional. É claro que há distintas
sandinista da Nicarágua. E financia a tendências em cada partido. Mas
contra-revolução também em El todos são obrigados a colocar-se à
Salvador. "Foi na America Central problemática nacional. No
que o Pentágono inaugurou o chamado independentista, há tendências que
'conflito de baixa intensidade', levantam a proposta de socialismo,
modalidade de guerra como um modo de resolver a questão
contra-insurgente que pretende evitar, nacional e a questão social, em
para os EUA, os custos políticos e conjunto.
militares registrados no Vietnam. Os
EUA entram com as armas, o dinheiro, Os partidos autonomista e estadista
os planos e os assessores; o pais com predominam no cenário político
os soldados." (COSTA, 1987, p. 7.) nacional. Às vezes, revezam-se no
controle da administração da ilha,
Essa é uma longa história, vinda do sempre em consonância com os
século XIX, atravessando o interesses organizados nas instituições
continente e as ilhas, os mares e as jurídico-políticas estabelecidas pelos
montanhas, os governos, os regimes norte-americanos. O estatuto vigente,
e as formas do Estado nacional. Na de Estado Livre Associado, confere
maioria dos casos, sem metáforas a Porto Rico a condição de um país
(NEARING e FREEMAN, 1966/ administrado por organizações
BEMAN, 1928/RONNING, 1970/ políticas locais, mas em conformidade
BARBER e RUNNING, 1966/ com as diretrizes políticas, jurídicas,
DREIFUSS, 1986). econômicas, militares e culturais do
governo dos Estados Unidos.
Porto Rico é um caso particularmente
importante do que é a problemática Note-se que o portorriquenho é
nacional. Colônia da Espanha até cidadão norte-americano desde 1917.
1898 e dos Estados Unidos desde essa Sua moeda é o dólar. E o inglês é a
data. Um povo com as características língua que é obrigado a falar e escrever
históricas, culturais, sociais e raciais quando os interesses norte-americanos
construídas no largo de muitas lutas. estão em causa. O Congresso dos
Entretanto, não alcançou a vitória Estados Unidos "recruta jovens e os
nas batalhas pela independência envia à guerra", desde a Primeira
travadas contra a Espanha. Foi Guerra Mundial; "decide quem entra
submetido militarmente pelos Estados e sai, conforme as suas leis de
Unidos em um momento dessas imigração e emigração; mantém, aqui,
batalhas. Nunca resolveu o seu dilema. um tribunal federal que processa e
Oscila entre as opções polarizadas condena portorriuenhos conforme as
pelos três partidos principais: estadista, leis federais; controla o rádio e a
autonomista e independentista. O televisão, e sem a sua anuência não se
estadista propõe a pura e simples pode levantar em nosso país uma torre
transformação da ilha em um estado emissora, nem enviar ou receber
da federação norte-americana, ao passo mensagem alguma através destes meios
que o autonomista preconiza a de comunicação". Também "controla
nosso comércio e a nossa economia Entretanto, a maioria do povo afirma
mediante o monopólio". E "mantém e reafirma o espanhol como forma de
um absoluto e incrível controle sobre pensar e sentir, ser e devir.
os fretes marítimos e aéreos".
Interfere "com exclusividade nas leis Uma parte essencial da vida e trabalho,
sobre falência, naturalização e história e cultura do portorriquenho,
cidadania". Inclusive, "dirige com sintetiza-se neste idioma. O espanhol
exclusividade as relações exteriores". portorriquenho falado e escrito
E "cobre terra, mar e ar expressa as mais diversas realizações e
portorriquenhos com seu exército, lutas compreendidas no passado e
marinha e aviação, sem sequer ouvir o presente. A produção intelectual revela
nosso parecer nem consentimento, aspectos fundamentais da
para encobrir as aparências de um nacionalidade, em termos de análises
sistema que tem a pretensão de ser e impressões, ficção e interpretações,
democrático" (MALDONADO DENIS, memória e história. Não é possível
1974, p. 190-1)2. pensar e lutar em Porto Rico sem levar
em conta as lutas e os pensamentos de
Apesar de atravessado pelos Betances, Hostos, Albizu Campos e
compromissos de setores sociais muitos outros. São muitas as obras
dominantes locais com os em que muito da nacionalidade
norte-americanos, o povo sente-se portorriquenha se revela como história
diferente, diverso, oposto, com e imaginário: Antônio S. Pedreira,
referência aos Estados Unidos. Apesar Insularismo; Tomás Blanco,
de atravessado pelo bilingüismo, o Prontuário Histórico de Puerto Rico;
inglês permanece o idioma externo, Manuel Maldonado Denis, Puerto
referido à coisa pública, ao passo que Rico; José Luis González, El País de
o espanhol característico do lugar é Cuatro Pisos; Ángel Quintero Rivera,
o idioma que vale para o público e José Luis González, Ricardo Campos e
o privado, a razão e o sentimento, a Juan Flores, Puerto Rico: identidad
memória e a história, a dita e a desdita. nacional y clases sociales; Manuel A.
Quando quer pensar-se no pretérito, Alonso, El Gibaro; Manuel Zeno
durante os quatro séculos de Gandia, La Charca; Luis Pales Matos,
colonização ibérica, pensa-se em Tuntún de Pasa y Grifería; Luis Rafael
espanhol. E quando quer pensar-se no Sánchez, La Guaracha del Macho
presente, influenciado pela dominação Camacho; Luis Hernández Aquino
e administração dos norte-americanos, (org.), Cantos a Puerto Rico
pensa-se em espanhol, complementado (Antologia Siglos XIX y XX). Há
pelo inglês. O inglês pode ser estudos que buscam essa historia lá
indispensável na prática dos negócios longe, como em Tribu y Clase en el
públicos relacionados com os Caribe Antiguo, de Francisco Moscoso.
interesses dos norte-americanos e seus Há toda uma memória do povo
associados locais. Também o é no que resgatada e decantada na sua produção
se refere à cultura universal que se intelectual. Tanto assim que o povo
encontra nesse idioma, por sua portorriquenho pode pensar-se no
produção original e traduções. passado e no presente; e no futuro.

2 Depoimento de Yamil Galib, diante da Comissão do Estatuto, transcrição de Manuel Mal-


donado Denis.
Mas Porto Rico é uma Nação conjunturas críticas emergentes no
atravessada pela geopolítica Caribe, América Central e o conjunto
norte-americana. Uma geopolítica que da América Latina. O exército,
não compreende apenas o Caribe, e marinha e aviação que cobrem terra,
sim o conjunto da América Latina. mar e ar portoriquenhos cobrem
Envolve a defesa ou segurança dos terra, mar e ar latino-americanos.
Estados Unidos, compreendendo o Porto Rico é um caso singular,
predomínio desse país nas ilhas e no extremo, do que tem sido a diplomacia
continente. É óbvio que entram aí total dos Estados Unidos no
interesses econômicos, políticos e Hemisfério Ocidental, que é a
culturais, além dos militares. Ainda expressão mais freqüente nessa
que um objetivo básico seja a luta diplomacia.
ideológica entre capitalismo e
socialismo, cabe reconhecer que há Sob o domínio norte-americano,
interesses norte-americanos no desenvolveu-se uma revolução
Hemisfério Ocidental que se opõem burguesa insólita. Verdadeira
aos interesses de europeus e japoneses. revolução econômica, com sérias
Convém não esquecer que durante a transformações sociais, políticas e
Segunda Guerra Mundial os mesmo culturais. Mas o povo, mesmo
norte-americanos aproveitaram para beneficiado por ela, sente-se
expulsar esses interesses e alargar a sua administrado, ocupado. "As
penetração. Depois, com as várias contradições de uma revolução
fases da Guerra Fria, a ilha de Porto burguesa incompleta e imposta
Rico continuou a ser importante, colonialmente encobriram o
redefinida segundo as exigências das significado do imperialismo para a luta
social e política do proletariado. . . É evidente que os partidos principais
Significava modernização da refletem as divergências e oposições de
economia: opressiva e alienante, pelas grupos e classes. As polarizações
relações de trabalho capitalistas, mas estadismo, autonomismo e
positiva quanto ao desenvolvimento independentismo têm raízes nas
das forças produtivas, especialmente o diversidades internas. Pode-se mesmo
trabalho livre, elemento que possibilita dizer que essas diversidades são
a alternativa socialista. Significava, trabalhadas em termos práticos e
além disso, o estabelecimento das ideológicos, segundo os interesses que
liberdades civis: liberdade de reunião, predominam na organização do poder
associação, imprensa, palavra etc., que que administra o país.
tornavam possível, por outro lado, o Entretanto, os problemas
desenvolvimento de organizações compreendidos por essas diversidades
operárias." (RIVERA, 1981, p.34-36.) estão subordinados ao da soberania.
Uma revolução burguesa colonial, Trata-se de uma sociedade com
colonizadora, que não resolve a história, façanhas, cultura, povo,
questão nacional. literatura, poesia e riso, obrigada ao
No entanto, essa sociedade nacional bilingüismo imposto, à moeda
afirma e reafirma as suas estrangeira, ao passaporte alheio, ao
peculiaridades no contraponto com os militar da ocupação. "Uma nação não
Estados Unidos. Sente-se pode existir sem a posse de toda a sua
latino-americana e não riqueza material. A agricultura, a
norte-americana. Seus heróis são indústria, o comércio, as
Betances, Hostos, Albizu Campos e comunicações, franquias e toda forma
de riqueza têm de estar em mãos
muitos outros3. Possui sua história
literatura, poesia, teatro, cinema, nacionais para poder assegurar a
pintura e outras produções, nas quais vida da nacionalidade." (ALBIZU
ressoam lutas e façanhas nacionais. O CAMPOS, 1984, p. 22.)
seu sentido de humor é uma arma Trata-se de uma sociedade obrigada a
carregada de passado e presente. A organizar o seu modo de vida e
irreverência, a burla da solenidade, trabalho principalmente, ou
sermão ou arenga têm raízes na exclusivamente, conforme as
cultura popular. Por sua arte e sátira exigências externas. "Porto Rico
verifica-se que o povo portorriquenho apresenta o cenário de um naufrágio
está decidido a sobreviver "de dos valores humanos mais
qualquer maneira" (GONZÁLEZ, importantes: a honra, o patriotismo,
1980, p. 102/SÁNCHEZ, 1983). o sacrifício. No que se refere à moral,
É claro que Porto Rico tem as suas o imperialismo ianque nos levou ao
contradições internas. As suas desprezo de nós mesmos" (Idem,
diversidades regionais, raciais e p. 24.)
culturais são desafios da maior Os mesmos laços que negam, criam
importância, no que se refere ao modo novas possibilidades de reafirmação da
pelo qual se forma e expressa o povo. nacionalidade. As lutas ressurgem em

3 Estes são alguns mártires das lutas dos últimos anos: Arnaldo Dario Rosado, Carlos Soto
Arrivi, José Rafael Caballero, Santiago Mari Pesquera, Carlos Muñiz Varela, Angel Char-
bonier e Angel Rodriguez Cristóbal.
outros patamares. "A independência, sociedade, Estado, história. O jogo das
como futuro do povo de Porto Rico, forças sociais, compreendendo grupos
depende essencialmente da feliz e classes, movimentos e partidos,
conclusão de uma luta tenaz em prol configura o Estado-Nação: soberano,
da conservação da nacionalidade subordinado, associado etc.
portorriquenha." (MALDONADO
A história de Porto Rico mostra como
DENIS, 1974, p. 234.)
é um Estado Livre Associado, isto é,
Os novos patamares criados pelo administrado segundo os interesses do
colonialismo institucionalizado no governo dos Estados Unidos. Um caso
Estado Livre Associado permitem extremo, na gama das situações
resgatar lutas e lições passadas. São latino-americanas. Revela uma
lutas e lições que, muitas vezes, vêm tendência muito forte do que são as
desde longe, do fundo do povo. "A relações dos Estados Unidos com os
pátria é a humanidade de um povo. A países da América Latina. Tanto assim
pátria em Porto Rico a constituimos que se pode afirmar que há outros
todos os portorriquenhos." Estados associados no continente e nas
Legalmente, Porto Rico "não pode ser ilhas. Definem-se como soberanos,
propriedade exclusiva de uns poucos". interdependentes, aliados, parceiros
A pátria sempre quer dizer dos Estados Unidos. Mas também
"comunidade de irmãos. E entre podem ser Estados-Livres-Associados.
os irmãos, por lei natural, não pode "Uma sociedade vive uma situação
existir amo." (RIVERA, 1981, p. 30)4. colonial quando é governada em
Sob todos os aspectos, Porto Rico é função dos interesses econômicos de
uma Nação sem Estado, no sentido classes dominantes de uma sociedade
de que não se expressa em um Estado estranha." (MARTÍNEZ PELÁEZ,
que reflete a cara do povo. Os 1979, p. 574.)
administradores pensam e falam em Nessa situação, fica difícil descobrir
inglês. Para comunicar-se com o povo, alguns contornos ou algumas
traduzem para o espanhol. Possuem determinações essenciais à Nação.
dupla solidariedade, uma das quais é "Não existe uma história nacional.
a principal. Não expressam o idioma, a Trata-se de uma mistificação, que tem
cultura, a história, a irreverência do a sua origem no fato de que nossos
povo. Correspondem a um poder países têm vivido passivamente a
alheio, estranho, estrangeiro. Por isso conformação das suas estruturas
Porto Rico é uma Nação em busca sociais por forças que operam,
de um Estado. principalmente, do exterior; têm
sofrido as suas mudanças sociais, em
Estados Associados lugar de as promover eles próprios; e
que se têm visto empurrados em suas
A Nação não se delimita na fronteira, transformações estruturais por grandes
mas por suas relações internas e mudanças na correlação das forças
externas, de cunho social, econômico, imperialistas, mudanças com as quais,
político e cultural. Não é na geografia como é óbvio, pouco têm tido que
que se localiza a fronteira. Ela está na ver. Paradoxalmente, a atitude de

4
As declarações entre aspas - conforme Ángel Quintero Rivera - são de Ramón Romero
Rosa, tipógrafo e líder operário, 1904.
acomodação passiva a forças que e a maioria do povo parecem raças
atuam de fora, ao inibir todo diferentes, estranhas, como em Nações
discernimento no plano da conquistadas.
consciência, induz à ilusão oposta: Sob vários aspectos, a quinta fronteira
a da autogestão das próprias é realidade e metáfora. Não apenas
características, no que estas têm no Panamá e em Porto Rico, mas
de fundamental E assim se fala em também no México, Brasil, Argentina
história nacional" (ARRUBLA, e outros países. Nos últimos tempos,
1984, p. 71-2.) o volume da dívida externa
A quinta fronteira vai e vem. Poucas constituiu-se numa determinação
vezes está no território. Mas essencial da gestão interna dos
freqüentemente está nas relações assuntos econômicos, políticos e
econômicas, políticas, militares, sociais em vários países. Isso implica
culturais. Influencia ou mesmo cria no desenvolvimento da crise do
instituições. Além do mais, os Estado-Nação. "Em termos reais, os
consórcios não têm pátria. Associam-se pagamentos anuais de juros dos
aqui ou lá, segundo as exigências do países latino-americanos consomem
movimento do capital. "Se em cada até 50% de seu Produto Nacional
nação não encontrassem gente que, em Bruto. A conseqüência prática é que
pequeno, fazem o mesmo que eles em os juros são pagos não a partir do
grande, não poderiam dominar tantos crescimento econômico, mas graças a
povos e propriedades. Entendem-se novos empréstimos de credores que,
facilmente com essa gente e, juntos, por sua vez, produzem uma carga de
empenham-se em ganhar mais com o juros maior nos anos seguintes. A
menor esforço." (ARGUEDAS, natureza circular do problema é
1982, p. 211.) ilustrada pela escalada da dúvida
latino-americana desde o início da
Muitas vezes, setores das classes
crise, em 1982: a dívida do México
dominantes, ou classes dominantes
aumentou de US$ 77 bilhões para
inteiras, com os seus associados de
US$ 102 bilhões; a da Argentina, de
classes médias, parecem uma quinta
US$ 36 bilhões para US$ 53 bilhões;
fronteira. "As burguesias nacionais, a do Brasil, de US$ 74 bilhões para
que vêem na cooperação com o US$ 108 bilhões." (KISSINGER,
imperialismo a melhor fonte de 1987, p. 53.)
vantagens, sentem-se bastante donas
do poder político para não O círculo vicioso embutido na dívida
preocupar-se seriamente com a revive a metáfora da venda do mar
soberania nacional" (MARIÁTEGUI, pelo ditador perpétuo. Diante de uma
1969, p. 87.) dívida descomunal, impossível de ser
paga pela Nação, o tirano vende o
Daí resulta uma dissociação entre mar, com todos os seus tesouros,
largos segmentos da sociedade mistérios e magias. "Levaram o Caribe
nacional e as tendências que em abril, levaram-no em peças
predominam nas esferas de poder. "A numeradas os engenheiros náuticos
aristocracia e a burguesia nativas não do embaixador Ewng para semeá-lo
se sentem solidarizadas com o povo longe dos furacões nas auroras de
pelo laço de uma história e uma sangue e de Arizona, levaram-no com
cultura comuns." (Idem, p. 88.) tudo o que tinha dentro, meu general,
Em vários casos, as classes dominantes com o reflexo de nossas cidades,
nossos tímidos afogados, nossos nada adiantava provar a posse pelo
dragões dementes." (MÁRQUEZ, trabalho, cultura e moradia. Os
1975, p. 238.) agrimensores não faziam caso.
"Andavam de cá para lá,
O tema da fronteira está na história e insolentemente, medindo tudo e
no pensamento latino-americanos. anotando coisas em seus livros
Nem sempre na mesma linguagem, cinzentos com grossos lápis de
fórmula, cor, som, imagem. Mas é um carpinteiro." Eles estavam em toda
elemento permanente, uma espécie de parte, protegidos por homens a cavalo.
obsessão enlouquecida, iluminada. Uma tempestade sem chuva nem
Umas vezes sao os agrimensores que vento. "Muitos camponeses, montados
chegam, descidos na planície não se em seus burricos, carregando galinhas
sabe vindos de onde. Deslindam e e porcos, abandonavam suas
demarcam as terras indígenas, tribais, choupanas, entre os gritos e as
comunais, familiares, camponesas, lágrimas das mulheres, para
apossadas, devolutas. Transformam refugiarem-se nas montanhas."
toda terra em propriedade privada dos (CARPENTIER, 1966, p. 111-2.)
outros, em monopólio de alguns. De Os agrimensores plantam o que não
medra, estiola. Plantam uma fantástica as cordilheiras. Mas eles viviam no
cerca caminhando sem parar, comendo telhado do mundo." Não pode ser
as terras com a voracidade de bicho outra coisa, "essa cerca é coisa do
do outro mundo. "Fazia semanas que demo" (SCORZA, 1972,p. 12-3, 29).
a cerca tinha nascido nos capinzais A poética da quinta fronteira vai
de Rancas." Os homens corriam, longe. Pode ser a cerca, o canal, a
temendo ser alcançados "por aquele dívida, a invasão, o mar. Mas vai
verme que sobre os humanos levava longe, não pára. Pode ser a Anaconda
uma vantagem: não comia, não Copper Mining, Mr. Smith, o
dormia, nem se cansava". Muitos Presidente Roosevelt. Ela tem muitas
rezavam "nas praças, aterrados", já formas, está sempre na história e no
que não podiam mais fugir. "Os imaginário dos povos da América
habitantes das terras baixas podiam Latina, uma obsessão enlouquecida,
embrenhar-se nas selvas ou subir para iluminada.
Outras e muitas vezes se recolocam as continental. Os pensadores
formas históricas da Nação: soberana, ibero-americanos vêem claro o
independente, interdependente, problema conjunto da América Ibérica
associada, parceira, subordinada, diante do imperialismo ianque. Se
administrada. Só na aparência a triunfa a absorção norte-americana em
fronteira está lá fora. Muito mais nossa terra, o espírito de conquista
freqüentemente está no de dentro, que ianque não terá freios..."
leva para fora (MELO NETO, 1986, (ALBIZU CAMPOS, 1984, p. 19-20.)
p.70-5)5. A quinta fronteira é uma determinação
Esse é um dos dilemas que reabrem essencial dos contornos e movimentos
periodicamente o debate sobre o de cada sociedade nacional. Pode ser
conjunto dos países do continente e realidade ou ficção: canal, base militar,
das ilhas. Por isso em todo debate enclave, joint venture, doutrina de
sobre a questão nacional formam-se segurança nacional, civic action, guerra
correntes visando acomodar ou de baixa intensidade ou low profile,
resolver o dilema da quinta fronteira, indústria cultural, idioma do outro,
em escala internacional: Monroísmo e valores da civilização ocidental
e cristã interpretados pelo
Bolivarismo, Hemisfério Ocidental e
governo norte-americano,
Ibero-americanismo, Imperialismo e
Estado-Livre-Associado. Tanto
Nuestra América. A utopia de Bolívar,
articula a associação, parceria,
Martí, Betances, Sandino e muitos
outros ilumina muita história. Cada interdependência entre setores
dominantes estrangeiros e locais, como
um e todos lançam desafios e abrem
horizontes. Sintetizam lutas e desenvolve desigualdades e
façanhas de grupos e classes, antagonismos internos, compreendidos
movimentos sociais e partidos nessas mesmas relações. Pode-se dizer
políticos. que a descoberta, ou invenção, da
quinta fronteira é um momento
Cada experiência, vitória ou derrota é essencial da questão nacional. É
uma façanha que pode abrir olhando no de fora que se descobre
perspectivas para outros, ou todos. o que está dentro. O de dentro fica
"Porto Rico e as outras Antilhas mais nítido, quando se vê o que se
constituem o campo de batalha entre levou para fora.
o imperialismo ianque e o
ibero-americanismo. A solidariedade
ibero-americana exige que cesse toda A Nação Imaginária
ingerência ianque neste arquipélago,
para restaurar o equilíbrio continental A Nação está na história e no
e assegurar a independência de todas imaginário. É uma realidade
as nações colombianas. Dentro dessa inquestionável, consubstanciada
suprema necessidade, é imprescindível na sociedade civil e no Estado. Mas
nossa independência. Nossa situação também é uma fabulação. Ressoa no
dolorosa sob o império dos Estados pensamento do historiador, filósofo,
Unidos é a situação que Norte-América escritor. A Nação que aparece no
pretende impor a todos os povos do imaginário, não é a da história. Não
continente. Nossa causa é a causa está no real. Pode nascer de um

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Alusão ao poema "Generaciones y Semblanzas".
incidente, personagem, situação. Mas A freqüência, força e duração das
não permanece nesse ponto. Solta-se ditaduras produzem uma espécie de
nos espaços e movimentos propiciados obsessão na vida e pensamento
pelo idioma, a cor, o traço, a imagem, latino-americanos. Esse é um tema
o som. No romance, poesia, teatro, que atravessa o continente e as ilhas.
pintura, música, cinema, ela é fantasia, Várias formas de Estado confundem-se
quimera, obsessão. É fruto da com ditaduras abertas ou dissimuladas,
inventiva, liberdade poética, civis ou militares, episódicas ou
linguagem, imaginação. Há muitas perpétuas. Por isso é que na história
Nações no imaginário e sociologia, teatro e cinema, romance
latino-americano. Cada época, e poesia, é grande a presença do
escola, tendência artística cria o ditador, ditadura ou tirania. "Na
mundo à sua feição. Talvez se possa América hispânica a ditadura é, ao
mesmo dizer que a Nação mesmo tempo, a forma de governo
latino-americana tem sido barroca, mais freqüentemente praticada e a
romântica, parnasiana, realista, mais fundamentalmente desprovida de
moderna, mágica. A do imaginário, legitimidade. Sendo assim, não é
é pura invenção. surpreendente que o exame das
raízes históricas das ditaduras
Na produção intelectual sobre a hispano-americanas tenha sido tão
ditadura, a Nação histórica e amiúde, empreendido na perspectiva
imaginária revela-se particularmente de um conflito entre o vício e a
nítida, surpreendente, insólita. Há virtude." (DONGHI, 1986, p. 24.)
escritos sobre as formas do Estado, os É tão importante o desafio prático e
regimes políticos, os populismos e teórico representado pela recorrência
militarismos, nos quais o que se e força da ditadura, que alguns
procura é conhecer a anatomia da encontram as suas raízes no passado
ditadura. distante, remoto, colonial, absolutista,
A ditadura pode ser uma configuração ibérico, da contra-reforma. O desafio
particularmente extrema da é tão forte que o pensamento e a
problemática nacional. Essa é uma imaginação deslocam-se para a larga
época em que a Nação é levada a duração, a filosofia da história, a
fundir-se no poder estatal. A figura evasão sofisticada, erudita, pretérita. A
do ditador personifica o governo, proliferação de regimes autoritários
o regime, o Estado e a Nação. Tudo "não é uma aberração moral ou
se refere a ele. Tanto assim que o política, mas a manifestação de um
maniqueísmo toma conta de todos. estilo de comportamento político,
Quem não é favorável ao governo, uma disposição secular da sociedade
é contra. Impossível a indiferença, latino-americana" (VÉLIZ, 1984,
a dúvida. p. 15). Como a matriz está no passado,
Há ditaduras de meses, anos. Outras o presente está condenado. Pode
levam décadas. Podem ser abertas e resignar-se à sabedoria do pretérito.
disfarçadas, civis e militares. Há Em vários momentos a história e o
perpétuas, marcando de modo imaginário confundem-se. No
profundo a cultura política nacional, empenho de buscar as condições,
o estilo de governo, as estruturas origens e raízes da tirania, alguns
estatais, a visão da história, pretérito parecem reificar o passado.
e presente. Abandonam o jogo das forças sociais,
perdem de vista a historicidade das coleção de incidentes e situações;
conjunturas críticas, desesperam-se ressoando a sociedade, a história e a
diante da recorrência, força e duração Nação.
da tirania. Todos estão empenhados em
Ocorre que a tirania latino-americana desvendar o mistério da tirania, sem
muitas vezes supera a imaginação. danificar o tirano. Trata-se de
Apresenta-se como uma realidade compreendê-lo vicariamente,
inverossímil. É algo que é dado na desvendar o seu modo de pensar,
história e vida das pessoas, grupos, sentir, agir. Buscar o segredo do seu
classes, sociedade. É verossímil, mas poder, como graça e danação. Nos
contém um elemento de absurdo, romances sobre ditadores
paroxismo, loucura. "Cardoza y latino-americanos "percebemos o
Aragón disse um dia a Carpentier que poder através dessa figura carismática
a realidade supera os romances de que o exerce, a qual revela a aparência
ditadores. Carpentier respondeu que de toda potestade humana. Nossa
se os romancistas narrassem a realidade percepção do poder é a da pessoa que
seus romances seriam 'inverossímeis'. o conquistou e a ele se aferra até não
'A realidade é inverossímil', replicou ser nada mais do que isso, poder"
Cardoza, acrescentado uma reflexão (RAMA, 1976, p.16).
impessoal: — "Há algo mais. . . A
imaginação não pode inventar um O poder do tirano está em que ele
Somoza." (CASANOVA, 1986, absorve e sintetiza não só o governo,
p. 222.) o regime e o Estado, mas também a
Um personagem particularmente sociedade, o povo e a Nação. Esta
importante na produção artística realiza-se e dissolve-se nele. "O
latino-americana é o tirano. Está no Supremo é a abstração da Nação,
romance, poesia, teatro, pintura e não é humano e encarna-se na pessoa
outras formas. Metido em incidentes, do Dr. Francia." Tudo está iluminado e
vivendo situações. Em vários sombreado pela mesma figura, singular
romances, o tirano é o personagem e plural. "O poder de Francia é,
principal, em torno do qual gravitam paradoxalmente, incorpóreo
ministros, secretários, diplomatas, (transcendental) e também encarnado
empresários, fazendeiros, intelectuais, em um ser humano mortal, que trata
duplos, sombras; ao mesmo tempo o Paraguai como se fora uma extensão
Ocorre que a tirania que aí gravitam a sociedade, a da sua própria pessoa." (FRANCO,
latino-americana história, a Nação. Alguns exemplares 1986, p. 186, 188.)
muitas vezes supera a notáveis da galeria de tiranos são O que sobressai é a Nação
imaginação. criados por Miguel Ángel Asturias, representada, personificada,
Apresenta-se como uma El Señor Presidente; Alejo Carpentier, sintetizada, simbolizada e dissolvida
realidade inverossímil. El Recurso del Método; Arturo Uslar no tirano. O tirano como presidente,
É algo que é dado na Pietri, Oficio de Difuntos; Jorge generalissimo, magistrado, supremo,
história e vida das Zalamea, El Gran Burundún-Burundá patriarca. Princípio e fim de todas as
pessoas, grupos, ha Muerto; Oduvaldo Vianna Filho, coisas, de todos. Ele institui o
classes, sociedade. Papa Highirte; Gabriel García presente e o passado. Movimenta ou
É verossímil, mas Márquez, El Otoño del Patriarca; estanca o devir. Tem o poder de
contém um elemento Augusto Roa Bastos, Yo El Supremo. instituir a ordem e o progresso. "O
de absurdo, paroxismo, Esses são alguns textos, dentre os que Supremo é aquele que o é por sua
loucura. lidam com o tirano, como personagem, natureza. Nunca nos lembra outro
senão a imagem do Estado, da Nação, ditador. O ditador é levado às últimas
do Povo, da Pátria. "(ROA BASTOS, conseqüências, enquanto fantasia do
1977, p. 56.) escritor. O tratamento literário dessa
Institui o certo e o errado, o permitido figura permite levá-la aos mais
e o proibido, dissolvendo a realidade incríveis paroxismos. A ambição de
no inverossímil, fazendo tudo mando eleva o poder ao absurdo, de
universal. "Dito-te uma circular a fim tal modo que o tirano se imagina
de instruir os funcionários civis e absoluto, em si. De tão longe que se
militares sobre os fatos cardinais de leva, como figura e figuração do poder,
nossa Nação. Quando a lerem, estes acaba por perder quaisquer vínculos
bestas analfabetos acreditarão que falo com os outros: familiares, auxiliares,
de uma Nação imaginária." (Idem, secretários, ministros, setores sociais,
p. 52.) povo, população. É tamanho o
isolamento em que se põe que termina
A figura do ditador, manifesta e por sentir-se imagem, reflexo, sombra
desenvolvida nas relações com os seus de si mesmo. Aos poucos, sente-se
coadjuvantes, expressa aspectos mais tão só que se imagina vendo-se
ou menos fundamentais da situação póstero, depois de ter existido. Aí
nacional. Independentemente das descobre plenamente o ponto de
escolas literárias em que se inscrevem, vista do povo. Parecia respeitado,
da qualidade artística de cada um, os seguido, admirado, idolatrado. Na
romances retratam aspectos realidade, era invejado, desconfiado,
importantes da questão nacional. São temido, odiado, satirizado.
vários os temas e dilemas neles O paroxismo do poder revela-se na
presentes. Lidam com as mais variadas solidão e desdobra-se na duração do
expressões da cultura latino-americana. tempo. Para ele, o tempo não passa,
Apontam as diversidades raciais, repassa; não flui, reflui. Adquire o
culturais, religiosas, lingüísticas, contorno do círculo fechado, torna-se
econômicas, políticas, regionais, estático, parado, mesmo, atônito,
sociais. Mostram a difícil e prisioneiro de si. De tanto dominar a
contraditória metamorfose da todos e a tudo, as atividades e as
população em povo, das múltiplas opiniões, os amigos e os inimigos, o
formas sociais de vida e trabalho em perto e o longe, o tirano acaba por
sociedade nacional, Estado-Nação. desprezar o curso da história, os
Revelam a metamorfose da história movimentos da sociedade, as
em façanha, do tempo em duração, façanhas do povo. Fecha-se num
do tirano em prisioneiro da tirania. Em círculo atônito, monumento de si
vários países, se não em todos, há mesmo petrificado. Glória e vítima do
romances que constróem a fisionomia seu poder perpétuo, granítico. Imagina
da sociedade nacional, enquanto que a duração da sua estátua pode
história, cultura, lutas sociais, alterar a duração da história.
vitórias, derrotas, façanhas. Fica O escritor do romance da ditadura
bastante nítida a ressonância da não escapa ao fascínio da sua criação.
Nação no romance; e deste na imagem Na singular dialética das relações
que uns e outros podem construir da criador e criatura, aos poucos, fica
Nação. Na América Latina, o romance imperceptível a linha que separa o
inventa a sociedade nacional. real e o imaginário, a figura e a
A Nação espelha-se na figura do figuração, a pessoa e o personagem,
o dito e o mito. De tanto compreender no imaginário. Tanto assim que ela
o poder, evitando satanizar ou pode ser barroca, romântica,
angelizar o ditador, o escritor parece parnasiana, realista, moderna,
entregar-se ao seu personagem, labiríntica, mágica. Como o são os
tornar-se cúmplice do algoz. Quem que a formam, quando lhe incutem
inventou o romance : o escritor ou o a imaginação.
tirano? Esse o preço que o artista
paga para desvendar os paroxismos
da sua criatura. O pathos da tirania História e Nação
arrasta o leitor, o tirano e o escritor.
A Nação não surge pronta, acabada.
Mas é mera aparência o fascínio do Forma-se e conforma-se ao longo da
ditador sobre o escritor e o leitor. A história. Nasce e renasce, segundo os
narração flui todo o tempo sob o signo movimentos do seu povo, forças
do riso. Desde o primeiro momento, o sociais, formas de trabalho e vida,
humor permeia a construção da controvérsias e lutas, façanhas e
narrativa. A força do poder, o utopias. Resgata ou esquece tradições
desmesurado da façanha, a insólita reais e imaginárias, conforme a
duração do tempo, a reversão da fisionomia que se pretende construir
figura do ditador em outro, duplo, no presente, segundo a utopia que vai
sósia, sombra de si mesmo, a buscar no futuro. Está sempre em
construção de obras públicas movimento. Afina e desafina.
monumentais, a reprodução de
palácios, capitólios, templos e óperas O hino, bandeira, idioma, moeda,
de modelos estrangeiros, a venda do mercado, meios de comunicação,
mar para pagamento da dívida, o instituições, padrões, valores, heróis,
palácio do governo transformado em santos conferem a todos a ilusão de
estabulo, os tapetes e as cortinas que fazem parte da mesma Nação. O
feitos pastagens de vacas, são muitas operário, camponês, empregado,
as invenções que desvendam a funcionário, artesão, comerciante,
paródia. Tudo é iluminado pela estudante, intelectual e outros,
ironia, caricatura, escárnio, grotesco, compreendendo o índio, mestiço,
gargalhada, riso devastador. Tudo se negro, mulato, amarelo e branco são
carnavaliza, a partir de uma profunda, levados a imaginar-se no espelho do
surpreendente e insólita compreensão hino, bandeira, idioma, moeda,
do tirano visto na ótica do povo. mercado, governo, regime, Estado.
Mas a Nação está atravessada por
A Nação está na história e no diversidades sociais, culturais,
imaginário. Umas vezes a história políticas, econômicas, regionais, raciais
vai além da imaginação. Outras, é e outras. Uns afirmam que elas são
esta que revela o que não se vê na naturais, inevitáveis, como o colorido
história. da multiplicidade; que as desigualdades
Talvez se possa dizer que a Nação são incidentes na conformação das
seja uma singular criatura, uma diversidades. Outros alegam que as
estranha obra de arte. Nela desigualdades freqüentemente
sintetizam-se as façanhas da sociedade escondem-se nas diversidades; que os
civil e a força do Estado demiurgo. A antagonismos espreitam todo o tempo,
comunidade ilusória não é o Estado, desde as diversidades sociais, raciais,
mas a Nação que aparece na história e regionais, culturais e outras.
Entretanto, o que reina, sobretudo e São as forças sociais presentes na
sobretodos, é a ilusão da identidade sociedade civil que conferem ao
simbolizada no Estado. Estado, em última instância, a
O Estado não só simboliza como é capacidade de exercer este ou aquele
levado a interferir nas relações comando, direção. O povo, os grupos
internas e externas que configuram sociais e as classes sociais, por sua
a Nação. A partir dos interesses que atividade na política, economia e
representa, ou interpreta, confere à cultura, criam e recriam as condições
sociedade nacional esta ou aquela de organização do governo, regime,
direção. Às vezes detém uma grande Estado. As formas do Estado, as
capacidade de mando, ou desmando, recorrências do autoritarismo e as
podendo incutir na sociedade esta ou vicissitudes da democracia têm as suas
aquela direção. Outras vezes parece raízes nas relações internas e externas
estar em descompasso, desligado ou que movimentam a sociedade civil.
mesmo oposto às tendências da Mas a sociedade civil não se esgota na
sociedade constituição, códigos, instituições,
sindicatos, partidos, movimentos en México; bem como a pintura
sociais e correntes de opinião. Ela muralista mexicana de Orozco, Rivera
tem raízes, também, nas diversidades e Siqueiros.
e desigualdades sociais, culturais, PORTO RICO: Antonio S. Pedreira,
regionais, raciais e outras, sem as Insularismo; Tomás Blanco,
quais se torna pouco inteligível. Prontuário Histórico de Puerto Rico;
A problemática da questão nacional Manuel Maldonado Denis, Puerto
está presente em boa parte da Rico: una Interpretación
produção intelectual relativa a cada Histórico-Social; José Luis González,
um e todos os países da América El País de Cuatro Pisos; Ángel G.
Latina, no continente e nas ilhas. Está Quintero Rivera, "Clases Sociales e
na história e sociologia, teatro e Identidad Nacional", Luis Pales Matos,
cinema, pintura e música, romance e Tuntun de Pasa y Grifería; Manuel A.
poesia. Nessa produção, ressoam e Alonso, El Gibaro.
multiplicam-se os temas, de tal BRASIL: Oliveira Vianna, Evolução do
maneira que a Nação parece vagar Povo Brasileiro; Gilberto Freyre,
na história e no imaginário. Interpretação do Brasil; Sérgio
Talvez se possa dizer que algumas das Buarque de Holanda, Raízes do Brasil;
principais obras da produção Caio Prado Júnior, Evolução Política
intelectual latino-americana lidam do Brasil; José Honório Rodrigues,
com aspectos mais ou menos Aspirações Nacionais; Raymundo
relevantes da questão nacional. A Faoro, Os Donos do Poder; Florestan
menção de obras relativas a alguns Fernandes, A Revolução Burguesa no
países pode dar uma idéia do desafio Brasil; Lima Barreto, Triste Fim de
reiterado que essa problemática exerce Policarpo Quaresma; Mário de
entre cientistas sociais, filósofos, Andrade, Macunaíma.
escritores, artistas. Todos estão interessados em
ARGENTINA: Domingo F. Sarmiento, compreender como se forma o povo,
Facundo (Civilización y Barbárie); a sociedade, o Estado, a Nação; em
Juan B. Alberdi, Bases y Puntos de certas conjunturas ou no largo da
Partida para la Organización Política história. Colocam-se os dilemas
de la República Argentina; Ezequiel relativos às diversidades sociais,
Martinez Estrada, Radiografia de la culturais, raciais, regionais e outras.
Pampa; José Hernández, Martin Fierro. Resgatam e esquecem tradições reais e
PERU: José Carlos Mariategui, Siete imaginárias, ao mesmo tempo que
Ensayos de Interpretación de la narram controvérsias e lutas, façanhas
Realidad Peruana; Víctor Raúl Haya e utopias. Querem formar ou
de la Torre, El Imperialismo y el conformar a Nação ao passado ou
Apra; José Maria Arguedas, Todas las futuro, desde o presente.
Sangres; Julio Cotler, Estado y Nación Na América Latina, a Nação parece
en el Perú. encontrar-se sempre em formação. Não
MÉXICO: Andrés Molina Enríquez, está no começo, avançou muito, mas
Los Grandes Problemas Nacionales; continua a articular-se e rearticular-se,
Samuel Ramos, El Perfil del Hombre buscando o seu lugar. Quase todos os
y la Cultura en México; Octavio Paz, países contam com várias, ou muitas,
El Laberinto de la Soledad; Pablo constituições em sua história. Tiveram
González Casanova, La Democracia que começar de novo, recomeçar
muita coisa, ou tudo. Os golpes, os Daí a impressão mais ou menos
surtos de autoritarismo, as ditaduras permanente de que a Nação é
perpétuas povoam a história. A provisória, está por formar-se,
democracia floresce e fenece. procura o seu lugar na história. Pode
ser oligárquica, liberal, populista,
O povo continua a formar-se, se autoritária, democrática. Está sempre
compreendemos que povo é uma em movimento. Afina e desafina.
coletividade de cidadãos. O que Sim, a Nação não está pronta, acabada.
predomina é a população de Ao contrário, as crises e rupturas
trabalhadores, na qual encontram-se sucedem-se. Depois de décadas de um
camponeses, mineiros, operários, processo democrático ascendente,
empregados e outros; em geral, pode ocorrer o retrocesso, o golpe de
compreendendo índios, mestiços, Estado, a recorrência autoritária, a
negros, mulatos, amarelos, brancos. ditadura. Destróem-se vastas
Uma população heterogênea, conquistas sociais, políticas e
aglutinada ou dispersa, quanto às culturais. Precisamente os que falam
características culturais, lingüísticas, em civilização, Ocidente etc.,
religiosas e outras. População mergulham a sociedade na barbárie
espalhada e concentrada, na cidade e fascista.
campo, nesta ou naquela região. Os Há conjunturas críticas nas quais o
grupos, classes, sindicatos, partidos, Estado e a sociedade civil dissociam-se
movimentos sociais e correntes de bastante, estranham-se amplamente.
opinião pública estão atravessados Diante da violência organizada e
pelas diversidades culturais, raciais e concentrada no Estado militarizado, a
regionais. São várias as condições serviço do grande capital, o povo
históricas — naturalmente, segundo as resiste, subsiste. Mas dá a impressão
peculiaridades de cada país — que de que vaga perdido na solidão dos
dificultam ou distorcem a pampas, coxilhas, planaltos, costas,
metamorfose da população de serras, montanhas, vales, matas,
trabalhadores em um povo de campos e construções. Muitos são
cidadãos; pessoas que pertencem obrigados a confinar-se dentro de si.
e sentem-se pertencer à sociedade Parecem sonâmbulos, zumbis
nacional. extraviados de um país inexistente.
Acontece que a sociedade civil e o "No que se refere à sociedade, ia-se
Estado encontram-se e arraigando a idéia da desproteção, o
desencontram-se. Freqüentemente obscuro temor de que qualquer um,
dissociam-se. A sucessão de crises, por inocente que fosse, poderia cair
golpes de Estado, ditaduras e naquela infindável caça às bruxas,
interrupções de experiências apoderando-se de uns o medo
democráticas assinalam o periódico paralisante e de outros uma tendência
divórcio entre as tendências consciente ou inconsciente para
predominantes na sociedade civil justificar o horror. Por algum motivo
e as do Estado. O Estado nem está será, murmurava-se, em voz baixa,
solto no ar, nem é demiurgo. Mais como que querendo, assim, abrandar
freqüentemente, é prisioneiro de os terríveis e inescrutáveis deuses,
pequenos grupos, as classes vendo como empesteados os filhos ou
econômica, política e militarmente os países desaparecidos... No delírio
mais fortes; os que mandam. semântico, polarizado por expressões
como 'marxismo-leninismo' reivindicações sociais, políticas,
'apátridas', 'materialistas e ateus' econômicas, culturais. Em todos os
'inimigos dos valores ocidentais e lugares, as reivindicações e lutas
cristãos', tudo era possível Desde reabrem a problemática da questão
aquele favorável a uma revolução nacional. No limite, a Nação está em
social até os adolescentes generosos vias de realizar-se de forma mais
que iam às favelas para ajudar seus plena quando se organiza nos moldes
moradores, todos caíam na rede: de uma democracia política e social.
dirigentes sindicais que lutavam por Nesse momento é que a maioria
uma simples melhora de salários, aparece no âmbito do Estado-Nação,
jovens que tinham sido membros de
um centro estudantil, jornalistas que A Nação tem adquirido a fisionomia
não eram devotados à ditadura, que lhe conferem os que mandam,
psicólogos e sociólogos por pertencer nesta ou naquela época. Tanto assim
a profissões suspeitas, jovens que tem sido oligárquica, liberal,
pacifistas, freiras e sacerdotes que conservadora, populista, autoritária
haviam levado os ensinamentos de democrática. São distintas as formas
Cristo às favelas. E amigos de qualquer da Nação burguesa. Mas pouco, ou
um deles, e amigos desses amigos, nada, expressam do operário,
gente que havia sido denunciada por camponês, empregado e outras
vingança pessoal e por seqüestrados categorias que compõem o povo;
submetidos à tortura." (Comisión pouco ou nada expressam das
Nac. Desaparición de Personas, diversidades e desigualdades regionais,
1985, p. 9-10.) culturais e outras. Em geral, subsiste
a impressão de que não se conclui
Poucos são os países latino-americanos nunca a sua formação.
que não passaram algum tempo, ou
largo tempo, por esse horror. Esses são Talvez se possa afirmar que as
revoluções burguesas verificadas nos
fatos antigos e atuais, pretéritos e
países latino-americanos não
presentes. Estão incrustados em
resolveram satisfatoriamente alguns
agências do poder estatal, na cultura
aspectos básicos da questão nacional.
política de grupos e classes
Em quase todos os países, não se
dominantes. A repressão contra os
formou o povo, como coletividade
descontentes, os que lutam por
de cidadãos. O operário, camponês,
conquistas sociais, os que almejam
empregado e outras categorias, muitas
uma sociedade alternativa, converte-se
vezes como índio, negro ou branco,
em "exercício administrativo" regular.
não ingressaram de forma ampla nos
"A piedade e a compaixão tornam-se
espaços da cidadania. As diversidades
desonrosas" (MORSE, 1982, p. 160),
e desigualdades sociais, raciais,
para quem exerce a sagrada missão de
regionais e culturais, expressas em
salvar a pátria militar, a civilização
termos políticos econômicos,
cristã, o mercado do capital.
mostram que a fisionomia da Nação
Nem por isso, no entanto, apagam-se burguesa pouco ou nada reflete da
as lutas pela democracia política e cara do povo.
social. Os mais diversos setores da As revoluções populares em curso na
sociedade, na cidade e no campo, por América Latina no século XX sugerem
seus movimentos sociais e partidos outras formas de organizar a
políticos, insistem nas suas sociedade nacional, o Estado-Nação.
Pode-se dizer que um dos segredos da termos de povo, de coletividade de
revolução cubana, assim como da cidadãos. Além das contradições de
sandinista, está em que são classes, em âmbito interno e externo,
revoluções nacionais, ao mesmo entram em causa as contradições
tempo que sociais. Fundam-se nas culturais, raciais e regionais. Isto é,
desigualdades que a revolução o operário, camponês, mineiro,
burguesa, em Cuba e na Nicarágua, empregado e outros ingressam na
não foi capaz de resolver, ou luta também como membros de um
encaminhar de modo a articular povo desprezado por suas
maiores segmentos da população em características culturais e raciais.

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