Você está na página 1de 201

1

Anais do evento
VOL.1: LINGUÍSTICA

Universidade Federal do Pará


Instituto de Letras e Comunicação
Programa de Pós-Graduação em Letras
2

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ


Prof. Dr. Carlos Edilson de Almeida Maneschy
Reitor

Prof. Dr. Horacio Schneider


Vice-Reitor

Profa. Dra. Marlene Rodrigues Medeiros Freitas


Pró-Reitoria de Ensino e Graduação

Prof. Dr.Emmanuel Zagury Tourinho


Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação

Prof. Dr. Fernando Arthur de Freitas Neves


Pró-Reitoria de Extensão

Prof. MSc. Edson Ortiz de Matos


Pró-Reitoria de Administração

João Cauby de Almeida Júnior


Pró-Reitoria de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal

Prof. Dr. Erick Nelo Pedreira


Pró-Reitoria de Planejamento

INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO

Dr. Otacílio Amaral Filho


Diretor Geral

Dr.ª Fátima Pessoa


Diretora Adjunta

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

Dr.ª Marília de N. de Oliveira Ferreira


Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras

Dr.ª Germana Maria Araújo Sales


Vice-Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras
3

VIII Seminário de Pesquisa em Andamento

COMISSÃO ORGANIZADORA

Dr.ª Marília de N. de Oliveira Ferreira


Presidente da comissão organizadora
Docente do Programa de Pós-Graduação em Letras
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras

Dr.ª Germana Maria Araújo Sales


Docente do Programa de Pós-Graduação em Letras
Vice-Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Letras

Dr.ª Izabela Leal


Docente do Programa de Pós-Graduação em Letras

Cinthia de Lima Neves


Discente do Programa de Pós-Graduação em Letras (Estudos Linguísticos)

Paulo José Valente Barata


Discente do Programa de Pós-Graduação em Letras (Estudos Literários)

Thiago Gonçalves Souza


Discente do Programa de Pós-Graduação em Letras (Estudos Literários)

Wanessa Regina Paiva da Silva


Discente do Programa de Pós-Graduação em Letras (Estudos Literários)

Universidade Federal do Pará


Instituto de Letras e Comunicação
Programa de Pós-Graduação em Letras

Cidade Universitária Professor José da Silveira Neto


Rua Augusto Corrêa, 01, Guamá
CEP 66075-900, Belém-PA
Fone-Fax: (91) 3201-7499
E-mail: mletras@ufpa.br
Site: www.ufpa.br/mletras
4

MONITORES

Adna Maely dos Santos Oliveira (PET/Letras UFPA)

Alana Samara Neves (Mestranda (Estudos Linguísticos)

Ana Carla Costa Castilho (PET/Letras UFPA)

Camila Maranhão da Gama (Graduação Letras UFPA)

Cláudia Gizelle Teles Paiva (PIBID/CAPES UFPA)

Denise Araújo Lobato (PIBID/CAPES UFPA)

Havana Rama Martins Barroso (Graduação Letras UFPA)

Laíse Maciel Barros (PIBIC/CNPq UFPA)

Ricardo Bezerra (PIBIC/CNPq UFPA)

Sara Vasconcelos Ferreira (PIBID/CAPES UFPA)


5

APRESENTAÇÃO

O Seminário de Pesquisas em Andamento (SEPA), promovido pelo Programa de Pós-


Graduação em Letras (PPGL), do Instituto de Letras e Comunicação (ILC), da Universidade
Federal do Pará (UFPA), este ano em sua oitava edição, tem o intuito de proporcionar aos
docentes e discentes do curso de Pós-Graduação stricto sensu, Mestrado em Letras, um
momento de divulgação de suas pesquisas desenvolvidas no cotidiano acadêmico.
Esse momento de intercâmbio e de apresentação das pesquisas possibilita o diálogo e
o intercâmbio de ideias não apenas entre colegas de instituição, mas conta com a participação
de interessados vinculados a cursos de graduação e de pós-graduação da UFPA e de outras
IES na discussão acerca dos temas discutidos.
Nesse sentido, a Coordenação do PPGL pensou o VIII SEPA como um evento
acadêmico que proporcionasse, ao seu corpo docente e discente, um espaço de
confraternização do saber, em que a inovação fosse uma meta a ser alcançada em breve.
Os Anais que ora você acessa são o resultado dos esforços empreendidos no VIII
SEPA. Neles estão reunidos artigos das áreas de Linguística e de Estudos Literários, os quais
apresentam ao leitor o atual estado das pesquisas conduzidas pelos discentes de nosso curso,
bem como alguns acenos de resultados que se insinuam no horizonte do trabalho acadêmico
desses futuros mestres.
6

SUMÁRIO
Apolo Macoto Hino
PRONOMES INDEPENDENTES E DEPENDENTES EM LÍNGUAS TUPÍ 08
Betânia Rocha de Sousa
APRENDENTES IDOSAS E A PRODUÇÃO DE TEXTOS ESCRITOS ............................ 16
Breno de Campos Belem
ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM E AUTONOMIA NA PRODUÇÃO ORAL DOS
ALUNOS DE LICENCIATURA INTENSIVA EM INGLÊS................................................. 25
Celso Francês Júnior
O PROCESSO DE REVITALIZAÇÃO DA LÍNGUA MUNDURUKÚ: Observações
preliminares................................................................................................................................... 34
Carlos Nédson Silva Cavalcante
O SISTEMA VOCÁLICO DO PORTUGUÊS FALADO EM BRAGANÇA (PA):
ANÁLISE EXPERIMENTAL.................................................................................................... 41
Cinthia Neves
CODE-SWITCHING NA FALA PARKATÊJÊ:
ASPECTOS SOCIAIS E ESTRUTURAIS DO CONTATO LINGUISTICO COM O
PORTUGUÊS............................................................................................................................... 49
Cyntia de Sousa Godinho
A VARIAÇÃO DAS OCLUSIVAS ALVEOLARES NO FALAR PARAENSE_
RESULTADOSPRELIMINARES............................................................................................ 54
Danielle Abreu Franco
LINGUAS OBSOLESCENTES: UMA VISAO SOCIOLINGUISTICA SOBRE A
DINAMICA DOS CONTATOS EM COMUNIDADES MINORITARIAS........................ 64
Edirnelis Moraes dos Santos
HETEROGENEIDADE LINGUÍSTICO-CULTURAL EM TURMAS DE PORTUGUÊS
LÍNGUA ESTRANGEIRA: OS GÊNEROS TEXTUAIS COMO INSTRUMENTOS
PARA O ENSINO-APRENDIZAGEM DA PRODUÇÃO ORAL....................................... 71
Edson de Freitas Gomes
VARIAÇÃO LEXICAL EM SEIS MUNICÍPIOS DA MESORREGIÃO SUDESTE DO
ESTADO DO PARÁ.................................................................................................................. 82
Eliane Oliveira da Costa
TERMINOLOGIA DA CERÂMICA ARTESANAL DE ICOARACI: UMA
ABORDAGEM SOCIOTERMINOLÓGICA.......................................................................... 89
Flávia Helena da Silva Paz
HAPLOLOGIA NO FALAR BELENENSE: UMA ANÁLISE
VARIACIONISTA...................................................................................................................... 98
Francinete de Jesus Pantoja Quaresma
ANÁLISE DE LIVROS DIDÁTICOS BILINGUES PARA O ENSINO DA LÍNGUA
MẼBÊNGÔKRE........................................................................................................................ 108
Giovani dos Santos Silva
ESTUDO FONOLÓGICO DO DIALETO MUNDURUKÚ DO
AMAZONAS............................................................................................................................... 116
Gizelia Maria da Silva Freitas
O GERENCIAMENTO DO ERRO NO ENSINO/APRENDIZAGEM DE INGLÊS
COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA (LE): UM ESTUDO COM FOCO NA PRODUÇÃO
ESCRITA...................................................................................................................................... 125
7

Isabel Cristina Rocha Remédios


ATLAS PROSÓDICO MULTIMÉDIA DO PORTUGUÊS DO NORTE DO BRASIL-
AMPER-POR: VARIEDADE LINGUÍSTICA DO MUNICÍPIO DE ABAETETUBA (PA) 135
Jany Éric Queirós Ferreira
A VARIAÇÃO DO /S/ NO FALAR AURORENSE............................................................... 142
Regis José da Cunha Guedes
IMAGENS PRÉVIAS DA VARIAÇÃO LEXICAL NO ATLAS GEO-
SOCIOLINGUÍSTICO DO PARÁ............................................................................................ 149
Rejane Umbelina Garcez Santos de Oliveira
GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA LINGUAGEM USADA NO CORTE
BOVINO........................................................................................................................................ 159
Renata de Cássia Dória da Silva
PROCESSOS DE REGULAÇÃO NA PRODUÇÃO ESCRITA EM PORTUGUÊS
LÍNGUA ESTRANGEIRA......................................................................................................... 167
Silvia Helena Benchimol Barros
A INTERFACE ENTRE A CONSCIÊNCIA LINGUAGEIRA E O APRENDIZADO DE
LÍNGUA ESTRANGEIRA........................................................................................................ 174
Vanessa Fabiane Martins de Oliveira
NÚCLEOS NOMINAIS – O USO DE ANÁFORAS COMO FORMA DE
REFERENCIAÇÃO AO PREFEITO DE BELÉM NO SUPORTE TWITTER ................. 182
Williane Brasil dos Santos
PERFIL GEOSOCIOLINGUÍSTICO DO DITONGO /EJ/ NAS CAPITAIS
NORTISTAS DO BRASIL ...................................................................................................... 192
8

PRONOMES INDEPENDENTES E DEPENDENTES EM LÍNGUAS TUPÍ


Apolo Macoto HINO (UFPA)
Orientadora: Carmen Lúcia Reis RODRIGUES (UFPA)

RESUMO: Este trabalho pretende apresentar o posicionamento e a função sintática dos


pronomes independentes e dependentes (clíticos) em seis línguas do tronco Tupí, conforme
trabalhos já realizados sobre essas línguas. As línguas objeto de análise, em nossa pesquisa,
são três pertencentes à família Tupí-Guaraní: Kamaiurá, Mbyá e Asuriní do Xingu; e três
pertencentes às famílias Juruna, Mundurukú e Tuparí, respectivamente, Xipaya, Mundurukú e
Mekens.

PALAVRAS-CHAVE: pronomes independentes; pronomes dependentes; línguas Tupí.

ABSTRACT: This paper is a presentation of a research involving the positioning and the
sintatic function of independent and dependent (clitics) pronouns in six languages with the
same Tupí linguistic root, based on other researches realized with the goal to study the same
language root. The languages that were the object of our research are three from the Tupí-
Guarani family: Kamaiurá, Mbyá e Asuriní from Xingu region, and three from Juruna,
Mundurukú and Tuparí families. They are Xipaya, Mundurukú and Mekens respectivily.

KEY WORDS: dependent pronouns; independent pronouns; Tupí languages.

Introdução
A relevância de um estudo tipológico se fundamenta no funcionamento de um
determinado fenômeno em várias línguas. Com base nesse aspecto, o propósito deste trabalho
é mostrar a ocorrência dos pronomes independentes e dependentes (clíticos) quanto à sua
posição e função sintática em algumas línguas Tupí, dentre as quais: Xipaya, da família
Juruna (RODRIGUES, 1995); Mbyá (MARTINS, 2003), Asuriní do Xingu (PEREIRA, 2009)
e Kamaiurá (SEKI, 2000), todas três da família Tupí-Guaraní; Mekens, da família Tuparí
(GALÚCIO, 2001); e Mundurukú, da família Mundurukú (GOMES, 2006).
Os pronomes independentes são definidos, normalmente, como formas autônomas
fonológica e sintaticamente, enquanto os pronomes clíticos são definidos como formas que
dependem fonologicamente de uma outra palavra. Quanto a esses dois grupos de pronomes,
nas línguas que apresentam pronomes independentes e/ou pronomes dependentes, ou seja,
pronomes clíticos, percebe-se que os clíticos são, em geral, formas derivadas dos pronomes
fortes (independentes) que se enfraqueceram na evolução da língua.
No grupo de línguas consideradas nesta pesquisa, identificamos um conjunto de
pronomes independentes e um conjunto de pronomes clíticos, dos quais apenas algumas das
formas pronominais serão exemplificadas neste trabalho. Inicialmente, será apresentada, em
9

cada uma das línguas, a posição em que, normalmente, os pronomes independentes se


apresentam na sentença, assim como sua função sintática; e, a seguir, o mesmo será feito para
os pronomes clíticos.

I Pronomes Independentes

Os pronomes independentes caracterizam-se, segundo Siewierska (2004, p. 16), como


marcas de pessoa que podem atuar como constituintes de palavras separadas e que podem
carregar acento primário, ou seja, possuem independência morfológica e prosódica. Em
alguns casos, de forma isolada podem constituir uma sentença.
Observando os exemplos das línguas em análise, percebemos que os pronomes
independentes ocorrem de forma a não depender de outros elementos em uma oração.
Quanto à função sintática dos pronomes, atestamos que, nas línguas Xipaya (exs. 1-3),
Mbyá (ex. 4), Mekens (exs. 10-14) e Mundurukú (exs. 15-17), os pronomes independentes
exercem a função de sujeito, enquanto que em Asurini do Xingú (exs. 5-7) e em Kamaiurá
(exs. 8-9) podem desempenhar tanto o papel de sujeito como de objeto. No que se refere à
posição, na língua Asuriní do Xingu (exs. 5-7), os pronomes independentes podem estar no
início ou no meio da oração; em Mbyá (ex. 4) e em Kamaiurá (exs. 8-9), ocorrem no início;
em Xipaya (exs. 1-3), em Mekens (exs. 10-14) e em Mundurukú (exs. 15-17), o pronome
independente pode estar no início, no meio ou no final da oração.

Xipaya:
1 - una u-mabɨ a didaku anu
//1S./prf.1s.-fils/frapper/m. mod.//
‗Je suis en train de frapper mon fils.‘
(Eu estou batendo em meu filho) (RODRIGUES, 1995, p.55)

2 - waɭ itekãu una 'kahu he


//beaucoup/1S./engordar/m.mod.//
‗Je suis en train de grossir beaucoup.‘
(Eu estou engordando muito) (op. cit., p. 102)

3 - 'maši siaũ una


//'maši/sia-ũ/una//
10

//adv. de temps/dormir-nég./1S.//
Litt. : ‗Aujourd'hui, (je) n'ai pas dormi, moi.‘
‗Aujourd'hui, je n'ai pas dormi.‘
(Hoje eu não dormi) (op. cit.)

Mbyá:
4 - ndee xe=r-apy
você 1sg=Rel-queimar
‗você me queimou‘ (MARTINS, 2003, p. 78)

Asuriní do Xingu:
5 - dje djawara a-etxak
1sg cachorro 1-ver
‗eu vi o cachorro‘ (PEREIRA, 2009, p. 121)

6 - pajẽ dje u-avyki


pajé 1sg 3-bater
A O Vt
‗o pajé me bateu‘ (op. cit., p. 148)

7 - ga a-etxak
3sg.Mas 1-ver
O A-V
‗eu o vi‘ (op. cit)

Kamaiurá:
08 - ene je=r-etsak
você 1sg=Rel-ver
‗você me viu‘ (SEKI, 2000, p.155)

09 - ene ruẽj oro-etsak


você Neg 1/2-ver
‗não é a você que eu vejo‘ (op. cit., 62)
11

Observe-se que em Asuriní o pronome /dje/ (primeira pessoa do singular) ocorre em


(5) como sujeito da oração e, em (6), esse pronome assume a função de objeto. Do mesmo
modo, em Kamaiurá, o pronome /ene/ (segunda pessoa do singular) indica ora o sujeito da
oração, em (08), ora o objeto (ex. 09).

Mekens:
10 - õt o-ser-a
I 1s-leave-Them
‗I will leave‘
(Eu irei) (GALÚCIO, 2001, p. 39)

11 – o-er-a naat top õt


1s-sleep-Them Aux.lying.pres I
‗I am sleeping‘
(Eu estou dormindo) (op. cit., p. 87-8)

12 – e-aso-bõ ẽt
2s-bath-Neg You
‗Do not bathe‘
(Não tome banho) (op. cit., p. 93)

13 - kɨ rẽp õt o-pe paaga o-koop


today;now I 1s-clothes dry 1s-Aux.mov
‗I am drying my clothes today‘
(Eu estou lavando minhas roupas hoje) (op. cit., p. 64)

14 - ɨ sɨ ɨ so-a-t õt
deer see-Them-past I
‗I saw the deer‘
(Eu vi o veado) (op. cit., p. 79)

Mundurukú:
15 - õn bio o=y-aoka kapusu
eu anta 1S=R2-matar.PRF ontem
12

‗eu matei uma anta ontem‘ (GOMES, 2006, p. 121)

16 - i-mu-wexan õn ico-m
R2-CAUS1-transformar.se.IPRF eu cesto-TRANSL
‗Eu vou fazer um cesto.‘
(lit. ‗Eu vou transformar algo em cesto.‘) (op. cit., p. 93)

17 - xen puk õn
dormir.IPRF iminente eu
‗Eu estou indo dormir‘ (op. cit., p. 174)

É notável que tanto em Mekens, assim como em Xipaya (1-3), a posição dos pronomes
independentes é relativamente livre, ou seja, podem ocorrer no início, no meio ou no final da
oração (10-14). O mesmo acontece em Mundurukú (15-17). Note-se também a semelhança
fonética entre a ‗primeira pessoa do singular‘ em Mekens /õt/ e a ‗primeira pessoa do
singular‘ em Mundurukú /õn/.

II – Pronomes Clíticos
Segundo Zwicky (1977, p. 3), o pronome clítico refere-se a uma forma presa sem
acento que atua como variante de uma forma livre com o mesmo significado e com
característica fonológica semelhante. Ao observar as formas pronominais nas línguas
analisadas, é possível considerar esse pressuposto teórico para determinados pronomes
clíticos, pelo menos, conforme a semelhança fonológica existente entre certos pronomes
independentes e a forma do clítico correspondente. Na língua Xipaya, por exemplo, o
pronome clítico /na/ (ex. 18) é variante do pronome forte /una/ (exs. 1-3) e assume também a
função sintática de sujeito (exs. 18).

Xipaya:
18 - senapɨ du na
//homme/voir/1s.//
‗J'ai vu l'homme.‘
(Eu vi o homem) (RODRIGUES, 1995, p. 105)

19 - bɨ ya da anu
13

//chanter/3pl./m. mod.//
‗Ils sont en train de chanter.‘
(Eles estão cantando) (op. cit.)

Em Xipaya, os pronomes clíticos podem estar no final (ex. 18) ou no meio (ex. 19) da
oração, ocorrendo como sujeito.

Mbyá:
20 - xe=ø-kavaju xe=ø-joko
1sg=Rel-cavalo 1sg=Rel-cercar
‗meu cavalo me cercou‘ (MARTINS, 2003, p. 47)

Verificamos que, em Mbyá, os pronomes clíticos encontram-se no início ou no meio


da sentença (ex. 20), exercendo ora a função de sujeito ora a função de objeto, e
intermediados por um prefixo relacional (ex. 20).

Asuriní do Xingu:
21 - dje r-agỹ
1sg Rel-estar apressado
‗eu estou apressado‘ (PEREIRA, 2009, p. 123)

22 - a-aha ene r-upi ne


1Sg-ir 2sg Rel-Posp Fut
‗eu irei contigo‘ (op. cit.)

Semelhantemente às duas outras línguas da família Tupí-Guaraní, Mbyá e Kamaiurá


(exs. 23-24, a seguir), em Asuriní do Xingu, o pronome clítico encontra-se ora no início (ex.
21) ora no meio da sentença (ex. 22). Note-se que a forma para a ‗primeira pessoa singular‘
/dje/ (ex. 21) é idêntica à forma do pronome independente de ‗primeira pessoa singular‘ (exs.
5-6).

Kamaiurá:
23 - je=ø-katu
1sg=Rel-ser bom
14

‗eu sou bom‘ (SEKI, 2000, p. 63)

24 - ene je = r -etsak
você 1sg=Rel-ver
‗você me viu‘ (op. cit., p. 155)

Mekens:
25 - /o-akop=õt/
1s-hot=I
‗I am hot‘
(Eu estou quente) (GALÚCIO, 2001, p. 43)

26 - o-kwe-a=õt kɨ pkɨ ba=bõ


1s-climb-THEM-I tree=dat
‗I climbed on the tree‘
(Eu subi na árvore) (op. cit., p. 89)

Em Mekens (exs. 25-26), encontramos o pronome clítico posposto à palavra


hospedeira, da mesma forma como temos em Xipaya (exs. 18-19), diferente do que se observa
em outras línguas Tupí aqui analisadas, como em Mbyá, Asurini do Xingu, Kamaiurá e
Mundurukú (exs. 27-30, a seguir), em que a posição do pronome clítico se antepõe a sua
palavra fonologicamente acentuada. Em relação à função sintática dessas formas pronominais,
em Mekens, o pronome clítico exerce a função sintática de sujeito do mesmo modo como em
Xipaya (18-19).

Mundurukú:
27 - o=d-op
1=R1-flecha
‗minha flecha‘ (GOMES, 2006, p. 27)

28 - ayacat o'='at
mulher 3S=cair.PRF
‗A mulher caiu.‘ (op. cit., p. 37)
15

29 - o=nomuwã du e)n
1O=R1.chamar.PRF INT você
‗Você me chamou?‘ (op. cit., p. 27)

30 - kapusu ma õn e=nomuwã
ontem mesmo eu 2O=R1.chamar.PRF
‗Ontem mesmo eu chamei você.‘ (op. cit.)

Conforme os exemplos, acima, os pronomes clíticos fixam-se a palavras


fonologicamente acentuadas. Em alguns casos, apresentam-se intermediados por um prefixo
relacional, como acontece em Mbyá, Asuriní do Xingu e Kamaiurá, ou por um ‗indicador de
determinante contíguo‘, como em Mundurukú (cf. exs. 27).

Conclusão
De acordo com o que foi apresentado neste trabalho, foi possível verificar algumas
distinções em relação ao papel sintático dos dois conjuntos de pronomes (independentes e
clíticos) nas línguas analisadas. Nos dados apresentados, foi visto que esses pronomes podem
se comportar, em algumas línguas, apenas como sujeito – por exemplo, o Xipaya – e, em
outras línguas, ora como sujeito ora como objeto. Há diferenças também quanto ao seu
posicionamento dentro da oração: em algumas línguas, estão no início e meio de sentença; em
outras, no meio e no final da oração; ou ainda, no início, meio e no final da oração.
Note-se que esse trabalho foi apenas um ensaio sobre as ocorrências dos pronomes em
seis línguas Tupí, sabendo-se que há muito ainda o que dizer sobre o comportamento dessas
formas pronominais nas línguas estudadas.

Abreviaturas: 1: primeira pessoa; 1: Primeira pessoa, ‗eu, me‘ (Mudurukú); 2: segunda


pessoa; 3: terceira pessoa; 1S: pronome tônico de primeira pessoa do singular; 1s: primeira
pessoa singular; 1sg: primeira pessoa singular; 2s: segunda pessoa do singular; 3Pl: pronome
tônico de terceira pessoa do plural; A: Sujeito de verbo transitivo; Aux: Auxiliar; adv.:
advérbio; CAUS1: Causativo de intransitivo; Dat: Dativo; Fut: Futuro; INT: Partícula
interrogativa; IPRF: Aspecto imperfectivo; m. mod: morfema modal; neg/NEG: negação; O:
objeto direto; O: Marcador clítico de objeto (Mundurukú); Posp: Posposição; PRF: Aspecto
perfectivo; prf. 1s: prefixo de primeira pessoa do singular; R1: Indicador de determinante
16

contíguo; R2: Indicador de determinante não-contíguo; Rel: relacional; S: Marcador clítico de


sujeito (Mundurukú); Sg: singular; TRANSL: Translativo; V: Verbo; Vtr: Verbo transitivo.

Referências Bibliográficas:
GALÚCIO, Ana Vilacy. The morphosyntax of Mekens (Tupi). 2001. 272p. Tese de
doutorado. Chicago. 2001.
GOMES, Dioney Moreira. Estudo morfológico e sintático da língua Mundurukú (Tupí).
2006. 320p. Tese de doutorado. Brasília. 2006.
MARTINS, Marci Fileti. Descrição e análise de aspectos da gramática do Guarani Mbyá.
2004. 209p. Tese de doutorado. Campinas, SP. 2004.
PEREIRA, Antônia Alves. Estudo morfossintático do Assurini do Xingu. 2009. 341p. Tese
de doutorado. Campinas, SP. 2009.
RODRIGUES, Carmen Lúcia Reis. Etude morphosyntaxique de la langue Xipaya (Brasil).
1995. 277p. Tese de doutorado. Paris. 1995.
SEKI, Lucy. Gramática do Kamaiurá: língua Tupí-Guaraní do Alto Xingu. Campinas,
SP: Imprensa Oficial. 2000.
SIEWIERSKA, Anna. Person. Cambridge: Cambridge University Press. 2004.
ZWICKY, Arnold M. On clitics. Indiana University Linguistic Club: Bloomington. 1977.

APRENDENTES IDOSAS E A PRODUÇÃO DE TEXTOS ESCRITOS


Betânia Rocha de SOUSA (UFPA)
Profa. Dra. Myriam Crestian CUNHA (UFPA)

RESUMO: O presente artigo busca apresentar resultados parciais de uma pesquisa


participante, realizada na turma de 2ª etapa do Grupo de Educação na Terceira Idade (GETI),
programa de extensão da Universidade Federal do Pará (UFPA) que desenvolve suas ações
pedagógicas no Campus Universitário de Castanhal. O objeto dessa pesquisa está focalizado
no ensino e na aprendizagem da produção de textos escritos em turmas de pessoas idosas,
tendo em vista produções socialmente relevantes. Esses aprendentes idosos, na sua maioria,
passaram mais de 40 anos ausentes dos espaços formais de escolarização. Nesse sentido, o
objetivo geral consiste em analisar de que maneira a proposta de avaliação formativa,
dialogada com os princípios de educação freirena e com a abordagem interacional de ensino-
aprendizagem de língua, é pertinente para a elevação qualitativa da produção de textos
escritos das pessoas idosas que fazem parte da turma sobredita. A abordagem teórica
desdobra-se em quatro pilares fundamentais que embasam este estudo: 1) educação
emancipatória (FREIRE, 1983, 1987, 1996), que visa educar para a cidadania; 2)
envelhecimento humano como um processo natural da vida, cuja compreensão do que seja
pessoa idosa passa pelo viés de sujeito ativo e potencialmente capaz (NERI, FREIRE, 2000;
BOSE, 1994) – já que o locus da pesquisa está inserido dentro de um programa para pessoas
idosas –; 3) abordagem interacional do ensino-aprendizagem de língua (ANTUNES, 2006); 4)
avaliação formativa (AMARAL, 2008; CUNHA, 2006) com o intuito de regular a
aprendizagem. A metodologia insere-se na abordagem qualitativa, mais especificamente, na
perspectiva da pesquisa participante. Sequem os procedimentos instrumentais que
viabilizaram a geração de dados: entrevistas semiestruturada realizada com os aprendentes
idosos(as) e com a professora regente da turma; notas em diário de campo; Modelo de
17

Sequência Didática (SCHNEUWLY, DOLZ, 2004); atividades e materiais desenvolvidos para


ou em sala de aula. Os resultados ainda são parciais, pois a pesquisa está em andamento.

PALAVRAS-CHAVE: Produção escrita, turma de pessoas idosas, relevância social.

RÉSUMÉ: Cet article présente les résultats partiels d'une recherche participative, réalisée
dans la classe de la deuxième étape du «Grupo de Educação na Terceira Idade (GETI)»,
programme d'extension de l'Université Fédérale du Pará (UFPA) qui développe ses actions
pédagogiques dans le Campus Universitaire de Castanhal. L'objet de cette recherche est axé à
l'enseignement et à l'apprentissage de production de textes écrits dans des classes de
personnes âgées, ayant en vue les productions socialement pertinentes. La plus part de ces
apprenants âgés ont passé plus de 40 ans absents des espaces formels de scolarité. En ce sens,
l'objectif général est d‘analyser quelle manière la proposition d'évaluation formative, liée aux
principes d'éducation «freireana» et à l'approche interactionnelle d'enseignement-
apprentissage de langue, est valable pour l'élévation qualitative de la production de textes
écrits des personnes âgées qui font partie de la classe susmentionnée. L'approche théorique se
décompose en quatre piliers fondamentaux qui sous-tendent cette étude: 1) l'éducation
émancipatrice (FREIRE, 1983, 1987, 1996), qui vise à éduquer pour la citoyenneté ; 2) le
vieillissement humain comme un processus naturel de la vie, dont la compréhension de ce
qu'il est la personne âgée est conçue comme un sujet actif et potentiellement capable (NERI ;
FREIRE, 2000 ; BOSE, 1994) – vu que le locus de la recherche s'intègre dans le programme
pour les personnes agées; 3) L'approche interactionnelle d'enseignement-apprentissage de
langue (ANTUNES, 2006) ; 4) l'évaluation formative (AMARAL, 2008; CUNHA, 2006) afin
de réguler l'apprentissage. La méthodologie s'inscrit dans l'approche qualitative, plus
spécifiquement, dans la perspective de la recherche participative. Les procédures
instrumentales qui ont viabilisé la génération de données sont : l'interview semi-structurée
réalisée avec les apprenants âgés (es) et avec l‘enseignant de la classe; un cahier de notes; le
Modèle de Séquence Didactique (SCHNEUWLY, DOLZ, 2004); des activités et des
matériaux développés pour et dans la classe. Les résultats sont encore partiels, parce que la
recherche est en cours.

MOTS CLÉS: Production Écrite. Classe de personnes âgées. Importance Sociale.

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Este artigo busca apresentar sumariamente resultados parciais de meu projeto de


mestrado que buscou investigar quais as contribuições dos princípios de educação freirena, da
abordagem interacional de ensino-aprendizagem de língua e da proposta de avaliação
formativa para a elevação qualitativa da produção de textos escritos das educandas idosas que
participam da turma de 2ª etapa do Projeto de Educação Formal do Grupo de Educação na
Terceira Idade (GETI), programa de extensão da Universidade Federal do Pará (UFPA), cujas
ações desdobram-se, no Campus Universitário de Castanhal, em três projetos distintos:
Atualização Cultural, Bem-estar Físico e Educação Formal.
18

Como também procura refletir a respeito da necessidade do cidadão e da cidadão em


construir sua autonomia escritora, visto que essa habilidade servirá de suporte para suas
práticas sociais, as quais transcendem ―aos muros‖ ideológicos da escola. As educandas
idosas e os educandos idosos não estão isentos dessa necessidade, pois cada vez mais nossa
sociedade, altamente letrada, exige-nos o domínio da leitura, da oralidade, sobretudo da
escrita.
Diante dessa necessidade, surgem alguns questionamentos: 1) Como trabalhar a
produção escrita com aprendentes idosos(as) que, na sua maioria, passaram mais de 40 anos
excluídos dos espaços formais de escolarização? 2) que práticas de ensino-aprendizagem
desenvolver para que a produção de textos escritos ganhe dimensão socialmente relevante? 3)
que procedimentos avaliativos utilizar para subsidiar esse processo de produção textual que
dialogue com a proposta de aprendizagem significativa proposta por Paulo Freire? Essas são
algumas das questões que essa pesquisa procura responder, dentro do referencial que a
subsidia.
Dentro dessa perspectiva, a intenção dessa pesquisa é buscar meios de atrelar o ensino
de produção textual escrita a práticas de ensino da língua materna que compreenda que a
plena participação social dos indivíduos também se dar por meio da linguagem.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Os referenciais teóricos que embasam este estudo fundamentam-se nos princípios da


gerontalogia educacional, também conhecida como gerontagogia educacional; nas ideias de
Paulo Freire para a educação de adultos; nas abordagens sócio-interacionais de ensino-
aprendizagem de línguas e na proposta de Avaliação formativa.

2.1 Envelhecimento humano e a Gerontagogia

O envelhecimento populacional é um fenômeno natural que vem ocorrendo


mundialmente e no Brasil vem se configurando em grandes proporções. Segundo projeção do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1, a população brasileira com 60 anos ou
mais deverá ultrapassar a marca de 64 milhões de pessoas em 2050. Neste ano, este estrato
populacional deverá chegar próximo de 30% da população do País.

1
Dados recolhidos no dia 10 de junho de 2011 do site:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/projecao_da_populacao/metodologia.pdf
19

Em decorrência do aumento considerável do número de pessoas idosas, o processo de


envelhecimento humano e a velhice têm-se tornado objeto de investigação. A Geriatria e a
Gerontologia são duas disciplinas voltadas a esses estudos. A primeira é uma especialidade
médica, cujo interesse centra-se no tratamento das doenças inerente à velhice. A segunda, nas
palavras de Neri ―é um campo multidisciplinar que tem como objeto o estudo do processo do
envelhecimento humano, o fenômeno velhice‖ (2002)2; estudo que não se esgota no fator
biológico, mas espraia-se até aos aspectos psicológicos, sociológicos concernentes ao
envelhecimento humano.
Envelhecimento humano, então, pode ser entendido como um fenômeno natural,
contínuo e irreversível, definido por Néri e Freire (2000, p.14) como ―processo de mudanças
físicas, psicológicas e sociais [iniciado desde o nascimento] que se acentuam e se tornam mais
perceptíveis a partir dos 45 anos‖, sendo, portanto, mais uma etapa da vida humana. Etapa
mensurada de possibilidades e potencialidades.
Para essas autoras, a pessoa idosa se constitui (e esta precisa ter consciência disso) como
um sujeito existente, vivo, ativo, capaz de reorganizar e ressignificar suas experiências
vividas; por isso, pode, e, deve manifestar seus anseios, esperanças, sonhos, projeções para o
futuro à luz das novas necessidades éticas, psicológicas, sociais preconizadas nessa etapa da
vida.
Dentro da abordagem gerontológica, surgem algumas especificações. Uma delas é a
gerontagogia, que segundo André Lemieux (2007), citado por Meire Cachioni (2008, p. 92),
seria o termo mais apropriado para se referir aos processos de ensino e aprendizagem das
pessoas idosas. Gerontagogia é então definida com ―a ciência educacional interdisciplinar
cujo objeto de estudo é o idoso em situação de aprendizagem‖, assim ―a gerontagogia, como
ciência social, está mais preocupada com ensino/aprendizagem‖ (COCHIONI, 2008, p. 92).
Compreender que o envelhecimento é um processo natural e que a velhice se configura
em mais uma fase da vida, contextualizando-os no âmbito da educação, nos dá subsídio para
vislumbrar que aprendentes idosos e idosas se constituem em sujeitos sócio históricos e
culturais que embora apresentem limitações físicas e, muitas vezes, cognitivas (inerentes ao
processo de envelhecimento), ainda são capazes de aprender, ensinar e vivenciar múltiplas
experiências.

2
Entrevista cedida à Revista Comciencia, em 2002. Disponível em:
http://www.comciencia.br/entrevistas/envelhecimento/neri.htm <acesso em: 13.01.2011>
20

2.2 Educação emancipatória

Os princípios de educação emancipatória de Paulo Freire se mostram perfeitamente


adequados para uma educação para pessoas idosas. Isso porque, Freire enfatiza uma prática
educacional que incentiva a autonomia do educando e concebe o processo de ensino como
instância criativa e criadora de conhecimentos, pois ―ensinar não é transferir conhecimentos,
mas em criar as possibilidades para a sua própria produção‖3; compreensão do educando e
do educador como sujeitos sociais, políticos e culturais, historicamente situados. Nesse
sentido, professor e educando são incentivados a se assumirem enquanto sujeitos ativos do ato
de conhecer 4 no sentido de promoverem as mudanças no status quo.
Assim, pensar uma educação para pessoas idosas, baseada numa relação dialógica,
significa, sobretudo, em criar situações pedagógicas em que se inscrevam práticas que
respeitem a vivência do aprendente idoso e idosa e a partir desta trace projetos de ensino-
aprendizagem. Ensino que não se baseia no paradigma bancário da educação, mas que em
comunhão com os educandos e educandas busca-se construir conhecimentos e práticas que
extrapolem aos ―muros‖ ideológicos do ensino formal, de modo a associá-los aos interesses,
necessidades e vivência do educando idoso(a), a fim de que promover aprendizagens
significativas.

2.3. E a produção de textos escritos?

A escrita, assim como a oralidade, por muito tempo foi concebida como instâncias
dissociadas das práticas sociais. Concepção que atualmente, pelo menos no discurso, não se
sustenta mais. A Compreensão da escrita (e também a oralidade), como prática socialmente
situada que se constitui e se materializa por meio dos gêneros do discurso, conforme
Marcuschi (2001), Antunes (2003, 2009), Geraldi (2003), Rojo (2008) significa, sobretudo,
situar o texto e a produção do mesmo nas relações interacionais e culturais. Assim, o texto
pode ser interpretado como um instrumento de participação ativa numa sociedade
marcadamente letrada como a nossa.
Partindo dessa concepção, conforme Geraldi (2006), o ensino-aprendizagem de línguas
assume contornos que vão para além do ensino de gramática e se configura em práticas de
leitura, de produção de textos e de análise linguística. Todas articulas entre si para cumprir a

3
op. cit. , p. 52 (giros do autor).
4
cf. op. cit. , p. 24.
21

um único objetivo de criar nas próprias aulas, e a partir delas, as condições necessárias para
que o educando e a educanda desenvolvam as habilidades leitoras e escritoras, tendo em vista
uma formação para a cidadania.
No contexto dessa proposta, qual seria o papel da avaliação da aprendizagem? Verificar
para classificar e atribuir notas ou conceito, práticas comumente utilizadas na avaliação
escolar brasileira, conforme Luckesi (2010)? Ou avaliar para promover aprendizagens? Seria
um dissenso se, no contexto de um ensino-aprendizagem de línguas que se propõe sócio
interacional, a avaliação se erigisse a partir do paradigma da nota e/ou dos conceitos.
Avaliar para promover aprendizagens se insere dentro de uma proposta dialógica, cuja
primeira fase seria o diagnóstico das reais necessidades do educando; depois a construção de
instrumentos que possibilitassem tanto ao educador acompanhar a evolução ou não do
educando, a fim de auxiliá-lo a superação das dificuldades, quanto ao educando no sentido de
regular conscientemente seu aprendizado.
Condemarín e Medina (2005) expõem que a finalidade primordial da avaliação, baseada
em princípios da Avaliação Formativa seria a de

[...] melhorar o processo ensimo-aprendizagem que ocorre na interação de


um professor com seus alunos. Também tem como objetivo informar e
orientar os alunos e os pais sobre os avanços, centrando-se
fundamentalmente em suas aptidões, interesses, capacidades e competências.
(CONDEMARÍN, MEDINA, 2005, p. VI).

A avaliação sob esse viés aponta para um processo ―multidimensional‖, dinâmico e


dialético, visto que, amplia substancialmente a noção tradicional de avaliação puramente
somativa: verificar para atribuir notas.
A proposta de Avaliação Formativa constitui-se, então, como dimensão relevante para o
desenvolvimento de propostas de ensino para a produção escrita significativa, pois esta
abordagem de avaliação pauta-se na criação de situações didáticas de aprendizagem que
possibilitam aos educandos reconhecerem-se como sujeitos ativos e co-participantes de sua
aprendizagem, desenvolvendo assim autonomia e motivação em relação aos estudos.
É no contexto dessas reflexões sobre ensino-aprendizagem da produção de textos
escritos e sobre a avaliação desse processo que se insere a temática de minha tese de
mestrado, a qual amplia o debate trazendo para o foco da discussão o sujeito idoso
aprendente.
22

Nesse sentido, compreende-se que essa proposta de avaliação dialoga perfeitamente com
os princípios de educação emancipatória de Paulo Freire e com a abordagem de ensino de
língua apresentado nesse artigo.

3. METODOLOGIA

Este estudo teve como suporte a pesquisa qualitativa (LÜDKE; ANDRÉ, 1986), na
modalidade de pesquisa participante (BRANDÃO, 1984), pois a mesma aproxima-se do
referencial teórico deste trabalho no sentido de compreender que o compromisso histórico de
mulheres e homens pesquisadores não existe fora da práxis enquanto prática de apropriação,
reflexão e transformação da realidade (FREIRE, 1983, 1987, 1996; MACKAY, 2003).
Os instrumentos metodológicos que estão subsidiando a geração de dados: pesquisa
bibliográfica; entrevistas semiestruturadas; notas em diário de campo; aplicação do Modelo de
Sequência Didática (SCHNEUWLY, DOLZ, 2004) que pressupõe etapas e módulos para se
trabalhar com gênero textual: apresentação da situação, primeira produção textual, módulos
(várias atividades ou exercícios que servirão como instrumentos para o domínio das
capacidades ainda não dominadas pelos alunos) e produção final.

3.1. Contexto dos participantes

A pesquisa foi realizada na turma de 2ª etapa do Projeto de Educação Formal do Grupo


de Educação na Terceira Idade (GETI), programa de extensão da Universidade Federal do
Pará que desenvolve suas ações no Campus Universitário de Castanhal, cujo ensino é
direcionado a mulheres e homens idosos da cidade de Castanhal. Essa turma é formada apenas
por mulheres.
A maioria dessas educandas passou mais de 40 anos ausente dos espaços formais de
escolarização, ora porque tiveram os estudos interrompidos por causa da educação machista
que incutia na cabeça dos pais que mulher não deveria estudar para não aprender a escrever
cartas para namorados, ora porque já casadas, o marido não as permitia, ora porque a família
dizia que ―papagaio velho não aprende mais‖, conforme relatos informais das educandas.
23

4. (RE) ESCREVENDO RECEITAS CULINÁRIAS: ALGUMAS


CONSIDERAÇÕES

Com base na sequência didática, foi realizado em parceira com a professora titular da
turma e com as educandas idosas da 2ª etapa do GETI o Projeto ―Receitas culinárias: mãos
experientes, escrevendo com autonomia‖. Como o espaço de desse artigo é insuficiente para a
descrição minuciosa da sequência desenvolvida e a análise da mesma, as apresentarei de
forma sumária.
A escolha pela escrita de receitas culinárias partiu das próprias educadas, pois segundo
elas essa temática fazia parte da vivência delas, ficando mais fácil falar e escrever de algo que
elas, de certo modo já conheciam. Propus, então, às senhoras a escrita de um livro de receitas
culinárias, elas gostaram da proposta e aceitaram o desfio de escreverem suas próprias
receitas, registrando no papel o que a memória oral já vinha fazendo há algum tempo. O
caderno de receitas seria publicizado durante o seminário sobre envelhecimento humano que
o GETI promove todos os anos, previsto para outubro, mas por motivos técnicos foi adiando
para novembro.
Definidos o projeto de escrita, o suporte, o meio de divulgação e os interlocutores dessa
prática discursiva, foi realizada uma roda de conversas para dialogarmos sobre receitas
culinárias: a importância dessa temática; os valores sociais, culturais e econômicos agregados
a elas; receitas que mais gostavam; como também a composição estrutural da mesma. Então,
foi solicitado que as senhoras escrevessem uma receita culinária, da preferência das mesmas.
De posse da primeira produção, diagnostiquei a forte presença da oralidade na escrita
das educandas idosas, como também, a maioria das receitas continha apenas a indicação dos
ingredientes, faltando o modo de preparo. Com base nesses dados, os módulos da sequência
foram elaborados, contendo atividades individuais, em duplas e em grupos para auxiliar as
aprendentes idosas a superarem essas dificuldades. Ao longo dos módulos foi construída uma
ficha avaliativa para que as educandas autorregularizassem a aprendizagem no que se refere à
escrita da receita culinária.
A última produção das educandas idosas demonstrou avanços consideráveis em relação
à primeira, o que demonstrou que a educada e o educando idosos, contextualizados em
processos de ensino-aprendizagem (nesse caso do texto escrito) que criem situações
pedagógicas socialmente situadas e de auxiliados por instrumentos avaliativos que promovam
aprendizagens significativas, oportunizando ao aprendente ser coparticipante na construção do
24

conhecimento, são capazes de escrever, refletir sobre sua escrita e assim decidir
conscientemente em direção à elevação qualitativa da mesma.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização desse estudo é de grande relevância, pois permite revisitar minhas práticas
enquanto professora de língua portuguesa, especificamente no que tange práticas de produção
textual. Assim como, busca responder aos questionamentos propostos por esta pesquisa, no
que se refere às contribuições da avaliação formativa, da abordagem interacional do ensino do
português e dos princípios de educação freireana para a elevação qualitativa da produção
textual dos aprendentes idosos do programa Grupo de Estudos da Terceira Idade, a fim de que
esses sujeitos idosos construam sua autonomia escritora.

REFERÊNCIAS

AMARAL, M. C. E.. Julgar, medir, diagnosticar, formar... afinal, para que serve a
avaliação? Mal-Estar e Sociedade - Ano I - n. 1 - Barbacena - nov. 2008 - p. 129-145. <
http://eduemg.uemg.br/docs/Mal%20Estar%201/7.pdf > acesso em: 14. Mai. 2011
ANTUNES, Irandé. Aulas de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola
Editorial, 2003.
______ . Avaliação da produção textual no ensino médio. p. 163-180. In: BUNZEN, Clecio;
MENDONÇA, Márcia (orgs). Português no ensino médio e formação do professor. São
Paulo: Parábola Editorial, 2006. 255p.
______. Língua, texto e ensino: outra escola é possível. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
238p
BOSI, Ecléia. História e Sociedade: Lembranças de Velho. São Paulo: Companhia de
Letras, 1994.
CACHIONI, Meire. Gerontologia Educacional/educação gerontológica. In: NERI, A. L.
Palavras-chaves em Gerontologia. Campinas, SP: Editora Alínea, 2008. 92-95p
CONDEMARIN, Mabel; MEDINA, Alejandra. Avaliação Autêntica: um meio para
melhorar as competências em linguagem e Comunicação. Trad. Fátima Murad. Porto Alegre:
Artmed, 2005. 200p
ROJO, Roxane (org.). A prática de Linguagem em Sala de aula, praticando os PCNs.
Campinas, SP: Mercado de Letras, 2000.
SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim e colaboradores. Gêneros orais e escritos na
escola. Trad. E org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, SP: Mercado de
Letras, 2004.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. 11ª ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
_____. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
_____ . Pedagogia da Autonomia; saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1996. 186p.
GERALDI, J.W. (org). O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006. 136p
LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A.. Pesquisa em Educação: abordagens
Qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.
25

MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: Atividades de retextualizações. São Paulo:


Cortez, 2001.
NERI, Anita Liberalesco; FREIRE, Sueli Aparecida (Org). E por falar em boa velhice.
Campinas, SP: Papirus, 2000.135p.

ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM E AUTONOMIA NA PRODUÇÃO ORAL


DOS ALUNOS DE LICENCIATURA INTENSIVA EM INGLÊS

Breno de Campos BELEM (UFPA)


Orientador (a): Prof.ª Dr.ª Walkyria MAGNO E SILVA (UFPA)

RESUMO: Segundo Benson (2001), a autonomia é a chave para que o aprendente encontre
meios de buscar novas informações relacionadas ao que ele está aprendendo, com ou sem o
auxílio do professor. Os estudantes que são ativos em procurar esclarecimentos e
confirmação dos seus próprios pensamentos e suposições são mais bem sucedidos na
aprendizagem do que aqueles que não o fazem (DICKINSON, 1987). Um dos elementos
importantes para que o aluno se torne autônomo é ser auxiliado pelas estratégias de
aprendizagem com o propósito de melhorar a aprendizagem (RUBIN, 1987; WENDEN, 1987;
O‘MALLEY; CHAMOT, 1990; OXFORD, 1990). Esse sucesso pode ser atribuído a aspectos
cognitivos e metacognitivos com os quais os aprendentes se engajam. O presente trabalho tem
como objetivo averiguar que de que forma os acadêmicos do curso de licenciatura em língua
inglesa, em caráter intensivo da Universidade Federal do Pará apreendem práticas autônomas,
utilizado as estratégias de aprendizagem para melhor apropriarem-se da habilidade oral. A
produção oral é, para Brown e Yule (1983), a habilidade de maior dificuldade para o
aprendente de língua estrangeira. Sendo assim, ao retornar à academia, depois dos períodos
sem aulas, os alunos sentem-se incapazes de participar efetivamente das aulas expondo suas
idéias oralmente. Deste modo, a proposta desta pesquisa é atuar em prol de mudanças que
levem a um aprimoramento das práticas analisadas. A metodologia utilizada nesta pesquisa é
a pesquisa-ação de abordagem qualitativa longitudinal empregando instrumentos como
narrativas, questionários e entrevistas semi-etruturadas, ao longo de três períodos letivos da
universidade, sendo dois períodos intensivos e um extensivo.

PALAVRAS-CHAVE: Autonomia, estratégias de aprendizagem, aprendizagem da


habilidade oral em inglês.

ABSTRACT: According to Benson (2001), autonomy is the key to the learner to find ways to
search new information related to what he or she is learning, with or without the teacher‘s
help. The students who are active on searching, clarification and confirmation on their own
thoughts and suppositions are much more successful on their learning process than those who
don‘t act this way (DICKINSON, 1987). One of the important elements to the learner to
become autonomous is to be helped by the learning strategies with the purpose of improving
learning (RUBIN, 1987; WENDEN, 1987; O‘MALLEY; CHAMOT, 1990; OXFORD, 1990).
This success can be attributed to cognitive and metacognitive aspects which learners engage
in. The present work aims at investigating in which way the students majoring in English, of
an intensive course at Universidade Federal do Pará, apprehend autonomous practices,
26

making use of learning strategies to learn oral skills. The oral production is, to Brown and
Yule (1983), the most difficult skill to the foreign language learner. Thus, when coming back
to the academy, after the periods without any classes, the students feel incapable of
participating effectively in class exposing orally their ideas. This way, the purpose of this
research is to act in favor of changes that improve these practices. The methodology in this
research is the action research with a qualitative longitudinal approach; instruments used are
narratives, questionnaires and semi-structured interviews, during three academic periods of
the university, two intensive periods and one extensive.

KEYWORDS: Autonomy, learning strategies, English oral skill learning.

Atualmente a oferta de cursos de Licenciatura em modalidade Intensiva pela


Universidade Federal do Pará é comum, visto a necessidade de profissionais qualificados para
atuarem como professores da educação básica. O curso de Licenciatura em Língua Inglesa
na supracitada modalidade foi primeiramente ofertado em 2006 no Campus da cidade de
Bragança. Foi como sujeito acadêmico participante desse contexto que pude observar, com o
passar do tempo, que uma parte dos alunos dessa turma não apresentou e nem adquiriu os
requisitos básicos para uma produção oral efetiva. Posteriormente, já atuando como
professor, constatei que a mesma situação ocorria na cidade de Altamira, no mesmo tipo de
licenciatura.
Nas atividades de produção oral, alguns alunos reproduziam a fala de outros
personagens, dublando-os, sem refletir sobre o que estavam falando. Essa postura motivava-
se pela simples aquisição de um conceito final. Quando precisavam expor oralmente idéias,
pontos de vista ou opiniões pessoais sobre determinados assuntos, preferiam calar-se ou então
proferir frases prontas e até mesmo decoradas. Observava-se tal postura, principalmente
quando o professor fazia uma pergunta como réplica e ao responder, o aluno não conseguia
continuar a conversação.
É importante ressaltar que o curso de Letras tem como objetivo:

Formar profissionais competentes, capazes de atuar de forma ética e crítica


diante das várias linguagens presentes no meio sócio-educacional, a fim de
produzir, expressar e comunicar suas idéias, além de interpretar e usufruir
as produções culturais e tecnológicas, em contextos formais, públicos e
privados, e contextos não formais (CARLIEZ et al, 2008, p. 16).

Sendo assim, propõe-se esta pesquisa como forma de criar condições para que os alunos
possam, em períodos em que não estão presentes em sala de aula, entender e utilizar os
procedimentos necessários para melhor se apropriarem da habilidade oral ao longo dos quatro
27

anos de curso. A proposta deste trabalho é também proporcionar aos acadêmicos reflexões
que estimulem comportamentos autônomos, para que eles se motivem a aprimorar a
habilidade oral.
Para dar suporte ao nosso estudo, pesquisamos sobre as estratégias de aprendizagem na
visão dos teóricos e os papéis dos professores em uma proposta para o ensino das estratégias.
Ademais, discutimos alguns conceitos autonomia e uma reconfiguração nos papéis do
professor e do aluno. Além disso, buscamos informações que tratam da habilidade da fala
com teóricos que tratam mais especificamente da produção oral.
No que concerne as estratégias de aprendizagem, O‘Malley e Chamot (1990), afirmam
que as estratégias de aprendizagem são maneiras de processar a informação para melhorar a
compreensão, aprendizagem ou retenção da informação. Estes autores defendem a teoria da
cognição como aspecto fundamental na compreensão da aprendizagem de línguas, pois, para
que a aprendizagem seja bem sucedida, é necessário entender como a língua é armazenada na
memória e como este processo resulta na produção e compreensão da linguagem.
Na visão de Oxford (1990, p. 8) as estratégias de aprendizagem são ―ações específicas
tomadas pelos aprendentes para tornar a aprendizagem mais fácil, mais rápida, mais
agradável, mais auto-direcionável, mais eficaz e mais transferível para novas situações‖ 5.
Identificamos-nos com a definição proposta por Oxford (1990), pois acreditamos que o
emprego de estratégias em sala de aula seja benéfico para melhorar a aprendizagem dos
aprendentes em língua estrangeira. Compartilhamos dessa idéia, pois vamos a possibilidade
do aprendente tornar-se mais auto-direcionável, contribuindo para a sua autonomização na
aprendizagem. Quando este aprendente se sente confiante de que está aprendendo com
sucesso, utilizando as estratégias de aprendizagem adequadas, torna-se também, mais
motivado a aprender.
A autonomia é de primordial importância em contextos de ensino e aprendizagem de
língua estrangeira. A incessante busca pela informação possibilita ao aprendente uma melhor
competência nas habilidades linguageiras. Entretanto, diferentemente de contextos de
aprendizagem de língua segunda, o aprendente de uma língua estrangeira não tem contato
com a língua quando está fora de sala de aula, a não ser que ele busque meios para praticar o
que aprendeu. Nesse sentido, estudos sobre a autonomia (HOLEC, 1981; LITTLE, 1991;
BENSON; VOLLER, 1997; BENSON, 2001; DICKINSON, 1987; MAGNO E SILVA, 2003)

5
No original, ―Specific actions taken by the learner to make learning easier, faster, more enjoyable, more self-
directed, more effective, and more transferrable to new situations‖. Esta e todas as demais traduções de citações
do inglês são de minha responsabilidade.
28

mostram que alunos que estão conscientes de que habilidades e competências podem ser
desenvolvidas e treinadas de acordo com suas vontades, ou com a interdependência de um
outro sujeito, tornam-se melhores aprendentes e, por conseqüência, demonstram melhores
habilidades no uso da língua.
Benson (2001, p. 47) conceitua autonomia como ―uma capacidade multidimensional
que assumirá formas diferentes para indivíduos diferentes, e até mesmo para o mesmo
indivíduo em épocas diferentes‖6. Com esta definição, pode-se perceber que a autonomia do
aprendente não é algo estável. Ela pode estar presente em um determinado momento e em
outros não. Vários fatores podem influenciar a presença ou ausência da autonomia. Em
muitos casos, é a própria figura do professor e, como ele direciona a sua aula, que faz com
que atitudes autônomas sejam evidenciadas.
Apesar da maioria das teorias da autonomia se referirem ao aprendente, Dam (2003)
considera que é necessária uma mudança nas atitudes do professor para alcançar seus
objetivos com a responsabilidade e a autonomização dos alunos. Ao mudar o foco de sua aula
para a constante negociação de atitudes e procedimentos em prol da aprendizagem dos alunos,
o professor começará a criar as condições necessárias para a ressignificação de conceitos
sobre a aprendizagem fazendo surgir o aluno autônomo. Magno e Silva (2008) complementa
que, quando o professor modifica seu posicionamento em sala de aula, provoca novos
comportamentos nos seus alunos. A autora também postula que na formação de professores,
os cursos ―precisam tratar de assuntos tais como controle sobre os alunos, a sala de aula e os
conteúdos a serem ensinados e aprendidos de forma a abrigar a escolha dos aprendentes‖
(MAGNO E SILVA, 2008, p. 295).
Segundo Brown e Yule (1983, p. 25) ―a produção da linguagem falada, aprender a falar
uma língua estrangeira, é frequentemente considerada um dos aspectos mais difíceis na
aprendizagem de línguas para que o professor ajude seus alunos‖ 7. No entanto, essa
dificuldade deve ser superada visto que ao final do curso este aluno irá atuar como
profissional da área e no mercado de trabalho apresentar-se-á como falante da língua e
sabedor desta língua. Neste ponto é importante citar que:

as pessoas que sabem uma língua são referidas como ‗falantes‘ daquela
língua, como se falar incluísse todas os tipos de conhecimento; e muitos se
não a maioria dos aprendentes de línguas estrangeiras estão prioritariamente

6
No original: ―a multidimensional capacity that will take different forms for different individuals, and even for
the same individual in different contexts or at different times‖.
7
No original: Spoken language production, learning to talk in the foreign language, is often considered to be one
of the most difficult aspects of language learning for the teacher to help the students with.
29

mais interessados em aprender a falar (RICHARDS; RENANDYA, 2002, p.


120)8.

O foco nas habilidades orais é uma tentativa de demonstrar como os aprendentes


identificam a produção oral como fator de aprendizagem da língua. Nesse sentido, observa-se
um grau de insatisfação quando um aluno não consegue se expressar oralmente, levando-o a
pensar que não sabe a língua ou que não aprendeu e perdeu seu tempo.
Ao atentar sobre a produção oral, Celce-Murcia e Olshtain (2000) afirmam que não é
necessário alcançar um nível perfeito de competência e controle para se fazer entender na
língua que está aprendendo. De fato ―as pessoas podem se comunicar oralmente com muito
pouco conhecimento lingüístico quando elas fazem bom uso de fatores pragmáticos e
socioculturais‖ (CELCE-MURCIA; OLSHTAIN, 2000, p. 175). Quando se trata de fluência,
a necessidade de um inglês perfeito é ilusão. Aprendentes de língua estrangeira
frequentemente almejam alcançar a pronúncia de um nativo e se frustram por não conseguir.
É desejável que o aprendente tenha um inglês próximo ao padrão internacional,
principalmente se esse aprendente já for um adulto com seu sistema articulatório pré-disposto
à produção dos sons na língua materna. Entretanto, falar perfeitamente um idioma
estrangeiro não é habilidade de fácil alcance.
Por uma questão social afetiva, alguns alunos se sentem inibidos em se expressar
oralmente pela rapidez que a produção oral requer em sala de aula. A exposição perante os
alunos e o bloqueio do professor ao uso de novos recursos e metodologias para a produção
oral pode gerar desmotivação e desistência do aluno de um curso. Na produção oral, a
simultaneidade das ações ocorre em processos de turnos, onde o falante precisa estar atento
para o que quer falar e o que precisa ser dito. Nesse sentido, podemos falar em fluência. Para
Hedge (2000, p. 261) ―fluência significa responder coerentemente entre os turnos da conversa,
conectar palavras e frases, usando pronúncia inteligível e entonação apropriada e fazendo tudo
isso sem hesitações exageradas‖ 9. A fluência é adquirida com o tempo de curso. No início, o
aluno começa a adquirir vocabulário, escrever e estruturar frases simples. Em seguida passa a
estruturar frases maiores e se responsabilizar por produzir textos e discursos mais longos.
Esses estágios acontecem de forma paulatina e não devem ser ultrapassados, pois cada
indivíduo tem seu ritmo.

8
No original: People who know a language are referred to as ‗speakers‘ of that language, as if speaking included
all other kinds of knowing; and many if not most foreign language learners are primarily interested in learning to
speak.
9
Fluency means responding coherently within the turns of the conversation, linking words and phrases, using
intelligible pronunciation and appropriate intonation, and doing all of this without undue hesitation.
30

Para este trabalho escolhemos a pesquisa-ação de abordagem qualitativa. Segundo


Severino (2007, p. 120), a pesquisa-ação ―é aquela que, além de compreender, visa intervir na
situação com vistas a modificá-la. O conhecimento visado articula-se a uma finalidade
intencional de alteração da situação pesquisada‖. Nesse sentido, como o professor
pesquisador deste trabalho também será participante da pesquisa, a pesquisa-ação foi
escolhida como forma de propor ―ao conjunto de sujeitos envolvidos mudanças que levem a
um aprimoramento das práticas analisadas‖ (ibidem).
Esta pesquisa está sendo realizada no Campus Universitário de Altamira da
Universidade Federal do Pará com a turma da graduação intensiva do curso de licenciatura em
Língua Inglesa que ingressou no ano de 2009. A pesquisa teve início com a coleta de dados
preliminares das primeiras narrativas no final do período letivo de 2011, correspondente ao
mês de julho/agosto do referido ano. Os sujeitos da pesquisa são 24 alunos, sendo 6 homens e
18 mulheres. Para instrumentalizar a pesquisa, utilizaremos narrativas, dois questionários, e
duas entrevistas semi-estruturadas.
Nos dados preliminares desta pesquisa, foram coletadas 6 narrativas. Nessas narrativas
constam as experiências dos alunos com a língua inglesa desde o primeiro contato até os dias
atuais. Nelas, eles relatam fatos que julgam importantes ao longo da jornada acadêmica,
dificuldades, anseios, aspectos motivacionais, dentre outros. A seguir, apresento alguns
trechos dessas narrativas.
Em sua narrativa a primeira aluna (A1) menciona, que, apesar não ser formada em
Letras, foi chamada para trabalhar com inglês. Nesse sentido, precisou adquirir materiais de
estudo para aprender melhor a língua e criar métodos de ensino:

Em 1992, passei no vestibular da UEPA, para cursar Licenciatura Plena em


Educação Física, concluindo em 1997. No ano seguinte, 1998, passei no
concurso público para trabalhar em Senador José Porfírio, e quando me
apresentei na secretaria de educação, para minha surpresa, a secretária era a
profa. Marinês, que foi de imediato me oferecendo todas as turmas de
inglês. Eles não tinham aulas de inglês até então, motivo pelo qual começei
a trabalhar desde o alphabet. Comprei vários livros com CDs de audio, e
ficava estudando e ouvindo os diálogos, em casa, nas horas de folga, para
melhorar a minha atuação.

Observa-se, por este depoimento, que a aluna precisou de uma certa autonomia para
aprender a língua alvo, visto que a aluna cita que foi somente em 2005 que ela se matriculou
efetivamente em um curso de idiomas. O conhecimento que ela tinha da língua alvo,
incluindo metodologias, era apenas o da escola regular. Além disso, a aluna precisou, ao
31

longo desse período, criar suas próprias estratégias de aprendizagem para aprender, para
então, poder lecionar.
Nas narrativas dos alunos A1, A3, A4 e A5, percebe-se a busca pela informação mesmo
fora de contextos de aprendizagem, como a sala de aula.
―Pegava as letras das músicas e tentava traduzir‖ (A1)
―Como aqui na cidade nunca teve cursos de idioma meus pais sempre que podia
comprava livros sobre o assunto pra mim fiz um ensino médio com boas notas em inglês‖
(A3)
―[...] mas ao ouvir músicas internacionais eu gostava de escutá-las repetidamente com a
letra da mesma em mãos [...]‖ (A4)
―Comecei a estudar inglês com a idade de 12 anos, sozinho de um livro que meu irmão
achou no lixo, e outros ganhei de amigos‖.
Aspectos de estratégias de aprendizagem podem ser observados nas narrativas de A1 e
A4. Na fala de A1, percebe-se que para que ela aprendesse e se motivasse a entender a
música que estava cantando, preferia traduzi-la. Diferentemente dela, a A4 sentia-se bem
apenas escutando a música de forma repetida acompanhando com a letra das músicas. Já nas
falas de A3 e A5, aspectos de autonomia podem ser identificados. Quando A3 fala que seu
pai comprava livros relacionados ao idioma, e por consequência fazia com que ele tivesse
bons resultados, subentende-se que ele usava os livros para estudar de forma autônoma. Na
fala de A5, surpreendentemente a autonomia liga-se ao primeiro contato da língua, no qual em
busca de informação, este aprendente inicia a aprendizagem da língua por curiosidade e
motivação.
Semelhante à situação da A1, A2 também iniciou a carreira docente sem possuir curso
superior em licenciatura. Ela relata:

Como aqui na cidade nunca teve cursos de idioma meus pais sempre que
podia comprava livros sobre o assunto pra mim fiz um ensino médio com
boas notas em inglês. Em 2001 as escolas particulares começaram a
oferecer aulas de inglês de 1ª a 4ª série e como eu tinha sido uma boa alunos
meus professores me indicaram para eu dar aula para essas séries e fui
contratada. Como era carência e poucas pessoas se interessavam nessa
disciplina fui contratada para dar aula no ensino fundamental II 5ª a 8ª serie,
então comecei a estudar nos áudios e livros o pouco tempo que tinha tentava
aprender do jeito que dava.

Mesmo de forma precária, sem recursos, A2 afirma que tentava aprender da forma que
os materiais que possuía lhe proporcionavam a aprendizagem. Sendo assim, ao longo dos
32

anos de atuação, A2 deve ter refletido sobre suas práticas de ensino, em como fazer seus
alunos aprenderem para poder, também, aprender melhor a língua.
Em relação à produção oral, podemos observar nas narrativas alguns dados relevantes
para o nosso estudo. A4 mostra como a aprendizagem da habilidade oral aconteceu ao longo
de sua vida estudantil no seguinte trecho:

Estudei em colégios particulares, no ensino fundamental e médio os


professores de inglês trabalhavam a disciplina de forma corrida, sem atentar
em trabalhar com os alunos a parte de conversação, era mais cobrada a parte
gramatical, mais também de forma superficial. Eles não desenvolviam a
estrutura contextual, trabalhavam apenas palavras soltas como, por
exemplo, o nome de um animal ou um local e até algumas frases prontas,
porém fácil o que não permitia que desenvolvêssemos uma facilidade em
aprender a dialogar na língua.
Em virtude disso eu aceitava o inglês em meu cotidiano como uma matéria
de sala de aula, mas ao ouvir músicas internacionais eu gostava de escutá-
las repetidamente com a letra da mesma em mãos, pois a pronúncia e o jeito
que era proferido cada palavra despertava em mim um interesse de aprender
a falar de forma fluente, com isso eu tentei ingressar em um cursinho de
inglês mais não deu certo devido aos custos que já tinha com o colégio
particular e cursinho pré – vestibular. Apesar dos empecilhos algo me
ligava à língua inglesa, é até engraçado comentar, mas ao mesmo tempo em
que nada dava certo na possibilidade de aprendê-la, surgiam novas
oportunidades que me levavam a ela e quanto mais difícil ficava mais eu me
interessava.

A preocupação atual com a forma corrida com que a disciplina era ministrada e a não
preocupação em trabalhar a conversação talvez se faça presente em sua vida hoje, pela
necessidade de utilizar a língua inglesa no contexto em que ela se insere. Na maioria dos
casos, os professores de ensino fundamental e médio não tem interesse e não estão dispostos a
trabalhar com produção oral nas mínimas aulas dispostas semanalmente pela coordenação ou
escola É importante observar que A4 tomou a atitude de aceitar o inglês como uma simples
matéria de sala de aula, mas não ignorou o inglês do seu cotidiano. Foi partindo da produção
oral, de como as palavras eram pronunciadas, que o interesse de A4 de aprender de forma
fluente motivou o interesse de ingressar em um curso de idioma. No final, A4 menciona que
as dificuldades não eram barreiras e sim motivações para superações. Quanto mais difícil se
tornava, mais A4 queria aprender.
Por ser uma pesquisa em andamento, os dados preliminares ainda não nos possibilitaram
mostrar conclusões. Entretanto, com esses dados e as discussões apresentadas, podemos
observar os três aspectos estudados neste trabalho: estratégias de aprendizagem, autonomia e
produção oral se fazem presentes nas narrativas de aprendizagem dos sujeitos deste trabalho.
33

Mesmo sem ser ensinado de forma explicita, os alunos puderam apresentar em suas
narrativas características relevantes para uma aprendizagem eficaz. Entretanto, quando se
transporta para o contexto de sala de aula, professores e alunos, especialmente em
modalidades intensivas de graduação, prendem-se ao cumprimento de conteúdos e questões
que subjazem a aprendizagem ficam para trás para que o programa disciplinar possa ser
cumprido.
Com este trabalho esperamos contribuir para futuros estudos em autonomia e motivação
de aprendentes de cursos de Licenciatura em Língua Inglesa em modalidade intensiva
promovidos pela Universidade Federal do Pará, visto que são cursos com um alto índice de
evasão discente, e provavelmente a cobrança pela produção oral eficaz seja um dos motivos
desta evasão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BENSON, P. Teaching and Researching Autonomy in Language Learning. Harlow:


Longman, 2001.
BENSON, P; VOLLER, P. Autonomy & Independence in Language Learning. Harlow:
Longman, 1997.
BROWN, G.; YULE, G. Teaching the Spoken Language: an approach based on the
analysis of conversational English. Cambridge: Cambridge University Press, 1983.
CARLIEZ, M.; SOUSA, M.; LOPES, J. Projeto Pedagógico do Curso de Letras do
Campus Universitário do Marajó/Soure. Soure: UFPA, 2008.
CELCE-MURCIA, M.; OLSHTAIN, E. Discourse and context in language teaching: a
guide for language teachers. USA: Cambridge University Press, 2000.
DAM, L. Developing learner autonomy: the teacher‘s responsibility. In: LITTLE, D.;
RIDLEY, J.; USHIODA, E. (Eds.). Learner autonomy in the Foreign Language
Classroom. Dublin: Authentik, 2003, p. 135-146.
DICKINSON, L. Self-instruction in language learning. Cambridge: Cambridge University
Press, 1987.
HEDGE, T. Teaching and learning in the language classroom. Oxford: Oxford University
Press, 2000.
HOLEC, H. Autonomy in Foreign Language Learning. Oxford: Pergamon, 1981.
LITTLE, D. Autonomy: Definitions, Issues and Problems. Dublin: Authentik, 1991.
MAGNO E SILVA, W. Autonomia no Ensino e Aprendizagem de Línguas. In: Moara.
Revista de Pós-Graduação em Letras da UFPA, v. 20, p. 73-81, jul./dez. 2003.
MAGNO E SILVA, W., Autonomia no Aprendizado de LE: é preciso um novo tipo de
professor? In: Educação de Professores de Línguas: os desafios do formador. Campinas:
Pontes, 2008, p. 293-301
O‘MALLEY, J.; CHAMOT A. Learning Strategies in Second Language Acquisition. New
York: Cambridge University Press, 1990.
OXFORD, R. Language Learning Strategies: what every teacher should know. Boston,
Massachusetts: Heinle & Heinle Publishers, 1990.
RICHARDS, J. C.; RENANDYA, W. A. Methodology in Language Teaching; an
anthology of current practice. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
34

RUBIN, J. Learner Strategies: Theoretical Assumptions, Research History and Typology. In:
WENDEN, A; RUBIN, J. Learner Strategies in Language Learning. Cambridge: Prentice
Hall International (UK) Ltd., 1987. p. 3-13.
SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. São Paulo: Cortez, 2007.
WENDEN, A. Conceptual Background and Utility. In: WENDEN, A; RUBIN, J. Learner
Strategies in Language Learning. Cambridge: Prentice Hall International (UK) Ltd., 1987.
p. 3-13.

O PROCESSO DE REVITALIZAÇÃO DA LÍNGUA MUNDURUKÚ:


Observações preliminares

Celso FRANCÊS JÚNIOR (UFPA)


Orientadora: Gessiane de Fátima Lobato PICANÇO (UFPA)

RESUMO: O interesse de nossa pesquisa é a comunidade Mundurukú da Terra Indígena


Kwatá-Laranjal habitante do rio Kanumã, no estado do Amazonas, pois a língua desta
comunidade apresenta situação crítica de extinção. Porém, o interesse de revitalização,
manifestado pela comunidade, extrapola todos os obstáculos rumo à retomada de sua língua
nativa, completando sua herança cultural. Segundo Hilton e Hale (2001) a revitalização da
língua deve ser um esforço de colaboração que envolve dedicação pelos membros da
comunidade. Nosso trabalho assume a responsabilidade de observar processo de revitalização
da língua Mundurukú desta comunidade verificando o nível de interesse, de
comprometimento que a comunidade assume para o sucesso do processo. Para a coleta de
dados foram feitas entrevistas com quarenta e quatro (44) informantes que responderam sobre
algumas áreas de domínio da língua como a história, a educação, a atitude e o uso da língua.
Com o recurso de gravador digital colhemos aproximadamente 13 horas de gravação de
áudio, o qual serão transcrevidos para uma análise qualitativa. Pretendemos desenvolver esta
pesquisa sob a hipótese que de esta comunidade deseja revitalizar sua língua a partir das
disciplinas da língua Mundurukú do Curso de Formação Específica de Professores Indígenas
Mundurukú da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas. A proposta é
que esta formação também propicie aos alunos da Comunidade Mundurukú aprender a língua
e ensiná-la a todas as crianças da comunidade. Dos fatores que os motivam para o processo de
revitalização, o preconceito linguístico parece ser mais acentuado, pois nas palavras dos
alunos ―a sociedade branca os consideram menos índio por não falar sua língua‖.

PALAVRA-CHAVE: Extinção linguística, revitalização e formação de professores.

ABSTRACT: The interest of our research is the community of Indigenous Mundurukú


Kwata-Laranjal Kanuma inhabitant of the river in the state of Amazonas, since the language
of this community has a critical situation of extinction. However, the revival of interest
manifested by the community, goes beyond all obstacles towards recovery of their native
language, completing their cultural heritage. According to Hilton and Hale (2001) the
revitalization of the language should be a collaborative effort that involves dedication by
community members. Our work assumes the responsibility to observe the process of language
revitalization of this community Mundurukú checking the interest level of commitment that
the community takes to the success of the process. For data collection interviews were
conducted with forty-four (44), informants were asked about some areas of the field of
35

language and history, education, attitude and language use. With the use of digital recorder
harvested approximately 13 hours of audio recording, which will be transcribed for qualitative
analysis. We intend to develop this research under the assumption that in this community
want to revitalize their language from the disciplines of language Mundurukú Course Teacher
Training Specific Mundurukú Indigenous College of Education, Federal University of
Amazonas. The proposal is that this training is also possible to the students of the Community
Mundurukú learn the language and teach it to all children in the community. Among the
factors that motivate them to the process of revitalization, linguistic bias seems to be more
pronounced because of the students in the words "white society consider them less Indian by
not speaking their language."

1 INTRODUÇÃO

Nossa diversidade cultural está em extinção, e com ela está desaparecendo uma grande
quantidade de línguas ainda existentes no Brasil. Hoje, calcula-se que o número de línguas
indígenas faladas no Brasil deve estar entre 150 e 180. Este número pode até impressionar,
mas é pouco em comparação com as estimativas de que teriam sido mais de 1200 línguas
quando da chegada dos europeus há 500 anos. Segundo a professora Solange Aparecida
Gonçalves (2009) citando Moore, 2006.

há em torno de 154 línguas indígenas distintas em nosso país. A diferença de


seu levantamento em relação a outros (como o de Rodrigues 1986) reside,
segundo esse autor, principalmente ―no problema da confusão frequente
entre línguas, dialetos e grupos étnicos‖.

O presente panorama da péssima situação das línguas minoritárias indígenas no Brasil


demonstra a grande necessidade de uma documentação, análise e descrição rigorosa que
possibilite materiais para futuros projetos de revitalização de línguas em perigo. Precisamos
de motivação para recrutar novos pesquisadores, pois sabemos que são poucos, embora tenha
crescido o número de pesquisas na área. Segundo Moore, 2006

Das cerca de 150 línguas indígenas, pelo menos 21% estão seriamente
ameaçadas de desaparecer em curto prazo, devido ao número reduzido de
falantes e à baixa taxa de transmissão para as novas gerações.

Segundo Maia (2006) a preservação e a revitalização de uma língua demanda


procedimentos complexos que viabilizem a formulação e a implementação de políticas
afirmativas no sentido de garantir a institucionalização de práticas sociais que valorizem,
divulguem e ampliem o uso de uma língua minoritária. Mas o que leva uma língua à morte e o
36

que se deve fazer para mantê-la viva? Essas são questões polemizadas na obra de Cristal
(2000) chamada ―Language Death‖ e que dá um tom mais responsável para o problema de
extinção das línguas. ―O que pode ser feito?‖. Esta é, sem dúvida, uma boa pergunta. Hinton
(2001), em estudos importantes sobre o processo de revitalização de línguas, lembra que há
hoje, no mundo cerca de 250 nações, onde se falam em torno de 6.000 línguas. Essa imensa
desproporção entre o número de países e o de línguas indica que apenas uma minoria das
línguas do mundo pode ser caracterizada como língua de governo. É importante levar até a
nossa consciência que a maioria das línguas do mundo está ameaçada de extinção e isto é fato.
Uma língua só morre se seus falantes morrem. Uma tautologia que devemos considerar
quando nos propomos a falar de revitalização de línguas.
Segundo Hilton e Hale (2001) a revitalização da língua deve ser um esforço de
colaboração que envolve dedicação dos membros da comunidade. Os projetos devem ser
iniciados por pessoas que estão interessadas realmente no processo de revitalização. Uma
pessoa que se dedica à causa pode fazer uma grande diferença, mas muito mais pode ser
alcançado uma vez que o apoio da comunidade é adquirido. O importante é começar, e para
isso precisamos nos fazer a seguinte pergunta: O que se pode fazer para começar um processo
de revitalização? Conhecer a real intenção da comunidade no processo; saber o que é descrito
sobre a língua; aprender a língua ou os recursos que estão disponíveis; desenvolver materiais
de aprendizagem; motivar a comunidade para o processo, esses são alguns aspectos o qual
devem ser considerados quando se objetiva revitalizar uma língua.

2 OS MUNDURUKÚ

Amplamente conhecidos por Mundurukú, os historicamente famosos ―cortadores de


cabeça‖ autodenominam-se wũyjũyũ que significa povo, gente, pessoa. Foram considerados
no passado uma das tribos mais guerreiras, inteligentes e poderosas que viveu no Brasil.
Segundo Gomes (2006), povo Tupí, com população estimada em cerca de 10.000 pessoas
(FUNASA/2011), boa parte dela constituída por poucos falantes plenos. Vivem no Vale do
Rio Tapajós e de seus afluentes, no Estado do Pará, sendo também encontrados na bacia do
Rio Madeira, Estado do Amazonas, e na terra indígena Apiaká, município de Juara (Mato
Grosso). Nosso interesse para nossa pesquisa será a comunidade Mundurukú que habita a
bacia do Rio Madeira. Na Terra Indígena Kwatá-Laranjal são 18 aldeias, as quais são
distribuídas em: Suaru, Parawa, Kwara, Fronteira, São Francisco, Aru, Pajurá, Mamiá, Terra
Preta, Niterói, Cobra, Laguinho, Laranjal, Mucajá, Sorval, Varre-vento, Vila Batista, Vila
37

Nova, que totalizam aproximadamente 2.200 índios. (FONTE: Professores Mundurukú e


Sateré-Mawé em formação e Agentes Indígenas de Saúde, 2001).

3 OBSERVAÇÃO DA REVITALIZAÇÃO

Nosso trabalho assume a responsabilidade de observar o processo de revitalização da


língua Mundurukú da comunidade indígena Kwatá-Laranjal habitante do rio Kanumã, Estado
do Amazonas verificando o nível de interesse, de comprometimento que a comunidade
assume para o sucesso do processo. A pesquisa pretende observar o processo de revitalização
da língua Mundurukú e quem sabe num futuro fazer um acompanhamento do processo.
Inicialmente nos propomos a realizar um questionário de perguntas que estavam relacionadas
a quatro áreas: a história da língua; a educação da língua; a atitude dos falantes, e por fim, o
uso da língua. Posteriormente, decidimos que tal questionário, que a princípio seria dado aos
informantes e respondido em modalidade escrita, se transformou em uma entrevista semi-
estruturada e gravada em equipamento digital. Obtivemos aproximadamente 13h de gravação
e é a partir das informações contidas nas gravações é que será feita a análise para saber, de
forma detalhada, o que realmente a comunidade indígena, assim como os alunos do curso,
quer fazer com a língua Mundurukú depois de aprendê-la, e, se vão de fato aprendê-la.
Para a realização desta pesquisa nos propusemos a fazer um trabalho de campo, coletar e
observar o fenômeno no seu ponto de origem, assim tomando, por empréstimo, as palavras de
Coupland & Jaworski, 1997, p.69 (apud RODRIGUES JÚNIOR, 2005)

O trabalho de campo é considerado ferramenta essencial que os antropólogos


utilizam para a coleta de dados e sua posterior análise. Eleito como método
central de investigação da linguagem em sociedade, o trabalho de campo
acena para as interpretações dos variados contextos sociais nos quais os
pesquisadores se inserem, na tentativa de extrair desses contextos formas
linguísticas de significados, além de investigar até que ponto seus
informantes são capazes de manipular o caráter social das interações em que
participam (cf. COUPLAND &JAWORSKI, 1997, p.69).

A pesquisa será desenvolvida a partir da aplicação de questionário considerando alguns


aspectos julgados relevantes para os resultados. O questionário para programa de
revitalização, como é chamado este conjuntos de perguntas, será construído considerando o
aspecto histórico da comunidade; a educação; a atitude linguística e o uso da língua. O quadro
abaixo ilustra o que foi informado acima:
38

HISTÓRICO
1. Qual a primeira língua que você aprendeu quando criança?
2. Que língua seus pais aprenderam quando criança?
3. Que língua seus avós aprenderam quando criança?
4. Você escutava seus avós falarem com seus pais na língua Mundurukú?
5. Que língua você usa mais frequentemente em casa para falar com as crianças?
6. Que língua você usava mais frequentemente em casa para falar com adultos?
7. O você conhece da cultura de seu povo?
8. Como você conheceu?
9. Em que língua isso aconteceu?

EDUCAÇÃO
1. Que língua você usa mais frequentemente em casa para escrever?
2. Que língua você prefere para ler?
3. Que língua você prefere para escrever?
4. Você foi alfabetizado em que língua e como foi este processo?
5. Em que língua você gostaria que seus filhos fossem alfabetizados?
6. Você já teve algum tipo de experiência de aprendizagem em língua Mundurukú? Se teve,
como isso aconteceu?
7. Você acha importante aprender a forma escrita do Mundurukú? Por quê?
8. Se tivesse que estudar a língua Mundurukú na escola, como você gostaria que fossem as
aulas?
9. Qual sua expectativa nas disciplinas onde irão aprender a língua Mundurukú?

ATITUDE
1. Que língua você fala mais confortavelmente?
2. Que língua deve ser ensinada na escola?
3. Qual seu interesse em voltar a falar sua língua nativa?
4. Atualmente, quantos falantes falam sua língua nativa e quem são eles?
5. Se você aprender sua língua nativa, o que vai acontecer com o português?
6. Que futuro você imagina para a sua língua de cultura?
7. Você gostaria que todos de sua comunidade falassem a língua Mundurukú. Por quê?
8. Você acha que a sociedade os considera menos indígenas por não falarem o Mundurukú?
39

9. Você se sente menos índio por não falar a língua Mundurukú?


10. Você já sofreu algum tipo de preconceito por ser índio?
11. Você já sofreu algum tipo de preconceito por não falar a língua Mundurukú?
12. Você acha que por ser índio é mais propenso a sofrer preconceito por parte dos não
índios?
13. Você acha realmente que vai aprender a língua Mundurukú?

USO
1. Que língua você usa no trabalho para falar com seus colegas?
2. Que língua você fala com pessoas da mesma idade na vizinhança?
3. Na sua comunidade ainda fazem algum tipo de cerimônia?
4. Que língua você usa durante uma cerimônia de sua tribo?
5. Você conhece alguma palavra na língua Mundurukú? Se conhece, utiliza com que
frequência ?
6. Você, geralmente se interessa em aprender novas palavras em Mundurukú?
7. Como você vai fazer isso? (só se tiver interesse)
8. Para que fazer isso?(só se tiver interesse)
9. Que língua você acha ―mais bonita‖? Por que?
10. Você sabe que língua seus pais consideravam mais bonita?

O processo de pesquisa por meio de questionário pode proporcionar uma análise mais
concreta do objeto e a construção de uma hipótese mais consistente. No entendimento daquilo
que se quer pesquisar podemos criar um ambiento onde o pesquisador pode interagir com
indivíduos da comunidade a partir das perguntas existentes no questionário.
4 COMPARTILHANDO EXPERIÊNCIAS DA PESQUISA

Nossa pesquisa foi motivada inicialmente pela necessidade de se verificar a Política


linguística voltada para a Língua Mundurukú com o objetivo de fazer uma regênese da língua
a partir do nível de interesse que a comunidade tem para isso. Aproveitando o projeto voltado
para os jovens índios do Curso de Formação Específica de Professores Indígenas Mundurukú
da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) entendeu-se que
havia necessidade de incorporar em seu desenho curricular disciplinas de língua Mundurukú,
já como uma pequena prévia de um processo de revitalização de língua.
40

O levantamento inicial para o começo do projeto de pesquisa foi feito a partir de uma
reunião que minha orientadora teve com os alunos do curso para que pudesse reter a maior
quantidade possível de informação sobre o que realmente eles queriam fazer com sua língua
nativa. A ideia é que os alunos aprendam a língua para ensiná-la às crianças, em casa e nas
escolas. É importante consideramos que o futuro de uma língua, em processo de revitalização,
está no que as crianças vão fazer com a língua. São elas que determinam o sucesso ou não do
processo. Outro fator determinante que devemos considerar foi a informação dadas pelos
alunos de que a maior motivação da revitalização é porque eles acham que a sociedade os
consideram menos índio por não falarem mais a sua língua.
A maioria das comunidades possuem escolas de ensino fundamental e as crianças são
alfabetizadas em Língua Portuguesa, o que no nosso entendimento foi um dos fatores de
desuso da língua nativa. Todos os professores receberam um tipo de formação para o
magistério proposto por um projeto chamado Kabia‘ra do Governo do Estado do Amazonas.
Entendemos ser importante para o processo de revitalização que os alunos deste curso
aprendam o Mundurukú e ensinem às crianças, esse talvez seja o princípio do processo,
contudo, também sabemos que o português aprendido por eles não irá desaparecer
subitamente, portanto esperamos que o futuro linguístico desta comunidade seja de
bilinguismo.
São muitos os fatores de aculturação e que consequentemente levam à perda da língua.
Historicamente o contato com o branco; a presença dos jesuítas contribuiu para isso. Outros
fatores importantes são: a saída dos índios para o trabalho fora das aldeias; a saída, também,
para o estudo em escolas não indígenas, etc. Para os governos o processo de revitalização de
uma língua não é um negócio vantajoso. Revitalizar uma língua custa muito caro aos cofres
públicos. Hoje, as políticas linguísticas voltadas para esta questão ainda são tímidas e muitas
vezes hipócritas. A mobilização para a manutenção de línguas minoritárias ainda parte de
pesquisadores interessados no assunto.

5 CONCLUSÃO

Nosso desafio é estudar o processo de reavivamento desta língua, a partir da história


da língua Mundurukú, da educação que a comunidade teve com a sua língua, tanto o
português como o Mundurukú, do uso que se faz da língua ou se quer fazer e da verdadeira
atitude linguística que eles manifestam sobre a língua. A Contribuição de nossa pesquisa é a
longo prazo e pode trazer a comunidade científica experiências de revitalização em língua
41

minoritárias, neste caso de língua indígenas, que podem contribuir para a elaboração de
políticas linguísticas indígenas mais eficazes para a manutenção e revitalização de língua em
processo de extinção.
Esperamos que a tentativa de revitalização de língua Mundurukú tenha bons resultados
e que isso possa gerar, na consciência da comunidade linguística, um sentimento ecológico
em favor das línguas em perigo de extinção. Que a elaboração de gramáticas e dicionários
possam servir como instrumentos eficazes para o ensino e transmissão de línguas indígenas
para as futuras gerações.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CRISTAL, M. Language Death. Cambridge: Cambridge University. Press, 2000.p 127-166


GOMES, Dioney Moreira. Estudo morfológico e sintático da língua mundurukú (Tupí).
Tese de doutorado apresentada ao Departamento de Linguística, Línguas Clássicas e
Vernáculas da Universidade de Brasília. 2006.
HINTON, Leanne; HALE, Ken.The Green Book of Language Revitalization in
Pratice.San Diego: Academic Press, 2001. p 3-18
MAIA, Marcus. A revitalização de línguas indígenas e seu desafio para a educação
intercultural bilíngue. Tellus, ano 6, n. 11, p. 61-76, Out. Campo Grande – MS. 2006
MOORE, D. Brazil: Language Situation. In: BROWN, K. (org. geral). Encyclopedia of
language and linguistics, 2.ed. Oxford: Elsevier, 2006. v. 2. p. 117-128.
GONÇALVES, Solange Aparecida. Por um planejamento linguístico local. Texto
apresentado para qualificação na área de ―Multiculturalismo, Plurilinguismo e Educação
Bilíngue‖ do Departamento de Linguística Aplicada, do Instituto de Estudos da Linguagem
(IEL), da Unicamp, sob orientação da Profª. Drª Terezinha de Jesus Machado Maher. (2009)

O SISTEMA VOCÁLICO DO PORTUGUÊS FALADO EM BRAGANÇA (PA):


ANÁLISE EXPERIMENTAL

Carlos Nédson Silva CAVALCANTE (UFPA)


Orientadora: Pra. Dra. Regina Célia Fernandes CRUZ (UFPA/CNPq)

RESUMO: Este trabalho apresenta a pesquisa O Sistema Vocálico do Português Falado em


Bragança (PA): Análise Experimental. Seu principal objetivo é caracterizar acusticamente as
vogais orais médias, em posição pretônica, desta variedade falada na Amazônia Paraense. Os
dados que embasam nossa análise serão obtidos junto a 18 informantes socialmente
estratificados em idade, sexo e escolaridade. Os dados a serem analisados compreendem
realizações de vogais médias pretônicas que serão obtidos induzindo os locutores a
produzirem vocábulos contendo as vogais alvo em dois protocolos diferentes: a) um teste de
projeção de imagens e b) a leitura de um texto. Para a composição do material, foram
selecionados 74 vocábulos de maior frequência de ocorrência nos corpora sociolinguísticos já
42

existentes sobre as variedades linguísticas estudadas do Pará. Os contextos são os mesmos


cujo fatores foram selecionados pelo programa Varbrul como favorecedores para explicar o
fenômeno de variação das vogais alvos em suas descrições variacionistas prévias
(RODRIGUES & ARAÚJO 2007, CAMPOS 2008, CRUZ et al 2008, SOUSA 2010). Serão
tomadas medidas de F1, F2, F0 e da duração das vogais médias alvo na posição pretônica. As
medidas acústicas serão feitas com o auxílio do programa PRAAT. Preve-se igualmente o uso
do software R para tratamento estatístico a ser analisado. São também previstas medidas das
vogais tônicas destes 74 vocábulos com o objetivo de apresentação de um espaço vocálico de
referência

PALAVRAS-CHAVE: vogais médias; vogais pretônicas; análise experimental.

ABSTRACT: This paper presentes the research The Vowel System of the Portuguese spoken
in Bragança (PA): Experimental Analysis. Its main objective is to characterize acoustically
middle vowels in a position pre-stressed this variety spoken in the Amazon region of Pará.
The data underlying our analysis are obtained from 18 informants socially stratified on age,
sex and educational level. The data to be analyzed include realizations of middle pre-stressed
vowels that will be achieved by inducing the speakers to produce target words containing the
vowels in two different protocols: a) a test image projection and b) reading a text. For the
composition of the material, we selected 74 words to more frequent occurrence in existing
sociolinguistic corpora studied on the linguistic varieties of Pará. The contexts are the same
factors which were selected by the program Varbrul to explain the phenomenon of variation
of vowels targets in their descriptions previous variational (RODRIGUES & ARAÚJO 2007,
CAMPOS 2008, CRUZ et al 2008, SOUSA 2010). Measures will be taken F1, F2, F0 and
duration of middle pre-stressed vowels. The acoustic measurements are made with the help of
the PRAAT. Provision is also made using the R software for statistical treatment to be
analyzed. They are also provided measures of stressed vowel of these 74 words in order to
provide a reference vowel space.

KEYWORDS: middle vowels; pre-stressed vowels; experimental analysis.

1 INTRODUÇÃO

Diversos fenômenos fonológicos do Português do Brasil têm suscitado grande número de


indagações e, por conseguinte, uma produção científica crescente. Um destes fenômenos, objeto deste
estudo, é o comportamento das vogais médias /e/ e /o/ em posição pretônica.
O português do Brasil demonstra alta produtividade da vogal média em posição pretônica, com
predominância das realizações abertas ou fechadas de acordo com cada área do país. O objetivo desta
pesquisa, é caracterizar acusticamente as vogais orais átonas, em posição pretônica, do Português do
Brasil, mais especificamente as variedades estudadas no Português do Norte do Brasil, através das
propostas de Mattoso Câmara Junior (1969). Câmara Junior (1977) determina o quadro de sete vogais
tônicas observando a existência de neutralizações nas posições átonas. Das átonas, considera as
pretônicas as menos fracas em relação à tonicidade, observando o desaparecimento das oposições
entre as médias /ɛ / e /e/ e entre /ɔ / e /o/, o que resulta nos arquifonemas /E/ e /O/ e na redução da
série a cinco vogais, sendo altas /i/ e /u/; médias /E/ e /O/ e central /a/.
43

Esta pesquisa está integrada ao Projeto Vogais do Norte10 e já procedeu a descrição do processo
de variação das vogais médias pretônicas de cinco localidades do Estado do Pará, a saber: i) do
português falado em Cametá (RODRIGUES & ARAÚJO 2007); ii) em Mocajuba (CAMPOS, 2008);
iii) em Breves (CASSIQUE et al no prelo; DIAS, et al 2007; OLIVEIRA 2007); iv) em Belém
(SOUSA 2010; CRUZ et al 2008) e, v) em Breu Branco (MARQUES 2008, COELHO 2008,
CAMPELO 2008). Os estudos são descrições sociolinguísticas de cunho variacionistas, que
apresentam um tratamento quantitativo dos dados e todos os resultados sobre as variedades do
português falado na Amazônia paraense apontam para uma tendência de preferência pela preservação
das médias pretônicas em detrimento do alteamento. Também confirmam que quando ocorre o
alteamento das vogais médias pretônicas nas variedades linguísticas paraenses, o mesmo se dá
motivado por uma clara harmonização vocálica, principalmente condicionada pela vogal da sílaba
tônica e pela sílaba imediata, que contempla as hipóteses de Câmara Junior (1969), que afirmava ser o
alçamento da pretônica determinado pela altura da vogal da tônica e de Silva Neto (1957) que
afirmava ser o alçamento ainda mais favorecido por sílaba com vogal alta contígua e imediata à sílaba
da vogal pretônica.
Análises dos dados da variedade de Belém11 (PA) de caráter ainda preliminar (CRUZ 2011,
REIS 2011, REIS et al 2011) tem demonstrado que a variedade do português falada na Amazônia
Paraense possui no nível acústico 4 (quatro) variantes para as vogais médias pretônicas: a) alteamento
como em fut[i]bol e c[u]madre; b) manutenção como em fut[e]bol e c[o]madre; c) abaixamento como
em fut[E]bol e c[O]madre; d) mas há também casos de enfraquecimento das vogais pretônicas ou
mesmo de total apagamento das mesma como em fut[Ø]bol e c[Ø]madre. As análises acústicas têm
confirmado os resultados das descrições sociolinguísticas de que a manutenção das médias é a variante
de maior ocorrência no português falado na Amazônia Paraense, seguida do alteamento das médias
pretônicas e a variante de abaixamento é a de menor ocorrência nos corpora.
A variedade linguística objeto da presente pesquisa faz parte do português regional
paraense. Bragança é um município situado na região Nordeste do Pará a 200 km de Belém e
a 16 km do Oceano Atlântico, à margem esquerda do rio Caeté. É um dos municípios mais
populosos do estado do Pará e recebe grande fluxo migratório. Possui uma intrínseca relação
entre campo e cidade devido às relações de trabalho, estudo e/ou familiar, pois, comumente,
bragantinos urbanos têm pais bragantinos de origem rural. As principais atividades comerciais
estão relacionadas à pesca (há o predomínio das grandes companhias pesqueiras; já a extração
do caranguejo é essencialmente familiar), ao comércio de produtos locais e industrializados,

10
Projeto de Pesquisa Descrição Sócio-Histórica das Vogais do Português do Norte do Brasil (Portaria nº
047/2009ILC).
11
Novo estudo realizado por CRUZ, Regina. Projeto de Pesquisa ―Brazilian Amazon Portuguese vowel system:
acoustic analysis” (processo BEX1754/10-6) Brasília: CAPES/ Fulbright, New York (USA): New York
University, 2011. (Relatório Técnico-científico Aprovado).
44

importados de outros centros e a agricultura e criação de animais (prevalecem o pequeno e o


médio produtor).
A análise proposta nesta pesquisa segue os pressupostos teóricos de Câmara Junior
(1969), em que se pretende descobrir quais fatores linguísticos e extralinguísticos são
relevantes para explicar o comportamento variacional das vogais médias, em posição
pretônica, do português falado no município de Bragança, em particular os fonéticos, como
tem demonstrado os estudos já realizados.

2 METODOLOGIA

Como se trata de uma nova fase do trabalho de análise das vogais médias, cujo objetivo
é definir a avaliação subjetiva dos falantes sobre sua variedade, novos sujeitos foram
selecionados para o trabalho de campo, mantendo-se, entretanto, a mesma estratificação social
utilizada nas descrições variacionistas realizadas pela equipe da UFPA ligada ao
PROBRAVO12 (cf. RODRIGUES & ARAUJO 2007, SOUSA 2010, CAMPOS 2008, CRUZ
et al 2008).

2.1 Perfil dos sujeitos

Foram selecionados 18 sujeitos para participarem do protocolo experimental. Todos


deviam respeitar as condições exigidas para obtenção de dados representativos, ou seja, eles
deviam ser paraenses natos de Bragança, no caso de não terem nascidos em Bragança, deviam
ter fixado residência na referida cidade antes dos 25 anos. De modo geral, os sujeitos não
poderiam ter ficado por mais de dois anos residindo em outra cidade e distante da capital
paraense.
Os sujeitos foram estratificados em sexo (feminino, masculino), faixa etária (15 a 25
anos, 26 a 45 anos e acima de 46 anos) e escolaridade (nível fundamental, médio e superior).
Como o protocolo experimental prevê etapa de leitura de texto, os sujeitos analfabetos foram
excluídos naturalmente.
2.2 Material

Para a composição do material, foram selecionados 74 vocábulos de maior frequência


de ocorrência nos corpora sociolinguísticos já existentes sobre as variedades linguísticas

12
Projeto Descrição Sócio-Histórica das Vogais do Português do Brasil coordenado por Dr. Marco Antônio de
Oliveira (PUCMG) e Dr. Seung-Hwa Lee (UFMG) e do qual fazem parte 15 outras instituições nacionais além
da UFPA e da própria UFMG que sedia o projeto. Para maiores detalhes, consultar o site do projeto
http://relin.letras.ufmg.br/probravo
45

estudadas do Pará. Os contextos são os mesmos cujo fatores foram selecionados pelo
programa Varbrul como favorecedores para explicar o fenômeno de variação das vogais alvos
em suas descrições variacionistas prévias (RODRIGUES & ARAÚJO 2007, CAMPOS 2008,
CRUZ et al 2008, SOUSA 2010).

2.3 Coleta de dados

O corpus utilizado para o presente plano de trabalho foi formado com dados coletados a
partir de duas etapas experimentais rigorosamente controladas: a) um teste de projeção de
imagens e b) a leitura de um texto, as quais serão descritas em seguida.

2.3.1 Teste de projeção de imagens

Para essa primeira etapa da coleta de dados foi utilizado um material visual contento
imagens que representam os setenta e quatro vocábulos alvos que compõem o corpus final do
estudo. A sequência dos setenta e quatro imagens foi projetada três ou quatro vezes,
dependendo do desempenho do sujeito durante a coleta em emitir os vocábulos desejados.
Quando ocorreu de o vocábulo não ter sido emitido imediatamente pelo sujeito, perguntas
eram feitas de forma a levá-lo a emissão dos vocábulos alvos. As sequencias de imagens
foram dispostas em ordem aleatória de forma a evitar qualquer efeito lista na emissão dos
vocábulos. Inspirou-se para a montagem deste teste em RIBEIRO (2007), que elaborou este
mesmo tipo de instrumento de coleta de dados ao estudar as médias postônicas não finais.

2.3.2 Dados de leitura

Para esta etapa da coleta de dados foi utilizado um texto contendo os 74 vocábulos
selecionados. Os 18 sujeitos selecionados para participarem do teste, leram um texto contendo
os 74 vocábulos do corpus. Um texto foi elaborado considerando sua extensão (pois tememos
que o experimento seja cansativo com um texto longo), seu gênero textual (selecionar-se-á um
texto de um gênero de fácil acesso), o assunto central (pensa-se utilizar um texto cujo
conteúdo seja familiar aos sujeitos para que o mesmo não interfira na produção das vogais
médias). Foi dado um tempo de dez minutos para que cada sujeito se familiarizasse com o
texto antes da sua leitura em voz alta.

2.4 Tratamento de dados

Uma vez as gravações obtidas em trabalho de campo, o tratamento realizado consiste


em seis etapas bem estabelecidas. Primeiramente as gravações originais são segmentadas em
46

6 (seis) níveis no programa PRAAT: enunciado, indicação da palavra alvo, duração da


palavra, sílaba, transcrição fonológica da vogal, transcrição fonética da vogal. Em seguida
procede-se à extração dos vocábulos alvo e seu isolamento em um arquivo individual,
preservando seu sinal sonoro e sua transcrição no TextGrid. Para tal utiliza-se um recurso do
próprio PRAAT (Extract Selected Sound e Extract Selected TextGrid). Passa-se então a
codificação do vocábulo contendo as informações sociais do locutor, do tipo de situação de
fala gravado (teste de imagens ou fala lida) e o próprio vocábulo em si. O código criado é
utilizado para nomear o novo arquivo criado.

De posse dos vocábulos em arquivos isolados, procede-se ao levantamento e registro


das variantes de vogais médias pretônicas identificadas no corpus por locutor em um
formulário controle padrão. São então tomadas medidas de F1, F2, F0 e da duração das vogais
médias alvo na posição pretônica na parte central das vogais. A tomada de medidas acústicas
é feita também com o auxílio do programa PRAAT. São também realizadas medidas das
vogais tônicas destes mesmos setenta e quatro vocábulos com o objetivo de apresentação de
um espaço vocálico de referência. O tratamento estatístico compreende tomada de média,
desvio padrão e teste T dos valores obtidos. Preve-se também o uso do software R para
tratamento estatístico a ser analisado.

3 ANDAMENTO DA PESQUISA

A presente pesquisa está com a coleta de dados em andamento. O corpus já coletado


conta com a amostra de 12 sujeitos, restando 06 para seu término. Das 12 amostras já
coletadas, 09 foram realizada na Sala de Videoconferência, do Campus Universitário de
Bragança e 03 nas residências dos informantes. A referida sala é apropriada para a realização
da coleta, pois possui uma acústica muito boa e é equipada para utilização de áudio e vídeo. A
captura do áudio foi feito com o auxílio de um gravador Microtrack II da M-Audio e
microfone Philips SBC MD 140 e, para projetar as imagens, utilizamos um notebook Sony
Vaio Série E 14‘‘ VPCEA43FB com processador Intel Core i5 e um projetor NEC modelo
CTXI - VT 595.
Tomou-se o cuidado de estabelecer uma relação amistosa, deixando que o informante
manifestasse o seu comportamento natural e de fazer o mínimo de intromissão para não
influenciá-lo ao nivelamento linguístico. Para todos foram adotados os mesmos
procedimentos: enquanto se organizava os materiais para coletar os dados, os procedimentos
da coleta eram explicados. As gravações têm tempo aproximado de 35 minutos, dentre estes,
47

05 minutos são referentes à leitura do texto. Dos 12 informantes selecionados, apenas três
apresentaram dificuldade nas duas etapas do protocolo experimental, sendo necessário refazer
a gravação do teste de projeção de imagens de dois informantes.
As coletas já efetuadas foram realizadas nos meses de setembro/outubro de 2011, e tem
sua conclusão prevista para novembro de 2011. A análise e sistematização dos dados são as
próximas etapas a serem desenvolvidas.

4 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Nesta pesquisa procura-se refletir a respeito do português falado no município de


Bragança (PA) levando-se em consideração as realizações acústicas das vogais médias
pretônicas desta variedade da Amazônia paraense. Com a coleta de dados em fase de
conclusão, os passos seguintes são as análises e sistematização das amostras. Finalmente,
após essas etapas, esperamos apresentar nossos resultados referentes ao comportamento
variável das vogais médias, em posição pretônica, apresentando os contextos propícios à
aplicação dos processos; as identificações das variáveis linguísticas e extralinguísticas que
possam influenciar positivamente ou negativamente o comportamento variável do processo e;
traçar um quadro comparativo entre os resultados obtidos neste trabalho e os resultados já
apresentados por estudiosos para outras variedades do Português, bem como para a variedade
em questão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BISOL, Leda. Harmonização Vocálica: uma regra variável. Tese de Doutorado em
Lingüística e Filologia. Rio de Janeiro: UFRJ, 1981.
CAGLIARI, Luiz Carlos. An experimental study of nasality with particular reference to
Brazilian Portuguese. Edinburgh: University of Edinburgh. Ph.D. Thesis, 1977.
CALDAS, Raimunda, CRUZ, Regina & SILVA, Tabita. ―Possibilidade de interferência da
Língua Geral Amazônica na combinação de orações em Urubú-Ka‘apór‖, in Atas do
Workshop sobre Lingüística Histórica e Línguas em Contato: Línguas Indígenas
Brasileiras e de Áreas Adjacentes. Brasília: UnB, no prelo.
CAMARA JR, Joaquim Mattoso. Estrutura da Língua Portuguesa. 24 ed. Petrópolis:
Vozes, 1969.
CAMARA JR, Joaquim Mattoso. Para o estudo da fonêmica portuguesa. Rio de Janeiro:
Padrão, 1977.
CAMPELO, Maria Madalena. A Variação das Vogais Médias Anteriores Pretônicas no
Português Falado no Município de Breu Branco (PA): uma Abordagem Variacionista.
Belém: UFPA/ILC/FALE, 2008. (Trabalho de Conclusão de Curso em Letras).
CAMPOS, Benedita do Socorro. Alteamento das vogais médias pretônicas no português
falado em Mocajuba (PA): uma abordagem variacionista. Belém: UFPA/CML, 2008.
(Dissertação de Mestrado em Lingüística).
48

CAMPOS, Socorro & CRUZ, Regina. “Alteamento Vocálico em Posição Pretônica no


Português Falado no Município de Mocajuba (Pará), comunicação oral apresentada no X
Congresso Nacional e IV Congresso Internacional de Fonética e Fonologia, no Instituto de
Letras da Universidade Federal Fluminense, no período de 24 a 26 de novembro de 2008.
CASSIQUE, Orlando. Projeto de Doutorado “Linguagem, Estigma e Identidade no
Interior da Amazônia Paraense: um exame de base variacionista da nasalidade vocálica
pretônica no município de Breves (PA)‖, 2006. (Projeto de Pesquisa. Inédito)
CASSIQUE, Orlando et al. ―Variação das Vogais Médias Pré-tônicas no português falado em
Breves (PA)‖, in D. Hora (org.), Vogais no ponto mais oriental das américas. João Pessoa
(PB): Ideia, 2009, pp. 163-184.
COELHO, Maria Lúcia. A Variação das Vogais Médias Posteriores Pretônicas no
Português Falado no Município de Breu Branco(PA): uma Abordagem Variacionista.
Belém: UFPA/ILC/FALE, 2008. (Trabalho de Conclusão de Curso em Letras).
CRUZ, Regina. Projeto de Pesquisa “Brazilian Amazon Portuguese vowel system: acoustic
analysis” (processo BEX1754/10-6) Brasília: CAPES/ Fulbright, New York (USA): New
York University, 2011. (Relatório Técnico-científico Aprovado).
CRUZ, Regina et al. ―As Vogais Médias Pretônicas no Português Falado nas Ilhas de Belém
(PA), in. ARAGÃO, Maria do Socorro Silva de (Org.). Estudos em fonética e fonologia no
Brasil. João Pessoa: GT-Fonética e Fonologia / ANPOLL, 2008. ISBN 978-85-906544-4-5.
DIAS, Marcelo Pires; CASSIQUE, Orlando & CRUZ, Regina. ―O alteamento das vogais pré-
tônicas no português falado na área rural do município de Breves (PA): uma abordagem
variacionista‖. Revista Virtual de Estudos da Linguagem (REVEL). Porto Alegre, n. 9,
vol. 5, jul. 2007. (Disponível em: http://www.revel.inf.br/site2007/_pdf/artigos/)
FREITAS, S. As vogais médias pretônicas /e/ e /o/ num falar do norte do Brasil. In: RAZKY,
Abdelhak. (Org.). Estudos Geo-Sociolinguísticos no Estado do Pará, Belém, 2003.
MARQUES, Luzia Carmen dos Santos. Alteamento das Vogais Médias Pré-tônicas no
Português Falado no Município de Breu Branco(PA): uma Abordagem Variacionista.
Belém: UFPA/ILC/FALE, 2008. (Trabalho de Conclusão de Curso em Letras).
MORAES, João et al. ―O sistema vocálico do português do Brasil: caracterização acústica‖, in
Mary Kato (org.), Gramática do Português Falado, vol. 5: convergências, 2ª. edição revista,
Campinas: Editora da Unicamp. 2002, pp. 33-51.
OLIVEIRA, Daniele. Harmonização vocálica das vogais médias do português falado na
zona urbana de Breves (PA): uma abordagem variacionista. Belém: UFPA/PROPESP, 2007.
(Relatório de Iniciação Científica).
OLIVEIRA, Miguel. ―A comparative study between Brazilian Portuguese anda American
English intrisic pitch of vowels‖, in NWLC14. 1999, pp. 146-155.
RODRIGUES, Aryon. ―As línguas gerais sulamericanas”. Papia, 4 (2), p.6-18, 1996.
RODRIGUES, Doriedson do Socorro & ARAÚJO, Marivana dos Prazeres. ―As vogais
médias pretônicas / e / e / o / no português falado no município de Cametá/PA – a
harmonização vocálica numa abordagem variacionista‖, Cadernos de Pesquisa em
Linguística, Variação no Português Brasileiro, Leda Bisol & Cláudia Brescancini (orgas.),
volume 3, Porto Alegre, novembro de 2007, pp. 104-126.
NETO, Serafim da SILVA. Introdução ao Estudo da Língua Portuguesa no Brasil. 4 ed.
Rio de Janeiro, Presença, 1957.
SOUSA, Josivane. A Variação das vogais médias pretônicas no português falado na área
urbana do município de Belém/PA. 2010. Dissertação (Curso de Mestrado em Letras) –
Universidade Federal do Pará, Belém: UFPA. Orientador: Regina Célia Fernandes Cruz.
49

CODE-SWITCHING NA FALA PARKATÊJÊ:


ASPECTOS SOCIAIS E ESTRUTURAIS DO CONTATO LINGUISTICO COM O
PORTUGUÊS

Cinthia NEVES (CAPES/UFPA)


Orientador (a): Profa. Dra. Marília FERREIRA (UFPA)

RESUMO: Um dos fenômenos recorrentes em situações de contato de línguas é a alternância


de códigos, ou code-switching, que permite ao falante bilíngue, numa única conversa, usar de
forma alternada os sistemas linguísticos que domina, sem mudar de tópico ou de interlocutor.
A alternância pode ser afetada e condicionada tanto por fatores externos ou sociais – que estão
relacionados ao falante, ao tópico da conversação e à identificação étnica do indivíduo –
quanto por fatores internos ou linguísticos. A proposta deste estudo é descrever aspectos
sociolinguísticos e estruturais da alternância entre português e o parkatêjê, língua indígena do
Complexo Dialetal Timbira, falada no Sudeste do Estado do Pará, na fala de indivíduos
bilíngues dessa comunidade. A análise se baseia em histórias tradicionais do povo, coletadas
desde 2000, nas quais é possível encontrar diversas ocorrências do fenômeno.

PALAVRAS-CHAVE: contato linguístico, code-switching, parkatêjê.

ABSTRACT: One of the recurring phenomena in language contact situations is the code-
switching, which allows the bilingual speaker, during a single conversation, alternately using
language that dominates, without changing the topic or speaker. The alternation may be
affected and conditioned both by external factors or social – that are associated to the speaker,
the topic of conversation and the ethnic identification of the individual – and by internal
factors or linguistic. The purpose of this study is to describe aspects of the sociolinguistic and
structural alternation between Portuguese and Parkatêjê, an indigenous language of the
Complexo Dialetal Timbira, spoken in the southeast of Pará, in the speech of bilingual
individuals in the community. The analysis is based on traditional stories of the people,
collected since 2000, where we can find several occurrences of the phenomenon.

KEYWORDS: languages in contact, code-switching, parkatêjê.

1. Introdução

A língua Parkatêjê é falada por uma comunidade indígena localizada no sudeste do


estado do Pará, no município de Bom Jesus do Tocantins. Trata-se de uma língua considerada
parte do Complexo Dialetal Timbira, de acordo com Rodrigues (1999), da família Jê,
agrupamento Macro-Jê, que partilha características tipológicas semelhantes às de outras
línguas de mesma afiliação genética, entre as quais aquelas de cunho (i) fonético-fonológico
em que as vogais centrais são numerosas; (ii) morfológico – a flexão que indica contiguidade
ou não de um determinante a um determinado; (iii) sintático – a ordem constituinte SOV em
orações declarativas.
50

A intensiva situação de contato entre Parkatêjê e a língua portuguesa, já observada por


Ferreira (2005) e Araújo (2008), tem resultado em uma situação de atrito linguístico
crescente, cuja consequência mais dramática é a atual situação de obsolescência vivida pela
língua Parkatêjê. Dentre os muitos fenômenos ligados a tal situação de contato entre línguas
está a ocorrência da alternância de código (ou code-switching) entre os falantes que têm a
língua Parkatêjê como primeira língua e a língua portuguesa como segunda, isto é, falantes
bilíngues. O indivíduo bilíngue, de acordo com Hymes (1967), por meio de sua competência
comunicativa, pode selecionar os códigos gramaticalmente corretos incluindo a seleção das
formas adequadas para refletir as normas sociais de conduta em dadas situações.
A alternância de código é um dos processos decorrentes do contato de línguas que
inclui empréstimos (tanto em nível sintático quanto lexical), atrito linguístico e morte de um
dos sistemas. Poplack (2004) define alternância como a justaposição integrada de línguas, em
qualquer lugar no nível da estrutura sintática sem necessariamente haver mudança de
interlocutor ou tópico. Essa justaposição, que pode envolver uma palavra, uma frase ou uma
sentença, é um dos processos encontrados na fala de indivíduos bilíngues da Comunidade
Indígena Parkatêjê, quando estão em interação utilizando a língua indígena, ou a língua
portuguesa.
No processo de alternância de código devem ser considerados a função que cada
língua assume para o comportamento de cada indivíduo bilíngue e o grau da competência que
esses indivíduos têm de ambas as línguas. O fenômeno pode estar associado ao tópico que
estiver sendo falado, à pessoa a quem o falante se dirige e à tensão da situação de fala; e
apesar de complexo, dá-se de maneira sistemática e está sujeito a restrições gramaticais, ou
seja, ocorre em pontos específicos e recorrentes (Poplack, 1980, 1982).
Durante as coletas de histórias orais tradicionais entre os anos de 2008 e 2009, Ferreira
e Neves verificaram e registraram grande incidência de mescla de língua portuguesa durante a
narração de textos orais por seus auxiliares de pesquisa. Tal comportamento linguístico
também foi observado durante reuniões do chefe com membros mais velhos da comunidade
no mesmo período.
Com base nesse material, a pesquisa desenvolvida para elaboração de dissertação
pretende descrever a alternância de código manifestada quando do uso da língua parkatêjê
nessas situações, adotando os modelos teóricos abstratos de Poplack (1981) e Myers-Scotton
(1993b) para dar conta da gramaticalidade do fenômeno.

2. Abordagens adotadas na pesquisa


51

Alguns estudos sobre o fenômeno de alternância de código mostraram sua


sistematicidade, sem explicações dos aspectos gramaticais envolvidos, como mostra a tabela
abaixo apresentada por Oliveira (2006):

Segundo a autora, outros pesquisadores "ao perceberem que havia padrões de


recorrência ao code-switching, buscaram elaborar modelos teóricos para dar conta de duas
restrições sintáticas" (Oliveira, op. cit.). Nesta seção apresentaremos brevemente duas
abordagens que fundamentam esta pesquisa na identificação dos pontos em que a alternância
de código ocorre.
2.1 Restrições de Poplack

O modelo de Poplack (1981) apresenta duas restrições gramaticais gerais ao


fenômeno: (a) Restrição de Equivalência e (b) Restrição do Morfema Livre.
Segundo a primeira restrição,

"a alternância entre os códigos ocorrerá em pontos do discurso em que a


justaposição de elementos da L1 e da L2 não viole uma regra sintática de
nenhuma das línguas"
(Poplack, 1981, p. 586)

Sugere-se, assim, que a alternância de código ocorre apenas quando os códigos


envolvidos possuem as mesmas categorias gramaticais e a mesma ordem de constituintes.
Na segunda restrição "os códigos podem ser alternados após qualquer constituinte no
discurso desde que este constituinte não seja um morfema fixo" (Poplack, ibidem). A
alternância de código não pode, portanto, "ocorrer entre um morfema fixo (ou de fronteira) e
uma forma lexical não integrada fonologicamente à lingua":
52

Mẽ jõlei itan nari


Nossa lei é esta.

A combinação entre jõ e lei é possível devido à adaptação fonológica de ―lei‖ ao


parkatêjê.

2.2 O modelo de Myers-Scotton

O modelo de Myers-Scotton apresenta duas oposições básicas: (a) língua matriz (LM)
x língua encaixada (LE); (b) morfemas de conteúdo x morfemas sistêmicos. Segundo este
modelo:

―A distinção ML versus LE captura o fato que a alternância de código dentro


de uma CP (Projeção de Complementizador) é mais adequadamente pensada
como a inserção de elementos da LE dentro do quadro gramatical fornecido
por uma LM do que uma verdadeira alternância de uma língua para outra‖
(Myers-Scotton & Jake, 2000, p.2)

A autora denomina CP

―a estrutura sintática que expressa predicado-argumento de uma oração, além


de estruturas adicionais necessárias para codificar estruturas relevantes ao
discurso e a forma lógica da oração‖
(Myers-Scotton, 2002, p. 54)

Uma CP bilíngue pode se constituir de:


(a) Ilhas de LM com morfemas apenas da LM

Aí... Aiku me aiku kôt kre nã aite kume hõkre


Aí... Eu escutava e depois cantava sozinho eu mesmo

(b) Constituintes mistos incluindo morfemas da LM e da LE


Me pê mekwârâ é o memo mejõkrepoj nã kre
As cantigas do Mekwârâ são as mesmas do Mejõkrepoj

(c) Ilhas de LE formadas apenas por morfemas da LE


Miti tore a-krãjapap ateti... Aí, ele corria atrás...
Jacaré (me) atravessou, tua nuca é enrugada... Aí, ele corria atrás...

Ilhas de LM são formadas por morfemas da LM e estão sob o controle da gramática da


53

LM. Entretanto, ilhas de LE são ainda que formadas pela gramática da LE obedecem a
gramática da LM.
Na identificação da LM outra distinção é fundamental: ―morfemas que expressam
aspectos semânticos e pragmáticos e atribuem ou recebem papéis temáticos‖ (Oliveira, op.
cit., 129) – morfemas de conteúdo, como verbos, adjetivos e substantivos – e os que
―expressam a relação entre os morfemas de conteúdo e não recebem ou atribuem papel
temático‖ (Oliveira, ibidem). Com base nisso, Myers-Scotton propõe dois princípios para
identificar a LM:

―Princípio da Ordem dos Morfemas: em constituintes LM+LE consistindo


de ocorrências isoladas de lexemas da LE e de qualquer número de morfemas
da LM, a ordem dos morfemas de superfície será aquela da LM.

Princípio do Morfema Sistêmico: em constituintes LM+LE, todos os


morfemas sistêmicos que possuem relações gramaticais externas ao núcleo de
seu constituinte virão da LM‖
(Myers-Scotton, 1993:83)

Segundo Oliveira (op.cit, p. 129), os morfemas sistêmicos de uma CP bilíngue são


provenientes da LM e os de conteúdo virão da LM e/ou da LE.
Com base nos dois modelos acima apresentados, pretende-se descrever e analisar a
gramaticalidade da alternância de código nos dados coletados com falantes parkatêjê
bilíngues. Uma primeira obervação permitiu notar que algumas construções bilíngues
aparentemente dominadas pelo parkatêjê estão sob controle da gramática do português:

a bola, kupe têkiê

a bola é coisa do não-índio

Como a língua parkatêjê não dispõe de uma palavra correspondente a ―bola‖, há a


possbilidade de se considerar um empréstimo. A presença do artigo definido ―a‖, no entanto,
aponta a utilização da gramática da LE. Questões como esta deverão ser respondidas ao longo
da pesquisa.

REFERÊNCIAS

AIKHENVALD, Alexandra Y. Language contact in Amazonia. Oxford University Press:


New York, 2002.
54

ARAÚJO, Leopoldina. Parkatêjê x Português: caminhos de resistência. IX Congresso


Internacional da "Brazilian Studies Association" (www.brasa.org). New Orleans, Louisiana, Estados
Unidos, 2008.
FERREIRA, Marilia. Descrição de aspectos da variante étnica usada pelos parkatêjê. DELTA,
jan./jun. 2005, vol.21, no.1, pp.1-21.
GROSJEAN, F. Life with two languages: An introduction to bilingualism. Harvard
University. Press, Cambridge, Mass, 1982.
GUMPERZ, J. J. Discourse Strategies. Cambridge: Cambridge UP, 1982.
HYMES, D. On communicative competence. In: PRIDE, J.B. & HOLMES, J. (eds.).
Sociolinguistics,Harmondsworth. England : Penguin Books, 1967. p.269-294.
POPLACK, Shana. Code-Switching. In Ammon, U., N. Dittmar, K.J. Mattheier and P. Trudgill (eds),
Sociolinguistics. An International Handbook of the Science of Language and Society.
Berlin: Walter de Gruyter. 2nd edition, 2004. pp 589-596.
POPLACK, S. (1980) Sometimes I’ll start a sentence in Spanish y termino espanol:
Toward a Typology of Code-Switching. Linguistics 18, 581-618
MYERS-SCOTTON, C. Duelling Languages: Grammatical Structure in Codeswitching
(1997edition with a new Afterword). Oxford : Clarendon Press, 1993.
MYERS-SCOTTON, C. and Jake, J.L.(1995 )Matching lemmas in a bilingual language
competence and production model:evidence from Intrasentential Codeswitching .
Linguistics 33 :981-1024
_______________. Testing a Model of Morpheme Classification with Language
Contact Data International Journal of Bilingualism 4/1, 1-8, 2000.
______________. Explaining Aspects of Codeswitching and Their Implications In J. Nicole
(ed.) One mind, Two Languages; Bilingual Language Processing. Oxford:Blackwell, 84-
116, 2001.

A VARIAÇÃO DAS OCLUSIVAS ALVEOLARES NO FALAR PARAENSE_


RESULTADOS PRELIMINARES

Cyntia de Sousa GODINHO (UFPA)


Orientadora: Marilucia Barros de OLIVEIRA (UFPA)

RESUMO: O presente trabalho se insere na linha de pesquisa documentação, descrição e


análise do Português da Amazônia e se propõe a analisar o comportamento variável das
oclusivas alveolares /t/ e /d/ seguidas de [i] no falar de 20 informantes paraenses, a partir de
dados coletados pelo projeto ALIB – Atlas Linguístico do Brasil, Regional Norte, em cinco
cidades do Pará (Belém, Bragança, Jacareacanga, Marabá e Soure), segundo os pressupostos
metodológicos da Variação Linguística, de Labov (1972, 2008). Foram retirados, dos
questionários QFF e QSL, do ALIB todos os contextos de /t/ e /d/ diante de [i] que depois de
codificados foram submetidos ao tratamento estatístico com o uso do programa de análise
multivariada GOLDVARB X, a fim de determinar os fatores favorecedores dessa variação no
Estado. As variáveis linguísticas controladas foram tipo de vogal e sonoridade, e as variáveis
extralinguísticas, foram sexo, grupo geográfico e faixa etária; não foi levada em conta a
escolaridade, uma vez que os informantes para esta pesquisa possuíam em sua maioria, apenas
o fundamental incompleto. A análise dos dados demonstrou que a africada alveopalatal é
considerada a variante de prestígio e seu uso estende-se quase que completamente nessas
cidades, e que o processo de aplicação da regra é favorecido pela vogal derivada ‗e‘ devido ao
forte processo de elevação vocálica, outra regra recorrente entre os paraenses.
55

PALAVRAS-CHAVE: Variação. Africadas alveopalatais. Palatalização.

RÉSUMÉ : Ce travail s'insère dans la ligne de recherche de la documentation, description et


analyse du portugais de l'Amazonie et se dispose à analyser le comportement variable des
occlusives alvéolaires /t/ et /d/ suivies de [i] dans la parole de 20 informants paraenses, à
partir des données recueillies par le projet ALIB - Atlas Linguístico do Brasil, Regional Norte
-, dans cinq villes du Pará (Belém, Bragança, Jacareacanga, Marabá et Soure), selon les
présupposés méthodologiques de la Variation Linguistique, de Labov (1972, 2008). On a
retiré des questionnaires QFF et QSL de l'ALIB tous les contextes de /t/ et /d/ devant [i]
qu'après avoir codifié, ils ont été traités statiquement avec l'aide d'un logiciel d'analyse
multivarié GOLDVARB X, afin de déterminer les facteurs favorables de cette variation dans
l'État. Les variables linguistiques contrôlées ont étés du type de voyelle et de la sonorité, et les
variables extra-linguistiques ont été le sexe, le groupe géographique et l'âge; on n'a pas tenue
en compte le niveau scolaire, parce que les informants de cette recherche avaient, dans sa
majorité, seulement le niveau fondamental incomplet. L'analyse des données démontre que
l'africative alveopalatal est considérée la variante de prestige et son usage est fréquent presque
complètement dans ces villes, et que les processus de l'application de la règle est favorisée par
la voyelle dérivée 'e' à cause du fort processus de l'élévation vocalique, autre règle recourante
entre les paraenses.

MOTS CLES: Variation, Africative alveopalatal, palatalisation

INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta os primeiros resultados da variação das oclusivas


alveolares diante de [i] no falar paraense, pesquisa de mestrado em fase de finalização no
Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Pará. O fenômeno da
africação das consoantes oclusivas alveolares /t/ e /d/ é regularmente identificado entre os
falantes do Estado do Pará, o que ratifica a importância da realização desta pesquisa. As
oclusivas alveolares sofrem comumente, a africação e/ou palatalização diante da vogal alta
anterior [i] em todos os contextos posicionais da palavra no falar paraense, com este trabalho,
porém, pretendemos descrever a variação das oclusivas /t/ e /d/em cinco cidades paraenses,
principalmente, em seus aspectos extralinguísticos.
Os dados para análise fazem parte do Projeto ALIB (Atlas Linguístico do Brasil) que
tem como objetivo a descrição e o mapeamento do português brasileiro através da
identificação e demarcação de áreas dialetais em todas as regiões do país. No Pará já foram
coletados inquéritos nas 10 cidades selecionadas: Almeirim, Altamira, Belém, Bragança,
Conceição do Araguaia, Itaituba, Jacareacanga, Marabá, Óbidos e Soure. Para esta pesquisa
56

preliminar selecionamos cinco pontos de inquérito: Belém, Bragança, Jacareacanga, Marabá e


Soure.
Este trabalho foi dividido em 3 partes, a primeira corresponde à fundamentação teórica,
abordando especificamente, a descrição do processo articulatório e fonológico da africação
e/ou palatalização e aspectos fundamentais acerca da Sociolinguística Variacionista (LABOV,
1972, 2008). A segunda parte trata-se da descrição dos métodos utilizados para o tratamento
dos dados e metodologia de análise para esta pesquisa. A terceira parte, por sua vez, compõe-
se da apresentação e análise dos resultados conforme a sociolinguística quantitativa ou
variacionista e, por fim, uma breve discussão sobre os resultados analisados.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A variável pesquisada ocorre em várias regiões brasileiras em que as oclusivas


alveolares /t/ e /d/ diante de [i] sofrem um processo de africação, palatalização ou
fricativização passando a serem pronunciadas como africadas alveopalatais [t] e [d],
oclusivas palatalizadas [t] e [d] ou africadas alveolares [ts] e [dz]. A palatalização que
ocorre nas africadas [t] e [d] no Pará é bastante marcada, porém, mesmo com a forte
ocorrência desse fenômeno no Estado, não foram muitos os trabalhos realizados sobre esse
processo fonológico na região. A africada alveopalatal constitui-se a principal variante de
nossa pesquisa por ter a sua produção favorecida entre os falantes do Estado do Pará.
Fonologicamente, as oclusivas que sofrem esse processo são descritas como alofones de
/t/ e /d/ estando, consequentemente, em distribuição complementar em relação às oclusivas
alveolares. A palatalização pode ser descrita, a partir de uma mudança fonética em que as
propriedades articulatórias de [i] são assimiladas pelas consoantes /t/ e /d/.
Segundo Bisol; Hora (1993, p. 32) sob a perspectiva do fenômeno da palatalização, as
oclusivas alveolares /t / e /d/ para se tornarem palatalizadas tendem a assimilar a propriedade
palatal, o traço [- anterior], da vogal alta [i] que espraia juntamente, com o traço [coronal]
para o ponto C da consoante, podendo resultar em oclusivas palatalizadas ou africadas
alveopalatais.
Sobre o caráter fonético-fonológico da vogal alta anterior, Dias (2009) enumera sob
quais realizações de [i] é possível a ocorrência dessas mudanças: pode ocorrer diante da
realização fonológica do [i]; do produto da elevação da vogal [e]; através da realização do
glide em processo de ditongação, através do [i] epentético e do [i] nasalizado (DIAS, 2009, p.
58). Ainda com base na pesquisa realizada por Dias (Ibid) o processo de palatalização das
57

oclusivas alveolares /t/ e /d/ pode ocorrer em sílabas: átonas, tônicas, sílabas iniciais e sílaba
final, desde que condicionadas ao elemento que favorece esse processo, no caso, a vogal alta
[i]. (DIAS, 2009, p. 61)

1.1 Sociolinguística variacionista ou quantitativa

Segundo Labov (1972, 2008) a língua é um fenômeno social e cultural com variações
passíveis de serem mensuradas e sistematizadas, a partir do levantamento estatístico de
ocorrências das variáveis na fala dos indivíduos. A língua é regida por regras, algumas são
categóricas e outras, variáveis, que mudam devido a parâmetros de escolaridade, sexo, idade.
Guy; Zilles (2007), por sua vez, afirmam que:

A análise de uma regra variável é um tipo de análise multivariada


amplamente empregada em estudos de variação linguística. Seu propósito é
separar, quantificar e testar a significância dos efeitos de fatores contextuais
em uma variável linguística, esses fatores condicionantes podem ser tanto
sociais quantos linguísticos. (Guy; Zilles, 2007 p. 34)

A sociolinguística admite a hipótese de que numa comunidade de fala haverá sempre


formas em variação que podem estar em co-ocorrência (ambas as formas ao mesmo tempo)
ou em concorrência (ora uma, ora a outra forma), razão pela qual a sociolinguística
variacionista é também conhecida como ―Teoria da Variação‖. A língua é considerada ―viva‖,
no sentido em que ela muda e, por ser ―viva‖ ela precisa crescer (se desenvolver), entrar em
conflito, afim de, estabelecer as suas regularidades. A comunidade e o meio social são os
responsáveis diretos pela mudança no tempo, no espaço físico e no espaço social.
Consideramos que a sociolinguística estuda uma cópia da realidade e que essa realidade
é muitas vezes complexa, por isso, não podemos descontextualizar-la, uma vez que, o
contexto influencia diretamente o falante e este, influencia diretamente a língua.

2 PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
2.1 Atlas linguístico do Brasil _ ALIB

A metodologia adotada é a utilizada pelo projeto ALIB – Atlas Linguístico do Brasil,


cuja principal finalidade é descrever a diversidade fonético-fonológica, morfológica, sintática
58

e lexical da língua portuguesa. Do ponto de vista metodológico o projeto utiliza-se: da rede de


pontos, do perfil dos informantes, dos questionários linguísticos e da realização dos
inquéritos.
A rede de pontos é formada por 250 localidades, distribuídas por todo o Brasil e
escolhidas com base em considerações como: a extensão de cada região, os aspectos
demográficos, culturais e históricos e a natureza do processo de povoamento da área, fugindo
à tradição em que são considerados critérios como a antiguidade e a localização do lugar com
relação ao centro. No Pará já foram coletados os dados nas 10 cidades selecionadas: Almerim,
Altamira, Belém, Bragança, Conceição do Araguaia, Jacareacanga, Marabá, Óbidos e Soure.
Neste trabalho nos deteremos em apenas cinco delas, conforme já mencionado: Belém,
Bragança, Jacareacanga, Marabá e Soure que corresponde, ao total de 20 informantes.
Segue, abaixo, mapa do estado do Pará em que pode ser observada a distribuição das
cidades pesquisadas pelo ALIB e corpus desta pesquisa.

Figura 1: Cidades pesquisadas pelo ALIB Norte _ SEPA 2011. Adaptado por Cyntia Godinho.

As cidades selecionadas para esta pesquisa foram escolhidas, ocasionalmente, a partir


da conclusão da triagem de seus dados, fazem parte dos pontos de inquéritos escolhidos pelo
projeto ALIB, no Pará, devido principalmente, aos seus contextos históricos, grau de
importância para o Estado, tempo de instalação como municípios e povoamento. Os
informantes são organizados, conforme a seguinte estratificação: idade (primeira faixa etária
59

– 18 a 30 anos /segunda faixa etária – 50 a 65 anos); sexo (masculino / feminino);


escolaridade (fundamental incompleto / superior13).
No que refere aos questionários, para esta pesquisa, foram utilizados: o Questionário
Fonético-Fonológico _ QFF, composto por 159 questões e o Questionário Semântico-Lexicais
_ QSL, formado por 202 questões distribuídas em 14 campos semânticos. Vale ressaltar, que
foram extraídos, desses questionários, somente os contextos de /t/ e /d/ diante de [i] que
poderiam corresponder a itens esperados, quando o falante responde a palavra que, por hora,
era esperada pelo inquiridor; não esperados, quando no lugar do item esperado o entrevistado
responde com uma palavra em que há o contexto, objeto da pesquisa; e os frutos de
interlocução, quando o falante ao tentar responder alguma pergunta do inquiridor passa a um
período de conversação e acaba por produzir algum contexto. Após a triagem, transcrição e
codificação dos dados, estes foram submetidos ao programa de análise estatística
GOLDVARB X que realiza análise de variantes binárias. A transcrição dos dados foi
realizada através da fonte SILDOULOSIPA.

2.2 Definição das variáveis

As variáveis dependente e independentes selecionadas para esta análise dizem respeito


apenas as que fazem referência aos aspectos extralinguísticos ou, quando linguísticos, que
podem vir a ter alguma influência para o processo, uma vez, que nesta fase da pesquisa ainda
nos detemos em mapear a ocorrência da variação das oclusivas nessas cidades. Sob a hipótese
de que fatores sociais são fortes condicionadores para mudança linguística, os fatores
extralinguísticos selecionados conforme a estratificação do Projeto ALIB, anteriormente
descrita, foram: idade, gênero e grupo geográfico, mas, além destes, nesta pesquisa, definimos
um número X de variáveis linguísticas que consideramos importante para descrever como
ocorre a variação das oclusivas diante dos fatores extralinguísticos.
A variável dependente selecionada foi a palatalização de /t/ e /d/, não se fazendo
distinção em nenhum grau da aplicação da regra. Dessa forma, definindo o grupo de fator: (1)
palataliza; (2) não palataliza. A variável linguística tipo de vogal foi controlada, com o
objetivo de determinar se a palatalização distingue a vogal derivada da vogal média (e) da não
derivada (i): derivada: (dente); não-derivada (tio). Para melhor verificar qual das consoantes

13
O ALIB coleta inquéritos referentes a informantes do ensino superior apenas nas capitais. Nesta pesquisa
foram desconsiderados estes dados por serem pouco representativos, uma vez que, Belém é a única cidade que
apresentaria tais informantes.
60

/t/ ou /d é a mais favorecedora a aplicação da regra da palatalização, o fator sonoridade foi


controlado, independente da posição em que as consoantes ocorreram: surda (tarde); sonora
(noite)
Neste trabalho, seguindo os parâmetros do projeto ALIB, foram consideradas duas
faixas etárias, constituídas por 10 informantes com idade entre 18– 30 anos e 10 informantes
com idades entre 50 – 65 anos. A idade, em muitas pesquisas variacionistas é levada em conta
devido a importância que ela tem em definir o comportamento linguístico dos falantes, uma
vez que, falantes mais velhos tendem a ser menos maleáveis a inovações enquanto que
falantes mais novos tendem a ser mais suscetíveis a elas.
Quanto a variação sexo, segundo Pires (2007, p. 6) a análise variacionista ―não pode
ignorar que o sexo do falante possa estar correlacionado à maior ou menor probabilidade de
uma variante linguística‖, uma vez que, homens e mulheres podem sim apresentar diferentes
atitudes linguísticas diante de fatores sociais. Nesta pesquisa a variável apresenta-se dividida
em 10 informantes do sexo feminino e 10 informantes do sexo masculino.
A variável geográfica, nesta pesquisa, procura definir o processo de variação das
consoantes /t/ e /d/ nestas cidades e se apresenta dividida: (a) Soure; (b) Bragança; (c)
Jacareacanga; (d) Marabá e (e) Belém.

3 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Após a rodada dos dados no GOLDVARB X, o programa considerou como


estatisticamente relevante, as seguintes variáveis: Tipo de vogal alta, Sonoridade e Grupo
Geográfico. As variáveis, sexo e idade, foram considerados como estatisticamente não
relevantes quando passaram pela análise regressiva stepping down do GOLDVARB X.
Passemos a analise das variáveis linguísticas consideradas relevantes:

3.1 Tipo de vogal

O contexto fonológico tipo de vogal alta, de acordo com os resultados probabilísticos,


foi selecionado como a variável mais significativa quanto à aplicação da regra de
palatalização. Ao contrário do que esperávamos a vogal não-derivada ‗i‘ (0.31) não favorece o
fenômeno nessas cidades, enquanto que a derivada ‗e‘ (0.58) apresenta-se como favorecedora
da regra. Entendemos que isso aconteça, principalmente, porque no Pará é recorrente entre os
falantes a elevação vocálica e ~ i, em contextos como: ponte ~ ponti; realmente ~ realmenti.
61

Tabela 1: Tipo de vogal alta

Fatores Aplic./ Total % P.R


Derivada ‗e‘ (gente) 587/628 69% 0.58
Não-derivada ‗i‘ (tipo) 231/282 31% 0.31
Total 818/910 89.9%
Input: 0.909 Significance: 0.000

Bisol (1986, p. 171) esclarece que a regra da palatalização, muitas vezes, encontra-se
relacionada à outra regra, de elevação vocálica, esta acaba interferindo aditivamente,
aumentando o número de itens em que a primeira opera, o que pode ser atestado nos
resultados aqui expostos.

3.2 Sonoridade

A consoante surda tende a favorecer a aplicação da palatalização (0.59), enquanto a


consoante sonora funciona como inibidora do processo. Isso se dá pelo fato de que mesmo
que a consoante sonora /d/ tenha o maior número de ocorrência nos dados, ela tende a ter
menos processos de aplicação da regra: (63) para /d/, (29) para /t/. Conforme, podemos
observar na tabela 3.

Tabela 2: Sonoridade da oclusiva

Fatores Aplic./ Total % P.R


Surda /t/ (realmente) 398/427 46.9% 0.59
Sonora /d/ (pode) 420/483 53.1% 0.41
Total 818/910 89.9%
Input: 0.903 Significance: 0.003

Ao correlacionarmos as variáveis: tipo de vogal e sonoridade observou-se que a vogal


não-derivada ‗i‘, apresenta menos ocorrência nos dados, enquanto que a derivada tem o índice
elevado, tanto diante da consoante surda quanto na consoante sonora. Sabemos que a vogal
não-derivada desfavorece a palatalização e que segundo foi atestado na tabela 2, a consoante
sonora tende a funcionar como inibidora do processo, o que sugere que há menos casos de
62

palatalização quando há o contexto ‗di‘, essa hipótese, porém só deverá ser comprovada a
partir da rodada dos fatores linguísticos no programa estatístico que deve apontar
detalhadamente outros processos favorecedores e desfavorecedores para a aplicação da regra,
como a posição da consoante na sílaba e a tonicidade.

3.3 Grupo Geográfico

Com relação à variação diatópica, verifica-se que três das cidades selecionadas
apresentam índices mais relevantes de palatalização: Jacareacanga (com 19.2% e 0.65 de peso
relativo), Soure ( com 29.1% e 0.55 de peso relativo) e Belém (com 17.3% e 0.51 de peso
relativo).

Tabela 4: Variação diatópica: /t, d/ diante de [i]

Fatores Aplic./ Total % P.R


Soure 245/265 29.1% 0.55
Bragança 125/143 15.7% 0.41
Jacareacanga 166/175 19.2% 0.65
Marabá 139/170 18.7% 0.31
Belém 143/157 17.3% 0.51

Total 818/910 89.9%


Input: 0.907 Significance: 0.001

É interesse observarmos que Soure apresenta maior frequência que Jacareacanga e


Belém, mas ao observarmos a aplicação/total percebemos que ela apresentou o maior índice
de não aplicação da regra em relação às outras. O que nos permite inferir que a cidade pode
ter frequência considerável de ocorrência diante [i] em relação às demais, isso, porém, não
significa que os níveis de palatalização sejam altos.
Bragança e Marabá apresentam entre as cidades, os menores índices, 15.7% e 0.41 de
peso relativo, 18.7% e 0.31 de peso relativo, respectivamente. O que pode denotar a
preferência dos falantes de nível fundamental incompleto, nessas duas cidades, pelas
oclusivas alveolares.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
63

A partir da pesquisa realizada sobre a variação das oclusivas alveolares seguidas de [i],
nas cidades de Soure, Bragança, Jacareacanga, Marabá e Belém, chegamos às seguintes
conclusões:
O contexto fonológico tipo de vogal alta foi selecionado como a variável mais
significativa quanto à aplicação da regra de palatalização, a vogal derivada ‗e‘ apresenta-se
como favorecedora da regra, enquanto que a não-derivada ‗i‘ não favorece o fenômeno.
Sobre a sonoridade, observamos que a consoante surda /t/ tende a favorecer a aplicação
da palatalização, enquanto a consoante sonora /d/ funciona como inibidora do processo.
Acreditamos que isso ocorre quando este fator é correlacionado ao fator tipo de vogal, em que
a vogal não-derivada ‗i‘ é apontada como inibidora do processo. Essa hipótese, porém só
deverá ser comprovada a partir da rodada dos fatores linguísticos que deverá apontar
detalhadamente outros aspectos relevantes.
A variável grupo geográfico demonstrou dois níveis de variação entre as cinco cidades:
as com índices mais relevantes, como Jacareacanga, Soure e Belém, e as com menores índices
de palatalização como Bragança e Marabá. Nas três primeiras cidades foi observado que a
africada alveopalatal é considerada variante de maior preferência entre os falantes, enquanto
que em Marabá e Bragança, a oclusiva alveolar é que detêm essa preferência. Não podemos
afirmar se isso reflete algum prestigio de uma forma ou outra, devido todos os falantes terem
a mesma escolaridade: fundamental incompleto. Indícios de mudança em curso também não
podem ser observados nesta amostra, uma vez, que fatores como escolaridade, idade e sexo
são imprescindíveis para determinar esse estado de mudança em curso e foram considerados
estatisticamente irrelevantes pelo programa de análise estatística.
Como pesquisa preliminar, este trabalho, limitou-se a delimitar os aspectos
extralinguísticos, várias questões ainda serão acrescentadas futuramente, a partir da análise
dos demais fatores selecionados para a finalização do projeto do mestrado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BISOL, L. A palatalização e sua restrição variável. Estudos, Salvador, n. 5, p. 163-177, 1986.
BISOL, L.; HORA, D. da. Palatalização da oclusiva dental e fonologia lexical. Letras, Santa
Maria, 1993.
DIAS, Ana Lourdes Cardoso. Processo de palatalização no Português: Lagoa da Pedra e
Canabrava – TO. Goiânia. 2009. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade
Federal de Goiás. 2009. Disponível em:
http://bdtd.ufg.br/tedesimplificado/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=742 Acesso em:
21/06/2010.
64

GUY, G. R.; ZILLES, A. Sociolingüística quantitativa_ instrumental de análise. São Paulo:


Parábola Editorial, 2007.
LABOV, William. Sociolinguistic Patterns. Philadelphia: University of Pennsylvania. Press,
1972.
____. Padrões Sociolingüísticos. São Paulo, Parábola Editorial, 2008.
PIRES, L. B. A palatalização das oclusivas dentais em São Borja. Revista Virtual de
Estudos da Linguagem – ReVEL. Edição especial n.1, 2007.

LINGUAS OBSOLESCENTES: UMA VISAO SOCIOLINGUISTICA SOBRE A


DINAMICA DOS CONTATOS EM COMUNIDADES MINORITARIAS

Danielle Abreu FRANCO (UFPA)


Orientadora Dra. Marilia FERREIRA (UFPA)

RESUMO: A presente pesquisa abordará as questões gerais que envolvem os processos de


obsolescência linguística em línguas minoritárias, especialmente as línguas indígenas
brasileiras. Tratar da descrição e documentação de línguas minoritárias não e tarefa fácil,
pois segundo Hinton (2001) no mundo há cerca de 250 nações que falam aproximadamente
6.00 línguas. Podemos inferir que há uma imensa desproporção entre números de países e o
de línguas que possuem status de língua oficial de uma nação. Além do mais certificamos
com essa estatística a dificuldade de se ter o conhecimento exato de quantas línguas ou
dialetos existem no mundo, pois a natureza dessa relação pode ser tanto no campo linguístico
quanto social. Segundo esta autora foi após a publicação do artigo de Michael Krauss em
1992, que apresentava uma estimativa de que aproximadamente 90% das línguas no mundo
estariam em perigo de extinção no século XXI, que o movimento internacional intensificou
as discussões em torno das línguas minoritárias. Sabe-se que a comunidade de fala, em
contato com a língua majoritária, vai gradualmente sendo substituindo a sua língua materna
por outra que apresente maior prestigio social, e assim vão-se perdendo historias, conquistas
de um povo registrado no arcabouço linguístico desta comunidade. Desta forma, a pesquisa
objetiva apresentar um trabalho que contribua para o estudo dos fatores responsáveis pelo
processo de extinção de línguas. E que ressalte a importância da manutenção da língua
nativa como requisito indispensável para a aprendizagem de qualquer outra língua, pois todo
o conhecimento produzido pela descrição e documentação de uma língua irá contribuir para
o aperfeiçoamento das propostas educacionais e de revitalização direcionadas a comunidades
linguísticas minoritárias.

PALAVRAS-CHAVE: Língua Minoritária; Revitalização.

ABSTRACT: This research will address the general issues surrounding the processes of
linguistic obsolescence in minority languages, especially the Brazilian indigenous languages.
Treat the description and documentation of minority languages is not easy, because
according to Hinton (2001) in the world for nearly 250 nations that speak languages around
6:00. We can infer that there is a huge disproportion between the numbers of countries and
languages that have official status of a nation. In addition make sure that statistic with the
difficulty of having accurate knowledge of many languages and dialects in the world,
because the nature of this relationship can be both social and linguistic field. According to
65

the author was after the publication of the article by Michael Krauss in 1992, which
presented an estimate that approximately 90% of the languages in the world would be in
danger of extinction in the XXI century, the international movement intensified discussions
about minority languages. It is known that the speech community, in touch with the majority
language, which will gradually replace their mother tongue by another presenting the highest
social prestige, and so are lost stories, achievements of a people registered in the framework
of this linguistic community. Thus, the research aims to present a work that contributes to the
study of factors responsible for the process of extinction of languages. And that points out
the importance of maintaining the native language as a prerequisite for learning any other
language, for all the knowledge produced by the description and documentation of a
language will contribute to the improvement of educational proposals aimed at revitalization
and minority language communities.

KEYWORDS: Minority languages; Revitalization

1 - Introdução

Nos últimos anos, em decorrência do crescente contato de línguas, várias


contribuições surgiram destinadas a dar um novo horizonte no campo da descrição e
documentação de línguas, sendo que as questões referentes à perda linguística e cultural de
comunidades minoritárias estão em foco. Por ser a língua e cultura construções sociais que
refletem as mudanças que ocorrem com um povo em seu percurso histórico e social, torna-se
incoerente estudá-las separadamente, quando tratamos de contato de línguas. Pois, as
consequências do contato linguístico não repercutem somente na estrutura de uma língua,
mas também no comportamento dos falantes.
O projeto de dissertação que estou desenvolvendo irá abordar as questões gerais que
envolvem os processos de perda linguística em comunidades minoritárias, focalizando para a
situação sociolinguística de comunidades indígenas brasileiras. Pois, de acordo com Moore14
a situação do Brasil não é diferente da situação mundial, no que diz respeito a línguas
ameaçadas de extinção. Mesmo apresentando uma diversidade linguística muito intensa,
muitas das línguas indígenas brasileiras que coexistem com o português estão seriamente
ameaçadas de desaparecer.
Em se tratando de línguas indígenas, no Brasil houve uma redução de 1200 línguas
para 180 nos últimos 500 anos. De acordo com os estudos de Moore, Galucio e Gabas
(2008) esse processo continua de forma crescente provocando grandes prejuízos para a
riqueza linguística em nosso país. É relevante constatar que das 180 línguas indígenas
faladas no Brasil, pelo menos 21% destas línguas estão ameaçadas de desaparecer, em

14
MOORE, Denny. Línguas indígenas: a situação atual, levantamento e registro. Revista Eletrônica do IPHAN.
Disponível em : http://www.labjor.unicamp.br/patrimonio/materia.php?id=213. Acessado em 05/08/2010.
66

decorrência do numero reduzido de falantes e à baixa taxa de transmissão para novas


gerações.
Portanto, este trabalho está voltado para o estudo da obsolescência linguística e as
propostas de revitalização da cultura tradicional de comunidades minoritárias. Ressaltando a
importância da manutenção da língua nativa como requisito indispensável para a
aprendizagem de qualquer outra língua, pois todo o conhecimento produzido pela descrição e
documentação de uma língua irá contribuir para o aperfeiçoamento das propostas
educacionais e de revitalização direcionadas a comunidades linguísticas minoritárias.

2 - Línguas em contato

Com a internacionalização sem precedentes das relações comerciais e as


consequências da globalização, o contato entre culturas é sem duvida inevitável. As
pesquisas que dizem respeito aos processos linguísticos decorrente do contato de línguas
tratam a questão da perda linguística como uma preocupação generalizada entre linguistas,
antropólogos, historiadores, sociólogos, estudiosos dedicados ao estudo das relações entre
língua, cultura e sociedade.
O multilinguismo sempre fez parte das relações mundiais, no entanto em situações de
contato de línguas os processos linguísticos como interferências, alternâncias e estratégias,
estão cada vez mais presentes. De acordo com Calvet (2002) esses processos linguísticos
quando imersos em comunidades linguísticas minoritárias provocam grandes mudanças
nessas línguas, pois o conflito identitário é muito visível. Logo, as interferências que
ocorrem em uma língua minoritária não provocam somente mudanças na estrutura da língua
materna, mas interfere na percepção que o falante tem da sua cultura, e da outra língua que
começa a ocupar domínios.
Tratar de descrição e documentação de línguas minoritárias não é tarefa fácil, segundo
Hinton (2001) no mundo há cerca de 250 nações que falam aproximadamente 6.000 línguas.
Podemos inferir que há uma imensa desproporção entre números de países e o de línguas que
possuem status de língua oficial de uma nação. Além do mais certificamos com essa
estatística a dificuldade de se ter o conhecimento exato de quantas línguas ou dialetos
existem no mundo, pois a natureza dessa relação pode ser tanto no campo linguístico, quanto
social.
As manifestações de contato de línguas são encontradas em uma grande variedade de
domínios, como afirma Orlandi (2007, p.08) ―não há possibilidade de se ter língua que não
67

esteja afetada desde sempre pelo politico‖. Pois, a língua faz parte das relações entre os
sujeitos e o seu meio social e politico, sendo a interação linguística inevitável. O contato
entre línguas ocasiona o aparecimento de vários fenômenos linguísticos que nem sempre são
determinantes na mudança estrutural de uma língua, mas representam um indicador de
mudança. Thomason (2001) afirma que os processos linguísticos mais comuns atestadas em
línguas minoritárias são os empréstimos e o fenômeno de code switching.
Por isso, especialistas no estudo de línguas em contato como Krauss (1992), Crystal
(2000) e Netlle e Romaine (2000) vem investigando as motivações de mudança linguística
em línguas ameaçadas de extinção, com isso podendo avaliar as condições de revitalização
destas línguas.

3 – Manutenção e revitalização de línguas minoritárias

As línguas não são somente um meio de comunicação entre as pessoas, representam a


própria estrutura cultural de uma comunidade, pois transmitem valores e concepções de
mundo que caracterizam nossa identidade. Segundo Moita Lopes (2002) a identidade social
é definida pelos discursos que circulam e se constroem entre os interlocutores por meio das
praticas discursivas. Em ambientes de contato, as praticas discursivas serão responsáveis
pela importância que se dará para o uso ou não uso de um determinado idioma.
Logo, a obsolescência linguística inevitavelmente leva a um colapso na transmissão
tradicional dos padrões de comunicação de uma comunidade, provocando mudanças nas
praticas tradicionais de cultura e educação, consequentemente sérias mudanças psicológicas
e sociais que dificulta a manutenção da língua.
Buscar entender o funcionamento das interações verbais em contextos minoritários
bilíngues ou multilíngues é uma forma pela qual o pesquisador encontrará um
aprimoramento nas propostas de ensino/aprendizagem de línguas em contato. Pois, poderá
caracterizar o modo como uma língua desempenha suas funções dentro da comunidade
linguística minoritária.
A revitalização linguística em contextos minoritários não depende tão somente do
pesquisador em documentar a língua, segundo Romaine (2000) recuperar extratos de um
idioma e consequentemente traços culturais que se perderam em decorrência do contato é
uma tarefa importante para a revitalização. Mas, as atitudes positivas do falante em relação a
sua língua é uma das principais ferramentas que favorecem a manutenção da língua
minoritária. Por mais que se faça uma politica linguística em favor da valorização de línguas
68

minoritárias, as chances de sobrevivência da língua dependem essencialmente de seus


falantes, do compromisso de resgatar o status social da língua que está se perdendo pelo
contato com outro idioma de maior representatividade social e politico.
Por isso, estudiosos da área tem se dedicado a buscar soluções que detenham a
ameaça a línguas minoritárias, e aos impactos que o contato com a língua majoritária
provoca nessas comunidades. No que se refere aos estudos em comunidades indígenas, uma
das propostas mais relevantes que encontramos em diversas pesquisas é a investigação no
contexto educacional. A escola assume papel importante na revitalização de línguas
ameaçadas de extinção, pois a educação escolar indígena deve ser um instrumento de
afirmação da cultura tradicional por meio do ensino da língua indígena e da apropriação do
conteúdo da escola da cultura majoritária.

4 – Metodologia

Os procedimentos metodológicos desta pesquisa incluem o levantamento


bibliográfico e a aplicação de um questionário.
O levantamento bibliográfico é uma ferramenta indispensável para o
desenvolvimento desta pesquisa, pois permite que façamos uma revisão da literatura sobre
extinção de línguas. Além de oportunizar a apresentação de diferentes posicionamentos de
autores renomados e pesquisadores que estão envolvidos diretamente com a problemática da
extinção e revitalização de línguas, principalmente de autores que tratam de processos
linguísticos em línguas indígenas.
O questionário será aplicado na Comunidade Parkatêjê localizada em Marabá,
sudeste do Estado do Pará, nas proximidades do município Bom Jesus do Tocantins, no
quilometro 30 da rodovia BR-222. A língua Parkatêjê, e Timbira, do tronco linguístico
Macro-Jê pertencente à família Jê. Com base em Ferreira (2005) esta língua apresenta
indícios de perigo de extinção, pois as crianças já não aprendem a língua nativa, em
detrimento do aprendizado do português. A língua Parkatêjê é falada por apenas 10% da
população de aproximadamente quatrocentas pessoas.
Os fatores responsáveis pela situação sociolinguística da comunidade Parkateje não
são inéditos, já foram descritos por outros pesquisadores em outras línguas em processo de
obsolescência. Portanto, se faz necessário descrever o quadro real da situação
sociolinguística desta comunidade por meio da aplicação do questionário, baseado em
69

Braggio (1989), composto de 25 perguntas organizadas em cinco temas:


 Informação Pessoal
Neste tema as quatro perguntas identificarão o nome, sexo e a faixa etária dos informantes
selecionados, assim como a ocupação dos indígenas a partir dos 18 anos de idade.
 Proficiência e uso da língua Parkatêjê
As duas perguntas deste tema permitem identificar o quanto a língua Parkateje ainda e
utilizada e em que domínios ainda se mantem.
 Proficiência e uso da língua Portuguesa
Podemos identificar com as quatro perguntas deste tema quais domínios a língua portuguesa
já ocupou.
 Uso das línguas e seus contextos sociais e educacionais
Por meio das treze perguntas referentes a esse tema permite identificar a preferencia dos
indígenas quanto ao uso diário, educacional e comercial no que se refere ao uso tanto do
Parkateje, quanto do Português.
 Atividade de revitalização
Neste tema as duas perguntas caracterizarão a participação dos indígenas quanto aos projetos
de revitalização linguística na aldeia, identificando assim qual a faixa etária mais envolvida
nesses projetos.
Os dados da pesquisa serão analisados segundo uma abordagem quantitativa e
qualitativa com base no modelo de Maia e Pereira (2000) demonstrados na tabela 1 e 2. A
tabela 1 refere-se a analise do grau de domínio da língua indígena e a tabela 2 refere-se ao
uso da língua portuguesa pelos indígenas.

Tabela 1 – Grau de domínio da língua indígena


Grau de domínio Homens Mulheres
Jovens Adultos Velhos Jovens Adultos Velhos
Desconhece a
língua
Entende alguns
vocábulos
Entende bem a
língua, mas não a
utiliza efetivamente.
Entende e fala
razoavelmente bem
a língua
Entende e fala com
70

fluência

Tabela 2 – Grau de domínio da língua portuguesa


Grau de domínio Homens Mulheres
Jovens Adultos Velhos Jovens Adultos Velhos
Desconhece a
língua
Entende alguns
vocábulos
Entende bem a
língua, mas não a
utiliza efetivamente.
Entende e fala
razoavelmente bem
a língua
Entende e fala com
fluência

Quanto à abordagem quantitativa, os dados serão analisados com base nos fatores
condicionantes que caracterizam a obsolescência da língua nativa, dentre esses fatores estão
as variáveis extralinguísticas como idade, sexo e escolaridade. No que se refere a abordagem
qualitativa, os dados serão analisados para identificar as atitudes dos falantes desta
comunidade em relação à interação entre as duas línguas ali existentes – Parkatêjê e o
Português – à preferencia e necessidade de usos de cada uma das línguas.
Com isso busca-se verificar o uso da língua em seus diversos domínios sociais e em
diferentes relações identitárias.

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise sociolinguística se justifica pela necessidade de se tentar compreender


quantos e quais os fatores que possam estar influenciando na operação de uma ou de outra
língua, uma vez que a comunidade de fala é influenciada direta e indiretamente pelo meio
em que vive.
Diante deste contexto, espera-se fazer um levantamento bibliográfico sobre as
questões que envolvem os processos linguísticos decorrentes do contato. Assim como
identificar quais os fatores responsáveis pela situação sociolinguística de comunidades
minoritárias. Contribuir desta forma com futuras pesquisas sociolinguísticas referentes às
línguas indígenas e auxiliar professores na produção de material didático que leve em
71

consideração o uso de cada língua que coexistem em ambientes bilíngues ou multilíngues.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CALVET, Louis-Jean. Sociolinguística: uma introdução crítica. trad. Marcos Marcionilo.


São Paulo: Parábola, 2002.
CAMPBELL L.; MUNTZEL, M.C. The structural consequence of language death. In:
Dorian, N.C.(org.) Investigating obsolescence: studies in language contraction and
death. Cambridge University Press. 1989. p.181-189.
FERRAZ, Aderlande P. O panorama linguístico brasileiro: a coexistência de línguas
minoritarias com o português. n.9, p. 43-73. Disponível em:
http://www.fflch.usp.br/dlcv/lport/flp/imagens/arquivos/FLP9/Ferraz.pdf. Acesso em
20/09/2010.
FERREIRA, Marilia. Descrição de aspectos da variante étnica usada pelos parkateje.
DELTA 21 (1): 1 – 21. 2005
HILL, J.H. Language death in Uto-Aztecan. In: International Journal of American
Linguistic, n.49, p. 258-279, 1983.
HINTON, L. Language Revitalization: An Overview. In: L. Hinton &Hale (Orgs.) The
Green Book of Language Revitalization in Practice. San Diego: Academic Press.2001.
MAIA, Marcus (Org.). Manual de Linguística: subsídios para a formação de professores
indígenas na área de linguagem. Brasília. Ministério da Educação. Coleção Educação para
Todos. 2006.
MOORE, D.;GALUCIO, A.V.;GABAS J.,N.; O desafio de documentar e preservar as
línguas amazônicas. Scientific American Brasil – Amazônia (A Floresta e o Futuro), Brasil,
p.36 -43, 01 set. 2008.
ORLANDI, E.P.(ORG). Politica Linguística no Brasil. Campinas, SP: Pontes, 2007.

HETEROGENEIDADE LINGUÍSTICO-CULTURAL EM TURMAS DE


PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA: OS GÊNEROS TEXTUAIS COMO
INSTRUMENTOS PARA O ENSINO-APRENDIZAGEM DA PRODUÇÃO ORAL

Edirnelis Moraes dos SANTOS (UFPA/CNPq)


Orientador: José Carlos Chaves da CUNHA (UFPA)

RESUMO: Impulsionados por acordos internacionais, de caráter acadêmico e comercial,


muitos profissionais e estudantes estrangeiros têm procurado por cursos de Português como
Língua Estrangeira (PLE). Alguns desses se submeterão ao exame CELPE-Bras – iniciativa
do Ministério da Educação do Brasil para consolidar o ensino de PLE no mundo. Os
professores que atuam na preparação de estrangeiros candidatos a esse exame deparam-se
com turmas que são heterogêneas não só quanto às nacionalidades, mas também quanto às
línguas‐culturas. Eles também encontram dificuldades para achar materiais que possibilitem o
desenvolvimento da produção oral de seus alunos. Neste trabalho, mostraremos como se pode
desenvolver o trabalho da produção oral dos aprendentes de PLE em turmas com esse perfil a
partir dos gêneros textuais. Para tanto, adotamos uma Perspectiva Acional para o ensino de
línguas a partir de Tarefas, assim como uma base teórica fundamentada no Interacionismo
Sociodiscursivo (Teoria dos Gêneros, modelo de Sequência Didática). Partindo desses
72

pressupostos teóricos, propomos uma Sequências Didáticas para o ensino-aprendizagem de


gêneros orais, tentando mostrar em que medida o ensino-aprendizagem de PLE por meio dos
gêneros textuais pode propiciar o desenvolvimento da produção oral de discentes estrangeiros.

PALAVRAS-CHAVE: Português Língua Estrangeira; Produção Oral; Perspectiva Acional.

HETEROGENEITÉ LINGUISTICO-CULTURELLE EN CLASSE DE PORTUGAIS


LANGUE ÉTRANGÈRE : LES GENRES TEXTUELS COMME INSTRUMENTS
POUR L’ENSEIGNEMENT-APPRENTISSAGE DE LA PRODUCTION ORALE

RESUME: Stimulé par les accords internationaux académiques et commerciaux, beaucoup de


professionnels et d‘étudiants étrangers ont suivi les cours de Portugais Langue Etrangère
(PLE). Certains d‘entre eux passeront l‘examen CELPE-Bras - initiative du ministère
brésilien de l‘Education pour renforcer l‘enseignement du PLE dans le monde. Les
professeurs impliqués dans la préparation des candidats étrangers à cet examens se trouvent
face à des classes hétérogènes, non seulement au niveau des nationalités, mais aussi au niveau
des langues et culture. Ils rencontrent également des difficultés pour trouver du matériel
favorisant le développement de la production orale de leurs élèves. Dans ce travail, nous
montrerons comment il est possible de développer le travail de production orale des étudiants
de PLE à partir des genres textuels, dans des classes avec ce profil. Pour cela, nous adopterons
une Perspective Actionnelle pour l‘enseignement des langues à partir d‘exercices, ainsi
qu‘une base théorique fondée sur l‘Interaction Socio-discursive (Théorie des Genres, modèle
de la séquence didactique). À partir des présupposés théoriques, nous proposerons une
Séquence Didactique pour l‘enseignement-apprentissage des genres oraux. Nous tenterons de
montrer dans quelle mesure l‘enseignement-apprentissage du PLE au moyen des genres
textuels peut être propice au développement de la production orale d‘étudiants étrangers.

MOTS CLÉS: Portugais Langue Etrangère; Production Orale; Perspective Actionnelle.

INTRODUÇÃO

Em 2006, formou-se na UFPA, o Projeto de Extensão Português Língua Estrangeira


(PLE-UFPA) que visa o desenvolvimento da área de ensino da língua portuguesa para
estrangeiros, capacitando alunos da graduação de Letras (habilitações em alemão, espanhol,
francês e português) desta universidade para atuarem como professores dos estudantes de
intercâmbio dos programas PEC-G15, Capes/Brafitec16 e Cooperação Brasil-EUA17, e também
para atender a demanda de empresários estrangeiros que residem curtas temporadas no Pará.

15
Programa de Estudantes Convênio de Graduação (PEC-G) que ―é uma atividade de cooperação, cujo objetivo é
a formação de recursos humanos, a fim de possibilitar aos cidadãos de países em desenvolvimento com os
quais o Brasil mantém acordos educacionais ou culturais realizarem estudos universitários no país, em nível de
graduação, nas Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras participantes do PEC-G‖ (SESu/MEC)
16
O Programa Capes/Brafitec tem como objetivo ―Apoiar a cooperação bilateral entre o Brasil e a França por
meio de parcerias universitárias nas especialidades das engenharias, favorecendo o intercâmbio de estudantes
de graduação, as iniciativas para aproximação de estrutura e conteúdos curriculares e de metodologias de
ensino nos dois países‖ (CAPES)
73

Entre os anos de 2008 e 2010, as turmas do curso de PLE da UFPA já foram


frequentadas por alunos de diversas nacionalidades, tais como: Congo, Estados Unidos,
França, Haiti, Itália, Peru, Alemanha, Japão, Jamaica, Equador, Guiana Inglesa, Suécia. Para
os professores, tem sido um desafio ensinar a língua portuguesa, pois não é um trabalho tão
fácil lidar com um grupo tão heterogêneo do ponto de vista linguístico-cultural.
Tendo como base este breve panorama, apresentaremos sucintamente pressupostos
teóricos que poderão favorecer o E/A da produção oral destas turmas, com o intuito de
otimizar a influência das línguas‐culturas presentes e minimizar as eventuais dificuldades
encontradas no que concerne a produção oral de estudantes estrangeiros de PLE.
Primeiramente, discorremos acerca da Perspectiva Acional, após falaremos um pouco da
relação da heterogeneidade linguístico-cultural, em seguida trataremos a respeito da
Sequência Didática, dos Gêneros Textuais e das Tarefas.
Partindo desses pressupostos teóricos, propomos uma Sequências Didáticas para o
ensino-aprendizagem de gêneros orais, mas especificamente para o gênero exposição oral.
Analisamos as produções dos alunos e tentamos mostrar em que medida o ensino-
aprendizagem de PLE por meio dos gêneros textuais pode propiciar o desenvolvimento da
produção oral de discentes estrangeiros.

1. A HETEROGENEIDADE LINGUÍSTICO-CULTURAL EM PLE

As classes de PLE da UFPA são formadas por um público que é, geralmente,


heterogêneo do ponto vista linguístico-cultural. Neste caso, a sala de aula transforma-se em
um ponto de encontro de ―pessoas que não se conhecem, que não partilham, em princípio, a
mesma língua nem a mesma cultura, [e que] passam a conviver quotidianamente‖ (WEISS,
200118), e a língua portuguesa, além de ser a língua-alvo, assumi um papel importante, pois se
torna a língua de interação, pois é uma tarefa difícil para o professor saber todos os possíveis
idiomas de seus alunos e estes também precisam interagir entre eles, por isso usam a língua
que têm em comum, isto é, o português.
Contudo, o ensino-aprendizagem (E/A) de uma língua não pode ser dissociado do E/A
da cultura, já que classes heterogêneas apresentam uma diversidade cultural muito grande, e
somando a cultura da nova língua, muito se tem para ser compartilhado e compreendido sobre

17
O Programa de Cooperação Brasil-EUA ―objetiva o desenvolvimento de cooperação entre as instituições
participantes na área de educação em engenharia e tecnologia que incluam intercâmbio de estudantes e
membros do corpo docente‖ (ENGCOMP/UPFA)
18
O artigo de Weiss (2001) não possui paginação.
74

a cultural de cada aluno e a da língua-alvo. Conforme Fontes (2002), a relação entre língua e
cultura é intrínseca, tornando concomitante o ensino-aprendizagem da língua e da cultura,
pois é os alunos geralmente fazem ―uma comparação com aquilo que lhe é caro, até que haja,
finalmente, a compreensão e a aceitação da outra [língua-]cultura‖ (WEISS, 2001).
É visível, nas salas de aula, a dificuldade que grande parte dos alunos demonstra quanto
à competência de produção oral, seja no momento de tomar a palavra em público, seja para
expor um conteúdo, seja para discutir sobre determinado assunto e apresentar seu ponto de
vista, ou porque sua língua materna é muito ―diferente‖ da língua portuguesa.

2. A PERSPECTIVA ACIONAL E AS TAREFAS

Em 2001, O Conselho da Europa (CE) publicou o Quadro Europeu Comum de


Referências (QECR)19 para o ensino de línguas. Neste documento oficial, encontramos as
primeiras reflexões acerca da Perspectiva Acional, a qual é

orientada para a acção, na medida em que considera antes de tudo o


utilizador e o aprendente de uma língua como actores sociais, que têm que
cumprir tarefas (que não estão apenas relacionadas com a língua) em
circunstâncias e ambientes determinados, num domínio de actuação
específico (CE, 2001, p. 29).

A PA toma como base duas situações sociais: (1) uma sociedade multicultural e
multilíngue em que uma pessoa poderá ficar durante um curto ou longo período no país em
que a língua estrangeira (LE) que ele está aprendendo é falada. Para que o aprendente tenha
êxito durante sua estadia, ele deve ser capacitado a conviver em permanência com pessoas de
línguas-culturas diferentes; (2) o campo profissional – que abrange tanto a formação (ex.:
escolas, universidades) quanto a sua efetivação (ex.: empresas, comércio) – também é levado
em conta, pois o aprendente precisa ser capaz de interagir com outros estudantes e
professores, assim como trabalhar com seus colegas de línguas-culturas diferentes. A
proposição da PA é, portanto,

formar em nossas classes de línguas, não mais (ou não mais simplesmente) o
viajante encontrando pontualmente estrangeiros (em um quadro turístico ou
profissional), ou o inverso, aquele que encontra estrangeiros de passagem,

19
O QECR é um documento que ―fornece uma base comum para a elaboração de programas de línguas, linhas de
orientação curriculares, exames, manuais, etc., na Europa.‖ (CONSELHO DA EUROPA, 2001, p. 19 – versão
portuguesa anterior ao Acordo Ortográfico)
75

mas o cidadão de um país multilíngue e multicultural integrado a um espaço


comum (...), e que, no quadro de sua formação universitária e de sua
profissão, deve ser capaz de trabalhar durante um longo período em língua-
cultura estrangeira com os alófonos e até mesmo com pessoas que
compartilham sua língua materna (PUREN, 2009a, p. 91)20.

O aprendente é visto como um ator social, isto é, como um indivíduo crítico, autônomo,
cidadão do mundo, que poderá ir morar em um país estrangeiro e saberá conviver em uma
sociedade multilíngue e multicultural.
Na Perspective Acional, o aluno precisa ser levado a cumprir ―tarefas ‗próximas da vida
real‘ escolhidas em função das necessidades que o aprendente tem fora da classe ou do
contexto de aprendizagem‖ (ROSEN, 2009, p. 7)21. Por isso, pode-se definir tarefa como

qualquer acção com uma finalidade considerada necessária pelo indivíduo


para atingir um dado resultado no contexto da resolução de um problema, do
cumprimento de uma obrigação ou da realização de um objectivo (CE, 2001,
p. 30).

Nas aulas de LE, o que geralmente ocorre, segundo Puren (2000d), são atividades que
visam a PO a partir de reprodução e elaboração de diálogos, ou atividades que combinam a
compreensão de um texto (escrito ou oral), para que os alunos comentem. Não se pode dizer
que tais atividades não favorecem a PO, entretanto, se o trabalho de aperfeiçoamento da PO
for feito com base em tarefas, os aprendentes serão levados a utilizar a língua-alvo em
situações de interação mais complexas e que se aproximam do uso da linguagem oral que eles
encontrarão fora da classe, seja individualmente, seja em grupo, como, por exemplo,
estabelecer contato com outras pessoas em contextos mais ou menos formais, como nos casos
de iniciar uma amizade ou fazer uma exposição oral em dupla.
Nunan (1989) e CE (2001) propõem um modelo de elaboração de tarefas com os
seguintes componentes:
 Atividades: é o conjunto de exercícios que serão feitos para a realização da tarefa;
Insumo (input): é o material utilizado para dar ter informações sobre o se pretende
executar na tarefa, o qual pode ser autêntico ou fabricado;

20
Original: ―former dans nos classes de langues, donc, ce n‘est plus (ou plus simplement) le voyageur
rencontrant ponctuellement des étrangers (dans un cadre touristique ou même professionnel), ou à l‘inverse
celui qui rencontre chez lui des étrangers de passage, mais le citoyen d‘un pays multilingue et multiculturel
intégré dans l‘espace commun (...), et qui, dans le cadre de sa formation et de sa profession, doit désormais être
capable de travailler dans la longue durée en langue-culture étrangère avec des allophones et même avec des
personnes partageant sa langue maternelle‖ (PUREN, 2009a, p. 91).
21
Original: ―les tâches ‗proches de la vie réelle‘ choisies en fonction des besoins de l‘apprenant hors de la classe
ou du contexte d‘apprentissage‖ (ROSEN, 2009,p. 7).
76

 Objetivo: é o que pretende alcançar com a tarefa;


 Papel do Professor: é diagnosticar são as necessidades dos alunos, planejando
possíveis tarefas e atividades que visem satisfazê-las e que demandem a
participação ativa do aprendente, abrindo espaço para a negociação do plano é ser
seguido;
 Papel do aluno: é ser ativo em seu processo de aprendizagem, colaborando com o
professor e os outros estudantes, a fim de obterem êxito na execução da tarefa;
 Contexto: é associação dos fatores situacionais (físicos, institucionais, por exemplo)
que influenciam diretamente na interação.

A determinação desses componentes em uma tarefa pode favorecer o E/A da PO, assim
como propiciar uma melhor a interação entre professor-aluno, aluno-aluno, pois a participação
dos aprendentes não se restringirá a reprodução de diálogos e a breves comentários de textos.

2. A SEQUÊNCIA DIDÁTICA E OS GÊNEROS TEXTUAIS (ORAIS) EM (P)LE

Para o ensino-aprendizagem da produção oral em (P)LE, faz-se necessário um


planejamento das atividades e procedimentos que serão utilizados. Esse planejamento pode se
dar por meio da elaboração de uma Sequência Didática (SD), a qual é definida como ―um
conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática‖ e ―tem (...) a finalidade
de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou
falar de uma maneira mais adequada numa dada situação comunicativa‖ (DOLZ,
NOVERRAZ, SCHNEUWLY, 2004, p. 97 – grifo dos autores).
Os gêneros textuais podem ser orais e escritos os quais, segundo Marcuschi (2007, p.
22-23), são ―textos materializados que encontramos em nossa vida diária e apresentam
características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e
composição característica‖ (grifos do autor) e podem ser ―objeto[s] e instrumento[s] de
trabalho para o desenvolvimento da linguagem‖ (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 80).
Para se trabalhar com um gênero textual, a partir de uma SD, Schneuwly e Dolz (2004)
recomendam as seguintes etapas: (1) apresentação de uma situação, isto, é, informar aos
alunos que eles realizarão uma tarefa para a produção de um determinado gênero escolhido;
após eles deverão efetuar (2) a produção inicial de texto (oral ou escrito), para que se possa
verificar o que eles sabem sobre o gênero que se está trabalhando; e a partir do que for
verificado, o professor poderá começar o processo de aperfeiçoamento da produção (oral ou
escrita) de seus alunos, conscientizando-os acerca das dificuldades que eles apresentam e
estabelecerão quais atividades serão utilizadas (3) nos módulos para superar os problemas
77

encontrados na primeira produção, assim como, mostrará os parâmetros empregados para


medir o progresso desse aperfeiçoamento até que cheguem a última etapa.
Na (4) produção final, espera-se que os alunos demonstrem na prática os conhecimentos
construídos e adquiridos separadamente nos módulos. A partir das produções desta etapa, o
professor poderá analisar se houve progresso referente à produção inicial e avaliar o
desempenho de seus alunos na última produção. Assim, perceberá se os conteúdos
apresentados por ele contribuíram para que seus alunos conseguissem dominar/aprimorar o
gênero estudado.
A duração de uma SD pode variar de dias a semanas, desde que esteja de acordo com o
planejamento e/ou com as necessidades da classe. Vale enfatizar que ao se trabalhar com a
SD, é importante que o professor tenha consciência de que o foco está na construção de uma
nova relação com a linguagem e isso implica em saber ensinar o oral de maneira
sistematizada, levando-se em consideração os recursos extralinguísticos (postura, gestos,
risos, silêncios) e prosódicos que constituem ―uma perspectiva central do ensino do oral‖
(DOLZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 162), visando levar o aluno a tomar consciência da
finalidade da tarefa proposta, das interações entre os interlocutores e da importância do
contexto social onde se dão as interações.

3. O GÊNERO EXPOSIÇÃO ORAL NO E/A DA PRODUÇÃO ORAL EM (P)LE

Com base em nossas leituras e concepções de E/A de línguas – as quais foram


apresentadas nos itens anteriores –, propomos uma SD para o trabalho com o gênero
Exposição Oral. Justificamos a escolha desse gênero porque ele permite aos alunos terem uma
significativa possibilidade de exercitar e desenvolver sua competência comunicativa, além de
aprender a utilizar os recursos verbais, não-verbais e prosódicos necessários para a
comunicação e, também, porque os alunos poderiam compartilhar informações sobre assuntos
diversos. Selecionamos ainda este gênero porque as exposições orais são trabalhos solicitados
no meio acadêmico.
A Exposição Oral é uma atividade praticada normalmente e usada nas escolas para
desenvolver a proficiência em oral. Schneuwly e Dolz (1998) apresentam uma abordagem
para facilitar o trabalho com esse gênero. Segundo eles, é preciso levar em conta as
características gerais da apresentação oral, que pode ser definida
78

como um gênero textual público, relativamente formal e específico, em que


um expositor especialista se dirige a uma plateia de uma maneira
(explicitamente) estruturada, para lhes transmitir informações, descrever-
lhes ou explicar-lhes alguma coisa (SCHNEUWLY, DOLZ, 1998, p. 143).22

No E/A, segundo os autores citados, depois de selecionar o gênero, em nosso caso a


Exposição Oral, é aconselhável adotar um modelo didático para torná-lo um objeto de ensino,
definindo quais são as especificidades funcionais e organizacionais desse gênero.
A situação de comunicação na sala de aula é uma das dimensões a serem levadas em
conta, porque o aluno, ao fazer uma exposição oral, é solicitado a desempenhar o papel de um
mestre (especialista) que conhece bem o assunto que expõe, e para apresentá-lo, precisa
organizar o seu discurso sobre o assunto que ele abordará em sua apresentação. Para isto, ele
terá que buscar informações. Logo, ele precisará fazer uma pesquisa, estabelecer um tipo de
hierarquia entre as informações encontradas, com o intuito de consolidar ideias, assegurar
uma progressão temática, estruturar o discurso, refletir sobre a maneira de falar e o trabalhar o
gestual; formular exemplos.
Com relação às fases da Exposição Oral, Schneuwly e Dolz (1998) mencionam que uma
sequência possível da apresentação pode ser:

(1) Abertura: entrar em contato com o público, saudá-lo;


(2) Introdução do tema: definir e legitimar a escolha do tema;
(3) Apresentação do plano: esclarecer os pontos do assunto a serem discutidos;
(4) Desenvolvimento do tema: expor informações sobre o assunto;
(5) Resumo/síntese: retomar pontos da apresentação;
(6) Conclusão: trazer uma mensagem final e, às vezes, apresentar outros
problemas que precisam ser refletidos;
(7) Encerramento: agradecer a presença e a atenção do público.

A esse modelo, acrescentamos uma oitava etapa de Comentários e Perguntas e, para


que o ouvinte possa pedir ao aluno/expositor esclarecimentos acerca de alguma informação
que ele não tenha entendido e, também, para elogiá-lo ou chamar atenção para possíveis
falhas na apresentação.

A avaliação também é uma etapa das apresentações, por isso é importante selecionar
critérios com base no que foi estudado, por exemplo: a gestão de conteúdos, a estruturação

22
Original : ―comme un genre textuel public, relativement formel et spécifique, dans lequel un exposant expert
s‘adresse à un auditoire, d‘une manière (explicitement) structurée, pour lui transmettre des informations, lui
décrire ou lui expliquer quelque chose‖ (SCHNEUWLY, DOLZ, 1998, p. 143).22
79

adequada/consistente, e também considerando as atividades da etapa de preparação, como a


pesquisa, os questionamentos dos alunos.
Antes de começarmos o trabalho propriamente dito, é importante traçar um perfil da
turma, para verificar quais conhecimentos linguísticos e temáticos os discentes terão quando
seremos executarão a produzir a exposição oral. Por isso, sugerimos a aplicação de um
questionário para coletar as seguintes informações:
• Nome: • Idade: • Língua (s) Estrangeira (s): (LE)
• País: • Língua Materna (LM): • Tempo de estudo do português:
• Cidade de origem: • Língua segunda (LS):

Abaixo, apresentamos um percurso de SD que pode ser seguido e modificado conforme


o perfil da turma:
Apresentação da Situação Primeira Módulos Produção
Produção Final
• A proposta de tarefa é • Os estudantes • Analisa-se as primeiras • Segunda
apresentada; expõem aos exposições exposição
• Além dos países dos colegas algumas • Revisa-se as oral;
alunos, outros são informações características de uma • Ao final das
escolhidos; sobre: exposição oral; apresentações,
• Os países são distribuídos;  Situação • Redefine-se critérios faz-se uma
• Orientações sobre como e Geográfica da exposição oral avaliação para
onde pesquisar.  Política (tempo, meios de verificar se
• Explica-se as  Economia exposição, gravação, houve
características de uma  História avaliação) mudanças em
exposição oral;  Cultura • Escolhem-se novos relação à
• Define-se, conjuntamente assuntos. primeira
com os alunos, os critérios dos países de seus produção
da exposição oral (tempo, colegas
meios de exposição [slides,
vídeos, etc ], gravação,
avaliação)

Note-se também que esta é uma proposta de sequência didática. Outro percurso
poderia ter sido adotado, todavia, optamos por esse trajeto que pareceu mais suscetível de
favorecer nossa análise quanto:
• à percepção dos estudantes acerca das características e da função do gênero
exposição oral;
• à determinação do que os alunos sabiam sobre tal gênero e o que lhes poderia ser
apresentado como novidade;
• à comparação entre as produções iniciais e finais dos aprendentes;
• ao interesse dos alunos pelos assuntos propostos para as apresentações;
• à relação que os aprendentes conseguiram estabelecer com as suas línguas-
80

culturas.

Vale enfatizar que ao trabalhar com a exposição oral, pretendíamos propor uma
interação ativa entre o professor e os alunos, entre os alunos e as fontes de conhecimento e
entre alunos expositores e a plateia. Sabíamos que o que estava em jogo, neste caso, não era
apenas um tema que serviu de mote para uma apresentação oral e discussão de conteúdos,
mas, sobretudo, o processo de apropriação de um gênero e também de instâncias ligadas a
línguas-culturas na produção oral dos aprendentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como foi dito anteriormente, produzir oralmente é uma das dificuldades encontradas
pelos aprendentes de PLE. Quando solicitados a tomar a palavra em público, seja para expor
um conteúdo, seja para discutir sobre determinado assunto e apresentar seu ponto de vista, os
alunos não conseguem se expressar. Alguns por timidez, outros por não se sentirem seguros
com o nível de língua que possuem, há alunos que em virtude de se compararem com outros
alunos que já aprenderam ―mais‖ sobre a língua-alvo, sentem-se acanhados.
Se o trabalho para o desenvolvimento da PO for desenvolvido a partir dos pressupostos
teóricos mostrados até o momento, ele poderá possibilitar a apropriação de uma competência
comunicativa, visando otimizar a influência de diferentes línguas‐culturas e minimizar as
eventuais dificuldades encontradas no que concerne a PO dos estudantes estrangeiros de PLE.
Por meio das tarefas, o aluno poderá apropriar-se de um conteúdo que permitirá
aumentar a sua consciência linguística, permitindo seu engajamento e atuação social na
comunidade estrangeira na qual se insere, e legitima o uso da língua. Tais fatores tornam a
aprendizagem significativa.
No que diz respeito ao ensino PLE, a SD pode favorecer o ensino-aprendizagem da PO
de estrangeiros, pois, ela auxilia o professor a sistematizar o trabalho com os gêneros,
possibilitando o planejamento de como se poderão explorar as características funcionais e
composicionais do gênero oral selecionado para o estudo.
Pelo exposto, consideramos que o ensino PLE, pode familiarizar o aprendente com as
formas de organização textual da língua-alvo, para que ele adquira segurança e se torne apto a
produzir os gêneros orais que circulam na língua-alvo. Dessa maneira, segundo Bustamante
81

(2007)23, os gêneros ajudarão o aluno a ―compreender o mundo e a ser compreendido,


tornando-se um aprendiz e cidadão melhor e independente‖.
Ressaltamos que neste artigo, apresentamos os pressupostos teóricos que têm
fundamentado nosso projeto de pesquisa de mestrado que no momento está em andamento
(Os Gêneros Textuais no Ensino-Aprendizagem da Produção Oral em Português Língua
Estrangeira em Contexo Linguístico-Cultural Heterogêneo). É nosso propósito em trabalhos
futuros, apresentar como nós os operacionalizamos, colocando em foco a heterogeneidade
linguístico-cultural presentes em turmas de PLE, com o objetivo de mostrar como foi
desenvolvida a produção oral, explorando as diferentes línguas-culturas, isto a partir de
tarefas que tentaram otimizar a influência das línguas-culturas e minimizar as eventuais
dificuldades encontradas.

REFERÊNCIAS

BUSTAMANTE, Isabela Gomes. A produção escrita em inglês como língua estrangeira


através do ensino de gêneros discursivos: análise de uma lição. In: Revista Pesquisas em
Discurso Pedagógico, v. 1, p. 9743, 2007. Disponível em: < http://www.maxwell.lambda.
ele.puc-rio.br/cgi-bin/db2www/PRG_1440.D2W/INPUT0?CdLinPrg=pt >. Acesso em: 30
maio 2008.
CAPES. Programa Capes/Brafitec. Disponível em: < http://www.capes.gov.br/cooperacao-
internacional/franca/brafitec> Acesso em: 04 jun 2011.
CONSELHO DA EUROPA. Quadro Europeu Comum de Referências para as Línguas:
Aprendizagem, ensino e avaliação. Portugal, Porto: ASA Editores, 2001.
ENGCOMP/UPFA. Programa de Cooperação Brasil-EUA. Disponível em:
<http://www.engcomp.ufpa.br/index.php?option=com_content&view=article&id=77:das-
engenharias-eletrica-computacao-e-mecanica&catid=43:noticias> Acesso em: 04 jun 2011.
MARCUSCHI, Luiz Antonio. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO,
Ângela Paiva; MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria Auxiliadora (orgs). Gêneros
textuais e ensino. - 5 ed. - Rio de janeiro: Lucena, 2007. (p. 19-36)
NUNAN, D. Designing tasks for the communicative classroom. Cambridge: Cambridge
University Press, 1989.
PUREN, Christian. De l’approche par les tâches à la perspective co-actionnelle.
Disponível em: <http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Russie3/puren.pdf>. Acesso em:
20 mar 2010.
_______. Entre l‘Approche Communicative et la Perspective Actionnelle, quoi de neuf? In:
ABDELGABER, Sylvie; MÉDIONI, Maria Alice (dir.). Les Cahiers Pédagogiques:
Enseigner les langues vivantes avec le Cadre européen. nº 18, p. 87-91, França, Paris:
CRAP, 2009a.
ROSEN, Evelyne (org). Les Français dans le Monde : Perspective actionnelle et approche
par lês tâches en classe de langue. França, Paris: CLE Internacional, nº 45, 2009.
SCHNEUWLY, Bernard. DOLZ, Joaquim. et al. Gêneros orais e escritos na escola.
[tradução e organização Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro] – Campinas, SP: Mercado de
Letras, 2004. (Coleção As Faces da Lingüística Aplicada)

23
O artigo de Bustamante (2007) não possui paginação.
82

SESU/MEC. Programa de Estudantes Convênio de Graduação. Disponível em:


<www.mec.gov.br/pecg> Acesso em: 28 nov. 2008.

VARIAÇÃO LEXICAL EM SEIS MUNICÍPIOS DA MESORREGIÃO SUDESTE DO


ESTADO DO PARÁ

Edson de Freitas GOMES (UFPA)


Prof. Dr. Abdelhak RAZKY (UFPA/CNPq)
,
RESUMO: Esta dissertação tem o propósito de mostrar o fenômeno da ―Variação Lexical em
Seis Municípios da Mesorregião Sudeste do Estado do Pará‖ que tem por objetivo coletar,
analisar, comparar e mapear as variantes linguísticas lexicais presentes na fala de vinte e
quatro informantes moradores da referida mesorregião (Curionópolis, Itupiranga, Santana do
Araguaia, São Félix do Xingu, São João do Araguaia e Tucuruí). A pesquisa que está sendo
realizada para a dissertação faz parte dos estudos vinculados ao projeto GeoLinTerm,
coordenado pelo Prof. Dr. Abdelhak Razky. Os dados coletados para a constituição do corpus
do trabalho estão sendo registrados em gravador digital, a partir da aplicação de um
questionário semântico-lexical com 256 perguntas feitas aos informantes selecionados, de
acordo com critérios que levam em consideração fatores extralinguísticos (sexo, idade,
escolaridade). Como resultado serão confeccionadas cartas lexicais que mapearão a variação
lexical na mesorregião sudeste do estado do Pará.

PALAVRAS-CHAVE: Geolinguística, léxico, variação lexical.

ABSTRACT: This paper aims to show the phenomenon of "Lexical Variation in Six
Municipalities in southeastern region of Pará" which aims to collect, analyze, compare and
map the language lexical variants present in the speech of twenty-four residents of the
informants said meso (Curionópolis, Itupiranga, Santana do Araguaia, Sao Felix do Xingu,
São João do Araguaia and Tucuruí). The research being conducted for the dissertation is part
of the studies GeoLinTerm attached to the project, coordinated by Prof. Dr. Abdelhak Razky.
Data collected for the constitution of the corpus of work are being recorded on digital recorder
from the application of a lexical-semantic questionnaire with 256 questions asked of
informants selected according to criteria that take into account extralinguistic factors (sex,
age, schooling). As a result letters will be made to map the lexical variation in the
southeastern region of Pará.

KEYWORDS: Geolinguística, lexicon, lexical variation.

INTRODUÇÃO

A tentativa de registrar a variação linguística no Brasil remonta ao século XIX quando


surgiram os primeiros estudos de caráter semântico-lexical, momento em que,

[...] Passa-se, a seguir, à investigação mais aprofundada de áreas e


localidades, examinadas nos diferentes níveis que a língua oferece –
83

fonético, morfológico, sintático, semântico, lexical, prosódico -, buscando-


se, assim, a descrição plena do falar das áreas consideradas. [...]
(CARDOSO, 2010, p. 11)

Mas é em meados do século XX que surge a preocupação com relação à geolinguística


no Brasil. É quando a intenção de realizar um atlas linguístico do Brasil, leva à criação dos
atlas regionais. Hoje muitos desses atlas já estão concluídos e outros estão em andamento,
como é o caso do ALIPA.
O trabalho que estamos desenvolvendo pretende descrever e mapear a variação lexical
do português falado em seis municípios da mesorregião sudeste do Pará. O referencial teórico
nos ajudará com informações de trabalhos já realizados na área. Seguimos a metodologia
prescrita pelo projeto ALIPA, que são as entrevistas com informantes da zona rural, levando-
se em consideração os aspectos diageracional, diagenérico, diastrático e diafásico.
No momento somente as entrevistas com 12 informantes constituem o corpus do
trabalho, com expectativa de fazermos as 12 restantes no início de 2012. Os dados estão
referentes as 12 entrevistas estão armazenados em equipamentos eletrônicos à espera de
tratamento.

Objetivo da dissertação

Este trabalho de dissertação faz parte do projeto Atlas Geo-Sociolinguístico do Pará


(ALIPA), que está inserido na nova versão do projeto Geo-Sociolinguística e Terminologia
(GeoLinTerm), que é vinculado ao laboratório de linguagem da pós-graduação em Letras da
UFPA e está em desenvolvimento desde 1996, com o propósito de registrar a variação lexical
em cinquenta pontos do estado, a fim de traçar um perfil do uso das palavras que fazem parte
do léxico no estado. Para facilitar o trabalho e registrar com maior fidelidade as variações, o
projeto usa como referência as seis mesorregiões do estado, a saber: Baixo Amazonas,
Marajó, Metropolitana de Belém, Nordeste, Sudeste e Sudoeste. Até o momento já foram
realizados os registros de aproximadamente 40 localidades.
Com a elaboração desta dissertação pretendemos conhecer melhor a diversidade
linguístico-lexical de cada município do Sudeste Paraense, a que este trabalho se propõe a
estudar, bem como entender melhor os aspectos históricos e socioculturais de cada uma das
localidades. Baseando-nos em trabalhos já realizados por alunos de letras da graduação e da
pós-graduação sobre o assunto, iremos verificar a possibilidade de, a partir dos dados já
trabalhados e com os quais estamos coletando, traçar isoglossas tanto na mesorregião Sudeste,
quanto em relação às outras mesorregiões do estado que fazem parte do projeto.
84

Trabalhamos com a hipótese de que a possibilidade de encontrarmos registros com


significativa variação do léxico na referida mesorregião é bastante provável, devido ao
elevado número de imigrantes que vieram para essa região do estado durante os ciclos de
povoamento na Amazônia, em que principalmente sulistas e nordestinos fixaram-se no local,
e pelo fato de as populações daquela parte do Pará, manterem uma relação muito grande com
outros estados do Brasil como Tocantins e Goiás, o que faz com que a mesorregião possua
uma característica bastante peculiar em relação às outras cinco que compõem o projeto
ALIPA.

MAPA 1. Mapa do estado do Pará com as seis mesorregiões, dentre as quais a mesorregião
sudeste que é objeto desta pesquisa.

Referencial teórico

Para a realização do presente trabalho estão sendo utilizados como referencial teórico os
estudos sobre a dialetologia e a geolinguística, que têm como interesse estudar a diversidade
linguística no espaço geográfico. Bem como, a sociolinguística que aborda os fatos da língua
a partir de perspectiva social, registrando os fatos comprovados através de mapas. Uma das
obras de destaque até aqui no trabalho é Geolinguística: tradição e modernidade de Cardoso
(2010), pela propriedade com que a autora aborda o assunto em questão.
85

Para referenciar o trabalho estão sendo utilizados os atlas linguísticos regionais


publicados, até o momento dentre os quais se destacam: Atlas Provisório dos Falares Baianos
- APFB (Rossi et al, 1963), Esboço de um Atlas Linguístico de Minas Gerais - EALMG
(Ribeiro et al, 1977), Atlas linguístico da Paraíba – ALPB (Aragão et al, 1984) e Atlas
Linguístico de Sergipe - ALS I (Ferreira et al, 1987). No Pará o projeto GeoLinTerm divide-
se em três: Atlas Linguístico e Sonoro do Pará - ALISPA, com dados já publicados da zona
urbana de 10 municípios do estado; Atlas Linguístico do Pará - ALIPA, em andamento com
coleta de dados em 50 localidades rurais, e TERMINOLOGIA, também em andamento com
coleta de dados específicos, como a terminologia da farinha, da pesca, do caranguejo, da
madeira etc. Todos sob a coordenação do prof. Abdelhak Razky. Em nível nacional o projeto
Atlas Linguístico do Brasil – ALIB, que nas palavras de Cardoso (2010), ―em abril de 2010 já
conta com 80% da rede de pontos documentada‖. Este atlas serve não apenas como
referencial, mas, sobretudo como fonte inspiradora para a realização dos trabalhos nessa área
de estudo.

Metodologia

No projeto ALIPA, a pesquisa de cunho dialetológico é realizada em localidades da


zona rural e abrange cinquenta pontos geográficos do estado do Pará. Em cada ponto são
entrevistados 4 informantes estratificados da seguinte forma, Sexo: 2 homens e 2 mulheres;
Idade: 2 informantes entre 18 a 30 anos e 2 informantes entre 40 a 70 anos; Escolaridade:
todos escolarizados até a 4ª série do ensino fundamental.
As gravações para a pesquisa estão sendo realizadas pelo autor da pesquisa, em
gravador digital Linear PCM Recorder LS-10, a partir da aplicação de um questionário
semântico-lexical, composto de 256 perguntas, que abordam variados temas, feitas aos 24
informantes previamente selecionados na mesorregião. O tamanho dos corpora que serão
formados compreende 24 gravações ao todo.
Os mapas serão um recurso de relevante importância para a confecção das cartas
lexicais, por isso, conseguimos alguns que identificam: as mesorregiões do estado do Pará,
com seus respectivos pontos de inquérito do projeto ALIPA e um da mesorregião sudeste com
os seis municípios de nossa pesquisa. Estes mapas foram elaborados pela estagiária Ana
Cristina Salim do NAEA/UFPA.
86

Etapa realizada

Este trabalho está em andamento desde março de 2011, com previsão de conclusão para
fevereiro de 2013. Nos meses de julho e agosto de 2011 fomos para os municípios de Santana
do Araguaia, São Félix do Xingu e Tucuruí, para cumprir a primeira etapa da coleta dos
dados, a fim de identificarmos os 12 informantes para gravar as entrevistas para a formação
do corpus do trabalho de dissertação. Os dados coletados já estão em fase inicial de
tratamento, a partir da seleção para transcrições, análises e confecção das cartas lexicais.

MAPA 2. Mapa da mesorregião sudeste do estado do Pará, com destaque para os municípios
que são objetos de estudo desta pesquisa.

Constituição do corpus

Após pesquisar sobre o histórico e a especificidade de cada município alvo da pesquisa,


em consonância com Brandão (1991, p. 25) que diz ―[...] que se proceda a um estudo
preliminar que possibilite conhecer as especificidades da região em que se desenvolverá a
pesquisa e dos segmentos sociais que a constituem.‖, e de analisarmos cuidadosamente por
87

onde deveríamos começar o deslocamento para tornar viável o trabalho de campo e realizar
em menor tempo a coleta dos dados, chegamos à conclusão de que faríamos o trabalho de
campo em duas etapas. Primeiramente, começaria por Santana do Araguaia que fica na divisa
com o estado do Tocantins, que é o município mais distante de Belém. Depois São Félix do
Xingu, que além da distância, é de difícil acesso e de maior extensão territorial, o que
dificultaria o trabalho de coleta de dados. Posteriormente fui para Tucuruí que fica mais
próximo a Belém, o que facilitou o acesso. Num segundo momento iremos para os municípios
de São João do Araguaia, Curionópolis e Itupiranga que ficam mais concentrados, próximos a
Marabá, o que deverá facilitar o deslocamento e a coleta dos dados.
Ao chegarmos aos municípios de Santana do Araguaia, São Félix do Xingu e de
Tucuruí, procuramos a EMATER para nos orientasse sobre os lugares onde teria maior
chance de encontrar informantes. Essa decisão foi fundamental para o sucesso da pesquisa,
porque foram os servidores deste órgão público que me deram as maiores dicas sobre
possíveis lugares onde encontraria os informantes ideais para gravar as entrevistas. Também
foi com o pessoal da EMATER que conseguimos hospedagem a maior parte do tempo em que
estivemos naqueles municípios, com exceção de Tucuruí, que ficamos no alojamento da
UFPA.
Foram muitas as dificuldades encontradas antes e durante a realização da coleta dos
dados. A primeira está relacionada à viagem, devido à dimensão territorial do Estado do Pará
e ao péssimo estado das rodovias estaduais que tornam as viagens ainda mais demoradas,
desconfortáveis e perigosas. A outra dificuldade foi encontrar os informantes que
preenchessem os requisitos exigidos pelo projeto ALIPA, pois, as exigências do projeto
seguem os seguintes critérios,

[...] somente serão entrevistados aqueles indivíduos que ou tenham nascido


na comunidade em questão ou a ela tenham chegado até os 5 anos de idade.
Com isso você evitará que a escolaridade do informante em uma ou outra
comunidade, ou sua interação com falantes de outro centro até a fase crítica
da adolescência tenham reflexo sobre a marca sociolinguística do grupo
estudado. (TARALLO, 1985, p. 27 e 28).

Pelo fato de os municípios de Santana do Araguaia e São Félix do Xingu não sediarem
Campi da UFPA, e que o município de Tucuruí tem Campus, mas só funcionam cursos da
área de Engenharia. Isso descartou qualquer possibilidade de apoio através da UFPA local, o
que nos forçou a procurar outros meios de apoio para chegar aos informantes. Por fim, o
maior desafio foi encontrar informantes que tenham nascidos nos locais, haja vista o grande
88

número de pessoas vindas de outras regiões do Brasil, durante os períodos migratórios, e que
habitam as zonas rurais destes municípios (Projetos de Assentamento). Por conta dessa
realidade, às vezes se torna mais fácil encontrar moradores que nasceram naqueles
municípios, que trabalham na zona rural e moram na cidade.
Mas, apesar das dificuldades para conseguirmos encontrar os informantes, nas três
localidades onde coletamos os dados, contando com a boa vontade das pessoas dos lugares,
foi possível entrevistar os 12 informantes. E ainda poderíamos entrar mais informantes se não
fosse o desgaste físico e psicológico que a aplicação do questionário provoca e o pouco tempo
disponível para a realização da atividade.

Organização dos dados

Até o presente momento tudo o que temos são os dados coletados em três dos seis
municípios que iremos coletar. Estes dados coletados e os que serão coletados vão ser
transferidos para equipamentos e programas computacionais, a fim de serem realizados os
procedimentos necessários para o tratamento dos dados, como transcrições fonéticas de
acordo com IPA (Alfabeto Fonético Internacional), análises, comparações e conclusões.
Como resultado serão confeccionadas cartas lexicais que mapearão a variação lexical na
mesorregião sudeste do estado do Pará. Posteriormente, serão submetidos à apresentação
pública e publicados nos meios de comunicações apropriados e integrarão o corpus do Projeto
GeoLinTerm.

Referências bibliográficas
BRANDÃO, Silvia Figueiredo. A geografia linguística no Brasil. São Paulo: Ática, 1991.
CARDOSO, Suzana Alice Marcelino. Geolinguística: tradição e modernidade. São Paulo:
Parábola, 2010.
RAMOS, Conceição de Maria de Araujo et al (Org.). Pelos caminhos da dialetologia e da
sociolinguística: entrelaçando saberes e vidas. São Luis: Edufma, 2010.
RAZKY, Abdelhak (Org.). Estudos geo-sociolinguísticos no estado do Pará. Belém:
Edufpa, 2003.
TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. 4 ed. São Paulo: Ática, 1994.
89

TERMINOLOGIA DA CERÂMICA ARTESANAL DE ICOARACI: UMA


ABORDAGEM SOCIOTERMINOLÓGICA

Eliane Oliveira da COSTA (UFPA)


Abdelhak RAZKY (UFPA)

RESUMO: A introdução da dimensão social nos estudos linguísticos, com o advento da


Sociolinguística, possibilitou análises mais reais dos fenômenos de linguagem. Do mesmo
modo, quando se passou a levar em consideração o aspecto social nos estudos terminológicos,
com o advento da Socioterminologia, houve um redirecionamento no tratamento dado às
linguagens especializadas. Assim, observou-se que essas linguagens variam e que as variantes
terminológicas ocorrem nos níveis linguístico e social e resultam dos diferentes usos que a
comunidade linguística faz dos termos. Este último modelo de estudo propõe outra maneira de
se coletar dados, já que o pesquisador precisa buscá-los em situações reais de comunicação.
Nesta perspectiva, o presente trabalho apresenta alguns resultados da pesquisa que estamos
realizando para a nossa dissertação de Mestrado, em que nos propomos a elaborar, com base
nos princípios teórico-metodológicos da Socioterminologia, um glossário socioterminológico
dos termos da cerâmica artesanal produzida no distrito de Icoaraci (Belém/PA), a partir de três
campos semânticos, a saber: extração da argila, confecção da peça e comercialização.

PALAVRAS-CHAVE: Socioterminologia, Cerâmica artesanal, Glossário


socioterminológico.

ABSTRACT: L'introduction de la dimension sociale dans les études linguistiques, avec


l'avènement de la sociolinguistique, a permis une analyse plus réaliste des phénomènes
linguistiques. De même, quand il est venu à considérer les études sociales terminologiques,
avec l'avènement de Socioterminologie, il y avait une redirection dans le traitement des
langages spécialisés. Il a été constaté que ces langues diffèrent dans la terminologie et que les
variantes se produisent dans la langue et social résulte de niveaux différents usages que la
communauté fait le point de vue linguistique. Le modèle de cette dernière étude propose une
autre façon de recueillir des données que le chercheur a besoin de les obtenir dans une
communication réelle. Dans cette perspective, cet article présente quelques résultats de la
recherche que nous faisons pour la thèse de notre Maître, dans laquelle nous proposons de
développer, basée sur des principes théoriques et méthodologiques de Socioterminologie, un
glossaire des termes de socioterminológie poterie produite dans le quartier Icoaraci (Belém /
PA), à partir de trois champs sémantiques, à savoir l'extraction de l'argile, la fabrication et la
commercialisation.

MOTS-CLÉS: Socioterminologie, céramique artisanat, Glossaire socioterminologique

INTRODUÇÃO

No trabalho de dissertação de Mestrado, estamos fazendo a identificação, a análise e a


documentação da terminologia corrente na produção de cerâmica artesanal no distrito de
Icoaraci (Belém/Pará), a partir de um corpus constituído por quinze textos orais produzidos
90

por profissionais que praticam o fazer ceramista. Para desenvolvermos tal pesquisa, adotamos
os princípios teórico-metodológicos da Socioterminologia, tal como pensada por Gaudin e por
Faulstich, que propõem a análise e a descrição das unidades terminológicas em contextos
socioculturais reais de uso da língua.
A adoção dessa base teórico-metodológica deve-se ao fato de ela nos permitir analisar
a terminologia em questão a partir de situações sociais reais de comunicação, o que não seria
possível se o fizéssemos à luz da Terminologia de cunho prescritivo, já que essa disciplina
prevê a normalização dos termos técnicos e científicos. Assim, em divergência a esse ideal
normalizador, a inclusão da dimensão social nos estudos terminológicos redirecionou o modo
se estudar as linguagens especializadas ao definir as comunicações profissionais, lugar onde
as terminologias funcionam naturalmente, como ponto de partida do fazer socioterminológico.
Quanto ao nosso objeto de estudo, a terminologia da cerâmica artesanal do Distrito de
Icoaraci, justificamos a sua escolha pelos seguintes fatos: a) por seu valor socioeconômico,
uma vez que a sua produção envolve a maioria das famílias que residem no bairro do Paracuri
(bairro icoaraciense onde funcionam diariamente dezenas de olarias), funcionando como fonte
de renda de onde provém seu sustento; b) por ser uma atividade cultural local que representa o
Estado do Pará a nível nacional e internacional, corroborando a valorização da cultura
paraense, bem como o fortalecimento da identidade regional; c) por ser o artesanato em
cerâmica um veículo da memória individual e coletiva dos membros da comunidade, uma vez
que constitui uma atividade que se perpetualiza por meio das várias gerações que o mantém,
ou seja, é uma atividade que passa de pai para filho; d) por contribuir com o projeto
SocioTerm, no que tange à descrição e à documentação do léxico do português paraense; e)
por não existir, que seja do nosso conhecimento e alcance, um instrumento terminográfico em
que esteja registrada a terminologia da cerâmica artesanal da localidade investigada.
Nesta perspectiva, entendemos que a nossa pesquisa contribuirá para o
desenvolvimento dos estudos terminológicos, os quais têm avançado amplamente no Brasil,
sobretudo, no espaço acadêmico das Universidades brasileiras. Na Universidade Federal do
Pará (UFPA), por exemplo, no âmbito do Projeto SocioTerm, a pesquisa terminológica tem se
destacado com a produção de glossários que analisam, descrevem e documentam, sob o ponto
de vista linguístico-descritivo, ou seja, considerando os fenômenos da variação, polissemia e
sinonímia, e, ainda sociocultural, ou seja, considerando os diferentes usos linguísticos como
indicadores de diferença e de identidade de uma comunidade, o léxico do português paraense,
documentando-o em glossários.
91

1. LÉXICO COMUM E LÉXICO ESPECIALIZADO

O léxico é a primeira instância de nomeação do mundo, ou seja, é ele o instrumento de


registro da história do conhecimento (ciências e tecnologias) e da humanidade, as quais se
confundem naturalmente. Assim sendo, a produção do conhecimento nessas áreas se dá de
maneira constante, transformando e modificando as realidades social, histórica e cultural das
civilizações. O caráter inconstante dessa relação (conhecimento/sociedade) movimenta o
léxico, que se mantém aberto a essas transformações, recebendo novas palavras em
detrimento do desaparecimento total ou parcial de outras que não nomeiam mais realidades
atuais. Além disso, segundo Isquerdo (2001, p. 14), o ―léxico de uma língua natural pode ser
identificado com o patrimônio vocabular de uma dada comunidade linguística ao longo de sua
história‖. Sobre o componente lexical das línguas, Biderman (1998, p. 179) explica:

O léxico está associado ao conhecimento e o processo de nomeação em


qualquer língua resulta de uma operação perceptiva e cognitiva. Assim
sendo, no aparato linguístico da memória humana, o léxico é o lugar do
conhecimento sob o rótulo sintético de palavras – os signos linguísticos.

Sua classificação se dá em dois tipos: léxico geral e léxico especializado. O primeiro


―integra as palavras que podem ser utilizadas em qualquer contexto discursivo‖. O segundo
―encontra adequação no âmbito da comunicação socioprofissional e no contexto técnico-
científico‖, conforme Pontes (2009, p. 18). Esses léxicos se entrecruzam, pois uma palavra
pode ser empregada na linguagem especializada, assim como um termo pode ser utilizado na
linguagem comum, sendo difícil estabecer um limite entre ambos. Além disso, como afirmam
Krieger e Finatto (2004, p. 46), ―ambos, palavra e termo, obedecem aos mesmos padrões e
sofrem os mesmos efeitos da gramática dos sistemas linguísticos‖.
Dessa forma, observa-se que o léxico, de modo geral, resulta de fenômenos
linguísticos, os quais são responsáveis pela sua constante renovação, cabendo aos estudiosos
da língua investigar como esses fenômenos se processam. Isso deu e dará conta de explicar o
funcionamento do léxico das línguas ao longo da história. Além disso, é importante também
que se levante, analise e descreva esses léxicos, documentando-os em instrumentos
lexicográficos, uma vez que estes constituem o ―único lugar que reúne, de modo sistemático,
o conjunto dos itens lexicais criados e utilizados por uma comunidade lingüística, permitindo
que ela reconheça-se a si mesma em sua história e em sua cultura.‖ (KRIEGER et. al., 2006,
p. 174).
92

2. LEXICOLOGIA E LEXICOGRAFIA: BREVES CONSIDERAÇÕES

A Lexicologia é um campo de estudo que analisa e descreve o léxico geral da língua.


Esse léxico comporta todas as palavras existentes num sistema linguístico, sendo, portanto,
uma disciplina que se ocupa do ―estudo científico do léxico, mais especificamente, das
palavras de uma língua‖, conforme Krieger e Finatto (op. cit., p. 43). Assim, dada a
complexidade do seu objeto de estudo, a Lexicologia dá conta de muitas tarefas.
Barbosa (1990, não paginado) relaciona uma série delas, dentre as quais destacamos as
seguintes: a) definir conjuntos e subconjuntos lexicais; b) conceituar e delimitar a unidade
lexical de base - a lexia -, bem como elaborar os modelos teóricos subjacentes às suas
diferentes denominações; c) analisar e descrever as estruturas morfo-sintáxico-semânticas de
tais unidades, sua estruturação, tipologia e possibilidades combinatórias; d) analisar e
descrever as relações entre a expressão e o conteúdo das palavras e os fenômenos daí
decorrentes: polissemia, homonímia, homossemia total (sinonímia), homossemia parcial
(parassinonímia), hiperonímia, hiponímia, antonímia e paronímia.
Conforme se observa, os estudos lexicológicos envolvem a palavra, entendida como
―[...] uma unidade descrita por um conjunto de características linguísticas sistemáticas e
dotada de propriedade de referir-se a um elemento da realidade 24‖ (CABRÉ, 1995, não
paginado), em sua totalidade, o que amplia o campo de atuação da Lexicologia para outras
áreas do conhecimento linguístico.
Outra disciplina que se situa no âmbito do léxico comum é a Lexicografia. Esse campo
de estudo apresenta, atualmente, uma identidade configurada, de um lado, pelo fazer
dicionarístico (Lexicografia Prática) e, de outro, pela análise desse fazer (Lexicografia
Teórica ou Metalexicografia). Em ambas as perspectivas, se leva em consideração que um
dicionário é uma obra de grande complexidade estrutural, linguística e cultural e que,
portanto, não pode ser concebida simplesmente como uma lista de palavras. Nesta
perspectiva, se enquadra a definição apresentada por Dubois (et. al., 2006, p.367), que
entendem a Lexicografia como ―a técnica de confecção dos dicionários e análise linguística
dessa técnica‖.
Tanto do ponto de vista teórico quanto do prático, os estudos lexicográficos têm
evoluído bastante com o surgimento de novas disciplinas linguísticas e com o

24
Una unidad descrita por un conjunto de características linguísticas sistemáticas y dotada de la propiedad de
referirse a un elemento de la realidad.
93

desenvolvimento de novas tecnologias, o que revolucionou a produção de dicionários os quais


―[...] deixaram de ser essencialmente normativos, para serem mais descritivos, preocupados
com os usos da língua e com a educação linguística do povo.‖ (PONTES, op. cit., p. 20).

3. TERMINOLOGIA E TERMINOGRAFIA: DELIMITAÇÃO

A terminologia enquanto conjunto de termos de uma área ou domínio específicos


constitui um construto histórico configurado pelo léxico das línguas, uma vez que a
humanidade não só desenvolve a ciência e a tecnologia, mas também se desenvolve por meio
delas.
Isso porque o homem se movimenta segundo uma linha progressiva em que,
ininterruptamente, são criados processos, máquinas, produtos e processos novos decorrentes
de suas necessidades próprias. Pontes (1997, p. 44) aponta e descreve as seguintes causas
para a disseminação das terminologias: o avanço das ciências, o desenvolvimento da
tecnologia, dos meios de comunicação, das relações políticas internacionais e do comércio
internacional, bem como a chegada e o progresso das multinacionais.
Apesar da contínua dinâmica das terminologias, é somente no século XX que elas
passam a ser observadas com mais interesse. Segundo Gaudin (1993) ―a Terminologia nasce
de uma demanda social real e corresponde a necessidades econômicas e/ou decisões
políticas25‖. Assim, a Terminologia se desenvolve num contexto em que se idealizava uma
terminologia clara e precisa com vistas à eficácia da comunicação profissional, o que
significava padronizar os léxicos de especialidade, a partir da eliminação de ambiguidades e
da prescrição de usos.
Outro campo de estudo que se desenvolve no âmbito do léxico especializado é a
Terminografia. Faulstich (1992, p. 207) concebe essa disciplina como a prática da
Terminologia. Assim, ―o trabalho do terminológo prático ou terminógrafo consiste em
recolher e organizar os termos e as noções de uma mesma área, sob a forma de léxicos,
glossários, dicionários, etc.‖. Esse fazer dicionarístico é um ponto comum entre
Terminografia e Lexicografia, mas Cabré (op. cit.) deixa claro que os instrumentos lexicais
(lexicográficos e terminográficos) são elaborados com metodologia e objetivos diferentes.
O conhecimento das particularidades das áreas descritas anteriormente é indispensável
para o trabalho terminológico, uma vez que ―é passando pelos meandros da língua geral que o

25
la terminologie nait d‘une demande sociale réel et correspond à desbesoins économiques et/ou dês décisions
politiques
94

especialista penetra no coração dos domínios temáticos‖, segundo Boulanger (1995, não
paginado). Permiti-nos, assim, adentrar e nos situar no universo do léxico. Sobre o exposto,
Boulanger (op. cit.), bem conclui que o trabalho com a Terminologia pressupõe ter
―conhecimentos de léxico, de semântica, de morfologia, de lexicografia. Uma obra
lexicográfica ou terminográfica permite, portanto, que se mensurem o progresso e os
conhecimentos linguísticos adquiridos pelos estudantes‖.

4. SOCIOTERMINOLOGIA E VARIAÇÃO TERMINOLÓGICA

O termo Socioterminologia aparece pela primeira vez em 1981, num artigo cunhado
por Jean-Claude Boulanger e publicado nos números 7-8 do Terminogramme do OLF,
Québec, segundo Faulstich (1995, não paginado). Daí em diante, a Socioterminologia começa
a se instituir como campo de estudo voltado para o estabelecimento de estudos mais
condizentes com a realidade das comunicações especializadas. Neste contexto, observou-se
uma avalanche de movimentações que iam de encontro com as concepções das escolas
normalizadoras.
Os ideais socioterminológicos se desenvolveram amplamente a partir dos trabalhos de
François Gaudin, que publicou duas grandes obras de referência, a saber: Pour une
socioterminologie – des problèmes semantiques aux pratiques institutionnelles, em 1993, e
Socioterminologie – une approche sociolinguistitique de la terminologie, em 2003. Nessas
obras Gaudin discute as colocações da Terminologia Clássica, mostrando que os estudos
terminológicos podem ser mais reais, se considerarem o fator social.
Nessa mesma linha de raciocínio, Faulstich retoma o tema variação lexical, discutido
em sua tese de doutoramento, denominada Interpretação de Variante Lexical, defendida na
Universidade de São Paulo, em 1988, e desenvolve a Teoria da Variação em Terminologia,
cujos princípios são:
 dissociação entre estrutura terminológica e homogeneidade ou univocidade ou
monorreferencialidade, associando-se à estrutura terminológica a noção de
heterogeneidade ordenada;
 abandono do isomorfismo categórico entre termo-conceito-significado;
95

 aceitação de que, sendo a terminologia um fato de língua, ela acomoda elementos


variáveis;
 aceitação de que a terminologia varia e de que essa variação pode indicar uma
mudança em curso;
 análise da terminologia em co-textos linguísticos e em contextos discursivos da língua
escrita e da língua oral (FAULSTICH, 2003, p. 12).
Assim, a Socioterminologia é concebida como uma ―disciplina que se ocupa da
identificação das variantes linguísticas dos termos em diferentes tipos de situação de uso da
língua‖ (FAULSTICH, 1995, não paginado). E, desta forma, a terminologia de uma área
especializada deve ser observada e descrita (não mais prescrita) a partir de situações reais de
comunicação, o que pressupõe a consideração imediata da variação linguística e de registro.

5. METODOLOGIA

O primeiro momento do nosso trabalho consistiu no reconhecimento do ambiente da


pesquisa, ocasião em que nos preocupamos em observar os espaços de produção da cerâmica,
bem como em conhecer as pessoas envolvidas no processo. Assim, visitamos, primeiramente,
a Cooperativa dos Artesãos de Icoaraci (COARTI), lugar criado com o objetivo de organizar a
produção ceramista e de criar boas possibilidades de comércio das peças produzidas pelos
artesãos, onde obtivemos algumas informações sobre a estrutura e o funcionamento das
olarias icoaracienses.
Ainda no contexto dessa primeira fase, fomos ao Paracuri, bairro icoaraciense onde
estão localizadas dezenas de olarias, e fizemos o primeiro contato com o universo da
cerâmica. Nesta ocasião, apresentamos a nossa pesquisa e conseguimos permissão para
acompanhar, nas olarias e demais espaços, todas as etapas de produção dessa arte, as quais
foram fotografadas e filmadas com uma máquina digital SONY DSC- W320B.
Com o universo da cerâmica estruturado e registrado em vídeos, fotos e entrevista,
passamos à organização e estudo desse material, com vistas à elaboração de um questionário
terminológico. Segundo Costa (2009, p. 61), esse instrumento é utilizado para coletar termos
e seus respectivos conceitos e pode ser elaborado tanto a partir do contato com profissionais
da área, quanto a partir da literatura especializada escrita.
Elaboramos um questionário com 82 questões. Com ele em mãos, voltamos a campo,
segundo momento do trabalho, e o aplicamos com quinze profissionais (Barreirenses,
boleiros, oleiros, etc.) envolvidos com o fazer ceramista, sendo o critério de seleção dos
96

mesmos o tempo de atuação na produção de cerâmica em Icoaraci. Vale dizer, então, que
desse total apenas dois não nasceram em Icoaraci. Assim sendo, o corpus da nossa pesquisa
está constituído de quinze textos orais provenientes de entrevistas realizadas in loco e feitas
com um gravador digital OLUMPUS VN-5200PC. O Tempo dessas entrevistas varia, dado o
desempenho de cada informante, e foram gravadas em diversos espaços (a casa do
informante, o Liceu, a COARTI).
Após as duas etapas acima descritas, passamos ao tratamento dos dados. Começamos,
com a transcrição grafemática das entrevistas realizadas, utilizando o programa Transana
(versão 2.12). Em seguida geramos listas de palavras no programa Wordsmith (versão 05)
para que pudéssemos analisar e extrair os termos. Finalmente, depois que validarmos os
termos, passaremos ao manuseio do programa Lexique Pró (versão 2.8.6), que nos ajudará
com a organização do glossário.

6. UMA PEQUENA AMOSTRA DOS VERBETES DO GLOSSÁRIO DA CERÂMICA


DE ICOARACI

Barreiro s.m. [Extração da argila]: lugar aonde se vai para extrair argila.
―L2: ... eles vão sempre quando a maré tá vamos dizê eles vão pro barrêro eles tem que
entrar no onde tá o corte da argila eles tem que vê a maré se a maré for de lanço...”
(IBF2MES).

Canoa s.f. [extração da argila]: embarcação de madeira utilizada no transporte da argila.


Var. batelão
“L2: antes eles saíam lá do Porto do Uxi era o local de onde saia a canoa hoje em dia as
invasões já quase destruíram o Porto do Uxi agora eles tão saindo daí da quinta rua ( )
direto lá:: numa ponte que tem de lá que eles tão saindo agora...”(IBF3MEST).

Forno s.m. [confecção da peça]: Instrumento utilizado para queimar a peça na produção de
cerâmica.
―L2: ...tem peça que tu vai esperá dias pra ela ficá um pôco mais seca pra PINtá que a gente
chama de pintura natural né tu pinta aí depois tu desenha aí quando ela sai do forno ela já
sai pronta não precisa mais pintá...‖ (IBF3MEST).

Oleiro s.m. [confecção da peça]: Pessoa que modela a peça com as mãos.
―L1: onde o oleiro se senta para trabalhar no torno? Tem um nome específico? L2: não...
eles chamam assento do oleiro mesmo...‖ (IBF3MEST).

Palheta s.f. [confecção da peça]: ferramenta utilizada pelo oleiro para fazer o acabamento
da peça.
97

“L2: porque é assim tu modela com as mãos a palheta é só pra ela dá aquela aquela::
quando tu passa assim ela via ficando toda lisinha é só pra isso só pra dá esse acabamento
mesmo...” (IBF3MEST)

Nota: Existem vários modelos de palheta e eles se adequam à forma da peça.

Torno de desenho s.t.m. [confecção da peça]: instrumento utilizado pelo desenhista para
movimentar a peça durante a decoração.
Var. torno de gravação
“L1: ... onde o desenhista põe a peça para que ele possa desenhar? L2: ele usa o torno de
desenho...” (IBF3MES).

CONCLUSÃO

Conforme explicamos, estamos elaborando, com base num corpus oral, um


instrumento terminográfico em que será registrada a terminologia da cerâmica de Icoaraci,
levando em consideração a variação dos termos que a compõem. Assim, desejamos que, ao
término desta pesquisa, essa obra tenha contribuído não só para a ampliação dos nossos
conhecimentos linguísticos, mas também para a preservação da cultura dos artesãos de
Icoaraci, que trazem o dom da arte. Neste sentido, esperamos que o Glossário da Cerâmica
Artesanal do Distrito de Icoaraci (Belém/PA) seja uma obra de referência para aqueles que
lidam com essa terminologia no dia-a-dia e para aqueles que entram em contado com ela
esporadicamente. Ainda neste trabalho, observamos que seria interessante observar a
terminologia da cerâmica artesanal no espaço paraense (Marajó, Oriximiná, Santarém, etc.),
bem como a elaboração de um glossário bilíngue, tendo em vista a interface artesanato/
turismo.

REFERÊNCIAS:
BARBOSA, Maria Aparecida. Lexicologia, lexicografia, terminologia, terminografia,
identidade científica, objeto, métodos, campos de atuação. Disponível
<http://www.riterm.net/actes/2simposio/barbosa2.htm>Acesso em: 20 jan. de 2011.
BIDERMAN, M. T. A face quantitativa da linguagem: um dicionário de frequências do
português. Alfa, São Paulo, v.42, p.161-181, 1998. Número especial.
BOULANGER, Jean-Claude. Alguns componentes linguísticos no ensino da terminologia.
Ciência da Informação, Brasília, v. 24, n. 3, 1995.
CABRÉ, Maria Teresa. La terminologia hoy: concepciones, tendencias y aplica
aplicaciones. Ciência da Informação, Brasília, v. 24, n. 3, 1995.
COSTA, Celiane Sousa. Glossário terminológico da cultura do cacau em
Medicilândia/PA. 2009. Dissertação (Mestrado) – Instituto de Letras e Comunicação,
Universidade Federal do Pará, 2009.
DUBOIS, Jean et. al. Dicionário de Linguística. São Paulo: Cultrix, 2006.
98

FAULSTICH, Enilde. Metodologia para o trabalho terminográfico. Anais do II Simpósio


Latino-Americano de Terminologia e I Encontro Brasileiro de Terminologia Técnico-
Científica, Brasília: IBICT; Paris: União Latina, 1992.
____________. Socioterminologia: mais que um método de pesquisa, uma disciplina.
Ciência da Informação, Brasília, v. 24, n. 3, 1995.
___________. A formação de termos: do constructo e das regras às evidências empíricas. In:
FAULSTICH, Enilde e ABREU, Sabrina Pereira de (Orgs.). Linguística aplicada à
Terminologia e à Lexicologia. Porto Alegre: Instituto de Letras, NEC, 2003.
GAUDIN, François. Pour une socioterminologie: des problèmes sémantiques aux
pratiques institutionnelles. Rouen: Publications de l'Université de Rouen, 1993.
ISQUERDO, Aparecida Negri; OLIVEIRA, Ana Maria Pinto Pires de. As ciências do
Léxico: Lexicologia, Lexicografia, Terminologia. Campo Grande, MS: UFMS, 2001.
KRIEGER, Maria da G. e FINATTO, Maria J. B. Introdução à terminologia: teoria e
prática. São Paulo: Contexto, 2004.
KRIEGER, Maria da Graça et. al. O Século XX, Cenário dos Dicionários Fundadores da
Lexicografia Brasileira: Relações com a Identidade do Português do Brasil. Alfa, 50 (2),
2006.
PONTES, Antônio Luciano. Terminologia Científica: como é e como se faz. Revista de
Letras, v. 19, n. 1/2, jan/dez 1997.
____________. Dicionário para uso escolar: o que é e como se lê. Fortaleza: EDUECE,
2009.

HAPLOLOGIA NO FALAR BELENENSE: UMA ANÁLISE VARIACIONISTA

Flávia Helena da Silva PAZ (UFPA)


Orientadora: Marilucia Barros de OLIVEIRA (UFPA)

RESUMO: Este trabalho trata do fenômeno da Haplologia entre frases na fala espontânea de
cidadãos da capital do Estado do Pará, Belém. Avaliam-se os contextos de frases compostas
apenas por /t/ - /d/, /d/ - /d/, /t/ - /t/ e /d/ - /t/, tais como: la(du) di fora, per(tu) du, a gen(ti)
tinha medu e tu(du) tinha, respectivamente. São analisados fatores linguísticos e
extralinguísticos com o objetivo de mostrar os contextos favoráveis e desfavoráveis à
aplicação do fenômeno em estudo. Ao estudarmos os fatores linguísticos, observaremos além
dos tipos de frases já mencionados, os tipos de vogais que acompanham as consoantes. Essas
vogais serão definidas como vogais idênticas, parecidas e diferentes, levando-se em
consideração o movimento vertical e horizontal da língua. No que se refere aos fatores
extralinguísticos, analisaremos: idade, sexo e escolaridade, seguindo a estratificação proposta
no projeto Atlas Linguístico do Pará (ALIPA). A coleta dos dados seguiu a orientação da
Sociolinguística Variacionista. Os dados já foram coletados e estão em fase de tratamento. Os
resultados obtidos podem mostrar qual o nível de relevância dos diferentes fatores
mencionados sobre o fenômeno em estudo.

PALAVRAS-CHAVE: Haplologia, Sociolinguística, Variação.

ABSTRACT: This paper explores the phenomenon of Haplologia between phrases in


spontaneous speech of citizens of the state capital of Pará, Belém to assess the contexts of
99

sentences composed only of / t / - / d /, / d / - / d / , / t / - / t / and / d / - / t /, such as: la(du) di


fora, per(tu) du, a gen(ti) tinha medu e tu(du) tinha, respectively. Are analyzed extralinguistic
and linguistic factors in order to show the favorable and unfavorable contexts the application
of the phenomenon under study. Studying the linguistic factors, we look beyond the types of
sentences already mentioned, the types of vowels that accompany consonants. These members
shall be defined as vowels identical, similar and different, taking into account the vertical and
horizontal movement of the tongue. With regard to extralinguistic factors, analyzed: age, sex
and education, following the stratification proposed project Linguistic Atlas of Pará (ALIP).
Data collection followed the line of variational sociolinguistics. The data have been collected
and are being processed. The results can show what level of importance of different factors
mentioned on the phenomenon under study.

KEYWORDS: Haplologia, Sociolinguistics, Variation.

1-INTRODUÇÃO:
Considerar a dinâmica que caracteriza o uso da língua nas diversas situações de
interação é considerar a língua como elemento linguístico-social vivo que pode e deve ser
usado de acordo com as necessidades linguísticas do falante que a domina, já que a língua é
mutável.
A língua é variável, modifica-se e amplia-se constantemente. Isto faz com que haja
transformações na fonologia, na morfologia e na sintaxe, ou uma modificação maior, a
extinção da própria língua. Para a perspectiva sociolinguística variacionista (Labov) 26, os
responsáveis pelas transformações que ocorrem na língua em todos os espaços: físico,
psicológico ou social são os sujeitos falantes de uma comunidade linguística.
Ao estudarmos a língua a partir da perspectiva sociolinguística variacionista, estamos
considerando além do aspecto lingüístico, os fatores sociais e culturais que se fazem presentes
na cultura linguística de uma língua, e podem nos auxiliar no esclarecimento das variações
reentrantes ou não, que não podem ser explicadas somente por fatores linguísticos isolados,
mas podem ser explicados por fatores extralinguísticos.
Nossa pesquisa de mestrado, ―Haplologia no falar belenense: uma análise
variacionista‖ propõe discutir e mostrar como ocorre a haplologia na cidade de Belém-Pará, a
partir da fala de habitantes desta cidade, pois se acredita que a realização deste estudo possa
vir a contribuir para as pesquisas realizadas sobre o fenômeno da haplologia no português
paraense, assim como para a descrição e documentação do português brasileiro.
Partiremos da pesquisa sociolingüística variacionista de Labov (1972), trabalhando com
narrativas contadas por informantes de Belém. Verificaremos o fenômeno estudado,

26
LABOV, William. The social motivation of a sound change. In: Sociolinguistic patterns. Pensilvânia:
University Press, 1972
100

observando como se realiza o condicionamento de variáveis linguísticas e extralingüísticas.


Por fim, a discussão dos resultados da análise quantitativa desta pesquisa se fará a partir dos
dados fornecidos pelo programa VARBRUL27.

2 REVISÃO DA LITERATURA

A haplologia é um fenômeno fonológico variável que pode ocorrer dentro de palavras, e


entre frases, em que tanto a palavra como a sílaba de palavras diferentes apresentam estruturas
segmentais contíguas semelhantes ou idênticas. Para Crystal (2000)28, a haplologia ―é um
processo de sândi29 que corresponde à omissão de alguns sons numa sequência de articulações
semelhantes‖. Coutinho (1976)30 define a haplologia como ―uma espécie de síncope especial
que consiste na queda de uma sílaba medial por haver outra idêntica ou quase idêntica na
mesma palavra, como em idololatria>idolatria‖. Pavezi31 (2006) compreende a haplologia
como um ―processo fonológico no qual é possível perceber a queda total de uma sílaba no
encontro de duas sílabas semelhantes átonas em fronteiras de palavras, como em ‗faculdade
de letras‘‖.
Os trabalhos mais relevantes sobre a haplologia focalizando tanto palavras quanto a
sentença no português brasileiro foram escritos primeiramente por Alkmin e Gomes (1982)
intitulado ―Dois fenômenos de supressão de segmentos em limite de palavra.‖. Vinte anos
mais tarde Tenani (2002), apresentou o estudo sobre “Domínios prosódicos no português do
Brasil: implicações para a prosódia e para a aplicação de processos fonológicos.”. Em
seguida Battisti (2005), realizou um estudo sobre a “Haplologia no português do sul do
Brasil: Porto Alegre.‖. No ano de 2006 tivemos duas produções científicas em relação ao
fenômeno da haplologia, Pavezi (2006) com “A haplologia na variedade paulista. São José
do Rio Preto‖ e Leal (2006) com a ―Elisão e haplologia: aspectos fonológicos do falar da
cidade paulista de Capivari.”. Na sequência cronológicas referentes às pesquisas realizadas
sobre o fenômeno da haplologia, em 2008 é realizado o primeiro estudo no Estado do Pará,
especificamente com os informantes de Itaituba, intitulado “Haplologia: uma análise
sociolinguística” PAZ (2008). As últimas pesquisas realizadas sobre o fenômeno foram a de

27
Varbrul/Goldvarb 3.0b3 de Robinson, Lawrence e Tagliamonte (2001) é um pacote de programas utilizado
para análise estatísticas.
28
CRYSTAL, apud BATTISTI, 2005. p. 73.
29
Sândi é um processo que ocorre quando é afetado foneticamente o início ou o final de uma palavra, ou um
morfema.
30
COUTINHO, 1976. p.148.
31
PAVEZI, 2006. p.11.
101

Mendes (2009): “A haplologia no português de belo horizonte.” e a de Prado (2010):


―Haplologia na formação de palavras envolvendo o sufixo –ção” .

3 METODOLOGIA

Seguindo a perspectiva Sociolinguística Variacionista de Labov (1972) nosso estudo


investiga a ocorrência da haplologia especificamente em contextos formados por oclusivas
alveolares /t/ e /d/ nas silabas candidatas à ocorrência do fenômeno. Por meio deste estudo
pretendemos discutir e mostrar como ocorre a haplologia na cidade de Belém – Pa, a partir da
fala de habitantes desta cidade. Ao estudarmos as variantes linguísticas que norteiam o
fenômeno em nosso região, além de contribuírmos para a descrição do português paraense,
estaremos cooperando com a construção de uma esfera de descrição maior do português
brasileiro, que é a construção do Atlas Línguístico Brasileiro (ALIB) 32.
Para alcançarmos nossos objetivos estamos fazendo um levantamento bibliográfico de
todos os trabalhos realizados sobre o fenômeno da haplologia no Brasil, para compormos a
finalização da nossa revisão bibliográfica. Mas, nosso principal instrumento de pesquisa são
as narrativas do ALIPA33 que estamos utilizando para coletarmos nossos dados e montarmos
nosso corpus.
O fenômeno está sendo estudado a partir de 36 (trinta e seis) narrativas que pertencem
ao Atlas Geo-Sociolinguístico do Pará (ALIPA), cujos informantes são do município de
Belém, com estratificações que se delimitam a sexo (18 do sexo masculino/18 do sexo
feminino), escolaridade (não escolarizados, ensino fundamental, e ensino médio) e faixa etária
(15-25; 26-45; a partir de 46).

3.1 COMUNIDADE PESQUISADA

Belém é a capital paraense que representa um dos 143 municípios que constitui o Estado
do Pará. Pertence à mesorregião Metropolitana de Belém e à microrregião de Belém.
Localizando-se no Norte do Brasil. Com uma área de aproximadamente 1 064,918 km²,

32
O Projeto Atlas Linguístico do Brasil ainda está em fase de construção e tem como objetivo englobar de
maneira ampla a diversidade e a realidade linguística de nosso país.
33
O Projeto Atlas Geo-Sociolingüístico do Pará foi instituído em 1996. Tem como coordenador o professor
Abdelhak Razky. O ALIPA, objetiva por meio da coleta de dados de fala e estudos de variações linguísticas, de
algumas cidades do Pará, mapear e identificar o falar dos cidadãos paraenses.
102

Belém fica a 2 146 quilômetros da capital do Brasil, Brasília.


Figura 1: Mapa de Belém

Fonte: maps.google.com.br

3.2 TRATAMENTO DOS DADOS

Labov (1972), afirma que para se coletar a língua vernácula de um informante, este
precisa estar totalmente relaxado e agir naturalmente para que a sua língua materna possa
fluir. As narrativas de Belém, que fazem parte do ALIPA, apresentam conversas livres e
relato de experiências espontâneas vivenciados pelo informante, que fazem com que este se
aproxime bastante da sua língua vernácula. As narrativas encontram-se em forma de áudio
apresentando em média 40 minutos de duração, cada uma. No momento estão sendo
transcritas para fazermos a seleção dos contextos que podem favorecer a aplicação do
fenômeno da haplologia. Para a transcrição estamos utilizando o programa PRAAT 34
Após a fase de transcrição dos dados selecionaremos os contextos pertinentes em que há
a frequência da haplologia, para fazermos a análise e descrição dos mesmos. Em seguida,
procederemos à codificação dos dados no VARBRUL e, posteriormente, à análise das
frequências fornecidas pelo programa, a fim de prepararmos os dados para submissão ao
programa de regra variável. Verificaremos o fenômeno estudado, observando como se realiza
o condicionamento de variáveis linguísticas e extralinguísticas. Por fim, a discussão dos
resultados da análise quantitativa desta pesquisa se fará a partir dos dados fornecidos pelo
programa VARBRUL.

34
Programa computacional para análise acústica Praat (BOERSMA & WEENINK, 2006).
103

3.3 Princípio do Contorno Obrigatório PCO)

O Princípio do Contorno Obrigatório (PCO) proposto por Leben (1973) 35é um princípio
linguístico que veta a sequência de estruturas segmentais contíguas idênticas. Este
condicionamento pode fazer com que as estruturas segmentais contíguas, possam vir a se
fundir ou a apagar-se totalmente. Tal condicionamento nos permite evidenciar que o OCP é
relevante na aplicação do fenômenos da haplologia, já que para esta ocorrer é preciso que haja
o apagamento de uma das estruturas segmentais idênticas ou quase idênticas.

4 COMO PROCEDEREMOS A ANÁLISE DOS DADOS

Ao analisarmos os dados, observaremos os fatores linguísticos e extralinguísticos.


Vejamos como procederemos à análise de cada um.
4.1 Fatores linguísticos:
Os fatores linguísticos que pretendemos analisar envolvem vários grupos de fatores,
entre eles existem os dois maiores, que são os grupos das consoantes correspondentes as
oclusivas alveolares surda e sonora /t/ e /d/ respectivamente, e o grupo das vogais, que já
subdividimos como pares de vogais idênticas, parecidas e diferentes. Tanto os pares de
consoantes quanto os pares de vogais serão analisados isoladamente ao seu grupo de fator e
também relacionados ao outro grupo. Por exemplo, o grupo de fator consoante ora vai ser
analisado somente com consoantes, ora vai ser analisado com vogais. Vejamos a partir de
agora cada um desses grupos.

4.1.1 Qualidade das Consoantes


Investigaremos a ocorrência da haplologia especificamente em contextos formados por
oclusivas alveolares /t/ e /d/, nas sílabas candidatas à ocorrência do fenômeno. Os contextos
analisados serão: /t/-/d/, /d/-/t/, /d/-/d/ e /t/-/t/ que podem ser exemplificados respectivamente
por per(tu) du, tu(du) tinha, la(du) di fora e gen(ti) tinha medu. Ao final da análise, os
resultados nos mostrarão qual desses contextos irá favorecer mais a ocorrência do fenômeno.
De posse desses resultados iremos subdividir o grupo de fator consoantes em outro grupo, o
das consoantes idênticas /d/-/d/ e /t/-/t/ e o das consoantes diferentes /t/-/d/ e /d/-/t/, para
podermos verificar em qual deles há maior aplicação do fenômeno.

35
Leben (1973) apud Bisol ( p.66, 1999).
104

4.1.1.1 A desconstrução de grupo consonantal


Além dos contextos formados somente por sílabas compostas por consoante e vogal, a
exemplo pertu da, também analisaremos na sílaba candidata à queda, os contextos formados
por grupo consonantal em que há a presença da oclusiva alveolar surda /t/ seguida pela líquida
/r/ acompanhada de uma vogal, como em dentru di. Investigaremos se a desconstrução de um
grupo consonantal como (tru), na frase den(tru) di, possa ser considerado fator relevante para
a aplicação do fenômeno. Pois acreditamos que quando ocorre a aplicação do fenômeno em
contextos como este, há primeiramente o apagamento da líquida que dá origem a forma dentu
di, para posteriormente haver a aplicação do fenômeno e passar a forma den(tu) di = dendi

4.1.2 A natureza das vogais


As vogais serão analisadas de duas formas, observando somente a natureza das vogais,
altas, médias e baixas, nas sílabas candidatas à ocorrência do fenômeno. Assim como, no
grupo de fatores qualidade das vogais.
Definimos como um grupo de fator importante, os pares de vogais pertencentes às
sílabas contíguas que acompanham as oclusivas alveolares envolvidas no processo. A
classificação terá como base a informações apresentadas por SILVA (1999) no quadro que
mostra a altura das vogais e o avanço e recuo da língua (aspecto de anterioridade e
posterioridade). O que nos possibilitou classificarmos três pares de vogais: idênticas,
parecidas e diferentes.
VOGAIS IDÊNTICAS: este par de vogal apresentará a mesma altura e o mesmo
aspecto ou anterioridade ou posteridade. Ou seja, as duas vogais precisam ser anteriores ou as
duas precisam ser posteriores e ainda ter a mesma altura. Como em gos(tu) du.
VOGAIS PARECIDAS: o par terá como característica fundamental apenas um traço
em comum, anterioridade ou posterioridade; ou altura da vogal. A exemplo temos mui(tu) di.
VOGAIS DIFERENTES: a falta de simetria entre as vogais é a principal característica
deste par, pois as vogais envolvidas não apresentam nenhum dos traços em comum, nem nos
aspectos anterioridade e posterioridade, nem na altura da língua. Como em gos(ta) di,

4.1.3 Refinamento dos pares de vogais e consoantes


Comprovamos em um estudo anterior, que para haver a ocorrência do fenômeno da
haplologia se torna indispensável a presença de uma vogal alta em uma das sílabas envolvidas
no processo. Portanto, após os resultados com os pares de consoantes e de vogais que mais
105

favorecem a aplicação do fenômeno, faremos um refinamento dos resultados, observando a


posição das vogais altas que ocorrem na aplicação do fenômeno, somente em contextos em
que há a presença de vogais altas nas duas sílabas do processo. Hipoteticamente teremos os
possíveis contextos:

4.1.3.1 Pares de Consoantes com Pares de Vogais /i/-/i/.


Observaremos nestes contextos, todos os pares de consoantes que apresentam somente a
vogal alta anterior /i/ nas sílabas contíguas, como em / t/-/d/← /i/-/i/ O den(ti) di leiti; /d/-/t/
← /i/-/i/ Ele pe(di) tinta; /d/-/d/← /i/-/i/ Eli pe(di) dinheiru; e /t/-/t/← /i/-/i/ a gen(ti) tinha
medu.

4.1.3.2 Pares de Consoantes com Pares de Vogais /u/-/u/.


Nestes contextos analisaremos todos os pares de consoantes que apresentam somente a
vogal alta posterior /u/ na sílaba elidida e na sílaba da palavra seguinte. Por exemplo: /t/-
/d/←/u/-/u/ den(tu) du copu; /d/-/t/← /u/-/u/ tá len(du) tudu; /d/-/d/←/u/-/u/ tá len(du) du
ladu; e /t/-/t/← /u/-/u/ Eu par(tu) tudu.

4.1.3.4 Pares de Consoantes somente com Pares de Vogais /i/-/u/.


Neste grupo analisaremos somente os contextos que apresentarem na sílaba elidida
vogais altas anteriores e na sílaba da palavra seguinte, vogais altas posteriores, como em / t/-
/d/← /i/-/u/ O den(ti) du João; /d/-/t/ ← /i/-/u/ Ele pe(di) tudu; /d/-/d/← /i/-/u/ Eli po(di)
duvidá; e /t/-/t/←/i/-/u/ Ó a pon(ti) Tunica.

4.1.3.5 Pares de Consoantes somente com Pares de Vogais /u/-/i/.


Neste grupo observaremos contextos como / t/-/d/←/u/-/i/ den(tu) di casa; /d/-/t/← /u/-
/i/ comen(du) tilápia; /d/-/d/←/u/-/i/ tá len(du) di ladu; e /t/-/t/← /u/-/i/ tem tan(tu) timi, que
trazem uma vogal alta posterior na sílaba elidida e uma vogal alta anterior na sílaba da palavra
seguinte.
A análise dos dados nos mostrará em quais desses contextos haverá mais ocorrência do
fenômeno.

4.1.4 A palavra da sílaba elidida quanto ao número de sílabas


Examinaremos o número de sílabas da palavra em que ocorre a haplologia, se essa é:
monossílaba, dissílaba, trissílaba ou polissílaba. E ainda, a distância da sílaba elidida em
106

relação à sílaba tônica. Os resultados nos mostrarão em quais desses grupos de palavras há
mais aplicação do fenômeno em estudo e o posicionamento da sílaba átona (que cai) em
relação à sílaba tônica da palavra que apresenta a sílaba elidida.

4.1.5 Contexto Morfossintático


Ao observarmos os contextos de frase que envolvem a aplicação da regra da haplologia,
também pretendemos investigar nos sintagmas como se dá a aplicação do fenômeno
morfossintaticamente, registrando as estruturas morfológicas e sintáticas das expressões em
que mais ocorre o fenômeno da haplologia neste estudo.

5 Fatores Extralinguísticos
Analisaremos os grupos de fatores escolaridade, sexo e faixa etária.

5.1 Escolaridade
O grau de escolaridade de um sujeito é o que faz com que ele se utilize da forma
linguística mais adequada ao seu nível de escolaridade e tenha mais cuidado ao usar a língua.
Este estudo analisa três níveis diferentes de escolaridade, a saber: Sem escolaridade (1);
Ensino Fundamental (2); e Ensino Médio (3). Pretendemos por meio da análise dos dados,
mostrar qual destes é mais favorável a aplicação do fenômeno e se há uma disparidade nos
resultados.

5.2 Sexo
O sexo é considerado por muitas pesquisas como fator relevante para investigações
científicas. Em nosso estudo analisaremos qual a protuberância de cada sexo, masculino e
feminino, na aplicação do fenômeno da haplologia. Os resultados nos mostrarão o sexo que
mais aplica o fenômeno.

5.3 Faixa Etária

Analisaremos três faixas etárias e mostraremos os percentuais de ocorrência de cada


uma, assim como a que mais favorece a aplicação do fenômeno.
O quadro a seguir compacta todos os fatores extralinguísticos e suas codificações.
Quadro 1: Fatores extralinguísticos
107

FAIXA ETÁRIA SEXO ESCOLARIDADE CODIFICAÇÕES


1º Faixa etária Feminino (F) Sem escolaridade (1) FA1 FA1 MA1 MA1
15 a 25 anos (A) Masculino (M) Ensino Fundamental (2) FA2 FA2 MA2 MA2
Ensino Médio (3) FA3 FA3 MA3 MA3
2º Faixa etária Feminino (F) Sem escolaridade (1) FB1 FB1 MB1 MB1
26 a 45 anos (B) Masculino (M) Ensino Fundamental (2) FB2 FB2 MB2 MB2
Ensino Médio (3) FB3 FB3 MB3 MB3
3º Faixa etária Feminino (F) Sem escolaridade (1) FC1 FC1 MC1 MC1
Acima de 46 (C) Masculino (M) Ensino Fundamental (2) FC2 FC2 MC2 MC2
Ensino Médio (3) FC3 FC3 MC3 MC3

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa pesquisa, ainda em fase inicial, faz no momento, o levantamento bibliográfico


para a construção do primeiro capítulo que será intitulado revisão da literatura, e as
transcrições das narrativas para podermos proceder à análise dos dados conforme
descrevemos neste trabalho. Portanto, o resultado final deste estudo será apresentado em um
próximo trabalho.

REFERÊNCIAS
BATTISTI, Elisa. Haplologia no português do sul do Brasil. Letras de Hoje, Porto Alegre,
v. 40, n. 3, p. 73-88, 2005.
BISOL, Leda. Introdução a Estudos de Fonologia do Português Brasileiro. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 1999.
COUTINHO, Ismael de Lima. Gramática Histórica.7. ed. Rio de janeiro: Ao livro Técnico,
1976.
LABOV, William. The social motivation of a sound change. In: Sociolinguistic patterns.
Pensilvânia: University Press, 1972.
LEAL, Eneida Goes. Elisão silábica e haplologia: aspectos fonológicos do falar da cidade
paulista de Capivari, 2006. http://www.ibge.gov.br>.Acesso em: 22 out 2011.
MENDES, Regina Maria Gonçalves. A haplologia na oralidade do português de Belo
Horizonte. Belo Horizonte, 2009.
PAVEZI, Vanessa Cristina. A haplologia na variedade paulista. São Jose do Rio Preto:
[s.n.], 2006.
PRADO, Natália Cristine. Haplologia na formação de palavras envolvendo o sufixo –cão
in Anais do IX Encontro do CELSUL Palhoça, SC, out. 2010.
RAZKY, Albdelhak (org.). Estudos Geo-sociolinguisticos no Estado do Pará. 1ª Ed.
Belém: Grafia, 2003.
SILVA, Thaïs Cristófaro da. Fonética e Fonologia do Português: Roteiro de Estudos e
Guia de Exercícios. 9ª ed- São Paulo: Contexto, 2007.
108

ANÁLISE DE LIVROS DIDÁTICOS BILINGUES PARA O ENSINO DA LÍNGUA


MẼBÊNGÔKRE

Francinete de Jesus Pantoja QUARESMA (UFPA)


Orientadora: Marília de Nazaré de Oliveira FERREIRA (UFPA)

RESUMO: Este trabalho surgiu a partir da problemática da perda das línguas indígenas no
Brasil. Temos como objetivo analisar a modalidade escrita nos livros didáticos bilíngues
utilizados no processo de alfabetização na comunidade indígena mẽbêngôkre porque
acreditamos que materiais escritos em língua indígena podem contribuir para sua manutenção
e valorização e que a alfabetização em língua materna constitui-se em uma metodologia de
revitalização eficiente, capaz de combater o quadro da extinção linguística indígena. Para
realização deste estudo analisamos manuais de ensino bilíngues escritos em línguas
mẽbêngôkre e portuguesa. A metodologia empregada para este trabalho foi a pesquisa
bibliográfica e as análises qualitativa e quantitativa dos dados coletados. Com relação a
análise qualitativa, essa foi realizada a partir de um roteiro baseado nos parâmetros de análise
utilizados por Marcuschi (1996). Buscamos fundamentação teórica para este estudo na
Sociolinguística com Labov (2010); na Linguística Textual com Marcuschi (1996; 2008;
2010) e com Geraldi (1995); no Ensino-aprendizagem de línguas com Spinassé (2006),
Scarpa (2001), Baltar (2004) e Perrenoud (1997; 1999); na literatura das Línguas Indígenas
com Rodrigues (2000; 2003), Moore (2008), Pimentel da Silva (2003) e Maria Amélia Reis
Silva (2001); e na Educação Escolar com Paulo Freire (1996), Mortatti (2000; 2010), Lajolo
(1996), Rojo (1998; 2005; 2009) e Magda Soares (2001; 2011). Esperamos com esta pesquisa
colaborar com informações teóricas que possibilitem a elaboração de outros livros didáticos
indígenas bilíngues mais adequados à comunidade indígena mẽbêngôkre.

PALAVRAS-CHAVE: escrita indígena, língua indígena, livro didático.

RÉSUMÉ: Ce travail est né à partir de la problématique de la perte des langues indigènes au


Brésil. Nous avons comme objectif analyser la modalité écrite dans les manuels scolaires
bilingues utilisés dans le processus d'alphabétisation dans la communauté indigène
mẽbêngôkre parce que nous croyons que documents écrits dans les langues indigènes peuvent
contribuer à leur entretien et appréciation et que l'alphabétisation dans la langue maternelle est
une méthode de revitalisation efficace, capable de combattre le cadre de l'extinction
linguistique indigène. Pour effectuer cet étude nous avons analysé des manuels bilingues
écrits en langues mẽbêngôkre et portugaise. La méthodologie utilisée pour ce travail a été la
recherche documentaire et les analyses qualitatives et quantitatives des donnés recueillies. En
ce qui concerne l'analyse qualitative, cela a été fait à partir d'un script basé sur les paramètres
d'analyse utilisés par Marcuschi (1996). Nous cherchons de base théorique pour cet étude
dans la Sociolinguistique avec Labov (2010); dans la Linguistique Textuelle avec Marcuschi
(1996, 2008, 2010) et Geraldi (1995); dans l'Enseignement et l'apprentissage des langues avec
Spinassé (2006), Scarpa (2001), Baltar (2004) et Perrenoud (1997, 1999); dans la littérature
sur les Langues Indigènes avec Rodrigues (2000, 2003), Moore (2008), Pimentel da Silva
(2003) et Reis Silva (2001); et dans l'Éducation Scolaire avec Paulo Freire (1996), Mortatti
(2000, 2010), Lajolo (1996), Rojo (1998, 2005, 2009) et Magda Soares (2001, 2011). Nous
attendons avec ce travail de recherche collaborer avec des informations théoriques qui
109

permettent développer d'autres manuels scolaires indigènes bilingues plus adaptées à la


communauté indigène mẽbêngôkre.

MOTS-CLÉS: l'écriture indigène, langue indigène, manuel scolaire.

INTRODUÇÃO
A perda das línguas indígenas é uma problemática que preocupa não somente os povos
indígenas, mas também pesquisadores que se interessam por essas línguas. Por estarmos na região
amazônica, onde, segundo Morre, Galúcio e Gabas Jr. (2008), se concentra o maior número de
população indígena no país – 60% desses povos, o equivalente a mais de dois terços das línguas
indígenas faladas no país -, a preservação dessas línguas torna-se também um compromisso nosso.
―Somente no Estado do Pará são faladas cerca de 25 línguas nativas, um número semelhante ao de
línguas faladas na Europa ocidental‖ (MORRE, GALÚCIO, GABAS JR., 2008)36, e muitos desses
idiomas correm o risco de desaparecer completamente se ações imediatas de preservação não forem
realizadas.
Uma das ações que podem ser realizadas em prol da preservação das línguas indígenas é investir
na educação escolar indígena. A escola pode incentivar e favorecer a manutenção ou revitalização
dessas línguas quando nela se utiliza a língua da comunidade como a língua de instrução oral e escrita
do conteúdo curricular.
Sendo a educação escolar uma iniciativa importante para preservar as línguas indígenas,
decidimos analisar elementos que contribuem para o ensino escolar indígena, dentre esses possíveis
elementos optamos pelos Livros Didáticos (doravante LDs), pois partimos das hipóteses que: a)
materiais escritos em língua indígena podem contribuir para sua manutenção e valorização; b) a
alfabetização em língua materna constitui-se como uma metodologia de revitalização eficiente. Assim,
nossa pesquisa intitula-se ―Análise de livros didáticos bilingues para o ensino da língua
mẽbêngôkre37‖.
Compartilhamos os pensamentos que apresentamos em nossas hipóteses com Moore, Galúcio e
Gabas Jr. (2008), para quem a alfabetização em língua materna constitui-se uma das principais
metodologias de revitalização de línguas ameaçadas de extinção, essa é uma metodologia usada
mundialmente em casos onde há um número razoável de falantes da língua e vontade de transmitir o
idioma às crianças.
Nossa pesquisa tem como objetivo principal analisar a modalidade escrita nos LDs bilíngues
utilizados no processo de alfabetização na comunidade indígena mẽbêngôkre. Tomamos a escrita
como objeto de estudo porque, como sabemos, as línguas indígenas não possuem longa tradição nessa

36
A obra dos autores a qual nos referimos foi encontrada na Internet, ela não possui numeração nas páginas,
portanto, qualquer referência a esse trabalho será feia por meio do ano.
37
Os mẽbêngôkres são mais conhecidos como kayapós, constituem um grupo de 7.196 pessoas, estão localizados
no norte do Mato Grosso e no sul do Pará e falam uma língua pertencente à família linguística Jê, principal
família do tronco Macro-Jê.
110

modalidade, são línguas ágrafas, a escrita alfabética para muitas línguas indígenas ainda não é
realidade, a produção escrita e a publicação de livros em língua indígena é recente. Dos povos que
habitam o Estado do Pará temos conhecimento que os mẽbêngôkre já possuem um sistema de escrita
alfabética veiculado em LDs. Assim, pretendemos saber qual o tratamento que vem sendo dado a
modalidade escrita nas cartilhas bilíngues de alfabetização elaboradas por professores indígenas
mẽbêngôkre, para, se necessário, contribuir na melhoria do ensino de língua, indígena e portuguesa,
nessas comunidades.
Para mostrar como nossa pesquisa está acontecendo organizamos este trabalho da seguinte
forma. Apresentamos, em um primeiro momento os pressupostos teóricos e metodológicos que
fundamentam o estudo; em seguida, a metodologia empregada em nossa pesquisa; em um terceiro
momento mostramos o corpus analisado; após mostramos os aspectos e critérios dos LDs
considerados na análise; seguimos apresentando resultados da análise; e finalizamos com nossas
considerações finais.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Dos materiais didáticos mais comuns presentes em sala de aula o LD é um dos mais
essenciais, visto que influi mais diretamente na aprendizagem, daí estudiosos como Rojo
(2006), por exemplo, mostrar-se favorável ao uso do LD por professores e alunos. Dentre os
argumentos apresentados pela autora, destacamos o fato do LD ser um material impresso que
favorece a leitura literária, dentro e fora da instituição escolar.
Rojo (2005) afirma que na atualidade os livros mais presentes em sala de aula são os
manuais didáticos e os paradidáticos. A supremacia dos LDs nas salas de aula dá-se devido ao
fato desses livros serem ―centrais na produção e apropriação de conhecimentos, sobretudo dos
conhecimentos por cuja difusão a escola é responsável‖ (LAJOLO, 1996, p. 3-4).
No que se refere ao uso do LD em escolas indígenas, os professores desse público
parecem compartilhar do mesmo ponto de vista de Rojo, vendo de modo positivo a presença
desses manuais escolares no ambiente escolar. Porém, essa importância, da parte dos
professores indígenas, não é justificada apenas porque tais livros apresentam-se como um
grande instrumento de apoio no processo de ensino-aprendizagem, auxiliando o professor em
sua prática pedagógica, transmitindo conceitos, facilitando a aquisição dos conhecimentos e
saberes a serem ensinados, mas também porque o LD, por ser produzido em uma dada língua
indígena, é visto como uma ferramenta importante na revitalização e valorização dessas
línguas para suas respectivas comunidades. Ou seja, ao constituírem-se como materiais
escritos em língua indígena os LDs também contribuem para revitalizar e impedir que as
111

línguas indígenas desapareçam, haja vista que os manuais didáticos auxiliam na alfabetização
dos povos indígenas, levando-os a apropriarem-se do sistema de escrita alfabética de seu
idioma, para que possam registrar os conhecimentos expressados por sua língua.
Sobre o assunto, Moore, Galúcio e Gabas Jr. (2008) afirmam que ―materiais escritos na
língua geralmente aumentam o prestígio da mesma e chamam a atenção da geração mais
jovem‖.
Dada a importância do LD nas escolas indígenas, faz-se necessário analisá-los dentro de
concepções teóricas que nos permitam ter uma visão coerente sobre o assunto. Assim, para
realizarmos nossa análise estamos pautados nos pressupostos teóricos e metodológicos da
Sociolinguística de Labov (2010) sobre perda linguística; da Linguística Textual com a
proposta de Marcuschi (1996; 2008; 2010) sobre concepção de língua e de texto - o estudioso
nos fornece pressupostos teóricos para elaborarmos um roteiro de análise para ser aplicado
nas cartilhas indígenas - e com a proposta de Geraldi (1995) sobre concepção de língua; do
Ensino-aprendizagem de línguas, com os trabalhos de Spinassé (2006) sobre conceitos de
Língua Materna, Língua Segunda e Língua Estrangeira, Scarpa (2001) sobre a aquisição de
linguagem, Baltar (2004) sobre competências discursivas, e Perrenoud (1997; 1999) sobre
estratégias de aprendizagem; das Línguas Indígenas, sobre essa abordagem destacamos os
estudos de Rodrigues (2000; 2003), Moore (2008), Pimentel da Silva (2003), Maria Amélia
Reis Silva (2001) dentre outros; da Educação Escolar, dentro desse quadro destacamos o
trabalho de Paulo Freire (1996) sobre alfabetização de adultos, Mortatti (2000; 2010), Lajolo
(1996) e Rojo (1998; 2005; 2009) sobre concepções de livros didáticos e alfabetização, e
Magda Soares (2001; 2011) sobre letramento. Vale ressaltar que há outros nomes
fundamentando nosso trabalho, destacamos apenas os mais significativos.
Na próxima seção, apresentaremos a metodologia empregada nesta pesquisa.

2. METODOLOGIA

Em um primeiro momento aplicamos uma pesquisa bibliográfica cuja finalidade


consistia em fazer um levantamento dos manuais bilíngues propostos para o ensino
aprendizagem da educação indígena, dos dados documentados pelos linguistas em suas
pesquisas de campo e da literatura que fornece base teórica para este trabalho. Realizamos
pesquisas junto à biblioteca da FUNAI – Belém, à bibliotecas particulares38 e à demais

38
Citamos em especial a biblioteca particular de Marília Ferreira, professora da Universidade Federal do Pará e
orientadora desta pesquisa.
112

bibliotecas desta instituição de ensino. É válido ressaltar que não tivemos êxito em nossas
pesquisas realizadas nas bibliotecas da Universidade Federal do Pará.
Em seguida passamos para a leitura dos textos teóricos que dão fundamentação teórica
ao nosso trabalho, essa é uma etapa que ainda estamos realizando, pois as leituras não se
esgotam.
Antes de iniciarmos as análises precisávamos definir os critérios de escolha dos livros
didáticos que utilizaríamos em nossa pesquisa, assim elaboramos uma lista com vários
critérios para escolha do corpus, essa será apresentada posteriormente. Também precisávamos
definir os procedimentos de nossa análise, decidimos em realizar dois tipos de análise:
qualitativa e quantitativa. Na primeira, por privilegiarmos o enfoque da escrita nos livros
didáticos indígenas, tomamos como parâmetros e princípios de análise a proposta de
Marcuschi (1996). Assim sendo, na análise qualitativa elaboramos um roteiro baseado nos
parâmetros de análise que Marcuschi utilizou quando ele se propôs a investigar livros
didáticos de língua portuguesa. Por meio desse roteiro buscaremos observar o tratamento que
está sendo dado à escrita nos livros didáticos mẽbêngôkre, como são realizadas as atividades
propostas para essa modalidade de ensino de língua, etc. A escrita será analisada por meio dos
textos presentes nos manuais, neles observaremos o enfoque que é dado à compreensão e à
produção escrita nas línguas portuguesa e mẽbêngôkre.
Na análise quantitativa pretendemos mostrar a frequência de determinados tipos de
atividade envolvendo escrita nesses manuais. Em nossa análise preliminar observamos que as
atividades de produção escrita ―não passam de uma descomprometida atividade de copiação‖
(MARCUSCHI, 1996)39.
No próximo segmento apresentaremos o corpus no qual está sendo aplicada a análise
qualitativa e quantitativa.

3. O CORPUS

Fizemos o levantamento dos livros didáticos bilíngues elaborados para a comunidade


mẽbêngôkre, a fim de analisar o ensino-aprendizagem da modalidade escrita nas línguas
portuguesa e mẽbêngôkre nas salas de aula das escolas dessa comunidade indígena. Assim o
corpus de análise desta pesquisa é composto pelos livros didáticos produzidos nas línguas
supracitadas.

39
A obra de Marcuschi a qual nos referimos foi encontrada na Internet, ela não possui numeração nas páginas,
portanto, qualquer referência a esse trabalho será feia por meio do ano.
113

Sobre os livros, informamos que são obras produzidas por professores indígenas da
referida comunidade durante Cursos de Formação de Professores Indígenas. Nesses cursos
são realizadas oficinas de produção de materiais didáticos bilíngues para que, auxiliados e
assistidos por especialistas como linguistas, antropólogos e educadores, os professores
indígenas elaborem os materiais que desejam utilizar em sua prática pedagógica.
São três os títulos analisados até agora:

TÍTULO ANO DE PUBLICAÇÃO AUTORES


Cartilha Me Banhõ Pi'ôk. Volumes 1, 2 e 3 – 1991 Professores mẽbêngôkre.
(sete volumes de cartilhas e Volumes 5 e 6 – 1968
um manual do professor que Volume 7 - 1969
acompanha o terceiro Manual do Professor - 1978
volume).
Livro de língua portuguesa 2005 Professores mẽbêngôkre,
Mẽbêngôkre, Paraná e parãna e tapajuna.
Tapajuna. (Volume único)
Atlas dos Territórios 2007 Especialistas e Professores
Mẽbêngôkre, Paraná e mẽbêngôkre, parãna e
Tapajúna. (Volume único) tapajúna.

Quadro 1: Livros analisados durante a pesquisa em questão.

Daremos prosseguimento apresentando os aspectos dos LDs que foram considerados em nossa
análise.

4. ASPECTOS DOS LIVROS DIDÁTICOS CONSIDERADOS NA ANÁLISE

Nosso objetivo primeiro é analisar a abordagem que é dada à compreensão e


à produção escrita nos LDs, contudo, não podemos deixar de observar outros aspectos presentes
nesses manuais. Assim, elaboramos um quadro de observação em que apresentamos os aspectos
considerados em nossa investigação dos LDs, os aspectos a observar são: a) presença de
atividades/exercícios de compreensão e produção escrita; b) adequação ao público-alvo; c) adequação
ao nível de escolaridade (nível de alfabetização); d) adequação à faixa etária; e) projeto gráfico
(coerências das imagens, fonte, qualidade do material, etc.); f) concepção de língua, gramática e
ensino; g) conteúdo contextualizado ao público; h) bilinguismo; i) aspectos da cultura indígena
presente; j) presença de textos autênticos.
Nesse quadro descrevemos informações importantes sobre o LD que está sendo estudado como:
título, autor(es), ano de publicação, local de publicação, número de páginas, comunidade a qual se
114

destina. Também há espaço para confirmar ou não a existência dos aspectos observados no LD, anotar
a(s) página(s)s onde esses são encontrados e, ainda, comentar sobre as observações feitas.
Na próxima seção, apresentaremos os resultados preliminares de nossas análises.

5. RESULTADO DA ANÁLISE

Nossa pesquisa encontra-se em andamento, ainda estamos realizando as leituras teóricas,


análises qualitativa e quantitativa dos LDs e escrevendo a dissertação, portanto para este momento
temos apenas resultados preliminares. Como havíamos dito anteriormente, em nossa análise preliminar
dos LDs constatamos que as atividades de produção escrita constituem-se em atividades
descomprometidas de metalinguagem, que se caracterizam mais como cópia e treino de caligrafia, do
que como atividade envolvendo leitura, compreensão, interpretação e produção textual escrita. No
entanto, por meio das leituras e das observações já realizadas, é possível afirmar que materiais escritos
em língua indígena podem contribuir para manutenção de uma dada língua indígena desde que a
escrita dê-se de forma significativa no contexto escolar, envolvendo a vida sociocultural do aluno
indígena, só assim a alfabetização em língua materna constitui-se como uma metodologia de
revitalização eficiente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A alfabetização em língua materna é uma metodologia que precisa de fato ser adotada nas
escolas indígenas, isto é, precisa fazer parte da educação escolar indígena como um instrumento a
serviço da manutenção e revitalização dessas línguas em risco de extinção. Dentro desse contexto o
LD indígena apresenta-se como uma ferramenta de apoio para a alfabetização de uma dada língua
materna, daí enfatizarmos a necessidade desse material didático ser investigado. Nosso objetivo não
consiste em julgar os LDs que estamos analisando a fim de indicar ou promover algum em especial
para ser usado em contexto escolar indígena, em nossa pesquisa buscamos refletir como a modalidade
escrita está sendo tratada nos LDs indígenas selecionados para que, fundamentados em estudiosos do
assunto, possamos colaborar com informações teóricas que possibilitem a elaboração de outros
materiais didáticos indígenas bilíngues mais adequados ao contexto intercultural da comunidade
indígena, em especial da comunidade mẽbêngôkre.

REFERÊNCIA

BALTAR, M. A validade do conceito de competência discursiva para o ensino de língua


materna. Linguagem em (Dis) curso. v. 5, n. 1, jul.-dez. 2004. Disponível em
http://www3.unisul.br/pagins/ensino/pos/linguagem/0501/10.htm. Acesso em: 05/10/10.
115

CEZARIO, M.M. & VOTRE, S. Sociolingüística. In: MARTELOTTA, M. E. (Org.). Manual


de Lingüística. 1. ed. São Paulo: Contexto, 2010, p. 141-155.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.
GERALDI, J. V. Portos de passagem. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes,1995.
LAJOLO, M. Livro Didático: um (quase) manual de usuário. Em aberto. Brasília: INEP /
MEC, jan.-mar. 1996, ano 16, n. 69, p. 3-9. Disponível em:
http://www.rbep.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/view/1033. Acesso em: 08/08/11.
MARCUSCHI, L. A. Exercícios de compreensão ou copiação nos manuais de ensino de
língua? Em aberto. Brasília: INEP / MEC, jan.-mar. 1996, ano 16, n. 69. Disponível em:
http://www.rbep.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/view/1033. Acesso em: 18/05/11.
________________. Produção textual, análises de gêneros e compreensão. São Paulo:
Parábola, 2008, p. 267-281.
_________________. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONISIO, A. P.;
MACHADO, A. R.; & BEZERRA, M. A. (Org.). Gêneros Textuais e Ensino. São Paulo:
Parábola Editorial, 2010, p. 19-38.
MOORE, D.; GALUCIO, A. V.; GABAS JR. Nilson. O desafio de documentar e preservar
as línguas amazônicas. Scientific American Brasil – Amazônia (A floresta e o futuro), Brasil,

n. 3, p. 36 – 43, 01 set. 2008. Disponível em:


http://prodoc.museudoindio.gov.br/down/O_Desafio_de_Documentar_e_Preservar_as_Lingua
s_Amazonia-revisada.pdf. Acesso em: 21/06/10.
MORTATTI, M. R. L. Cartilhas de alfabetização e cultura escolar: Um pacto secular.
[S.I]: Cadernos CEDES, ano XX, n. 52, nov. 2000, p. 41-54.
__________________. Alfabetização no Brasil: conjecturas sobre as relações entre
políticas públicas e seus sujeitos privados. Revista Brasileira de Educação. v. 15, n. 44,
mai.-ago. 2010, p. 329-341. Disponível em:
http://www.anped.org.br/novo_portal/app/webroot/files/file/anped44%20miolo.pdf. Acesso
em: 14/09/11.
MORTATTI, M. R. L.; ROJO, R. Vale a pena usar livro didático em sala de aula? Letra A –
o jornal do alfabetizador. Troca de idéias. Belo Horizonte, fev./ mar. 2006, ano 2, n. 5.
Disponível em: http://www.ceale.fae.ufmg.br/nomade/midia/docs/63/phpUHYLYH.pdf
Acesso em: 18/08/2011.
PERRENOUD, P. Construire des compétenses dès l’école. Paris: ESF, 1997.
______________. Construir competências é virar as costas aos saberes? Pátio Revista
pedagógica. Porto Alegre. n 11, nov. 1999, p. 15-19. Disponível em:
http://www.centrorefeducacional.com.br/perrenoud2.htm. Acesso em: 13/09/10.
PIMENTEL DA SILVA, M. S. Situação de ensino de línguas indígenas no contexto escolar.
In: ANAIS DO 5º ENCONTRO DO CELSUL. Curitiba, 2003, p. 958-961.
RODRIGUES, A. Panorama das línguas indígenas da Amazônia. In: QUEIXALÓS, F.;
RENAULT-LESCURE, O. (Org.). As línguas amazônicas hoje. São Paulo: Instituto
Socioambiental, 2000, p.15-28.
_______________. Aspectos da história das línguas indígenas da Amazônia. In: SIMÕES, M.
do S. (Org.). Sob o signo do Xingu. Belém: UFPA - IFNOPAP, 2003, v. 1, p. 37–51.
ROJO, R. Alfabetização e letramento: perspectivas linguísticas. Campinas: Mercado Livre,
1998.
________. (Org.) Livros em sala de aula – modo de usar. In: MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO E DO DESPORTO. Materiais didáticos: escolha e uso. Boletim 14, ago. 2005,
p. 35-43.
116

________. Letramento múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: Parábola editorial,
2009.
SCARPA, E. M. Aquisição da linguagem. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (Org.)
Introdução à linguística – domínios e fronteiras. v. 2, São Paulo: Cortez, 2001.
SILVA, M. A. Pronomes, ordem e ergatividade em Mebêngôkre (Kayapó). Dissertação
(Mestrado em Linguística) – Departamento de Linguística do Instituto de Estudos de
Linguagem da Universidade Estadual de Campinas. Campinas: UNICAMP, 2001.
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
__________. Alfabetização e letramento. 6. ed., São Paulo: Contexto, 2011.
SPINASSÉ. Karen Pupp. Os conceitos de Língua Materna, Segunda língua, e Língua
Estrangeira e os falantes de línguas alóctones minoritárias. Contingentia, 2006, v. 1, nov.
2006. p. 1-8. Disponível em:
HTTP://www.seer.ufrgs.br/index.php/contingentia/article/viewFile/3837/2144. Acesso em:
20/09/10.

ESTUDO FONOLÓGICO DO DIALETO


MUNDURUKÚ DO AMAZONAS

Giovani dos Santos SILVA (UFPA)


Orientadora: Profa. Dra. Gessiane de Fátima Lobato PICANÇO (UFPA)

RESUMO: O Mundurukú é uma língua pertencente ao tronco Tupi e, apresenta traços de


familiaridade ao Kuruaya, compondo, desta maneira, a família linguística Mundurukú. Os
Mundurukú localizam-se na região do Rio Tapajós, no Estado do Pará, na Terra Indígena
Mundurukú, na região do Rio Madeira, no Estado do Amazonas, na Terra Indígena Kwatá-
Laranjal, no município de Borba, AM, e na Terra Indígena Apiaká, município de Juara, MT.
A realidade sociolinguística atual dos Mundurukú da Terra Indígena Kwatá-Laranjal
apresenta uma situação de alto índice de monolinguismo em Português, com raros falantes da
língua, numa faixa etária acima dos oitenta anos. No presente trabalho, desenvolveremos um
estudo fonológico segmental da língua Mundurukú do Amazonas, no qual, serão apresentados
dados mais sistematizados para a consolidação da família Mundurukú, incluindo dados
inéditos desta variante de Mundurukú. É objeto principal desta pesquisa, descrever e analisar
a fonologia segmental do dialeto Mundurukú do Amazonas, com vistas as suas propriedades
articulatórias e distintivas, com base nas descrições e documentos existentes Crofts (1973 e
1985); Picanço (2005); Mendes Júnior (2007) e Borella; Santos (2011), como fontes de
pesquisa, e como proposta inicial de análise baseada em Cagliari (2002). Além de gravações
feitas com uma das últimas falantes residentes na T. I. Kwatá-Laranjal. A trilha metodológica
utilizada constará dos seguintes passos: identificar os sons vocálicos e consonantais da língua;
descrever as propriedades articulatórias de vogais e consoantes; descrever os processos
fonológicos; indicar os sons que ocorrem em distribuição complementar e/ou em variação
livre; analisar os pares de sons suspeitos; identificar os fonemas; descrever os padrões de
distribuição dos fonemas; e identificar os alofones de cada fonema. Esta pesquisa em
desenvolvimento teve continuação com a recente coleta de dados e informações sobre a língua
Mundurukú. Com os dados transcritos, será aprofundado o conhecimento da fonética e da
fonologia desta língua.

PALAVRAS-CHAVE: Mundurukú, fonética, fonologia segmental.


117

ABSTRACT: The Mundurukú is a language belonging to the Tupi, and shows familiarity to
Kuruaya, composing in this way, the language family Mundurukú. The Mundurukú located in
the Rio Tapajos, in Para state, Mundurukú on Indigenous Land, in the Rio Madeira,
Amazonas state, in Indigenous Kwatá-Laranjal in the municipality of Borba, AM, and the
Indigenous Land Apiaká, city of Juara, MT. The current sociolinguistic reality of the
Indigenous Land Mundurukú Kwatá-Laranjal show a situation of high monolingualism in
Portuguese, with rare-speaking of this language, an age group above eighty years. In this
work, we will develop a segmental phonological study of the language Mundurukú Amazon,
in which, more systematic data will be presented to the consolidation of family Mundurukú,
including unpublished data Mundurukú this variant. It is the principal object of this study to
describe and analyze the segmental phonology of the dialect Mundurukú the Amazon, with
their views and distinctive articulatory properties, based on existing documents and
descriptions Crofts (1973 and 1985); Picanco (2005), Mendes Júnior (2007) and Borella,
Santos (2011), as sources of research and analysis as the initial proposal based in Cagliari
(2002). In addition to recordings made with one of the last speakers living in T. I. Kwatá-
Laranjal. The trail methodology used consisted of the following steps: identify the vowel and
consonant sounds of the language, describe the articulatory properties of vowels and
consonants; describe phonological processes; indicate the sounds that occur in complementary
distribution and / or in free variation, to analyze the pairs sounds suspicious, identifying
phonemes, to describe the distribution patterns of the phonemes, allophones and identify each
phoneme. This research development has continued with the recent data collection and
information about the language Mundurukú. With the data entered will be thorough
knowledge of phonetics and phonology of the language.

KEYWORDS: Mundurukú, phonetics, segmental phonology.

INTRODUÇÃO

A língua, comprovadamente, mantém os valores culturais de um povo, mesmo que não


seja passada para a escrita, como comunidades reivindicam que se faça. Não obstante a tudo
isso, temos uma representação com o Mundurukú, a qual, é uma língua pertencente ao tronco
Tupi e, apresenta traços de familiaridade ao Kuruaya, compondo, desta maneira, a família
linguística Mundurukú. Os Mundurukú se localizam na região do Rio Tapajós, no Estado do
Pará, na Terra Indígena Mundurukú, na região do Rio Madeira, no Estado do Amazonas, na
Terra Indígena Kwatá-Laranjal, no município de Borba, AM, e na Terra Indígena Apiaká,
município de Juara, MT. Dados da FUNASA (2011) assinalam que os Mundurukú totalizam
hoje uma população aproximada de 10.000 pessoas, vivendo em comunidades indígenas
localizadas nos estados do acima listados. A realidade sociolinguística atual dos Mundurukú
da Terra Indígena Kwatá-Laranjal apresenta uma situação de alto índice de monolinguismo
em Português, com raros falantes da língua, numa faixa etária acima dos oitenta anos.
118

É objeto principal desta pesquisa, descrever e analisar a fonologia segmental do dialeto


Mundurukú do Amazonas, com vistas as suas propriedades articulatórias e distintivas, com
base nas descrições e documentos existentes Crofts (1973 e 1985); Picanço (2005); Mendes
Júnior (2007) e Borella; Santos (2011), como fontes de pesquisa, e como proposta inicial de
análise baseada em Cagliari (2002). Além de gravações feitas com uma das últimas falantes
residentes na T. I. Kwatá-Laranjal.
A trilha metodológica utilizada constará dos seguintes passos: identificar os sons
vocálicos e consonantais da língua; descrever as propriedades articulatórias de vogais e
consoantes; descrever os processos fonológicos; indicar os sons que ocorrem em distribuição
complementar e/ou em variação livre; analisar os pares de sons suspeitos; identificar os
fonemas; descrever os padrões de distribuição dos fonemas; e identificar os alofones de cada
fonema. Esta pesquisa em desenvolvimento teve continuação com a recente coleta de dados e
informações sobre a língua Mundurukú. Com os dados transcritos, será aprofundado o
conhecimento da fonética e da fonologia desta língua.

1. Línguas em risco

“The first instrument of a people‟s genius is its language”

Stendhal

Young (2009, p 03) certifica que a ferramenta de maior proveito para a evolução
humana é a habilidade de coexistir e trabalhar eficientemente em grupo, de maneira que cada
sujeito faça uso de seus melhores predicados para o bem comum. Tal modo de vida só é
possível por meio de um diálogo uniformizado, complexo e bem articulado, ao qual damos o
nome de Língua. O autor supra (2009, p 03) destaca ainda que:

Calcula-se que, atualmente, existam mais de 6 mil línguas no mundo,


embora menos de 50 sejam conhecidas globalmente. As restantes são línguas
de comunidades minoritárias nos Estados, as mais ameaçadas de extinção
pelos idiomas dominantes na comunicação global.
O melhor modo de comunicação continua, ainda hoje, sendo a fala. No
entanto, com a crescente complexidade das relações sociais ao longo da
história, a linguagem também se tornou mais elaborada e sofisticada até
chegar ao registro escrito – uma forma de uniformizar a língua e evitar sua
mudança com demasiada rapidez. Este fenômeno ocorre principalmente
quando relações deixam de ser exclusivamente locais e passam a um âmbito
de concernimento internacional.

No entanto, no decorrer dos dias, há que se examinar que, além de sucessivas mutações,
algumas línguas estão a caminho à completa obsolescência. Neste panorama, é concebível que
119

um terço das línguas conhecidas, não mais existe e as restantes estão em iminente perigo de
extinção. Dentre os vários estágios de extinção, o Mundurukú do Amazonas, sendo uma
língua indígena da Amazônia se enquadra no estágio Extinção Gradual, o qual é mais
comumente observado e pode demorar gerações para chegar à situação de inexistência. Dado
ao seu caráter gradual, muitos trabalhos são realizados com o intento de revitalizar o uso da
língua em seu grupo de origem ou, nos casos tidos como irreversíveis, registrá-la para que não
se esvaeça sem qualquer registro escrito ou fonético.
Para programas de revitalização e/ou registro das línguas humanas, há uma classificação
designada aos falantes e os tipos de registros que eles são capazes de fornecer. Deste modo,
ficando dispostos em fluentes, semifalantes e recordantes (rememberers). Young (2009, p 04)
delineia esta classificação assim:

Os primeiros utilizam a língua para comunicação cotidiana e são capazes de


expressar qualquer pensamento de acordo com a lógica sistemática da
língua. Esses falantes são os mais importantes na reconstrução de um
sistema de comunicação, dado o destaque de fontes e estruturas de primeira
mão para o registro e a sistematização. Em casos de línguas consideradas
extintas, provam a existência da língua; em caso de ameaça, é uma
oportunidade para revitalizar a cultura de um grupo.
Os semifalantes se caracterizam pelo domínio limitado em termos de
estruturações complexas e por certa dificuldade em expressar-se pela língua
em questão, dado o vocabulário restrito que conhecem. São fornecedores de
registro de línguas já fadadas à extinção e das quais unicamente é possível
extrair arquivos de usos básicos, pois não lembram da linguagem em si, mas
unicamente de algumas palavras que geralmente lhes foram ensinadas
quando pequenos jovens.
Os recordantes são indivíduos que tiveram contato com a língua semifalantes
como segunda língua. Também podem ser inclusos nessa categoria falantes
fluentes que sofreram preconceitos e repressões e acabaram abandonando o
uso da língua por um longo período de tempo. Fornecem registros de línguas
já fadadas à extinção e das quais unicamente é possível extrair arquivos de
usos básicos. A peculiaridade desse grupo está no fato de se lembrarem de
poucas palavras ou de estruturas simples de comunicação.

É possível dizer que todas as línguas têm competência de expansão sem respeitar limites
meramente geográficos. De tal modo, há línguas de diferentes alcances, desde local, de
reiterado contato com língua limítrofe, até extranacional. Em meio as milhares de línguas
faladas por todo o mundo, raras são as que não sofrem qualquer problema quanto à
quantidade de falantes, à qualidade da comunicação e à perda de espaço para outra língua que
se adequou melhor ao mundo moderno. A maioria dessas línguas ditas dominantes foi esteada
por regimes expansionistas que instituíram políticas de aculturação em seus territórios
120

conquistados e para que seus falantes abandonassem seus traços culturais locais. Este
processo teve como um de seus alvos principais as línguas locais.
Atualmente, a maioria das comunidades falantes dessas línguas vitimadas pela
aculturação tem meios para se defender e políticas autônomas para afiançar a existência de
suas culturas e de seus modos de vida. Muitas dessas comunidades somente conseguiam se
manter quando uma liderança de governo tolerava o uso de outras línguas, ou quando estavam
enclaustradas geograficamente. Em correspondência, recentemente há possibilidades de maior
ingresso à educação e de um aumento no nível social capaz a trazer liberdade no uso da língua
(sem necessidade do cumprimento de ordens exógenas). Ademais, há casos em que a língua
dominante é incorporada e a língua-mãe mantida para a comunicação cotidiana: é o caso do
bilinguismo (ou diglossia), fato observado no lócus da tribo indígena estudada neste trabalho.
As comunidades que conseguem manter um bom padrão dos dois sistemas de comunicação
podem optar por uma língua segundo o tipo de retórica ou a consciência ideológica que as
represente num dado contexto.

2. A língua e o povo Mundurukú

O Mundurukú é uma língua pertencente ao tronco Tupi e, junto com o Kuruaya,


compõe a família linguística Mundurukú (Rodrigues, 1986). As primeiras publicações acerca
do Mundurukú datam das décadas de 1930 e 1940, com destaque para os trabalhos de Strömer
(1932) – Die Sprache der Mundurukú e de Mense (1947) – ―Língua Mundurukú: vocabulários
especiais‖.
O povo indígena Mundurukú é pertencente ao tronco linguístico Tupi, família
linguística Mundurukú; autodenominam-se Wuyjugu e, segundo os saberes difundidos
oralmente entre alguns anciãos, a designação Mundurukú, como são conhecidos desde fins do
século XVIII, é como estes eram denominados pelos Parintintins, povo rival que estava
localizado na região entre a margem direita do rio Tapajós e o rio Madeira. Esta designação
teria como significado formigas vermelhas, em menção aos guerreiros Mundurukú que
atacavam, massivamente, os territórios adversários.
Os Mundurukú têm como seu território mais habitual os campos interiores do alto
Tapajós. No mito de origem, uma das grandes lideranças antepassadas dessa nação, o cacique
Karosakaybo criou os Mundurukú na aldeia Wakopadi, ao qual se atribui a esse grande
guerreiro, ainda o encargo do desenvolvimento deste povo e da revolução cultural e social
desta nação, situada nos campos centrais, próximo às cabeceiras do rio Krepori.
As primeiras notícias sobre o contato das frentes colonizadoras com os Mundurukú
121

datam da segunda metade do século XVIII, sendo a primeira referência escrita feita pelo
vigário José Monteiro de Noronha, em 1768, que os nomeou Maturucu, na ocasião do seu
avistamento às margens do rio Maués, afluente do rio Madeira, ancestral Capitania do Rio
Negro – atualmente estado do Amazonas. Localidade onde, presentemente, existem
comunidades desta etnia cuja história de contato e relações com a sociedade nacional,
apresenta aspectos distintos das comunidades Mundurukú situadas na região do alto Tapajós.
Atualmente, a população Mundurukú da bacia do Madeira é habitante da Terra Indígena
Kwatá-Laranjal.
A historiografia destaca este povo indígena, com revelada notoriedade, sendo uma
nação audaciosamente guerreira, que realizava grandes excursões do Madeira ao Tocantins,
com o desígnio, entre outros, de obter troféus: cabeças de inimigos, as quais eram
mumificadas e se atribuíam poderes mágicos. Os Mundurukú sobrepujaram de forma bélica e
cultural o Vale do Tapajós desde o final do século XVIII, região conhecida secularmente
como Mundurukânia, onde permanecem até os dias de hoje, seja em terras reconhecidas
oficialmente, seja habitando diminutas comunidades ribeirinhas.
Os Mundurukú só foram derrotados pelos conquistadores após o envio de inúmeros
contingentes e tropas de resgate, instituídas pelos portugueses em retaliação à resistência
nutrida pelos indígenas por meio de ataques aos povoados, ultimada com a adoção de
―acordos de paz‖ entre chefes Mundurukú e comandos coloniais da região do baixo
Madeira/Tapajós, ao final do século XVIII. A partir de então, foram assentados em
aldeamentos missionários, arraigados na exploração das chamadas drogas do sertão, sendo
que alguns grupos permaneceram brigando contra etnias rivais, facilitando a ação dos
colonizadores quanto à ocupação da região.
Em decorrência das vastas áreas que ocupavam, o contato dos Mundurukú com o
levante expansionista alterou decisivamente, de acordo com as cercanias e facilidades de
acesso aos seus territórios. Eventos que resultaram no surgimento de aspectos distintos da
cultura entre os indígenas situados nas margens do rio Tapajós, rio Madeira, Cururú e na área
de cerrado conhecida como campos do Tapajós.

3. Mundurukú: estudos elementares

Os estudos linguísticos elementares acerca do Mundurukú foram concretizados por


Braun & Crofts, que perpetraram um estudo sobre a fonologia desta língua (1965). Em
seguida, destacam-se os trabalhos de Crofts: Repeated morphs in Mundurukú (1971),
Gramática Mundurukú, em que exibe um estudo sistemático sobre a língua (1973), Ideófonos
122

na narração Mundurukú (1984) e Aspectos da língua Mundurukú (1985). Em 1987, é


destacado o trabalho de Gonçalves, Concordância em Mundurukú. Angotti (1998) delineia
sobre a Causativização em Mundurukú: aspectos morfossintáticos. Em 2000, os trabalhos de
Nunes sobre o princípio icônico presente na língua com um tratamento lexicográfico para os
nomes e o de Gomes sobre os predicados verbais e modelos lexicográficos, com introdução de
uma descrição da flexão relacional, dos verbos intransitivos e transitivos, e anexação dos
nomes e dos classificadores. Mais recentemente, podemos destacar duas teses de doutorado
realizadas sobre a língua Mundurukú: em 2005, Picanço concluiu na University of British
Columbia um pormenorizado estudo sobre a fonética e a fonologia do Mundurukú, expondo
algumas inovações, inclusive uma nova interpretação sobre o sistema tonal. E em 2006,
Gomes exibiu na Universidade de Brasília um estudo sistemático sobre a morfologia e a
sintaxe.
Concernente às relações entre o Kuruáya e o Mundurukú, Rodrigues (1980) realizou um
trabalho no intento de evidenciar as correlações em meio a as línguas da família Mundurukú e
as da família Tupi-Guarani. Nesse trabalho, foram elencados cerca de 140 cognatos,
compreendendo, sempre que possível, dados do Kuruaya, mas focalizando a necessidade de
uma análise fonológica para essa língua, o que veio a ser realizado por Costa em 1998 e ainda
um estudo fonológico-comparativo realizado por Mendes Júnior (2007).

4. Abordagem teórico-metodológica e a descrição do dialeto Mundurukú do Amazonas

Este estudo adotará os direcionamentos teóricos e metodológicos da Linguística


Estruturalista Funcional para descrição de línguas ágrafas. De tal modo, na primeira fase da
pesquisa realizamos o levantamento de uma bibliografia coeso à temática do trabalho, como
obras de linguística descritiva e estudos de línguas indígenas em geral, de maneira especial, as
línguas do tronco Tupi. A segunda fase consistiu na aquisição de um corpus constituído de
palavras e frases curtas, coletado in loco. Para o registro dos dados coletados foram utilizados
dispositivos digitais (gravadores de áudio do tipo Marantz e filmadora Sony). A terceira fase
consiste na sistematização dos dados com vistas ao conhecimento das propriedades fonéticas
e fonológicas da língua. Para tanto, os segmentos sonoros estão sendo distribuídos em tabelas
e dispostos quanto ao modo e ao ponto de articulação. Em seguida, serão investigados e
identificados os pares foneticamente semelhantes na língua e por meio dos critérios de
oposição entre pares mínimos e/ou análogos, variação livre e distribuição complementar serão
determinados os fonemas e seus respectivos alofones.
123

5. A Linguística Estruturalista Funcional e a descrição do dialeto Mundurukú do


Amazonas

Esta pesquisa tem seus alicerces nas considerações metodológicas e técnicas próprias
a uma análise fonológica básica, de cunho estruturalista, obedecendo aos pressupostos por
Kindell (1981). Este aponta que os sons de uma língua são organizados automática e
inconscientemente pelos seus falantes, em unidades estruturais, tais como fonemas,
sílabas, pés e contornos. O estudo das características fônicas relacionadas à articulação
dessas unidades é o objetivo geral da fonética articulatória, e constitui-se como pré-requisito
para uma análise fonológica. Uma importante distinção a ser ponderada é a diferença entre
fonética e fonologia. Segundo Kindell (1981), a fonética é o estudo dos sons em geral,
enquanto a fonologia é o estudo da organização dos sons de uma determinada língua. Do
ponto de vista prático, a fonética permite precisão na aquisição de dados, e a fonologia
possibilita a explicação desses dados.
Cagliari (2002, p. 20) assinala que toda análise fonológica, ―seja ela de que tipo for,
baseia-se sempre em dados e fatos obtidos por meio de uma cuidadosa análise fonética‖.
Kindell (1981) corrobora que uma análise fonológica deve possuir um inventário fonético e
um inventário fonológico, em que a unidade mínima da análise fonológica seja o fonema. Na
elaboração dos inventários fonético e fonológico, empregaremos a técnica de oposição e
variação. Silva (2001, p. 126) observa que um dos objetivos de uma análise fonêmica é
determinar quais são os sons de uma língua que têm valor distintivo. O método tradicional de
identificação de fonemas é procurar duas palavras com significados diferentes cuja cadeia
sonora seja análoga. Essas palavras formam um binário mínimo, e a oposição entre eles é
designada contraste em ambiente idêntico (CAI). Ao não encontrarmos pares mínimos,
podemos caracterizar os dois segmentos em questão como fonemas distintos pelo contraste
em ambiente análogo (CAA), premissas estas que serão utilizadas neste estudo.
Por sua vez, Cagliari (2002, p.24) assegura que a função opositiva é uma função
fonológica que possibilita, utilizando o teste de comutação (o qual consiste na substituição de
um som por outro num determinado ponto do sintagma ou enunciado), fazer o levantamento
dos sons que desempenham a função de fonemas numa dada língua ou do valor fonológico
que as demais unidades possuem. Partindo desse pressuposto, na fonologia, tudo se faz por
oposição, tendo como forma de controle o significado resultante das alterações nas
comparações, assim:
124

Como a fala é uma cadeia-de-sons, a detecção dos fonemas através do teste


de comutação estabelece a função de fonema para os sons, de acordo com o
contexto em que foram encontrados. Isto significa que um som pode estar
em oposição fonológica com outro num determinado contexto (ponto de um
sintagma caracterizado pelo que vem antes ou depois do som em análise),
mas num outro contexto, tal oposição pode não se realizar. Cada contexto
tem sua própria estrutura e o que acontece num caso não precisa acontecer
do mesmo modo em outro. (CAGLIARI, 2002, p. 24-25)

Alguns estudos observam que, quando da impossibilidade de atestar, por meio de pares
mínimos, a oposição entre dois sons, e quando a substituição de um pelo outro em um mesmo
contexto não resulta em mudança de significado, a oposição/contraste entre os pares, em vez
de mostrar dois fonemas, comprova duas variantes fonológicas. A esse respeito, Cagliari
(2002, p. 25) enfatiza que ―A função fonológica desses dois sons não é distintiva nem
opositiva, mas redundante do ponto de vista do sistema linguístico‖. Todavia, como a
presença de um ou de outro é necessária na formação do morfema, devemos reconhecer a
presença de um fonema nesse ponto do enunciado. A realização fonética (alofônica) desse
fonema pode ser através de um som ou de outro detectado como variante, mas não dos dois
simultaneamente, pois, existe um ambiente para apenas um som na cadeia-da-fala, naquele
contexto.
Silva (2001, p.128) realça que, no estágio incipiente de descrição de uma língua, a finalidade
central é identificar como se organiza a cadeia sonora da fala. Deste modo, satisfeito o requisito de que
encontremos pares mínimos para sons foneticamente semelhantes (SFS). A autora assinala ainda, que
um par de sons foneticamente semelhantes se constitui como um par suspeito. Um par suspeito satisfaz
a um par de sons para os quais devemos buscar um exemplo de par mínimo para atestar o status de
fonemas dos segmentos em questão.

Por fim, Silva (2001) abaliza que, às vezes, a investigação de um par mínimo para identificar
fonemas de uma língua pode ser improdutiva. De tal modo, quando não encontramos pares mínimos
para dois segmentos suspeitos, podemos chegar a concluir que os segmentos em questão não são
fonemas. Se não conseguimos caracterizar esses segmentos como fonemas, precisamos buscar
evidências para caracterizá-los como alofones de um mesmo fonema, o que será feito pelo método da
distribuição complementar e/ou métodos que se fizerem necessários à análise fonológica proposta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Caçadores de Macacos 1. Mundurukú. Disponível em


<http://geocities.ws/segredosdemacaco/munduruk.html> acesso em 20/05/2011.
125

CAGLIARI, L. C. Análise fonológica: introdução à teoria e à prática, com especial destaque


para o modelo fônico. Campinas, SP, Mercado das letras, 2002.
FUNASA. Sistema de Informações da Atenção à Saúde Indígena (SIASI). DEMOGRAFIA
DOS POVOS INDÍGENAS. Disponível em
<http://www.funasa.gov.br/internet/desai/sistemaSiasiDemografiaIndigena.asp> acesso em
03/09/2011.
KINDELL, G. E. Guia de análise fonológica. Brasília: Summer Institute of Linguistics.
1981.
MENDES JUNIOR, Djalma Gomes. Comparação Fonológica do Kuruaya com o
Mundurukú. Universidade de Brasília. Brasília-DF 2007. Dissertação de Mestrado.
Munduruku. André Ramos. Indigenista e historiador. Novembro, 2003. Disponível em
<http://pib.socioambiental.org/pt/povo/munduruku/print > acesso em 20/05/2011.
SILVA, Thais Cristófaro. Fonética e Fonologia do Português: roteiro de estudos e guia de
exercícios. 8ª ed. São Paulo: Contexto, 2005.
MUSSALIM. Fonética. In: MUSSALIM, F. e BENTES, A.C. (orgs). Introdução a linguística
II: princípios de análise. 3 ed. São Paulo: contexto, 2004.
YOUNG, Chloé Rocha et al. Agenda: Línguas em risco: proteção ao patrimônio linguístico
da humanidade. Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
(UNESCO). Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BORELLA, Cristina de Cássia; SANTOS, Eneida Alice Gonzaga dos. Relatório do


Levantamento Sociolinguístico do Povo Mundurukú. Universidade Federal do Amazonas.
Faculdade de Educação. Curso de Formação Específica para Professores (as) Indígenas.
Manaus – AM. Fevereiro / 2011.

O GERENCIAMENTO DO ERRO NO ENSINO/APRENDIZAGEM DE INGLÊS


COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA (LE): UM ESTUDO COM FOCO NA PRODUÇÃO
ESCRITA

Gizelia Maria da Silva FREITAS (UFPA)


Orientadora: Profa. Dra. Walkyria Magno e SILVA (UFPA)

RESUMO: Esta pesquisa tem como finalidade investigar o gerenciamento do erro em aulas
de inglês como língua estrangeira (LE), assim como suas implicações para o ensino-
aprendizagem da produção escrita, no que concerne à motivação para a aprendizagem dessa
habilidade. A investigação se fundamenta na pressuposição de que a percepção de escrita e o
gerenciamento dos erros pensados pelos professores (e que repercute na formação dos alunos-
professores) apresenta traços análogos àqueles arrolados na escrita vista como produto e na
correção direta dos erros – o que não envolve o aprendente em qualquer etapa. O referencial
teórico utilizado para este estudo inclui a literatura disponível sobre escrita em segunda língua
(BAZERMAN, 2006; FIGUEIREDO, 2001; HYLAND, 2001; SCARCELLA e OXFORD,
1992), erro e gerenciamento dos erros (FERRIS, 1999, 2004; ALLWRIGHT e BAILEY,
2004; ELLIS, 1994, CORDER, 1967) e motivação na aprendizagem de língua estrangeira
(DÖRNYEI, 2001; DÖRNYEI e OTTÓ, 1998). A investigação é de caráter observatório não-
participante, pois busca descrever uma situação específica de ensino/aprendizagem de uma
126

língua estrangeira a um grupo de alunos do curso de Letras/inglês. O contexto investigado se


caracteriza por um ambiente formal de ensino/aprendizagem de língua estrangeira em uma
turma do curso de Letras com habilitação em língua inglesa, da Universidade Federal do Pará,
campus de Marabá e os sujeitos da pesquisa são uma professora da disciplina língua inglesa
III e o grupo de estudantes da graduação. Como instrumentos de coleta de dados, estão sendo
utilizados observação de aulas – com a elaboração de um diário de campo –, questionários e
produção escrita dos alunos (antes e depois de passarem pela professora). Parte dos dados já
foi coletada para análise (referente aos questionários) e a coleta dos demais dados está
prevista para o período compreendido entre agosto e outubro de 2011.

PALAVRAS-CHAVE: gerenciamento de erros, ensino-aprendizagem da escrita, língua


estrangeira

ABSTRACT: This study aims at investigating error management in classes of English as a


foreign language (EFL), as well as its implications for written production teaching and
learning, with regard to motivation for learning this skill. The research assumes that the
perception of writing and management of errors by teachers (which affects the training of
student who are teachers-to-be) seems to be similar to those listed in the writing as a product
and the direct correction of errors – which does not involve the learner at any stage. The
theoretical framework used in this study includes the available literature on second language
writing (BAZERMAN, 2006; FIGUEIREDO, 2001; HYLAND, 2001, SCARCELLA and
OXFORD, 1992), error management and the errors (FERRIS, 1999, 2004, ALLWRIGHT and
BAILEY, 2004; ELLIS, 1994, CORDER, 1967) and motivation in learning a foreign
language (DÖRNYEI, 2001; DÖRNYEI and OTTÓ, 1998). The research aims to describe a
specific situation of teaching-learning a foreign language to a group of students of
Letras/English. The context investigated is characterized by a formal teaching-learning
environment, at the Universidade Federal do Pará, in Maraba, and the subjects are a teacher of
English language levels III and V and the two groups of undergraduates. In order to collect
the data to be analised in this study, some instruments have been used, such as classroom
observation, questionnaires and students texts. Part of the data has been collected for analysis
(for the questionnaires) and other data collection is scheduled for the period between August
and October 2011.

KEYWORDS: error management, writing teaching and learning, foreign language

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Nos estudos sobre os erros no ensino/aprendizagem de línguas, encontramos várias


definições e abordagens para o erro e seu gerenciamento. Segundo Ellis (1997), aprendentes
de uma segunda língua cometem dois tipos de erros, os quais podem ser errors ou mistakes.
Para esse autor, os errors são aqueles erros cometidos quando não se tem conhecimento da
forma adequada. Já o mistake, refere-se a um desvio ocorrido durante o desempenho na
língua-alvo, apesar de o aprendente ter conhecimento sobre as formas dessa língua.
Em consonância com Ellis (1997), Corder (1967) também apresenta uma distinção
entre error e mistake, baseado na distinção chomskyana entre competência e desempenho.
127

Segundo este autor, error refere-se a um desvio ocasionado pela falta de conhecimento, ou
seja, é um erro de competência. Devido ao aprendente não dispor desse conhecimento, ele
próprio não poderá corrigir-se. Por outro lado, o mistake ocorre quando o aprendente falha no
desempenho da competência: ele já possui o conhecimento e, mesmo assim, comete o desvio.
No entanto, ele próprio é capaz de corrigir-se.
De maneira geral, a definição de erro não deixa de ser tarefa árdua, complexa, pois
depende da teoria lingüística adotada. Assim, pode-se definir o erro do ponto de vista da
gramática normativa, para a qual é erro tudo o que foge às normas da língua padrão, ou da
gramática descritiva, que considera erro a ocorrência que, em contexto algum, seria produzida
por um falante nativo da língua que se pretende aprender.
Neste trabalho, adotaremos a noção de Ferris (2004), que percebe o erro como parte
natural do processo de aprendizagem de uma língua. Para a autora, ele pode sinalizar mais
progresso do que deficiência.
No que se refere ao termo a ser utilizado para denominar a intervenção perante o erro
produzido, temos Allwright e Bailey (2004) que apresentam o termo tratamento de erros para
confrontar correção de erros. De acordo com esses autores, correção implica em ―cura‖ e
assim o erro não mais existiria ou se repetiria, o que não condiz bem com a realidade,
diferentemente de um tratamento, o qual se refere a um efeito mais imediato no
comportamento do aluno. Assim, o professor não deve apenas fornecer uma solução, mas
conduzir o aluno a realizar comparações e fazer com que ele mesmo possa encontrar a forma
correta.
Cardoso-Brito (2004) rebate esta distinção. Para ela, o tratamento é posterior à
correção, visto que existe uma outra distinção também baseada no conceito de cada vocábulo.
A correção é a atitude tomada pelo professor, pelo aluno ou pelos colegas no momento em
que um erro é cometido. Tratamento, por outro lado, refere-se a tarefas que possam fazer com
que o aluno reflita e avance no processo de aprendizagem da LE.
Há também outros termos utilizados para denominar as diferentes formas de
intervenção. Dentre eles, estão o feedback (doravante podendo ser referido como ‗retorno‘40)
e repair (‗reparo‘), utilizados por Ellis (1994). O primeiro designa um termo geral que
fornece informação ao emissor sobre a recepção e compreensão de mensagens; o segundo é
utilizado para designar as tentativas de identificação e correção de problemas na
comunicação.

40
Estamos utilizando neste trabalho o termo retorno conforme tradução encontrada no Glossário de Linguística
Aplicada, de Almeida Filho (1997).
128

No que se refere às discussões mais importantes encontradas na literatura disponível


acerca do tratamento de erros, encontramos aquelas que se referem à dicotomia direta vs.
indireta.
Segundo Figueiredo (2004) – cuja classificação baseia-se na classificação proposta por
Hendrickson (1978) –, pode-se tratar o erro de forma direta e de forma indireta. A maneira
direta ocorre quando o professor fornece a forma correta para aquele erro cometido. Essa é a
forma tradicional de tratamento e não requer tanto esforço do professor.
Na forma indireta de se tratar o erro, professores e alunos trabalham em um processo
de ensino/aprendizagem mais autônomo. Ele inclui auto-correção, correção com os pares,
conferências e correção com toda a turma.
Para Ferris (2004), a correção indireta tem o objetivo de ajudar alunos a identificar
seus próprios erros e tornarem-se bons ―editores‖. Segundo ela, os professores devem: estar
conscientes de que a correção deve ser seletiva e focalizada nos erros mais freqüentes do que
em erros únicos, além de proporcionar algum tipo de feedback em trabalhos preliminares,
como rascunhos, e conscientizar os alunos da importância da correção, para que esta possa ser
eficaz.
Além dos efeitos do feedback na escrita, considera-se relevante dar especial atenção às
preferências e expectativas dos alunos.
Investigações sobre a opinião dos alunos, no que se refere ao feedback mostram que,
segundo consta em Ferris (2004, p. 33-34):
 alunos acham que o retorno do professor na gramática e nos erros é extremamente
importante para seu progresso como escritores;
 em estudos recentes, os alunos também valorizam outros tipos de feedback do
professor (sobre idéias e organização);
 alunos-escritores, em sua maioria, são a favor da marcação de erros pelo professor;
 alunos-escritores, quando lhes é dada a escolha de estratégias de estratégias de
marcação do professor, tendem a preferir que professores marquem erros e dêem a
eles estratégias para corrigi-los por meio da correção direta ou métodos indiretos
menos explícitos;
 os alunos, às vezes, acham que o sistema de marcação do professor é confuso ou
pesado.
129

Um outro fator de grande importância quando se estuda as intervenções do professor


para responder aos erros produzidos pelos aprendentes é a motivação, que, segundo Dörnyei
(2005), é uma das características individuais que todos possuímos, mas que se manifesta em
diferentes graus em cada um de nós.
A motivação é um fator considerado determinante – pela maioria dos professores e
pesquisadores – no sucesso ou no fracasso na aprendizagem de uma língua estrangeira é a
motivação (DÖRNYEI, 2001). A motivação, segundo este autor, tem um conceito abstrato e
hipotético, o qual é utilizado para explicar

A escolha de uma ação particular, a persistência nessa escolha e o esforço


nela despendido. Em outras palavras, a motivação é responsável por: o
porquê de as pessoas decidirem fazer alguma coisa; quanto tempo elas estão
desejosas de sustentar ou expandir a atividade e qual a dificuldade que
encontrarão para sustentar a atividade ou alcançá-la41 (DÖRNYEI, 2001,
p.8).

Dörnyei (2001) fornece duas dicotomias de classificação da motivação, as quais são


apresentadas de acordo com o esforço do aprendente para com a aprendizagem. Assim, temos
intrínseca e extrínseca, e instrumental e integrativa. A motivação intrínseca refere-se a um
interesse de investimento de esforço na aprendizagem, enquanto que a motivação extrínseca
derivada de incentivos externos. Já a motivação instrumental é o desejo de se obter
reconhecimento perante um grupo com relação à língua a ser aprendida; a motivação
integrativa caracteriza-se pelas atitudes positivas e pelo desejo de se integrar ao grupo de
falantes da língua-alvo. Apesar de apresentar as duas dicotomias, este autor as reduz a apenas
dois tipos de classificações com suas respectivas subdivisões.
 Motivação intrínseca (VALLERAND, 1997 apud DÖRNYEI, 2001, p.28):
o Motivação intrínseca para aprender: engajamento em determinada
atividade por iniciativa, prazer e satisfação próprios;
o Motivação para a realização: engajamento em determinada atividade,
para satisfazer a si mesmo;
o Motivação para estimulação ou experiência: engajamento em
determinada atividade a fim de se experienciar novas e agradáveis
sensações.
 Motivação extrínseca (DECI e RYAN, 1985 apud DÖRNYEI, 2001, p.28):

41
Do original: ―the choice of a particular action, the persistence with it, the effort expended on it. In other words,
motivation is responsible for why people decide to do something, how long they are willing to sustain the
activity, how hard they are going to pursue it‖ (DÖRNYEI, 2001, p. 8).
130

o Regulação externa: origina-se de fontes externas;


o Regulação introjetada: envolve os papéis impostos e aceitos pelo
indivíduo como normas;
o Regulação identificada: engajamento em determinada atividade devido
à valorização e visão de utilidade da mesma, posto que há certa
identificação com tal atividade;
o Regulação integrada: relaciona-se ao comportamento do indivíduo de
assimilar valores externos aos seus. Esta é considerada por Dörnyei a
forma mais desenvolvida de motivação extrínseca.

As pesquisas sobre motivação tentam explicar três aspectos do comportamento


humano. São eles: a) a escolha de uma determinada ação; b)a persistênciano desempenho
dessa ação; e b) o esforço dedicado à ação.

Em outras palavras, motivação é responsável pelo por que as pessoas


decidem fazer algo, por quanto tempo elas estão dispostas a permanecer
executando essa atividade, e quão dedicadas a ela serão42. (DÖRNYEI, 2000
p.519-520)

Considerando o ensino-aprendizagem de línguas, Dörnyei distingue três fases de


pesquisas sobre motivação em L2. São elas: a) 1959-1990: psicologia social da linguagem; b)
anos 90: trabalhos focalizados em teorias cognitivas da psicologia educacional; e c) a partir
dos anos 2000: abordagem orientada no processo.
Dörnyei desenvolveu e utiliza abordagem nesta última fase, com orientação no
processo, sendo que esta apresenta uma visão mais dinâmica de motivação e consiste,
também, de três fases: a) pré-acional, na qual a motivação é chamada de motivação por
escolha, já que, uma vez provocada, leva à escolha dos objetos ou tarefas; b) acional, na qual
a motivação é chamada de executiva e precisa ser mantida e protegida, é importante para que
os objetivos e as tarefas escolhidas sejam mantidos; e c) pós-acional, tem-se a retrospectiva
motivacional, que se dá quando os objetivos foram alcançados ou as tarefas cumpridas e o
aprendente avalia o processo, determinando sua motivação para ações futuras.

42
Tradução de MAGNO E SILVA e DINIZ (s/d) para―In broad terms, motivation is responsible forwhypeople
decide to do something, how longthey are willing to sustain the activity, and how hardthey are going to pursue
it.‖
131

Também é de grande importância o papel do professor na motivação em sala de aula.


A esse respeito, Bentham (2006) afirma que, apesar de o professor não poder controlar a
motivação dos alunos, ele pode influenciar na motivação.
Dörnyei afirma que para que se crie estratégias de motivação, é necessário que se crie,
primeiramente, condições para que ela se estabeleça e, segundo este autor, três pré-condições
são indispensáveis: comportamento adequado do professor e bom relacionamento com os
alunos; uma atmosfera de sala de aula prazerosa e de apoio; um grupo de aprendentes coeso
com relação à sua aprendizagem e com normas adequadas.
A motivação, com se percebe, não pode ser ensinada, mas a motivação no aprendente
pode ser influenciada por fatores como os valores. Para Dörnyei (2001), é preciso despertar o
primeiro valor da aprendizagem de uma língua, o valor intrínseco. Desta forma, segundo este
autor, é necessário estimular tanto a curiosidade quanto a atenção do aprendente (o que pode
se dá criando-se uma imagem bastante atrativa do curso que oferecerá o ensino da língua-
alvo). O valor integrativo – o segundo valor – refere-se à atitude com relação à língua-alvo
(atitudes sociais, culturais etc.) e pode ser desenvolvido quando o professor apresenta a base
cultural na qual a língua está envolvida a partir da escolha do material (de preferência o
autêntico) e do estabelecimento de contato com os falantes dessa língua. O valor instrumental
– terceiro valor – refere-se à instrumentalidade oferecida pelo conhecimento da língua, o que
ocorre por meio das ações do professor de conscientização sobre os benefícios que o
conhecimento desse idioma proporciona (nesse sentido, a língua torna-se um meio para que
outros objetivos sejam alcançados).
Muito do que foi exposto acima recai sobre os ombros do professor. Percebe-se que a
motivação extrínseca parece não ser suficiente. Fazer com que o aprendente interesse-se pela
aprendizagem da L2 pelo prazer de aprender não é tarefa fácil. Conforme se observa no
parágrafo anterior, é necessário, primeiramente, fazer com que o ambiente, o contexto de
aprendizagem seja, de fato, prazeroso. Portanto, a formação do professor, suas atitudes em
sala de aula, assim como sua visão de ensino podem ser determinantes. Nesse sentido,
entendemos que seja de fundamental importância que o professor esteja consciente das
principais teorias sobre motivação, haja vista que para motivar para a aprendizagem da L2 é
preciso que, primeiro, se conheça a forma como os alunos aprendem e lançar mão de
estratégias para se influenciar no comportamento dos aprendentes.
Uma dessas estratégias, além das notas, é fornecer o retorno em sala de aula ou em
seus textos (DÖRNYEI, 2001), o que pode produzir mudanças positivas ou negativas na
aprendizagem. Ele é de fundamental importância para que se tome determinadas atitudes em
132

qualquer aspecto da vida e em especial na aprendizagem de uma nova língua. Sem ele,
segundo Ford (1992, apud DÖRNYEI, 2001), as pessoas, de modo geral, não conseguem
continuar avançando em direção a um objetivo. Assim, até mesmo as metas mais importantes
podem ser deixadas de lado.
De uma perspectiva motivacional, pode-se perceber que nem todo retorno apresenta-se
com tanta eficácia para determinados momentos e, dependendo da ação do professor, ele pode
ou não ser produtivo para a aprendizagem da L2. O retorno eficaz deve envolver, segundo
Dörnyei (2001), três aspectos principais, conforme se observa a seguir.
Primeiramente, para que o retorno tenha efeito motivacional, é necessário que tenha
uma função gratificante, isto é, pelo elogio se pode aumentar a satisfação do aprendente,
assim como seu espírito de aprendizagem.
Em Segundo lugar, ao se expressar confiança e encorajamento, o retorno pode
despertar no aluno autoconfiança e uma visão positiva acerca de si mesmo.
O terceiro aspecto do retorno motivacional é levar o aprendente a refletir sobre as
áreas que precisam ser melhoradas, além de identificar possíveis estratégias para maximizar a
aprendizagem. A esse terceiro tipo de retorno, Raffini (1993 apud DÖRNYEI, 2001)
denomina “positive information feedback” (retorno de informação positiva), o qual envolve o
retorno descritivo e positivo a respeito dos pontos fortes, das conquistas, progresso e atitudes.
Mas o mais importante, segundo Good e Brophy (1994 apud DÖRNYEI, 2001, p. 124), é que
esse retorno ―fornece aos alunos informações, mais que julgamentos contra padrões externos
ou realizações de pares (cuja principal característica é o ‗retorno controlador‘43‖.
Além desses aspectos, há também aqueles sugeridos por Alison (1993 citado por
DÖRNYEI, 2001) para que o retorno tenha eficácia e se apresente de forma positiva na sala
de aula. Primeiramente, há o fato de que se espera que um professor não se restrinja aos erros
ou pormenores cometidos pelos alunos enquanto negligencia contribuições positivas, quando
o que se espera é o contrário.

2. METODOLOGIA

Este trabalho apresenta-se como uma pesquisa observatória não participante,


descritiva, pois busca descrever uma situação específica de ensino/aprendizagem de uma
língua estrangeira a um grupo de alunos do curso de letras/inglês; e desenvolve-se em duas

43
―this feedback provides students with information rather than judgements against external standards or peer
achievement (which is the main feature of `controlling feedback‘‖.
133

turmas de graduação em Letras, com habilitação em língua inglesa da Universidade Federal


do Pará, campus de Marabá.
Como instrumentos de coleta de dados foram utilizados observação de aulas e a
produção textual dos alunos das turmas citadas, para que fossem verificadas as ocorrências de
intervenção da professora das turmas, de outros alunos ou do próprio aluno. Posteriormente,
foram feitas as descrições das atividades desenvolvidas nas aulas e classificação dos erros de
acordo com o tipo e ocorrência e classificação das formas de gerenciamento utilizadas pela
professora. Os efeitos das intervenções nos alunos também foram considerados.
Paralelamente à análise acima, foram aplicados questionários os quais foram
respondidos por professores e alunos, para que fossem analisadas as diferentes opiniões de
professores com relação aos erros e possíveis intervenções na escrita dos alunos, bem como as
opiniões destes sobre as atitudes do professor.

3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

As aulas observadas aconteceram no terceiro período letivo de 2011 e foram


centradas, basicamente, no professor, com ênfase na produção oral e, consequentemente, com
muita interação em sala de aula. Nas aulas, eram utilizadas tanto a língua materna quanto a
língua-alvo (inglês)
Com relação aos erros escritos mapeados, verificou-se um total de 57 intervenções,
das quais os tipos mais recorrentes foram referentes a vocabulário e verbos.
A visão de alunos e professores sobre os erros foi obtida por meio dos questionários
aplicados. Todos os alunos respondentes consideram o erro como um aspecto positivo da
aprendizagem, pois, segundo eles, é por meio do erro que se aprende o caminho para o que
seria o certo. No entanto, com relação à atitude a ser tomada sobre o erro cometido e seu
tratamento é função apenas do professor, na visão dos alunos.
No contexto estudado, foi possível verificar que a maioria das formas de correção
efetuadas pelo professor se caracteriza pelo feedback por meio de comentários ou pela forma
indireta, apontando que um erro foi cometido. As demais formas ocorreram mas sem muita
freqüência. Nesse contexto da pesquisa, pôde-se observar que, apesar de a professora utilizar
o feedback indireto, não houve, em sala de aula, um momento para que os alunos se auto-
corrigissem, por exemplo.
Também constatou-se que mais de 90% dos movimentos corretivos identificados
partem da professora, o que vem a corresponder às expectativas dos alunos, quando estes
134

afirmam ser do professor a função de prover qualquer tipo de correção.


Vale ressaltar que não foram desenvolvidas atividades que abordassem um
posicionamento mais autônomo do aluno, em sala da aula. No entanto, de acordo com as
respostas adquiridas por meio dos questionários, a maior parte dos alunos declarou prestar
atenção ao feedback provido pelo professor.
Os efeitos do feedback também são ponto a ser discutido nesta pesquisa, pois grande
parte dos alunos participantes afirmou sentir-se incomodado com algumas formas de
feedback, principalmente quando seu erro é exposto aos colegas. Além disso, procurou-se
verificar quais estratégias motivacionais eram adotadas quando do fornecimento de feedback
nas produções escritas dos alunos, cuja análise ainda está em desenvolvimento. O processo de
conscientização dos alunos é um dos aspectos que não foi verificado, até o momento, neste
contexto pesquisado.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa – que ainda encontra-se em desenvolvimento – tem como um dos objetivos


verificar como professores respondem aos erros produzidos na escrita dos alunos do curso de
graduação em Letras, com habilitação em inglês. Conforme se observa, essas intervenções
não estão em consonância com as formas mais tradicionais de gerenciamento de erros, mas
por meio de feedback indireto, pelo qual o aluno é levado a repensar suas escolhas no uso da
língua na modalidade escrita, sendo esta a resposta para uma das perguntas a que pesquisa
pretende responder. Com relação a vivência do erro em sala de aula, observou-se que a
professora se mostrou tolerante aos erros cometidos sem, no entanto, deixar de intervir na
ocorrência de forma reparatória.
Devido a este trabalho estar baseado em um estudo em andamento, não nos foi
possível apresentar análise mais profunda dos dados. Porém, nos foi possível apreciar uma
parte dos dados que vem sendo estudados.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALLWRIGHT, D.; BAILEY, K. M. Focus on the Language Classroom. Cambridge:
Cambridge University Press, 1991.
CARDOSO, S. A. Correção e Tratamento de Erros e seus Possíveis Efeitos na Produção
Oral no Processo de Aprendizagem/Aquisição da Língua Estrangeira em Classes de
Adolescentes. Dissertação (Mestrado em Lingüística Aplicada) UNESP. 2002.
DÖRNYEI, Z; OTTÓ, I. Motivation in action: a process model o L2 motivation. Working
papers in applied Linguistics. Thames Valley University, London, v. 4, 1998. p. 43-69.
135

DÖRNYEI, Z. The Psychology of the Language Learner: Individual Differences in Second


Language Acquisition. Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates, 2005.
_________. Motivational strategies in the language classroom. Cambridge: Cambridge
University Press, 2001
ELLIS, R. The study of second language acquisition. 2.ed. Oxford: Oxford University
Press, 2008.
____________. The Study of Second Language Acquisition. Oxford: Oxford University
Press, 1994.
FERRIS, D. Treatment of errors in second language writing. Ann Arbor: The University
of Michigan Press, 2004
FIGUEIREDO, F. J. Q. Correção com os Pares: os Efeitos do Processo da Correção
Dialogada na Aprendizagem da Escrita em Língua Inglesa. Belo Horizonte: Faculdade de
Letras – UFMG, 2001. Tese de Doutorado.
___________. Aprendendo com os erros: uma perspectiva comunicativa de ensino de
línguas. Goiânia: Cegraf: Editora da UFG, 1997.
SCARCELLA, R.C.; OXFORD, R.L. The Tapestry of Language Learning: The Individual
in the Communicative Classroom. Boston: Heinle & Heinle, 1992.
USHIODA, E. The Role of Motivation. Dublin: Authentik, 1996

ATLAS PROSÓDICO MULTIMÉDIA DO PORTUGUÊS DO NORTE DO BRASIL-


AMPER-POR: VARIEDADE LINGUÍSTICA DO MUNICÍPIO DE ABAETETUBA
(PA)

Isabel Cristina Rocha REMÉDIOS (UFPA)


Orientadora: Regina Célia Fernandes CRUZ (UFPA / CNPq)

Resumo: O projeto Atlas Prosódico Multimédia do Português do Norte do Brasil-AMPER-


POR: variedade lingüística do município de Abaetetuba (PA) está vinculado ao projeto“Atlas
Prosódico Multimédia do Português do Norte do Brasil‖ que, por sua vez, está ligado ao
projeto de pesquisa europeu Atlas Multimédia Prosodique de l'Espace Roman (AMPER)44.
Está sediado no Laboratório de Ciência e Tecnologia da Fala do Campus de Cametá da
Universidade Federal do Pará (UFPA) e utiliza a infra-estrutura deste para execução de suas
atividades. O objetivo geral do referido projeto é caracterizar a variação prosódica dialetal do
português falado no Município de Abaetetuba (PA). A metodologia adotada segue as
orientações da equipe do Projeto AMPER. As gravações serão efetuadas em trabalho de
campo. As produções lingüísticas dos falantes de Abaetetuba serão gravadas, utilizando um
padrão para todas as gravações, garantindo: um registro do sinal acústico de qualidade
uniforme e uma boa representatividade da variedade dialetal. O corpus será constituído por 66
frases, SVC (Sujeito + Verbo + complemento) e suas expansões (Sintagmas Adjetivais e
Adverbiais), estruturadas com as mesmas restrições fonéticas e sintáticas, e manterá o padrão
dos corpora constituídos pelas variedades do português do projeto AMPER-POR,
possibilitando futuras análises comparativas.

Palavras-Chave: dialetologia, prosódia, português brasileiro.


136

Abstract: This study has a base on science Laboratory and speech technology campus
Cametá, UFPA, Universidade Federal do Pará, uses this infrastructure to implement their
activities. The overall objective of this project is to characterize the dialect prosodic variation
of Portuguese spoken in Abaetetuba city. The methodology follows the AMPER guidelines of
project. The recordings will be made to work in the field. The language productions of
Abaetetuba‘s speakers be recorded using a standard for all recordings, ensuring: a record of
the acoustic signal of uniform quality and a good representative of the dialect variety. The
corpus will consist of 66 sentences, SVC ( Subject + Verb + Complement ) and expansions
(Adjectival Syntagma and Adverbial Syntagma), structured with the same phonetic
restrictions and syntactic restrictions, and maintain the standard of corpora constituted by
Portuguese varieties of project AMPER- by, enabling future comparative analysis.

Keywords: dialectology, prosody, Brazilian Portuguese.

INTRODUÇÃO

O projeto Atlas Prosódico Multimédia do Português do Norte do Brasil-AMPER-


POR: variedade lingüística do município de Abaetetuba (PA) está vinculado ao
projeto―Atlas Prosódico Multimédia do Português do Norte do Brasil‖ que, por sua vez, está
diretamente ligado ao projeto de pesquisa europeu Atlas Multimédia Prosodique de l'Espace
Roman (AMPER)45, coordenado pelos professores Michel Contini e Jean-Pierre Lai, do
Centro de Dialectologie da Universidade de Grenoble 3 (França); Antonio Romano da
Universidade de Turim (Itália) e Albert Rillard do CNRS, Paris (França) e do qual fazem parte
11 (onze) outras instituições, além da Universidade Federal do Pará (UFPA), responsáveis por
investigar o português (AMPER-POR): Universidade de Aveiro (Portugal), Universidade dos
Açores (Portugal), Universidade da Madeira (Portugal), as Universidades Federais
Brasileiras: do Amazonas (UFAM), da Paraíba (UFPB), do Rio de Janeiro (UFRJ),
Fluminense (UFF), de Minas Gerais (UFMG), do Paraná (UFPR), de Santa Catarina (UFSC)
e a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo(PUCSP). O grupo de investigadores do
projeto AMPER realiza uma investigação que tem como objetivo principal o estudo da
organização prosódica das variedades faladas no espaço dialetal românico. Sendo um projeto
de abrangência das línguas românicas, contempla o português. Por esta razão, um grupo de
pesquisadores portugueses e brasileiros se reuniu com a finalidade de contribuir para um
conhecimento mais aprofundado da variação prosódica da língua portuguesa. O grupo
também planeja uma disponibilização online do corpus com a intenção de possibilitar futuras

1
http://w3.u-grenoble3.fr/dialecto/AMPER/AMPERfr_fichiers/frame.htm
137

investigações a diversos níveis da análise lingüística.


A pesquisa relativa à variação prosódica do Português (AMPER-POR46) é coordenada
pela Professora Lurdes de Castro Moutinho do Centro de Investigação de Línguas e Culturas
da Universidade de Aveiro (Portugal).
A UFPA já participa do referido projeto a convite da própria Dr. Lurdes de Castro
Moutinho, tendo sob sua responsabilidade a confecção do Atlas Prosódico Multimédia da
Região Norte do Brasil (cf. site do projeto).
O projeto Atlas Prosódico Multimédia do Português do Norte do Brasil é sediado no
laboratório de Ciência e Tecnologia da Fala do Instituto de Letras e Comunicação da
Universidade Federal do Pará (UFPA), campus de Cametá, e conta com a infra-estrutura deste
para a execução de suas atividades. O projeto em questão já produziu duas monografias de
conclusão de Curso (SANTOS JR. 2008; CASTILHO 2009), possui um plano de Iniciação
Científica (SILVA, em andamento) e desde 2009 a coordenadora do projeto teve aprovada
uma bolsa de Produtividade do CNPq (PQ2) com este mesmo projeto pelo Edital do CNPq
PQ 10/2008 (Processo 303455/2008-0).
Para comprovar a relevância do tema escolhido, temos como justificativa, o fato de o
conhecimento do sistema prosódico das línguas latinas ainda continuar muito fragmentado. Na
maior parte dos casos, não se dispõe de resultados experimentais que considerem todas as
possibilidades de variação que o fenômeno exige. A situação se agrava ainda mais quando se
consideram as investigações concluídas, seja por serem quantitativamente insignificantes, seja por
impossibilitarem estudos contrastivos capazes de dar conta deste tipo de variação, considerando as
investigações que já foram concluídas. Isto se deve a diversos fatores:
a) a inexistência de uma abordagem objetiva, considerando que o dialetólogo interessado neste
campo de pesquisa não possui na maior parte dos casos formação satisfatoriamente sólida no
domínio da fonética acústica experimental;
b) a escassez de laboratórios de fonética equipados para este tipo de pesquisa;
c) a complexidade de tal análise deve considerar o enorme grau de variação física da fala, assim
como diversos outros parâmetros, seja em nível da percepção seja em nível da produção;
d) a dificuldade de se conceber procedimentos metodológicos suficientemente abrangentes que
tornem possíveis a comparação entre as estruturas entoacionais das diferentes línguas latinas.
Apesar de todas essas dificuldades, o interesse científico pela variação prosódica tem

2
www2.ii.ua.pt/cidlc/gcl/AMPER-POR.ht
www2.ii.ua.pt/cidlc/gcl/
138

tomado certo impulso nestas últimas décadas. Entretanto, os métodos de análise e


interpretação dos dados acústicos, sendo bastante destoantes, tornam praticamente impossível
a comparação dos dados obtidos a partir dessas investigações (Hirst & Di Cristo 1998; Pereira
et al 1992; Morais 1994; Marotta 2000; Profili & Martin 1987; D‘Alessandro et al. 1994;
Bailly & Aubergé 1997; Di Cristo & Hirst 1996; Rossi 1999).
Cônscios dessa situação, os membros da equipe do Centro de Dialetologia de Grenoble
(França) desenvolveram uma metodologia comum de pesquisa (Contini et al. no prelo; De
Castro Moutinho et al. 2001; Romano 1999) com o objetivo de contribuir para um
conhecimento mais aprofundado da variação prosódica das línguas latinas.
É com esta configuração e com estes objetivos que nasce o Projeto Atlas Multimédia
Prosodique de l'Espace Roman (AMPER).
No que diz respeito a comunidade lingüística investigada, para a constituição do
corpus, será realizada pesquisa de campo no município de Abaetetuba (PA) que faz parte da
área de atuação do projeto principal, que investiga o dialeto da Amazônia interiorana
paraense.
O português regional paraense é também aquele considerado por Silva Neto (1957) como
sendo o de canua cheia de cucus de pupa a prua, por conta de sua principal marca dialetal o
alteamento das vogais posteriores em posição de sílaba tônica. A localidades escolhida para o
presente trabalho faz parte, portanto, da área do dialeto ―canua cheia de cúcus de pupa a
prua”, falar esse característico do município de Abaetetuba (PA).

OBJETIVOS
Objetivo geral
O presente projeto tem como objetivo principal caracterizar a variação prosódica dialetal
do português falado no município de Abaetetuba (PA).
Objetivos específicos
Com a perspectiva de delinear a variação dialetal do nível prosódico do português regional
paraense, são previstas:
1. constituição de um corpus prosódico com amostras dialetais do português falado no
município de Abaetetuba (PA);
2. disponibilização do corpus formado on line;
3. análise instrumental dos aspectos prosódicos do português falado no município de
Abaetetuba (PA).
139

METODOLOGIA

Todos os procedimentos metodológicos adotados no presente estudo seguirão as


orientações estabelecidas pela equipe do Projeto AMPER na condução da formação dos
corpora para os Atlas prosódicos multimídias das línguas românicas.
Todas as gravações serão efetuadas em trabalho de campo, vindo a constituir uma base
de dados, sobre a qual incide a nossa análise.
Relativamente ao português regional do Norte do Brasil, Abaetetubua é a região que
constitui objeto de estudo do presente pré-projeto, como já mencionado acima.
As produções lingüísticas dos falantes da localidade selecionada serão gravadas,
utilizando o mesmo procedimento para todas as gravações, de forma a garantir um registro do
sinal acústico de qualidade uniforme e garantir uma boa representatividade da variedade
dialetal.

Constituição do Corpus

O corpus é composto de 66 frases que foram estruturadas obedecendo às mesmas


restrições fonéticas e sintáticas, a fim de se manter o mesmo padrão para todos os corpora
coletados nas três variedades do português que fazem parte do projeto AMPER-POR, a saber:
português continental, português insular e português do Brasil
A adaptação semântica dessas frases para o PB foi feita pelos professores Plínio
Barbosa (Unicamp), João Moraes (UFRJ) e Jussara Abraçado (UFF). O objetivo de se usar o
mesmo corpus para todas as variedades do português é o de possibilitar uma análise
comparativa das variedades estudadas e o de contribuir para um conhecimento mais
aprofundado da variação prosódica da língua portuguesa .
Dessa forma, as frases utilizadas nas gravações que irão compor o corpus da localidade
estudada e que serão analisadas neste trabalho são do tipo SVC (Sujeito + Verbo +
complemento) e suas expansões com a inclusão de Sintagmas Adjetivais e Adverbiais. As
frases estão estruturadas sintaticamente da seguinte maneira: 1) possui apenas três
personagens: Renato, pássaro e bisavô; 2) três sintagmas adjetivais: nadador, bêbado e pateta;
3) três sintagmas adverbiais indicadores de lugar: de Mônaco, de Veneza e de Salvador; e 4)
um único verbo: gostar.
Assim, as combinações de todos os sintagmas permitiram organizar as frases de 47
maneiras possíveis. Sendo assim, as 66 frases do corpus correspondentes aos sinais acústicos
140

gravados foram codificados de acordo com a organização sintática da frase e de acordo com o
tipo entoacional.
Quadro 01 - composição sintática e prosódica das 66 frases do corpus gravado e seus códigos
correspondentes.
Elementos sintáticos Tipos Código
Personagem O bisavô N1
O Renato N2
O pássaro N3
Verbo Gostar V
Sintagmas Adjetivais Nadador Adj1
Pateta Adj2
Bêbado Adj3
Sintagmas Adverbiais De Mônaco y
De Veneza
De Salvador
Ø47 Ø w
Modalidade entoacional Declarativa a
Interrogativa i
Fonte: Santos Jr. (2008: 21

Foneticamente, as frases foram estruturadas em duas modalidades entoacionais:


declarativa e interrogativa, codificadas de acordo com o quadro 01 acima. Todas as frases
foram constituídas por vocábulos representativos das diversas estruturas acentuais ( oxítona,
paroxítona e proparoxítona) e nas diversas posições da frase, a formar sílabas em que as
vogais ocorressem no mesmo contexto fonético de consoantes não vozeadas a fim de reduzir
alguns problemas postos por fenômenos de coarticulação e garantir uma fácil e rigorosa
segmentação do sinal acústico.
Cada um dos elementos constituintes das frases possui uma representação visual. Essas
representações foram combinadas para formar as 66 frases utilizadas para a obtenção das
gravações. Os informantes não terão em nenhum momento contato com as frases escritas.
As gravações das repetições serão feitas por meio de projeção dessas representações.
A partir das combinações dessas representações, projetar-se-á cada uma das 66 frases para
os informantes. Nas formas interrogativas, acrescentou-se o símbolo ‗?‘.
Conforme determina o projeto geral - AMPER-POR - os informantes selecionados para
a formação dos corpora devem atender aos seguintes critérios: 1) ser nativo do local onde foi
feita a coleta de dados ou ter vivido a maior parte de sua vida nesse local; 2) ter idade acima

47
Indica ausência de sintagmas adverbiais.
141

de trinta anos; e 3) ter escolaridade até, no máximo, o ensino médio. A partir desses critérios,
deveriam ser selecionados quatro informantes, dois homens e duas mulheres.
A seleção dos informantes, de ambos os sexos (dois homens e duas mulheres, de
preferência, com mais de 30 anos de idade e cujo grau de escolaridade não deve exceder o 9º
ano), obedece a critérios de representatividade e espontaneidade. A cada informante serão
pedidas seis repetições da série de frases do corpus (em ordem aleatória), sendo selecionadas
para análise as três melhores repetições, a fim de se poderem estabelecer médias nos diversos
parâmetros a analisar: duração, F0 e intensidade. Cada informante receberá um código de
acordo com o sistema de notação adotado pela coordenação do projeto AMPER - POR.
As gravações serão realizadas na própria casa dos informantes, para garantir a
espontaneidade do discurso. Para a gravação serão utilizados um aparelho MD SONY MZ-
R900, um microfone SONY estéreo e um notebook.
Por meio dos slides exibidos pelo computador no programa powerpoint, serão
projetadas as figuras formadoras das 66 frases de forma visual aos informantes, sem
apresentar-lhes suas formas escritas. A cada informante serão pedidas seis repetições da série
de frases do corpus (em ordem aleatória), no momento da gravação propriamente dita. As
gravações serão feitas sem interrupção até a última frase.
O projeto está, ainda em andamento, na fase de trabalho de campo, concluindo-se a
coleta de dados, tendo como data de previsão para qualificação da dissertação da aluna, o mês
de junho de 2012.
O material gravado terá as seguintes etapas de tratamento: a) Codificação das
repetições; b) Segmentação vocálica dos sinais selecionados no programa PRAAT; c)
Aplicação do script Praat; d) Seleção das três melhores repetições; e) Aplicação da interface
Matlab para se obter as médias dos parâmetros das três melhores repetições.
No caso da Codificação das repetições, retomou-se o código do informante, contendo o
seu perfil e acrescentou-se o código de cada frase já estabelecido pelo Projeto AMPER.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAILLY, G. & AUBERGÉ, V. ―Phonetic representation for intonation‖. In J. Ph. Van


Stander (ed), Progress in Speech Synthesis. New York: Springer, 1997, pp. 435-441.
CASSIQUE, Orlando. Minina bunita de olhos esverdeados: um estudo variacionista da
nasalização no português da Cidade de Breves-PA.. Dissertação de Mestrado, UFPA, 2002.
CASSIQUE, Orlando. Projeto de Doutorado “Linguagem, Estigma e Identidade no Interior da
Amazônia Paraense: um exame de base variacionista da nasalidade vocálica pretônica no município
de Breves (PA)”, 2006. (Projeto de Pesquisa. Inédito).
142

CASTILHO, Francinete Carvalho. Formação de Corpora para o Atlas Dialetal Prosódico


Multimídia do Norte do Brasil: Variedade Lingüística de Bragança (PA). BRAGANÇA:
UFPA- Campus de Bragança- Faculdade de letras, Em andamento.. (Trabalho de Conclusão
de Curso em Letras).
CONTINI, M.; LAI, J. P.; ROMANO, A. & Roullet S. ―Vers um atlas prosodique parlant dês
variétés romanes‖. Mélanges em honneur de X. Ravier (no prelo).
D’ALESSANDRO, C.; BEAUGENDRE, F. & MERTENS, P. ―Automatic stylisation of
intonation: applicationsto speech synthesis‖. 2nd ESCA Workshop on Speech Synthesis. New
York: Mohonk, 1994, pp. 155-158.
DE CASTRO MOUTINHO, Lurdes; COIMBRA, R.L; SECCA RUIVO, S. & PEREIRA
BENDIHA,U. ― Atlas Prosódico Multimédia: curvas de uma trajetória‖. Actas do XVI
Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Lingüística. Colibri, 2001, pp. 387-39.
DI CRISTO, Albert & HIRST, Daniel. ―Modelling French micromelody‖. Phonetica 43 (1),
1996, pp. 11-30.
HIRST, Daniel & DI CRISTO, Albert. Intonation systems: a survey of twenty languages.
Cambridge: Cambridge Univarsity Press, 1998.
MADUREIRA, Sandra. ―Notação entoacional do português brasileiro em corpora de fala
espontânea‖. Revista Intercâmbio- PUC – SP: São Paulo, 2007.
MAROTTA, G. ―Allinamento e transcrizione dei toni accentuali complesi: uma proposta‖.
Atti dalle X G. di St. Del GFS (Napoli 1999). Napoli: Ist. Univ. Orientale, 2000.
MORAIS, Barbosa Joaquim. ―Entoação e Prosódia‖, in Holtus G. et al. (eds), Lexicon der
Romanistischen Linguistik, Band IV, 2, 1994, pp. 243-248.
PEREIRA, I.; MATA, A.I. & FREITAS, M. J. Estudos em Prosódia. Lisboa:Editora Colibri,
1992. Profili, O. & Martin, Philippe. ―Antonio mangia la zuppa inglese. Phonetic and
Phonological Aspects of Italian Sentence Intonation‖. Atti dell‟ XI ICPhS, Tallinn, 1987.
ROMANO, A, Analyse dês estructures prosodiques dês dialectes et de I‘italien regional
parlés dans lê Salento (Italie): appriche linguistique et instrumentale. Tesi de Dottorato in
Sciences du Langage, Université Stendhal, Grenoble, vol.2, 1999.
ROSSI, M. L‘intonation. Le systèmy du fraçais: descrption et modélisation. Gap: Ophrys,
1999.
SANTOS JR., Manoel Fonseca dos. Formação de corpora para o Atlas Dialetal Prosódico
Multimédia do Norte do Brasil: variedade lingüística de Belém. Belém: UFPA/ILC/FALE,
2008. (Trabalho de Conclusão de Curso em Letras).
SILVA NETO, Serafim da. Introdução ao Estudo da Língua Portuguesa no Brasil. 4 ed. Rio
de Janeiro, Presença, 1977 [1957].
VALENTE, Rayra. Atlas prosódico multimédia do Português do Norte do Brasil – AMPER-
POR: variedade lingüística da zona rural de Belém (PA). Belém: UFPA. Em andamento.
(Plano PIBIC/CNPq).

A VARIAÇÃO DO /S/ NO FALAR AURORENSE

Jany Éric Queirós FERREIRA (CML/UFPA)


Orientador: Regina Célia Fernandes CRUZ (UFPA/CNPq)

RESUMO: O presente projeto de pesquisa tem como tema a variação do /s/ no falar de
Aurora do Pará. Pauta-se nos pressupostos teóricos da sociolinguística (BORTONI-
143

RICARDO, 1985). Acredita-se que a variação do /s/ presente nesta variedade linguística tenha
reflexo da influência dos dialetos que migraram para esta região do Pará. O objetivo principal
do presente projeto é descrever a variação fonética do /s/ no português falado em Aurora do
Pará, levando-se em conta os fatores lingüísticos e extra-lingüísticos que poderão influenciar e
condicionar o fenômeno pesquisado, caracterizando-o sociolinguisticamente este falar. A
pesquisa será realizada no município de Aurora do Pará, localizado na Mesorregião do
Nordeste Paraense. Dois grupos de informantes serão formados: a) um grupo de ancoragem a
ser formado com 24 informantes (12 do sexo masculino e 12 do sexo feminino), distribuídos
em duas faixas etárias de 26 a 46 anos e acima de 50 anos; b) um grupo de controle de 12
informantes (6 do sexo masculino e 6 do sexo feminino), descendentes do grupo de
ancoragem. Uma vez o trabalho de campo concluído, o tratamento dos dados seguirá todas as
etapas previstas em um estudo sociolingüístico, a saber: (i) transcrição dos dados no moldes
da análise da conversação (CASTILHO 2003); (ii) triagem dos grupos de força (CAMARA
JR. 1969); (iii) transcrição fonética dos vocábulos contendo marcas dialetais, utilizando-se o
alfabeto SAMPA; (iv) codificação dos dados e; (v) tratamento quantitativo VARBRUL.

PALAVRAS-CHAVE: sociolinguística, variação fonológica, português brasileiro.

ABSTRACT: This paper has as theme the variation of the /s/ in the speech of Aurora (Pará)
city.This work is based on the assumptions of the linguistics‘ theoricals (BORTONI-
RICARDO, 1985). It is believed that the variation of the /s/ present in this linguistic variation
is a reflex of the dialects that migrated to this particular region. The main objective of this
paper is to describe the fonetic variation of the /s/ in the spoken portuguese in ―Aurora do
Pará‖, taking in consideration the linguistical and extra linguistical factors that may influence
and condition the researched phenomenon, caractrizing it social-linguistically. The research
will be made in the town of Aurora, located in Pará‘s Northeast. Two groups of informants
will be formed: a) a group of anchorage with 24 informants (12 men and 12 women), between
the ages of 26 and 46 years-old and above fifty years-old; b) a control group of twelve
informants (6 men and 6 women), descending of the anchorage group. Once the field work is
concluded, the data treatment will follow all the steps of a social linguistic study, as follows:
(i) transcription of the data in the shape of conversation analysis (CASTILHO, 2003); (ii)
selection of the force groups (CAMARA JR, 1969); (iii) phonetic transcription of the words
with dialect marks, using the SAMPA alphabet; (iv) data codification and; (v) VARBUL
quantitative treatment

KEYWORDS: social linguistics; phonological variation; brazilian portuguese.

INTRODUÇÃO:

A ―evidente‖ certeza da variação linguística só tem valor quando atestada pelos


pressupostos e métodos científicos, comprovados por meio de pesquisas. O estudo e análise
de questões linguísticas voltadas para a variação, sejam elas de qualquer natureza, fonético-
fonológicas, morfossintáticas, semântico-lexicais, etc atestam que a língua é heterogênea. O
registro dos mecanismos que envolvem as línguas humanas é de suma importância para se
compreender como o homem faz uso desse instrumento servindo-se dele para seu próprio
progresso.
144

O reconhecimento da necessidade de descrever a realidade lingüística brasileira


constitui um compromisso de grande parte dos lingüistas, em especial dos dialetólogos e
sociolinguistas, estes desde a década de 60, conforme Carvalho (2000), têm-se ocupado com
análise e descrição dos vários aspectos do português falado no Brasil. A pesquisa linguística
tem comprovado que a ideia saussureana da língua homogênia é falsa e, que por trás do
aparente ―caos linguístico‖, como diz Tarallo (2003), há uma regularidade dos fatos da língua.
Assim, começa-se a dar o devido valor às variantes lingüísticas, às diversas maneiras de dizer
a mesma coisa em um mesmo contexto e como o mesmo valor de verdade (TARALLO,
2003).
Dentro dessa perspectiva, o presente estudo, pauta-se em um dos aspectos do falar
aurorense, a variação do /s/, e este vinculado ao Projeto Vozes da Amazônia sediado na UFPA
que por sua vez é vinculado diretamente ao Diretório de Pesquisa Nacional PROBRAVO.
Além de Aurora do Pará, em outras cidades está sendo realizada a pesquisa: Marabá, por
Soelis Mendes; e Breves, por Giselda Fagindes. O objetivo central do Vozes é o de mapear a
situação sociolingüística diagnosticada por Cruz et al (2009) identificada na Amazônia
paraense, onde se atesta contato interdialetal decorrente de fluxo migratório intenso motivado
por projetos econômicos na região Amazônica ou outros fins.
Em Aurora do Pará, o estudo busca descrever a variação fonética do /s/ no
português falado por migrantes que vieram para essa cidade, levando-se em conta os
fatores lingüísticos e extralingüísticos que poderão influenciar e condicionar o fenômeno
pesquisado. Para isso visa identificar quais fatores lingüísticos interferem no
condicionamento das variantes do /s/; relacionar aspectos de variação inter e
intradialetal para explicar o comportamento do /s/ no dialeto da zona urbana de Aurora
do Pará(PA); caracterizar sociolinguisticamente o português falado em Aurora do Pará
(PA); identificar fatores sociais favorecedores da variação dialetal do português falado
em Aurora do Pará (PA).

CONTEXTUALIZANDO A PESQUISA

Aurora do Pará é uma cidade que recebeu bastante migrantes nordestinos, sobretudo, do
Ceará. Devido a isso possui características peculiares em sua cultura e língua; o fluxo
migratório dessa região se deu por volta dos meados do século XIX quando da abertura da
rodovia Belém-Brasília que atraiu para região projetos de exportação de madeira e,
posteriormente, a agricultura. Sucessivamente a isso, passou a cultivar malva e algodão que
145

tevem sua decadência nos anos 1960. Na década de 70 a 80, com a penetração da colônia
Japonesa em Tomé-açu, o municipio também começa a cultivar pimenta do reino. Todas essas
atividades econômicas atraiam para região muitos migrantes, que vinham convidados de seus
conterrâneos, a maioria era nordestinos e poucos paraenses. Com a decadência dessas
atividades, muitos desses migrantes passaram a desempenhar atividades de agricultura em
colônias próximas a área urbana do município. Atualmente, a economia local sobrevive
basicamente da agricultura e de empregos públicos, que trouxe para cidade,no início do século
XIX, com a realização de concursos públicos no município, várias pessoas de outras cidades
do Pará, e mesmo outros estados. Diante da gama de migrantes nessa região questiona-se
como se realiza o /s/ no falar aurorense? Os contextos fonético-fonológicos podem interferir
na realização de determinada variente de /s/? O uso do /s/ em Aurora do Pará é diferente do
utilizado em outras regiões já estudadas sobre esse fenômeno? Dentre outras.

PERCURSOS METODOLÓGICOS:

Para a realização do trabalho de campo, estabelemos a metodologia utilizada também


nas outras localidades onde se realiza o projeto Vozes da Amazônia, cujos perfis possuem
traços de fluxo migratórios nas quais se adota dois caminhos metodológicos, unindo pesquisa
quantitativa e pesquisa qualitativa, seguindo modelo de Bortoni-Ricardo(1985).
O locus da pesquisa é a cidade de Aurora do Pará, cuja sede do município está
localizada à 200km da capital paraense, Belém. Possui, segundo CENSO (2010), população
de 26.556 pessoas. A pesquisa se realiza apenas na zona urbana, sede do município, que é
dividida em três bairros: centro, que concentra o comércio e as principais escolas, bem como
igrejas-sede, a praça principal da cidade, além de boa parte dos moradores mais antigos; Vila
Nova, bairro mais afastado por conta de um pequeno rio que o corta, é junto ao bairro centro,
um dos mais antigos; Aparecida, bairro mais novo, e é o que concentra, nesses ultimos
tempos, grande quantidade de moradores vindos de diversas regiões. Os três totalizam 8.168
pessoas (CENSO 2010).
Para compor o corpus foram selecionados 32 informantes, divididos em dois grupos.
Um grupo de ancoragem formado com 24 informantes (12 do sexo masculino e 12 do sexo
feminino), distribuídos em duas faixas etárias de 26 a 46 anos e acima de 50 anos. E um grupo
de controle de 12 informantes (6 do sexo masculino e 6 do sexo feminino), os quais devem
ser filhos, netos ou sobrinhos do grupo de ancoragem.
146

O grupo de ancoragem serve de base para a pesquisa, e é composto por falantes não
nativos do Estado, oriundo do Ceará. O grupo de controle, que servirá como parâmetro para o
grupo de ancoragem, é composto por jovens nascidos na mesma região proveniente de seus
ascendentes, que vieram ainda crianças para Aurora do Pará, locus do presente projeto ou
mesmo que já tenha nascido no município onde se realiza a pesquisa.
Durante a coleta de dados, utilizamos a técnica de narrativas de experiência pessoal
(Tarallo 1988), tomando cuidado para registrar o vernáculo dos falantes. O tema das
narrativas giram em torno da vinda destes para o estado, além de outros assuntos direcionados
pelo questionário-guia. A técnica da narrativa é válida para nossa pesquisa devido o fenômeno
estudado ser bastante produtivo na fala.
Análise dos dados, que ocorrerá posterior à coleta, será feita à luz do tempo da duração
da residência na localidade escolhida, dos anos de escolaridade, da estabilidade de emprego
dos informantes selecionados, além dos parâmetros usuais de sexo e idade, como fizera
Bortoni-Ricardo (1985) ao proceder a um estudo sociolingüístico sobre a difusão dialetal no
repertório dos falantes do português no Brasil que migram da região rural para a urbana.
Tal como Bortoni-Ricardo (1985), considera-se fatores sócio-ecológicos e variáveis
independentes na correlação com o comportamento lingüístico. Segundo a autora, o melhor
instrumento para lidar simultaneamente com as diferenças individuais e com a identificação
da variação sutil dos padrões sistemáticos é o da analise das redes sociais dos migrantes, já
usado anteriormente em sociolinguistica correlacional (Labov, 1972; Milroy, 1980).A rede
social é o conjunto de ligações que se estabelecem entre indivíduos, conforme Bortoni-
Ricardo (1985 apud Cunha [s.d.]). Ela é útil em investigações sociolingüísticas envolvendo
comunidades lingüísticas de migrantes, no caso de Aurora, quando o interesse da investigação
não está nos atributos dos indivíduos, mas na caracterização das relações de um com outro, a
qual pode predizer e explicar o comportamento destes indivíduos, inclusive o comportamento
lingüístico.
Além da rede de relações sociais, vamos utilizar nas análises o conceito de grupo de
referência dos falantes, que para Bortoni-Ricardo (1985), é aquele que serve de alavanca à
construção da identidade do indivíduo, ou seja, o falante modela seu discurso de acordo com o
grupo com o qual ele busca identificar-se, o grupo que atende as suas expectativas
psicossociais. A partir de fatores sócio-ecológicos como variáveis independentes, e,
considerando como variáveis intervenientes tanto a rede social como o grupo de referência,
Bortoni-Ricardo (1985) estabelece um modelo metodológico, eficiente e inovador, para a
147

explicação da variável dependente, o comportamento lingüístico, como pode ser visualizado


no esquema 1, abaixo:
Esquema 1 – Relação estabelecida entre as partes componentes do
modelo metodológico de Bortoni-Ricardo (1985).

Fonte: Bortoni-Ricardo (1985).

Uma vez o trabalho de campo concluído, o tratamento dos dados seguirá todas as etapas
previstas em um estudo sociolingüístico, a saber: (i) transcrição dos dados no moldes da
análise da conversação (Castilho 2003); (ii) triagem dos grupos de força (Câmara Jr. 1969);
(iii) transcrição fonética dos vocábulos contendo marcas dialetais, utilizando-se o alfabeto
SAMPA; (iv) codificação dos dados e; (v) tratamento quantitativo VARBRUL.

PESQUISA DE CAMPO: ALGUMAS INFORMAÇÕES:

A pesquisa está sendo realizada desde o mês de setembro de 2011. Conta com o apoio
de uma professora bastante conhecida na cidade que nos auxilia na procura e execução da
coleta de dados. No início da pesquisa fazíamos duas visitas à casa dos informantes, uma para
o primeiro contato e outra para a coleta. Todavia, percebendo o grau de intimidade com os
informantes, grande parte conhecidos nossos, achamos desnecessárias essas visitas. Assim, no
primeiro contato coletamos os dados.
As conversas com os informantes acontecem sempre nas dependências de suas casas,
sala ou cozinha; Sempre é feita uma pequena introdução sobre o trabalho e uma breve
conversa antes de iniciarmos a coleta de dados, por meio da gravação, que é iniciada sempre
na mesma situação discursiva. Até o momento, foram coletados dados de nove informantes do
grupo de ancoragem, sendo cinco mulheres e três homens, da faixa etária acima de 50, e um
da faixa etária de 26 a 46, do sexo masculino.
Dentre as dificuldades em se realizar o trabalho de campo está a dificuldade de
encontrarmos informantes, do sexo masculino, na faixa etária de 26 a 46 anos. Isso ocorre
porque grande parte dos migrantes possuem mais de 50 anos e por terem vindo para o
município na década de 50 a 60. Ainda não foram feitas nenhuma análise dos dados já
148

coletados, porque queremos terminar a etapa da coleta, que está prevista para no máximo final
de novembro. A duração desses dados é em torno de 30 a 40 minuntos. As gravações estão
sendo feitas, geralmente finais de semana com gravador digital.

CONSIDERAÇÕES:

Como pudemos compreender com a leitura deste texto, da pesquisa aqui implementada,
não há nenhum resultado sobre o fenômeno da variação do /s/ em Aurora do Pará-PA, isso
porque a pesquisa ainda é bastante recente, faz parte de nossa dissertação de mestrado em
Letras-Linguística, realizado na Universidada Federal do Pará. Do que já foi realizado e
obervado em nossa pesquisa, algumas hipóteses podem ser levantadas. Dentre elas está o fato
do /s/ variar na fala do mesmo falante em contextos fonéticos distintos. Acredita-se também
que a variante fricativa alveola surda seja a mais produtiva. As variantes do /s/ ocorrem de
forma idênticas tanto da fala de nativos (grupo de controle) como na fala de migrantes (grupo
de ancoragem) nos mesmos contextos fonéticos. Esperamos, desse modo, ao concluir nosso
trabalho contribuir para que futuros estudos possam ser realizados a partir dele, sejam os de
cunho comparativo ou aqueles que possam utilizar os dados para outras análises.

REFERÊNCIAS:

AGUILERA, Vanderci de Andrade. A Geolinguistica no Brasil: trilhas seguidas, caminhos a


percorrer. Londrina:Eduel, 2005.
BRANDÃO, Silvia Figueiredo. A geografia lingüística no Brasil. São Paulo: Ática, 1991.
CALLOU, Dinah; LEITE, Yonne. Iniciação à fonética e fonologia do português. 7 ed. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000.
CALVET, Louis-Jean. Sociolinguística: uma introdução crítica. Trad. Marco Marcionilo.
São Paulo: Parábola, 2002.
CARDOSO, Suzana Alice Marcelino. Dialetologia: trilhas seguidas, caminhos a perseguir.
D.E.L.T. A. Revista de Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e Aplicada. São
Paulo/SP, Número especial, v 17, p. 25-44: EDUC, 2001.
CARVALHO, Rosana Siqueira de. Variação do /s/ pós-vocálico na fala de Belém.
Dissertação (Mestrado em Linguística). Instituto de Letras, Universidade Federal do Pará,
Belém, 2000.
DUBOIS, Jean et al. Dicionário de lingüística. 8 ed. São Paulo: Cutrix, 2001.
FERREIRA, Carlota; CARDOSO, Suzana Alice. A dialetologia no Brasil. São Paulo:
Contexto, 1994.
FERREIRA, Jany Éric Q. Algumas faces dos estudos lingüísticos. Lato e Sensu. Belém, PA,
n. 1. pág 70-79, jun. 2005.
FIORIN, José Luiz.(org.) Introdução à lingüística: princípio de análise. 3 ed. São Paulo:
Contexto, 2003.
MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna Christina. Introdução à lingüística: domínios e
fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001.
149

RAZKY, AbdelhaK.(org). Estudos geo-sociolingüísticos no estado do Pará. Belém: UFPa,


2003.
SAUSSURE, Ferdinad de. Curso de lingüística geral. São Paulo: Cutrix, 1916.
SILVA, Thais Cristófaro. Fonética e fonologia do português: roteiro de estudos e guia de
exercícios. São Paulo: Contexto, 2002.
TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolingüística. São Paulo: Ática, 2003.
BORTONI-RICARDO, Stella M. The urbanization of rural dialect speakers: a
sociolinguistic study in Brazil. Cambridge: Cambridge University Press, 1985. 265p.
CAMARA JR, Joaquim Mattoso. Estrutura da Língua Portuguesa. Petrópolis: Vozes,
1969.
CAMPELO, Maria Madalena. A Variação das Vogais Médias Anteriores Pretônicas no
Português Falado no Município de Breu Branco(PA): uma Abordagem Variacionista.
Belém: UFPA/ILC/FALE, 2008. (Trabalho de Conclusão de Curso em Letras).
CAMPOS, Benedita M. do S. Pinto. Alteamento vocálico em posição pretônica no
português falado no Município de Mocajuba-Pará. 2008. Dissertação (Curso de Mestrado
em Letras) – Universidade Federal do Pará, Belém: UFPA. Orientador: Regina Célia
Fernandes Cruz.
CASTILHO, Ataliba de. A língua falada no ensino do português, 5ª. Edição. São Paulo:
Contexto, 2003.
CASSIQUE, Orlando. Projeto de Doutorado “Linguagem, Estigma e Identidade no
Interior da Amazônia Paraense: um exame de base variacionista da nasalidae vocálica
pretônica no município de Breves (PA)”, 2006. (Projeto de Pesquisa. Inédito).
SOUSA, Josivane do Carmo Campos. A Variação das Vogais Médias Pretôncias no
Português Falado na área Urbana do Município de Belém (PA). Dissertação (Curso de
Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Pará, Belém: UFPA. 2010.
BORTONI-RICARDO, Stella M. The urbanization of rural dialect speakers: a
sociolinguistic study in Brazil. Cambridge: Cambridge University Press, 1985. 265p.
CARILHO, Ataliba. Análise da Conversação. São Paulo: Átiva, 2003.
CÂMARA JR, Joaquim Matoso. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis: Vozes, 1969.

IMAGENS PRÉVIAS DA VARIAÇÃO LEXICAL NO ATLAS GEO-


SOCIOLINGUÍSTICO DO PARÁ

Regis José da Cunha GUEDES (UFPA)


Abdelhak RAZKY (UFPA)

RESUMO: Os estudos no âmbito da variação lexical vêm ganhando destaque no estado do


Pará a partir do levantamento e atualização do corpus do projeto Atlas Geo-sociolinguístico do
Pará (ALIPA) entre 1999 e 2011. Seguindo esta tendência, o presente estudo, tendo por base o
banco de dados do projeto ALIPA, tenta dar conta da variação lexical na zona rural do estado
do Pará. Para tanto, foram cartografados e analisados dados de doze municípios do estado,
sendo dois de cada uma das seis mesorregiões paraenses. Neste intuito, foram adotados os
pressupostos teórico-metodológicos da Dialetologia e da Geografia Linguística, que observam,
analisam e cartografam as variantes linguísticas inter-relacionadas aos fatores sociais. No que
diz respeito à área de pesquisa em Geografia Linguística, observa-se a grande carência de tais
estudos no estado do Pará. O presente estudo organiza e mapeia uma parcela do corpus
coletado por pesquisadores do projeto GeoLinTerm para a elaboração do Atlas Geo-
sociolinguístico do Pará (ALIPA), além de traçar um paralelo entre as lexias ocorridas e o
registro das mesmas em outros atlas e em dicionários de língua portuguesa.
150

Palavras-chave: Variação Lexical, Dialetologia, ALIPA.

ABSTRACT: Studies in the variation have been gaining prominence in the state of Pará para
the survey and update of the corpus of the Atlas project Geo-sociolinguistic Pará (ALIPA)
Between 1999 an 2011. Following this trend, the present study, based on the database project
ALIPA, tries to give an account of lexical variation in a rural area of Pará has thus been
mapped and analyzed data from twelve municipalities in the state, two of each of the sixmese
Pará. To this end, we adopted the theorical and methodological principles of linguistics and
geography, they observe, analyse and map the linguistic variant sinterrelated social factors.
Regarding the area of research in Geography Linguistics, there is adearth of such studies in
the state of Pará. The study organizes and a portion of thecorpus collected by researchers on
the projectfor the development GeoLinTerm Atlas Geosociolinguistic Pará (ALIPA), and
draw a parallel between lexias occuring anr record the same in other atlases and dictionaries
of the portuguese language.

Key words: Lexical Variation, Dialectology, ALIPA.

1 INTRODUÇÃO
Este estudo sobre a variação lexical no estado do Pará é uma colaboração a um projeto
mais amplo: o Atlas Geo-sociolinguístico do Pará (ALIPA), que está em fase de elaboração,
além deste, outros trabalhos já foram publicados utilizando dados ALIPA, inclusive o Atlas
Linguístico Sonoro do Pará - ALiSPA (RAZKY, 2004), que tratou os dados da pesquisa em
zona urbana do projeto. O estudo que aqui se apresenta identifica, cartografa e analisa dados
da pesquisa em zona rural do referido projeto, para tanto, foram selecionados e cartografados
dados de doze municípios, sendo dois de cada uma das seis mesorregiões paraenses, valendo-
se dos pressupostos teórico-metodológicos da Dialetologia e da Geolinguística.
Vários aspectos mostram a relevância de pesquisas como esta que aqui se apresenta,
dentre eles, vale ressaltar a urgência que há no registro e preservação da diversidade lexical
do português, em especial dos falares das zonas rurais. Sobre isso, Couto (2009, p. 146) alerta
que a diversidade linguística representa riqueza, para ele, contudo, essa diversidade está em
perigo de desaparecimento.
Em termos gerais, o objetivo deste trabalho é identificar, cartografar e analisar a
variação lexical na zona rural de doze municípios do estado do Pará, sendo dois de cada uma
das seis mesorregiões paraenses, quais sejam: Santarém e Oriximiná (Mesorregião do Baixo
Amazonas); Anajás e Breves (Mesorregião do Marajó); Castanhal e Santo Antônio do Tauá
(Mesorregião Metropolitana de Belém); Abaetetuba e Bragança (Mesorregião Nordeste);
Altamira e Itaituba (Mesorregião Sudoeste); e Conceição do Araguaia e Redenção
(Mesorregião Sudeste), no intuito de projetar imagens prévias da variação lexical na zona
151

rural do estado do Pará, a partir de uma amostragem dos dados que compõem o corpus do
Atlas Geo-sociolinguístico do Pará, que está em fase de elaboração.
Em termos específicos este trabalho objetiva:
 mapear a variação lexical diatópica (espacial), diagenérica (sexo) e diageracional
(faixa etária) que ocorre na fala dos informantes selecionados;
 confeccionar cartas lexicais correspondentes a uma amostragem dos dados
coletados nos referidos municípios;
 analisar os resultados obtidos, como: produtividade dos campos semânticos, os
processos ocorridos na constituição das lexias, etc.
 Investigar a ocorrência das lexias registradas em outros atlas e em dicionários de
língua portuguesa;
Espera-se que este estudo sirva como fonte de informações para linguístas,
historiadores, sociólogos, antropólogos e pesquisadores de outras áreas afins, acerca do
português brasileiro falado na zona rural do estado do Pará.

2 DIALETOLOGIA, GEOGRAFIA LINGUÍSTICA E SOCIOLINGUÍSTICA

No que tange à conceituação da Dialetologia, Dubois (1978, p. 185) designa a mesma


como

[...] a disciplina que assumiu a tarefa de descrever comparativamente os


diferentes sistemas ou dialetos em que uma língua se diversifica no espaço, e
de estabelecer-lhe os limites. Emprega-se também para a descrição de falas
tomadas isoladamente, sem referência às falas vizinhas ou da mesma família.

A Geografia Linguística ou Geolinguística, por outro lado, é a parte da Dialetologia


que se ocupa em localizar e registrar as variações das línguas. É um método cartográfico
desenvolvido pelos dialetólogos que objetiva registrar e comparar os resultados das pesquisas
linguísticas em localidades diferentes.
Segundo Rector (1975, p.18) apud Costa (2004, p.11), a Geografia Linguística ou
Geolinguística é ―um método especial da dialetologia tradicional, da qual se distingue não por
estudar um dialeto local num só ponto, mas fenômenos análogos num espaço, por meio de
pesquisa e registro dos fatos comprovados em mapas‖. Para Carreter (1974, p. 209) o
conjunto de mapas constitui um Atlas Linguístico.
Contudo, para Aragão (2009, p. 71) a moderna Dialetologia não é uma mera
Geolinguística, como se considerava até alguns anos atrás, onde se estudava somente as
152

variações regionais ou diatópicas, o que por sua vez produzia resultados monodimensionais,
monostráticos, monogeracionais e monofásicos. Neste contexto a autora, citando Elizaicín e
Trun (1992, p. 128-129), afirma que a moderna Dialetologia estuda também as causas sociais
e estilísticas que determinam as variações regionais, o que implica dizer que um o atlas
linguístico pode e deve propiciar uma imagem multidimensional da variação.

3 CONTEXTO E INSTRUMENTOS DA PESQUISA

Descrevemos a seguir os aspectos mais relevantes no que tange à metodologia


utilizada nesta pesquisa, como o perfil dos informantes entrevistados, a estrutura e
composição do QSL (Questionário Semântico-lexical) aplicado e os procedimentos realizados
para a elaboração das cartas linguísticas.

3.1 PONTOS DE INQUÉRITO


O estado do Pará possui dimensões continentais, do ponto de vista político-geográfico
ele é dividido em seis mesorregiões. Os pontos de inquérito selecionados para a realização
desta pesquisa são os seguintes: Santarém e Oriximiná (Mesorregião do Baixo Amazonas);
Anajás e Breves (Mesorregião do Marajó); Castanhal e Santo Antônio do Tauá (Mesorregião
Metropolitana de Belém); Abaetetuba e Bragança (Mesorregião Nordeste); Altamira e Itaituba
(Mesorregião Sudoeste); e Conceição do Araguaia e Redenção (Mesorregião Sudeste).

3.2 INFORMANTES
Foram selecionados quarenta e oito informantes no total, sendo quatro por localidade.
Os critérios de seleção de informantes na zona rural utilizados pelo projeto ALIPA são os
seguintes:
– todos os informantes deveriam ter escolaridade igual ou inferior à 4ª série do ensino
fundamental;
– um do sexo masculino e um do sexo feminino, entre 18 e 30 anos e
– um do sexo masculino e um do sexo feminino, entre 40 e 70 anos, para cada uma das
localidades.

3.3 QUESTIONÁRIO SEMÂNTICO-LEXICAL (QSL)


O Questionário Semântico-lexical (QSL) utilizado na coleta de dados para o ALIPA
foi elaborado tendo como base a primeira versão do QSL elaborado para o Atlas Linguístico
153

do Brasil, acrescido de itens dos questionários usados para a construção do Atlas Linguístico
do Estado de São Paulo e do Atlas Linguístico do Paraná, e ainda de outros itens
acrescentados pela equipe do ALIPA.
A versão final do Questionário Semântico-lexical (QSL) utilizado na coleta de dados
para elaboração do ALIPA é composta de 257 questões, sendo 256 perguntas e uma
solicitação para que o informante faça um relato de experiência pessoal. As perguntas estão
distribuídas em 14 campos semânticos como: Astros e tempo, Flora, Fauna, etc.

3.4 COLETA DE DADOS


Os dados que compõe o corpus desta pesquisa foram coletados por pesquisadores do
projeto GeoLinTerm, sendo que, em dez dos doze municípios selecionados para esta pesquisa
os dados já haviam sido coletados, são eles: Anajás e Breves (Mesorregião do Marajó);
Castanhal e Santo Antônio do Tauá (Mesorregião Metropolitana de Belém); Abaetetuba e
Bragança (Mesorregião Nordeste); Altamira e Itaituba (Mesorregião Sudoeste); e Conceição
do Araguaia e Redenção (Mesorregião Sudeste), a coleta de dados in loco nos dois municípios
restantes, Santarém e Oriximiná (Mesorregião do Baixo Amazonas), foi realizada por nós no
mês de fevereiro de 2011.
Os dados foram coletados a partir da aplicação do QSL em entrevistas realizadas nas
residências dos informantes, e/ou nas imediações das mesmas, as entrevistas foram registradas
com gravadores analógicos e digitais diversos, uma vez que a coleta vem sendo realizada
desde o ano de 1999, as gravações que já faziam parte do banco de dados do projeto estavam
registradas em um CD (que continha os 4 informantes do município de Faro) e em 217 fitas
magnetofônicas com duração aproximada de sessenta minutos cada. As fitas cassete passaram
por um processo de digitalização 48 no qual foram utilizados os softwares Sonarca Sound
Recorder 3.3.5 e Sound Forge 9.0. O projeto atual do Atlas Geo-sociolinguístico do Pará
prevê 50 pontos de inquérito, como se pode ver no mapa abaixo. A coleta de dados já foi
realizada em 34 deles, restando ainda 16 pontos a serem coletados. O mapa a seguir apresenta
a distribuição geográfica dos 50 pontos de inquérito previsto para a elaboração do Atlas Geo-
sociolinguístico do Pará:
3.5 MAPEAMENTO
Os dados selecionados para esta pesquisa foram organizamos e sistematizamos em
tabelas, conforme os campos semânticos, estruturas sociais e espaciais, e transcritos

48
A equipe responsável pela atividade de digitalização foi coordenada por mim, sob a orientação do professor
Abdelhak Razky, e composta por bolsistas e voluntários do projeto GeoLinTerm.
154

foneticamente segundo o Alfabeto Fonético Internacional – IPA, utilizando a fonte


SILDoulosIPA. Em seguida os dados foram mapeados em cartas lexicais.
O mapa que serviu de base para a elaboração das cartas lexicais foi elaborado por
Piera Amora com fontes do IBGE/IBAMA, por meio do software ArcGis 10. Para a
confecção das cartas lexicais o mapa base foi alterado por meio da utilização dos programas
computacionais Adobe Photoshop CS 8.0.1 e Corew Dral X3 13, que possibilitaram a
inserção das cruzes de estratificação social, dos símbolos e das caixas de legenda.

4. ANÁLISE CARTOGRÁFICA
Nesta pesquisa foram confeccionadas até o momento 10 cartas lexicais, que
representam amostras dos campos semânticos do Questionário Semântico-Lexical do ALIPA,
além da carta explicativa, que objetiva nortear a leitura das demais cartas lexicais.

4.1 CARTA EXPLICATIVA


A carta explicativa a seguir foi elaborada tendo em vista possibilitar a leitura clara e
objetiva das demais cartas que compõe este trabalho. Por meio dela, é possível entender a
metodologia adotada para a apresentação dos dados nos pontos de inquérito selecionados para
esta pesquisa.
155

4.2 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS POR CAMPO SEMÂNTICO


A pesquisa abrange doze municípios, perfazendo um total de 48 informantes,
submetidos a 256 perguntas que compõem o QSL/ALIPA, e resultará na confecção de
aproximadamente 100 cartas lexicais. Contudo, devido ao grande volume de cartas
elaboradas, e a impossibilidade de analisá-las todas, serão selecionadas as mais produtivas e
representativas por campo semântico para serem analisadas. As demais cartas serão anexadas
à dissertação em DVD. Apresentamos uma das cartas já elaboradas sobre a qual se faz uma
análise geo-sociolinguística aos moldes das que se pretende fazer para as demais cartas no
texto final da dissertação.
156

Na carta 005, elaborada para a questão 142 do QSL, obtivemos 8 variantes lexicais,
sendo a lexia jacinta a mais recorrente (com 21 ocorrências).
Sobre o aspecto diatópico, a carta apresenta uma tendência de uso das lexias jacinta e
cambito em regiões distintas do estado. Neste sentido seria possível traçar uma isoglossa
separando as mesorregiões mais ao norte do estado da mais próxima ao Centro-oeste do
Brasil. Acima da isoglossa ficariam as mesorregiões Baixo Amazonas (pontos 1 e 2),
Sudoeste (pontos 9 e 10), Marajó (pontos 3 e 4), Metropolitana e Nordeste (pontos 5, 6, 7 e
8), onde há predomínio da lexia jacinta. Abaixo da isoglossa ficaria a mesorregião Sudeste
(pontos 11 e 12), para a qual a carta 005 projeta uma imagem que indica um predomínio da
lexia cambito. Ambas as lexias estão dicionarizadas em Aurélio (2009) como sinônimos de
libélula.
157

A carta 009, elaborada para a questão 177 do QSL, apresentou um total de 19


variantes lexicais, a variante mais recorrente foi mão de vaca que apresentou 14 ocorrências,
seguida por miserávi com 10 ocorrências. A carta apresentou diversas lexias dicionarizadas
por Aurélio (2009), como canguinho, suvina, iscasso e pão duro, ambas apresentadas como
sinônimos de avaro, e outras não dicionarizadas para esta acepção como: amarrado, muxiba e
siguro. Chamam a atenção algumas lexias como sumítico (ocorrida na fala de FA e FB do
ponto 4, Anajás), que é uma variante de semítico, dicionarizada por Aurélio (2009) como algo
―pertencente ou relativo aos judeus‖. Como é sabido, há no imaginário popular a ideia
corrente de que os judeus seriam pessoas avarentas. Outra lexia que reme à realidade cultural
da região seria a lexia mão de mucura [assada], registrada nos pontos 1 e 4, para as
informantes FA e FB, respectivamente. Como é sabido a mucura é um animal marsupial
típico dessa região, que está inserido nos hábitos alimentares da população, vale ressaltar a
analogia que há entre a forma fechada tomada pelas patas do animal quando o mesmo passa
pelo processo de cozimento e a ideia de que alguém sovina também é denominado como mão
fechada (lexia registrada nos pontos 1, 2, 7, 8, 9 e 12), também foram registradas outras
158

formas lexicais semanticamente similares, como mão trancada, mão apertada, mão de sapo,
etc.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do andamento da pesquisa até esta etapa é possível afirmar que as cartas produzidas
projetam uma imagem mais completa da variação lexical no estado do Pará, isso em relação a
pesquisas anteriores, uma vez que estas pesquisas trabalharam os dados ao ALIPA de forma
compartimentada, isto é, mapeando isoladamente algumas das mesorregiões paraenses. Neste sentido a
pesquisa que aqui se delineia proporcionará uma visão mais ampla dessa variação, uma vez que
mapeia nas cartas lexicais amostras de cada uma das seis mesorregiões que compõem o estado do
Pará.
A visão multidimensional mais abrangente que se espera ter da variação lexical na zona rural
paraense só será projetada quando da publicação do Atlas Geo-sociolinguístico do Pará, que, como é
sabido, está em fase de elaboração. Isso por que, no ALIPA, serão mapeados os 50 pontos de inquérito
previstos. A conclusão desta pesquisa, que mapeia dados de 12 municípios, apresentará, por tanto,
imagens prévias da rica variação lexical do português brasileiro falado na zona rural do estado do
Pará.

REFERÊNCIAS
ARAGÃO, M. do S. de. O léxico da região norte do Brasil. In: ARAGÃO, M. do S. de.
(Org.). Estudos em Lexicologia, lexicografia, terminologia e terminografia. Fortaleza:
UFC/MÍDIA, 2009.
ALTINO, F. C. Atlas linguístico do Paraná II. 2007. Tese (Doutorado) - Centro de Letras e
Ciências Humanas da Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2007.
CARRETER, F. L. Diccionario de términos filológicos. 3. ed. corregida. Madrid: Gredos,
1974.
COSTA, C. S. Variação lexical no nordeste do Pará. 2005. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação
em Letras) – Instituto de Letras e Comunicação, Universidade Federal do Pará, 2005.
COUTO, H. H. do. Linguística, ecologia e ecolinguística: contato de línguas. São Paulo:
Contexto, 2009.
DUBOIS, J. et al. Dicionário de lingüística. São Paulo: Cultrix, 1978
FEITOSA, A. da S. Variação lexical no sudeste do Pará. 2006. Trabalho de Conclusão de Curso
(Graduação em Letras) – Instituto de Letras e Comunicação, Universidade Federal do Pará, 2006.
FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário Eletrônico Aurélio. [S. l., 2009]. 1 CD. [versão 6]
GUEDES, R. J. da C. Variação lexical nos dados do atlas geo-sociolinguístico do Pará. (Comunicação
em Seminário – VII SEPA) – Instituto de Letras e Comunicação, Universidade Federal do Pará, 2011.
GUEDES, R. J. da C. Variação lexical em quatro municípios da mesorregião metropolitana de Belém.
2007. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Letras) – Instituto de Letras e Comunicação,
Universidade Federal do Pará, 2007.
MARTINS, A. F. C. Variação lexical e fonética na Ilha do Marajó. Revista Científica da
UFPA, Belém, v. 4, abr. 2004. Disponível em: <http://www.ufpa.br/revistaic>. Acesso em: 10
de setembro de 2011.
159

RAZKY, A; OLIVEIRA, M. B. de; LIMA, A. Contribuições da dialetologia para o ensino. In:


RODRIGUES, R. E. de S. B. Em busca de uma história social para o léxico rural
paranaense. 2007. Tese (Doutorado) Centro de Letras e Ciências Humanas da Universidade
Estadual de Londrina, Londrina, 2007.

GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA LINGUAGEM USADA NO CORTE


BOVINO

Rejane Umbelina Garcez Santos de OLIVEIRA (UFPA)


Orientador: Abdelhak RAZKY (UFPA)

RESUMO: Esta pesquisa de Mestrado pretende, como resultado, apresentar um glossário


socioterminológico que evidencie a língua usada para nomear as diversas peças do gado
bovino no estado do Pará. Para a concretização desse objetivo, o aporte teórico realiza-se em
pressupostos orientados pela Socioterminologia. Sendo assim, este trabalho pretende
descrever e divulgar as variedades de registro dos vocábulos que compõem o léxico de
especialidade usado por socioprofissionais da área e, constantemente, veiculado na sociedade.
Com esse constructo, o Glossário Socioterminológico da Linguagem Usada no Corte Bovino
está vinculado ao projeto Geo-sociolinguística e Socioterminologia no Brasil (GeoLinTerm)
que tem como uma de suas metas previstas o mapeamento do léxico especializado das
culturas na Amazônia e a disseminação desse conhecimento entre os especialistas e os
interessados no assunto.

PALAVRAS-CHAVE: léxico de especialidade, Socioterminologia, corte bovino.

RESUME: Cette maîtrise de recherche veut, en conséquence, présenter un glossaire de la


socioterminologie qui témoigne de la langue utilisée pour nommer les différents éléments de
bovins dans l'État du Pará. Pour atteindre cet objectif, le montant théorique est tenu à
Socioterminologie conduit par des hypothèses. Ainsi, ce travail vise à décrire et à divulguer
les variétés du dossier des mots qui composent le lexique d'expertise utilisée par zone
socioprofessionnelles et constamment diffusé dans la société. Cette construction, le Glossaire
de Socioterminológico de la Langue Utilisée dans la Cour et est lié au projet Geo-
sociolinguistique et Socioterminologie au Brésil (GeoLinTerm) qui a comme l'un de ses
cultures de cartographie de lexique spécialisés objectifs fournis en Amazonie et la diffusion
de ces connaissances entre les spécialistes et les personnes intéressées par le sujet.

MOTS-CLÉS : lexique de spécialité, Socioterminologie, boeuf de découpage.

A linguagem e o mundo atual


160

Os últimos anos têm sido marcados por um avanço tecnológico expressivo no que tange
os meios de comunicação. As interações se concretizam independente das distâncias, pois a
tecnologia assumiu a responsabilidade de permitir ao homem comunicar-se com seus
semelhantes ultrapassando toda e qualquer fronteira física ou cultural.

Os processos que levaram o mundo a essa globalização, têm globalizado também, em


muitos aspectos, a linguagem usada nas ações de compra e venda, nas interações unilaterais
ou bilaterais, de forma tão rápida como nunca antes vista.
A tecnologia permite essa interação, mas isso só é possível graças à linguagem. Inerente
ao homem, esta capacidade permite que possamos viver em sociedades, organizemo-nos em
grupos e, de acordo com cada comunidade, possamos desenvolver a linguagem e repassá-la de
geração à geração.
Segundo Faulstich (1995), em uma comunidade linguística, não há apenas a linguagem
comum, que devidamente organizada e sistematizada constitui parâmetros de comunicação e
interação entre os indivíduos. Na verdade, toda atividade humana, todo domínio do saber
envolve muitos conceitos, por isso, em muitos campos da ciência é preciso o domínio de um
conjunto de termos que permita o reconhecimento, a manipulação e a comercialização de
produtos e de serviços.
O trabalho terminológico vem atender a essas necessidades no vocabulário técnico e
científico buscando a harmonização das noções e dos termos, assim como a normalização dos
produtos, do instrumental e dos processos, o que é primordial às trocas comerciais em caráter
regional ou nacional.
Assim sendo, esta documentação reproduzirá as variações terminológicas de registro
observadas na linguagem usada para denominar as peças bovinas e, com isso, além de
descrever, documentará variedades específicas da região norte assim como foram registradas,
no sul e sudeste do Brasil, para o verbete ‗peixinho‘, corte bovino considerado pela Embrapa 49
como padrão e que apresenta, no percurso do frigorífico ao consumidor final, variantes 50
como ‗coió‟, „lagartinho-da-pá‟, „lombinho‟, „tatuzinho-da-paleta‟.

O porquê de um glossário socioterminológico que descreva a linguagem usada no


corte bovino do estado do Pará.

49
De acordo com visita em 27/09/2010 ao site http://www.cnpgc.embrapa.br/publicacoes/naoseriadas/cortes/
textos/sinonimia.html
50
‗Coió‟, „lagartinho-da-pá‟, „lombinho‟, „tatuzinho-da-paleta‟ são variantes registradas por Joaquim Santana
Caixeta, em Agroindústria: abate e preparação de carne, padronização de cortes de carne bovina e adotadas
pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa.
161

Um glossário dessa magnitude justifica-se porque o conceito e o termo são compostos


por elementos da cultura de uma dada sociedade, logo não será exclusivamente de cunho
terminológico, mas a partir dos registros de termos com semas que traduzem aspectos étnico-
culturais do estado do Pará, contemplará propriedades do conceito relacionadas a aspectos da
cultura do Estado e que também se apresentam nesse campo de especialidade; contribuirá com
a informação científica no âmbito da pecuária regional e nacional; os resultados da
investigação científica poderão servir de dados iniciais para outras pesquisas relacionadas ao
tema e, principalmente, por não haver registro semelhante, no Estado, ao glossário que
produziremos.
Neste trabalho, portanto, pretende-se fazer uma reflexão sobre os caminhos que
conduzirão esta pesquisa aos resultados pretendidos, à metodologia que será empregada e aos
postulados teóricos que nortearão esta investigação.
A produção de um glossário socioterminológico eletrônico que descreva a linguagem de
especialidade usada no corte bovino do estado do Pará, contribuirá para o desenvolvimento do
projeto Geo-sociolinguística e Socioterminologia no Brasil (GeoLinTerm), uma vez que
tornará possível a identificação e descrição das variações linguísticas e de registro; a
preservação dos valores étnico-culturais da pecuária de corte na região; o reconhecimento da
terminologia inerente à fala dos profissionais que trabalham nesta área; a formação de um
banco de dados dos termos profissionais e culturais dessa especialidade; a disseminação desse
conhecimento entre os especialistas e os interessados no assunto e , ainda, uma contribuição
para o mapeamento do léxico especializado das culturas da Amazônia.
Para tanto, tomar-se-á a Socioterminologia como norteadora da pesquisa, amparada
pelos princípios sociolinguísticos e terminológicos. A metodologia terminológica que se
pretende será de caráter onomasiológico, pois a partir da noção chegar-se-á à denominação.
Em relação a recolha dos termos primeiro será observado se o termo pertence ao campo
socioprofissional estudado para posterior descrição. Serão apresentados contextos, uma vez
que se pretende atingir todos aqueles que precisam conhecer o uso dessa especialidade.

Princípios fundamentais da pesquisa


Os postulados sociolinguísticos que estudam as relações entre linguagem e sociedade,
não serão esquecidos, pois os termos e suas definições serão analisados dentro do meio social
ao qual pertencem, uma vez que vivermos organizados em sociedades e somos detentores de
um sistema de comunicação oral, uma língua.
162

Para a Sociolinguística, a língua está em constante evolução, realiza-se, de fato, por


meio da interação na sociedade, o que possibilita a sua constante transformação sempre de
acordo com o momento histórico-social, segundo LABOV, 1991 (apud MONTEIRO, 2000)51.
Assim, a Sociolinguística registra, descreve e analisa diferentes falares, e a variedade
linguística ou diversidade linguística constitui seu objeto de estudo. De acordo com Labov, os
fatores sociais determinam as diversidades linguísticas e relacionam, entre outros, a origem
étnica e atitude ao comportamento linguístico.
Para a compreensão do constructo teórico que sustentará a pesquisa, propõe-se uma
releitura dos postulados da socioterminologia, desde o surgimento da terminologia, que
constitui a sua origem, a fim de que melhor se compreenda o porquê da ocorrência de
variações nas denominações usadas pelos socioprofissionais que trabalham no setor de abate,
produção e venda do gado bovino.

A terminologia, enquanto ciência, distingue-se das outras ciências da linguagem por ser
normativa e ter como objeto de estudo o termo.

O Brasil, país que se formou a partir da miscigenação de raças e culturas, destaca a


terminologia em todos os segmentos que compõem a sua sociedade. Não é difícil
encontrarmos dicionários que trazem a linguagem comum, apresentarem termos que
compõem a linguagem técnica usada em determinados ramos de atividade técnica e/ou
científica. Segundo Faulstich (2006),

A terminologia é uma disciplina de ordem sistêmica que prepara corpora


especializados para a redação técnica e para a elaboração de dicionários
eletrônicos de grande alcance. A grande vantagem dessa natureza sistêmica
é que a terminologia internacionaliza léxicos de linguagens de
especialidade, pois, num mundo moderno, que se desenha multilíngüe, a
comunicação deve ser rápida e eficiente.

A definição da autora faz-nos relembrar conceitos como o de Eugen Wüster, autor da


expressão ―variação linguística‖, usada para nomear as variadas ocorrências de um vocábulo.
Os estudos em terminologia evoluíram e os aspectos sociais, políticos e linguísticos passaram
a ser reconhecidos como motivadores, e como não dizer, definidores das variantes regionais,
locais (que decorrem das situações de uso) e, em algumas situações, responsáveis também

51
O autor referencia-se a William Labov, linguísta que, assim como Saussure, vê a linguística como uma ciência
do social; dessa forma, a sociolinguística equivale à linguística com ênfase na atenção às variáveis de natureza
extra-linguística.
163

pela padronização internacional de termos.


É frequente a variação de forma e conteúdo nas linguagens de especialidade, e essa
pode ocorrer no plano diacrônico ou sincrônico, por isso Faulstich (idem) diz que

(...) na diacronia ou na sincronia, é possível afirmar que nenhum estágio da


língua é um bloco homogêneo, embora seja regular. Cada estágio da língua,
por sua vez, está limitado por complexos de variedades linguísticas, as quais
se entrecruzam por impulso da linguagem e tendem a apresentar: I) a
variação como processo; II) as variantes como protocolos naturais de
evolução; III) a mudança como produto da alteração nos esquemas
comunicativos".

Podemos entender que uma unidade terminológica pode suscitar significados variados
dependendo da função que a variável assumirá nos diferentes contextos de uso.
Ainda de acordo com Faulstich (idem) a terminologia de Wüster não observava
ambiguidades, originárias de denominações plurivalentes e múltiplas, como homônimos,
termos polissêmicos e sinônimos. Segundo a autora, a terminologia está voltada para a
observação do uso do termo em contextos de língua oral e de língua escrita, o que possibilita a
identificação de variantes em um mesmo contexto ou em diferentes contextos em que o termo
é usado.
Desta forma, assim como na língua geral, as variações não decorrem apenas do meio
linguístico e social, mas as comunicações entre os membros de uma sociedade podem gerar
conceitos interacionais para um só termo ou ainda termos diferentes para um mesmo conceito
até em áreas de especialidade.
A terminologia estruturou-se em um ponto de vista puramente descritivo e Boulanger
(1991), por não aceitar esse postulado, muito contribuiu para o surgimento de uma nova
corrente, a Socioterminologia.
A Socioterminologia nasceu do ―desejo de se atenuar os efeitos prescritivos exagerados
de algumas proposições normativas" (FAULSTICH,2006, p.27) usadas pela terminologia.
Essa corrente foi uma reação às escolas hipernormalizadoras que não consideravam as
situações linguísticas específicas de cada lugar. A socioterminologia buscou suas origens no
cruzamento da sociologia da linguagem e da harmonização linguística."
(FAULSTICH,2006,p.27) e, em dezembro de 1993, formalizou-se com François Gaudin ao
publicar sua tese de doutorado – "Pour une socioterminologie – des problèmes sémantiques
aux pratiques institutionnelles", e nela discutir a questão terminológica voltada para o social.
Segundo ele,
164

... a socioterminologia, com o suposto de que deseja ultrapassar os limites de


uma terminologia "de escrivão", deve localizar a gênese dos termos, sua
recepção, sua aceitação, mas também as causas do insucesso e as do sucesso,
no âmbito das práticas lingüísticas e sociais concretas dos homens que
empregam tais termos. Estas práticas são essencialmente aquelas que se
exercem nas esferas de atividade. Eis porque a socioterminologia devia
reencontrar as reflexões nos laços que se criam entre trabalho e linguagem"
(p.216).

No Brasil, mais especificamente em 1995, a UnB desenvolveu as pesquisas do léxico e


inaugurou a socioterminologia estudada sob o enfoque da prática do trabalho terminológico,
fundamentando-se na análise das condições de circulação do termo no funcionamento da
linguagem e, ainda como disciplina descritiva, voltando-se para o termo sob a perspectiva
linguística na interação social. Assim, a variação linguística dos termos, quando estudada no
meio social, conduz-nos ao entendimento de que a mudança terminológica resulta da
pragmática discursiva.
Em línguas de especialidades, as variantes terminológicas surgem e formam classes de
acordo com sua natureza linguística, assim como ocorre na linguagem geral. A
socioterminologia deve se encarregar de sistematizar essa diversidade que ocorre nos planos
vertical, horizontal e temporal da língua, pois toda língua é historicamente diversificada e,
dada a mudança linguística, um estado de língua é diferente em tempos também diferentes;
uma língua é socialmente diversificada devido às origens geográfica e social dos locutores; e
toda língua é estilisticamente diversificada uma vez que os locutores realizam mudanças em
sua maneira de falar, de acordo com as situações sociais em que se encontram (FAULSTICH,
1995).
Não se pode desconsiderar que o estudo da terminologia está em relação direta com o
estudo da língua na qual os termos são usados e, sob essa perspectiva, o trabalho do
pesquisador variacionista, nesta investigação, deverá ter como objetivo científico a descrição
e análise dos fenômenos linguísticos que ocorrem na linguagem usada no corte bovino no
estado do Pará.

Procedimentos metodológicos para a produção do glossário

Os procedimentos metodológicos necessários à realização das etapas desta pesquisa


limitar-se-ão à metodologia terminológica de caráter onomasiológico, pois partirá da noção já
existente para chegar à denominação. Em relação a recolha dos termos, primeiro observar-se-
165

á se o termo pertence, realmente, ao campo socioprofissional estudado. Para isso será


constante o contato com especialistas que trabalhem na área pesquisada.
Durante a realização da pesquisa, os princípios sociolinguísticos serão utilizados:
observação, descrição e analise das variações dos termos. Em seguida as entrevistas que
proporcionarão, mais tarde, um inventário sistemático e normativo, ou ainda, um banco de
dados terminológicos com campos que darão informações históricas (domínio, fonte, data);
terminológicas, termo de entrada, nome científico, definição, contextos de uso; linguísticas,
categoria gramatical, variante gráfica, termos remissivos (relações semântico-lexicais),
termos equivalentes, normalização etc.
Para o registro dos fenômenos linguísticos alguns softwares serão utilizados. Entre eles
o Lexi-Pro, programa específico que além de armazenar dados, também produz o glossário
eletrônico.
O glossário apresentará uma organização macroestrutural,
organização interna da obra, a qual será formada pelo conjunto de entradas e seguirá critérios
de acordo com o corpus inventariado, como: a entrada dos verbetes seguirá a ordem
tradicional, do abecedário e agrupados por campo lexical; as entradas serão ordenadas de
acordo com os hiperônimos, hipônimos e sinônimos deixando cada termo respaldado por um
campo léxico-semântico próprio. Já a organização microestrutural, (organização dos dados
contidos no verbete) será assim disposta:

Verbete + Termo de entrada + Enunciado terminológico, donde:


Enunciado terminológico + Paradigma informacional (± substantivo, ± sintagma) +
Paradigma definicional (significado do termo naquele discurso concreto) + Paradigma
pragmático (abonações ou ilustrações) ± Paradigma lexical (remissivas).

Considerações Finais

A pesquisa de cunho Socioterminológico, considera as condições de uso dos termos na


língua em ação, na oralidade e na escrita. Assim sendo, procuramos aqui, de forma breve,
elucidar como vêm sendo desenvolvidas as pesquisas que resultarão no Glossário
Socioterminológico da Linguagem Usada no Corte Bovino, vinculado ao projeto Geo-
sociolinguística e Socioterminologia no Brasil (GeoLinTerm). No decorrer desta
apresentação, demos relevo aos aportes teóricos que fundamentarão a investigação científica e
à metodologia escolhida para recolha dos dados e formação do corpus. A partir desta base,
166

procuramos mostrar em que consistirá a macroestrutura e microestrutura do glossário,


objetivo final de nossa investigação, revelando que uma obra que contemple uma linguagem
de especialidade, não pode deixar à margem os fatores sociais, pois, assim, seguindo esse viés
pragmático, tornar-se-á viável, eficiente e constante a comunicação entre os socioprofissionais
envolvidos, o pesquisador, o cidadão comum e todos aqueles que se interessem pelo assunto.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOULANGER, J.-C. "Une lecture socio-culturelle de la terminologie". Cahiers de


linguistique sociale. (18). pp. 13-30. 1991.
BRANDÃO, Silvia Figueiredo. A Geografia Linguística do Brasil. São Paulo: Editora
Ática, 1991.
CAIXETA, J. S. Agroindústria: abate e preparação de carne, padronização de cortes de
carne bovina. Ciência da Informação - Vol 24, número 3, 1995.
CALVET, Louis-Jean. Sociolinguística: uma introdução crítica. Trad. Marcos Marcionilo.
São Paulo: Parábola, 2002.
FAULSTICHE, Enilde. Socioterminologia: mais que um método de pesquisa, uma
disciplina. Ciência da Informação, Brasília, v.24, n.3, p. 281-288, 1995.
___________. Variantes terminológicas: principios linguísticos de análise e métodos de .
Actes réflexios méthodologiques sur le travail en terminologie et em terminotique dans les
langues latines. Nice: Realiter / Université de Nice Sophiea-Antipolis, 1996.
___________. Princípios formais e funcionais de variação em terminologia. Seminário de
Terminologia Teórica. Barcelona, 28-29 de janeiro de 1999.
___________. A socioterminologia na comunicação científica e técnica. Ciência e
Cultura (Terminologia / Artigos). São Paulo: vol. 58, nº 2, pp. 27-31, 2006. Disponível em:
http://cienciacultura.bvs.br/scielo. Acesso em 20 setembro de 2010.
GAUDIN, François. Pour une socio-terminologie: des problèmes sèman-tiques aux
pratiques institutionnelles. Rouen: Publications de l‘Université de Rouen, 1993.
___________. Socioterminologie: une approche sociolinguistique de la terminologie.
Bruxelas: Duculot, 2003. (Coleção Champs linguistiques).
Cf. FAULSTICH, E. Base metodológica para pesquisa em socioterminologia. Brasília,
LIV/UNB, 1995.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. pecuária.
(http//pecuária.ibge.gov.br, 26 de agosto de 2011).
MONTEIRO. José Lemos. Para Compreender Labov. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
PRETTI, D. (1994) Sociolinguística: os níveis de fala. 7ed. São Psaulo: EDUSP.
SCHERRE, Maria Marta Pereira. Doa-se Lindos Filhotes de Poodle: variação linguística,
mídia e preconceito. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.
TARALLO, Fernando. A Pesquisa Sociolinguística. Série Princípios: 7 ed. São Paulo,
2000.
EMBRAPA.http://www.cnpgc.embrapa.br/publicacoes/naoseriadas/cortes/textos/sinonimia.ht
ml Visitado em: 27/09/2010.
167

PROCESSOS DE REGULAÇÃO NA PRODUÇÃO ESCRITA EM PORTUGUÊS


LÍNGUA ESTRANGEIRA

Renata de Cássia Dória da SILVA (UFPA)


Orientadora: Prof.ª Dra. Myriam Crestian Chaves da CUNHA (UFPA)

RESUMO: Este trabalho visa contribuir para a integração da problemática da Avaliação


Formativa no ensino da produção escrita em Português Língua Estrangeira (P.L.E.).
Procuramos investigar em que medida instrumentos construídos, nessa perspectiva, para
sistematizar o funcionamento da língua na modalidade escrita de PLE favorecem
procedimentos de avaliação e regulação (auto- avaliação, co-avaliação e autorregulação) dos
aprendentes de PLE na apropriação das competências de produção escrita. A investigação foi
realizada mediante uma pesquisa-ação junto ao público escolhido, de modo a ajudar os
aprendentes a se apropriarem dos recursos necessários para solucionar seus problemas de
produção escrita. Consideramos que aprender a escrever em PLE é mais do que dominar as
estruturas gramaticais da língua, ou seja, significa se apropriar do funcionamento dos
discursos na língua alvo. Acreditamos que por meio desta investigação seja possível tornar o
ensino da escrita mais eficaz e entender melhor os processos de aprendizagem da escrita de
nossos aprendentes.

PALAVRAS-CHAVE: Avaliação Formativa, Produção Escrita, PLE.

ABSTRACT: This paper aims to contribute to a reflection toward the Formative Assessment
in the teaching of written production in Portuguese as a Foreign Language (PFL). We are
trying to investigate how some tools of the Formative Assessment help students about self-
regulation, self-assement and co-assement and permit to understand the functioning of
language in the written production of PLE. The study was developed by an action research
with the public chosen to help learners to appropriate resources to solve their production
problems writing. We believe that learning to write in PLE is more than understanding the
grammatical structures of language because is necessary to know what to say according the
context. We believe this research can help to make the teaching of writing more effective and
better understand the learning processes of writing of our learners.
KEYWORDS: Formative Assessment, Written Production, PFL.

1. Considerações Iniciais

Na última década, a área de ensino-aprendizagem de Português para estrangeiros –


conhecida como Português Língua Estrangeira (PLE) – tem se desenvolvido bastante, tanto
no Brasil quanto no exterior. Diante disso, faz-se necessário buscar meios de se oferecer um
ensino de português de melhor qualidade que proporcione ao aprendente estrangeiro uma
aprendizagem mais eficaz, nas habilidades de compreensão e produção escrita e oral,
utilizando-se metodologias de ensino bastante diversas das usadas no ensino de português
língua materna. Dentre essas habilidades, a que exige maior tempo e maiores esforços para
ser adquirida é certamente a de produção escrita.
168

Os manuais de ensino de PLE têm contribuído para auxiliar/orientar os professores de


PLE em sua prática de sala de aula, mas ainda assim percebem-se lacunas, como, aliás, há
em qualquer conjunto pedagógico. No que concerne à produção escrita, em particular,
verifica-se que o trabalho é pouco desenvolvido na maioria dos manuais. Isto exige que o
professor procure elaborar atividades complementares que estarão condicionadas,
principalmente, ao objetivo do público em aprender português.
Diante dessa realidade, buscamos encontrar/apontar novos caminhos para ajudar o
professor e seus aprendentes no trabalho com a produção escrita em PLE. Um destes
caminhos apontados em estudos desenvolvidos no campo da avaliação da aprendizagem, é a
Avaliação Formativa, com ênfase nos processos de regulação, co-regulação e
autorregulação, na medida em que a apropriação dos critérios de avaliação dos textos é
necessária ao êxito das tarefas escritas. Na verdade, a modalidade formativa de avaliação,
inserida no processo de aprendizagem, tem sido amplamente divulgada como um eficiente
procedimento de ensino e de aprendizagem de línguas, pois faz do processo avaliativo algo a
ser aprendido pelos alunos.
Neste trabalho, procuramos, portanto, investigar em que medida instrumentos
construídos, nessa perspectiva, para sistematizar o funcionamento da língua na modalidade
escrita de PLE favorecem procedimentos de co-regulação e a autorregulação de suas
produções na apropriação das competências de produção escrita.
Acreditamos que por meio desta investigação será possível tornar o ensino da escrita
mais eficaz e que poderemos entender melhor os processos de aprendizagem da escrita de
nossos aprendentes.

1. A Avaliação Formativa na Produção Escrita

A modalidade de Avaliação Formativa possui finalidade essencialmente pedagógica.


Integra-se no próprio ato de ensino, objetivando melhorar a aprendizagem em curso.
Este tipo de avaliação costuma ocorrer ao longo do processo de ensino- aprendizagem e
não visa atribuir notas ou certificados aos alunos, e sim procura auxiliar o professor e os
alunos no estudo específico do que é necessário para se dominar um assunto ou desenvolver
uma competência. Por um lado, tenta ajudar os professores a ajustarem estratégias de ensino
que sejam compatíveis com o público ao qual se dirigem. Por outro, busca verificar em que
parte da unidade o aluno apresenta mais dificuldade, permitindo indicar meios alternativos
para que o mesmo possa superá-las.
169

Segundo Allal (2005, p.241) o conceito de Avaliação Formativa foi introduzido por
Scriven (1967) em um artigo a respeito de avaliação de programas educacionais em que se
discutiam temas, tais como currículo, métodos, e materiais de instrução. Para Scriven a
Avaliação Formativa visa providenciar dados que permitam sucessivas adaptações de um
novo programa durante a fase de seu desenvolvimento e sua implementação.
Autores como Fernandes (2006, p. 26 -27) afirmam que na perspectiva francófona, a
avaliação formativa representa uma fonte de regulação dos processos de aprendizagem e a
regulação poderia ser apontada como a peça-chave desta tradição teórica.
De acordo com Allal (p. 246, 2005) o conceito de regulação na literatura de língua
francesa enfatiza a importância dos fatores ligados aos processos de intervenção na tentativa
de alterar a diferença entre o que se deseja e o que se tem. Estes processos refletem-se
em:
- Ações efetivamente realizadas pelo professor e os alunos para melhorar a aprendizagem;
-Grau de participação ativa do aluno em tais ações;
- Uso que os alunos fazem das ferramentas e recursos presentes no ambiente de ensino para
se adaptar ou enriquecer a sua atividade de aprendizagem;
- Significado atribuído pelos alunos e professores para os diversos aspectos da avaliação;
- Maneiras pelas quais professores e alunos negociam a avaliação (discussão sobre os
critérios, discutir os requisitos, construir entendimentos partilhados sobre o que é esperado).
Na perspectiva teórica de origem francófona os processos cognitivos e metacognitivos
são bastante relevantes, assim, aspectos da aprendizagem internos ao aprendente tais como
auto-controle, a auto-avaliação ou a autorregulação são postos em destaque.
Esta perspectiva teórica busca entender os mecanismos de aprendizagem dos
aprendentes para que se possa utilizar a avaliação formativa a fim de ajudá-los a regularem
sozinhos sua aprendizagem.
É bastante evidente o papel central ocupado pelo aprendente nesta modalidade de
avaliação. O trabalho formativo exige mudanças no papel do professor e do aluno.
É necessário tentar fazer o aprendente se envolver no conhecimento e avaliação de seu
próprio processo de aprendizagem. Esta tarefa exige criatividade do professor para motivar
e promover a autonomia de seus aprendentes.
Um dos princípios da avaliação formativa é considerar a análise e o posterior
tratamento dos problemas da escrita como o centro da aprendizagem. Por isso, aprender a
avaliar é um objetivo indispensável no processo de aprendizagem.
170

Os critérios de avaliação precisam ser partilhados pelos aprendentes, para que tenham
mais segurança ao analisar seu próprio texto.
Segundo Portal (2008) ―se o aluno desenvolve a capacidade de auto-avaliar a sua
produção por ter internalizado os critérios, logo, percebe-se que a avaliação se tornou, de
fato, um instrumento que o ajuda a construir textos coerentes.‖
Utilizar a avaliação formativa para avaliar a produção escrita é considerar que os
aprendentes podem e devem participar da avaliação.
Para que os aprendentes internalizem melhor a representação de um texto é necessário
que partilhem com o professor os objetivos e os critérios da avaliação, para que assim,
possam auto-avaliar seu texto e auto corrigi-lo.
Dessa forma, o aprendente tem a possibilidade de tornar-se mais autônomo no seu
processo de aprendizagem da língua, pois não cabe mais ao professor assumir sozinho a
regulação da produção textual de seus alunos.
A avaliação formativa, de fato, mostra-se bastante eficaz no auxílio da aprendizagem
da produção escrita. Desde que os aprendentes sejam levados a desenvolver, por meio da
reflexão e da análise, a competência auto-avaliativa tornando-se cada vez mais autônomos
na apropriação de conhecimentos da produção escrita.
Um dos procedimentos de planejamento das atividades de sala de aula que valoriza a
avaliação formativa, deixando a esta um espaço primordial, é a chamada "Seqüência
Didática", procedimento que foi adotado neste trabalho como proposta para o ensino da
produção escrita em PLE, conforme trataremos posteriormente.

2. Produção Escrita em PLE

Em geral, ao se trabalhar com o ensino da modalidade escrita em PLE, com um


público adulto, uma das maiores dificuldades que pode ser apontada é ensinar as
características dos gêneros escritos em Língua Portuguesa. De fato, lidamos com pessoas
que já sabem escrever em sua própria língua e, por isso, geralmente dominam as regras de
estruturação textual, mas ainda não dominam as especificidades dos gêneros escritos em
português.
Desta forma, aprender a escrever em PLE é mais do que dominar as estruturas
gramaticais da língua. Significa, principalmente, se apropriar do funcionamento dos
discursos na língua alvo. Segundo Almeida Filho (2005, p. 81), aprender a escrever em
PLE,
171

não é mais somente aprender outro sistema, nem só


passar informações a um interlocutor, mas sim
construir no discurso (a partir de contextos sociais
concretos experiências prévias) ações sociais (e
culturais) apropriadas.

De acordo com Antunes (2003, p.47) ―a escrita, na diversidade de seus usos, cumpre
funções comunicativas socialmente específicas e relevantes‖, por meio dela é possível
realizar uma atividade sociocomuniativa entre as pessoas. Além disso, por se realizar em
diferentes gêneros e cumprir diferentes funções de comunicação a escrita sofre variação em
sua forma também. Por isso, o ensino da modalidade escrita em PLE deve levar em conta
que a produção de textos escritos ganha formas diferentes, conforme as diferentes funções
que se pretende cumprir.
Outra maneira de abordar as atividades de produção escrita é analisar as várias etapas,
interdependentes e intercomplementares, que constituem o processo de elaboração de um
texto escrito. De acordo com Antunes (2003, p. 54) as etapas seriam:
- Planejamento: envolve a delimitação do tema, a escolha dos objetivos, a escolha do gênero,
a delimitação dos critérios de ordenação das ideias, a identificação dos leitores e ainda a
escolha da forma linguística do texto (mais formal ou menos formal).
- Escrita propriamente dita: corresponde ao ato de registrar o que foi planejado.
- Revisão e reescrita: diz respeito ao momento de análise do que foi escrito, é a fase de
verificação se os objetivos foram cumpridos, se conseguiu manter a temática, se há coerência
e clareza no desenvolvimento das ideias.
As etapas citadas acima demonstram a natureza interativa da escrita, elas são
procedimentos que implicam análises e tomadas de decisões diferentes por parte de quem
escreve, verificação constante da adequação entre o que está sendo produzido e as intenções
comunicativas daquele que escreve, da adequação daquilo que está sendo escrito para o
destinatário do escrito.
É importante que o professor de produção escrita em língua estrangeira, ou mesmo de
língua materna, conheça as características e as habilidades da modalidade escrita de
comunicação. Pois, desta forma, pode ajudar os alunos a terem mais sucesso na elaboração
de um texto escrito. Também vale ressaltar a necessidade daquele que ensina de conhecer as
etapas do processo de produção de um texto escrito, uma vez que, esta produção não implica
apenas o ato de escrever.
172

Assim, verificamos que ensinar a produção escrita em PLE significa, principalmente,


ensinar ao aluno a perceber as peculiaridades desta modalidade discursiva de comunicação,
mostrando as implicações linguísticas e culturais que se fazem presentes na elaboração de
um discurso escrito. Mas do que a gramática ele precisa se apropriar do funcionamento
discursivo da língua alvo. No entanto, os professores de Português Língua Estrangeira
precisam também desenvolver conhecimentos sobre as características dos gêneros textuais a
serem produzidos, o que, talvez, seja mais difícil, na medida em que dispõe-se de poucas
descrições desse tipo.

3. Metodologia

Esta pesquisa foi realizada por meio de uma pesquisa-ação durante aulas de produção
escrita de PLE oferecidas pelo Projeto de Extensão de Ensino de PLE/FALEM/UFPA. Os
participantes além da professora, foram oito alunos integrantes do Programa Convênio de
Graduação (PECG). Eles são estudantes africanos que chegaram ao Brasil em março de 2011
para estudar português por sete meses e prepararem-se para submissão ao Exame de
Proficiência em Português Brasileiro realizado pelo Ministério da Educação do Brasil. Os
alunos aprovados no exame podem fazer um curso de graduação no Brasil.
A coleta de dados foi feita mediante a aplicação de uma sequência didática que, conforme
dito anteriormente, é um procedimento formativo de avaliação. Esta sequência visava ensinar
a produção do gênero carta do tipo argumentativa. Ela foi realizada em quatro módulos
elaborados com atividades variadas para trabalhar os problemas diagnosticados na elaboração
da primeira produção escrita: argumentação, expressar opinião, referenciar o assunto,
adequar-se ao interlocutor: vocativo e pronome de tratamento, saudação e aspectos
linguísticos.
Após a aplicação da Sequência Didática iniciamos a análise prévia das produções
escritas dos aprendentes por meio da observação das modificações nas diferentes reescritas e
da montagem de quadros para verificar o que, de fato, foi regulado. Esta análise já mostra
que o trabalho formativo favoreceu a regulação mais não de forma igualitária, pois apesar de
terem apresentado problemas similares na primeira produção escrita proposta pela sequência,
cada aprendente reagiu de forma diferente em sua reescrita, uma vez que, os ajustes no
processo de aprendizagem ocorrem de forma diferente para cada indivíduo.

4. Considerações finais
173

Uma das verificações que tivemos durante a realização deste trabalho formativo foi a
motivação elevada dos alunos participantes durante a aplicação da sequência. Além disso,
verificamos que os processos de co-avaliação e auto-avaliação continuaram presentes nas
aulas posteriores de produção escrita.
De fato, a Avaliação Formativa mostra-se bastante eficaz no auxílio da aprendizagem
da produção escrita, pois leva os aprendentes a perceberem os problemas da escrita deles, o
modo como conseguem corrigir e que instrumentos ou estratégias podem ajudá-los nessa
tarefa de modo que adquiram autonomia na produção textual.

REFERÊNCIAS

ALLAL, Linda. Formative Assessment of Learning: A Review of Publications in French,


2005.
ALMEIDA FILHO, José Carlos Paes. Lingüística Aplicada, Ensino de Línguas e
Comunicação. Campinas, SP: Pontes e Arte Língua, 2005.
ANTUNES, Irandé. Aula de português; encontro e interação. São Paulo: Parábola editorial,
2003.
BALESTTER, Margarita et al . Avaliação como apoio à aprendizagem. Porto Alegre:
Artmed, 2003.
DOLZ, Joaquim, NOVARRAZ & SCHNEUWLY Bernard. Gêneros orais e escritos na
escola. Tradução de ROJO, Roxane; CORDEIRO, Glaís Sales. Campinas, SP: Mercado de
Letras, p.95-128, 2004.
FERNANDES, Domingos. Para uma teoria da Avaliação Formativa. Revista Portuguesa
de Educação, 2006, 19(2), pp. 21-50, CIEd - Universidade do Minho
FRISON, Lourdes Maria Bragagnolo, Auto-Regulação da Aprendizagem, Ciência e
Conhecimento – Revista eletrônica da ULBRA São Jerônimo – vol. 02, 2007, pedagogia, a.1
HADJI, Charles. A Avaliação, Regras do Jogo. Porto: Porto, 1994.
HOFFMANN, Jussara. Avaliar Para Promover: as setas do caminho. São Paulo: Mediação,
2001. Resenhado por Zwinglio Rodrigues
JÚDICE, Norimar; TROUCHE, Lygia M. Gonçalves. Tópicos em Português como Língua
Estrangeira. Disponível em www.filologia.org.br. Acessado em 19.07.07
LUCKESI, Cipriano. A avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições-16ª ed.
São Paulo: Cortez, 2005.
MARCUSCHI, Elizabeth. Avaliação da Língua Materna: concepções e práticas. Rev. de
Letras - N0. 26 - Vol. 1/2 – jan. /dez. 2006.
PEDROSA, Priscilla Vilas Bôas & RIOS, Marilene Gonçalves. Avaliação Formativa como
reguladora das aprendizagens, 2010. Disponível em:
http://www.uftm.edu.br/paginas/curso/cod/281. Acessado em: Fevereiro de 2011
PERRENOUD, Phillipe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens – entre
duas lógicas. Porto Alegre: Artmed, 1999.
PORTAL, Michele Seabra. Contribuição da avaliação formativa para o ensino-
aprendizagem da produção escrita em turmas numerosas. Dissertação de Mestrado.
Universidade Federal do Pará, 2008.
Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas – Aprendizagem, ensino,
avaliação. Tradução: ROSÁRIO, Maria Joana Pimentel do & SOARES, Nuno Verdial,
174

Edições ASA, 2001. Disponível em:


http://www.asa.pt/downloads/Quadro_Europeu_001_072.pdf. Acessado em: abril/2011
SANTOS, Leonor. Auto-avaliação regulada: porquê, o quê e como?, Universidade de
Lisboa, 2002. Disponível em: www.educ.fc.ul.pt/docentes/msantos/avaliacao.htm
Acessado em: Janeiro de 2011.
SUASSUNA Lívia, Paradigmas de avaliação: Uma visão panorâmica. In.: Avaliação em
língua portuguesa : contribuições para a prática pedagógica /organizado por
MARCURSCHI, Beth e SUASSUNA, Lívia — 1 ed., 1 reimp. Belo Horizonte: Autêntica,
cap. 2, p. 27-43, 2007.

A INTERFACE ENTRE A CONSCIÊNCIA LINGUAGEIRA E O


APRENDIZADO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Silvia Helena Benchimol BARROS (UFPA)


Orientadora: Walkyria MAGNO E SILVA (UFPA)

RESUMO: Esta pesquisa situa-se entre os estudos da consciência linguageira e da autonomia


com influência do fator motivacional em aprendentes adultos do Inglês como língua
estrangeira. Considerando-se a relevância da explicitude do insumo na instrução e da
consciência linguageira que se processa por meio do foco consciente na forma, do emprego de
mecanismos de observação, identificação, reflexão, comparação e utilização de
metalinguagem, hipotetizamos que ao utilizar estes princípios o docente pode favorecer os
aprendentes com a formação de comportamentos que os levem ao controle de sua
aprendizagem. Assim, este estudo objetiva verificar a correlação entre consciência
linguageira, autonomização e motivação como aspecto subliminar. A literatura utilizada
repousa essencialmente nos estudos, observações e registros sobre o tema por David Little
(2010), Flavell (1976), Gillan Donmall (1991), Hawkings (2001), Peter Garrett; Carl James
(1991), Phil Benson (2001), Van Lier (2001), visando recolher, selecionar, analisar, contrastar
e interpretar as suas contribuições teóricas. Concomitante à investigação bibliográfica foi
desenvolvida uma pesquisa ação, com a finalidade de formular problemas e hipóteses
primando pela valorização do contexto dinâmico da sala de aula. A coleta dos dados ocorreu
em uma turma do 6º nível de língua inglesa do Curso livre da UFPa e os resultados das
análises demonstraram que diante de situações em que o insumo lingüístico apresentava maior
complexidade, as produções orais e escritas ficavam comprometidas resultando em menor
participação dos aprendentes nas atividades e que o foco na forma e reflexão conduzidos pela
metalinguagem propiciavam a solução de dificuldades diante dos insumos complexos e os
motivavam a busca por diferentes alternativas de aprendizagem. Os dados foram cruzados
para analise sobre o desenvolvimento de comportamentos autônomos permitindo reflexão
sobre o tema e insights significativos para a solução de problemas emergidos na
imprevisibilidade do contexto da sala de aula.

PALAVRAS-CHAVE: consciência linguageira, metalinguagem, autonomização,


175

ABSTRACT: This research touches the boundaries of the studies on language awareness and
autonomy influenced by motivational factors in adult learners of English as a Foreign
Language. Considering the relevance of the explicit input and the language awareness which
takes place by means of the conscious focus on form, observation, identification, reflection,
comparison and use of metalanguage mechanisms, we hypothesized that by using these
principles, teachers will favor learners with the emergence of behaviors that will lead them to
the control of their own learning. In doing so, the current study aims at verifying the
correlation between language awareness, autonomy and motivation. The basis of this study
lies on the theoretical contributions from authors such as: David Little (2010), Flavell (1976),
Gillan Donmall (1991), Hawkings (2001), Peter Garret; Carl James (1991), Batstone (1994)
Phil, Van Lier (2001) by means of their studies, observations and registers on this issue with
the purpose of collecting, selecting, analyzing, contrasting and interpreting their theoretical
contributions. Besides the bibliographical investigation, an action research took place, in
order to formulate hypothesis within the enhanced classroom dynamic context. The data
collection took place at a sixth level English language classroom from the Foreign Language
Courses at UFPa. Results have demonstrated that when a complex linguistic input was
presented, both oral and written productions were hindered and learners participation,
minimal. We have also observed that focus on form and the explicitude in reflective activities
carried out through metalanguage brings learners closer to the solution of difficulties in facing
complex input and leads them towards different learning alternatives. Data were crossed as
for verifying the implications of language awareness on autonomous behaviors fostering
meaningful insights for the solution of problems emerged in the unpredictability of the
classroom context.

KEY WORDS: language awareness, metalanguage, autonomization

I. ORIGEM E REFERENCIAIS TEÓRICOS DA PESQUISA

Esta pesquisa investiga a relação entre a formação de comportamentos autônomos em


aprendentes adultos do Inglês como língua estrangeira e a consciência linguageira (CL)
propiciada por meio do emprego do Foco na Forma (FonF) no contexto de cursos livres de
idioma cujo objetivo é o desenvolvimento das competências comunicativas.
A motivação adveio de minha própria experiência como docente e formadora de
docentes por mais de duas décadas. Tendo ministrado e participado de diversos cursos de
desenvolvimento e formação de professores de língua inglesa em instituições públicas e
privadas desde 1990, pude observar com frequencia, que o desenvolvimento das competências
no escopo da abordagem comunicativa, esteve sempre associado ao uso, à exposição e à
simulação de contextos reais de forma excessivamente prescritiva. Um exemplo do empenho
em propiciar situações de exposição à língua estrangeira pode ser identificado nos materiais
didáticos que circulam no mercado com os seus índices pautados nas noções de função dos
atos de fala, nas contextualizações e na ênfase ao sentido. Outras evidências deste empenho
176

estão nos estudos da área de Informação e Tecnologia da Comunicação - ICT


(McDONOUGH, 1978; ROSLER, 2000; SILVERMAN, 2001; STEPP-GREANY, 2002;
YOUNG, 1986) que constatam que o ensino de língua estrangeira têm inegavelmente
fomentado a exposição do aprendente à língua alvo por meio do emprego de novas
tecnologias e mídias. Especialmente no âmbito das salas de aula dos cursos de idiomas,
contextos onde se prima pelo uso, o ensino de Língua Estrangeira tem propiciado a simulação
de situações de uso e o desenvolvimento da competência comunicativa por meio dos mais
diversificados gêneros orais e escritos e seus suportes.
Ao contrário do aspecto pragmático do ensino da língua estrangeira, pouca referência
tem sido feita ao uso de metalinguagem e de explicitude na instrução, seja como estratégia de
favorecimento da aprendizagem para fins de uso da língua, seja para favorecimento da
compreensão dos processos envolvidos na aprendizagem. Ao contrário disto, nas sessões de
desenvolvimento de docentes ao longo de minha trajetória acadêmica, minha percepção
sempre foi a de que paira certo receio de inadequação, por parte dos mesmos, em assumir
como apropriadas, intervenções metalinguísticas sobre a percepção e compreensão de usos
linguageiros na língua alvo.
Tal receio é, a meu ver, compatível com àquele que inquieta o docente a respeito de se,
quando e como utilizar a gramática nas aulas de língua estrangeira como notam Doughty;
Williams (1998).
Um fato inquietante em relação à premissa de que os postulados da abordagem
comunicativa dão conta da tarefa de produzir a competência comunicativa nos aprendentes é
que os proponentes desta abordagem não se sentem experimentalmente compelidos a produzir
evidências de que os resultados obtidos com o método comunicativo e seus materiais são
melhores em relação a outras formas de conceber a aprendizagem, pressupondo que a teoria
por si só é suficiente para justificar a aplicação do método e para garantir os resultados por ele
pretendidos, conforme referem Richards; Renandya (2010)
Sob outra ótica e por entendermos que o desenvolvimento dos comportamentos de
autonomização é um componente efetivo e eficaz da aprendizagem e que estes
comportamentos estão relacionados à conscientização de como se aprende, isto é, do aprender
a aprender, senti-me movida a pesquisar sobre esta relação, especialmente em aprendentes
adultos pelo fato destes, ainda que de forma não totalmente consciente, hipoteticamente, já
possuírem melhor percepção do que lhes favorece em termos de estratégias de aprendizagem,
seus canais preferenciais de recepção, compreensão e produção, seus estilos e seus
mecanismos de controle dos seus processos cognitivos.
177

A aparente carência de informação sobre a legitimidade dos mecanismos de promoção


da CL , os parcos resultados significativos das pesquisas sobre a CL e sobre a amplitude dos
estudos desenvolvidos nesta área, especialmente no ensino de Inglês como Língua Estrangeira
(ILE), podem justificar uma postura limitadora da práxis docente diante de possibilidades
realmente efetivas de implemento da qualidade de ensino. O uso de recursos como: insumo
explícito, reflexões sobre as estruturas gramaticais da língua, utilização de metalinguagem e
outras características da CL, que potencialmente auxiliam promovem a autonomização e a
motivação dos aprendentes, especialmente com o público adulto, muitas vezes deixam de ser
empregados em razão das crenças que os docentes têm sobre aprendizagem e de suas
inseguranças sobre a legitimidade dos processos de conscientização linguageira nos contextos
comunicativos.
Van Lier (2001 p.162) ressalta que James e Garret (1991) compilam um número
razoável de estudos realizados em salas de aula e que ilustram diversos aspectos da CL , mas
que ―poucos reportam resultados sólidos‖ que evidenciem com sucesso a relação entre
consciência e sensibilidade lingüísticas na aprendizagem de línguas estrangeiras apesar dos
esforços em pesquisar sobre o tema.
Contudo, apesar da insuficiência de relatos e de estudos experimentais significativos
que tratem da CL como fomentadora da autonomia na aprendizagem de língua estrangeira,
inquieta-me analisar o que de fato ocorre dentro das salas de aula de aprendentes adultos,
onde o contexto suscita a explicitude de aspectos da língua e onde o nível de interferência da
língua materna sobre a língua estrangeira é evidentemente mais influente durante a trajetória
de aprendizagem.
Portanto, estabeleci como objetivo geral deste trabalho, analisar a aprendizagem da
língua estrangeira por aprendentes adultos, sob a ótica da CL, considerando especialmente o
ensino das formas gramaticais mais complexas de um nível intermediário de língua inglesa e
relacionando o emprego de estratégias de instrução por meio do FonF, com o
desenvolvimento de comportamentos autônomos, pelos aprendentes.
As pesquisas de aquisição de segunda língua e de língua estrangeira que se relacionam
ao FonF trazem em seu cerne a importância da consciência metalingüística incluindo as
consciências fonêmica e fonológica. Doughty; Williams (Op. cit) defendem que os princípios
do FonF se aplicam a todas as possíveis formas da língua, incluindo fonologia e discurso.
178

Diz Schwarz, em artigo online, sobre a consciência fonêmica de aprendentes de


segunda Língua que:
(...) estudiosos acharam que quando os aprendentes esforçados de
uma língua eram submetidos explicitamente ao ensino da fonologia
desta língua estrangeira, eles eram capazes de aprendê-la de forma
razoavelmente bem sucedida, e da mesma forma melhoravam suas
habilidades fonéticas 52.

A afirmação de Schwartz triangula as noções de competência comunicativa, CL e


FonF enquanto Schmidt (1990 p. 149) faz referência ao registro cognitivo que é empregado
nas práticas de FonF afirmando que ― a aprendizagem subliminar de uma língua é impossível
e o insumo percebido pelo aprendiz é o que realmente se torna a matéria para o aprendizado‖
53
.
Saeidi; Chong (2005) afirmam que o FonF se refere às atividades que capturam a
atenção dos aprendentes para a forma da língua enquanto mantêm comunicação significativa e
desempenham um papel facilitador da aprendizagem.
Ressaltam ainda, estes autores, que os princípios teóricos do FonF são contrários à
crença de que o ensino de gramática seja sinônimo de técnicas explícitas. Fotos (1998 apud
SAEIDI; CHONG, 2005) menciona que o FonF é uma apresentação de formas gramaticais
baseadas no contexto de uso, muito mais do que uma instrução conduzida abertamente pelo
professor‖.
Sobre a capacidade de apropriação da língua e de seus aspectos de forma consciente,
Little (1997) ressalta a coexistência, no aprendente, das duas dimensões: uma consciente e
outra inconsciente. Isto é, uma faculdade inata, e outra adquirida através dos processos
conscientes e reflexivos. E são os ganhos qualitativos decorrentes deste entendimento
bifocado da CL que nos impulsionam para uma investigação sobre a interface da CL e
Autonomia, isto é, seus desdobramentos em relação à formação de comportamentos
autônomos na esfera educacional, e mais especificamente no processo de ensino-
aprendizagem de língua estrangeira.
Little (2007 citado por DECI, 1995,p.2) afirma que ser autônomo é ―sentir-se livre e
volicional em suas próprias ações‖ e que esta é uma necessidade básica do ser humano

52
Tradução nossa do original: (...) when the struggling foreign language students were explicitly taught the
phonology of the foreign language, they were able to learn the target language fairly successfully, and also
improve their phonological skills.Disponível em http://dyslexia.mtsu.edu/modules/articles/
displayarticle.jsp?id=25.
53
Tradução nossa para o original I have claimed that subliminal language learning is impossible, and that intake
is what learners consciously notice....Schmidt, 1995 p.149.
179

alimentada e alimentadora da nossa motivação intrínseca, e do nosso interesse proativo pelo


mundo à nossa volta.54
Como os sujeitos desta pesquisa são adultos, a fundamentação teórica a respeito das
especificidades da aprendizagem de línguas estrangeiras dentro deste universo, também nos
habilitaram a fazer relações entre as peculiaridades do aprendente adulto e a CL, nos
estimularam a compreender como se dá o enfrentamento das suas demandas, a implicatura de
aspectos motivacionais e o desenvolvimento de comportamentos autônomos.
Considerando que a complexidade e a envergadura da expressão autonomia do
aprendente fizeram dela um conceito problemático e alvo de muitos estudos e tentativas de
definição, decidi refletir sobre algumas delas em especial.
Autores como Little e Dam (1998) interpretam o conceito de autonomia em relação à
liberdade do controle do professor, das restrições curriculares e até mesmo em relação à
liberdade para escolher não aprender. Contudo, estes autores destacam que a liberdade
considerada como componente da autonomia é a liberdade do aprendiz a partir dele mesmo,
em qualquer contexto, e não necessariamente em isolamento. Neste aspecto, a pesquisa que
desenvolvemos trata dos comportamentos autônomos que foram evidenciados especialmente
dentro do contexto de sala de aula, monitorados ou não pelo docente

II. A PESQUISA AÇÃO E OS CAMINHOS METODOLÓGICOS

Para atingir meu objetivo de compreender a interface da CL com a autonomia busquei


responder as seguintes perguntas de pesquisa:

1. Como o aprendente adulto de Inglês como LE se beneficia da consciência linguageira para


o desenvolvimento de comportamentos autônomos?
2. Quais atividades de foco na forma visando o uso contextualizado da língua podem ser
empregadas pelo docente?

54
Tradução nossa do original em Inglês: ―a large body of empirical research in social psychology affirm that
autonomy:―feeling free and volitional in one‘s actions‖ (Deci 1995, p.2) – is a basic human need. It is nourished
by, and in turn nourishes, our intrinsic motivation, our proactive interest in the world around us‖.
180

3. De que maneira essas instruções explícitas podem ser relacionadas com comportamentos
autônomos dos aprendentes?
O tipo de pesquisa adotada foi a pesquisa ação por seu respaldo na perspectiva
qualitativa etnográfica e por implicar em investigação participativa e engajada, isto é,
vivenciada por mim como docente e compartilhada com meus alunos nas aulas de língua
inglesa do sexto nível do Curso livre da UFPa onde o foco foram as ações, reações e relações
emergidas do processo de ensino e aprendizagem.
A pesquisa ação me permitiu refletir sobre minha própria prática, na tentativa de
encontrar caminhos que mediassem a aprendizagem destes alunos. Neste caso meu recurso
metodológico foi o FonF e a implementação dos aspectos de CL.
Originalmente, Kurt Lewin (1947) concebeu este tipo de pesquisa estabelecendo que
se tratava de um processo em espiral composto de três fases: planejamento a partir do
reconhecimento; tomada de ações; descoberta de fatos a partir dos resultados das ações.
Para Dornyei (2007) pesquisa ação é uma terminologia genérica que se presta a uma
família de métodos que seguem alguns princípios importantes em comum. O mais evidente
destes princípios é a ligação entre pesquisa e ensino e pesquisador e professor. Porém outros
princípios se evidenciam como o propósito de obter melhor compreensão do ambiente
educacional e melhorar a eficácia do ensino, justificando assim a introdução de modificações
e o enriquecimento da prática.
Os dados foram coletados por meio de: observação, entrevistas grupais abertas,
entrevistas grupais seriadas semi estruturadas e questionário individual, e foram
posteriormente analisados de forma interpretativa e comparativa.

III. A INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

Como os dados quantitativos e os qualitativos acabam se complementando


naturalmente dentro de uma pesquisa (MINAYO, 1996), não desprezei a necessidade de
categorizar a partir de dados estatísticos.
Para a categorização dos dados, utilizei a sequencia de perguntas proposta por Silva
(2000, p. 50) que implica nas fases: i. ―o que tenho aqui?‖, momento em que ocorre a leitura
das respostas individuais e resumo por palavras-chaves; ii. ―que coisas podem ficar juntas?‖
Momento em que defini as semelhanças entre as respostas a partir das palavras chave
estabelecidas; iii. ―todos esses temas podem ser temas?‖ Momento em que procedi a
181

validação do agrupamento, justificando a categoria; iiii.―qual é o melhor nome para esse


tema?‖ Momento em que defini a denominação dos temas.
Depois das aferições, os dados da entrevista, dos questionários e das atividades de
FonF foram comparados e analisados para fins de interpretação e melhor compreensão dos
fenômenos, possibilitando-nos responder as perguntas de pesquisa.

IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A investigação em curso está atualmente na fase de análise dos dados para a melhor
compreensão da dinâmica representada pelo gráfico que propormos abaixo.

Trajetória da Interface entre CL e Autonomia com interferência da Motivação –


Trajetória da Interface CLAM

REFERÊNCIAS:

BENSON, P. Teaching and Researching Autonomy in Language Learning. Harlow:


Longman/Pearson Education. 2001.
DAM, L.; Little, D. Autonomy in foreign language learning: From classroom practice to
generalizable theory. JALT, Saitama, Japan, JALT.1998
DECI, E. (with R. Flaste). Why we do what we do: understanding self-motivation.
NewYork: Penguin.1995
DONMALL. G. Old problems and new solutions: LA work in GCSE foreign language
classrooms. In JAMES, C.; GARRETT, P. Language Awareness in the Classroom, London:
Longman, 1991.
DOUGHTY, C.; WILLIAMS, J. Issues and terminology. In C. DOUGHTY; J. WILLIAMS
(Eds) Focus on Form in classroom second language acquisition (1-13). Cambridge:
Cambridge University Press. 1998.
182

FLAVELL, J. H. Metacognitive aspects of problem solving. Em L. B.Resnick (Orgs.), The


nature of intelligence (pp. 231-235). Hillsdale, N.Y. Erlbaum,1976.
HAWKINS, E. Foreign Language Study and Language Awareness.York.UK: Cambridge
University Press. 2001.
MINAYO, M. C. S. (org). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 6ª ed. Petrópolis:
Editora Vozes, 1996.
LEWIN, K. Frontiers in Group Dynamics: II. Channels of Group Life; Social Planning and
Action Research," Human Relations (1:2), pp. 143-153.1947.
LITTLE, D. Language awareness and the autonomous language learner, Language
Awareness, 6:2-3, 93-104. 1997.
McDONOUGH, S. Introspection and generalization. In The British Council.1978. The
Foreign Language Learning Process. London: The British Council.1978.
RICHARDS, J. C.; RENANDYA, W. A. (org.). Methodology in language teaching: an
anthology of current practice. New York: Cambridge University Press, 2010.
ROSLER, D. Foreign language learning with the new media: between the sanctuary of the
classroom and the open terrain of natural language acquisition. In http://www.gfl-
journal.de/1-2000/roesler.html#_ftn2. 2000.
SAEIDI, M., CHONG, L. Focus on form approach in a EFL context.2005.
SCHMIDT, R. W. The Role of Conciousness in Second Language Learning. Applied
Linguistics, 1990.
SILVA, I. M. Percepções do que seja ser um bom professor de inglês para formandos de
letras: um estudo de caso. 2000. 115f. Dissertação (Mestrado em Letras) Faculdade de
Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2000.
SILVERMAN, D. Interpreting Qualitative Data: Methods for Analysing Talk, Text and
Interaction, 2nd Edition. SAGE Publications Ltd. 2001
STEPP- GREANY, J. Student Perceptions on Language Learning in a Technological
Environment: Implications for the New Millennium. Language Learning and Technology,
Vol. 6, No. 1, 2002.
VAN LIER, L. Language awareness in R.Carter and D. Nunan (eds). The Cambridge Guide
to Teaching English to Speakers of Other Languages. Cambridge: Cambridge University
Press. 2001.
SCHWARZ, R. Using phonemic awareness with ESL students.Disponível em
< http://dyslexia.mtsu.edu/modules/articles/displayarticle.jsp?id=25> Acesso em 04 Março
2011.
DORNYEI, Z. Research Methods in Applied Linguistics. Oxford University Press, 2007.
Disponível em < http://applij.oxfordjournals.org/content/31/4/586.extract> Aceso em 10
Agosto 2011.
YOUNG, J. The effects of three different sequences of instruction on student
performance and attitudes in a teacher education course (Doctoral dissertation, Florida
State University, 1986). Dissertation Abstracts International, 47, 244. 1986.

NÚCLEOS NOMINAIS – O USO DE ANÁFORAS COMO FORMA DE


REFERENCIAÇÃO AO PREFEITO DE BELÉM NO SUPORTE TWITTER

Vanessa Fabiane Martins de OLIVEIRA (UFPA)


Orientadora: Maria Eulália Sobral TOSCANO (UFPA)
183

RESUMO: Este trabalho pretende analisar as estratégias de referenciação anafórica com


núcleos nominais, utilizando como corpus o perfil ―@sosbelem‖, ―@acaidevinte‖ e
―donamariadisse‖, do suporte Twitter, com o objetivo de reconstruir os sentidos dos objetos-
de-discurso a que essas anáforas remetem – neste caso, o prefeito de Belém Duciomar Costa.
Com isso, procuraremos evidenciar e trazer à superfície as intenções e o posicionamento do(s)
locutor(es) através de suas escolhas, contribuindo assim para as discussões acerca fenômeno
da remissão. KOCH (2003), o processo de reativação de referentes no texto, realizado por
meio de expressões anafóricas forma assim cadeias coesivas que, conforme MOURA (2006),
possibilitam ao falante manter controle sobre o que já foi enunciado (objetos ou indivíduos).
A análise de expressões nominais anafóricas permite-nos recuperar as intenções, crenças e
atitudes do locutor, não se reduzindo, portanto, apenas a uma estratégia de coesão textual.
Observaremos também a participação dos interlocutores, como eles interagem e por que
interagem de tal forma, ou seja, tentaremos explicitar o processo de interação que se
desenvolve nesse ambiente virtual. A investigação sobre o processo de interação entre os
―twitteiros‖ e sobre o contexto sócio-histórico em que esses sujeitos estão inseridos remetem-
nos a outros campos que vão além da Lingüística do Texto.

PALAVRAS-CHAVE: interação, Twitter, referenciação

NOMINAL CORES: USE OF ANAPHORA AS A REFERRAL TO THE MAYOR OF


BELÉM IN SUPPORT TWITTER

ABSTRACT: This work intent to analyse the anaphoric referentiation strategies with
nominal cores, using as corpus the profile ―@sosbelem‖, of Twitter support, with the
objective of reconstruct the object-of-speech senses those anaphoras refer – in this case, the
Belém mayor Duciomar Costa. Thus, we‘ll looking for to evidence and bring to the surface
the intents and the positionament of the announcer(s) through yours choices, contributing thus
for the discussions about remission phenomenon. KOCH (2003), the reactivation process of
referents in the text, realized through anaphoric expressions form cohesive chains that, as
MOURA (2006), enable to speaker keep control about which was enunciated (objects or
individuals). To deepen our knowledge about referentiation and, in particular, about the
anaphor, we‘ll search scholars of the subject, which will enable the necessary theoretical
backgrounds to ours analyses. We‘ll observe too the inter announcers participation, how they
interact and why they interact in such as way, i.e., we‘ll try to explain the interaction process
which that develops in this virtual environment. The investigation about the interaction
process between ―tweeters‖ and about the socio-historic context which those subjects are
inserted refer us to others fields that will go besides Linguistic of the Text.

KEYWORDS: interaction, Twitter, referentiation.

Considerações Iniciais
Com o surgimento da internet e com a popularização das redes de informações e
relacionamentos em nossa sociedade, emergiram novas práticas sociocomunicativas no
ciberespaço que se distinguem pelos aspectos interacionais, objetivos ilocucionais e estrutura
composicional. Dessa forma, essas novas práticas discursivas modificaram e/ou
184

redimensionaram a forma usual e já estabelecida de comunicação e interação entre os


indivíduos. Essas novas práticas discursivas, denominadas de discurso eletrônico – bate-papo
(chat), e-mail, e-fórum, fotolog, blog ou microblog etc –, têm atraído cada vez mais a atenção
de estudiosos da linguagem, já que esses discursos apresentam os mais variados e
interessantes aspectos linguísticos e sociológicos, que constituem um campo extremamente
fecundo para análises dessa natureza.
Atraídos por essa perspectiva, selecionamos para este trabalho – uma síntese da pesquisa
em andamento do mestrado em Lingüística da UFPA, ano 2010 – o suporte Twitter, site de
relacionamento virtual que tem crescido consideravelmente nos últimos anos, e nele,
elegemos como corpus o perfil @sosbelem55, @acaidevinte56 e @donamariadisse57 com o
objetivo de analisar as estratégias de referenciação anafórica com núcleos nominais e, desta
forma, reconstruir os sentidos dos objetos-de-discurso remetidos. No caso dos perfis
selecionados, o objeto-de-discurso a serem retomado pelas anáforas é o prefeito de Belém do
Pará, Duciomar Costa. Ao observarmos as estratégias de referenciação anafóricas utilizadas
pelo locutor nos perfis supracitados, perceberemos que as escolhas não são feitas de forma
despropositada e ingênua, pelo contrário, são intencionais e trazem à superfície suas intenções
e seu posicionamento através de suas escolhas.
Em suma, ao analisarmos esse corpus, não estaremos apenas diante de uma análise
lingüística, mas, também, de caráter sociológica, na qual é possível determinar o contexto
sócio-histórico em que esse locutor está inserido, as possíveis razões que o fez utilizar
determinados expressões para se referir ao prefeito , além das questões sociológicas próprias
das práticas discursivas mediadas pelo computador.

1. O fenômeno da referenciação: anáforas com núcleos nominais

A priori, o pressuposto da referenciação estava pautado numa visão da língua como


representação direta do mundo, a estreita relação entre as palavras e as coisas, os objetos. A
partir do avanço das ciências cognitivas essa postulação ganhou uma proporção maior, as
referenciações já não se encontram mais apenas no âmbito da palavra, mas do discurso. Os
elementos retomados não são apenas objetos, e sim, objetos-de-discurso. Mondada e Dubois
(2003) postulam que tudo aquilo que a língua refere não passa de objetos-de-discurso, ou seja,

55
http://twitter.com/sosbelem Acesso em 05/10/2011
56
http://twitter.com/acaidevinte Acesso em 05/10/2011
57
http://twitter.com/donamariadisse Acesso em 05/10/2011
185

o mecanismo da referenciação é uma maneira de compreender ―como as atividades humanas,


cognitivas e lingüísticas estruturam e dão um sentido ao mundo‖.
A cada lance no jogo comunicativo confere-se aos termos referidos estatutos variáveis,
instáveis, de acordo com nossos posicionamentos. Logo, a referenciação será entendida, não
apenas como uma estratégia de retomada de referentes que geram uma cadeia coesiva que
possibilita aos interlocutores uma compreensão global do texto, mas como um processo de
caráter sócio-cognitivo em que os produtores dos textos (re)criam objetos-de-discurso a partir
do seu projeto-de-dizer. A referenciação constitui uma atividade discursiva, pois, na medida
em que o discurso se desenvolve, os termos retomados são construídos por sujeitos sociais e
históricos em interação. Segundo Koch (2002), ―a realidade é construída, mantida e alterada
não somente pela forma como nomeamos o mundo, mas acima de tudo, pela forma como,
sociocognitivamente, interagimos com ele‖.
Koch (2003) destaca que a reativação de referentes no texto é realizada através de
estratégias de referenciação anafórica que formam, assim, cadeias coesivas mais ou menos
longas. Esse tipo de remissão poderá ser efetivado através de:
a) recursos de ordem ―gramatical‖ ou pelo auxílio de recursos de natureza lexical –
sinônimos, hiperônimos, nomes genéricos, descrições definidas;
b) reiterações de um mesmo grupo nominal ou parte dele;
c) elipse.
A (re)ativação de referentes pode acontecer também por meio de inferências, ―pistas‖
expressas no texto que levam os interlocutores a ―descobrir‖ quais os objetos-de-discursos
remetidos, através dos ―conhecimentos que fazem parte de um mesmo ‗frame‘ ou ‗script‘, a
partir de um ou vários de seus elementos explícitos na superfície textual‖. (Koch, 2003).
Há um tipo de referenciação, que não será analisado neste trabalho, que se realiza por
meio de remissões para a frente, denominada catáfora, geralmente feitas através de pronomes
demonstrativos ou indefinidos neutros (isto, isso, aquilo, nada), através de nomes genéricos e
por meio dos demais pronomes, numerais ou advérbios pronominais
Como já mencionado, as estratégias de referenciação analisadas nesse trabalho serão de
caráter anafórico, ativadas ou reativadas através de expressões nominais definidas, ou seja, de
descrições definidas do referente. Essas expressões trazem incutidas em si as impressões que
o locutor faz do referente, caracterizando-o, conforme diz Koch (2003):

―o uso de uma expressão definida implica sempre na escolha dentre as


propriedades ou qualidades que caracterizam o referente, escolha, escolha
esta que será feita de acordo com aquelas propriedades que, em dada
186

situação de interação, em função dos propósitos a serem atingidos, o


produtor do texto tem interesse em ressaltar, ou mesmo tornar conhecidas
de seu(s) interlocutor(es)‖.

Como se pode verificar, o uso de das descrições definidas não só retomam determinados
elementos do texto trazendo a superfície dados/informações que o produtor julga importante
para seus interlocutores, mas podem também revelar ao interlocutor aspectos importantes
sobre as opiniões, crenças e atitudes do produtor do texto, e isso, por sua vez, auxilia na
construção dos sentidos.

2. O suporte Twitter

As pesquisas acerca dos e-gêneros e discursos eletrônicos têm avançado ao longo dos
anos concomitantemente aos avanços tecnológicos, a popularização da internet e as diversas
modificações nas formas e possibilidades de utilização da linguagem, porém, muito se precisa
avançar nos estudos sobre as atividades linguística-interacionais mediadas por computador,
sendo este um dos principais objetivos que subjaz esse trabalho.
O uso da internet é cada vez mais frequente entre indivíduos do mundo inteiro, logo, é
importante ficar atento às modificações na linguagem influenciadas por ela. Os suportes que a
internet oferece – suportes estes que são inventados, modificados, reeditados o tempo todo –
possibilitam que os indivíduos criem e recriem a língua na mesma proporção, com a mesma
dinamicidade.
Um dos suportes mais recentes e que tem ganhado projeção considerável no meio virtual
e midiático é o Twitter – que será a base das análises desse trabalho. O Twitter é uma
ferramenta de micromensagens, também conceituado como um microblog, apesar de alguns
autores como Recuero & Zago (2009) não concordarem com essa definição, pois para elas
embora a ferramenta seja comumente referida como microblog, optou-se por denominá-la
como um ―micromensageiro‖, já que considerá-se que as apropriações conferidas ao suporte
fizeram com que ele se afastasse da idéia de um blog. Lançado em 2006, o Twitter tem
crescido nos dois últimos anos, tendo um aumento significativo de usuários no Brasil e no
mundo. Twitter, em português, significa ―gorjear‖, ―trinar‖, é o ―canto dos pássaros58‖ e tem a
intenção de denotar algo curto, instantâneo, sintético. .
Por ser um suporte relativamente novo e que redefiniu e/ou recriou um gênero existente
no espaço virtual – blog – agregando-lhe especificidades diferentes, fez com que despertasse

58
O símbolo do Twitter é um pássaro azul, o que reforça a questão da tradução dessa palavra.
187

o desejo de estudá-lo mais profundamente, principalmente no que diz respeito às construções


do sentido estabelecidas a partir das estratégias de referenciação anafóricas.
Vejamos a seguir alguns aspectos composicionais do suporte Twitter que podem
interessar para essa análise.

2.1 O Perfil do Usuário

No perfil, o usuário pode complementar algumas informações a seu respeito,


preenchendo resumidamente um campo denominado Bio ―que te dá 160 caracteres para contar
a história da sua vida‖ (O‘REILY, MILSTEIN, 2009).
Ao construir o seu perfil, o ―tuiteiro 59‖ poderá escolher os atores que irão compor sua
cadeia de relações, podendo ―seguir‖ e ser ―seguido‖ por outros usuários. Segundo Recuero &
Zago (2009), essa conexões são expressas por meio de links nas páginas dos usuários
(tweets). Dessa forma, tudo que o usuário escreve em sua página será automaticamente
publicado na página do seu ―seguidor‖, assim como o contrário.
Um dos aspectos mais relevantes em relação ao perfil do usuário é a possibilidade de
personalizar esse espaço: trocar as cores e imagens do fundo, adicionar uma foto, acrescentar
informações da Bio, adicionar uma frase que lhe defina etc. Ao personalizar o perfil, o usuário
torna, de certa forma, aquele espaço virtual uma representação do ―eu‖. É possível, a partir
das informações contidas nos perfis, saber previamente um pouco daquele interactante.

2.2 Tweet, Mensagens Retweet (RT) e Hashtag

Ao entrar na página inicial do Twitter, como pode ser observado na figura 3, há um


campo com a seguinte pergunta ―O que está acontecendo?‖. O usuário é convidado a
respondê-la, embora, na maioria das vezes, utilize o espaço para atividades de linguagem
completamente diferente da proposta inicial. Essas mensagens postadas nesse campo são
chamadas de ―tweets‖.
Os tweets possuem uma peculiaridade, devem ser escritos com limite e extensão de
apenas 140 caracteres. Por conta desse aspecto, o Twitter é caracterizado como microblog.
Essa limitação exige que o usuário exerça sua capacidade de síntese e tenha presteza para
produzir mensagens essencialmente curtas e objetivas.

59
Tuiteiro é a denominação em português para quem usa o Twitter.
188

No início do Twitter, não era possível destinar mensagens de uma pessoa para outra, o
suporte era utilizado apenas para que os tuiteiros postassem suas próprias atualizações.
Porém, com o tempo, os usuários pensaram que seria interessante entabular conversas e
publicá-las. (O‘REILY, MILSTEIN, 2009). Eles passaram a adicionar o símbolo @ antes dos
nomes das contas numa forma de destinar mensagens públicas a usuários ou como forma de
citá-los. Após um tempo, o Twitter incorporou esse sistema de conversação e o @ seguido do
nome da conta se transformou em um link que direciona o usuário para o perfil da conta
referida. Também chamado de menções ou respostas, Essas mensagens encadeia, muitas
vezes, interações extensas, transformando o Twitter em uma grande sala de bate-papo.
Os Retweets (RT) é o simples ato de utilizar como tweet ou mensagem algo que foi
postado por outro usuário e que você achou interessante, dando a ele os devidos créditos. Ao
retuitar uma postagem, o usuário ativa o recurso da citação e intertextualidade deixando
implícito o caráter valorativo do que foi dito e de quem disse. Alguns tuiteiros utilizam as RT
de maneira literal, enquanto outros acrescentam comentários próprios às RTs, deixando as
com um caráter um pouco mais autoral.
Como não havia no Twitter uma maneira de categorizar um grupo de mensagens que
remetesse a um mesmo assunto ou evento, os usuários criaram uma solução para isso: quando
alguém quer indicar uma relação entre mensagens, cria um pequeno termo, expressão ou
palavra-chave (tags) que tenha relação com o assunto, precedido do símbolo hash (#), também
conhecido como jogo da velha. Resumindo, uma Hashtag nada mais é do que um agrupador
dos tweets relacionados a um determinado assunto. Este recurso facilita a disseminação de um
tópico, assim como organiza o acompanhamento do conteúdo e discussões feitas em relação
ao tema colocado em pauta.

3. O corpus: em cena o prefeito de Belém

A seguir observaremos tweets60 retirados do perfil ―@sosbelem‖ que como se pode


inferir pelo próprio nome trata-se de um espaço para falar sobre os problemas vivenciados na
cidade de Belém do Pará, e assim, criticar, sugerir, informar acerca de tudo que diz respeito a
essa cidade. Contudo, o que poderemos perceber é que o foco do perfil se centralizará em
questionamentos acerca da figura do prefeito, Duciomar Costa. Vejamos:

60
Na linguagem do Twitter, é como são denominadas as mensagem publicadas pelos usuários.
189

@sosbelém disse:
A @bina_jares Acho que o blog do Vic Fofoca e o Belchior-com-medo-de-avião
aparecem primeiro que Dudu, o fantasminha-não-tão-camarada
@sosbelém disse:
B
Quando encontrarem o Belchior, perguntem se ele não viu o prefeitinho por aí.
@sosbelém disse:
C @joalkg As pessoas de Belém são gente muito boa. O único defeito: alguns não
sabem votar e elegem essas coisas que a gente nem consegue ver.
@sosbelém disse:
D Será que se o prefeito Gasparzinho conseguir privatizar a Cosanpa vai dar
flashback dessa venda da Celpa?

Nos tweets escolhidos podemos observar o fenômeno da referenciação através de


anáforas – em negrito – todas referentes ao prefeito de Belém, Duciomar Costa. Como se
pode perceber, as escolhas para se referir ao prefeito não foram aleatórias, todas são
extremamente carregas de sarcasmo e ironia. Isso demonstra o posicionamento do enunciador
a respeito do referente, sendo assim, podemos ter uma noção sobre qual é o posicionamento
ideológico e político do locutor e que apreciação valorativa que ele faz do referente.
No quadro A e D, há uso de três expressões nominais anafóricas ―Dudu‖, ―o
fantasminha-não-tão-camarada‖, ―o prefeito Gasparzinho‖. A primeira trata-se de um apelido
comumente empregado ao prefeito, utilizado por ele mesmo em sua campanha eleitoral, que
aparentemente, em um primeiro momento, não demonstra nenhum caráter pejorativo em se
tratando de um diminutivo. Porém, ao unirmos o apelido a segunda e terceira expressões
anaforizadas, que ativa, também, informações que se encontram fora da superfície do texto, a
partir de conhecimento partilhado sobre a história infantil do fantasma ―Gasparzinho‖,
personagem que apesar de ser sobrenatural não assustava ninguém, era bondoso e gostava de
fazer amigos e, por conta disso, foi intitulado de ―fantasminha camarada‖, vemos que o
produtor do texto não simpatiza com a figura de Duciomar. O prefeito é denominado como
um ―fantasma‖ – e não camarada – por não aparecer, segundo o autor do tweet, trabalhando
na/pela cidade. O tweet A, também faz referência ao episódio em que o cantor Belchior estava
desaparecido, o que gerou uma grande comoção nacional para saber onde ele estava e o
porquê de ter sumido, a partir disso o produtor do texto cria uma relação ao desaparecimento
do cantor com o ―desaparecimento‖ do prefeito.
O tweet B e C traz como remissão as expressões ―o prefeitinho‖ e ―essa coisas‖. O
diminutivo utilizado traz à tona o juízo de valor que o autor faz de Duciomar. É uma
expressão perjorativa que apresenta certa desqualificação, pouca importância ao elemento
190

anaforizado. A expressão ―essa coisas‖ também apresenta incutida em si um caráter


depreciativo, que nos leva a pensar que para o produtor do texto o prefeito não está nenhum
pouco qualificado ao cargo que ocupa, é um ―qualquer‖, passa do status de pessoa para o
status de ―coisa‖.
Analisaremos brevemente algumas interações entre @acaidevinte e @donamariadisse:
@acaidevinte disse:
E @DonaMariaDisse KKKKKKKKK... Vovó toda marombeira. Tá bom de de ir
malhar na academia do Duciomala, o prefeitinho "bom de praça". KKKKKK
@donamariadisse disse:
F @acaidevinte Tedoidé rsrs ! Viste aquela presepada já. Diz que
Dudumarombeiro malhando seu corpinho lindo em Mosqueiro. #vegonhaalheia
@acaidevinte disse:
G @DonaMariaDisse O comercial é tão ridíclo que morri de rir. Esse prefeito é uma
benção.
@donamariadisse disse:
H @acaidevinte Já viste o comercial da merenda escolar? Duduzinho comendo no
prato de plástico? Mais falso que nota de 3 reais. Rsrs
@acaidevinte disse:
I @DonaMariaDisse Eu chamo aqui de comercial do Dudumerendeira... Peeense
num sujeitinho falso :P
@donamariadisse disse:
J Começando como falso Dotô... rsrsrs RT @acaidevinte Eu chamo aqui de
comercial do Dudumerendeira... Peeense num sujeitinho falso:P

Observando o diálogo entre os dois interactantes é possível notar que, à medida que a
interação vai acontecendo, os participantes ativam os elementos referenciais, construindo,
assim, uma imagem do prefeito Duciomar.
As primeiras anáforas nominais a serem construídas nessa interação é ―Duciomala‖ e
―prefeitinho bom de praça‖, em E. O termo Duciomala (aglutinação de Duciomar + mala) nos
remete a construção da imagem de algo/alguém que não é fácil de ser carregado, algo pesado,
que atrapalha o ir e vir das pessoas, comumente utilizado para se referir a pessoas de difícil
convivência, ―chatas‖, cansativas etc.
A expressão ―prefeitinho bom de praça‖ faz referência a um comercial de campanha
eleitoral veiculado no primeiro semestre de 2011, em que o prefeito Duciomar aparece
fazendo exercícios em uma academia de ginástica ao ar livre que construiu em Mosqueiro,
distrito administrativo de Belém. Como o espaço é uma praça que contém alguns aparelhos
para exercícios físicos, o tuiteiro @acaidevinte aproveitou para satirizar dizendo que o
191

prefeito costuma construir apenas ―praças‖, enquanto deixa de lado obras mais importantes
para o crescimento da cidade. Para corroborar com @acaidevinte na construção negativa da
imagem do prefeito, @donamariadisse ativa jocosamente o referente ―Dudumarombeiro, em
F, fazendo relação ao fato de Duciomar aparecer ―malhando‖ no comercial, como costumam
fazer os marombeiros (termo utilizado para pessoas que vivem se exercitando em academias).
Em G e H as anáforas em destaque são utilizados de forma irônica e depreciativa.
―Duduzinho‖ reforça a pequenez e desqualificação da figura do prefeito. ―Uma benção‖ é
termo bastante utilizado em Belém com o sentido oposto do original. Significa que o prefeito
não é visto como alguém ―bom‖ no sentido mais amplo da palavra.
Por último, nos tweets I e J, o contexto, outra vez, será a base para se entender o
referente. ―Dudumerendeira‖ relaciona-se novamente a outro comercial de campanha da
Prefeitura, em que o prefeito aparece, em uma escola de Belém, fazendo uma refeição com os
alunos, para exemplificar a qualidade da merenda escolar. Além, de utilizar novamente a
―brincadeira‖ de unir o nome do prefeito a um outro termo, criando assim, uma expressão de
deboche e ironia, o interactante irá ativar outra anáfora para dar um pouco mais de
sustentação a sua crítica. Para @acaidevinte, a atitude do prefeito ―ausente‖ em ―merendar‖
com as crianças de uma escola administrada por ele, na tentativa de provar a entrega e a
qualidade da merenda, é no mínimo uma atitude falsa, falaciosa. Isso justificaria a utilização
da anáfora ―sujeitinho falso‖. Para finalizar e mais uma vez ratificar a fala do outro,
@donamariadisse ativa o termo anafórico ―falso dotô‖, que além de retomar a ―falsidade‖ de
merendar com as crianças, remete ao episódio das acusações de falso médico em 2000,
quando descobriram que Duciomar exercia ilegalmente a medicina com um diploma falso de
oftalmologista e de possuia três CPFs.
Dessa forma, foi possível traçar uma sucinta análise, tentando reconstruir o objeto-de-
discurso referido nesse corpus, de modo a procurar evidenciar como o fenômeno da remissão
é importante na construção dos sentidos do texto e o quanto eles demonstram do
posicionamento do produtor diante ao termo referido.

Considerações Finais

A priori, este trabalho de dissertação de mestrado encontra-se em andamento, buscando


aprimorar seu corpus e análises.
O objetivo de analisar as estratégias de referenciação anafórica com núcleos nominais
no Twitter, surgiu ao reconhecemos o quanto esse campo é rico, lingüísticamente e
192

sociologicamente, e observamos, através de breves análises de reconstrução dos sentidos dos


objetos-de-discurso remetidos, que muito se pode descobrir sobre intenções e o
posicionamento do(s) locutor(es) através de suas escolhas.
A seleção do perfil ―@sosbelem‖, ―@acaidevinte‖ e ―@donamariadisse‖ não
aconteceram de maneira despropositada, além das questões de referenciações que nelas se
encontram, podemos ter o contato com o falar paraense, englobando assim, a proposta da
linha de pesquisa - Documentação, Descrição e Análise do Português da Amazônia.
Em suma, o que se pretende com essa pesquisa é analisar as estratégias de referenciação
no suporte Twitter, atentando para a questão lingüístico-cognitivas-sociológicas, ou seja, a
construção das imagens e significados dos referentes, procurando evidenciar e trazer à
superfície as intenções, o interesse, o posicionamento do locutor através de suas escolhas,
contribuindo assim para as discussões acerca do fenômeno de referenciação.

Referências Bibliográficas
KOCH, Ingedore Villaça. Referenciação e orientação argumentativa. In: KOCH, Ingedore
Villaça; MORATO, Edwiges Maria; BENTES, Ana Cristina. (Orgs.). Referenciação e
Discurso. São Paulo: Contexto, 2005.
__________. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002.
__________. O Texto e a Construção dos Sentidos. São Paulo: Cortez, 2003.
O‘REILLY, Tim; MILSTEIN,Sarah. Desvendando o Twitter. São Paulo: Digerati Books,
2009.
RECUERO, Raquel. Por que os blogueiros têm Twitter?. Blog Social Media, 27 de maio de
2009. Online, 2009b. Disponível em: http://pontomidia.com.br/raquel/arquivos/
__________. Dos Blogs aos Microblogs: aspectos históricos, formatos e características.
Niterói: 2008. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/zago-gabriela-dos-blogs-aos-
microblogs.pdf
RECUERO, Raquel; ZAGO, Gabriela. Em busca das “redes que importam”: Redes
Sociais e Capital Social no Twitter. GT Comunicação e Cibercultura, XVIII Encontro da
Compós. Belo Horizonte, 2009c. Disponível em: http://www.compos.org.br/data/trabalhos

PERFIL GEOSOCIOLINGUÍSTICO DO DITONGO /EJ/ NAS CAPITAIS


NORTISTAS DO BRASIL

Williane Brasil dos SANTOS (UFPA)


Orientador: Abdelhak RAZKY (UFPA)

RESUMO: Esta pesquisa tem como objetivo principal a distribuição geográfica do ditongo
/ej/ na fala dos informantes das capitais nortistas, a saber: Belém, Manaus, Macapá, Boa
Vista, Porto Velho, Rio Branco. O corpus faz parte do projeto Atlas Linguístico do Brasil
(ALIB). Estamos verificando quais os fatores linguísticos e extralinguísticos que podem
193

influenciar na realização ditongada ou monotongada como ocorre nas situações peixe – pexe,
solteiro – soltero, manteiga – mantega. Dentre as hipóteses que nos instigam ao referido
estudo destacamos: o contexto fonético seguinte pode influenciar no apagamento do ditongo
/ej/ e a monotongação é usada mais que a ditongação pelos falantes de escolaridade baixa.
Este trabalho, ainda, está fundamentado conforme a perspectiva teórica - metodológica da
Sociolingüística e da Geolinguística. No tratamento destes dados, estamos considerando como
variável dependente a supressão da semivogal /j/ correlacionando-a com as variáveis
linguísticas e sociais. Nesta investigação, buscamos quantificar os dados por meio do
Programa Estatístico Varbrul. Até o momento, rodamos os dados das capitais Belém, Boa
Vista e Macapá. No resultado dessa rodada estamos observando os percentuais e os pesos
relativos das referidas capitais. Com base nesses percentuais e pesos será feita a análise dos
resultados. Esperamos com este trabalho verificar, dentre outros objetivos específicos, qual a
capital que mais aplica a regra da monotongação; se o contexto seguinte tem forte influência
para a monotongação e quanto ao sexo, quem não aplica a regra com tanta frequência.

PALAVRAS-CHAVE: Ditongo, Geolinguística, Variação

ABSTRACT: This research's main objective is the geographical distribution of the diphthong
/ ej / in the speech of informants from northern capitals: Belém, Manaus, Macapá, Boa Vista,
Porto Velho, Rio Branco. The corpus is part of the Linguistic Atlas project in Brazil (ALIB).
We are checking which extralinguistic and linguistic factors that may influence the
achievement diphthongize or monophthongs or situations such as in peixe - pexe, manteiga –
mantega, solteiro - soltero. Among the hypotheses that force us to this study include: the
following phonetic context can influence the deletion of the diphthong / ej /
monophthongization and is used by more than the speakers ditongação low schooling. This
work also is based according to the theoretical perspective - Sociolinguistics and
methodological Geolinguística. In the treatment of this corpus, we are considering as the
dependent variable suppression of semivowel / j / correlating it with the linguistic and social
variables. In this research, we seek to quantify the corpus by the Statistical program Varbrul.
So far, the corpus ran from Bethlehem capital, Boa Vista and Macapá. The outcome of this
round we are looking at percentages and the relative weights of these capitals. Based on these
percentages and weights will be analyzing the results. We expect this work to verify, among
other specific objectives, which the capital over the monophthongization rule applies; if the
context has a strong following for monophthongization and influence of gender, who did not
apply the rule so often.

KEYWORDS: Diphthong, Geolinguística, Variation

I. Introdução

Ao analisarmos o material teórico, notamos a grande ocorrência de ditongação, mas


também de monotongação que se referem ao ditongo /ej/. Diante disso, comprometemo-nos a
traçar o perfil geosociolinguístico do referido ditongo nas capitais nortistas do Brasil para
buscar compreender quais os fatores lingüísticos e extralinguísticos que justificam a variação
do ditongo em questão.
194

Nosso objetivo geral está relacionado com um dos objetivos do Projeto Atlas
Linguístico do Brasil – que é o registro da manifestação geosociolinguística em nível
fonético. Desta feita, destacamos a variação fonética do ditongo /ej/ que aqui apresentaremos
como parte de uma pesquisa - realizada no âmbito do Projeto GeoLinTerm61- e que ainda está
em fase de elaboração para a conclusão do Curso de Mestrado em Letras, da Universidade
Federal do Pará.
O referido projeto é coordenado, no Pará, pelo Professor Abdelhak Razky. Atualmente
estamos realizando a análise dos dados de três capitais Belém, Boa Vista e Macapá para que
possamos alcançar os nossos objetivos e ratificar ou não as hipóteses, tecidas por nós, sobre a
variação dos ditongos /ej/.
Pesquisas que tem como objetivo de descrever a Língua Portuguesa estão cada vez mais
sendo produzidas dentro das Universidades. A parceria entre algumas delas faz com que
trabalhos de conclusão de curso, dissertações de mestrado, publicação de artigos e de livros
além da elaboração de atlas linguísticos cresçam cada vez mais ampliando, assim, o leque de
bibliografias sobre o estudo da nossa língua
Sabemos que o trabalho científico sobre a língua ainda é pouco valorizado. Mas isso
não tem abalado àqueles que pretendem colaborar para uma mudança que propicie uma
realidade escolar diferenciada e inovadora. Nosso país precisa, urgentemente, ter um olhar
diferenciado para os trabalhos que buscam demonstrar como os falantes usam e manipulam a
língua.
Para contribuir com as pesquisas de caráter geosociolinguístico, buscamos realizar um
estudo que tenha como meta descrever como os falantes usam a língua em certo espaço
geográfico e conforme alguns condicionantes.
Investigar a língua considerando o seu contexto social – Sociolinguística – e utilizar
uma metodologia que contribua para a coleta e análise dos dados dialetais demarcados
geograficamente – Geolinguística – são peças fundamentais para a execução do trabalho
dialetal.
Os estudos geosociolinguísticos buscam contribuir para o conhecimento linguístico e
para a reflexão das variantes. Além disso, propõem que esta reflexão gere frutos nas escolas,
nos dicionários, nos livros didáticos, nas conversas sem preconceito linguístico.

61
O GeoLinterm integra quatro eixos de pesquisas, sendo que a nossa está inserida nos eixos ALIB - Norte e
Atlas Geosociolinguístico do Pará.
195

Após traçarmos o nosso objetivo geral – que é a analise e descrição do ditongo /ej/,
buscamos elencar algumas hipóteses, que futuramente, serão ratificadas ou não com base na
análise estatística:
 O contexto fonético seguinte pode influenciar no apagamento do ditongo /ey/;
 A monotongação é usada mais que a ditongação pelos falantes de escolaridade baixa;
 As palavras polissílabas têm a maior probabilidade de sofrerem monotongação;
 Ditongos /ej/ em posição final se realizam plenamente;
 A variável localização geográfica não é um fator preponderante para a realização da
monotongação.

II. Fundamentação Teórica


II. I Ditongo

Os ditongos, no espaço brasileiro, tem sido objeto de investigação por parte daqueles
que pretendem investigar a língua em uso, ou seja, como ela verdadeiramente é utilizada pelos
falantes.
Realizamos uma pesquisa teórica sobre os ditongos e constatamos que Câmara Jr.
(1986, p. 101) define os ditongos como um ―grupo de dois fonemas vocálicos pronunciados
na mesma sílaba sonora‖.
Enquanto que Silva (2002) ressalta que um ditongo consiste de uma sequência de
segmentos vocálicos sendo que ―um dos segmentos é interpretado como vogal e o outro é
interpretado como ‗semivocóide, semicontóide, semivogal, vogal assilábica‘ ou de glide‖
(SILVA, 2002, p.73). Os segmentos glides (y e w), nos ditongos, são destituídos de
proeminência acentual; enquanto que a vogal tem proeminência acentual.
A Língua Portuguesa, segundo Aragão (2000), possui trinta e seis ditongos sendo
quinze decrescentes e vinte e um crescentes distribuídos em orais e nasais. Quanto esta
classificação, verificamos que as gramáticas também classificam os ditongos em crescentes
ou decrescentes. Aqueles são formados por uma sequência de glide e vogal; enquanto que
estes são constituídos pela sequência vogal e glide. .
Essa classificação tem gerado algumas controvérsias, pois Bisol (1989) afirma que na
Língua Portuguesa não existe ditongos crescentes. A autora explica que o glide estando em
uma seqüência GV (glide e vogal) está em variação livre com a vogal alta correspondente.
Assim, o ditongo crescente é um processo de ressilabificação, ou seja, união de rimas de duas
sílabas diferentes, como nas palavras (qui.abo,o.este, i.ate, su.ar).
196

Para Bisol (1989) há duas classes dos ditongos, em Português: os leves e os pesados. Os
pesados são também chamados de fonológicos; enquanto que os leves são denominados de
fonéticos. Os ditongos pesados são denominados de fonológicos porque criam pares mínimos
com a vogal simples, como pauta/pata, teima/tem; já os leves, que passam pelo processo de
monotongação, são denominados de fonéticos porque alternam com a vogal simples sem
alterar o sentido, como nas palavras peixe/pexe, roupa/ ropa. Assim, o glide pode ser apagado
sem comprometer o sentido da palavra ao passo que nos ditongos pesados, se isso acontecer,
haverá a alteração do significado da palavra.
Os verdadeiros ditongos são os pesados, ou seja, ligados a dois elementos V (vogal).
Nestes ―o glide aparece por substituição ou apagamento de uma consoante. Toma lugar de
consoante, [na estrutura silábica] e tende a ser preservado‖ (BISOL, 1989, p. 192).
Os ditongos leves são os falsos, porque apresentam variação em sua estrutura e ―são
criados por espraimento ou duração compensatória, diante de palatal‖ (BISOL, 1989, p. 192).

II. II Ditongação e Monotongação

A formação de um ditongo, ou seja, a união de uma vogal mais uma semivogal ou vice-
versa é denominada de ditongação, ou seja, processo este que pode ocorrer na fala espontânea
e também na escrita.
A monotongação é um processo pelo qual há a supressão da semivogal, como peixe –
pexe, caloteiro – calotero. Essa variação, que pode ocorrer com os ditongos leves, é
denominada de monotongação.
Câmara Jr. (1986, p. 100 - 170) define a Monotongação como:

Mudança fonética que consiste na passagem de um ditongo a uma vogal


simples. Para por em relevo o fenômeno da monotongação chama-se, muitas
vezes, monotongo, à vogal simples resultante, principalmente quando a
grafia continua a indicar o ditongo e ele ainda se realiza em uma linguagem
cuidadosa...

Complementando, Trask apud Aragão (2000, p.4) afirma que a monotongação é


―Qualquer processo fonológico no qual um ditongo é convertido em monotongo‖.
Assim, na grafia, o ditongo pode permanecer, entretanto na fala espontânea ele variará,
ou seja, o falante terá a liberdade de ora ditongar ora monotongará. O que prevalecerá é o
entendimento da mensagem.
197

II. III Sociolinguística, Dialetologia e Geolinguística

Pretendemos com este trabalho descrever e analisar a distribuição do ditongo /ey/ nas
capitais nortistas e verificar quais os fatores que influenciam na realização ditongada ou
monotongada como peixe – pexe, solteiro – soltero, manteiga – mantega, sob a perspectiva
teórica - metodológica da Sociolingüística e da Geolinguística.
A Sociolinguística surgiu em 1960, nos Estados Unidos, quando muitos estudiosos da
linguagem decidiram analisar a língua considerando a sociedade que a utiliza. Entretanto, foi
William Labov quem impulsionou o estudo da variação e da mudança linguística sob o viés
sociolingüístico.
A Sociolinguística estuda a língua em seu contexto social, observando o seu objeto de
estudo - que é a diversidade linguística. Quanto à definição do termo, Labov destaca que não
há uma nova disciplina, mas que a Linguística ao criar a Sociolingüística, tenha encontrado o
que é realmente é o seu foco de pesquisa. Isso implica, para Labov, uma incoerência em se
definir a sociolingüística, já que ela é a própria linguística.
Os trabalhos de natureza geolinguística começaram a surgir no século XIX. Estes
contribuíram com eficácia para o novo ramo dos estudos da linguagem, isto é, da dialetologia
atrelada ao método da geografia lingüística.
Neste século houve a preocupação em se registrar e estudar os fatos da língua, apesar de
as regiões ainda estarem demarcadas geograficamente e pelas dificuldades de interação com
as diferentes áreas geográficas, como salienta Cardoso (2010, p.39):

Os estudos dialetólogicos propriamente ditos vêm a se iniciar num momento


da história, século XIX, em que a individualidade geográfica de cada região
estava resguardada seja pelo isolamento decorrente da frágil rede de
estradas, seja pela dificuldade de comunicação...que permitisse a interação à
distância entre as diferentes áreas, mas resultam, principalmente, da
preocupação com o resgate de dados e a documentação dos diferentes
estágios da língua.

A dialetologia é considerada uma ciência que estuda a diversidade linguística e que


possui uma metodologia específica para a coleta dialetal, que no caso é a geografia
linguística.
Para Ferreira e Cardoso (1994, p. 18) a dialetologia pode ser identificada com a
linguística diatópica, horizontal:
198

Todavia, não se pode negar que a dialetologia, a ciência que brotou nos fins
do século XIX, demonstrou, e demonstra até os dias de hoje, seu maior
interesse pelos dialetos regionais, rurais, sua distribuição e intercomparação,
portanto não parece atitude parcial ou incoerente identificá-la com a
linguística diatópica, horizontal.

Conseriu apud Brandão (1991, p. 11-12) define a Geografia Linguística como:

O método dialectológico e comparativo [...] que pressupõe o registro em


mapas especiais de um número relativamente elevado de formas linguísticas
(fônicas, lexicais ou gramaticais) comprovadas mediante pesquisa direta e
unitária numa rede de pontos de determinado território, ou que, pelo menos,
tem em conta a distribuição das formas no espaço geográfico correspondente
à língua, às línguas, aos dialetos ou aos falares estudados .

Corroborando com Brandão, Cardoso (2010, p. 46) salienta que ―Firma-se, assim, a
geografia linguística como método por excelência da dialetologia e vai se incumbir de
recolher de forma sistemática o testemunho das diferentes realidades dialetais refletidas nos
espaços considerados‖.
Assim, a Geografia Linguística ou Geolinguística pode ser definida como uma
metodologia para a execução do trabalho dialetal. A coleta e análise dos dados linguísticos
são utilizados para a elaboração de atlas linguísticos. Esses dados são as variações dialetais
demarcadas geograficamente, socialmente, A dialetologia pode ser considerada como uma
ciência que estuda a diversidade linguística e que possui uma metodologia específica para a
coleta dialetal, que no caso é a geografia linguística.
O método geolinguístico foi e ainda é utilizado, no espaço brasileiro, na elaboração de
atlas nos quais podemos verificar a distribuição espacial da língua portuguesa.

III. Corpus da Pesquisa

Como trabalhamos com os dados do ALIB, consideramos o perfil dos informantes e


fatores sociais conforme está descriminado no referido projeto, a saber:
Informantes: quarenta e oito, sendo oito por capital;
Sexo: masculino e feminino;
Faixa etária: 18 -30 e 50 – 65;
Escolaridade: Fundamental e Superior;
Capitais Nortistas: Belém, Macapá, Proto Velho, Boa Vista, Manaus e Rio Branco.
Questionários: Fonético – Fonológico e Semântico – Lexical.
199

IV. Variáveis da Pesquisa


IV. I. Variável Dependente

Escolhemos como variável dependente binária as duas possíveis formas que o ditongo /ej/ pode

ocorrer, ou seja, o ditongo pleno /ej/ e a sua forma monotongada, isto é, a ausência do glide /j/.

Assim, na aplicação da regra consideramos a forma monotongada do ditongo /ej/, ocorrida nas

seguintes situações: prateleira – pratelera ; manteiga – mantega; beija-flor – beja-flor, curandeiro –

curandera, peixe – pexe.

IV. II. Variáveis Independentes: Linguísticas e Extralinguísticas

Consideramos, no presente estudo, como variáveis independentes as linguísticas e as


não linguísticas, a saber:
 Linguísticas: contexto fonético seguinte, classe morfológica do vocábulo, posição do
ditongo na palavra, estrutura silábica, tonicidade da sílaba;
 Extralinguísticas: sexo, faixa etária, escolaridade, localização geográfica e
instrumentos da pesquisa.

V. Desenvolvimento da Pesquisa

O corpus já foi pesquisado, coletado e transcrito pelos colaboradores do ALIB. A coleta


de dados foi realizada por meio de gravação, e, posteriormente, todas as respostas esperadas
foram transcritas. Para a realização de pesquisas, como a nossa, o ALIB possibilita aos
pesquisadores tanto o questionário escrito, quanto o registro sonoro das entrevistas.
Inicialmente realizamos o recorte escrito e posteriormente o recorte sonoro. Este, que
por sua vez, foi executado com o auxílio do Programa Cool Edit Pro 2.0. Neste recorte
sonoro, encontramos dados que não foram registrados no questionário escrito, ou seja,
respostas não esperadas.
A atenção ao questionário sonoro foi de suma importância para que tivéssemos um
maior número de dados possíveis. Após este recorte, realizamos o processo de transcrição
grafemática dos dados que eram de nosso interesse.
Tratamos de levantar os dados de quarenta e oito informantes das capitais nortistas que
responderam a 159 perguntas do Questionário Fonético-Fonológico e 202 perguntas do
200

Questionário Semântico-Lexical. Ressaltamos que nem todas as respostas foram aproveitadas,


somente àquelas que eram de nosso interesse.
Quanto às etapas da pesquisa já realizamos as seguintes:
a) Recorte dos Dados escritos e sonoro: Já terminamos esta etapa. Apenas estamos
revisando, ou seja, escutando novamente os dados de ambos questionários para complementar
a nossa pesquisa;
b) Pesquisa Bibliográfica: Já pesquisamos várias dissertações que tratam da análise do
ditongo em questão; livros que tratam da sociolingüística, da geolinguística e de variação
lingüística. Entretanto, continuamos a pesquisar, pois ainda temos muito que acrescentar em
se tratando de teoria.
c) Tratamento dos dados: Os dados das capitais de Belém, Boa Vista e Macapá já foram
transcritos e rodados no programa estatístico.

VI. Quanto aos Resultados

Um longo caminho já foi trilhado para tentarmos chegar a um final que justifique nossas
hipóteses.
Já temos os resultados parciais das capitais estudadas, no caso, Belém, Boa Vista e
Macapá. Atualmente estamos realizando a análise dos mesmos com base na rodada que
executamos no programa Varbrul62 o qual nos forneceu os percentuais e pesos relativos para
cada variável selecionada. Nessa análise, consideramos como variáveis os fatores linguísticos
e extralingüísticos.
Não podemos dizer muito de nossos resultados, somente afirmamos que condizem com
algumas das hipóteses levantadas. Na análise estamos fazendo uma relação com os resultados
dos trabalhos anteriores, buscando justificar o motivo que leva o falante, por exemplo, a
realizar a ditongação conforme certo contexto linguístico e/ou extralinguístico.
Esperamos, em breve, apresentar no próximo Seminário de Pesquisa em Andamento
(SEPA) o resultado final de todas as capitais em estudo.

Referências Bibliográficas
ARAGÃO, Maria do Socorro Silva de (2000). Ditongação x Monotongação no falar de
Fortaleza. Disponível em: http://www.profala.ufc.br/trabalho9.pdf. Acessado em: 01 de maio
de 2011.

62
Programa que realiza estatisticamente dados linguísticos variáveis
201

BISOL, Leda (1989). O ditongo na perspectiva da fonología atual. DELTA. V. 5. n°2. P.


185-224.
BRANDÃO, Silvia Figueiredo (1991). A Geografia Lingüística no Brasil. Série Princípios.
São Paulo: Ática.
CÂMARA JUNIOR, Joaquim Mattoso (1986). Dicionário de Linguística e Gramática. 13ª
ed. Petrópolis: Vozes.
CARDOSO, Suzana Alice (2010). Geolinguística: tradição e modernidade. São Paulo:
Parábola.
COMITÊ NACIONAL DO PROJETO ALIB (2001). Atlas Lingüístico do Brasil:
questionários. Londrina: Ed. UEL.
COSERIU, Eugenio (1982). A Geografia Linguística. In: O homem e sua linguagem. Rio de
Janeiro/São Paulo: Presença. USP.
FERREIRA, Carlota; CARDOSO, Suzana Alice (1994). A Dialetologia no Brasil. São
Paulo: Ed. Contexto.
SILVA, Thaís Cristófaro (2002). Fonética e Fonologia do Português: roteiro de estudos e
guia de exercícios. 6ª Ed. São Paulo: Contexto.
TRASK, R. L (1996). A dictionary of phonetics and phonology. London/New York:
Routledge.

Você também pode gostar