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ESTRUTURAS CRISTALINAS
3.1 INTRODUÇÃO
Após a descoberta da difração de raios-X por materiais metálicos realizada por Max von Laue e
colaboradores, em 1912 na Alemanha, e da constatação de que esses materiais eram compostos
fundamentalmente por átomos arranjados segundo formas geométricas específicas, muitos estudos foram
desenvolvidos sobre a relação existente entre a estrutura atômica e o comportamento mecânico dos
mesmos uma vez que suas propriedades também dependem de seus respectivos arranjos atômicos.
A análise da difração de raios X mostra que os átomos de um material cristalino estão dispostos de
forma regular, bem definida, que se repete nas três dimensões através de uma considerável distância
(Figura 3.1). O arranjo atômico dos materiais metálicos pode ser representado de maneira mais simples
através de uma rede cristalina em que os átomos são visualizados como esferas rígidas localizadas em
posições particulares de um arranjo geométrico no qual três eixos perpendiculares entre si são
posicionados arbitrariamente (Figura 3.2).
Figura 3.2 – Conjunto de células cristalinas cúbicas simples. Os eixos de referência x, y e z são
perpendiculares entre si.
3.2 PRINCIPAIS ESTRUTURAS CRITALINAS
No desenvolvimento do estudo sobre estruturas cristalinas é importante inicialmente conhecer
alguns conceitos básicos relacionados com as mesmas. Assim, temos que:
Figura 3.6 – Número de átomos por célula unitária em uma estrutura cfc.
4r a2 a2
2
4r 2a 2
2
4r
2
a 2
2
a 2 2r (3.3)
NC = 12 (máximo)
1 1
Número de átomos ocupando efetivamente a célula: ( 8 vértices) + ( 6 faces) = 4 átomos
8 2
4 3
r 4
FE 0, 74 (máximo)
3
3
2 2r
Figura 3.8 – Número de átomos por célula unitária em uma estrutura ccc.
4r d2 a 2
2
(3.4)
da 2 (3.5)
Substituindo-se a equação (3.5) na equação (3.4) obtém-se:
4r
2
a 2 a2
2
4r 2a 2 a 2
2
4r 3a 2
2
4r
2
a 2
3
4 3
a r (3.6)
3
NC = 8
1
Número de átomos ocupando efetivamente a célula: ( 8 vértices) + 1 no centro = 2 átomos
8
4 3
r 2
FE 0, 68
3
3
4 3
r
3
a 2r (3.7)
c 1,633a (3.8)
NC = 12 (máximo)
Número de átomos ocupando efetivamente a célula:
1 1
( 12 vértices) + ( 2 faces) + 3 no centro = 6 átomos
6 2
4 3
r 6
FE 3 0, 74 (máximo)
3 3
2r 1, 633 2r
2
Figura 3.11 – Principais direções cristalinas em uma célula unitária cúbica de corpo centrado.
Os índices de Miller são representados entre colchetes [x y z].
Componente negativa: x
As coordenadas são medidas em relação ao parâmetro de cada eixo não representando, portanto,
os valores reais das distâncias.
A combinação dos menores números inteiros deve ser sempre utilizada. Ex: A direção [2 4 2] é
idêntica à direção [1 2 1].
Estruturas cristalinas simétricas apresentam direções atômicas que podem ser transformadas umas
nas outras somente através de rotações e/ou deslocamentos do sistema de coordenadas. Tais direções são
consideradas equivalentes constituindo, portanto, uma família que é representada pela forma < x y z >.
Ex: < 1 1 0 > = [1 1 0], [1 0 1], [0 1 1], [1 1 0], [ 1 0 1], [0 1 1], etc que representam as diagonais das
faces, por exemplo, de uma célula cristalina cúbica qualquer.
Assim, o procedimento adotado para a determinação dos índices de Miller de uma direção
cristalográfica obedece ao seguinte princípio:
As componentes do vetor correspondente à direção cristalina, nos eixos (x y z), devem ser
reduzidas ao menor conjunto de números inteiros considerando-se o(s) parâmetro(s) da rede como
unidade (m.m.c.).
Ex: [1/2 1/2 1] → [1 1 2]
[1/2 0 1/3] → [3 0 2]
[1 1 1/2] → [2 2 1]
O sistema de referência para os cristais hexagonais apresenta quatro eixos de coordenadas, ou seja,
a1 , a 2 , a 3 e c , onde:
a1 a 2 a 3 (3.9)
As Figuras de 3.12 a 3.15 e de 3.16 a 3.18 mostram, respectivamente, algumas importantes
direções cristalinas em células unitárias cúbicas e hexagonais.
Figura 3.12 – Principais direções cristalinas em uma célula unitária cúbica de corpo centrado.
Figura 3.13 – Direções cristalinas em uma célula cúbica simples.
Figura 3.17 – Direções cristalinas no plano basal de uma célula hexagonal compacta.
Sabemos que a equação do plano, em um sistema de coordenadas (x y z), pode ser representada
através da equação a seguir:
x y z
1 (3.10)
u v w
onde u, v e w são, pela ordem, as intercessões do plano com os eixos (x y z). Atribuindo-se aos índices de
Miller os valores abaixo, temos que:
h 1 u (3.11)
k 1 v (3.12)
l 1 w (3.13)
Substituindo-se as equações (4.11), (4.12) e (4.13) na equação (4.10) obtemos:
hx ky lz 1 (3.14)
Por conseguinte, para a determinação dos índices de Miller de um plano cristalográfico qualquer
deve ser adotado o seguinte procedimento:
Calcular as intercessões do referido plano com os eixos (x y z), isto é, (u v w), considerando-se
o(s) parâmetro(s) da rede como unidade.
Ex: (1 1 1/2), (1/2 1/2 1), (1/2 ∞ 1/3), etc.
Determinar os inversos das intercessões (u v w), ou seja, (h k l).
serão (h k i l). Como apenas três pontos são necessários para definir um plano, os quatro índices não
podem ser independentes. Logo, os mesmos devem satisfazer a seguinte relação:
h k i (3.15)
Ex: (1 1 2 0), (1 1 0 0), (1 0 1 0), etc.
Nas Figuras de 3.19 a 3.22, 3.25 e 3.26 são apresentados os planos cristalinos mais importantes
existentes em células unitárias cúbicas. As Figuras 3.23 e 3.24 mostram, por outro lado, os principais
planos cristalinos de uma célula unitária hexagonal.
Figura 3.22 – Planos cristalinos nas células cúbicas de corpo centrado e faces centradas.
nº de átomos no plano
(3.17)
área do plano
nº de átomos na direção
(3.18)
comprimento da direção
Ex: Qual a densidade de átomos na direção [1 1 0] da rede cristalina do cobre?
1 1
nº de átomos na direção: 1 2 átomos
2 2
comprimento da direção:
d 2 a 2 a 2 d 2 2a 2 d a 2
onde a 2 2r ;
d 2 2r 2 d 4r
Vazios, lacunas ou vacâncias: são pontos vazios na estrutura cristalina que normalmente deveriam ser
ocupados por átomos (Figura 3.27.a). Estes defeitos podem resultar de um empacotamento imperfeito
durante a solidificação (devido flutuações de temperaturas, presença de impurezas, segregação de soluto,
etc) ou de vibrações térmicas de átomos em altas temperaturas pois, à medida que o nível de energia
térmica se eleva, aumenta a probabilidade dos mesmos se afastarem de suas posições de menor energia
em função de sua maior mobilidade. Resfriamentos rápidos também contribuem para que a concentração
de vazios no material seja elevada uma vez que os mesmos não permitem um intervalo de tempo
suficiente para o fenômeno da difusão atômica.
Existem dois tipos particulares de vazios os quais são conhecidos como defeitos de Frenkel e
defeitos de Schottky. Os defeitos de Frenkel ocorrem quando um átomo ou íon deixa sua posição normal
na rede cristalina, formando portanto uma vazio, indo para uma posição intersticial na mesma. Os defeitos
de Schottky acontecem quando um átomo ou íon deixa sua posição normal na rede cristalina, formando
portanto também um vazio, indo no entanto para um posição na superfície do cristal. No caso de íons, um
vazio catiônico está sempre associado a um vazio aniônico a fim de que o balanço de cargas seja mantido.
Estes defeitos são mais comuns que os de Frenkel uma vez que exigem menor energia para movimentar
os átomos ou íons para as novas posições.
Figura 3.27 – Principais tipos de imperfeições pontuais.
Defeitos intersticiais: são átomos ocupando posições na rede cristalina que normalmente não seriam
ocupadas (Figura 3.27.b). A energia necessária para a formação destes defeitos é maior que aquela
exigida para a formação de vazios. São originados pelos mesmos motivos citados anteriormente para o
caso de formação de vazios.
Impurezas: são átomos estranhos introduzidos na estrutura cristalina substituindo átomos da mesma
(Figuras 3.27.c e 3.28) ou ocupando interstícios (Figura 3.29). Dependendo de suas dimensões podem
provocar tensões na rede cristalina. Átomos estranhos bem menores que os da estrutura cristalina
favorecem o aparecimento de impurezas intersticiais. Ex: Difusão atômica de carbono no ferro para a
obtenção do aço. As Figuras 3.30 e 3.31 apresentam, respectivamente, o mecanismo de difusão de vazios
em uma rede cristalina e os possíveis tipos de imperfeições existentes na mesma.
Figura 3.31 – Principais tipos de imperfeições pontuais existentes em uma estrutura cristalina.
Discordâncias em cunha ou em aresta: são aquelas caracterizadas pela inserção de um plano extra de
átomos na rede cristalina. Próximo a uma discordância em cunha a estrutura cristalina permanece
deformada devido a existência de tensões de tração e compressão (Figura 3.32).
a b
Figura 3.33 – O circuito de Burgers para uma discordância em cunha: (a) cristal perfeito e (b) cristal com
discordância em cunha ou aresta.
Figura 3.35 – Movimento de uma discordância em cunha sob a ação de uma tensão.
Discordâncias mistas: quando ocorrem juntas uma discordância em cunha e outra em hélice. Neste caso
a linha de discordância é curva.
Figura 3.38 – Movimentos de discordâncias: (a) em cunha, (b) em hélice e (c) mista.
É importante salientar, que as discordâncias em cunha somente podem se movimentar no plano de
deslizamento que contém o vetor de Burgers e a linha de discordância. A única forma de deslocar esta
discordância para outro plano é através de “saltos” por meio do aumento ou redução do plano extra de
átomos (Figura 3.39).
Assim, quando as discordâncias em hélice encontram obstáculos, tais como impurezas, átomos
intersticiais, precipitados, etc, podem deslizar para um plano intermediário a fim de evitá-lo e
posteriormente retornar a um plano paralelo ao original proporcionando, então, o deslizamento cruzado.
O movimento de discordâncias em cunha e em hélice pode ainda proporcionar a multiplicação das
mesmas uma vez que estas podem interagir com os defeitos da estrutura cristalina e, ao se encurvarem em
torno deles, originar anéis de discordância. Uma possível justificativa para este fenômeno é dada pelo
mecanismo de Frank-Read o qual é apresentado, de maneira esquemática, na Figura 3.43.
Figura 3.43 – Multiplicação de discordâncias através do mecanismo de Frank-Read.
Contornos de grão: são regiões existentes entre dois ou mais planos de um material metálico,
constituídas por átomos desalinhados com a estrutura cristalina regular, originadas a partir do encontro de
grãos adjacentes durante o seu crescimento (Figuras 3.44 e 3.45). Como os átomos pertencentes a um
contorno de grão ocupam posições distorcidas e, portanto, tensionadas apresentam um estado de maior
energia que os átomos da estrutura cristalina regular.
Figura 3.44 – Efeito amorfo devido à desorientação atômica nos contornos de grão.
logo,
b
sen (3.19)
D
Como o ângulo θ é muito pequeno podemos admitir que sen θ = θ. Assim, a equação (4.19) pode
ser representada da seguinte maneira:
b
(3.20)
D
o que permite concluir que:
b
D (3.21)
A Figura 3.49 apresenta alguns contornos de grão de pequeno ângulo em amostra de uma liga de
cobre-alumínio.
Figura 3.49 – Contornos de grão de pequeno ângulo de uma liga de cobre-alumínio observada em
microscópio eletrônico de transmissão.
Defeitos de empilhamento: são defeitos originados durante o empilhamento de átomos quando aparecem
planos atômicos em uma sequência diferente daquela correspondente à estrutura cristalina perfeita.
Suponhamos, por exemplo, que uma rede cristalina qualquer durante o fenômeno da solidificação
apresente a seguinte correspondência de empilhamento para os planos atômicos:
Assim, qualquer modificação encontrada nesta sequência de planos atômicos é considerada um defeito de
empilhamento, ou seja:
A Figura 3.50 mostra o processo de empilhamento de planos atômicos em uma célula cristalina de
uma estrutura hc. As Figuras 3.51 e 3.52 mostram de maneira esquemática o mesmo fenômeno em outros
tipos de redes cristalinas.
Figura 3.50 – Empilhamento de planos atômicos em uma célula cristalina hexagonal compacta.