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CONSIDERAÇÕES SOBRE VALÉRY, HERMANN E LANDOWSKI

Samantha Borges

Paul Valéry, em seu “Discurso sobre a estética”, discorre, em especial, sobre a


dificuldade de conceituar o tema. Segundo ele, a estética nasce a partir de uma
curiosidade filosófica, além de manter ligações com a metafísica. Em geral, apresenta-se
de maneira paradoxal, já que mesmo que se tente racionalizá-la, tornando-a uma
ciência, a dificuldade está justamente no fato de que ela contém em si elementos difíceis
de serem teorizados, como o sentimento de prazer, as sensações e os fenômenos
causados diante de algo tido como Belo. Valéry fala de um prazer que desperta no
receptor de um objeto a ilusão de compreensão do mesmo, o que acaba incitando o
desejo no filósofo de categorizar o que está acontecendo, de teorizar, nominar, fechá-lo
em um conceito. O prazer, no entanto, dificilmente irá caber em uma ideia fechada, com
começo e fim. Como destaca Valéry “o prazer, enfim, só existe no instante e nada mais
individual, de mais incerto, de mais incomunicável” (2002, p. 23).
Entretanto, o autor destaca que tratar a estética pelo viés da metafísica, termina
por reduzi-la a concepção ligada apenas a fenômenos e sensações, afastando-a da
construção de uma visão intelectualizada de si. Em contrapartida, uma “Ciência do
Belo”, também não se sustenta, já que existe uma diversidade monstruosa de belezas
produzidas no mundo. Logo a ideia de Belo, pode muito bem variar de país para país, de
grupo social para grupo social, geração a geração, e assim por diante. Chega-se aí, a
compreensão de que a estética pode estar vinculada a “um efeito mais desejável”, ou
seja, que o objeto se apresente em harmonia àquilo que eu espero que seja apresentado
por ele.
Logo estamos diante de uma constante ideia de paradoxo e contraste. De um
lado a teoria da estética busca um jogo em que se priorize a razão, a ordem, a harmonia,
a lógica. Por outro lado, se está diante de algo que transcende tais conceitos, pois
trabalha com sensações, com prazeres, com efeitos e que, por estarem ligados à emoção,
variam e se particularizam de pessoa para pessoa. Esse painel de constante contradição,
também alimentaria justamente o artista, que “espera uma resposta absolutamente
precisa (já que ela deve engendrar um ato de execução) a uma questão essencialmente
incompleta: deseja o efeito que será produzido nele por aquilo que dele pode nascer”
(VALÉRY, 2002, p. 30). E para Valéry, talvez a Arte seja feita justamente da
combinação desses elementos contraditórios, que mesmo que não sejam bem
compreendidos, acabam por promover algumas vezes a produção de objetos advindos
do controle, pelo artista, de suas arbitrariedades, demonstrando-se como fruto da
“variedade e indeterminação de todo possível que está em nós” (ibid, p. 34).
Por sua vez, Nadja Hermann, atualiza algumas ideias levantadas por Valéry.
Segundo a autora, que também faz o resgate do constante entrave na compreensão da
estética - relacionado a mantê-la apenas no terreno do sensível ou tomá-la apenas dentro
de um conceito-, o discurso contemporâneo sobre a estética se mostra voltado mais para
a ideia das diferentes sensibilidades que atuam sobre os indivíduos, do que para a
teorização da arte, refletindo-se até mesmo na construção de uma “atualidade do
estético” (Welsch, 1993) que se refere a uma tendência em que tudo se configura
esteticamente. Assim como Valéry fala sobre um paradoxo entre a conceituação da
estética e sua compreensão no terreno das sensações, Hermann levanta a necessidade de,
diante de uma sociedade contemporânea estetizada, existir uma experiência habitual,
para que se construa um contraponto entre o que é a arte e o que é a realidade. A autora
destaca as ideias de Adorno – e também de autores como Bohrer que se colocam
contrários a aproximação entre ética e estética -, para o qual a experiênca estética não se
mantém fixa ao seu parâmetro apenas racional, mas que, no momento do estranhamento
constrói uma ligação entre ética e estética. Para a autora é possível encontrar um diálogo
construtivo entre as duas áreas do saber, no momento em que a estética, que eleva o
particular, torna-se complementar à ética, geralmente abarcadora de preceitos mais
universais e rígidos. Da mesma forma, e constituindo assim uma via de mão-dupla, a
ética oferece à estética uma orientação racional frente aos possíveis abusos de um
mundo fundamentado apenas na estética.
Hermann ainda destaca que a estética desempenha um papel importante no
mundo atual, no momento em que dispõem ao indivíduo algo diferente de sua rotina,
logo o coloca diante do novo, do diferente, do estranho, o que acaba por contribuir na
relação e compreensão do homem com a alteridade. E sobre alteridade que o texto de
Eric Landowski, “Presenças do outro – Ensaios de sociossemiótica” se fundamenta. O
autor discorre sobre a importância e as problemáticas da relação do homem com o
outro, em um jogo em que a construção da identidade de um sujeito depende
diretamente dessa relação, pois eu só me constituo enquanto houver um outro que me
contraponha. Além disso, também Landowski traz à tona a necessidade de se ter contato
com o diferente, com o estranho, em especial no momento em que damos ao mundo, à
vida e a nós mesmos, algum sentido, algum significado. Para Landowski é o inesperado
que, ao surgir, quebra o curso normal das coisas e lhe confere esse efeito de
significação. Dessa forma, a alteridade se apresenta em diferentes personagens: o
estrangeiro, o dandi, o urso, entre várias outras categorizações descritas por Landowski.
E é nessa interação social, em que personagens se mostram de maneira particular, mas
sem deixar de conter em si os efeitos de sua relação com o mundo e com o outro, que a
ética se faz importante, no momento em que aponta diretrizes morais aos personagens
em questão. Não obstante, a estética também entra em cena, em um mundo em que
padrões e parâmetros são altamente estetizados e dessa forma influenciam na “atuação”
dos indivíduos frente à sociedade e a si mesmos.

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