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Ladera c R® Una analise da prans nas pvblicacces hrasilerias Dissectaccs de Mesdeado UNICAMP 14 86 2. A FILOSOFIA DA PRAXIS 30 2.1. Apraxis social e seu cariter formative A sociedade, no seu todo ou em qualquer um de seus dominios, nem é uma realidade natural que se cria, se reproduz e se transforma obedecendo compulsoriamente a forgas exteriores, fora do seu controle, nem é uma realidade caética cuja atividade vital se da desordenada ¢ aleatoriamente. E, ao contrério, uma realidade construida a partir de processos através dos quais o homem, ao transformar a natureza, cria, reproduz e transforma a sua prépria existéncia. A praxis social é, segundo a filosofia da praxis, um dos fatores estruturantes da organizagio da sociedade. E a atividade exercida por uns sobre outros homens na sua vida social, objetivando dar a ela esse ou aquele tipo de reordenagao. Se na atividade produtiva a agio do homem é exercida sobre objetos naturais, na praxis social o objeto € 0 préprio homem. Nao o homem isolado e abstrato, mas o homem inserido no mundo, vinculado a outros homens através da produgiio de bens que atendam as suas necessidades materiais e no materiais, formando os grupos, as classes, ¢ os diversos tipos de sistemas sociais. Segundo Vasquez"? , na praxis social estio contidos os diversos atos orientados no sentido da transformagiio do homem como ser social, destinados a mudar suas relagdes econémicas, politicas e sociais. De forma menos genérica poder-se-ia dizer que a praxis social é a atividade de grupos ou classes sociais, objetivando transformar a organizagio e a diregdio da sociedade, ou a operar nela certas mudangas mediante a atividade do Estado. Ou seja, a praxis social corresponde a atividade politica. A praxis social, ou atividade politica, é entiio o mecanismo que possibilita a0 homem construir, ao longo da historia, as diferentes formas de organizagio e de estruturagio da sociedade. Tais formas concretas, ao serem constru{das, produzem ) -VASQUEZ, Adolfo Sanches. Filosofia da praxis. 3* ed. Rio de Janeiro, Paz ¢ Terra, 1986; 194-201. 31 também determinados estados de consciéncia correspondentes, que thes permitem existir no plane espiritual, subjetivo, que por sua vez pode possibilitar tanto a reproducio quanto a transformagdo dessas formas. Ao relacionar-se com sua existéncia concreta o homem, sendo um objeto que no s6 se deixa moldar, mas que também reage ativamente & agio exercida sobre si, cria formas de transformar ou de modificar tal existéncia em maior ou menor grau. Essas formas, concebidas a partir de uma ago reflexiva sobre a realidade, 36 podem materializar-se mediante a atividade coletiva dos homens. A politica é pois uma atividade pritica, na medida em que a luta que os grupos ou classes travam depende de um certo tipo de organizagio real de seus membros, objetivando atingir certas finalidades. Nesse sentido, exige a criagio de organismos ~ goncretos (Sindicatos, partidos, movimentos sociais), ¢ a adogéo de formas, meios ¢ métodos efetivos de luta (reunides, comicios, manifestagdes, greves ¢ outros). ‘A realizagio dos objetivos implicados na luta politica que gira em tomo da conquista, conservagiio, direc ou controle do Estado por uma classe ou segmento de classe, estando condicionada pelas possibilidades inscritas na propria realidade, exige, entre outras coisas, um alto grau de conhecimento dessa realidade e da correlagio de forgas nela existente. Isso faz com que tal atividade tenha também uma natureza teérico- ___reflexiva. No entanto, abordar teérica e reflexivamente a realidade niio significa, segundo a filosofia da pravis, fazé-lo de forma especulativa com 0 intuito de compreender essa realidade na sua constituigo ¢ no seu funcionamento, mas, sobretudo, em como ela se transforma, em como ela tende a deixar de ser o que é. Esse seu carter teérico-pritico faz com que a atividade politica seja sempre findada no choque e contraposig#io de idéias, projetos ¢ programas, ou seja, na luta ideolégica, e que exerga uma influéncia indubitivel nas agdes reais que determina os rumos a serem seguidos nos virios dominios sociais da realidade em que se dé. A praxis politica, enquanto atividade pratica transformadora, alcanga sua forma mais radical na praxis revolucionéria, cuja finalidade é a transformagio das bases econémicas e sociais que sustentam 0 poder material e espiritual dominante numa 32 sociedade determinada, Dado 0 seu cariter teleolégico transformador, tal praxis | revolucionéria devera fundamentar-se numa concepgao tedrica revolucionéria, sem a qual néo seria possivel qualquer transformagio. © Estado, numa sociedade de classes, representa, para os segmentos de classe no hegeménicos, um espago estratégico @ ser conquistado. Nao é, portanto, um ugar jé ocupado majoritariamente por aqueles que desejam a transformagdo. Ele é, ainda, o espago de poder dos segmentos hegeménicos, que se quer destituir. E através dessa atividade que os diversos segmentos de classe tomam seus interesses, © de como esses interesses se articulam com os interesses de outros segmentos, formando os interesses sociais de classe. E no bojo dessa atividade que as pessoas vio adquirindo clareza das relagdes sociais sob as quais vivem, das fungdes do Estado na estruturagdo dessas relagées, bem como da importincia de sua participagio nas formas concretas de lute, que visam dar a esse Estado outras fungses. bs no seu interior também que pode se evidenciar objetivamente, para os diversos segmentos de classe que dela participam, a necessidade da escola ¢ sua fungi estratégica na elaboragdo/difusio de uma concepgéo de mundo que atenda aos seus interesses. Ao educador, evidenciam-se ai os vinculos existentes entre a educagio e os interesses sociais “am luta nos diversos ambitos da sociedade, como também o seu papel de agente mediador em face de tais interesses. Como afirma Ribeiro” , a atividade politica possibilita aos excluidos, em situagdes andlogas as vividas nos paises periféricos, a conquista de espagos em antigos onganismos da sociedade civil, asim como a criagéo de novos. A escola é um dos espagos - cujo propésito de conquista, por parte das camadas populares, dessas realidades, é despertado tardiamente, pois as reivindicagSes populares no se iniciam com o interesse pela escolarizagéo. A precariedade das condigdes de vida, a que estiio submetidos os segmentos populares, encaminha suas reivindicagées prioritariamente para questées (RIBEIRO, Maria Luiza Santos. A formacSo do Professor no exercicio Profissional nos anos 70: organizasio ¢ lideranga. S40 Paulo, PUC (Tese de Doutorade), 1983.

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