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Introdução
Durante os mais de 20 anos que venho trabalhando como como professor de arranjo,
tenho comprovado uma gigantesca curiosidade, por parte dos alunos, sobre as distintas
técnicas e recursos utilizados pelos arranjadores profissionais. A quase completa ausência de
bons livros sobre o assunto, em português (Carlos Almada1 e Ian Guest2 são pioneiros nessa
empreitada), resultou em um autodidatismo generalizado. Consequentemente, o caminho do
aprendizado acaba sendo muito mais longo e penoso. Não me entendam mal: acredito que um
artista deva passar a vida se auto educando, porém deve existir uma troca de informações com
outros profissionais, através de aulas, livros, vídeos, etc. Muitas vezes me deparo com alunos,
que demoraram uma vida para aprender conceitos, que levariam não mais que uma hora para
serem dominados. Infelizmente, entre os chamados músicos populares, ainda existe uma
resistência ao ensino formal. Muitos acreditam que perderão a espontaneidade e a
criatividade, se submetidos a uma educação acadêmica.
Essa situação começou a mudar quando a primeira geração de músicos que teve a
oportunidade de estudar nos centros consagrados de ensino de jazz no exterior, voltou para o
Brasil, e começou a retransmitir os conhecimentos adquiridos lá fora. Destaco dois mestres
importantes: Nelson Ayres em São Paulo, e Ian Guest no Rio de Janeiro. O segundo, querido
Húngaro, de quem fui aluno durante mais de 5 anos, admirava a espontaneidade de nossos
músicos, porém acreditava que precisávamos aprender mais ferramentas técnicas, para poder
melhor expressar nossa fecunda musicalidade. Segundo Ian Guest (GUEST,1996, Volume 2,
p.8), deve-se distinguir técnica e criatividade, liberdade e disciplina:
Outro agravante, é a quase total falta de oportunidades para execução dos primeiros
arranjos, dos pretendentes a profissão de arranjador. A falta de grupos instrumentais
dedicados para esse fim, dentro das instituições de ensino, é um mal que precisaria ser sanado.
Essa dissertação, é a minha pequena contribuição para tentar resolver alguns desses
1
Carlos Almada é compositor, arranjador e autor de Arranjo (Editora da Unicamp, 2000), A estrutura do choro
(Da Fonseca, 2006), Harmonia funcional (Editora da Unicamp, 2009) diversos métodos sobre música brasileira.
publicados pela editora norte-americana Mel Bay.
2 Ian Guest é precursor, no Brasil, do ensino da música popular. Fundador, em 1987, do Centro Ian Guest de
Aperfeiçoamento Musical – CIGAM. Autor de Arranjo Método Prático Vol. 1, Vol. 2 e Vol. 3 (Editora Lumiar
1996). Introdutor do método Kodály de Musicalização no Brasil.
2
problemas.
Na época de ouro das rádios no Brasil, havia dois tipos de arranjadores. O primeiro,
vinha da música de concerto. Geralmente eram compositores ou pianistas, que necessitavam
do dinheiro rápido da chamada música comercial, para pagar suas contas. Embora tivessem
um profundo conhecimento de matérias como orquestração, instrumentação e contraponto,
faltava a eles, a vivencia da música popular, em suas formações musicais. O segundo, era
justamente o oposto. Vinham de uma vasta experiência tocando e gravando com artistas
populares. Possuíam o que hoje chamamos de "baile3". O interessante, é que esses dois tipos
de artistas trabalharam dia a dia, durante muitos anos, informalmente trocando preciosas
informações. Como resultado, elevaram o nível dos arranjos da chamada época de ouro da
música popular. Radamés Gnattali e Pixinguinha são dois exemplos dessa saudável
miscigenação musical.
3
'Ter baile"- Gíria antiga, ainda utilizado pelos músicos populares para designar conhecimento que só pode ser
adquirido através da experiência de tocar ao vivo. geralmente em bandas de baila, onde tinha que se aprender o
repertório de ouvido, na hora.
3
(Long Players, bisavós do MP3) eram gravados com grandes orquestras, o que proporcionou
aos músicos dessa geração, uma frutífera experiência nos estúdios. Outra vez a troca informal
e generosa entre os músicos, junto com a enorme gama de oportunidades para gravar seus
arranjos iniciais, foi a principal escola dessa geração. No entanto, infelizmente mais uma vez,
ninguém escreveu um livro sobre o assunto.
De lá para cá, muita coisa mudou no mercado musical. A internet e as mídias digitais
tornaram a música um produto muito barato, ou muitas vezes, completamente gratuito para o
consumidor. Infelizmente, raramente se grava um fonograma com orquestra ao vivo. O uso de
sintetizadores e samples é onipresente no universo da música popular, e no lugar do
arranjador temos o que veio a se chamar de produtor musical. Esse muitas das vezes, é um
sujeito sem a mínima formação musical, que lida muito superficialmente com computadores,
e caiu de paraquedas na profissão.
As emissoras de TV, que outrora possuíam uma orquestra própria para suas produções,
trocaram 150 instrumentistas por uma dúzia de tecladistas/compositores. Muitos são músicos
extremamente competentes, entretanto, gastam mais tempo discutindo com diretores e
sequenciando suas trilhas no computador, do que compondo ou escrevendo arranjos.
gastos com trabalhos mais criativos. Além do mais, os editores de partitura nos permitem
escutar nossos arranjos e composições em tempo real (utilizando instrumentos midi ou
samples). Com isso é possível corrigir eventuais erros, antes de ensaios ou gravações. A era
digital, possibilitou todo tipo imaginável de edição, em qualquer espécie de trabalho onde a
criatividade esteja envolvida. Mudar de ideia sobre um trecho musical e trocar sua posição
dentro de uma composição, ficou muito fácil e intuitivo, para quem sabe utilizar as
ferramentas digitais. Por exemplo: nesse projeto, utilizei o Sibelius como "cenário" de fundo
na filmagem das minhas aulas, para confeccionar as apostilas de cada tópico, e para criar
todas as figuras dessa dissertação.
Outra benesse de final do século é a internet, e a sua revolução sem volta, que vem
causando na humanidade. As novas maneiras de produzir, distribuir, divulgar e negociar
musica, mudaram completamente o modus operandi da profissão. Antes, a gravação de um
fonograma só era acessível para as grandes corporações do entretenimento. O preço da
construção de um estúdio de gravação era inviável, mesmo para artistas bem sucedidos.
Graças ao desenvolvimento e barateamento dos PCs (Computador Pessoal), das interfaces de
áudio e dos softwares de gravação, tornou-se possível produzir Cds de qualidade na
tranquilidade de nossos lares. Foi o famoso mote "uma câmera na mão e uma ideia na cabeça"
do Glauber Rocha, levado ao extremo, por todos os músicos do planeta. Nunca tantos,
produziram tanto por tão pouco. Foi o boom dos home studios4. A cereja do bolo, para o
artista independente foi a compressão do som digital (MP3 e outros formatos), a qual abriu de
vez, a caixa de Pandora da distribuição de música pela internet. As gravadores entraram em
pânico e mais tarde armaram sua vingança, com mais controle em cima dos artistas. Mas isto,
é assunto para outros trabalhos.
Outra boa aquisição dos aspirantes a músicos do século XXI é a explosão dos
chamados cursos online, onde esse meu projeto de aulas se classifica. Do sossego de nossos
lares, podemos nos graduar em arranjo, composição ou produção fonográfica, pelo prestigioso
Berklee College of Music. Obviamente, é preciso ter um bom nível de inglês para isso. Se eu
der a seguinte busca no google: Arranging Courses and Certificates Online5, encontro uma
quantidade surpreendente de opções, tanto de faculdade famosas (como a Berklee School ou a
North Texas), quanto de renomados professores que criaram seus cursos particulares online
(nos EUA e em outros países). Até na renomada escola de música erudita Julliard School,
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Home Studio -estúdio caseiro.
5 Arranging Courses and Certificates Online - cursos de arranjo e certificados (diplomas) online.
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Nesse projeto para o Promus, resolvi junto com meu orientador, abordar dez tópicos
sobre as técnicas mais usadas em arranjo. Criei módulos que funcionam da seguinte maneira:
Primeiro, escreverei um roteiro que servirá de base para a filmagem das aulas (módulos), que
mais tarde será feita no software supracitado. Embora os temas escolhidos sejam muito
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O Screenflow é um software que foi desenvolvido pela Telestream e oferece uma solução completa para quem
precisa gravar vídeo aulas, apresentações, jogos ou qualquer coisa em que seja necessário mostrar o que acontece
em seu desktop. Além de gravar, o software também edita e exporta o vídeo para os principais sites da internet.
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vastos, optamos por vídeos de 15 minutos, no máximo. Se necessário, cada módulo terá mais
de um vídeo. Como já foi dito, o "cenário" desses vídeos, foram preparados no Sibelius, e são
partituras interativas sobre o assunto abordado. Tudo que for explicado nas aulas, os alunos
vão escutar em exemplos de minha autoria, especialmente compostos para esse fim. Segundo,
cada módulo será acompanhado de duas apostilas em pdf. Uma com a teoria do assunto
abordado, e outra com exercícios complementares, com um gabarito das respostas no final.
Essas vídeos aulas, estarão disponíveis gratuitamente na internet, e fazem parte de um
futuro projeto, onde pretendo abordar toda a matéria do curso de arranjo. Estarão online, tanto
num site dedicado para o assunto, quanto em plataformas consagradas, tais como o Facebook
e o YouTube, onde já criei o canal Arranjo Online (ainda não aberto para todos). No site, será
possível assistir as aulas em streaming, fazer download das apostilas em pdf, e entrar em
contato comigo por e-mail. E, para quem interessar possa, agendar aulas através do Skype.
Para minha sorte, uma das primeiras aulas que assisti online, foi as do agora famoso
Prof. Thomas Goss, que da tranquilidade de seu quarto na Nova Zelândia, gravou uma série
de aulas sobre orquestração e composição. Totalmente gratuito, e com informação da maior
qualidade. Mas tarde acabou ampliando este despretensioso canal do YouTube para o maior
portal de orquestradores e compositores da internet. Lançou maravilhoso livro digital (e-book)
de orquestração, além de vários cursos online sobre Sibelius e Orquestração para a
MacProVideo.com (celebrada escola virtual de cursos sobre áudio e música, da qual acabei
fiquei freguês). Foi ele, uma das inspirações que me levou a iniciar essa empreitada.
O assunto é vasto e fascinante, e muito ainda teria o que discutir. As ferramentas
digitais para o aprendizado de música são muitas, e estão disponíveis gratuitamente, ou por
preços acessíveis. Basta dar uma pequena busca no Google, para perceber que o número de
cursos de música online é imenso. Pessoalmente, tenho usufruído ao máximo dos
maravilhosos recursos que estão ao meu alcance, e tento instigar nos meus alunos o dom da
curiosidade.
Não tenho dúvida, que todos podem se beneficiar muito, usando tecnologia digital em
seu aprendizado. Fico um pouco decepcionado quando encontro jovens que só usam o
computador como correio. É quase como usar um piano de cauda somente como porta vaso.
Vamos colocar a mão na massa! Estamos vivendo tempos extraordinários, custa muito pouco
aprender, criar e produzir. Acredito que seja nossa missão como educadores, incitar, difundir
e facilitar o uso das muitas ferramentas digitais accessíveis para o músico contemporâneo.
O mestrado profissional me proporciona a oportunidade de realizar um velho projeto
de democratização do ensino. Deixe-me explicar melhor: a muitos anos atrás, viajando pelo
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