ELEIÇÕES 2018
NAIRA HOFMEISTER
candidatos a sempre que sair dos limites do Morro da Cruz, vila na periferia de
presidente de novo
Porto Alegre que tem um dos piores Índices de
Desenvolvimento Humano da capital do Rio Grande do Sul, mas
onde ele se sente confortável para ouvir música e checar o
Facebook no telefone sem medo de ser roubado. Essa é a
justificativa principal para dar o primeiro voto de sua vida para
Bolsonaro propõe
Jair Bolsonaro (PSL), o controverso candidato à presidência da
‘licença para matar’ República que promete rigor com a criminalidade.
para policiais e
venda de ativos da
Petrobras Também são os problemas com a segurança que levam Anriel
do Prado Neves, 24, a optar pela candidatura de extrema direita
do parlamentar e capitão do Exército reformado. Sua convicção
é tanta que até colou um adesivo com a cara do candidato na
traseira do automóvel que dirige para um aplicativo de
transporte. “Sei que tem gente que dá nota ruim por isso, mas
“Vendo camisetas
tudo bem”, se resigna. Ele já foi assaltado duas vezes quando
de Bolsonaro, mas
não voto nele”
era taxista, mas o que preocupa mesmo Anriel é o tráfico e a
guerra com a polícia. “Dos meus 30 amigos de infância, só
sobraram dois. Os outros todos morreram, foram executados”,
lamenta. No Morro da Cruz, metade das mortes de jovens entre
15 e 29 anos é por homicídio.
Rosana Pinheiro-
Para ambos, o perfil “linha dura” do militar, que promete
Machado conversa
sobre jovens e as endurecimento da legislação penal e a revisão do estatuto
eleições do desarmamento, poderia ajudar a solucionar os problemas.
Coronel da reserva
EL PAÍS no Morro da Cruz pouco têm em comum com o perfil
acusa general que institutos de pesquisa desenham dos possíveis eleitores
Mourão de do presidenciável do PSL: eles não são os mais escolarizados
favorecer empresa
(chegaram ao ensino médio), nem ricos e tampouco estão no
em contrato do
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Exército site e Centro-Oeste do país. Também não se enquadram no
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estereótipo que os críticos do candidato dizem ter seus
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use eleitores: são gente de fala branda, que defende opiniões com
serenidade e argumentação, busca informações na imprensa e é, inclusive, capaz de
discordar das propostas mais radicais de Bolsonaro.Learn More CONTINUE TO SITE
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19/08/2018 Eleições 2018: Nem fascistas nem teleguiados: os bolsonaristas da periferia de Porto Alegre | Brasil | EL PAÍS Brasil
A pesquisa
A complexidade do pensamento desses jovens eleitores de
Bolsonaro e a disponibilidade que eles têm para o debate de
propostas chamou a atenção de duas antropólogas que
Cenário eleitoral pesquisam juventude, consumo e política no Morro da Cruz há
difuso põe à prova o quase uma década e que desenvolvem agora uma nova fase do
mítico poder das
trabalho que só termina depois das eleições. Foi acompanhando
campanhas de TV
no Brasil o trabalho de campo de Rosana Pinheiro-Machado e Lucia
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site Scalco que a reportagem do EL PAÍS esteve no local numa
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sexta-feira may“Eles
de agosto. access andsão
não usefascistas,
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pelo contrário,
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tem argumentos para defender sua posição”, observa Rosana.
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19/08/2018 Eleições 2018: Nem fascistas nem teleguiados: os bolsonaristas da periferia de Porto Alegre | Brasil | EL PAÍS Brasil
A triste
conveniência dos
Em grupos focais que vem realizando em escolas, as
candidatos que antropólogas Lucia e Rosana perceberam que o voto em
querem ser eleitos Bolsonaro é também uma questão de gênero. “As meninas
sem enfrentar seus
são muito articuladas na crítica ao machismo que o candidato
eleitores
demonstra”, assevera Rosana. A convicção delas era tanta que
foi preciso criar um grupo exclusivamente masculino para que
os rapazes se sentissem à vontade para declarar seu voto, o que as pesquisadoras
também interpretam como uma reação ao feminismo crescente.
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candidato do PSL fez de seu voto uma homenagem ao coronel Carlos Brilhante Ustra,
condenado por torturar presos políticos durante a ditadura militar.
“Eu tenho pena da Dilma, aquilo não era para ter ocorrido. Passamos uma vergonha
na frente de outros países. Ela tinha votos para estar lá”, lamenta. Ainda assim,
entende a posição do seu candidato: “Ele estava fazendo política. Bolsonaro é um
democrata”, acredita.
O morro
Os bairros onde o Morro da Cruz está localizado não são muito familiares ao porto-
alegrense médio (São José é o principal, mas também a Vila João Pessoa e Coronel
Aparício Borges). Mas nem por isso a favela é desconhecida da população em geral:
lá se celebra anualmente a procissão de Páscoa mais famosa da cidade, com a
encenação da via sacra que termina justamente no alto da montanha, debaixo da
cruz que lhe dá nome. O morro também está a meio caminho entre as duas
universidades mais tradicionais da capital, a católica PUC e a federal UFRGS, e é pelo
mesmo corredor onde passam os ônibus dos estudantes que se acessa a
comunidade, na avenida Bento Gonçalves, uma das mais importantes artérias de
Porto Alegre.
Não é raro ouvir de um morador do Morro da Cruz que ele “vai pra Porto Alegre”
quando precisa sair da localidade (são nove quilômetros até o centro). Lá tem de
tudo: supermercado, farmácia, mecânica, padaria. Placas de freteiros e de
confeiteiras são muitas, penduradas nas grades de ferro das casas. Mesmo a parte
alta do morro é abastecida com transporte coletivo, os postos de saúde atendem a
população apesar da precariedade, as escolas estão abertas. Em uma lan house que
estava cheia perto do meio-dia de uma sexta-feira, os cartazes avisam: “É proibido
pornografia”. Quem não atender é punido com a “perda de todos os créditos”. Já
falar palavrão ou ter um ataque histérico são falhas menos graves, custam 30
créditos a quem cometer os deslizes.
À primeira vista, portanto, o Morro da Cruz não parece uma comunidade vulnerável.
Anriel
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us run a irmã em uma casa de concreto e rua pavimentada. Cássio ajuda a
site
mãe
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Mas as estatísticas sãocontinue
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do Morro
use
da Cruz está na posição 581 entre os 722 locais acompanhados regularmente pelo
Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil. Segundo o IBGE,
Learn More 5% dos domicílios
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localidade são considerados indigentes - seus moradores sobrevivem com ¼ de
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salário mínimo por pessoa, algo em torno de 250 reais. Outros 20% estão em
condição levemente melhor: são os pobres, cuja renda per capita é de meio salário
mínimo. Entre 2000 e 2010, o rendimento médio dos chefes de família do Morro da
Cruz caiu pela metade.
E a realidade pode ser ainda pior do que mostram os dados oficiais, porque há uma
imensidão de áreas irregulares no entorno do centrinho mais organizado, nos becos.
Essa parte não entra nas estatísticas. Por exemplo, se os dados do IBGE contabilizam
uma população de pouco mais de 16.000 pessoas, estima-se que a vila tenha entre
35 e 45 mil moradores. “São muitas ocupações, é impossível saber com precisão”,
argumenta Lucia Mury Scalco, que divide seu tempo no morro entre a pesquisa de
pós-doutorado em antropologia e um trabalho social que criou depois de 12 anos
estudando a população do local.
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Quem votou em uma das cinco zonas eleitorais do bairro São José, onde fica a maior
parte do Morro da Cruz elegeu Dilma Rousseff (PT) —a candidata petista venceu
Aécio Neves (PSDB) em todas as seções eleitorais da região. A sigla tem certa
tradição na localidade: a população do morro sempre foi muito atuante nas
assembleias do Orçamento Participativo, criado no final dos anos 80 durante a
gestão de Olívio Dutra na prefeitura, figura sempre lembrada e referência no bairro.
Cássio lembra que os pais e os tios falam rotineiramente que “o PT ajudou muito o
povo mais pobre”, mas ele mesmo não sabe opinar sobre se a vida era melhor ou pior
antes da era Lula, por exemplo —tinha dois anos quando o ex-mandatário assumiu o
poder.
Por essas e outras razões, as antropólogas acham que o jogo no Morro da Cruz pode
ter virado. “Nas últimas semanas, muitas pessoas nos abordam na rua para dizer que
vão votar no Bolsonaro. Sabem que estamos pesquisando o assunto e vem nos dar
suas justificativas”, revela Rosana.
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19/08/2018 Eleições 2018: Nem fascistas nem teleguiados: os bolsonaristas da periferia de Porto Alegre | Brasil | EL PAÍS Brasil
Mas há outros elementos em jogo. Anriel, por exemplo, se decidiu no ensino médio,
“antes dos protestos” do últimos protestos. Como no Morro da Cruz não há escolas
secundárias, Anriel frequentou o tradicionalíssimo colégio estadual Julio de
Castilhos, na região central de Porto Alegre, um caldeirão da política local, onde
estudaram Leonel Brizola e Luciana Genro, entre uma galeria de celebridades da
vida pública brasileira (Caco Barcelos e o avô do atual presidente do TRF4, Carlos
Eduardo Thompson Flores também foram alunos).
posso contar nos dedos as aulas que tive e era muito fácil de passar”, assegura
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Anriel.
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19/08/2018 Eleições 2018: Nem fascistas nem teleguiados: os bolsonaristas da periferia de Porto Alegre | Brasil | EL PAÍS Brasil
Informação
A militância espontânea é um fator citado por muitos dos eleitores de Bolsonaro no
Morro da Cruz entrevistados pela reportagem do EL PAÍS. Outro ponto repetido por
vários jovens é que o candidato é visto como alguém sem papas na língua, que não
tem medo de dizer o que pensa e cuja comunicação na internet - feita sobretudo por
memes - fala diretamente a esse público. “Eu deslizo o meu Facebook e só aparecem
as coisas dele, nada dos concorrentes”, exemplifica Juan da Paz, 19 anos.
Eles também querem ouvir o que os outros candidatos têm a dizer e acompanham
entrevistas e declarações. A participação de Bolsonaro no Roda Viva foi
acompanhada por todos, mas não na TV, e sim, pelas redes sociais. Anriel, por
exemplo, precisou resgatar o vídeo no YouTube na manhã seguinte, embora tenha
tentado ver ao vivo: “Travou a transmissão do Twitter dele e não consegui mais
assistir”.
https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/17/politica/1534457864_835707.html?id_externo_rsoc=Fb_BR_CM 10/11
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Por motivos como esses, Camila Diefenthaler Zafanelli, 19 anos, está tentando virar o
voto do pai, bolsonarista convicto. “A gente conversa muito em casa, ele super apoia
(o Bolsonaro), mas eu estou insistindo”.
ARQUIVADO EM:
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