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ARTIGOS Evolugao das Politicas eda Admimistracao da Educagao em Portugal JORO FORMOSINHO JOAQUIM MACHADO Universidade do Minho, Portugal RESUMO ‘Arnosta itu da croluo das potas e da administsgio da efagio parte da tens ente cetalzagioe descestlizagio administra, entenddas como formas politica de ozatiaaso do Estado e fo camo meros process técicas para asepatt a efcicia da administra. Asi, revitamos o debate sobre cetazaio e descentalizario dos anos 198) assinalamos a tensfoente ima retrcaGescentaizadon e pritias de desconcentragéo dis escoli Nest perspec, anzisamos quero programa de seforgo da autonomia das escols quer as pocas de r-cenresio do XV Goverao Consttacional: nomeadamente as polticas de recutamento ¢ clocasio dos professotes, de avalueio das escoas, de ageapamento de cseolts ede muniipaizacio da educa, Fidaeraschave: Centeiago - Descestulinagio Conon de professors ~ Avalago dis escoas - Agraparento de esos - Monicpaiago da educogio A. Constituigio da Repérica Portuguesa de 1976 instivacionaliza 0 regime democratico instaurado pela “Revolugio de Absil” de 1974 © consagia a descenttalizagio administrativa como garante do exercicio democritico do poder (art® 239°). Aplicando, dez anos depois, esta concepgio de Estado democritico ¢ descentralizado no dominio da educacio, a Lat te Bases do Sistona Edvcaivo (Lei n° 14/86, de 14 de Outubro) supera 2 concepeio de democratizagio ja presente na Reforma Veiga Simfo (Lei n° 5/73, de 25 de Julho) ¢ entendida como reforgo na distrbuicio dos recursos educativos (escolas, professores, dotagiies financeiras,curs0s), na igualdade no acesso (gratutidade, apoios sécio-econdmicos, distibuigio geogréfica dos cestabelecimentos de ensino) ¢ na igualdade de sucesso (alteragdes curticulases, formacio profissional de docentese técaicos de educacio, métodos pedagégicos ¢ aplicacio de novas tecnologias educativas)..A concepcio de democratizagio presente na LBSE inclu “wma dtibigo de poder was deer edatvs, aos da estan dos gia da partipgin poplar na defi a poltica ea dies eat dos estabulimenos de ensna” (Eermandes, 1988: 507) Com esta afiemagio da “ont, no siema educa, de um praia de cenros de decisnnndependents ete 5, oa, desonnlzades em _poderes pris (camptércias)" Peas, 1988: 506), 2 BSE introduz uma inovagio que & divesificagio des estroturas © actividades educativas faz corresponder a diversiicagio dos poderes e dos agentes responsives, Neste texto, perspectivamos 2 evolucio das politicas € da administeagio da educagio a parti desta tensio entre centralizacio e descentralizagio administrativas, entendidas como formas politicas de orguniza¢io do Estado e nfo como metos processos téenicos para assegarar a eficacia da administracio. Por isso, nfio identficamos a desconcentragio com descentralizacio, porguanto aquela tanto pode ser um instrumento a0 sexvico da centraizagao do poder como um cotolitio da descentralizagio. Colocada ao servigo da centtalizagio do poder, a aplicacio do principio da desconcentaco justifica-se por “sazdes téenicas que tém a ver com a 06> 07 celcridade, a eficicia e o ajuste da decisio administrativa as situagies concretas verificadas 2 nivel local”, bem como coma libertagio dos érgios centrais de “umacervo de decis6es instrumentais” para poderem concentrar as suas actividades nas fungdes de direccio, supervisio ¢ controlo. Entendlida como corolitio da descentralizacio, a desconcentracio dé conta dos efeitos da disteibuigo de poderes operada num modelo desceatralizado desconcentrado por oposigio 20 modelo centralizado concentrado que era dominante antes da LBSE, Na verdade, a desconcentragio administrative evita a concentragio de poderes, enquanto a descentralizagio propriamente dita consiste a institucionalizacio de centros auténomos de decisao através da autonomizagio das funges administrativas © da descentealizacio territorial (Peenandes, 1988: 512-513). ‘As Glkimas daas décadas foram marcadis, em Portugal, pela «ersitorializacto» das politicas educativas, com “novos espagos” e “novos evens” (Charlot, 1994). Com efeito, a partir dos anos 80 afirma-se uma vontade de desconcentragio e descentralizagio que pretende romper com a logica das décadas anteriores, impulsione o ressurgimento da selaco da escola com 0 terstério local, apela & mobilizagio dos actotes locais ¢ 2 inovacio sobre o terreno € mobiliza discursivamente as nocies de tertitério escolar, espagos de formacio, contrato, parcetia € rede, Centralicasio, descentralizagio ¢ préticas de desconcentragio ‘A ligecio da escola ao tetsitério local emerge a partir da LBSE, através da introdugio de uma concepgio de escola, nio jé como *servico local de estado”, mas como “comunidade educativa” (Formosinho, 19892) ¢ retoma 0 sentido da acco das populagdes locais que esteve na origem e desenvolvimento da escola antes de esta vi ligarse directamente a um Estado que, através dela, procura a sua legitimacio. Colocundo o sistema educativo 20 servigo, nfo s6 do desenvolvimento global da personalidade dos educandos, mas também do progresso social ¢ da democtatizagio da sociedade (art? 1°, n° 2), 2 LBSE prevé quer o plancamento e reorganizagio da rede escolar quer a construgio ¢ manutencio dos edificios escolares e seu equipamento num quacro politico de “egionalizaco efectiva” e de definicio de competéncias dos diversos intervenientes (art? 38°) Prevé, pot isso, que “pss education deve er dota de extras adinicirations 4 abito nacional, rajonal axtinoms, ronal ¢ lool, que swrem a sa interligasio vm a comenidade mediante deguades rans de parka des prewar, dos leno, das amis, cas ankergnics, denies riproentaias dos cstvdaes suis, eons + eta anda de ntti criteria”, pelo que seriam adoptadas oxginicas ¢ formas de descentralizagio © de descancentragio dos ‘servigos (att? 43°, 0% 2.¢ 3), Preconiza ainda a etiacio em cada regido de um departamento regional de educagio “com © objectivo de integrar, coordenar ¢ acompanhar a actividade elucativa” (art® 44°, n° 2) e estabelece, por um lado, que 0 funcionamento dos estabelecimentos de educagio ¢ ensino se oriente por “uma perspectiva de intepracio comunittia, sendo, nesse sentido, favorecida a fixagio local dos respectivos dacentes”, ¢, por outto, gue a “direcgio de cada estabelecimento on grupo de estabelecimentos dos ensinos bisico e secunditio” scja assegurada por érgios proprios e que a sua administracio ¢ gestio seja orientada por “principios de democraticidade e de particpagio de todos os implicados no processo educative” (art? 45°, n’s 1, 2 ed), O ressurgimento da relagio da escola go territétio local pretende, assim, inverter uma légica que, & vez, universalizou ¢ uniformizou as escolas através da nasionalizasio do ensino © que, em. nome da igualdade, contribuiu para acentuar os desequilfbrios regionais. A nova logica preteade doravante tomar em conta a diversidade do expago educative local, reformular © papel do estado na gestio da educagio, redistibuir fungdes por varios patamares da administragio € instaurar novas relagdes entre as comunidades locais € © sistema educative através da sua participacio na direegio da escola piblica. Neste sentido, com Bernard Charlot (1994: 27-28) podemos afirmar que a tertitorializagio das politicas educativas vem a set, também ela, “uma politica nacional” num. contexto de “ctise” de Jegitimagio da acgio do Bstado, que, sompeodo com uma légica que fava da educagio uma tarefa do Estado ~ de um Estado educador, primeiro, € de um Estado promotor do desenvolvimento, depois = delega poderes nas escolas e nas conmnidades em que clas se inserem, reservando-se uum papel de regulagio € controlo, a montante e a jusaate. Por isso, em qualquer proceso de reorganizacio das estruturas de admninistracio de edlueacio devem ser considerados trés aspectos: as competéncias attibuidas aosestabelecimentos de educagio eensino, a distibuigio de competéncias entre os varios niveis de administracio = centtal, regional, local ¢ institucional (Fernandes, 1988) - ¢ a articulagko entre estes niveis, Como se pode ler na Proparia Global de Reforma apreséntada pela Comissio de Reforma do Sistema Educativo (CRSE, 1998b: 497-498), a importincia destes aspectos advém do carécter de autonomia de cada instituigio, traduzida na possibilidede, mais o menos alargada, dc assumir um rosto ¢ uma vocasio propria (que se joga no 1° aspecto), da légica de funcionamento do sistema € da interacciio entre as instituigées edueativas € as comunidades que elas servem (que se reflecte no 2 aspecto) ¢ da disciplina funcional do sistema, do cequiibrio de poderes e de uma dialectics evolutiva de competéncias convergentes nos mesmos objectivos {que 0 3° aspecto contempla). ‘A. discussio das propostas de adminisiragio das eseolas no Ambito da Comissito de Reforma do Sistema Educativo (CRSE) anda, assim, em torno das concepgdes de democracia presentes na Constitui¢io da Repiblica Portuguesa, a democracia representativa centralizada e a democracia participativa descentralizada. Bnquanto, ‘na primeita concepgio, o Estado a tinica entidade politicamente relevante e a administragio central suporte executivo das suas decisdes, a segunda, embora continue aésente na intervencZo dos cidadios através do voto num quadro de Estado de Discito ¢ de democracia parlamentar ¢ n0 papel mediador dos partidos, composta ainda corpos intermédios entre 0 Estado ¢ 0s cidadios,cuja participagio nfo se reduz 20 voto, Se na democracia tepresentativa centralizada se fala do direito da maioria, da legtimidade do exercicio do poder ¢ do Estado, na democracia perticipativa fala- se também no respeito pelas minotias, nos mecanismos de controlo dos abusos de poder e na sociedade civil. Deste modo, 0 debate ancors-se nos principios da desburocratizagio da Administragio Publica, da aproximacio dos servicas as populacdes ¢ da participagio de todos os interessados na sua gestio. ‘Apesar da tensio entre essas duas concepsies ¢ da influéncia que cada uma delas teve nas estratégias de condugo da Reforma, primeito pela Comissio de Reforma do Sistema Educative (CRSE) ¢ depois pelo Ministétio da Educacio, a verdade & que a LBSE consagta como principios gerais da administragio das escolas basicas e secundéias (Formosinho, 1988): + a distingiio entre ditecgio (formulacio ou adopcio de politicas ou esteatépias) « gestao (eua implementacio) (art? 459, cujas actividades diswibui de forma fo uniforme por todos os niveis de administracio (rts 43°, 44 € 459 + participagzo de todos os interessados na administragio da educagio escolar, professores, pais, alunos, pessoal nfo docente, autarquias, representantes dos intetesses sécio-ccondmicos, culturais ¢ cientificos (art's 43%, n° 1 € 2, € 45°, 0° 2); +1 interacgio insttucionalizada entre a escola ¢ a comunidade local em que ela se insere fart?s 43°, n? 2, 48°, 0° 1s + a prevaléncia de crtétios pedagdgioos € cientificos sobre os ctitérios administrativos A operacionalizago destes principios através de um modelo de administragio do sistema escolar descentralizado pressupunha a adopcio de uma estratégia no burocritice de implementago da reform educativa, pelo que se proceden a um proceso de discussio piblica que pretendia proporcionar a “tomada de palavra” pelos priprios interessados, nfo se confinando estes aos limites fisicos ¢ humanos da escol-estabelecimento, mas, antes, alargando-se 20 seu espago social proprio, sugerido pelo conceito de comunidade educative, que inchsi no s6 0s membros da comunidade escolar, mas também os clientes (imediatos 08 > 09

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