Você está na página 1de 3

ROTEIRO PARA ASSISTÊNCIA NA CESSAÇÃO DO TABAGISMO

1) Avaliação Clínica

a) Perfil do fumante: carga tabágica, tentativas de cessação, tratamento anteriores com


ou sem sucesso, recaídas e prováveis causas, sintomas de abstinência, convivência com
outros fumantes e situações em que fuma, atividade física habitual.

b) Grau de dependência (Fagerström Test for Nicotine Dependence – FTND, com


pontuação máxima de 10): *Quanto tempo após acordar você fuma seu primeiro cigarro
(3= 5min, 2= 6-30min, 1= 31-60min, 0= >60min)?; *Você acha difícil não fumar em
lugares proibidos (1= sim, 0 = não)?; *Qual o cigarro do dia que traz mais satisfação (1=
1º da manhã, 0= outros)?; *Quantos cigarros você fuma por dia (3= >31, 2 = 21-30, 1=
11-20, 0= <10)?; *Você fuma mais frequentemente pela manhã (1= sim, 0= não); *Você
fuma mesmo doente, quando precisa ficar acamado a maior parte do tempo (1=sim,
0=não)?. 06 ou mais pontos indicam elevada chance de síndrome de abstinência após
retirada do cigarro. Outra forma de diagnosticar dependência à nicotina é por critérios
do DSM-V.

c) Grau motivacional e estágio (modelo transteórico comportamental de Prochaska e


DiClemente): a premissa é que toda mudança comportamental é um processo, com
diversos níveis de motivação e prontidão para mudar. 1) Pré-contemplação (não há
intenção de parar de fumar); 2) Contemplação (há consciência de que fumar é um
problema, mas h[a ambivalência quanto à perspectiva de mudança); 3) Preparação
(aceita mudar e prepara-se para tal); 4) Ação (para de fumar); 5) Manutenção (mantém-
se sem fumar +/- recaída); 6) Mudança. A Entrevista Motivacional (EM) é importante
para estimular a passar à ação, ajudar na reflexão, remover barreiras, esclarecer
objetivos e ajudar ativamente.

d) Sintomas: tosse, expectoração, chiado, dispneia, dor torácica, palpitações, claudicação


intermitente, tonturas;

e) Alergias e Medicamentos em uso que possam causar interação: antidepressivos,


inibidores da MAO, carbamazepina, cimetidina, barbitúricos, fenitoína, antipsicóticos,
teofilina, corticosteroides, hipoglicemiantes, insulina, entre outros;

f) Investigação de comorbidades: lesões orais, úlcera péptica, HAS, DM, cardiopatias,


transtornos psiquiátricos, uso de álcool e/ou outras drogas, pneumopatias, epilepsia,
AVE, dermatopatias, câncer, nefropatias, hepatopatias, entre outras;

g) Exame físico completo;

h) Exames complementares: radiografia de tórax, espirometria com prova


broncodilatadora, ECG, hemograma, bioquímica sérica e urinária.
2) Abordagem terapêutica

a) Intervenções motivacionais. TCC, com atendimento individual e em grupos com sessões


semanais no 1º mês, quinzenal por 3 meses e mensal até 1 ano. Material de apoio
(Cartilhas do INCA para cessação do tabagismo) deve ser oferecido para reforçar as
orientações. Todas as formas de intervenção psicossocial do tratamento (IPS) têm
relação dose-resposta direta com taxa de sucesso! Metade das pessoas são capazes de
parar de fumar com ajuda. Intervenções nas fases motivacionais: Pré-contemplação >
estimular a pensar em parar, informando sobre malefícios do cigarro e benefícios de
parar; Contemplação > encorajados a marcar uma data dentro de 30 dias para parar,
informando a familiares e amigos e iniciando medicação se indicada); Ação > afastar de
tudo o que lembre do cigarro, estratégias para manter as mãos ocupadas (escrever,
digitar, costurar, pintar), estratégias para combater humor negativo (banhar-se, fazer
algo prazeroso, ouvir música, ler, exercícios), estratégia para controlar urgência por
fumar (dura 3min > beber líquidos, chupar gelo, escovar dentes, mascar balas/chicletes
dietéticos, canela - substitutos da gratificação oral). Se recaída, aceitar sem críticas,
mantendo atmosfera de confiança e apoio.

b) Farmacoterapia: 1ª linha é TRN, Bupropiona e Vareniclina. Combinações aceitas:


adesivos + goma ou adesivos + bupropiona; 2ª linha é nortriptilina e clonidina são de 2ª
linha. Terapia de Reposição de Nicotina (TRN). Objetiva substituição da nicotina do
cigarro por meio de doses menores e seguras de nicotina, reduzindo a fissura e outros
sintomas de abstinência, dobrando a taxa de sucesso a longo prazo. Há forma de
liberação lenta em 24h = Adesivos Transdérmicos 21, 14 e 7mg (NiQuitin® / Nicotinell®),
iniciando com 01 adesivo por dia de 21mg por 04 semanas > 14mg por 04 semanas >
7mg por 02 semanas. Colar ao despertar em áreas sem pelos (tórax) no dia escolhido
para deixar de fumar, trocando a cada 24h ou retirando ao deitar, fazendo rodízio de
locais de aplicação (evitar alergias). Usar por até 10 semanas. Há formas de liberação
rápida, a Goma mastigável 2 e 4mg (Nicorette®) a cada 1-2h se fissura, mastigando até
surgir sabor e deixar repousado entre a gengiva e bochecha, com máx 24 unidades/dia.
Usar por até 12 semanas. Fora do Brasil há também inalador, spray nasal e pastilhas –
maior risco de dependência. São seguras para cardiopatas. O número de cigarros
fumados por dia pode orientar a dose inicial, sendo segura até 42mg por dia para
grandes fumantes. Diminuir doses se náuseas, salivação, palidez, dor abdominal,
sudorese, cefaleia, tontura, tremores. Aumentar dose se persistência de sintomas
graves de abstinência (ansiedade, inquietação, falta de concentração, distúrbios do
sono, sudorese, cefaleia, alteração do hábito intestinal).

c) Cloridrato de Bupropiona (Bup 150mg®). É um antidepressivo atípico dual/antagonista


nicotínico, sendo de primeira linha pelo FDA, com vários estudos demonstrando eficácia.
Tem distribuição gratuita pelo SUS. Indicação: escore de Fagerstrom ≥5. Pico em 03
horas, metabolização hepática (cimetidina, valproato e ciclofosfamida diminuam sua
metabolização / bupropiona diminui a metabolização de betabloqueadores e
antiarrítmicos), excreção renal. Deve-se iniciar 01 semana antes do paciente parar de
fumar (equilíbrio sério em 5 dias). Iniciar 01 comprimido de 150mg 1X/dia por 3 dias, no
4º dia até o final do tratamento 2X/dia (última dose até 16h da tarde), por até 12
semanas. Geralmente, bem tolerada, com efeitos comuns a insônia, cefaleia, boca seca,
tontura, hipertensão. Atenção - diminui limiar epiléptico! Contraindicada em epilépticos
ou propensos a convulsionar (tumor no SNC, TCE, abstinência alcoólica), uso de iMAO
nos últimos 15 dias, transtornos de alimentação (é anoréxico = perde peso!). Atenção
em uso de medicamentos com interação e HAS não controlada.

d) Tartarato de Vareniclina (Champix® 0,5 e 1mg). É um agonista parcial de receptores


colinérgicos nicotínicos cerebrais (alfa4beta2), derivado da citisina. É relativamente
caro! Indicação: escore de Fagerstrom ≥5. Os estudos mostram até maiores taxes de
abstinência que bupropiona e TRN. Estado de equilíbrio sério 4 dias após início, não tem
interação com bupropiona ou TRN, sendo excretada pelos de forma inalterada. Iniciar
1º ao 3º dia 1 comp 0,5mg 1X/dia > 4º ao 7º dia > 1 comp 0,5mg 12/12h > 8º dia até final
1 comp de 1mg de 12/12h. Duração recomendada de 12 semanas. Efeitos colaterais:
náuseas leves (1/3 dos pacientes), aumento do apetite, sonolência, constipação,
mudança no paladar, diarreia, boca seca, entre outros. Atenção: pode se associar a
depressão ou comportamento suicida.

e) 2ª Linha. *Nortriptilina (Pamelor® 10, 25, 50, 75mg). É um antidepressivo tricíclico com
efeitos também independentes na cessação do tabagismo. Efeitos colaterais
anticolinérgicos: boca seca, tremores, constipação, visão turva, sedação. Contraindicado
em pacientes com IAM, arritmias, insuficiência hepática, epilepsia, psicose e lactantes.
Iniciar 25mg/dia com incremento gradual até 75-100mg/dia em 3 semanas, sendo o dia
“D” após 28 dias do início e a duração do tratamento 12 semanas. *Clonidina (Atensina®
0,100mg / 0,150mg / 0,200mg). É um agonista de ação central em receptores alfa-2
adrenérgicos, com principal ação anti-hipertensiva, talvez com mesma eficácia que
bupropiona e TRN. Efeitos colaterais: sonolência, boca seca, hipotensão ortostática,
depressão, constipação e distúrbios do sono. Iniciar com 0,1mg/dia até 0,4mg/dia, com
dia “D” 2-3 dias após início, a qual deve ser mantida 3-4 semanas, com desmame
gradual. *Propostas futuras: imunoterapia (vacina contra nicotina), dispositivos
(inaladores livres de fumaça, filtros de nicotina, etc), materiais de auto-ajuda,
tratamento via internet/telefone (helplines), atividade física orientada, acupuntura,
hipnoterapia.

f) Gestantes, adolescentes, médicos, idosos, hospitalizados (25% fumam dentro do


hospital, 55% referem sintomas de abstinência, apenas 6% recebe reposição de nicotina,
63% recaem na 1º semana de alta), com comorbidades psiquiátricas, com comorbidades
clínicas (úlcera péptica, doença de Crohn, doença hepática, DM, doenças da tireoides,
osteoporose, DPOC, asma, Doenças intersticiais pulmonares, doenças cardiovasculares,
câncer de pulmão, TGO, pâncreas, rim, bexiga, LMA, etc) merecem atenção especial.

g) Tabagista em recaída: é um fenômeno natural no ciclo de qualquer dependência, sendo


um marco no tratamento do fumante, não devendo ser encarada com criticismo, o qual
pode gerar grande frustação e baixa auto-estima. A maioria dos fumantes realiza de 3-
10 tentativas até obter a abstinência definitiva. A recaída é maior nos primeiros seis
meses, com ou sem uso de medicação. A TCC ajuda a identificar e lidar com os gatilhos
das fissuras. Quando motivado, deve ser encorajado a fazer novo tratamento,
considerando utilidade ou não do tratamento prévio. Pode-se tratar novamente com
mesma droga, combiná-la ou substituí-la. Quando não prontos para nova tentativa,
realizar intervenção breve para aumentar probabilidade de tentativas futuras.

Você também pode gostar