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11 MAQUINOFATURA A NOVA FORMA SOCIAL DA PRODUGAO DO CAPITAL NA ERA DO CAPITALISMO MANIPULATORIO Giovanni Alves* Ove deste texto é apresentar, numa perspectiva histérico-on- ‘tolégica, mudangas nas formas de produgao do capital que ocor- reram no tiltimo quartel do século XX com impactos nao apenas da organizagao do trabalho e tecnologias de produgdo, mas modo de vida social. Inovaremos conceitualmente expondo a categoria de “maquino- fatura” como modo de cooperagaéo complexa que sucede a grande in- dustria. No livro Trabalho e subjetividade (Alves, 2011), conseguimos nos aproximar da problematica da nova forma de produgao do capi- tal, sugerindo o que indicamos como sendo a constituigao de uma co- operacdo complexa ¢ salientando mais uma dimensio da reestrutura- ao produtiva do capital — as inovagdes sociometabélicas, depois das inovagoes tecnolégicas ¢ inovagdes organizacionais. Esta perspectiva de critica do toyotismo, que deu origem a concepgao da nova forma de produgao do capital na perspectiva histérica do capitalismo global, es- tava presente no livro Dimensdes da reestruturagdo produtiva (Alves, 2007). Entretanto, apenas no livro Dimensdes da precarizagdo do trabalho, de Alves (2013), conseguimos equacionar categorialmente © que se vislumbrava como algo de novo no plano da dinamica do capital no século XXI. Nosso objetivo é expor esta hipdtese buscando * Professor da Unesp-Marilia, livre-docente em Teoria Sociolégica, pesquisador do CNPq com bolsa produtividade. E-mail: giovanni.alves@uol.com.br: 268 GIOVANNI ALVES contribuir com as novas tarefas criticas da emancipagdo humana na perspectiva histérico-ontolégica lastreada em Marx ¢ Lukacs. Ao tratar da produgao da mais-valia relativa no capitulo 13 da Segao IV do livro I de O capital, Karl Marx nos apresenta as formas sociais da produgao do capital: manufatura e grande industria. Po- demos considerd-las formas sécio-histéricas no interior das quais se desenvolve 0 modo de produgao capitalista. Entretanto, manufatura e grande industria nao so apenas categorias criticas da economia politica do capital, mas categorias sociolégicas que implicam um determinado modo de controle sociometabélico que emerge com a civilizagao moderna do capital. Cada forma social de produgéo do capital exposta por Karl Marx corresponde a um modo de subsungao da forga de trabalho ao capital adequado ao modo de produgao de mais-valia propriamente dito, que, por conseguinte, diz respeito a uma determinada dialética hist6rica do metabolismo social. Por exemplo: enquanto a subsungao formal do trabalho ao capital corresponde 4 manufatura, a subsun- ¢ao real do trabalho ao capital corresponde a grande indistria. Na verdade, é com a grande industria que emerge 0 modo de produgao capitalista propriamente dito. Para ir além da mera critica da economia politica, desvelando em seu interior as dimensdes sociolégicas propriamente ditas do movi- mento do capital, deve-se aprender, em suas miltiplas determinagées, 0 padrdao sociometabélico que diz respeito a cada modo de produgdo de mais-valia ou modo de subsungao da forga de trabalho ao capital. A légica historica de Marx exposta em O capital é uma légica dialética, 0 que significa que o desenvolvimento das formas sociais no interior das quais ocorre a produgdo do capital, ndo ¢ meramente linear e continua. O que Marx expoe na Segdo IV de O capital nao sio apenas etapas da produgao do capital, onde, por exemplo, a grande industria se seguiria 4 manufatura de forma literalmente continua e consecutiva, Sob a grande indistria, embora a manufatura ndo esteja mais posta como forma predominante da produgdo social do capital, ela esta pressuposta — como pressuposto negado. A rigor, no plano MAQUINOFATURA 269 légico (e ontolégico), a grande industria contém a manufatura como pressuposto negado. Ou ainda: a grande industria conserva a manufa- tura num patamar superior. Deste modo, Marx (1996) utiliza, na Segao IV, do Livro 1, de O capital, um conjunto de pares dialéticos que explicam o desenvol- vimento hist6rico da civilizagio moderna do capital. Por exemplo, mais-valia absoluta e mais-valia relativa; subsun¢do formal e sub- suncao real do trabalho ao capital; manufatura e grande indistria. Enquanto pares dialéticos, eles incorporam em seu movimento, a logica categorial das determinagées reflexivas da sintaxe dialética (posigdo e pressuposigao) (Fausto, 1989). Portanto, podemos apreender, no plano da esséncia, o movimen- to contraditério da produgao do capital a partir das categorias de mo- do de produgao capitalista e formas histéricas de produgao social do capital, constituida pela manufatura, grande indistria e, como iremos sugerir, maquinofatura, com seus respectivos modos de controle do metabolismo social. Tratar dos modos de controle do metabolismo so- cial significa investigar, por um lado, as relagdes sociais de produgdo do homem com a Natureza, isto é, do homem com outros homens e do homem consigo mesmo; e, por outro lado, investigar a relagao do homem com a técnica como elemento mediador ineliminavel desta relagao homem-natureza. TRABALHO COMO METABOLISMO SOCIAL Diz Marx (1996, p. 7), logo no inicio do capitulo 13, do livro I, de O capital: “O revolucionamento do modo de produgao toma, na manufatura, como ponto de partida a forga de trabalho; na grande industria, o meio de trabalho”. Nesta pequena e interessante passagem, Marx (1996) salienta os “pontos de partida” dos revolucionamentos do modo de produgdo capitalista. Trata-se de uma colocagdo ontolégica da forma de ser da produgao social do capital. Como Marx e Engels (1998) salientaram em Manifesto comunista, de 1848, 0 modo de produgao capitalista é

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