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1X O PAPEL DE ESPELHO DA MAE E DA FAMILIA NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL? No desenvolvimento emocional individual, 0 prectrsor do espelho é 0 rosio da mae, Desejo referir-me ao aspecto normal disso e também @ sua psicopatologia. Sem dtivida, o artigo de Jacques Lacan, ‘Le Stade du Miroir’ (1949), me influenciou, Ele se refere 20 uso do espelho no desenvolvimento do ego de cada individuo, Lacan, porém, nao pensa no espelho em termos do rosto da mae do modo co- mo desejo fazer aqui. Refiro-me apenas aos bebés que tém visio, A aplicagdo ranger bebés com visao deficiente, ou sem visio, deve ser deixada de lado até que seja enunciado o tema principal. O enunciado puro é este: nas primeiras fases do desenvolvimento emocional do bebé humano, um papel vital é desempenhado pelo meio ambiente, que, de fato, o bebé ainda nao separou de si mesmo, Gradativamente, a separacao entre o nao-eu € o eu se efetua, e o ritmo dela varia de acordo com o bebé e com o meio ambiente. As modificagdes principais reali- zam-se quanlo a separagao da mae como aspecto ambiental objetivamente percebido, Se ninguem ali esta para ser mae, a tarefa desenvolvimental do bebé torna-se infinitamente com- plicada. Permitam-me simplificar a fungao ambiental ¢ afirmar su- cintamente que ela envolve: mais ampla da idéia, para I. o segurar; 2. © manejar, 3. a apresentagio de objetos O bebé pode reagir a essas provisdes ambientais, mas o resultado, nele, é uma maturacgdo pessoal maxima, Pela palavra Publicado em P. Lomas (org.). The Predicament of the Family A Psycho-Analvtical Svmposiun (1967), Londres. Hogarth Press eo Instituto de Psicaniilise. 153 “maturagao’, nessa fase, pretendo incluir os diversos significados da palavra ‘integracao', bem como o inter-relacionamento psi- cossomitico ¢ a relacao de objeio. Um bebé & segurado, satisfatoriamente manejado e, isso aceito, é-lhe apresentado um objeto de tal modo, que sua expe- riéncia legitima de onipoténcia nao seja violada, O resultado pode ser que o bebé seja capaz de usar o objeto ¢ sentir-se como se esse objeto fosse um objeto subjsetivo, criado por ele. Hud isso & proprio do inicio, e de tudo isso provém as imensay complexidades que abrangem o desenvolvimento emo- cional ¢ mental do bebé e da crianca.! Ora, em certo ponto, o bebé passa a olhar em volta. ‘Talvez um bebé ao seio no olhe para esic, [ mais provavel que a ca- racteristica seja olhar para o roste (Gough, 1962), Eo que vé © bebé ali? Para obter a resposta, temos de nos voltar para nossa experiencia com pacientes psicanaltticos que podem reportar-se a fendmenos bastante primitives ¢, apesar disso, verbaliza-los (quando acham que podem fazé-lo) sem que isso constitua agra- vo a delicadeza do que ¢ pré-verbal, nao verbalizado ¢ nao-ver- balizavel, exceto, talvez, na poesia, © que vé o bebé quando olha para o rosto da mae? Sugiro que, normalmente, o que o bebe ve é ele mesmo, Em outros ter- mos, a mae esta ollando para o bebé ¢ aquilo com o que ela se parece se acha relacionade com 0 que cla vé ali, Tudo isso & facilmente tomado como evidente, Peco que isso, naturalmente bem realizado por maes que estao cuidado de seus bebés, nao seja considerado tio evidente assim. Posso demonstrar minha proposigao referindo o caso de um bebé cuja mae reflete o pro- prio humor dela ou, pior ainda, a rigidez de suas proprias de- fesas, Em tal caso, 0 que é que 0 bebé ve? Naturalmente, nada se pode dizer sobre as ocasides isola- das em que a mae poderia nao reagir. Muitos bebés, contudo, tém uma longa experiéncia de nao receber de volta o que estao dando, Eles olham ¢ nao se véem a si mesmos, Ha conseqiién- cias, Primeiro, sua propria capacidade criativa come aa atro- Para um cxame mais amplo € pormenorizado desas iddias, 0 Ieitor pode consultar meu artigo “(he ‘Theory of the Parent-Infant Relationship’ (1960h). 154 fiar-se c, de uma ou de outra mancira, precuram outres meios de obter algo de si mesmos de volta, a partir do ambiente. Po- dem aleangar sucesso de outra formas as criangas cegus neces Sitam ver-se refletidas por outros sentidas que nao o da vista Na verdade, a mae cujo rosto € fixe pode ser capaz de reagir de alyum outro modo. A maioria das mies pode reagir quando © bebé esta em dificuldades ou quando & agressive, e, especial- mente, quando doente. Depois, o bebe se ucostuma a ideia de que, quando olha, o que & visto € 9 rosto da mic. O rosta da mie, portanto, ndo G um espelho, Assim, a percepgao toma o lugar da apercepgio, toma o hn © comego de tima troci significativa com o mundo, um pro- cesso de duas direcdes no qual o auto-enriguecimento se alterna ado no mundo das coisas vistas. ur do que poderia ter sido com a descoberta do signifi Naturalmente, ha fases intermediarias nesse esquema. Al guns bebés nao abandonam inteiramente a esperanga ¢ estudam » objeto e fazem tudo 6 que & possivel para ver nele algum significado que ali deveria estar, se apenas pudesse ser sentido, Alguns bebés, tantalizados por esse upo de relative fracasso materno, estudam as variiveis Teigdes maternis, numa tentaiva de predizer 0 humor da mde, exatamente como todos nos estu- damos o tempo, O bebe rapidumente aprende a fazer uma pre visio: “Por enquanto, posso ficar seguro, esquecer o humor ia mie © ser espontinea, mas. a qualquer momento, o resto dela i: minhas proprias necessidades manceira se fixara ou seu humor domina pessoais devem entao ser afastadas, pois, de outr meu eu (self) central podera ser afrontado’ Imediatamente depois disso, la diregao da patologia, en- contra-se a predizibilidade, que & preciria, ¢ forga 6 bebe aos limites de sua capacidade de permitir acontecimentos, Isso ucar- reta uma ameaca de caos ¢ o bebé organizara a retirada ow nio mais olhard, exceto para pereeber, como defesa. Um bebé tratado assim erescera sentindo dificuldades em relacao a espe- Thos ¢ sobre o que o espelho tem a oferecer. Se @ roste da mae re, entiia o espelho constitt alga a ser olhado, nao a ser nao rea examinado. Retornando ao curso normal de eventos, quando a menina normal investiga seu rosto ao espelho, ela esta adquirindo a tranquilidade de sentir que @ imagem materna se encontra ali, que a mac pode ve-la ese encontra en rapport com ela, Quando

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