do Movimento
Diagnóstico e Tratamento
lu me
Vo
1
Egberto Reis Barbosa
Henrique Ballalai Ferraz
Vitor Tumas
e colaboradores
Transtornos
do Movimento
Diagnóstico e Tratamento
Bibliografia.
Vários colaboradores.
ISBN 978-85-62477-32-4
CDD-616.8
13-06575 NLM-WL 100
Diretor Executivo: Marcelo Valente © 2013 Editora OMNIFARMA Ltda. - Todos os direitos reservados
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Thaiane Rodrigues quaisquer outros. O conteúdo deste material é de inteira res-
Coordenador de Produção: Edson Honorio ponsabilidade dos autores. Código da Publicação: 3735A.2013
Diagramação: Fernando F. dos Santos
Revisão: Thais Naufel e Patrizia Zagni Distribuição exclusiva à classe médica.
PREFÁCIO
O
s conhecimentos dos transtornos do movimento na área de Neurologia
apresentaram um avanço exponencial. Esse progresso deve ser credita-
do especialmente às novas informações da Genética, Neurofisiologia e
Neuroquímica, sem mencionar as novas técnicas de Neuroimagem. Deve-se ainda
ressaltar que com o aumento da longevidade da população, a prevalência de várias
das doenças desse grupo de afecções, particularmente a doença de Parkinson, tem
crescido continuamente.
Em todo o mundo, esse avanço tem atraído neurologistas interessados nessa área.
Em nosso país, não foi diferente e, ao longo do tempo, foram constituindo-se, no
ambiente universitário, grupos de estudo voltados a esse campo do conhecimento.
Este livro, elaborado por iniciativa do Departamento Científico de Transtor-
nos do Movimento da Academia Brasileira de Neurologia, teve como objetivo criar
um compêndio de conteúdo abrangente com a participação dos pesquisadores
brasileiros de maior relevância nessa subespecialidade. Temos certeza de que será
uma fonte de consulta de grande utilidade na prática do dia a dia dos neurologistas
brasileiros.
Coordenadores
Egberto Reis Barbosa. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Coordenador do De-
partamento Científico de Transtornos do Movimento da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Livre
Docente do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da USP - São Paulo. Coordenador do
Grupo de Distúrbios do Movimento da Divisão de Neurologia do Hospital das Clínicas da FM-USP - São Paulo.
Vitor Tumas. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Secretário do Departamento Cien-
tífico de Transtornos do Movimento da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Doutor do Departa-
mento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
USP. Chefe do Setor de Distúrbios do Movimento e Neurologia Comportamental - Ribeirão Preto-SP.
colaboradores
Alexandre Aluízio Costa Machado. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Mé-
dico Assistente Doutor do Ambulatório de Transtornos do Movimento da Divisão de Neurologia do Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP - São Paulo.
Ana Lucia Zuma de Rosso. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médica Neu-
rologista, Responsável pelo Ambulatório de Distúrbios do Movimento do Serviço de Neurologia Prof. Sérgio
Novis, Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ.
André Carvalho Felício. Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Médico Doutor
do Setor de Transtornos do Movimento da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina da
UNIFESP. Clinical Fellow in Neurology, University of British Columbia, Canadá.
Carlos R. de Melo Rieder. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Ad-
junto de Neurologia da Universidade Federal Ciências da Saúde de Porto Alegre. Coordenador da Clínica de
Movimentos Anormais do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Chien Hsin Fan. Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista e Fisiatra, Dou-
tora, Colaboradora do Grupo de Distúrbios do Movimento da Divisão de Neurologia do Hospital das Clínicas
da FM-USP de São Paulo.
Débora Palma Maia. Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Médica Assistente da
Clínica de Distúrbios de Movimentos, Serviço de Neurologia, Departamento de Clínica Médica da Univer-
sidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em Saúde da Criança e do Adolescente pela FM - UFMG.
Delson José da Silva. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Coordenador do Nú-
cleo de Neurociências e do Centro de Referência em Transtornos do Movimento do Hospital das Clínicas da
Universidade Federal de Goiás. Diretor do Instituto Integrado de Neurociências - IINEURO de Goiânia - GO.
Denise Hack Nicaretta. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médica Neurologista
da 25ª Enfermaria da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Responsável pelo Ambulatório de
Distúrbios do Movimento Prof. Sérgio Novis da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro.
Hélio Afonso Ghizoni Teive. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor
Adjunto e Chefe do Serviço de Neurologia da Universidade Federal do Paraná. Coordenador do Setor de
Distúrbios do Movimento, Hospital de Clínicas da UFPR. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em
Medicina Interna da UFPR.
João Carlos Papaterra Limongi. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médico
Assistente Doutor do Ambulatório de Transtornos do Movimento da Divisão de Neurologia do Hospital das
Clínicas da FM-USP - São Paulo.
José Luiz Pedroso. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médico do Setor de
Neurologia Geral e Ataxias da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP.
Laura Silveira-Moriyama. Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Reta Lila Weston
Institute of Neurological Studies, UCL Institute of Neurology, Londres, Reino Unido. Neurologista do Serviço
de Neurologia Infantil do Departamento de Neurologia da Universidade de Campinas (UNICAMP).
Luiz Augusto Franco de Andrade. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Pro-
fessor Livre Docente de Neurologia. Médico Neurologista do Hospital Israelita Albert Einstein.
Mônica Santoro Haddad. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médica Assis-
tente do Ambulatório de Transtornos do Movimento da Divisão de Neurologia do Hospital das Clínicas da
FM-USP de São Paulo.
Nasser Allam. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Coordenador do Centro de Re-
ferência de Parkinson e Transtornos do Movimento da Secretaria de Saúde do DF. Pesquisador Adjunto do
Laboratório de Neurociências e Comportamento da Universidade de Brasília.
Raphael Doyle Maia. Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Médico da Clínica de
Distúrbios de Movimentos, Serviço de Neurologia, Departamento de Clínica Médica da Universidade Federal
de Minas Gerais (UFMG).
Renato Puppi Munhoz. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor de Neu-
rologia do Hospital do Cajuru da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Associação Paranaense dos
Portadores de Parkinsonismo. Médico do Serviço de Distúrbios do Movimento do Serviço de Neurologia da
Universidade Federal do Paraná.
Roberta Arb Saba. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médica do Setor de
Transtornos do Movimento da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP. Médica
Assistente do Serviço de Neurologia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Francisco
Morato de Oliveira.
Roberto César do Prado. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor As-
sociado de Neurologia da Universidade Federal de Sergipe. Coordenador do Ambulatório de Parkinson e
Distúrbios do Movimento do HU da Universidade Federal de Sergipe.
Sarah Camargos. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professora Adjunta do Setor
de Distúrbios de Movimentos, Serviço de Neurologia, Departamento de Clínica Médica da Universidade
Federal de Minas Gerais Clínica de Distúrbios do Movimento, Serviço de Neurologia, Departamento de
Clínica Médica da UFMG.
Sonia Maria César de Azevedo Silva. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia.
Doutora do Setor de Transtornos do Movimento da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina
da UNIFESP. Assistente do Serviço de Neurologia Clínica e Chefe do Ambulatório de Transtornos do Movi-
mento do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo Francisco Morato de Oliveira.
Vanderci Borges. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professora Afiliada Doutora
da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. Chefe do
Setor de Transtornos do Movimento da Disciplina de Neurologia da EPM/UNIFESP.
Ylmar Corrêa Neto. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista, Professor
Adjunto do Departamento de Clínica Médica da Universidade Federal de Santa Catarina.
ÍNDICE
O
termo núcleos da base ou “gânglios da base” é utilizado para designar um
grupo de núcleos de substância cinzenta localizados na região profunda
do encéfalo ou, mais especificamente, na região subcortical-basal do en-
céfalo. Esses núcleos estão interconectados e, assim, formam um sistema funcional
que foi originalmente denominado como “sistema extrapiramidal”. Tal denomina-
ção, originalmente elaborada há muito tempo, referia-se à observação de que lesões
estruturais que acometiam essas estruturas frequentemente produziam transtor-
nos da motricidade1-3. Isso levou à especulação de que os núcleos basais seriam os
responsáveis pelo principal processamento motor paralelo ao “sistema piramidal”.
Entretanto, o tempo e o avanço no conhecimento se incumbiram de erguer críticas
à conveniência dessa designação, já que hoje reconhecemos que os núcleos da base
participam de outras funções complexas além da motricidade e que esse sistema é
apenas um dos que participam do controle “extrapiramidal” do movimento.
Aspectos anatômicos
São quatro os principais núcleos que compõem o sistema dos núcleos da base4
(Figura 1):
13
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
Caudado
putâmen
globo pálido
14
fisio lo gi a dos núcleo s da bas e | capí tulo 1
Aspectos funcionais
A descoberta da deficiência de dopamina no estriado de pacientes com doença de
Parkinson (DP) foi o marco que desviou definitivamente os olhares para os núcleos
da base, que até então eram considerados núcleos de função pouco conhecida e
descritos como os “porões escuros do cérebro”5. Entretanto, desde muito tempo
antes disso, reconhecia-se a associação entre certos transtornos motores, chamados
de distúrbios do movimento, e lesões e anormalidades que acometiam essas estru-
turas. Os distúrbios do movimento se caracterizam por anomalias no movimento
sem paralisia, e são classificados em dois tipos essenciais de manifestação clínica: as
síndromes hipercinéticas e a síndrome hipocinética6. As síndromes hipercinéticas
são caracterizadas pelo aparecimento de movimentos anormais involuntários que
podem ser classificados em diferentes formas de apresentação clínica, como: coreia,
balismo, distonia, atetose, tremor, mioclonia, tique, entre outras. Cada um desses
tipos de movimentos involuntários tem características específicas que permitem a
sua classificação clínica.
Já a síndrome hipocinética é caracterizada por uma redução global nos movi-
mentos que se manifesta na forma de lentidão (bradicinesia), dificuldade para iniciar
os movimentos (acinesia) e manter sua amplitude, e uma redução nos movimentos
espontâneos corporais. Na síndrome hipocinética também ocorrem mudanças no
controle postural e há rigidez muscular. O protótipo da síndrome hipocinética é a
síndrome parkinsoniana.
Estudar as consequências de lesões em uma estrutura do sistema nervoso cen-
tral geralmente não é a melhor forma de se estudar a fisiologia de um sistema. O
sinal ou sintoma observado pode ser resultado direto da perda de função da área
lesada, mas pode também ser manifestação da liberação ou inibição de outra área
controlada pela estrutura que sofre a lesão. Também é raro encontrar situações
clínicas em que a lesão esteja restrita a uma só estrutura nervosa. De qualquer for-
ma, muito pode ser aprendido com a observação crítica das consequências de le-
sões no sistema nervoso central2. Por exemplo, Samuel Alexander Kinnier-Wilson,
em 1912, descreveu que a “degeneração hepatolenticular”, mais tarde chamada de
doença de Wilson, caracterizava-se especialmente pela degeneração do putâmen e
globos pálidos, e associou essas alterações ao aparecimento de tremores, distonia e
distúrbios da marcha7. Descrições de efeitos clínicos de lesões afetando os gânglios
da base apontam a distonia, seguida da coreia, como o distúrbio do movimento
mais frequentemente observado, especialmente quando a lesão acomete o putâ-
men2. O parkinsonismo é mais observado quando há lesões bilaterais acometendo
os núcleos lenticulados, ou seja, o putâmen e o globo pálido2. Por outro lado, as le-
sões que afetam o núcleo caudado quase nunca produzem distúrbios motores, mas
sim alterações comportamentais do tipo apatia (perda da iniciativa, das emoções e
pensamentos espontâneos) ou do tipo desinibição do comportamento2. Lesões que
15
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
Primeiro conceito: “os núcleos da base não têm conexões diretas com o neurônio motor
inferior”. Diferente de outros sistemas que participam do controle motor, os núcleos
da base não têm conexões diretas com a medula espinhal; assim, eles não se conec-
tam diretamente com os motoneurônios. Como foi dito anteriormente, os núcleos
da base têm importantes conexões bidirecionais com o córtex cerebral. Eles rece-
bem projeções ou aferências provenientes de várias regiões do córtex cerebral, no
caso da alça motora, especialmente que venham da área pré-central localizada no
lobo frontal, mais especificamente da área motora suplementar, da área motora e da
área pré-motora, mas também de áreas sensoriais pós-centrais. Essas informações
corticais transitam através dos núcleos basais e depois são tramsmitidas ao tálamo,
que as reenvia de volta ao córtex cerebral (Figura 2)2,3. Ao retornarem ao córtex cere-
bral, as aferências provenientes dos núcleos da base são dirigidas mais especialmen-
te às áreas pré-centrais que interferem com o controle do movimento. Isso funciona
como se houvesse um processo de focalização das informações. Dessa forma, os
núcleos da base influenciam o movimento interferindo sobre as áreas corticais que
diretamente controlam os neurônios motores superiores da via motora. De maneira
16
fisio lo gi a dos núcleo s da bas e | capí tulo 1
Glânglios basais
frontal e participa do controle do mo-
vimento ocular, e as alças que focam as Alça motora
eferências na porção dorsolateral do cór-
tex pré-frontal, no córtex órbito-frontal,
e no giro do cíngulo, que participam do
controle cognitivo e comportamental.
Terceiro conceito: “o GPi e a SNr são a origem da maioria das eferências que partem
dos núcleos da base e se dirigem ao tálamo”. Isso significa dizer que o GPi e a SNr
são os principais núcleos de saída das informações que transitaram pelos núcleos da
base4,13. Essas eferências que partem dos gânglios da base passam pelo tálamo e de-
17
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
Quarto conceito: “Há duas vias principais pelas quais as informações atravessam os
núcleos da base: a via direta e a via indireta” (Figura 3). Seriam, portanto, duas vias
principais que os estímulos nervosos percorreriam desde o núcleo de entrada (es-
CÓRTEX
AMS/APM
ESTRIADO
tálamo
GPe
SNc
via excitatória
NST via inibitória
GPi/SNr
Gpe: globo pálido externo; NST: núcleo subtalâmico; SNc: substância negra “pars compacta”; GPi/SNr: globo pálido
interno/substância negra “pars reticulata”.
Figura 3. Esquema de funcionamento dos gânglios da base, representando a via direta e indireta, e também a
via nigroestriatal.
18
fisio lo gi a dos núcleo s da bas e | capí tulo 1
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trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
20
fisio lo gi a dos núcleo s da bas e | capí tulo 1
atividade anormal, como ocorre na DP, pode ser mais prejudicial ao sistema que a
eliminação dos núcleos da base desse amplo e complexo circuito15,17. O circuito mo-
tor dos núcleos da base funciona facilitando a execução automática de sequências
aprendidas de movimento que são geradas no córtex cerebral14. Mas as evidências
mais recentes sugerem que os núcleos basais funcionam como um sistema altamen-
te eficiente que modula o desempenho motor de acordo com resultados positivos
e retornos motivacionais, além de possuir uma importante função no aprendizado
motor14,18,19.
Referências
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21
2
Pa rkinsonis m o genét ico
Patrícia Maria de Carvalho Aguiar
2
O
ano de 1997 representou um marco importante no estudo da doença de
Parkinson (DP) pois, pela primeira vez, identificou-se um gene como fator
causal de uma forma hereditária da doença1. A descoberta de mutações no
gene da alfa sinucleína (SNCA) na DP, muito embora estas sejam raras, ainda hoje
vem revolucionando nosso conhecimento sobre a fisiopatologia da doença.
A DP é considerada uma doença de padrão complexo, na qual fatores genéticos,
epigenéticos e ambientais contribuem para o seu aparecimento. A grande maioria
dos casos é esporádica; cerca de 20% dos pacientes apresentam história familiar po-
sitiva e, ainda assim, apenas uma minoria apresenta herança mendeliana clássica2.
No período de pouco mais de uma década e meia desde a primeira descoberta,
inúmeros loci foram definidos e diversos genes foram descobertos (Tabela 1). Em
termos de nomenclatura, a classificação ainda é confusa e necessita de revisão, pois
alguns loci não foram confirmados e há genes descobertos ainda sem atribuição de
nomenclatura para o lócus3. Por vezes o símbolo do gene remete ao seu lócus, ou-
tras vezes pode fazer referência à proteína que ele codifica. Em muitas vezes, a clas-
sificação tem base fenomenológica. No entanto, há vários casos em que mutações,
achados anatomopatológicos (nem sempre consistentes nas formas hereditárias),
de neuroimagem ou eletrofisiológicos foram utilizados para a classificação, gerando
uma grande dificuldade de diagnóstico diferencial para o clínico que lida com esses
pacientes no seu dia a dia. Mesmo nas formas monogênicas, o espectro clínico e
anatomopatológico pode ser amplamente variável. Neste capítulo utilizaremos a
nomenclatura vigente, tendo em mente que nem sempre é adequada e que, a qual-
quer momento, poderá vir a ser modificada com uma revisão mais ampla, mas que
está fora do nosso escopo. O termo “parkinsonismo clássico” será utilizado para as
condições onde predominam os sinais cardinais da DP (tremor, rigidez, bradicine-
sia) com boa resposta à levodopa. O termo “parkinsonismo” será utilizado quando
houver algum sinal de parkinsonismo, porém com outros sinais atípicos.
A seguir apresentaremos algumas das formas geneticamente definidas da DP, e
nos ateremos particularmente àquelas descobertas que foram replicadas na litera-
tura e às alterações genéticas mais frequentes, dando ênfase aos aspectos clínicos.
25
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
26
Parki nso ni sm o g e néti co | capí tulo 2
sômica dominante (AD) com penetrância incompleta (estimada em 85% nessas fa-
mílias). A faixa etária para o início da doença é ampla, mas boa parte dos casos pode
começar precocemente, antes dos 50 anos. Nessas famílias inicialmente estudadas,
o quadro era de parkinsonismo clássico, com boa resposta à levodopa, porém com
rápida evolução do diagnóstico até o óbito (aproximadamente 10 anos). O exame
anatomopatológico de dois membros, realizados antes da descoberta do gene, reve-
lou patologia típica da DP com a presença de corpos de Lewy4.
Essas mutações de ponto são raras nas pessoas com DP, porém o achado revo-
lucionou o nosso conhecimento sobre a fisiopatologia da doença e hoje sabemos
que a alfa sinucleína é um dos principais componentes dos corpos de Lewy5. Esses
pacientes podem cursar de forma atípica, apresentando uma série de outros dis-
túrbios, como disautonomia, hipoventilação e mioclonias6. A mutação E46K, por
exemplo, foi associada à demência com corpos de Lewy em uma família espanhola7.
Alguns anos depois da descoberta inicial, verificou-se que efeitos de dosagem
gênica do SNCA (duplicações ou triplicações do gene, sendo esta inicialmente de-
nominada lócus PARK4) também poderiam estar associados à DP. O lócus PARK4
foi erroneamente atribuído a uma dessas famílias e, posteriormente, verificou-se
que o gene SNCA apresentava alteração no número de cópias nos pacientes, incor-
porando-se esse achado ao já conhecido lócus PARK1. No entanto, não podemos
desconsiderar que outros genes nessa mesma região cromossômica estão com o
número de cópias alterado, e é precipitado atribuir o fenótipo desses indivíduos
exclusivamente aos efeitos de dosagem do gene SNCA, uma vez que essa região
possui cerca de dezessete genes. O efeito de dosagem gênica interfere no fenótipo;
boa parte dos pacientes com duplicações apresentam a forma clássica da DP, e a
penetrância pode estar reduzida a 33% nessas famílias. Casos de triplicação foram
associados a parkinsonismo de início precoce rapidamente progressivo, com de-
mência e disautonomia8.
Ainda que mutações no gene SNCA sejam raras, o fato da proteína alfa sinu-
cleína ser um componente dos corpos de Lewy, o que é um marco clássico da DP
idiopática, pode vir a ter implicações terapêuticas mesmo nas formas de DP sem
mutação no SNCA. Inúmeras pesquisas vêm sendo desenvolvidas para identificar
todos os substratos envolvidos com a alfa sinucleína na tentativa de descobrir pos-
síveis alvos terapêuticos.
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trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
28
Parki nso ni sm o g e néti co | capí tulo 2
dois alelos) ou com mutação em um único alelo. Na verdade, esses dois tipos de
mutação são muito mais comuns entre parkinsonianos do que em casos homozi-
góticos16. Vários pacientes heterozigotos, compostos ou não, apresentam idade de
início bem mais tardia do que é observado nas formas autossômicas recessivas, o
que favorece uma penetrância de idade dependente nessas formas. Mutações em
um único alelo poderiam funcionar como fatores de suscetibilidade à DP. Estudos
de neuroimagem mostram alterações pré-clínicas em portadores de mutações he-
terozigotas, e estudos anatomopatológicos revelaram perda neuronal na substância
negra no heterozigoto16. É provável que esse gene tenha penetrância completa nas
formas homozigóticas e penetrância reduzida entre os heterozigotos, estando sob
a influência de outros fatores genéticos, epigenéticos ou ambientais para que as
alterações clínicas se manifestem.
Genes de suscetibilidade
Diversos estudos de associação genômica ampla (GWAS) já foram realizados envol-
vendo milhares de pacientes com DP, na tentativa de identificar fatores genéticos
29
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
que contribuam para o risco de desenvolver essa doença. Muitos desses estudos
tiveram suas metodologias questionadas, e vários não tiveram seus resultados re-
plicados20. Porém, alguns genes são mencionados de forma mais consistente nesses
estudos, e um deles é o GBA, que codifica a enzima glucocerebrosidase. Mutações
em ambos os alelos levam à doença de Gaucher. Mutações em um único alelo desse
gene estão associadas a um risco aumentado para DP. Um estudo europeu demons-
trou que a penetrância aumenta com a idade, podendo chegar a 30% aos 80 anos,
sugerindo que o GBA poderia ser um gene dominante de penetrância reduzida e
um fator causal da DP, não apenas um fator de risco20. Outros genes como SNCA
e MAPT são frequentemente confirmados como fatores de riscos nesses grandes
estudos. Conforme já mencionamos, sabemos que mutações no SNCA são raras;
porém, polimorfismos presentes na região promotora desse gene vêm sendo rela-
cionados a um risco aumentado para DP20.
Muito embora os GWAS estejam cada vez mais refinados e apresentando dados
consistentes, é importante enfatizar que esses dados não devem ser levados em con-
ta quando se trata de medicina personalizada, na qual o risco para cada indivíduo
deve ser avaliado cuidadosamente, caso a caso.
Testes genéticos
Em qualquer situação na área médica, devemos seguir o princípio clássico “primum
nil nocere”, ou seja, não causar danos. A indicação de testes genéticos, particular-
mente para doenças nas quais não podemos intervir profilaticamente ou de forma
curativa, é sempre uma questão delicada. Devemos ter em mente que o resultado
do teste de um único indivíduo pode vir a interferir de forma marcante na sua vida
e na de seus familiares, sintomáticos ou não. Dessa forma, a solicitação de um teste
genético jamais deve ser feita sem que antes haja uma clara conscientização sobre o
significado de um teste negativo ou positivo, qual será a utilidade dessa informação
e quais os potenciais danos da revelação. Isso tudo é feito através do processo de
aconselhamento genético, que não se limita a uma única visita e, dependendo da
situação, deve ser manejado por uma equipe multidisciplinar, incluindo médico,
geneticista, psicólogo, psiquiatra e assistente social. Infelizmente, grande parte dos
centros do Brasil ainda não dispõe dessa estrutura, o que requer cautela redobrada
por parte do profissional médico ao cogitar fazer o pedido de um teste genético.
Para a DP, ainda não dispomos de nenhuma intervenção terapêutica baseada
no resultado de testes genéticos. Na prática, os testes são indicados principalmente
por interesse científico, e não estão disponíveis na maior parte dos laboratórios
privados. Tecnicamente, os testes são trabalhosos, e testar um painel de genes que
forneça uma cobertura mínima razoável para a identificação das mutações mais co-
nhecidas implicaria em um alto custo para o paciente, com o agravante de que um
resultado negativo não nos permitiria excluir com certeza um fator genético. Além
30
Parki nso ni sm o g e néti co | capí tulo 2
disso, muitos desses genes têm penetrância incompleta, e não é possível prever com
exatidão se o portador assintomático de uma mutação desenvolverá DP no futuro.
Pacientes com DP de início precoce e/ou com história familiar positiva estão
entre aqueles nos quais há maior chance de encontrarmos alterações genéticas. Nos
casos familiares de início precoce com história de consanguinidade, testamos pre-
ferencialmente o gene PARK2. Nos casos cuja história familiar sugere herança AD,
testamos preferencialmente o gene LRRK2.
Em alguns países há testes disponíveis comercialmente para alguns genes, in-
cluindo SNCA, PARK2, PINK1, DJ1,LRRK2 e GBA. Algumas empresas vêm ofere-
cendo testes com chips de DNA, a um custo bastante acessível, incluindo um vasto
painel de variantes genéticas que vão desde a calvície até a doença de Alzheimer. É
preciso ter muita cautela na interpretação desses resultados, pois inúmeras doenças
são de padrão complexo, não sendo possível inferir o risco de vir a desenvolvê-las
tendo apenas esses testes como base.
Na prática, temos indicado os testes apenas para indivíduos sintomáticos que
participam de protocolos de pesquisa, como DP de início precoce ou história fa-
miliar positiva. No casos esporádicos com início após os 50 anos, as chances de
identificarmos uma mutação são pequenas. Familiares assintomáticos maiores de
idade também podem ser submetidos aos testes, porém o acesso aos resultados
é fornecido apenas mediante aconselhamento genético e, na nossa experiência, a
maioria deles não deseja ter acesso ao resultado, uma vez que se conscientizam so-
bre o significado das informações ao longo do processo de aconselhamento.
Perspectivas
O aparecimento de novas tecnologias, como o sequenciamento em larga escala que
permite o estudo do genoma completo em poucos dias, bem como o estudo do
transcriptoma, acompanhado da diminuição dos custos, fará com que inúmeros
genes associados à DP e a outras doenças sejam identificados num curto período.
Identificaremos variantes comuns e variantes raras em diversos genes, variações de
expressão gênica e seus elementos reguladores. Teremos que lidar com uma imensa
quantidade de dados novos e saber exatamente o que eles significam. A interpreta-
ção desses dados exigirá, cada vez mais, um esforço conjunto de clínicos, geneticis-
tas, epidemiologistas e bioinformatas, para que saibamos utilizar essas informações
da melhor forma possível.
Vivemos um momento extremamente enriquecedor, pois nos últimos 15 anos
nosso conhecimento avançou exponencialmente, muito mais do que em quase dois
séculos desde a primeira publicação de James Parkinson, em 1817, fazendo a carac-
terização clínica da DP. Nosso arsenal terapêutico para o tratamento da DP ainda é
extremamente limitado, e não poderia ser de outra forma, uma vez que, até pouco
tempo, conhecíamos quase nada sobre as bases moleculares da doença. O estudo
31
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
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3
Pa rkinsonis mo atípico
Henrique Ballalai F erraz
Lorena Broseghini Barcelos
3
P
arkinsonismo atípico refere-se a um conjunto de doenças que se apresentam
com manifestações clínicas de uma síndrome parkinsoniana associada a ou-
tros sinais e sintomas distintivos da doença de Parkinson (DP). A partir do
início do século XX, reconheceu-se que um quadro clínico semelhante ao da DP
pudesse estar presente nos pacientes com encefalite de Von Economo, intoxicação
por manganês e por monóxido de carbono. Entretanto, foi a partir da década de
1960 que foram identificadas formas de parkinsonismo degenerativo com caracte-
rísticas anatomopatológicas peculiares e diferentes da DP. Em 1960, descreveu-se
parkinsonismo associado à hipotensão ortostática (síndrome de Shy-Drager); em
1961, parkinsonismo com degeneração neuronal em putâmen e substância negra
(degeneração estriatonigral); em 1964, a paralisia supranuclear progressiva; e, em
1968, a degeneração corticodentadonigral com acromasia neuronal, hoje conhecida
como degeneração corticobasal1.
Parkinsonismo atípico também é conhecido como o grupo de doenças “Parkin-
son-plus”, já que ao parkinsonismo somam-se outras manifestações neurológicas,
e o termo é uma oposição ao chamado parkinsonismo típico (que é de fato a DP),
pois os diagnósticos são frequentemente confundidos entre si. Ambos tendem a
acometer indivíduos depois dos 50 anos de idade, têm um curso progressivo e, na
fase inicial, as manifestações clínicas são muitas vezes indistinguíveis. No Brasil, o
parkinsonismo atípico responde por cerca de 10% do total dos parkinsonianos em
serviços terciários de transtornos do movimento, o que parece não ser diferente
do que se observa no resto do mundo2. Na população geral, entretanto, os atípi-
cos devem responder por uma proporção menor no universo dos pacientes com
parkinsonismo3.
O grupo denominado de parkinsonismo atípico é constituído pelas seguintes
doenças: paralisia supranuclear progressiva, atrofia de múltiplos sistemas, degene-
ração corticobasal e demência por corpúsculos de Lewy. Do ponto de vista etiopa-
togênico, a atrofia de múltiplos sistemas compartilha com a DP e a demência com
corpúsculos de Lewy o fato de estarem associadas ao acúmulo de alfa-sinucleína in-
35
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
tracelular. Por outro lado, as demais formas de parkinsonismo atípico estão associa-
das à disfunção da proteína tau intracelular. Por isso, a atrofia de múltiplos sistemas
e a demência por corpúsculos de Lewy são consideradas como “sinucleinopatias”,
enquanto as outras, como “taupatias”.
Anatomia patológica. O exame post-mortem dos pacientes com AMS revela uma per-
da neuronal envolvendo a substância negra, putâmen, caudado (particularmente na
AMS-P) e núcleos pontinos, células de Purkinje do cerebelo e núcleo olivar inferior
(na AMS-C). Também o locus ceruleus e a coluna intermédio-lateral da medula es-
pinhal estão acometidos nos dois subtipos. Ao lado da perda neuronal, ocorre o que
se considera a característica principal na AMS: a presença dos corpos de inclusão
gliais. Esses corpúsculos são encontrados no citoplasma da oligodendróglia da área
acometida e contêm uma grande quantidade de alfa-sinucleína hiperfosforilada e
outras proteínas.
Quadro clínico. Tipicamente, na AMS-P, o quadro tem início com rigidez muscu-
lar associado à bradicinesia com acometimento bilateral e simétrico não acompa-
nhado de tremor de repouso. Nos primeiros meses, já é frequente haver alterações
no equilíbrio e na postura e a tendência à quedas pode ser importante. Os sinais
de disfunção autonômica podem anteceder em meses ou anos os sinais motores,
mas raramente são detectados na anamnese e no exame físico rotineiro ou, quando
são, o clínico menos experiente não relaciona a disautonomia ao quadro motor do
paciente6. Manifestações cerebelares na AMS-P podem nunca aparecer ou podem
ficar mais evidentes apenas nas fases avançadas da doença. Dentro do quadro motor
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Tratamento. Não há tratamento específico para a AMS, e qualquer das medidas tem
efeito apenas paliativo. O uso de levodopa pode resultar em alguma melhora das
manifestações parkinsonianas, especialmente nas fases iniciais da doença9. Entre
30% e 50% dos pacientes podem apresentar melhora, mas a duração dessa resposta
não costuma exceder mais do que dois anos. Pacientes que não respondem à levo-
dopa não devem receber agonistas dopaminérgicos, pois esse tipo de medicação
pode agravar a hipotensão ortostática.
Nos casos com hipotensão ortostática sintomática, prescreve-se o acetato de
fludrocortisona na dose de 0,1 mg a 0,2 mg ao dia. Como alternativa à fludrocorti-
sona, pode-se utilizar a pseudoefedrina e a midodrina, esta não disponível no Brasil.
O uso de antidepressivos (tricíclicos ou inibidores seletivos de recaptura da se-
rotonina) pode ser prescritos para os pacientes com transtornos do humor, assim
como oxibutinina para sintomas de retenção urinária e sildenafila para disfunção
erétil nos homens.
Medidas de reabilitação (fisioterapia e fonoterapia) são fundamentais para mui-
tos pacientes, pois permitem que eles permaneçam independentes por mais tempo.
Quadro clínico. A PSP é caracterizada por uma paralisia do olhar vertical com saca-
das hipométricas ou lentas, particularmente no olhar para baixo. No entanto, nos
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Figura 1. Ressonância magnética do crânio de paciente com PSP. A esquerda a atrofia mesencefálica ou sinal do beija flor
(T1). No meio o hipersinal periaquedutal (FLAIR). A direita a dilatação do terceiro ventrículo (T2).
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Tratamento. O uso de levodopa serve na maioria das vezes para triar algumas for-
mas de parkinsonismo que podem responder a essa medicação e que podem estar
confundindo o diagnóstico. Nos casos comprovados de PSP, a levodopa quando
apresenta alguma resposta é muito modesta e transitória. Já houve tentativas tera-
pêuticas com amitriptilina, amantadina, zolpidem, entre outras, mas os resultados
são controversos e o número de pacientes testados é muito pequeno.
Medidas para reabilitação com treino de equilíbrio e marcha e fonoterapia para
manejo da fonação e deglutição são mais efetivas do que qualquer outra medida
farmacológica. Uso de toxina botulínica pode beneficiar alguns pacientes com dis-
tonias palpebrais, assim como na sialorreia (aplicação nas glândulas salivares).
Cirurgia estereotáxica com lesão ou estimulação profunda de pálido, tálamo ou
subtálamo são desastrosas para a maioria dos pacientes. Há alguns testes com esti-
mulação cerebral profunda (DBS) nos núcleos pedúnculo-pontinos, mas os resulta-
dos não têm sido satisfatórios15.
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Quadro clínico. Do ponto de vista clínico, a distinção diagnóstica entre DCL e de-
mência associada à DP é feita pelo tempo de aparecimento dos sintomas. Se a de-
mência antecede o aparecimento do parkinsonismo ou ocorre logo após o seu iní-
cio (dentro de no máximo um ano), o diagnóstico mais provável é de DCL. A DP,
por sua vez, costuma manifestar mais claramente o declínio cognitivo após alguns
anos de início das manifestações motoras. Em ambos, a demência é caracterizada
por disfunção visoespacial e executiva (com memória relativamente poupada). Os
sintomas cognitivos costumam flutuar ao longo do dia, sendo mais intensos ao en-
tardecer e à noite. Sonolência e letargia contínua ou ocorrendo intermitentemente
várias vezes ao dia, apesar do paciente ter dormido o suficiente na noite anterior,
são comuns na maioria dos pacientes. Alucinações visuais complexas (com pessoas
ou animais), mesmo nas fases iniciais da doença, são típicas da DCB e fazem parte
dos critérios diagnósticos.
O parkinsonismo associado à DCL pode ser indistinguível da DP, mas na maior
parte das vezes predominam manifestações axiais com grave acometimento do
equilíbrio e da postura. Quedas são muito frequentes e, em alguns casos, inauguram
as manifestações motoras da doença. A presença de sensibilidade a neurolépticos,
com rigidez muscular intensa após doses baixas, e o distúrbio comportamental do
sono REM são muito característicos da DCL21.
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Parki nsoni sm o atí p i co | capí tulo 3
claramente a eficácia dessas drogas na DCL, mas ainda assim a experiência clínica
parece demonstrar algum benefício para os pacientes.
Os agonistas dopaminérgicos, a amantadina, os inibidores da MAO-B e os anti-
colinérgicos podem agravar as alucinações e delírios e devem ser evitados. Clonaze-
pan pode ser prescrito em doses baixas para os pacientes com distúrbios compor-
tamentais do sono REM.
Ainda não há estudos consistentes que recomendem o uso de anticolinesterási-
cos na DCL, embora sejam frequentemente prescritos com a expectativa de melho-
rar as manifestações cognitivas.
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46
4
doença de Parkinson:
Diagnós tico
Egbert o Reis Barbosa
4
A
doença de Parkinson (DP) é uma moléstia degenerativa crônica e progres-
siva do sistema nervoso central que acomete principalmente o sistema
motor, porém manifestações não motoras como distúrbios cognitivos, psi-
quiátricos e autonômicos, hiposmia, fadiga e dor também podem ocorrer.
As manifestações motoras da DP são consequentes à perda progressiva de neu-
rônios da parte compacta da substância negra. A degeneração nesses neurônios é
irreversível e resulta na diminuição da produção de dopamina, acarretando altera-
ções funcionais no circuito dos núcleos da base. Admite-se atualmente que mani-
festações não motoras da doença tais como hiposmia, constipação intestinal, de-
pressão e transtorno comportamental da fase REM (rapid eye movement) do sono
estejam presentes anos antes do surgimento das dificuldades motoras1.
O estudo de Braak et al.2 indica que as manifestações pré-motoras da DP estão
relacionadas ao acometimento de estruturas do bulbo e ponte no tronco cerebral,
além do sistema olfatório. Portanto, o processo degenerativo na DP parece ter uma
progressão caudo-cranial iniciando-se no tronco cerebral baixo (fase pré-motora),
evoluindo de forma ascendente, passando pelo mesencéfalo (fase motora), até atin-
gir estruturas corticais que integram funções cognitivas (fase avançada).
À luz dessa concepção quanto à evolução da DP, quando nos referimos ao seu
diagnóstico, consideramos que é estabelecido com os recursos disponíveis atual-
mente, anos após o início do processo degenerativo, quando então instalam-se as
clássicas alterações motoras da doença. O início das manifestações motoras da DP
ocorre geralmente próximo aos 60 anos de idade, acometendo ambos os sexos e
diferentes raças. Os casos da doença que têm início antes dos 40 anos são conside-
rados como DP de início precoce.
O diagnóstico da DP é essencialmente fundamentado em dados clínicos e os
exames complementares têm como maior finalidade descartar condições que po-
dem ser confundidas.
Conforme critérios propostos pelo United Kingdom Parkinson’s Disease Society
Brain Bank3, o diagnóstico da DP envolve três passos (Figura 1): [1] a caracteriza-
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Excluir Excluir
tremor parkinsonismo
essencial secundário
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1) Presença de parkinsonismo;
2) Evidências clínicas e/ou de neuroimagem de doença cerebrovascular (DCV) re-
levante;
3) Relação consistente entre o aparecimento do parkinsonismo e a DCV, eviden-
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ciada por uma das seguintes circunstâncias: [a] instalação aguda ou retardada
do parkinsonismo e infartos em regiões que podem afetam aumentar o output
dos núcleos da base (globo pálido externo ou substância negra pars compacta)
ou diminuir a ativação tálamo-cortical (núcleo ventral-lateral do tálamo ou in-
farto extenso do lobo frontal). O parkinsonismo na sua instalação consiste em
síndrome rígido-acinética contralateral ou hesitação da marcha (dentro de um
ano após o infarto); [b] parkinsonismo de instalação insidiosa, bilateral, com ex-
tensas áreas de lesões de substância branca subcortical e presença de hesitação
da marcha ou disfunção cognitiva precoce;
4) Critérios de exclusão: história de trauma de crânio repetido, encefalite definida,
tratamento com neuroléptico na instalação do quadro, presença de tumor cere-
bral, hidrocefalia comunicante na tomografia de crânio (TC) ou em imagens de
ressonância magnética (IRM) ou outra explicação para o parkinsonismo.
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Doença de Parkinson
Degeneração Corticobasal
- Forma síndrome corticobasal Demência com Corpos de Lewy
- Forma PSP
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doença de Parkinson:
E TI OPATOGENIA
Ana Lucia Zuma de Rosso
Henryk Maul tasch
Denise Hack Nicaretta
James Pitágoras de Ma tt os
5
A
pesar de descrita há quase dois séculos e de ser exaustivamente estudada,
não se conhece, ainda, a exata causa e os precisos mecanismos geradores
da doença de Parkinson (DP). No entanto, há indícios de que múltiplos
fatores, tais como a presença de predisposição genética associada a fator ambiental,
desencadeariam alterações intracelulares que conduziriam à morte neuronal.
A importância de se identificar os fatores etiopatogênicos decorre da necessida-
de de se estabelecer estratégias terapêuticas que promovam a sobrevivência celular,
impedindo, assim, a progressão da doença.
Primeiras noções
James Parkinson, em 1817, acreditava que a origem da doença residia, essencial-
mente, na medula cervical, nas suas membranas ou no seu invólucro. Não acredi-
tava que se estendesse ao encéfalo pela inexistência de alterações sensoriais e do
intelecto. Desculpou-se da natureza especulativa das suas ideias, mantendo-se com
a esperança de ser possível, no futuro, a realização de necrópsia para sua melhor
compreensão1. Em 1895, Brissaud, pela primeira vez, notou dano na substância ne-
gra2. Em 1912, Lewy descreveu, no parkinsonismo idiopático, anormalidades in-
tracelulares na forma de inclusões hialinas, concêntricas, quase constantemente
presentes no núcleo dorsal do vago e no locus ceruleus3. Trétiakoff, em 1919, em
seus estudos anatomopatológicos realizados em parkinsonianos pós-encefalíticos,
mostrou a constância do descoramento da zona compacta na substância negra3.
Em junho de 1997, Polymeropoulos et al.4 descreveram a mutação na proteína alfa-
-sinucleína como causa de DP em algumas famílias de origem italiana e grega. Nesse
mesmo ano, em agosto, Spillantini e cols.5 demonstraram que o corpo de Lewy
apresentava imunorreação para a alfa-sinucleína, estabelecendo, assim, a impor-
tância da agregação proteica na DP. Apesar de serem reconhecidos desde a descri-
ção original, os sintomas não motores, tais como constipação intestinal, sialorreia
e disfagia, não estavam ligados à patologia da doença, que se mantinha quase que
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Fatores ambientais
A possível associação de infecção por vírus e parkinsonismo foi suspeitada após a
descrição da pandemia de encefalite letárgica de Von Economo de 1916 a 19267.
Como se sabe, o agente etiológico nunca foi isolado, acreditando-se, no entanto,
ser determinado por vírus. Vários autores, desde então, têm procurado um agente
infecioso como causa da DP, implicando arbovírus, influenza, herpes simplex, vírus
de ação lenta e até mesmo príon. Para Gibbs e Gajdusek, nos anos 60 e 70, as evi-
dências de vários estudos sugeriam a origem infecciosa3. Jang et al.8 demonstraram
que o vírus influenza H5N1, responsável pela gripe aviária, era capaz de infectar o
sistema nervoso central (SNC) de ratos e induzir a perda transitória da produção
dopaminérgica na parte compacta da substância negra, gerando sinais e sintomas
parkinsonianos. Outro fator ambiental implicado como causa ou fator de risco para
DP é a neurotoxina MPTP. No entanto, apesar de ser utilizada como modelo expe-
rimental, não se acredita que a sua exposição crônica seja a causa da DP idiopática,
o mesmo ocorrendo com outras substâncias de estruturas semelhantes, tais como
pesticidas e herbicidas.
Fatores genéticos
A partir do final da década de 90, com a primeira descrição da mutação do gene
da alfa-sinucleína4, várias outras vêm sendo descritas, como a da parkin, LRRK2,
Pink1, entre outras. Essas mutações, porém, contribuem com menos de 10% de
todas as formas da doença. Atualmente, devemos considerar duas formas de DP, a
familiar (DPf) e a esporádica (DPe). Por terem fenótipos semelhantes, o estudo das
formas familiares é importante porque os mecanismos fisiopatológicos parecem ser
comuns em ambas9.
Envelhecimento
Vários estudos epidemiológicos evidenciam a clara relação entre o envelhecimento
e a DP, com a incidência aumentando na sexta e na sétima décadas de vida, em
ambos os sexos. Apesar de não sabermos os mecanismos que levam a essa relação,
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está envolvida na patogênese da DP, mas não explica se ela é determinante ou ape-
nas uma consequência da degeneração neuronal.
Apesar de não se conhecer a causa da DP, sabe-se que fatores de risco como a
idade e fatores ambientais e genéticos têm papel importante na fisiopatologia e que
esses fatores provavelmente agem em conjunto e não isoladamente. O estudo das
alterações ligadas ao envelhecimento e às mutações genéticas pode nos ajudar a
entender melhor as bases moleculares e genéticas dessa complexa doença.
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69
6
doença de Parkinson:
fase pré- mot ora
Renato Puppi Munhoz
Marina Farah
6
O
diagnóstico da doença de Parkinson (DP) depende da presença de sinais
motores: bradicinesia, tremor de repouso e rigidez. Esses sinais geralmen-
te têm progressão lenta e a confirmação do diagnóstico pode levar muitos
meses, e até anos, após o aparecimento dos primeiros sintomas motores. Essas ma-
nifestações têm uma correlação direta com a presença de degeneração neuronal na
substância negra (SN) do mesencéfalo. Por outro lado, isso não indica o início do
processo degenerativo. Vários estudos utilizando diversas abordagens metodoló-
gicas demonstraram que, no momento que os sinais motores ultrapassam o limiar
de detecção clínica, uma quantidade significativa da SN já está degenerada. Essa
observação trouxe consigo a noção de que existe um período no qual o processo
degenerativo encontra-se em progressão franca, porém aparentemente silenciosa,
quando se busca apenas sinais motores1.
A descrição patológica da DP como um processo degenerativo que envolve de
forma absoluta a SN mudou drasticamente na última década, desde que estudos
funcionais e neuropatológicos demonstraram que existe extenso envolvimento ex-
tranigral. Dentre essas investigações, o estudo seminal de Braak et al.2, sugeriu, de
forma elegante, que o processo degenerativo na DP começa nas regiões caudais
do tronco cerebral, progredindo no sentido caudo-rostral. O envolvimento da SN
ocorreria, segundo essa hipótese, no terceiro de um processo de seis estágios que
começa nos núcleos dorsais motores dos nervos glossofaríngeo e vago e no núcleo
olfatório anterior. Apesar de demonstrar a ocorrência dessa distribuição patológica
peculiar, o estudo não faz a correlação clínica entre quaisquer dessas alterações e
manifestações motoras ou não motoras2. Entretanto, o estudo de Braak et al.2, trou-
xe de forma mais objetiva e concreta a idéia de que as manifestações não motoras
(principalmente distúrbio de olfação, do sono e do sistema nervoso autonômico)
precediam os sintomas motores da DP.
Com vistas a essa teoria, existe uma tendência nova a pesquisas em busca do
fenótipo da fase pré-motora da DP3. Dados prospectivos são ainda raros, mas apon-
tam que constipação, hiposmia e distúrbio comportamental do sono REM (DCSR)
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podem preceder o diagnóstico formal da DP. Assim, as fases que antecedem tal
diagnóstico podem ser divididas da seguinte forma: [i] fase pré-diagnóstica: inclui
casos que têm algum dos sinais motores cardeais, porém ainda não apresentam o
segundo sinal necessário para completar o critério sindrômico de parkinsonismo e
subsequente categorização etiológica; [ii] fase pré-motora: o tema específico desta
revisão, refere-se a uma parte do período entre o início do processo degenerativo
e o desenvolvimento da DP com os sinais motores clássicos; nesse período exis-
tem “endofenótipos” reconhecidos, isso é, os sinais não motores, como hiposmia,
constipação e DCSR; [iii] fase pré-clínica: refere-se a outra parte do período entre
o início do processo degenerativo e o desenvolvimento da DP, no qual o paciente é
totalmente assintomático, tanto sob aspectos motores quanto não motores, porém
apresenta anormalidades características em exames de neuroimagem funcional en-
volvendo vias dopaminérgicas demonstradas por técnicas especificas de SPECT ou
PET. Finalmente, existem ainda casos descritos na literatura como de “alto risco”
ou “risco aumentado”, que incluem uma categoria imprecisa de indivíduos assin-
tomáticos e sem alterações funcionais, porém com traços que conferem alto risco
para a doença, como por exemplo, mutações em alelos que causam parkinsonismo
monogênico4,5.
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médio manteve-se estável na maioria dos indivíduos até um período variável que
antecedeu o início dos sinais motores. Esse período variou de alguns meses a até
quatro anos. Curiosamente, nesse estudo houve uma tendência ao aumento da in-
gestão calórica ao mesmo tempo em que o IMC diminuía. No decorrer da doença, a
redução de IMC seguiu um processo contínuo com a mesma tendência do período
pré-motor, indicando que, sejam quais forem os processos que desencadeiem essa
alteração precoce de IMC, são relativamente uniformes e seguem o ritmo de pro-
gressão da doença22.
Conclusão
A presença de sinais pré-motores na DP engloba sinais comuns na população geral,
como alterações do humor e perda de peso. Por outro lado, inclui outros bem mais
específicos, como hiposmia na ausência de causa específica e DCSR. A utilidade
da pesquisa desses sinais, no momento, traz pouco impacto na prática clínica coti-
diana, uma vez que não são suficientes nem necessários para o diagnóstico. Acima
dessa constatação, está o fato de que, formalmente, não existe atualmente diagnós-
tico de DP na ausência de sinais motores. Pode-se ainda questionar o fato de que a
pesquisa da doença pré-clínica através da busca de endofenótipos subclínicos não
faz sentido e é infrutífera na ausência de terapias neuroprotetoras, indisponíveis no
momento. Por outro lado, uma visão mais construtiva é a de que a DP é temporal e
fenomenologicamente muito maior do que seus sinais cardinais motores clássicos.
Essa visão está sendo construída hoje e abre janelas para o entendimento do proces-
so degenerativo sob uma ótica diferente e mais ampla que a dopaminérgica, descrita
no século passado.
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81
7
doença de Parkinson:
medidas Neuroprotetoras
João Carlos Papaterra L imongi
7
A
vanços na compreensão dos mecanismos bioquímicos e fisiológicos envol-
vidos na fisiopatologia da doença de Parkinson (DP) levaram, nas últimas
décadas, ao desenvolvimento de terapias eficazes para o controle sintomá-
tico dessa afecção. Entretanto, o caráter progressivo do processo degenerativo e o
envolvimento de circuitos neurais mediados por outros neurotransmissores que
não a dopamina (DA) quase sempre resultam em redução significativa da eficácia
das terapias farmacológicas disponíveis. Dessa forma, tornou-se evidente a neces-
sidade de novas abordagens que pudessem retardar ou, de alguma forma, modifi-
car o curso natural da doença. Embora nenhuma intervenção desse tipo tenha se
mostrado eficaz até o presente, avanços significativos têm sido observados em anos
recentes e a obtenção desse objetivo começa a ser esperado em futuro próximo.
Neuroproteção é definida como uma intervenção que retarda ou interrompe a
progressão de uma doença através da proteção ou restauração da função neuronal.
Os termos modificação da doença ou retardo da velocidade de progressão clínica
são também utilizados e parecem ser mais adequados, uma vez que não há como se
determinar, in vivo, o número de neurônios e sua condição funcional1.
A obtenção de terapias neuroprotetoras eficazes depende de uma série de fa-
tores, alguns de ordem metodológica, que incluem: compreensão dos processos
etiopatogênicos envolvidos na morte celular, desenvolvimento de modelos animais
mais adequados e planejamento de estudos clínicos controlados.
Mecanismos etiopatogênicos
Embora esse tema seja objeto de outro capítulo deste livro, aqui serão discutidos
alguns aspectos relativos à etiopatogenia da DP que possam ter implicações tera-
pêuticas. Um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento de terapias neuro-
protetoras é a compreensão ainda incompleta da causa primária da doença. Estudos
recentes apontam para a existência de processo ativo de toxicidade neuronal. A
natureza desse processo não é conhecida e está provavelmente relacionada a es-
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Modelos animais
O planejamento de estudos clínicos de drogas com possível propriedade neuropro-
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Estudos clínicos
A maioria dos estudos planejados para avaliação de agentes neuroprotetores apre-
senta limitações. Um dos desafios mais frequentes tem sido a distinção entre uma
real modificação da doença e um efeito sintomático da droga. Como discutido
adiante, várias drogas que mostraram um efeito modificador da doença também
apresentavam alguma propriedade dopaminérgica, de modo que os benefícios obti-
dos poderiam representar apenas um efeito sintomático sem qualquer influência no
curso clínico. Entretanto, agentes com efeito sintomático podem apresentar, adi-
cionalmente, efeito modificador da doença, de modo que certas drogas não podem
ser descartadas a priori, inclusive pelo fato de também possuírem propriedades
dopaminérgicas.
A natureza progressiva da DP e a existência de terapias sintomáticas eficazes
tornam quase que obrigatória, por razões éticas, a utilização de estudos de curta du-
ração. Por sua vez, tais estudos, realizados geralmente nas fases iniciais da doença,
podem ter resultados pouco relevantes para fases mais avançadas em que predomi-
nam disfunções mais extensas.
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Tempo para um evento. O primeiro estudo de larga escala projetado para avaliar pos-
sível efeito protetor foi o DATATOP (deprenyl and tocopherol antioxidant therapy
of Parkinson’s disease). Esse estudo comparou os efeitos do deprenil (selegilina) e
tocoferol (vitamina E) com um grupo placebo. A medida de desfecho primário foi
o tempo decorrido para a necessidade de introdução de levodopa e o grupo do
deprenil mostrou superioridade significativa em relação aos outros grupos. Entre-
tanto, não está claro se esse resultado decorreu apenas de efeito sintomático ou da
combinação de efeito sintomático e neuroprotetor9. Embora o estabelecimento de
critérios de desfecho clínico (endpoints) seja uma estratégia que utiliza eventos bem
definidos e relativamente bem mensuráveis, esse tipo de estudo é mais confiável
quando a droga avaliada não possui efeito sintomático.
Estudos com períodos de eliminação (washout). Com o objetivo de evitar que um pos-
sível efeito sintomático influencie na interpretação dos resultados, têm se projetado
estudos que, em vez de critérios fixos de desfecho, usam variações em escalas clíni-
cas, como o UPDRS, e que incluem um período de eliminação da droga na fase final.
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O estudo ELLDOPA, que avaliou três doses de levodopa comparadas com place-
bo, foi planejado com essa metodologia. Nesse estudo, embora a levodopa estivesse
associada com menor progressão medida pela escala UPDRS após período de elimi-
nação, não foi possível determinar se esses achados eram resultado de uma real mo-
dificação da doença ou de efeito sintomático residual, uma vez que, nesse estudo, o
período de eliminação foi de apenas duas semanas10. Em vista dessas dificuldades na
interpretação dos resultados, fica claro que o período de eliminação deve ser o mais
longo possível para evitar que qualquer efeito sintomático esteja ainda presente.
Estudo de início tardio (em dois tempos). Esse método utiliza dois períodos de trata-
mento: no primeiro, pacientes são aleatorizados para receber a droga ativa ou pla-
cebo; no segundo, ambos os grupos recebem a droga ativa. Se a droga em questão
possui atividade neuroprotetora (com ou sem atividade sintomática), o grupo que
recebeu droga ativa no primeiro período deverá mostrar melhores resultados que
o grupo tratado apenas no segundo período. Esse desenho foi utilizado no estudo
ADAGIO que avaliou duas doses de rasagilina, 1 mg e 2 mg. Nesse estudo, após 18
semanas, a dose de 1 mg foi associada a efeito provavelmente modificador da doen-
ça, enquanto que na dose de 2 mg esse efeito não foi observado. As causas para essa
discrepância não foram bem esclarecidas, mas não se pode descartar que um maior
efeito sintomático da rasagilina no grupo de 2 mg possa ter confundido a interpre-
tação dos resultados11,12.
O estudo PROUD avaliou o pramipexol, com esse mesmo desenho, na dose de
1,5 mg por dia, comparado com placebo. Estudos anteriores haviam comparado
pramipexol e levodopa em relação a mudanças em marcadores com neuroimagem,
e estudos in vitro sugeriam efeito neuroprotetor dos agonistas da dopamina. Entre-
tanto, o estudo PROUD não mostrou superioridade no grupo que iniciou a droga
ativa precocemente, tanto em relação aos escores clínicos como em relação a modi-
ficações no SPECT (tomografia por emissão de fóton único)13.
Utilização de biomarcadores
Admite-se que os primeiros sintomas motores da DP apareçam quando pelo me-
nos 80% da DA estriatal e 50% dos neurônios da substância negra foram perdidos.
Dessa forma, a detecção da doença nos estágios mais precoces é de importância
fundamental, uma vez que eventuais terapias neuroprotetoras, quando estiverem
disponíveis, serão provavelmente mais eficazes nessa fase. A identificação de mar-
cadores biológicos para a DP tem como objetivo permitir o diagnóstico pré-clínico,
contribuir para elucidação dos mecanismos etiopatogêncos e auxiliar no desenvol-
vimento e utilização de estratégias neuroprotetoras.
Estudos de neuroimagem em indivíduos com risco maior para DP (exposição
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Conclusões e perspectivas
Critérios usualmente empregados para a seleção de pacientes não levam em conta
fatores que podem ser determinantes na progressão da doença. De fato, a DP não
é uma condição fenotipicamente homogênea, sendo que variáveis como a idade de
início, por exemplo, podem influenciar de modo decisivo a velocidade de progres-
são bem como determinar o aparecimento de alterações patológicas adicionais. Em
estudo longitudinal multicêntrico que avaliou a progressão da DP, pouco menos de
dois terços dos pacientes tinham idade de início entre 50 e 60 anos, progressão len-
ta, demência apenas nas fases mais avançadas e alterações neuropatológicas compa-
tíveis com sinucleinopatia pura; pouco menos de 1/3 dos pacientes iniciaram entre
os 65 e 70 anos de idade, tinham progressão mais rápida, mais quedas, demência
com início quatro anos após o diagnóstico e alterações neuropatológicas mistas,
com presença de placas de amiloide associadas à sinucleinopatia18. Esses achados
sugerem que a seleção de pacientes deve levar em conta a idade de início, com o
objetivo de tornar amostras mais homogêneas. Dessa forma, o estabelecimento de
critérios de desfecho, como surgimento de quedas ou demência, deve permitir re-
sultados mais confiáveis.
Outro aspecto de maior relevância tem sido a busca por métodos eficazes para
o diagnóstico pré-clínico da DP nas fases em que há relativa integridade do te-
cido neural. Nessas condições, estratégias neuroprotetoras teriam, obviamente,
maior benefício. Estudos clínicos, tais como planejados atualmente, avaliam pa-
cientes considerados clinicamente “em fase inicial”, porém em estágio já avançado
de degeneração neuronal. Dessa forma, estratégias potencialmente eficazes, como
neuroprotetoras em condições ideais, podem não resultar em qualquer benefício
clinicamente mensurável quando utilizadas “tarde demais”. A identificação de bio-
marcadores confiáveis e a consequente mudança de paradigmas no que se refere ao
conceito de fase inicial da DP deverá ter impacto significativo no estabelecimento
de estratégias para o estudo de terapias neuroprotetoras. É possível que, em um
futuro não distante, esses estudos tenham como critérios a utilização de múltiplos
marcadores em fases pré-clínicas com o objetivo de prevenir o surgimento de ma-
nifestações clínicas da DP.
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93
8
doença de Parkinson:
depressão e alterações
cognitivas
Egbert o Reis Barbosa
Laura Silveira-Moriyama
8
O
quadro clínico na doença de Parkinson (DP) é dominado pelas manifesta-
ções motoras representadas pela síndrome parkinsoniana, mas alterações
não motoras frequentemente estão presentes. Dessa forma, pacientes com
DP podem apresentar, além do quadro motor típico da moléstia, um amplo espec-
tro de alterações não motoras representadas por manifestações neuropsiquiátricas
(exs.: depressão e perdas cognitivas), transtornos do sono (ex.: transtorno compor-
tamental do sono REM [rapid eye movement]), distúrbios autonômicos (exs.: obsti-
pação intestinal, hipotensão postural e disfunções miccionais), entre outras, como
fadiga, hiposmia e dor.
Essas manifestações estão relacionadas a alterações neurobiológicas próprias da
DP e/ou efeito de drogas usadas no tratamento dessa doença. O substrato neural
subjacente envolve o comprometimento de circuitos frontoestriatais não motores,
núcleos serotoninérgicos da rafe mediana, núcleos noradrenérgicos (locus ceruleus
e subceruleus), centros autonômicos hipotalâmicos e no tronco cerebral (núcleo
dorsal do nervo vago) e vias olfatórias.
Na Figura 1, o quadro clínico da DP está ilustrado como um iceberg, no qual
a síndrome parkinsoniana representa apenas a parte que emerge na superfície da
água e é mais visível, enquanto as manifestações não motoras, que, no seu conjunto,
assumem uma grande proporção, são pouco aparentes, embora possam contribuir
de forma significativa para a perda da qualidade de vida. Neste capítulo, serão dis-
cutidos aspectos clínicos, fisiopatológicos e terapêuticos das duas mais importantes
manifestações neuropsiquiátricas da DP: a depressão e as perdas cognitivas.
Depressão
A depressão é o distúrbio neuropsiquiátrico mais comum na DP. Sua prevalência
varia bastante (4% a 70%) em diferentes estudos, dependendo da metodologia em-
pregada, porém situa-se em torno de 40% em pesquisas recentes1,2.
A depressão, assim como outras alterações psiquiátricas presentes na DP, fre-
97
trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
quentemente não é reconhecida pelos médicos que atendem pacientes com DP. Por
meio de escalas específicas para depressão, Shulman et al.3 avaliaram 101 pacientes
que já estavam em acompanhamento neurológico. Em 21% desses pacientes, o mé-
dico que os acompanhava já havia identificado a presença de depressão, entretanto
em outros 23% esse quadro não havia sido reconhecido, mas foi detectado na ava-
liação paralela por escalas específicas.
Não há uma correlação bem estabelecida entre depressão e idade atual do pa-
ciente ou idade do paciente no início da DP, mas há evidências de que a depressão
é mais comum e grave em parkinsonianos em que a doença se instala mais preco-
cemente e especialmente naqueles com a forma rígido-acinética da doença4. Não
há também relação entre sintomas depressivos e duração da doença, como seria
esperado. Vários estudos demonstraram maior incidência de depressão entre pa-
cientes de sexo feminino com DP e indivíduos com história pessoal ou familiar de
depressão têm mais chance de tornarem-se deprimidos após o início da doença5.
A depressão na DP caracteriza-se pelo alto nível de ansiedade, pessimismo, tris-
teza, irritabilidade, ideação suicida, porém com baixa incidência de suicídio e, ao
contrário do que ocorre na depressão primária, os pacientes geralmente não apre-
sentam sentimento de culpa e autorreprovação6. Cerca de metade dos pacientes
deprimidos com DP se enquadra nos critérios de depressão maior, enquanto a outra
metade apresenta distimia ou depressão leve a moderada.
Pacientes com DP podem também apresentar apatia (falta de motivação, desin-
teresse) e anedonia (redução da capacidade de sentir prazer), sintomas que podem
apresentar-se associados à depressão ou isolados7. Entretanto, enquanto a depres-
são é uma manifestação precoce, podendo estar presente mesmo na fase pré-moto-
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Tabela 4. Doenças neurodegenerativas nas quais demência e parkinsonismo podem estar presentes.
ff Doença de Parkinson (parkinsonismo precede o quadro demencial em vários anos).
ff Demência com corpos de Lewy (demência presente desde o início da doença).
ff Degeneração corticobasal (parkinsonismo com marcada assimetria; presença de quadro distônico, mioclo-
nias, perda sensorial cortical e fenômeno da mão alienígena).
ff Doença de Alzheimer (quando presente, parkinsonismo instala-se em fase avançada).
ff Degenerações lobares frontotemporais (presença de transtornos comportamentais graves e precoces).
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106
9
doença de Parkinson:
TRATAMENTO CLÍNICO
Vitor Tumas
9
O
tratamento farmacológico da doença de Parkison (DP) começou a ser uti-
lizado ainda no século XIX por Charcot, que prescrevia alcalóides naturais
obtidos da planta beladona1. Essas formulações apresentavam evidentes
efeitos anticolinérgicos, e foram substituídos mais tarde por anticolinérgicos sin-
téticos que da mesma forma que os alcalóides produzem um efeito benéfico dis-
creto sobre os sintomas parkinsonianos. Em realidade, o tratamento farmacológico
“efetivo” da DP surgiu no início dos anos de 1970, logo após algumas importantes
descobertas científicas2,3.
A levodopa
Na metade dos anos 1950, Arvid Carlson mostrou que 80% da dopamina cerebral
estariam concentradas nos gânglios da base4. Logo, Ehringer e Hornkiewicz obser-
varam que os cérebros de pacientes com DP apresentavam deficiência acentuada
de dopamina no estriado, especialmente no putâmen4. Isso deu origem à ideia de
que a DP seria uma doença causada pela deficiência de um único neurotransmissor.
Em seguida, Birkmayer e Hornkiewicz mostraram que a infusão intravenosa de um
precursor da dopamina, a L-dihidroxifenilalanina (L-dopa ou levodopa) produzia
uma dramática reversão dos sinais parkinsonianos4. Em 1967, Cotzias e colabora-
dores demonstraram a eficácia da administração oral da L-dopa no tratamento de
pacientes com DP4,5.
Desde então, o tratamento com a L-dopa é considerado como o tratamento pa-
drão para a DP5. Seu excepcional e até aqui insuperável efeito sobre os sintomas
parkinsonianos praticamente normalizou a expectativa de vida dos pacientes, além
de ter-lhes proporcionado um ganho evidente em qualidade de vida6. Hoje sabemos
que a DP é uma doença neurodegenerativa complexa que acomete vários sistemas
neurais além do sistema dopaminérgico, mas os principais sintomas motores decor-
rem principalmente da deficiência de dopamina estriatal6.
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todas elas apresentam potência terapêutica inferior à da L-dopa. Assim, elas são
utilizadas em monoterapia nas fases iniciais da doença ou como coadjuvantes ao
tratamento com a L-dopa. Nas fases avançadas elas são indicadas com o objetivo de
reduzir as doses de L-dopa, especialmente quando o paciente apresenta discinesias,
ou com a finalidade de ajudar a reduzir os períodos em “estado OFF” do paciente.
Como veremos, a maioria tem como mecanismo de ação alguma interferência sobre
o metabolismo da dopamina (Figura 1), ou então, agem como agonistas dos recep-
tores dopaminérgicos. Apenas os anticolinérgicos e a amantadina têm mecanismos
de ação diferentes.
114
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tempo. Pacientes tratados desde o início com AD demoram mais tempo para desen-
volver as complicações motoras, já que ficam sem utilizar a L-dopa por um período
maior ao longo do curso da sua doença. Porém, quando se torna necessário associar
o uso da L-dopa, a vantagem desaparece e o risco para o desenvolvimento das com-
plicações motoras é praticamente o mesmo de quem foi tratado desde o início com
a L-dopa. A principal vantagem em se usar um AD em combinação com a L-dopa,
é que frequentemente se pode reduzir a dose dessa última, poupando o seu uso.
A apomorfina é um AD muito potente, que somente é eficiente se aplicado por
via subcutânea6. Essa droga tem início de ação muito rápido, mas seu efeito é de
curta duração. Costuma ser utilizado como “tratamento de resgate” em momentos
“OFF”, em que o paciente está sem efeito da L-dopa. A apomorfina não é disponível
no Brasil, mas na Europa também é utilizada para infusão subcutânea contínua por
bomba especial com excelentes resultados em pacientes em fase avançada e muitas
flutuações na resposta à L-dopa.
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Os inibidores da COMT. A entacapona e a tolcapona são drogas que agem como inibi-
dores da enzima COMT, e assim inibem a metabolização da L-dopa por essa enzi-
ma. O efeito disso é uma modificação na farmacocinética da L-dopa aumentando a
sua meia-vida e a área sob a curva de concentração plasmática. Como resultado há
uma maior disponibilidade de L-dopa no sistema nervoso central6. Por isso, quando
administradas, essas drogas produzem uma potenciação no efeito da L-dopa e au-
mentam a duração do seu efeito nos pacientes com deterioração-de-fim-de-dose.
Elas não produzem nenhum efeito antiparkinsoniano se prescritas isoladamente. A
tolcapona inibe a COMT periférica e a localizada no sistema nervoso central, en-
quanto que a entacapona só age perifericamente. Assim, a tolcapona é mais poten-
te e eficaz. Os inibidores da COMT são especialmente indicados para ajudarem a
controlar os episódios de deterioração-de-fim-de-dose que ocorrem nas fases mais
avançadas da doença. Seu uso aumenta os efeitos clínicos da L-dopa, mas dessa
forma produzem o mesmo efeito de prescrever doses elevadas de L-dopa, ou seja,
aumentam o risco para o desenvolvimento das discinesias. A tolcapona é prescrita
na dose de 100 mg até 3 vezes ao dia, e devido ao risco de hepatotoxicidade, as en-
zimas hepáticas devem ser monitoradas. A entacapona é prescrita em doses de 200
mg a cada dose de L-dopa, até a dose máxima de 1600 mg/dia.
116
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gicos mais usados no Brasil são: o biperideno e a trihexifenidila, que são prescritos
na dose de 3 mg a 12 mg/dia, divididos em 2 a 4 tomadas.
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do curso da doença. Para alguns pacientes num certo momento, pode ser mais im-
portante diagnosticar e tratar uma depressão, que controlar os sintomas motores
parkinsonianos. A depressão é uma das principais responsáveis pela perda na qua-
lidade de vida desses pacientes. De outra forma, algumas vezes os próprios medica-
mentos antiparkinsonianos podem desencadear ou agravar outros sintomas como
produzir sintomas psicóticos, que são a principal causa para internação do paciente
em asilos. Nesse caso, os pacientes devem ter seu esquema terapêutico revisado e
algumas drogas antiparkinsonianas devem ser retiradas, seguindo essa ordem re-
comendada: primeiro anticolinérgicos, a seguir amantadina, inibidores da MAO-B,
AD, inibidores da COMT e por último a L-dopa. Dessa maneira, o clínico deve ter a
experiência necessária para priorizar e equilibrar o tratamento dos problemas mais
urgentes a cada momento.
A reabilitação na DP
Como dissemos antes, certos problemas motores como os distúrbios de marcha,
o desequilíbrio, as alterações da fala e da deglutição não respondem bem ao trata-
mento com as drogas dopaminérgicas e nem a outras drogas. Por isso, muitas vezes
é necessário empregar métodos específicos de reabilitação para obtermos alguma
melhora desses problemas. Frequentemente o paciente é tratado por uma equipe
multiprofissional que inclui além do médico, o profissional de enfermagem, o fi-
sioterapeuta ou educador físico, o fonoaudiólogo, o psicólogo e até mesmo o tera-
pêuta ocupacional. Existem poucos estudos bem elaborados mostrando evidências
definitivas da eficácia dessas intervenções na reabilitação dos pacientes, porém, a
atividade física em geral é recomendada aos pacientes por vários motivos15. Vários
métodos de fisioterapia são utilizados para tratar os pacientes com DP, e habitual-
mente benefícios discretos especialmente sobre a marcha e o equilíbrio, mas faltam
estudos mais informativos sobre a eficácia desses tratamentos16. O treinamento in-
tensivo da voz, usando especialmente o método de Lee Silverman produz benefícios
mensuráveis na qualidade da voz e na deglutição17.
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119
10
doença de Parkinson:
co m p licaç ões do
trat am ento
farm acológico
Luiz Augusto Franco de Andrade
10
I
números aspectos da terapêutica farmacológica da doença de Parkinson me-
recem uma revisão devido às dificuldades encontradas no dia a dia dos pacien-
tes, as quais apresentam verdadeiros desafios aos especialistas. O tratamento da
doença de Parkinson, entre todas as enfermidades crônicas neurológicas, é, pos-
sivelmente, o que traz maiores dificuldades para o neurologista em longo prazo e
enormes desafios a serem superados. As complicações do tratamento nos pacientes
mais idosos são frequentes, mas os mais jovens e os que iniciaram mais precoce-
mente a doença de Parkinson continuam a ser um desafio particular no contexto
global dos parkinsonianos, devido a sua extrema tendência de rapidamente desen-
volver as complicações de longo prazo da levodopaterapia (no caso, transformadas
em reações de curto ou médio prazo). Além disso, passou-se a considerar como
crítica para a produção das flutuações e discinesias nos pacientes tratados com a
levodopa não apenas o tempo de tratamento, mas o tamanho das doses da droga e
a intensidade da perda neuronal dopaminérgica.
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deve ser descontinuada. Com isso, há boa chance de que essa tendência desapareça.
Logicamente, outras drogas dadas simultaneamente também devem ser observa-
das e, eventualmente, reduzidas ou interrompidas, como antidepressivos tricíclicos,
anti-hipertensivos, diuréticos, vasodilatadores, entre outras. Insônia e falta de ape-
tite com emagrecimento no curso de um tratamento com a selegilina pode se dar
por sua ação anfetamínica. O mesmo pode se dizer de uma insônia que se acentuou
após a introdução do medicamento.
Em pacientes idosos, a tolerância à droga pode ser reduzida se ocorrerem sinto-
mas mentais, como surtos psicóticos, pensamentos paranoides e alucinações, como
com as demais drogas de nosso arsenal antiparkinsoniano. Os pacientes, de modo
geral, são submetidos a regimes de politerapia e deve-se observar com detalhes sin-
tomas desse tipo. A experiência local com a rasagilina, outra droga da mesma classe
ainda não comercializada no Brasil, porém já utilizada por muitos pacientes aqui,
mostra que efeitos anfetamínicos não são observados, porém os demais aspectos
mencionados em relação à selegilina devem também ocorrer, pois essas reações, e
talvez também os efeitos sobre a enfermidade, devem obedecer a um efeito de classe.
Os medicamentos dopaminérgicos que atuam diretamente no cérebro (agonis-
tas dopaminérgicos, levodopa, selegilina, rasagilina) ou de maneira indireta (tolca-
pona e entacapona) podem produzir as mais importantes complicações ao longo do
tratamento, que são as que mais dificultam a condução dos casos em longo prazo.
Pela importância do tema, vamos nos ater inicialmente a um ponto básico e decisi-
vo para os resultados de longo prazo, que é o início do tratamento, especialmente
com as drogas dopaminérgicas.
Os formadores de opinião na área de transtornos dos movimentos, nós inclusi-
ve, fomos todos responsáveis por favorecer uma atitude negativa para a introdução
“precoce” dos medicamentos dopaminérgicos, à exceção da selegilina, promovendo
um retardo da introdução destes pelo tempo possível. Criou-se em muitos médicos,
e também em muitos pacientes, uma verdadeira “levodopafobia”, e em alguns deles
uma recusa sistemática em aceitar a introdução do medicamento. Favorecíamos o
uso, nas fases iniciais dos anticolinérgicos, da amantadina ou da selegilina, drogas
conhecidas de longa data. Estávamos “protegendo” os pacientes das complicações
tardias dos medicamentos dopaminérgicos, especialmente da levodopa. Obviamen-
te a qualidade de vida dos pacientes melhorava muito pouco com esse enfoque, o
que não dizer da manutenção da capacidade de trabalho de indivíduos em idade
ainda de alta produção (40 a 60 anos). Muitos perderam seus empregos devido às
deficiências motoras, mas não só por esse motivo. Um preconceito dos emprega-
dores e da sociedade em geral pelos acometidos por esse tipo de enfermidade se
encarregou de inviabilizar muitos pacientes que mantinham suas capacidades de
trabalho intactas apesar dos sintomas motores. Eles, mesmo assim, foram despedi-
dos; logicamente, por outros motivos alegados.
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Doenç a de Pa r k in so n : c o m p lic a ç õ es d o tr atam e nto farm acoló gi co | capí tulo 10
lina, 1 mg ou 2 mg, ou placebo desde o “dia zero”, durante seis meses. Depois disso,
o grupo placebo passou a receber rasagilina. As curvas se mantiveram paralelas até
o final do estudo, mostrando que os que iniciaram mais precocemente mantiveram
um nível de menor deficiência motora comparado ao que iniciou mais tarde o uso
da droga5. Na época, concluiu-se também que o uso precoce do medicamento teria
um efeito protetor, pois caso se tratasse simplesmente de um efeito sintomático, as
curvas teriam se encontrado logo depois.
Essas foram as interpretações originais desses três estudos. Na releitura de Scha-
pira e Obeso, os autores consideram que esses três grandes ensaios podem ser in-
terpretados sob a óptica de que o uso precoce dos medicamentos dopaminérgicos,
como a própria levodopa e a rasagilina (ou mesmo a selegilina, ao nosso ver), deve
conferir uma melhora da fisiologia intrínseca dos circuitos envolvidos com os mo-
vimentos nos núcleos da base. Mecanismos compensatórios impediriam o apare-
cimento dos sintomas, pois as manifestações da doença de Parkinson só aparecem
depois de uma grande degeneração neuronal dopaminérgica, estimada em 70%
ou 80%. Elas surgem quando esses mecanismos são exauridos. O uso precoce dos
medicamentos, segundo essa teoria, pode provocar uma melhora da fisiologia in-
trínseca, poupando esses mecanismos compensatórios, de modo que os núcleos da
base funcionem em um nível semelhante ao que havia antes de ocorrer essa grande
deficiência dopaminérgica (efeito de reset do mecanismo estriatal, já mencionado
anteriormente). Esse efeito poderia, então, até não ser propriamente neuroprotetor,
mas seria explicado por essa nova interpretação.
Desde então, esses três grandes ensaios e essa teoria de interpretação dos seus
resultados passaram a ser usados para defender a antecipação do tratamento me-
dicamentoso dos pacientes, procurando-se poupar os mecanismos compensatórios
e melhorar a fisiologia intrínseca do sistema extrapiramidal. Essa proposta repre-
sentou uma mudança em relação à abordagem terapêutica tradicional, que tendia
a adiar a introdução dos medicamentos, passando-se a introduzi-los mais precoce-
mente. Hoje, se prioriza a qualidade de vida e a empregabilidade. Muitos grupos co-
meçaram, então, a antecipar o tratamento medicamentoso, mas antecipar quanto?
Já no primeiro dia após o diagnóstico? Ou mais precocemente do que antes se pro-
punha, mas nem tanto assim? Mais recentemente, foram feitas críticas a respeito
dessa teoria na literatura, mas, de qualquer maneira, ela lança um questionamento
muito sério à tendência anterior de postergar o início dos medicamentos dopa-
minérgicos, especialmente nos pacientes mais jovens. Justifica-se, assim, deixar a
cautela excessiva de antes em favor de uma introdução mais precoce dos medica-
mentos, porém ainda não há consenso sobre qual seja o momento exato.
Passaremos agora a tratar de alguns aspectos relevantes sobre a fisiopatologia
das alterações motoras nos pacientes submetidos ao tratamento com a levodopa. Há
muitos anos, o grupo liderado por Thomas Chase, nos EUA, produziu informações
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Manejo das flutuações motoras. O wearing-off costuma ser o primeiro tipo de flu-
tuação a se manifestar. A deterioração de fim de dose, em um primeiro momento,
pode ser tratada simplesmente pelo aumento da dose diária da levodopa e com uma
diminuição do intervalo entre as doses do medicamento. A selegilina, por um efeito
potencializador da levodopa, aumenta a eliminação da dopamina na fenda sináptica
(efeito do tipo anfetamínico) e em muitos pacientes mostra-se eficaz para aumentar
a resposta da levodopa, pelo menos em uma fase inicial. Devemos nos lembrar de
que esse tipo de flutuação apenas nos alerta para o fato de que, em algum tempo,
passaremos a ter as outras complicações motoras. Nesse instante, especialmente
nos pacientes mais jovens e com reconhecida tendência a desenvolver as formas
mais graves de flutuações e discinesias, devemos considerar a utilização de estra-
tégias com possível utilidade na prevenção dessas anormalidades. A introdução
no mercado farmacêutico de drogas inibidoras da catecol-orto-metiltransferase
(COMT), como a tolcapona e a entacapona, que agem aumentando a disponibilida-
de de levodopa no sangue com um aumento da duração do efeito da droga, veio nos
fornecer armas importantes para uma otimização da terapia com a levodopa. As
drogas são mais indicadas para pacientes com uma queda importante do rendimen-
to da levodopa, com flutuações do tipo períodos off resistentes ou deterioração de
fim de dose6,8.
Tendo em mente a pronunciada tendência dos pacientes mais jovens de desen-
volver complicações, a apresentação da deterioração de fim de dose deve nos ense-
jar a oportunidade de introduzir algum agonista dopaminérgico no regime diário do
paciente. Naqueles ainda não expostos a esse tipo de medicamento, temos indicado
o pramipexol; havendo a necessidade de interrompê-lo, por qualquer motivo, indi-
camos o inibidor de COMT. Em certas ocasiões, os pacientes são tratados com a le-
vodopa, associada ao inibidor de COMT, e, simultaneamente, com o pramipexol. O
laboratório produtor da entacapona oferece um medicamento com a combinação
da levodopa com a carbidopa e a entacapona. Outra situação relativamente comum
é a de que haja períodos refratários de resposta à levodopa, em que o paciente se
apresenta acinético e rígido por longos períodos, horas, às vezes, não respondendo
à ingestão de novas doses de levodopa. São os períodos off prolongados, também
chamados de períodos off resistentes. Podem ocorrer ao final do efeito de uma
dose, como um prolongamento de uma deterioração de fim de dose, ou de for-
ma randômica ao longo do dia; isso perturba muito as atividades do paciente que
se sente sem capacidade de prever os seus momentos bons. Estímulos psíquicos
desfavoráveis podem desencadear um período desse tipo. Uma dessensibilização
aguda dos receptores dopaminérgicos (down regulation) provavelmente está por
trás desse fenômeno, e a forma dispersível (solubilizável) da combinação levodopa/
benserazida pode ser utilizada como uma terapia de resgate. No caso dos pacientes
que não conseguem uma resposta favorável a essa estratégia, indicamos o uso do
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do muito dispendioso, pois exige uma gastrostomia, e, além disso, está disponível
apenas na Europa e nos EUA. Da mesma maneira, o uso de uma bomba de infusão
contínua subcutânea com grandes doses de apomorfina, como há anos vem sendo
feito (especialmente na Inglaterra, muito preconizado por Andrew Lees e seu gru-
po), embora produza resultados positivos nos pacientes, é de difícil acesso ao nosso
meio, por vários motivos. As cirurgias com implante do DBS (eletrodos de estimu-
lação profunda do cérebro) também podem ser indicadas nessas circunstâncias.
Manejo das discinesias. A discinesia mais comum que encontramos nos pacientes
é a chamada discinesia de pico de dose. São movimentos involuntários que podem
ser localizados apenas em um membro, em vários membros, no tronco, pescoço e
segmento cranial, isoladamente ou de maneira generalizada. Variam em intensi-
dade, desde pequenos gestos ou posturas anormais não percebidos pelos pacien-
tes ou seus familiares, a movimentos ou posturas anormais de tal intensidade que
tornam o doente incapacitado de sair da cama. O padrão temporal em relação à
ingestão da dose do medicamento nem sempre é tão nítido, com a fase de término
dos movimentos involuntários já se sucedendo com o fim do efeito da dose. Nesses
casos, pode haver confusão com outro tipo de discinesia que veremos mais adiante,
a discinesia bifásica, que ocorre quando esta aparece apenas no final do efeito da
dose da levodopa. Esse caso, entretanto, costuma ser mais do tipo distônico, com
menor movimentação coreica, com posturas distônicas mais fixas, predominando
em pacientes mais jovens. Quando as discinesias ocorrem desde o início do efeito
da levodopa e se mantém até o desaparecimento, ou seja, todo o período de efeito
é preenchido com discinesias, são chamadas de discinesias contínuas ou em onda
quadrada. Nessas condições, a tentativa de simplesmente fracionar mais as doses
de levodopa ou reduzir a dosagem total diária da droga não trazem o efeito desejado
de reduzir ou abolir as discinesias. Se as doses administradas são muito pequenas,
não terão nenhum efeito e, se atingirmos uma dose maior, suficiente para produzir
efeito clínico, já aparecem as discinesias.
Existe um grande estreitamento da janela terapêutica, onde a dose ideal não é
fácil de ser obtida. Os mecanismos subjacentes a essas formas de discinesias são
de vários tipos, mas envolvem modificações na fisiologia dos receptores dopami-
nérgicos9-11. Pacientes que apresentem graus reduzidos, ou mesmo médios, desse
sintoma podem não precisar de modificações no seu regime de drogas. Desde que
se necessite atuar no sentido de melhorar o quadro, uma das estratégias que vem
sendo repetidamente utilizada é a de baixar a dose de levodopa em cada uma das to-
madas, aumentando o número destas, com maior fragmentação da dose total diária.
Nem sempre isso traz o benefício que se procura, pois as doses menores podem não
ser tão eficazes nos momentos livres de discinesias. As preparações farmacêuticas
de levodopa de ação prolongada, infelizmente, não se mostraram de utilidade na
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prevenção das complicações motoras, conforme sua indicação original. Seria uma
estratégia produzir uma estimulação mais uniforme, duradoura, não pulsátil. No
entanto, na prática, isso não resultou em menor ocorrência de discinesias. Além
disso, vemos que os pacientes com muitas ocorrências desse sintoma tendem a pio-
rar quando utilizam as preparações de ação lenta.
Nos pacientes medicados apenas com a levodopa, a introdução de agonista do-
paminérgico com redução da dose da levodopa pode ser de utilidade, assim como
a retirada da selegilina. Como os agonistas dopaminérgicos produzem menos dis-
cinesias que a levodopa e poderiam atuar como uma proteção da fisiologia estriatal
em longo prazo, temos indicado a introdução dessas drogas, junto com a levodopa,
nesses pacientes. Uma reação colateral com o uso de doses terapêuticas do prami-
pexol é a produção de surtos de súbita sonolência, o que tem facilitado acidentes
automobilísticos em motoristas parkinsonianos recebendo a droga. Há vários anos,
há conhecimentos de estudos experimentais mostrando que a região subtalâmica
(o núcleo de Luys), cujas aferências são glutamatérgicas (aminoácido excitatório)
e participam do circuito indireto palidotalâmico (circuito estriado - globo pálido
lateral - núcleo subtalâmico - globo pálido interno - tálamo ventrolateral), no pa-
ciente parkinsoniano, está superestimulada, com atividade aumentada, e é uma
importante fonte de movimentos involuntários. Curiosamente, uma das drogas
antiparkinsonianas mais antigas, a amantadina, tem efeito antiglutamatérgico. Por
esse motivo, tem sido dada maior ênfase nessa droga em pacientes com discinesias,
no sentido de reduzi-las. As doses úteis podem chegar até a 500 mg ao dia. Outra
estratégia, em casos de discinesias muito importantes, é utilizar a clozapina em do-
ses baixas (12,5 mg até 100 mg ou mais, dependendo da tolerância dos pacientes).
Trata-se de um neuroléptico atípico com ação de bloqueio dos receptores D4 que
não produzem sinais extrapiramidais, ou seja, não pioram o parkinsonismo dos
pacientes. Nas pequenas doses, como utilizamos, praticamente não vemos casos
de redução acentuada dos glóbulos brancos, mas a monitorização hematológica é
obrigatória8,12.
Um terceiro tipo de discinesia é a discinesia bifásica. Nesse tipo, o paciente rece-
be a dose de levodopa em uma fase de ausência de efeito, quando está bradicinético
e rígido e, no momento em que os níveis plasmáticos da droga estão aumentando
e iniciando o seu efeito clínico, aparece uma discinesia geralmente na forma distô-
nica, sem os movimentos coreicos, que dura alguns minutos e desaparece, dando
lugar a uma melhora acentuada dos sintomas, fazendo o paciente ficar muito bem.
Após algumas horas de pleno benefício, ao término do efeito daquela dose, rea-
parece a discinesia distônica semelhante a do início, que também dura minutos e
desaparece, ficando o paciente novamente bradicinético e rígido como no início do
ciclo. Uma nova dose poderá provocar a mesma sucessão de eventos. Vemos, com
frequência, o paciente exibir apenas uma das fases de discinesia, habitualmente no
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final do efeito da dose (discinesia de final de dose) ou, então, apenas no início do
efeito da dose (discinesia de início de dose). Esses pacientes já costumam demons-
trar outras complicações motoras ou não motoras do uso crônico de levodopa. São
mais frequentes nos indivíduos jovens, com DP de início precoce. Uma alternativa
é a elevação das doses da levodopa e um maior número destas, de modo a manter
um nível de estimulação dopaminérgica mais constante. A combinação de levodopa
de ação regular com doses adicionais de levodopa de ação lenta poderia trazer be-
nefício nesses casos. Aqui, também, o mais racional seria a introdução de agonistas
dopaminérgicos para um tratamento combinado.
O aparecimento de uma distonia nos pés e pernas na forma de uma contração
muscular intensa e dolorosa, geralmente unilateral, no lado das manifestações mais
intensas, que ocorre logo ao despertar da manhã e que dura até 30 minutos ou mais,
chamada de distonia da manhã (distonia matinal), é mais um tipo de discinesia re-
lacionada à levodopa. Ocorre devido ao fato de que o paciente se encontra há várias
horas distante de sua última ingestão de levodopa, após uma noite de sono em que
os seus receptores dopaminérgicos estiveram menos estimulados pela dopamina.
Estão em um estado de supersensibilidade e isso se manifesta pela produção de uma
distonia nos membros inferiores. O curioso é que a manifestação é de tipo distônica
e nos membros inferiores. Vale a pena relembrar que as distonias não relacionadas
à DP, na infância, também tendem a se manifestar preferencialmente nos membros
inferiores, assim como as distonias que podem se relacionar a uma forma de parkin-
sonismo, como a distonia dopa-responsiva (doença de Segawa e as formas descritas
por Nygaard), além do fato de que a discinesia tardia relacionada ao uso crônico de
neurolépticos em pacientes jovens, ao invés de desencadear movimentos coreicos
ou estereotipias coreicas faciais, costumam produzir distonias. Conseguem-se bons
resultados aconselhando-se o paciente para que tome uma pequena dose de levodo-
pa logo ao despertar, antes de se levantar da cama, aguardando até 30 minutos para
o fazer, para com isso eliminar as distonias da manhã. Abalos musculares abruptos
na forma de mioclonias podem ocorrer em pacientes ao longo do tratamento com
levodopa, ou mesmo com os agonistas dopaminérgicos. De modo geral, não reque-
rem um tratamento específico, pois não trazem maiores dificuldades ou preocupa-
ções aos pacientes. Quando passam a ser um problema, podem ser tratadas com as
drogas antimioclônicas correntes, como o clonazepam ou o ácido valproico.
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pulsivos onde existe uma grande ansiedade para sua realização, e com frequentes
sentimentos de culpa posteriores. Indivíduos acometidos por esse distúrbio podem
passar horas montando e desmontando aparelhos, saindo de casa e andando sem
destino ou dirigindo o automóvel por longo tempo, voltando depois a sua atividade
habitual, sem haver ansiedade ou recriminação. Fenomenologicamente é diferente
dos comportamentos obsessivo-compulsivos ou da mania. Redução nas doses dos
medicamentos dopaminérgicos e o uso dos neurolépticos atípicos, como a clozapi-
na ou a quetiapina, devem ser considerados para seu controle14.
Em 1999, foi descrito um distúrbio do sono que ocorre em pacientes tomando o
pramipexol ou o ropirinol, como um “ataque de sono” (sleep attack) abrupto, pareci-
do com o que ocorre na narcolepsia, que foi fonte de muitos acidentes automobilís-
ticos15. Nesse caso, podemos reduzir as doses desses agentes, pois costumam ocorrer
com aqueles que ingerem doses, geralmente, acima dos 2 mg de pramipexol ao dia.
Em pacientes idosos, especialmente, podem ocorrer manifestações de falência
adrenérgica durante o tratamento, com selegilina, agonistas dopaminérgicos ou le-
vodopa. Hipotensão ortostática acentuada com estados sincopais que podem levar
pacientes a cair ao solo não são infrequentes, ao lado de incontinência urinária.
Nessas circunstâncias, deve-se rever o restante da prescrição dos pacientes, remo-
vendo-se ou diminuindo outros medicamentos que possam facilitar essas manifes-
tações, como hipotensores, diuréticos, vasodilatadores, antidepressivos tricíclicos,
entre outros. A seguir, também diminuir ou retirar as drogas antiparkinsonianas
acima citadas.
A sudorese excessiva que muitos pacientes se queixam, chegando a ponto de te-
rem de trocar de roupa durante a noite, ou mesmo durante o dia, ocorre em pacien-
tes que recebem doses maiores de levodopa, podendo se apresentar como uma das
flutuações não motoras de natureza autonômica, como apontamos anteriormente.
O propranolol pode ser uma solução para essa situação. O tratamento ativo dessa
complicação pode ser realizado com a fludrocortisona com doses iniciando em 0,1
mg ao dia e tituladas acima conforme a necessidade. Devem ser cuidadosamente
monitorizadas a função cardíaca, a formação de edemas nos membros inferiores
ou mesmo a precipitação de uma insuficiência cardíaca ou edema pulmonar. O
midodrine também pode ser utilizado, em doses variando de 2,5 mg a 10 mg ao
dia. Trata-se de um agonista alfa que possui uma ação periférica bastante eficaz na
hipotensão ortostática, com poucas manifestações colaterais.
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11
D oença de Parkinson:
tra t am ento ci rúrgico
Artur F. Schumacher Schuh
Carlos R. de Melo Rieder
11
O
tratamento cirúrgico da doença de Parkinson (DP) desenvolveu-se antes
do advento da levodopa, ainda na década de 1950, quando os primeiros
procedimentos ablativos dos núcleos da base (talamotomias e palidoto-
mias) começaram a ser utilizados em maior escala1. Esses procedimentos apresen-
tavam risco de sequelas permanentes e, por apresentarem muitas complicações
quando realizados bilateralmente, sua indicação ficou reservada para o controle de
sintomas unilaterais em casos selecionados. A introdução da levodopa na década de
1960 desencadeou uma revolução no tratamento da DP, com melhora não apenas
do tremor, mas também dos sintomas rígido-acinéticos; os procedimentos cirúrgi-
cos passaram a ser utilizados em casos excepcionais.
Apesar do grande benefício obtido com a levodopa, o uso crônico dessa medi-
cação associa-se a complicações, como flutuações da resposta motora e discinesias,
que interferem na qualidade de vida do paciente e são um desafio em termos de
controle. Com o objetivo de obter melhor domínio sobre essas complicações, na
década de 1980 foi proposto o tratamento do implante estereotáxico de eletrodos
para estimulação cerebral profunda (Deep Brain Stimulation – DBS) em pacientes
selecionados com DP2,3. Desde então, farta evidência vem sendo construída em prol
do uso desse tratamento. Este capítulo fará uma breve revisão sobre os principais
aspectos do tratamento com DBS, com ênfase na indicação e seleção dos pacientes.
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Indicação e seleção dos pacientes. Talvez um dos pontos mais críticos para o sucesso
do uso do DBS na DP é saber qual o paciente é adequado para o procedimento e
o momento certo para sua aplicação. Os critérios para uma seleção adequada de
pacientes estão apresentados na Tabela 1. Uma avaliação sistemática e cuidadosa
deve ser realizada a fim de se assegurar de que determinado paciente pode obter
benefício e, assim, evitar falsas expectativas4.
A primeira etapa é a confirmação do diagnóstico de DP e obter a maior certeza
possível de que não se trata de um caso de Parkinson atípico ou secundário. Aten-
ção especial deve ser dada aos critérios diagnósticos da doença5 e deve ser cuidado-
samente revisada a presença de sinais sugestivos de Parkinson atípico:
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caso, pesando-se os riscos e benefícios, deve ser conduzida, e idosos saudáveis com
ausência de declínio cognitivo e grande resposta ao desafio com levodopa podem
ser bons candidatos cirúrgicos.
Demência na DP é uma complicação frequente, com cerca de metade dos pa-
cientes evoluindo para esse quadro ao longo da evolução da doença10,11. O tratamen-
to cirúrgico é contraindicado em pacientes com quadros demenciais estabelecidos,
uma vez que representa um estágio avançado da doença, com o processo degenera-
tivo acometendo de maneira mais difusa o encéfalo12. São pacientes que, em geral,
apresentam muitos sintomas não responsivos à levodopa e uma doença que tende
a uma progressão mais rápida; também pode se perder a cooperação do paciente
no momento em que se faz o ajuste dos parâmetros de estimulação. O uso de DBS
em pacientes com algum grau de declínio cognitivo ainda não foi extensamente es-
tudado, e o mais prudente é submeter o paciente a uma testagem neuropsicológica
formal com pessoal capacitado caso haja suspeita de declínio cognitivo. Devido à
natureza neurodegenerativa da doença, uma vez detectada disfunção cognitiva, é
plausível prever que o risco desse paciente desenvolver demência no futuro seja
maior, o que o tornaria mau candidato para a cirurgia. O instrumento de rastreio
para disfunção cognitiva mais acessível ao clínico, o Mini Exame do Estado Mental,
é insuficiente para avaliação desses pacientes, uma vez que faz uma análise apenas
superficial e com maior ênfase em déficits de linguagem, domínio pouco acometido
na demência na DP. O MoCA (Montreal Cognitive Assessment) é sugerido como um
instrumento de rastreio cognitivo mais adequado para pacientes parkinsonianos13.
Transtornos psiquiátricos na doença de Parkinson são comuns, especialmen-
te ansiedade e depressão, esta última com uma prevalência estimada entre 20% a
50%14. Transtornos psicóticos, especialmente alucinações visuais, também podem
estar presentes, em geral secundários à terapia farmacológica. A literatura sobre
o efeito do DBS nos sintomas neuropsiquiátricos é controversa15,16, porém parece
haver uma maior incidência de suicídio no pós-operatório17. Recomenda-se ava-
liação específica e sistemática de sintomas psiquiátricos e de risco de suicídio em
pacientes candidatos à cirurgia, e deve ser instituído tratamento farmacológico ade-
quado para aqueles em que essas condições sejam identificadas. Sintomas de de-
pressão e ansiedade adequadamente controlados e com boa resposta ao tratamento
são essenciais para candidatos ao procedimento cirúrgico. Em relação aos sintomas
psicóticos, atenção deve ser dada caso eles não sejam secundários ao tratamento
farmacológico da própria doença, e ajustes na medicação devem ser considerados.
Pacientes com sintomas psicóticos leves e claramente induzidos pela terapia anti-
parkinsoniana ainda assim podem ser considerados ao tratamento cirúrgico.
Exame de imagem no pré-operatório é mandatório, preferencialmente resso-
nância magnética. Através desse exame pode ser avaliada a presença de outras pa-
tologias intracranianas que contraindiquem o procedimento neurocirúrgico, e pode
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Conclusão
O método cirúrgico de escolha para o tratamento da doença de Parkinson é o im-
plante do estimulador cerebral profundo, e cirurgias ablativas podem ser consi-
deradas apenas em casos bastante específicos. As vantagens do implante do DBS
são o fato de não produzir lesão, ser reversível e possibilitar o ajuste de diversos
parâmetros, maximizando o benefício do procedimento ao longo do tempo. O risco
cirúrgico associado é baixo e, quando bem indicado, promove melhora funcional
significativa. O ponto mais crítico para o sucesso desse procedimento é a indica-
ção e o melhor momento para sua realização. O paciente candidato é aquele com
diagnóstico de doença de Parkinson idiopática por pelo menos cinco anos, sem
achados sugestivos de parkinsonismo atípico, sem comorbidade clínica significativa
e que apresenta sintomas motores incapacitantes, especialmente flutuação motora,
discinesia e tremor, a despeito de tratamento farmacológico ótimo. Com exceção
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para os casos de tremor refratário, resposta motora significativa após o teste com
levodopa (>30% de melhora no escore motor da UPDRS) é outro forte fator predi-
tor de boa resposta ao procedimento. Atenção especial deve ser dada para a função
cognitiva, pois pacientes com demência não devem ser submetidos ao procedimen-
to e aqueles com transtornos neuropsiquiátricos devem ter seus sintomas satisfato-
riamente controlados no pré-operatório.
O uso do DBS no tratamento da doença de Parkinson e nos distúrbios neuropsi
quiátricos em geral é um campo em evolução e novas indicações e procedimentos
vêm sendo estudados. O uso do DBS em pacientes com DP em fase mais inicial tem
demonstrado sucesso nos últimos ensaios clínicos e novos alvos vêm sendo testados
na tentativa de melhorar outros sintomas, como o uso da estimulação no núcleo
pedunculopontino para instabilidade postural.
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151
12
Coreia , atetose e
balismo
Roberta Arb Saba
12
C
oreia (do grego “dança”) caracteriza-se por movimentos involuntários, irre-
gulares, rápidos e arrítmicos que podem acometer qualquer parte do corpo,
incluindo face, tronco e extremidades. Os movimentos são desprovidos de
qualquer propósito, muitas vezes rápidos, e mais intensos nas extremidades distais.
A gravidade é variável; pode ser discreta, na qual há uma sensação de inquietude,
como se o indivíduo não conseguisse ficar parado, ou, ainda, apresentar movimen-
tos de revirar os olhos e de elevação rápida dos ombros. Quando os movimentos são
mais intensos e generalizados, vários segmentos do corpo são acometidos, levando
o paciente a um estado de intensa inquietude e fadiga muscular, sendo estes os
casos de coreia generalizada. Há ainda os casos de hemicoreia, caracterizados por
movimentos que ocorrem apenas em um hemicorpo. Utilizamos o termo síndrome
coreica, pois geralmente os indivíduos apresentam outros sintomas além do movi-
mento coreico.
As primeiras associações entre coreia e etiologias específicas datam do século
XVII. Em 1661, Felix Meyer observou a associação entre coreia e gravidez. Em 1675,
Sir Thomas Sydenham fez uma descrição detalhada da manifestação coreica que
ocorria na infância, descrevendo pela primeira vez a “coreia reumática”. O caráter
hereditário de algumas coreias foi descrito pela primeira vez, em 1808, por Irving
Lyon, e, em 1872, George Huntington descreveu detalhadamente aquela que ele
denominou “coreia hereditária”1. Recentemente, a coreia tem sido associada a di-
ferentes doenças sistêmicas, ao uso de determinadas drogas e a distúrbios metabó-
licos. De um modo geral, pode-se dizer que a coreia é um distúrbio decorrente de
anormalidade no funcionamento dos núcleos da base.
Os termos coreia, atetose e balismo às vezes são utilizados indiscriminadamen-
te. O balismo e a atetose são os principais distúrbios do movimento que devem ser
lembrados no diagnóstico diferencial.
Balismo é caracterizado por movimentos involuntários acometendo preferen-
cialmente a porção proximal dos membros; possui grande amplitude, levando a
amplo deslocamento das extremidades. Costuma manifestar-se de um único lado
do corpo e, nesse caso, é denominado hemibalismo.
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trans torn os do movimento : d ia g n ó stic o e tr a ta m en to
Coreias hereditárias
Um exemplo clássico de coreia hereditária é a doença de Huntigton, a qual tem
herança autossômica dominante e caracteriza-se pelo aumento do número de base
CAG no braço curto do cromossomo 4. Tal doença será discutida no Capítulo 13
- Doença de Huntington e síndromes Huntington-like. Dentre as coreias hereditá-
rias, podemos destacar ainda a coreia familiar benigna e a atrofia dentato-rubro-
-pálido-luisiana (DRPLA).
Coreia familiar benigna. Descrita pela primeira vez por Haerer, em 1967, a coreia fa-
miliar benigna (CFB) é uma doença autossômica dominante rara que manifesta-se
por movimentos coreicos que se instalam nos primeiros anos de vida e caracteriza-
-se pela ausência de comprometimento mental marcante e progressivo, tal como
ocorre na doença de Huntington, permanecendo com quadro estável no decorrer
dos anos4. Além dos movimentos coreicos, outros sintomas podem estar associa-
dos, como ataxia, disartria, sinais piramidais e tremor postural. O gene associado,
NKX2-1 (anteriormente chamado TITF1), é essencial para a organogênese da tiroi-
de, gânglios da base e pulmões5. Estudo realizado recentemente analisou achados
clínicos, genéticos, de tratamento e dados de acompanhamento em 28 pacientes
de 13 famílias com NKX2-1 mutante. Todos os pacientes apresentavam mutação,
incluindo sete novas formas, três anteriormente relatadas e três deleções esporádi-
cas abrangendo o gene NKX2-1. Hipotonia e coreia estavam presentes no início da
infância, sendo que distonia, mioclonia e tiques estavam frequentemente associa-
dos, assim como o déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Como conclusão, o
estudo mostra que coreia de início precoce precedida por hipotonia é sugestivo de
BHC (coreia hereditária benigna); distúrbios respiratórios ou alteração da tireoide
podem apoiar ainda mais o diagnóstico e a tetrabenazina pode ser uma opção inte-
ressante para tratamento dos movimentos coreicos6.
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Coreia autoimune
As coreias de etiologia autoimunes mais comuns estão relacionadas ao lúpus erite-
matoso sistêmico e aos quadros infecciosos por estreptococo, ocasionando a coreia
de Sydenham. Tais doenças serão discutidas no Capítulo 14 - Transtornos dos mo-
vimentos associados a doenças infecciosas e autoimunes.
Coreia senil
Os movimentos coreicos ocorrem de forma insidiosa, em indivíduos a partir dos 60
anos de idade, sem comprometimento cognitivo, envolvendo os membros e, pos-
teriormente, podendo se tornar generalizada. Não há história familiar sendo sua
etiologia indeterminada.
Coreia gravídica
Gravidez é uma condição não neurológica que pode raramente cursar com movi-
mentos coreicos, é o que denominamos coreia gravídica (CG). Tal quadro é mais
frequente em mulheres com antecedente de episódios coreicos, em especial a coreia
de Sydenham. Atualmente, devido ao adequado tratamento com antibioticoterapia
dos quadros de febre reumática, a maioria dos casos de coreia que surgem durante
a gravidez é causada por outras doenças como, por exemplo, lúpus eritematoso
sistêmico e doença de Huntington. Cerca de metade dos casos é idiopática, seguida
por febre reumática e síndrome antifosfolípide8. A causa mais provável da coreia
gravídica é a reativação, por algum mecanismo de lesão subclínica, dos núcleos da
base, resultante de encefalopatia reumática anterior. Contraceptivos orais e possi-
velmente outros mecanismos podem ativar o mesmo mecanismo. Uma teoria é de
que hormônios como o estrógeno e a progesterona podem sensibilizar os recepto-
res de dopamina no estriado e induzir a coreia em indivíduos que são vulneráveis
a essa complicação em virtude de patologia preexistente nos núcleos da base. A
maioria dos pacientes com coreia gravídica é jovem, geralmente com ocorrência no
primeiro trimestre da gravidez, sendo que um terço surge no segundo semestre9.
Recidivas podem ocorrer em gestações subsequentes, particularmente se a síndro-
me antifosfolípide é a causa.
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núcleos da base têm sido exaustivamente estudados por estarem relacionados com
a motricidade e com diferentes aspectos do comportamento humano. As manifes-
tações clínicas dessa patologia, quando presentes, podem ser neurológicas, psiquiá-
tricas ou neuropsicológicas, caracterizadas por distúrbios do movimento (parkin-
soniano, tremor, rigidez, distonia, mioclonia, coreia, atetose, mutismo, hemicoreia,
hemibalismo), crises epilépticas, alterações cognitivas, distúrbios do comportamen-
to com apatia, retraimento social, abandono das atividades habituais, transtorno
obsessivo-compulsivo, alterações de personalidade, psicose esquizofreniforme e
dependência química15.
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Paralisia cerebral
A forma espástica é de longe o tipo clínico mais comum de paralisia cerebral (PC),
com uma prevalência de cerca de 80%, seguido pela forma discinética, que possui
aproximadamente 6,5% e 14,4%18. De acordo com a SCPE (Surveillance of Cerebral
Palsy in Europe), a PC discinética é caracterizada por movimentos involuntários,
arrítmicos, recorrentes, por vezes estereotipados, nos quais os padrões reflexos pri-
mitivos predominam e tônus muscular é variável19. A distonia é o movimento mais
frequente, porém a coreoatetose também pode ser observada nos casos de PC disci-
nética. É sabido que o surgimento da distonia e da coreoatetose está principalmente
associado a lesões cerebrais nos núcleos da base; no entanto, a sua fisiopatologia é
complexa e não completamente elucidada.
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13
DO ENÇA DE HUNT INGTON
e Sí ndromes
h unt i ng ton-like
Mônica Santoro Haddad
13
A
doença de Huntington (DH) é uma afecção heredodegenerativa do sistema
nervoso central (SNC) caracterizada por alterações motoras e mentais pro-
gressivas. Foi descrita em 1872 por George Huntington, de modo sucinto
porém preciso, e, por isso, em pouco tempo seu nome estava definitivamente vin-
culado à doença em todo o mundo. A DH é o protótipo de coreia genética, sendo
possivelmente a forma mais comum de coreia degenerativa no adulto. Entretanto,
as manifestações clínicas da DH são muito mais extensas do que a presença do mo-
vimento involuntário do tipo coreico, sendo por isso preferível o termo DH ao invés
de Coreia de Huntington.
Especialmente a partir de 1970, grande quantidade de conhecimentos têm se
acumulado sobre a DH, culminando com a descoberta de seu defeito genético no
início da década de 19901. Esforços colaborativos concentram-se na compreensão
dos mecanismos fisiopatológicos da doença e na busca de possibilidades terapêuti-
cas eficazes que possam alterar o prognóstico das famílias acometidas.
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Sinais cerebelares, tanto axiais como apendiculares, são bastante raros na DH.
A marcha dos pacientes com DH é característica, constantemente parasitada
por movimentos coreicos, assumindo caráter incoordenado na sua aparência e po-
dendo chegar a tornar-se impossível. Os pacientes apresentam também instabilida-
de postural e alterações primárias do equilíbrio, com quedas frequentes e fraturas e
traumatismos cranioencefálicos delas decorrentes.
Desordens da movimentação ocular extrínseca são comuns e, através de técni-
cas de eletro-oculografia, são demonstradas em 60% a 80% dos pacientes; ocorrem
como lentificação de sacadas (latência aumentada e velocidade diminuída) em to-
das as direções do olhar, além de diminuição da fase rápida do nistagmo vestibular
e optocinético e dismetria de sacadas.
Embora o tono muscular possa ser normal ou diminuído (hipotonia), especial-
mente nas fases iniciais, pacientes com DH desenvolvem hipertonia em alguma
fase da doença. Essa hipertonia pode ser do tipo rigidez (com ou sem sinal da roda
denteada) ou espasticidade (com ou sem sinal do canivete). A rigidez ocorre mais
comumente nos extremos etários. Os sinais piramidais, incluindo espasticidade, hi-
perreflexia, resposta plantar em extensão, abolição do reflexo cutâneo-abdominal e
clono, podem estar presentes em até um terço dos casos.
Bradicinesia, associada ou não à rigidez, acontece nas fases mais avançadas da
doença, com lentificação extrema de todos os movimentos. Esse sintoma está dire-
tamente relacionado com a incapacidade funcional dos pacientes e ocorre indepen-
dentemente da coreia.
Incontinência esfincteriana, tanto vesical quanto anal, é frequente, sobretudo
nas fases terminais da DH. Há evidências de disfunção autonômica como hiperidro-
se e alterações na regulação da pressão arterial. Crises convulsivas tônico-clônicas
generalizadas podem ocorrer em até 3% dos adultos com DH e em aproximada-
mente 40% dos pacientes com início precoce da doença (abaixo dos 20 anos), assim
como podem acontecer outros tipos de crises epilépticas.
Assim, observa-se que, além dos movimentos involuntários, há na DH um pre-
juízo da motricidade voluntária como um todo, o que fica evidente pelas alterações
já descritas3.
Alterações mentais
Alterações psiquiátricas e cognitivas podem preceder as manifestações motoras,
serem concomitantes a elas ou ocorrerem após, e apenas excepcionalmente não são
observadas na DH. A demência é considerada um dos sinais cardinais dessa doença.
Testes neuropsicológicos padronizados têm sido utilizados para a avaliação do
declínio cognitivo na DH, nos quais os pacientes demonstram grande prejuízo nas
tarefas motoras, solução de problemas, memória e concentração.
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Alterações psiquiátricas
A presença de sintomas psiquiátricos entre os pacientes com DH varia de 35% a
73%, e uma multiplicidade de distúrbios é relatada: alterações de personalidade,
transtornos do humor, psicoses e outros, além de associações entre eles. Os distúr-
bios psiquiátricos são muito desafiadores, em termos de tratamento, e acarretam
grandes problemas ao paciente e aos cuidadores, em termos funcionais4.
Alterações de personalidade são os sintomas psiquiátricos mais comumente en-
contrados, e incluem irritabilidade, apatia, labilidade emocional, impulsividade e
agressividade.
Alterações de humor, notadamente depressão, ocorrem em cerca de 30% dos
pacientes. A depressão é mais comum naqueles com início tardio da DH; pode pre-
ceder os sintomas motores e parece ser mais frequente em algumas famílias que em
outras.
A frequência de suicídios na DH é 4 a 6 vezes maior que na população geral,
e tais índices elevam-se para 8 a 20 vezes nos pacientes acima de 50 anos. Idea-
ção suicida está presente em aproximadamente 10% dos indivíduos diagnosticados
com DH.
Episódios de mania também podem ser encontrados, menos comumente, e
psicose esquizofreniforme ocorre de 6% a 25% dos casos; esta é caracterizada por
quadros paranoides, com delírios persecutórios, de ciúme e alucinações auditivas.
Os quadros com apresentação psicótica costumam ser mais frequentes entre os
pacientes com idade de início mais precoce.
Outros distúrbios psiquiátricos incluem: irritabilidade, agitação e agressivi-
dade, transtorno e comportamento obsessivo-compulsivos, queixas psicosso-
máticas, ansiedade, alterações de comportamento sexual e parafilias.
Além dessas manifestações, podem ocorrer, sem explicação razoável, emagre-
cimento intenso, que chega à caquexia nos estágios avançados, e envelhecimento
precoce.
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Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial da DH inclui, a princípio, todas as condições clínicas que
podem apresentar-se com quadro coreico proeminente mas que, na prática, podem
ser facilmente distinguidas. Pode haver mais dificuldade na distinção de doenças
em que, além das manifestações coreicas, exista componente hereditário ou fami-
liar, algumas das quais discorremos mais à frente. Em geral, apresentam-se como
quadros de evolução crônica e progressiva, nos quais comumente se associam ou-
tros sinais e sintomas neurológicos. Os diferentes modos de herança, curso clíni-
co e prognóstico, além de achados de exames complementares em algumas dessas
moléstias, tornam essa diferenciação possível. As causas genéticas das coreias são
muitas e elas só vêm crescendo.
Entre as doenças não hereditárias, as discinesias tardias podem oferecer alguma
dificuldade. Pacientes com DH com apresentação predominantemente psiquiátrica
podem ser, a princípio, diagnosticados como portadores de esquizofrenia ou de-
pressão. O advento de movimentos involuntários pode ser incorretamente inter-
pretado como complicação da terapêutica, mas o que pode fazer a diferença é a
história familiar detalhada.
Cumpre ressaltar, entretanto, que a ausência de história familiar não exclui, de
modo algum, um quadro genético, podendo ocorrer em casos de doenças com pe-
netrância reduzida, doenças autossômicas recessivas em famílias pequenas, muta-
ções, morte precoce do genitor afetado ou paternidade duvidosa5. Também é rele-
vante, independente da história familiar, que, em pacientes com síndromes coreicas
na juventude (até 40 a 45 anos), seja descartada doença de Wilson, pedindo-se sem-
pre a dosagem de ceruloplasmina. Diante do extenso diagnóstico diferencial das
coreias de causa genética sugerimos como regra prática de abordagem diagnóstica
que, em pacientes adultos, com quadros coreicos crônicos e progressivos (com ou
sem história familiar), seja inicialmente solicitada PCR para DH. Naqueles em que
esse teste é negativo, ou seja, não se demonstra a expansão de trinucleotídeos CAG
no gene Htt, abrimos a chave para outros diagnósticos, que, genericamente, podem
ser chamados de fenocópias para DH6. Isso ocorre em aproximadamente 2% a 7%
dos casos com fenótipo típico de DH. Inicialmente, esses casos sem diagnóstico fo-
ram denominados como sendo portadores de doenças Huntington-like (HL), sendo
pacientes com quadro clínico muitas vezes indistinguível dos portadores de DH,
mas sem o defeito genético. Atualmente, inclui-se nesse grupo, além dos casos de
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Tratamento
Até o presente momento, é possível apenas o tratamento sintomático, visando re-
duzir os sintomas motores e comportamentais e, assim, maximizar a capacidade
funcional do indivíduo afetado. O tratamento da coreia é feito com antagonistas
dopaminérgicos com alta afinidade por receptores D2, levando-se em considera-
ção que haveria uma hiperfunção dopaminérgica, ao menos relativa, contribuindo
para os movimentos coreiformes na DH. O tratamento da coreia deve ser instituído
quando ela causa prejuízo funcional, como disfagia e quedas, ou prejuízo social,
com estigmatização pela presença dos movimentos involuntários.
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Trans tornos dos
m ovim ent os associados
a doen ças infecciosas e
aut oim u nes
Ricardo H.O. Maciel
Débora Pal ma Maia
Francisco Cardoso
14
D
oenças sistêmicas autoimunes e infecciosas frequentemente afetam o sis-
tema nervoso central e os transtornos dos movimentos podem ser a ma-
nifestação inicial ou predominante do seu acometimento. Diferentes me-
canismos podem contribuir, isoladamente ou em associação, para produção de um
movimento anormal em doenças sistêmicas, incluindo lesão direta sobre os núcleos
da base e suas conexões, inflamação mediada por anticorpos e isquemia secundária
a vasculite1. São doenças mais prevalentes na população jovem e, portanto, com
grande impacto socioeconômico sobre uma população. Durante a investigação
clínica de um distúrbio do movimento, é importante estar atento à possibilidade
dessas etiologias no diagnóstico diferencial, devido à chance de tratamento e rever-
sibilidade do quadro.
As Tabelas 1 e 2, a seguir, listam as principais doenças infecciosas e autoimunes
relacionadas a transtornos dos movimentos em nosso meio. A esclerose múltipla
não será abordada neste capítulo, porém pode-se encontrar uma recente revisão
sobre o tema em Mehanna e Jankovic2.
Coreia de Sydenham
A coreia de Sydenham (CS) foi originalmente descrita por Thomas Sydenham no
século XVII, embora existam registros de movimentos coreicos na literatura mé-
dica desde Paracelsus, na Idade Média. A CS é uma das manifestações da febre
reumática, doença autoimune pós-infecciosa relacionada à infecção pelo estrepto-
coco beta-hemolítico do grupo A. A CS ainda é a principal causa de coreia aguda
em crianças, apesar da diminuição da incidência da doença em países industriali-
zados. A sua fisiopatologia está relacionada ao ataque autoimune dos núcleos da
base induzido por autoanticorpos produzidos contra a proteína M do estreptococo.
Pacientes com CS apresentam hiperperfusão dos núcleos da base3 e maior con-
centração no soro de anticorpos antigânglios da base, em relação a pacientes com
febre reumática sem coreia ou controles sadios4. Os anticorpos antinúcleos da base
provocam movimentos hipercinéticos em ratos com disfunção prévia da via dopa-
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Encefalites autoimunes
As encefalites autoimunes são um grupo de doenças neurológicas subagudas as-
sociadas a anticorpos que reconhecem antígenos neuronais (incluindo proteínas
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em geral se inicia na quinta ou sexta década de vida e 86% dos pacientes são do sexo
feminino. Diabetes mellitus tipo 1 está presente em cerca de 35% dos pacientes26.
Raramente, podem ocorrer formas incompletas da doença, acometendo apenas um
dos membros superiores ou inferiores. O tratamento envolve terapia imunomodula-
dora com imunoglobulina ou plasmaférese, além de benzodiazepínicos, baclofeno e
relaxantes musculares para alívio sintomático. Em 85% dos pacientes, a doença está
associada à presença de anticorpos contra a isoforma 65 da descarboxilase do ácido
glutâmico (GAD-65). O anti-GAD também foi associado a outras síndromes neuro-
lógicas, como ataxia cerebelar, encefalite límbica, tremor palatal e epilepsia refratá-
ria. Outros anticorpos relacionados à doença são a anti-anfifisina (usualmente asso-
ciada a câncer de pequenas células de pulmão ou de mama), antiproteína associada
ao receptor de GABAA (GABARAP) e anti-subunidade α do receptor de glicina.
A síndrome do homem rígido pode fazer parte do espectro da encefalomielite
progressiva com rigidez, em que, além dos sintomas citados, os pacientes apresen-
tam sinais de acometimento do tronco cerebral, como nistagmo, oftalmoparesia,
disartria, disfagia, surdez neurossensorial, opsoclonus e instabilidade autonômica
grave. Nessa variante da doença, a resposta ao tratamento em geral é incompleta e a
maioria dos pacientes tende ao óbito após cerca de dois ou três anos27.
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Neurocisticercose
A infecção pelo cisticerco da Taenia solium é a principal doença parasitária do siste-
ma nervoso central no Brasil. Embora o envolvimento dos núcleos da base pelos cis-
ticercos seja frequente, raramente essas lesões produzem sintomas, sendo, em sua
maioria, silenciosas32. O principal transtorno do movimento associado à doença é o
parkinsonismo reversível secundário à hidrocefalia obstrutiva em casos de neurocis-
ticercose ventricular. Em pacientes com infecção maciça do SNC, o parkinsonismo
pode acontecer no contexto de encefalite pela cisticercose, associado a outros sinais
neurológicos como confusão mental e crises convulsivas. Raramente foram relata-
dos casos de tremor, distonia, mioclonia, hemibalismo, coreia e espasmo hemifacial.
Tuberculose
Movimentos anormais podem ocorrer entre 16% a 19% dos pacientes com menin-
gite tuberculosa33. Os transtornos dos movimentos mais frequentes são tremor e
coreia. O tremor, em geral, é unilateral, postural e cinético, e podem acontecer
hemicoreia ou coreia generalizada. Também foram descritos distonia, focal ou ge-
neralizada, mioclonias e parkinsonismo. O principal mecanismo proposto para a
ocorrência de distúrbios dos movimentos em pacientes com meningite tuberculosa
é a ocorrência de infartos nos núcleos da base ou tálamo secundários à vasculite
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Encefalites virais
A encefalite letárgica relacionada ao vírus da influenza foi descrita em 1917 como
uma das principais causa de parkinsonismo pós-encefalítico. Desde 1930, a doen-
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D oen ça de Wilson
e trans tor nos do
m ovim ent o associados
a depósito de metais
Egbert o Reis Barbosa
Alexandre Aluízio Costa Machado
15
E
ntre os 23 elementos químicos com funções fisiológicas conhecidas no or-
ganismo humano, 12 são metais, que desempenham funções estruturais, re-
gulatórias e catalíticas em diferentes tipos de proteínas (enzimas, receptores
e transportadores) cruciais para preservação das células e, como consequência, da
vida1. Deficiências de aporte nutricional, alterações genéticas e por outro lado ex-
posição a níveis tóxicos desses metais podem levar a uma série de condições pato-
lógicas entre as quais várias que envolvem o sistema nervoso central. De particular
importância no campo dos transtornos do movimento estão as afecções relaciona-
das a quebra da homeostase do cobre, do ferro e do manganês.
Doença de Wilson
A doença de Wilson (DW) ou degeneração hepatolenticular progressiva foi ini-
cialmente descrita por Samuel A.K. Wilson em 19122. É de ocorrência universal,
sendo mais prevalente em populações com maior consanguinidade, já que é doença
genética com padrão autossômico recessivo, com penetrância completa. Os indiví-
duos homozigotos sempre desenvolvem a moléstia, e o risco dos irmãos é de 25%,
devendo ser obrigatoriamente investigados. A prevalência da DW situa-se entre
1 para 30.000 e 1 para 40.000, e a prevalência de heterozigotos (carreadores) é de
aproximadamente 1 para 903.
O gene afetado é o da proteína ATP7B (13q14.3), que é essencial no transporte
e distribuição do cobre no hepatócito. Mais de 400 tipos de mutações que levam à
disfunção variável da ATP7B já foram descritas nesse gene. No Brasil, em estudo
realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP), encontrou-se um predomínio das mutações 3042DelC (mis-
sence mutation) e L708P (point mutation), que foram detectadas em quase metade
dos casos analisados4. Por outro lado, em recente estudo desenvolvido por Bem et
al.5 no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina Universidade Federal do
Paraná, os autores constataram que, entre as mutações no gene da ATP7B encon-
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D o en ç a d e W ilso n e transto rnos
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Manifestações
hepáticas
Manifestações
Anemia neurológicas e
Assintomático hemolítica psiquiátricas
Manifestações
hepáticas
Doença de Wilson
Hepáticas Distonia
Oftalmológicas Parkinsonismo
Esqueléticas Quadro cerebelar
Hematológicas
Renais Disartria
Cardíacas Alterações da marcha
Dermatológicas
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Figura 4. Alterações de RM (T2) na DW. [A] 4A: Hipersinal em núcleo caudado e putâmen. [B] 4B: Hipersinal em mesencéfalo
(Sinal do Panda).
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ainda estes últimos como opção inicial. Ressalte-se que, nos pacientes com manifes-
tações com quadro hepático, sem manifestações neurológicas, o uso dos quelantes
para início do tratamento não é questionado.
A associação dos quelantes com os sais de zinco, mesmo que em horários distin-
tos, pode prejudicar a ação de ambas medicações, não sendo portanto uma opção
de tratamento que se possa recomendar.
O tetratiomolibidato é outra droga em estudo há vários anos para o tratamento
de pacientes com DW com manifestações neurológicas, como uma opção de menor
risco de piora neurológica.
A ação depletora de cobre do tetratiomolibdato é peculiar e envolve dois meca-
nismos. O primeiro ocorre no lúmen intestinal, onde essa droga forma complexos
com o cobre dos alimentos evitando sua absorção. A outra forma de atuação da
droga se desenvolve quando é ingerida distante das refeições; nessa situação, é rapi-
damente absorvida e, no sangue, forma complexos tripartidos com a albumina e o
cobre livre, neutralizando a ação tóxica desse metal. A dose recomendada é de seis
tomadas diárias de 20 mg, sendo três às refeições e outras três nos intervalos das
mesmas.
O tetratiomolibdato pode ter efeito tóxico sobre a medula óssea, provocando
depressão medular. Por essa razão, a proposta de uso dessa droga é apenas para fase
inicial do tratamento, por um período curto de oito semanas, quando então deve
ser substituída por outra menos tóxica para a fase de manutenção. O seu uso ainda
não está aprovado.
O transplante de fígado é indicado somente para os casos com comprometi-
mento hepático grave que não respondem ao tratamento com quelantes ou falência
hepática aguda10.
O tratamento sintomático pode trazer benefícios significativos nos pacientes
com distonia importante. O emprego da toxina botulínica e a correção cirúrgica
ortopédica de posturas articulares fixas trazem melhora funcional, quando criterio-
samente indicadas.
Os principais parâmetros para se avaliar a eficácia do tratamento são: evolução
do quadro clínico (a melhora é lenta, ao longo de meses), níveis de excreção urinária
de cobre (devem cair gradativamente), regressão do anel de K-F (ao longo de meses
ou anos) e regressão, ainda que geralmente parcial, das alterações na RM11.
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Apoio:
�1�0�6������-2013�����VIR-00676-2013