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Forma e Sem-forma

Shrii Shrii Anandamurti


Caetra Púrńimá de 1957, DMC {Dharma Maha Cakra}
Nathnagar, Bhagalpur - Índia

Aquilo que nós menosprezamos como matéria não é nada mais do que uma forma diferente de energia. Para
manter a qualidade inerte da matéria, a existência de energia, como também a sua aplicação, são inegáveis.
E essa concentração de energia, sendo grosseira, expressa ondas grosseiras que são negras. Então, a energia
que causa a qualidade de inércia dos objetos é uma expressão da força estática de Prakrti 1 sobre Puruśa 2.

A influência do princípio sutil é o oposto exato disso, pois ele é efulgente e expressivo. Ele é caracterizado
pela sua excelência de expansão e sutileza. A característica do princípio estático é de amarrar o que quer que
seja sutil dentro das limitações de formas e linhas, fazendo assim com que isso seja trazido para dentro da
periferia da percepção sensorial, e para dentro do escopo da concepção humana. Portanto, devido à
influência estática de Prakrti, o abstrato é trazido até o estágio inicial da matéria (éter 3). A sua natureza é de
dar forma concreta à idéia absoluta. Quando ocorre o desdobramento dos princípios mutativo e sutil, eles
não conseguem dar nenhuma expressão às suas idéias limitadas na falta de um objeto apropriado, ainda que
eles tenham a potencialidade de expressarem a si mesmos. Como eles não têm nenhum meio finito, a
expressão deles não pode se manifestar.

Devido às amarras do princípio estático, a expansividade dos princípios sutil e mutativo, presos pelas
limitações das formas, aparece como um objeto material. Mas como as características dos princípios sutil e
mutativo são ilimitadas, o princípio estático realmente não cria um número limitado de entidades finitas, e
sim um número ilimitado de entidades finitas. A característica do princípio estático – que é fazer com que o
sutil seja trazido para dentro da periferia da finitude – é a causa verdadeira por trás das manifestações tanto
das ações quanto dos objetos. Essas expressões finitas do mundo prático são a expressão agente limitadora
do princípio estático. Nomes, formas e outras simbolizações têm sido atribuídas a elas pelo eu-atuante 4.

A diferença entre os objetos é causada pelos graus variados de amarração pelo princípio estático. Os
indriyas (órgãos sensoriais humanos) e o controlador deles – a mente – aceitam a coletividade desses
objetos, amarrados pelas limitações das formas, como sendo o universo expresso. Onde não existe
estaticidade, não há percepção 5 da criação. Como não há amarras limitadoras, a própria expressão da
criação permanece indistinta. Ou seja: na falta da qualidade de inércia estática, nada pode ser trazido para o
campo da percepção.

Pegue o caso do metal precioso ouro. Sempre que vocês disserem “ouro”, vocês estão se referindo ao ouro
em geral – ao ouro do universo. Para que ele tenha utilidade prática, o ouro terá que ser colocado dentro da
limitação de uma certa forma, tal como um colar de ouro, uma pulseira de ouro ou uma tiara de ouro. As
mulheres podem obter um certo prazer ao usarem esses ornamentos de ouro, mas para o ourives eles não têm
uso prático enquanto ornamentos. Ele está ocupado somente com uma coisa: o ouro. Semelhantemente,
devido à influência do princípio estático, um número infinito de nomes e formas surgiram de Parama
Puruśa 6, a Entidade Singular. A maioria das pessoas obtêm contentamento com o uso desses nomes e
formas finitos, mas para aspirantes espirituais práticos, eles não têm nenhuma importância especial.
Sádhakas 7 estão interessados somente na substância original, e não nas suas formas finitas. Portanto, o

1
Nota do Tradutor para português (N.T.p.): Prakrti, ou princípio operativo, é o nome coletivo das três forças ou princípios
(guńas): estático, mutativo e sutil.
2
N.T.p.: Puruśa, ou princípio cognitivo, denota a Consciência pura, não-qualificada.
3
N.T.p.: No processo de criação e evolução do universo, éter é o primeiro dos cinco fatores fundamentais da matéria, criados pela
influência cada vez maior do princípio estático de Prakrti sobre Puruśa.
4
N.T.p.: Em inglês, “doer-I” – ou seja: o “eu” que faz, que age.
5
N.T.p.: A palavra em inglês é awareness, significando a qualidade de estar atento ou ciente de algo.
6
N.T.p.: Parama Puruśa significa “Consciência Suprema”.
7
N.T.p.: Sádhaka (ou o feminino sádhiká) denota um (ou uma) aspirante espiritual – ou então: uma pessoa que pratica sádhaná
(veja-se a próxima nota).
único objeto de ideação deles é Parama Puruśa. Eles aceitam somente Parama Puruśa, a Entidade Singular,
como o objetivo de suas vidas – assim como o ourives está interessado somente no ouro, e não nas suas
diferentes formas.

Como pode uma pessoa livrar-se da influência da inércia estática? Como pode uma pessoa libertar-se das
amarras de nomes e formas? Assim como um ourives usa um martelo e o processo de derretimento (no fogo)
para extrair o ouro real a partir dos variados ornamentos, similarmente um aspirante espiritual prático terá de
romper as amarras de nomes e formas deste mundo manifesto através do cultivo do conhecimento (que é
mutativo) e da devoção (que é sutil). Em virtude do calor do fogo da sádhaná 8 e da força derivada da
prática intuicional continuada, um sádhaka consegue sobrepujar a inércia estática e a causa aparente por trás
do universo quinquelementar 9. A vida e o mundo irão tornar-se brilhantes com o resultante
desenvolvimento da consciência latente.

Yadátamastanna divá naratrirna sanna cá saincchiva eva kevalah


Tadakśaraḿ tat saviturvareńyaḿ prajiňáca tasmát prasrtá puráńii.

Tão logo a escuridão mental tenha sido dissipada, a pessoa irá ver todas as coisas brilhando à luz do
conhecimento. O universo inteiro irá se mostrar como uma entidade indivisa, infinita e radiante. Não haverá
diferença entre noite e dia, entre real e irreal. A diversidade irá fundir-se na singularidade. Todas as
expressões finitas irão fundir-se na Entidade Macrocósmica integral.

Essa Entidade Consciente Suprema que está além da escuridão cimeriana é chamada de Akśara Puruśa (a
Entidade Imutável). Ela é o Uno que deve ser adorado por todos. Ele é o Pai Universal. A partir da Sua
Cognição Infinita, surgem todas as coisas.

Para realizar-se a Entidade Suprema todo-pervasiva, a escuridão estática precisa ser eliminada da mente da
pessoa – não existe alternativa. Aqueles que tateiam na escuridão da estaticidade estão fadados a
diferenciarem entre vários objetos e certamente serão levados a adorarem vários objetos finitos. Quando
uma pessoa desenvolve amor real pelo Supremo através de uma sinceridade inflexível e de intensa prática
espiritual, as amarras da inércia gradualmente afrouxam-se e finalmente rompem-se. Aquelas pessoas que
consideram o finito como sendo infinito, e que atribuem a qualidade de Brahma 10 a objetos finitos, por fim
degeneram até tornarem-se matéria inerte. Elas ficam psicologicamente incapazes de transcender as
limitações de linhagem, casta, comunidade e estado.11 Elas podem até fazer discursos que soam nobres, mas
na realidade elas enxergam este mundo através das lentes da mediocridade. Para satisfazer seus interesses de
grupo egoístas, elas utilizam seu poder intelectual e sua energia física em feudos e batalhas mutuamente
destrutivos, em ofensas e inveja, e assim corrompem a atmosfera do universo inteiro.

Alguns intelectuais são a favor de respeitar-se todas as religiões. Eu digo que tais pessoas não podem fazer
nada para promover a solidariedade da raça humana, pois a maioria das religiões exigem de seus seguidores
fé cega, em vez de racionalidade. “Não pergunte”, eles proclamam. “Aceite os ensinamentos das escrituras,
pois elas são palavras diretas de Deus.” Os intelectuais espertos do passado incutiram a importância da fé
cega nas mentes dos seus seguidores crédulos. Eles disseram-lhes para obedecerem os ensinamentos, sejam
racionais ou irracionais, pois de outro modo não haveria trégua para o sofrimento infindável da vida
humana, nem qualquer outro caminho para levá-los até a bem-aventurança eterna do céu.

Na maioria dos casos, as religiões tiraram proveito das fraquezas humanas, aleijaram a racionalidade das
pessoas e solaparam a força delas, facilitando assim que fossem exploradas pelos mercadores religiosos.
Quando a vitalidade e força das pessoas não alcança nenhuma expressão, os exploradores ficam aptos a
explorarem-nas na esfera econômica e nas demais esferas da vida por um longo tempo e com relativa

8
N.T.p.: Sádhaná significa, simplificadamente, prática intuicional ou espiritual. Mais adiante o autor abordará o significado desse
termo.
9
N.T.p.: “Quinquelementar” – isto é, constituído pelos cinco elementos ou fatores fundamentais da matéria. [Veja-se a nota 3.]
10
N.T.p.: Brahma significa, em resumo, “Entidade Suprema”.
11
N.T.p.: O autor refere-se aqui a vários “sócio-sentimentos”, ou aspectos sociais que funcionam como atratores em torno dos
quais circulam, ou para os quais fluem, os sentimentos da pessoa cuja mente está fixada nos mesmos, ou dominada pelos mesmos.
facilidade. Nos registros da história humana, pode-se observar que em todas as épocas os vários
exploradores foram os patrões e os pregadores das religiões.

Dharma é totalmente diferente de religião pois ensina os seres humanos a avançarem esmagando
impiedosamente todos os obstáculos que restringem o progresso humano. Suas qualidades inerentes são
análise sutil, força ideológica e o brilho da bravura. É por isso que interesses escusos não podem tolerá-lo e
usam toda sua força e maquinações para oporem-se ao dharma. Eles afirmam que estão protegendo a
religião. Quanto maior o conflito entre uma pessoa e outra, entre uma comunidade e outra, entre um estado e
outro, maior é o proveito deles. Mas quando muitas pessoas formam uma mente coletiva através do
sacrifício sincero e da prática ardente, avançando em direção à realização da unidade com o Supremo, será
difícil que se continue a explorar as pessoas sob qualquer pretexto.

Na verdade, a ignorância de Brahmaváda (ciência intuitiva) e do dharma 12 causaram enorme malefício à


raça humana. Na sociedade civilizada moderna, não se deveria permitir que a mesma coisa se repetisse.
Através da aceitação do todo-pervasivo e todo-permeante Brahma como a causa primordial dos mundos
denso, sutil e causal; da realização de Brahma como o núcleo de quem desfruta, daquilo que é desfrutado e
do desfrute em si mesmo; e mantendo-se a Cognição Suprema fixa perante a mente, a vida humana deveria
ser reconstruída sobre uma fundação firme. Todas as esferas da vida deveriam ser completamente
reestruturadas. Todos os sentimentos de diferenciação – o deus dele, o deus dela, o Hari dos hindus e o Álláh
dos muçulmanos – deveriam ser abandonados, e aquela Entidade Suprema deveria ser aceita do fundo do
coração da pessoa. Essa Entidade Suprema Imperecível é o desideratum final, o ponto culminante de todas
as entidades. Nós não deveríamos nos importar nem um pouco se alguém A chama de Hari ou se alguém A
chama de Álláh.

Aquelas pessoas cuja existência está preenchida com a ideação cósmica não conseguem suportar
discriminação nenhuma com relação a Parama Puruśa e a Sua criação. Mas aquelas que não
compreenderam adequadamente o conceito de Entidade Absoluta, confinam-Na às amarras das limitações
através de discussões medíocres (sobre argumentos insignificantes tais como se Hari é maior do que Álláh,
ou se Álláh é maior do que Hari), ou defendendo que Ela reside em certos lugares sagrados de peregrinação.
Algumas dessas pessoas erguem suas mãos e proclamam: “Deus está ouvindo tudo lá de cima.” Outras
acreditam que a Entidade Suprema está confinada aos limites de templos, mesquitas e igrejas, e distribui as
Suas dádivas para todos. Como é que alguém seria capaz de manter essa Entidade Infinita confinada a um
lugar ou a uma idéia limitados? Deixemos de lado os templos, mesquitas e igrejas: nem mesmo um
continente, um sistema solar ou o universo inteiro conseguiriam confiná-La. Pessoas estúpidas, devido à
influência do princípio estático, erroneamente atribuem a qualidade de Brahma a objetos finitos, e adoram-
nos. Elas apresentam argumentos racionais tentando justificar o apoio delas a superstições devido aos seus
samskaras 13 acumulados ao longo de muitas vidas.

Naenamúrdhvaḿ na tiryaiňca na madhye parijagrabhat


Na tasya pratimá asti yasya náma mahadyashah.

12
N.T.p.: De outras obras do autor:
Dhriyate dharma ityáhuh sa eva paramam prabhu.
“Dharma é a entidade que sustenta, a entidade contenedora, a entidade controladora. Por isso, para todo e cada ser
unitário, dharma é o Senhor Supremo.”
["Jaeva Dharma and Bhágavata Dharma".]
“Dharma é aquilo que sustenta os seres unitários, que é a força motivadora e mantém a existência deles”.
["Shiva's Teachings – 1 (continued) (Discourse 11)". "The Secret of Dharma Lies Hidden in the Mind".]
“O verbo raiz dhr mais o sufixo man é igual a dharma. Dharma significa ‘entidade sustentadora’, ‘entidade
controladora’; dharma significa svabháva: ‘propriedade característica’.”
["Jaeva Dharma and Bhágavata Dharma".]
13
N.T.p.: Os samskáras são muitas vezes referidos como o “karma” de uma pessoa. Em verdade, o termo samskára denota uma
reação não-assimilada correspondente a uma certa ação (karma). Essas reações ou samskáras tendem a ficar acumulados (ou
latentes) em certa camada mental da pessoa, até que sejam “compensados”, “assimilados”, “queimados” ou exauridos. O autor
abordará esse assunto mais adiante no texto.
As pessoas que dizem que o todo-pervasivo Brahma mora acima estão equivocadas. Sem dúvida Ele fica
acima, mas a Sua permanência nesse estado é uma expressão parcial e espacial, e não a Sua manifestação
plena. Se Ele tivesse alguma réplica (pratimá), Ele ficaria confinado em um espaço específico, mas Ele não
tem. O significado derivativo de pratimá é “uma coisa em forma de miniatura”. Se um objeto, não importa
quão grande possa ser, for circunscrito por linhas delimitadoras, facilmente pode-se criar uma forma em
miniatura para fazer com que o povo comum entenda mais facilmente. A Terra, o Oceano Pacífico e o
sistema solar são grandes mas não são infinitos, e portanto podem ser representados em um mapa ou gráfico.

A afirmação simplista “Eu estou tentando descobrir a consciência em uma figura de gesso” pode soar
agradável aos ouvidos mas pela lógica é totalmente inaceitável, porque ela é meramente a expressão de um
sentimento. A Consciência Suprema existe em todos os países e em todas as épocas igualmente. Não há
possibilidade de confiná-La dentro de algo limitado. Todo o falatório de Sua invocação, arrumação ou
imersão na forma de uma deidade 14 é sem-sentido. Também a questão se um certo dia é auspicioso ou
impróprio para a adoração da Entidade Suprema não tem nenhuma significância que seja.

A única maneira de uma pessoa firmar-se em Seu patamar Macrocósmico todo-pervasivo é praticando
Brahma sádhaná. Meramente acalentar um desejo ardente de que a Entidade Suprema irá aparecer perante a
pessoa na forma de um ser humano para satisfazer todas as vontades dela não irá ajudá-la a alcançar o
objetivo Supremo. Aquelas pessoas que afirmam que o deus delas apareceu perante elas e conferiu-lhes
dádivas, ou receitou remédios para os males delas depois que elas fizeram dhara longamente (sentaram-se
em frente de uma deidade por um tempo muito longo, com a expectativa de receberem uma mensagem
divina) enganam a si mesmas. As suas visões de deuses e deusas formam-se a partir da própria substância
mental delas, devido à concentração mental delas, e as assim-chamadas mensagens divinas provêm do vasto
vazio de cognição das suas próprias mentes causais. É a onisciência latente da própria mente causal delas
que confirma a informação já recebida pela manomáya kośa 15 (o conhecimento da mente inconsciente
infiltra-se no consciente).

Se vocês desejam comparar um objeto com outro, vocês têm que escolher um objeto que tenha qualidades
parecidas. Por exemplo: vocês podem dar a alguém uma idéia sobre a brancura da cal mostrando a ela uma
coalhada, porque ambas são brancas. Similarmente, vocês podem dar a alguém uma idéia sobre o sabor do
melado de cana-de-açúcar dando a ela melado de tâmara, porque ambos são doces. Mas vocês não podem
dar a alguém uma idéia sobre a natureza da água mostrando a essa pessoa um pedaço de ferro, porque eles
são categorias diferentes de objetos.

De modo semelhante, se vocês querem transmitir o conceito de Brahma, vocês terão de recorrer a uma outra
entidade parecida com Brahma – só que não existe uma outra entidade como Ele. Ele é a Entidade Infinita, a
encarnação da Bem-aventurança Suprema, a existência e o conhecimento personificados. Portanto, para
fazer uma comparação, vocês precisam de um objeto finito que seja infinito e supremamente bem-
aventurado. Mas como é que o finito pode ser infinito? Consequentemente, nenhum objeto finito pode ser a
Sua réplica. O rśi 16 diz: “A Entidade Suprema que não tem fronteira, cuja glória e excelência não têm fim,
jamais poderá ter uma réplica de Si mesma.”

Na saḿdrshe tist́hati rupamasya na cakśuśá pashyati kashcanaenam

14
N.T.p: Ou seja, a deidade pode ser vestida ou arrumada de alguma forma, pode ser banhada ou imersa em um rio e assim por
diante.
15
N.T.p.: Também denominada pelo autor de “mente sutil” ou de “mente subconsciente”.
16
N.T.p.: Várias indicações do significado do termo, incluindo etimologia da palavra dada pelo autor:
“Sábio; alguém que, inventando novas coisas, alarga o caminho do progresso da sociedade humana.”
[“Glossary”. Namah Shiváya Shántáya.]
“A raiz verbal rś tem muitos significados, um dos quais é “elevar-se”. [...] Acrescentando-se o sufixo in à raiz verbal rś
obtemos a palavra rśi, cujo significado etimológico é “alguém que se eleva”; o seu significado coloquial é “uma pessoa
de mente elevada, intelecto elevado, pensamento elevado”.”
[...]
“Pessoas de consciência elevada foram chamadas de rśi desde os tempos do Rgveda.”
[“Rk to Rkśa (Discourse 11)”. Shabda Cayaniká Part 2.]
Hrdáhrdisthaḿ manasá ya enamevaḿ viduramrtáste bhavanti.

Em nenhum lugar do universo vocês poderão ver a forma plena Dela, porque os nervos óticos limitados de
vocês são incapazes de percebê-La em Sua inteireza. Se vocês disserem que Parama Puruśa existe em um
certo local de peregrinação, isto é tão apropriado quanto dizer que Ele não existe em nenhuma parte do
universo. Ele não tem forma espacial, e tampouco ocupa lugar nenhum em especial. Os seus olhos
grosseiros somente conseguem perceber o fator espacial, e nada além disso. Como as expressões Dele não
são limitadas a nenhum lugar em particular, Ele não está incluído no escopo da percepção sensorial.

Em tais circunstâncias, como é que alguém consegue alcançá-Lo? A pessoa tem de fazer com que o espelho
do seu “eu” existencial (buddhitattva – que contém os impulsos para as ações) torne-se absolutamente
imaculado. Enquanto o “eu” existencial estiver coberto com camadas de escuridão, ele não conseguirá
refletir a Consciência Cósmica. Ela não será visível em tal placa mental defeituosa. Para perceber a
manifestação Dela no vasto céu das suas mentes internas, vocês terão de fazer com que as suas placas
mentais fiquem absolutamente límpidas e imaculadas através do processo de sádhaná. Nesse processo de
purificação mental, vocês irão experimentar que a Entidade Suprema adentrou-se nas suas mentes internas
(buddhitattva) e estabeleceu contato com o núcleo íntimo dos seus corações. Lembrem-se que Ela somente
pode ser alcançada através de ideação. Vocês jamais irão encontrá-La em templos e mesquitas, igrejas e
sinagogas. Ela não poderá ser encontrada em lugar algum externamente, pois Ela já abrigou-se no santuário
das suas mentes internas.

Sádhaná é o esforço de auto-purificação (átma suddhi) e de purificação mental (citta suddhi). As pessoas
que fazem uma imersão sagrada no rio Ganges ao pôr do sol depois de passarem o dia roubando os outros e
aceitando propinas não são seguidoras do dharma; nem tampouco aquelas que constróem igrejas, mesquitas,
templos e casas de repouso para peregrinos com parte das suas enormes fortunas acumuladas com o mercado
negro e adulterações. Elas não podem escapar dos resultados dos seus pecados desse jeito. Aquelas pessoas
que cometem atos pecaminosos acumulam um monte de samskáras grosseiros – uma carga pesada que
ninguém mais pode carregar. Mas se vocês tornarem as suas placas mentais absolutamente imaculadas,
Parama Puruśa irá aparecer nas suas mentes com toda a Sua efulgência, e irá encher todo o ser de vocês
com bem-aventurança imensurável.

É verdade que a emancipação de uma entidade não implica na emancipação de outras entidades. Suponha
que um lótus tenha sido colocado no meio de um círculo de dez espelhos. A reflexão dele será mais nítida no
espelho mais limpo. E somente observando essa reflexão uma pessoa poderá adquirir um conhecimento
apropriado sobre aquele lótus particular.17 Se vocês olharem nos outros espelhos {que não estão
devidamente limpos}, vocês não irão obter nada que seja como uma imagem clara do lótus. Será que se deve
culpar o lótus pelas imagens imperfeitas? Não: o defeito está nos espelhos.

A intuição pode ser comparada com o espelho microcósmico. Aquele espelho que alcança o Ser Cósmico
devido à sua ausência de máculas torna-se liberado – os demais não. Não se deve culpar a Entidade
Macrocósmica por isso; a falha está no microcosmo, porque ele não se esforça em remover as camadas de
escuridão da sua mente. A intuição é a reflexão da percepção que se recebe, a reflexão da assimilação
psíquica. Mas quando a intuição não foi despertada, nenhuma percepção recebida será refletida nela, e é por
isso que um objeto é chamado de matéria. Essa matéria não tem capacidade de assimilação interna e, assim,
acaba sendo completamente dirigida pela Vontade Cósmica.

A mente refletora frequentemente pensa que as suas atividades secretas ou os seus pensamentos ocultos
ficam invisíveis ou incógnitos para todas as demais pessoas. Entretanto, assim que uma imagem é formada
na mente unitária, ela é imediatamente refletida na Mente Cósmica. É por isso que ninguém pode fazer
qualquer coisa que fique desconhecida por Ela. Quando um homem rouba alguma coisa, a Entidade
Suprema ficará sabendo imediatamente do roubo. Quando a polícia o prende e ele nega o seu crime, ele sabe
que está contando mentira e assim a Entidade Suprema também sabe que ele está contando mentira. Se um
17
N.T.p.: Isto, como é o caso, se a pessoa estiver limitada a olhar apenas para os espelhos, sem poder olhar diretamente o lótus. A
analogia é com a situação de que as pessoas terão de conhecer ou perceber a Entidade Suprema através de suas mentes internas,
através do espelho de suas placas mentais.
policial desonesto aceitar um suborno e deixá-lo ir embora, o homem saberá que o policial aceitou um
suborno, e assim Parama Puruśa também saberá. Mais tarde, quando aquele policial sofrer uma grande
tragédia, tal como a morte do seu filho, os seus olhos se encherão de lágrimas de amargura e ele reclamará:
“Por que é que essa desgraça terrível se abateu sobre mim? Eu não fiz nada errado.” Essa reclamação será
imediatamente ouvida pela Entidade Suprema, que irá perguntar ao policial no fundo do seu coração: “Será
que Eu aceitei o suborno?” Essa Entidade Suprema sabe tudo. Para conhecer a Entidade Suprema, o Ser
Benevolente, a pessoa terá de manter a sua placa mental perfeitamente límpida através da prática de sádhaná
intuicional intensa.

O primeiro estágio da sádhaná é yama e niyama (observâncias morais estritas) – o fundamento da vida
espiritual, a luz que dissipa a escuridão da ignorância estática. Ao aperfeiçoarem-se nos dez princípios de
yama e niyama, os aspirantes espirituais adquirem o vigor espiritual necessário para travarem uma guerra
constante contra o torpor da estaticidade. A luta deles é uma luta valente e incansável contra os obstáculos
criados por avidyámáyá 18, que tenta afastá-los do caminho da realização de Brahma, o objetivo supremo
deles, seu desideratum final, a sua estrela-guia, o único ideal de suas vidas. Na esfera social, eles lutam para
reformar a sociedade não para fins de reformismo, mas para combater os defeitos e inconsistências em todos
os aspectos da vida que sejam nocivos à vida espiritual e que obstruam o caminho da realização da meta
Suprema. Em resumo, eles procuram construir uma sociedade espiritual, equilibrada e harmoniosa. O
esforço deles, de remover os espinhos espalhados ao longo do caminho do progresso, é incessante.

Usualmente aquelas pessoas cujo único objetivo é realizar reformas sociais, intelectuais e econômicas
colapsam exaustas após alcançarem um certo grau de sucesso, e então desistem ou ficam confusas. Mas isto
não acontece com sádhakas, porque o principal foco deles não é a batalha, e sim como atingir a meta.
Assim, eles travam uma luta incessante contra todos os tipos de defeitos e distorções com as suas duas armas
mais importantes: yama e niyama. Todos os sádhakas são soldados cujas rações são o conhecimento, cuja
bebida é a ação e cujo sal é a devoção.

Assim como a comida sem sal torna-se insípida, similarmente o conhecimento e a ação sem devoção
tornam-se sem sentido. Vocês deveriam manter em mente que se houver devoção, há tudo, e que se não
houver devoção, não há nada. É verdade que sem conhecimento uma pessoa pode ser desencaminhada, e
sem ação ela pode ficar inerte, mas é somente através da devoção que se pode atingir o Patamar Supremo.
Conhecimento e ação por si sós não podem levar uma pessoa à realização da Entidade Suprema na prática
(ainda que em teoria seja possível). A importância delas está na maneira como complementam a devoção.

Suponha que você conheça um homem chamado Ramesh, que vive em um certo lugar distante. Esta é a
medida do seu conhecimento sobre ele. Para encontrá-lo, você realiza uma longa e árdua viagem de trem.
Essa é a sua ação. Ao chegar na casa dele, você bate na sua porta e o chama, e assim ele vem saudar você e o
convida para entrar. Essa é a sua devoção. Se faltar conhecimento e ação a uma pessoa mas ela chamá-Lo
com a força de sua devoção, não é totalmente impossível alcançá-Lo, mas esse caminho é um tanto quanto
inconveniente. É por isso que eu digo que mesmo que a missão de uma pessoa possa ser cumprida somente
através da devoção, é melhor complementar a devoção com conhecimento e ação.

Conhecimento seco, de qualquer qualidade que seja, não serve para ajudar uma pessoa a atingir a meta
suprema da vida, porque lhe falta doçura. Uma vida desprovida de doçura no fim das contas torna-se inútil,
assim como a casca oca de uma árvore atingida por um raio. Tampouco pode a ação, sozinha, promover a
mais elevada realização da vida humana, porque as pessoas tendem a ficar tão envolvidas nela que ela se
torna uma obsessão para elas. A meta fundamental delas fica obscurecida perante os seus olhos. Aqueles
sádhakas que avançam mantendo um ajustamento equilibrado entre os três [conhecimento, ação e devoção],
por fim irão realizar a Entidade Suprema. Mesmo aqueles que buscam remover o sentimento de
diferenciação em relação ao mundo relativo e perceber a Entidade Suprema com uma visão integral
precisam desenvolver o seu conhecimento, ação e devoção – ainda que, também nesse caso, a devoção seja
mais importante do que conhecimento e ação. Aqueles sádhakas cujos corações transbordam com um doce

18
N.T.p.: A força da extroversão. Pouco adiante o autor explicará mais sobre isto.
sentimento devocional conseguem quebrar os grilhões da superstição muito mais facilmente do que aqueles
que seguem os cultos do conhecimento e da ação.

Vê-se com frequência que aquelas pessoas que fazem discursos bombásticos sobre os méritos do
conhecimento, ou aquelas que têm alguma reputação como ativistas sociais, apóiam sem hesitação
sentimentos estreitos como o casteísmo, provincialismo, nacionalismo etc. Com frequência são os assim-
chamados pânditas que sucumbem a vícios sociais como a aceitação de subornos, a falsidade, promiscuidade
ou alcoolismo. Muitas daquelas pessoas que encorajaram a discriminação entre os seres humanos e fizeram
com que as páginas dos livros de história ficassem manchados com sangue são as mesmas que a sociedade
respeita como pânditas e ativistas. Mas tais sentimentos de mediocridade estão ausentes em devotos, pois
eles amam a humanidade devido a um profundo sentimento devocional. Você perguntaria a uma pessoa que
está se afogando: “Você é um hindu, um muçulmano, um brâmane ou um intocável?” É claro que não. A
inspiração para não se fazer isso encontra-se oculta no seu sentimento devocional subjacente.

Bhaktirbhagavato sevá bhaktih premasvarupińii;


Bhaktiránandarúpá ca bhaktih bhaktasya jiivanam.

[Devoção é o espírito de serviço à Entidade Suprema. Ela é uma encarnação do amor altruísta, uma
encarnação da bem-aventurança – a própria vida de um devoto.]

***

Dve akśare Brahmapare tvanante vidyávidye nihite yatra gúd́he;


Kśaraḿ tvavidyá hyamrtaḿ tu vidyá vidyávidye iishate yastu so’nyah.

Infinita é a Entidade Suprema que é o ponto culminante do caminho da devoção. De qualquer ponto-de-vista
do qual vocês A analisarem, Ela é infindável. Vidyá e Avidyá – os aspectos positivo e negativo de Prakrti –
estão contidos Nela; eles encontram-se adormecidos Nela. Devido à dominância do princípio estático sobre
a Entidade Macrocósmica, a força negativa de Avidyá torna-se manifesta.19 Por meio da ávaranii shakti 20 e
da vikśepii shakti 21 de Avidyá, Ela engaja-Se na criação do universo. Portanto, Avidyá é kśara shakti
(perecível), pois Ela causa a mudança ou movimento rumo à degeneração. De modo semelhante, devido à
influência dominante do princípio sutil sobre o Corpo Macrocósmico, a força de Vidyá torna-se manifesta.

19
N.T.p.: Isto é, assim surge avidyámáyá.
20
N.T.p.: Segundo o autor,
“[...] avidyá shakti tem dois tipos de influência sobre o jiiva {ser unitário}: uma é espirituo-psíquica e a outra é psico-
física. A influência espirituo-psíquica {...} sobre a entidade jaevii [i.e., o jiiva, o ser unitário] é chamada de vikśepa
shakti. [...] E outra influência é psico-física. A influência psico-física é chamada de ávarańii shakti.”
[“The Noumenal Progenitor”. Subháśita Samgraha Part 24.]
E explicando:
“[...] a segunda expressão de avidyá shakti é ávarańii shakti. Em sânscrito, ávarańii significa “cobrir” {ou “ocultar”}.
Essa shakti [“força”] é como uma cortina negra que se interpõe entre Paramátmá e o jiiva. E por causa dessa ávarańii
shakti, dessa cortina negra de ávarańii shakti, dessa cortina sombria de ávarańii shakti, que os jiivas não podem ver o
Senhor. Os jiivas pensam: “O que quer que nós estejamos fazendo, ninguém verá, ninguém pode ver” – “Eu estou
fazendo tudo às escondidas; ninguém irá me ver.” A condição de um jiiva cometendo pápa [“pecado”] secretamente é
como a de um coelho quando é perseguido por um caçador. Diz-se que quando um coelho, uma lebre, é perseguida por
um caçador, ela fecha os seus olhos com a ajuda das suas orelhas. E ela pensa que “Como eu não estou vendo o caçador,
o caçador também não está me vendo.” E tal é a condição do jiiva que está sob influência dessa ávarańii shakti.”
[“Brahma Cakra”.]
21
N.T.p.: Também segundo o autor,
“[...] a primeira parte de avidyá shakti é chamada de vikśepa shakti em sânscrito. Vikśepa significa uma força repulsiva, a
força que repele o jiiva do seu Núcleo. Quer dizer: um jiiva é arremessado para longe, é levado embora do seu Núcleo
por propensidades {grosseiras}, por idéias depravadoras, por propensidades depravadoras. Portanto, essas idéias
depravadoras ou propensidades depravadoras são o que se chama de vikśepa shakti. Está claro? O jiiva é arremessado
para longe de Puruśottama por propensidades mundanas.”
[“Brahma Cakra”.]
Por meio de sańvit shakti (a força que desperta a consciência), Vidyá auxilia o microcosmo individual a
alcançar a imortalidade. Portanto, Vidyá shakti é uma força elevadora.

O Controlador Supremo de Vidyá e Avidyá é Puruśottama. Ele é a Cognição Suprema, acima de Vidyá e de
Avidyá, acima de Para (que controla a esfera Supramundana) e de Apara (que controla a esfera mundana) 22.
Para estabelecer-se no patamar de Puruśottama (ou Saguńa Brahma), um aspirante espiritual inicialmente
terá de recorrer à ajuda de Vidyá Shakti. Até mesmo para atingir o patamar não-atribuicional (Nirguńa), o
auxílio de Vidyá Shakti é indispensável. Depois de atingir-se o patamar atribuicional {Saguńa}, tanto Vidyá
quanto Avidyá têm uma certa autoridade controladora, até certo ponto, mas depois de atingir-se o patamar
não-atribuicional elas páram de existir.

Namaste paramaḿ brahma namaste Paramátmane


Nirguńáya namastubhyaḿ sadrúpáya namo namah.

[Saudações à Entidade Suprema. Eu saúdo a Faculdade Cognitiva Suprema. Eu saúdo a Entidade


Não-atribuicional. Saudações ao Ser Supremo.]

Os microcosmos colhem as consequências das suas atividades originais. Isto {esse arranjo} é ordenado pela
Entidade Suprema? Sim, é, ainda que Ela não imponha punições sobre ninguém diretamente. Ela apenas
ordenou que cada ação irá conter a semente da reação. Ela deu liberdade aos microcosmos desenvolvidos
decidirem se vão agir ou ficar inertes, se vão realizar atos virtuosos ou atos pecaminosos.

Quanto mais os microcosmos avançam ao longo do caminho de Pratisaiňcara 23, mais desenvolvidos eles se
tornam e mais liberdade eles recebem para agir independentemente. É claro que eles somente podem
desfrutar de tanta liberdade quanto a Autoridade Suprema decide lhes dar. A quantia de sofrimento causada
pelos impulsos reativos depende de como os microcosmos utilizam ou mal-utilizam essa liberdade. Não
adianta de nada culpar a Entidade Suprema por esse sofrimento. Afinal, vocês receberam a liberdade, a
plena liberdade, para realizar as ações originais conforme vocês consideram apropriado. Como cada ação
contém a semente da reação, vocês terão de suportar as reações das suas ações. Essas sementes ou impulsos
reativos são expressos através das suas ações não-originais (samskára múlaka), sobre as quais vocês não têm
controle.

Uma pessoa renasce em uma estrutura física e em um ambiente físico que são propícios para a expressão dos
seus samskáras não-compensados. A Mente Cósmica direciona a alma desencarnada para aquele ambiente
particular no qual ela terá a máxima oportunidade para a expressão dos seus samskáras latentes. É por isso
que algumas pessoas vivem vidas infelizes em condições miseráveis e sofrem de má saúde, enquanto outras
vivem vidas alegres, saudáveis e despreocupadas em um ambiente confortável. Mesmo assim, não importa
em que circunstâncias uma pessoa possa encontrar-se, ela tem que entender e aceitar que nenhuma situação
é sem esperança. Para a expansão psíquica da pessoa, ela terá de manter a sua mente fixa na Entidade
Suprema – ela terá de avançar em direção daquela Entidade Absoluta enquanto remove todos os obstáculos
do caminho.

Ninguém deveria alimentar nenhum pensamento ou ilusão sobre o passado. Se uma pessoa se agarrar a
objetos exauridos e permitir que lágrimas de lamento inundem a sua vida, ela perderá o ritmo do movimento
e gradualmente se converterá em matéria inerte. Uma pessoa jamais deveria permitir que a escuridão da
covardia engula a sua existência individual.

O movimento microcósmico em direção à Meta Suprema da vida através da luta incessante contra todos os
tipos de obstáculos formidáveis é o verdadeiro dharma. Os seres humanos precisam de inspiração cósmica

22
N.T.p.: O autor usa a palavra “world”, traduzida aqui como “esfera” em lugar de “mundo” para evitar um pleonasmo como
“mundo mundano”.
23
N.T.p.: Pratisaiňcara refere-se à primeira das duas fases em que se divide a evolução do universo: trata-se da fase em que o
universo é criado a partir da Consciência Suprema pura, não-manifesta, não-atribuicional. Esta fase inicia-se quando Prakrti,
subordinada a Puruśa, começa a qualificar Puruśa (parcialmente), e caracteriza-se pela dominância do princípio ou força estática
– e portanto, de avidyámáyá.
para motivarem-se a moverem-se adiante. O desenvolvimento psíquico deles não será possível através de
intimidações ou pela criação de pressão circunstancial.

Aquelas pessoas que são motivadas a empreender trabalho missionário somente com suporte financeiro ou
com patrocínio da realeza, ou que são guiadas pela sanção das escrituras em vez de pela lógica ou pela
racionalidade, não são nem um pouco capazes de guiar a raça humana ao longo do caminho do progresso
genuíno.

É possível converter de verdade milhares de pessoas pobres para uma certa religião aplicando-se a força
física ou aplicando-se grandes quantias de dinheiro? Tais assim-chamados novos adeptos sem dúvida
abandonam a sua própria religião {anterior}, mas eles não conseguem incorporar os melhores aspectos da
nova religião porque eles não a aceitaram através de inspiração religiosa ou da curiosidade espiritual. Na
verdade, tais novos adeptos religiosos seguidamente acabam sendo um peso para a sociedade religiosa que
os converteu.

A única maneira de promover o bem-estar real dos seres humanos é despertando a inspiração espiritual. É
necessário criar uma sede pela espiritualidade e um interesse fervoroso na sádhaná. As pessoas têm que
entender que dharma é a essência da vida, o sopro da vida.

Na prática do culto espiritual, não há nenhum distinção – nem poderá jamais haver – entre homens e
mulheres. Como jiivátmá (a alma {individual}) não é composta dos cinco fatores fundamentais 24, não pode
haver nenhuma distinção de sexo nela.

Naeva strii na pamáneśa na caeváyaḿ napuḿsakh


Yadyacchariiramáda)e tena tena sa rakśate

“Jiivátmá não é nem homem nem mulher, nem hermafrodita.”

Para que haja uma expressão apropriada dos samskáras latentes de uma pessoa, ela renasce no corpo de uma
mulher ou de um homem ou, algumas vezes, de um hermafrodita. Não existe questão de elevado ou baixo,
superior ou inferior, nobre ou ignóbil – porque, qualquer que seja o sexo do corpo, o jiivátmá é apenas a
testemunha da mente à qual ele está acoplado. Ele não é afetado por diferenças sexuais dos corpos
quinquelementais. As reações psíquicas não-expressas (samskáras) da alma desencarnada são guiadas pela
Mente Cósmica e ajustados a uma estrutura apropriada, em um momento apropriado e em um lugar
apropriado, proporcionando um ambiente favorável para a expressão dos samskáras não-resolvidos.

Dependendo da natureza dos samskáras, pode haver a predominância da tendência a atrair (samyojanii
shakti) ou a predominância da tendência a ser atraído (vibhájanii shakti). A natureza da força de atração é de
puxar o objeto de desfrute em direção a si, e a natureza da força que é atraída é de mover-se em direção ao
objeto de desfrute. Quando existe dominância de samyojanii shakti nos samskáras latentes da pessoa, a alma
desencarnada obtém um corpo feminino para sua expressão externa, e – inversamente –, quando há
dominância de vibhájanii shakti, ela obtém um corpo masculino. Quando existe um equilíbrio aproximado
entre essas duas forças, a alma desencarnada obtém um corpo de hermafrodita. É claro que mesmo num
hermafrodita o equilíbrio entre as shaktis samyojanii e vibhájanii não é perfeita; {sempre} existe uma leve
inclinação em favor de uma ou de outra. É por isso que alguns hermafroditas são mais inclinados em direção
à masculinidade, e outros em direção à feminilidade.

Em criaturas subdesenvolvidas, existe um equilíbrio entre as shaktis samyojanii e vibhájanii e, assim, elas
são assexuais. Como elas estão sujeitas a uma menor luta interna e a uma maior luta externa, essas criaturas
subdesenvolvidas podem dividir seus corpos em uma quantidade de partes. Mas as criaturas desenvolvidas
24
N.T.p.: Os cinco fatores fundamentais são, na ordem do mais sutil para o mais denso: fator etéreo (éter), fator gasoso ou aéreo
(não é sinônimo com o “ar” existente na atmosfera terrestre), fator luminoso (tampouco é sinônimo com o “fogo” que acompanha
a combustão de materiais), fator líquido (não é sinônimo com as substâncias líquidas com que se lida cotidianadamente, como por
exemplo a água ou outros líquidos) e fator sólido (tampouco é sinônimo com as substâncias sólidas com que se lida
cotidianadamente – sem falar que tais sólidos em geral apresentam liquidos e gases em suas composições).
não têm essa possibilidade. Para aumentarem sua população, elas são compelidas a buscarem ajuda umas
das outras com as forças samyojanii e vibhájanii. Portanto, existem diferenças entre todas as criaturas
desenvolvidas, sem as quais a preservação de suas diferentes espécies jamais poderia ser mantida. Assim, as
diferenças sexuais existem para permitir a expressão apropriada dos samskáras. Entretanto, essas diferenças
sexuais não têm qualquer valor absoluto que seja.

Assim, a característica da mente humana de atrair ou de ser atraída depende da tendência mental. Se houver
uma mudança glandular na estrutura física, haverá uma mudança correspondente nas forças samyojanii ou
vibhájanii da mente. Mesmo quando a mente pensa profundamente sobre uma pessoa do sexo oposto, a sua
própria shakti samyojanii ou vibhájanii acaba sendo alterada em alguma medida. Se houver uma mudança
drástica em alguma das forças, haverá uma mudança correspondente no corpo físico. Como resultado,
machos podem ser convertidos em fêmeas e fêmeas em machos.

Vocês podem ter percebido no mundo prático como os homens e mulheres tratam os objetos físicos de
formas diferentes. Isto se deve à diferença no grau de expansão de samyojanii e vibhájanii shakti.

Portanto, as características que determinam o sexo – seja masculino, feminino ou hermafrodita – não são
fixas ou definitivas. Com base neste conceito, não deveria haver qualquer discriminação entre as pessoas:
não há diferença de sexo em jiivátman. Também na prática espiritual não se deve encorajar nenhuma
distinção artificial entre homens e mulheres. Somente naqueles aspectos da prática espiritual que dependem
do funcionamento harmonioso do corpo e da mente (tais como asanas e mudras) é que as diferenças
glandulares e psicológicas devem ser levadas em consideração.

Saḿkalpanasparshanadrśtimohaergrásámbuvrśt́á cátmavivrddijama
Karmánugányanukrameńa dehiis tháneśu rúpáńyabhisamprapadyate.

A força inicial que causa a diferenciação de sexo e a adoção de formas variadas é chamada de
samkalpátmaka. A resolução de se manifestar no universo criado é a causa numenal 25 do nascimento.
Quando uma pessoa mantém a ideação em prazeres mundanos e se agarra a objetos de desfrute, ela está
fadada a assumir um corpo físico na próxima vida. Os samskáras originados da determinação de se renascer
são denominados de bhava em escrituras.

Imediatamente depois de samkalpa 26 ocorre indriya vrtii (a externalização da resolução através dos órgãos
sensoriais). A mente está constantemente correndo na direção dos objetos físicos em busca de desfrute com
a ajuda dos indriyas 27, em seu esforço infindável para trazê-los dentro do seu alcance. Os seres humanos

25
N.T.p.: Segue-se uma citação do autor onde ele apresenta sua definição de “numenal”:
‘Quando Um cria muitos, esse Um é chamado de causa numenal. E quando “muitos” é criado a partir de Um, esse
“muitos” é chamado de efeito fenomenal. Podemos dizer que “A falsidade é a causa numenal de todos os crimes sociais.”
Aqui, os crimes sociais são os efeitos fenomenais, e a falsidade é a causa numenal. Para tudo o que vemos neste universo,
existe uma causa numenal aparente. Nós vemos muitos derivados do leite: o leite é a causa numenal, a causa numenal
aparente [deles]. Ou seja: ele não é a entidade numenal suprema. E acima de todas as assim-chamadas causas numenais,
existe a entidade numenal suprema, e essa entidade numenal suprema é Parama Puruśa.’
[“A Causa Numenal e o Deus Pessoal”. Subháśita Samgraha Part 12.]
26
N.T.p.: Uma explicação do autor:
“Quando a mente, sob o domínio de avidyámáyá, é arrastada pelas ondas de desejos mundanos, ou seja, quando ela fica
associada com pabulum {um objeto de desfrute} psíquico grosseiro, isto é chamado de abhilása (desejo). Quando
abhilása fica firmemente enraizado, ele é chamado de samkalpa (resolução {ou determinação}) para obter-se pabulum
psíquico. [...] O que é samkalpa? Quando a mente fica firmemente associada com os seus objetos em uma relação
determinada feito aço, isto é chamado de samkalpa. Este vasto universo surgiu a partir do samkalpa da Mente Cósmica.”
[“The Science of Action”. Subháśita Samgraha Part 8.]
27
N.T.p.: Indriyas correspondem aos órgãos sensoriais e motores. Mas, como o autor explica (referindo-se aos indriyas
relacionados com os órgãos sensoriais):
“As posições dos indriyas realmente são no cérebro, e não na superfície externa do corpo físico. Existem vias de acesso
{gateways} dos indriyas na superfície externa do corpo físico, os quais recebem tanmátras {porções microscópicas} que
emanam dos diferentes objetos {externos}.”
[“Mente, Práńendriya e Vrtti”. Idéia e Ideologia.]
querem adquirir todo o reconhecimento e a fama que o mundo pode proporcionar, para tornarem-se os
indivíduos mais distintos; eles querem que todo o dinheiro do mundo seja depositado nos seus cofres.
Quando eles adquirem certos objetos, eles buscam mantê-los bem onde possam vê-los. Finalmente, devido à
influência extrema de Avidyámáyá, eles ficam tão cegamente atraídos por esses objetos prazeirosos que eles
não conseguem suportar ficarem separados deles, mesmo por um segundo.

O bhava (agregado de samskáras) de uma pessoa torna-se mais forte devido ao desenvolvimento da sua
resolução e ao desejo crescente por tocar, ver e agarrado aos seus objetos de desejo. Este processo têm
estado em andamento por milhões de vidas. A Mente Cósmica fornece uma base para o microcosmo, em
uma forma e lugar particulares, na vida subsequente, que lhe proporcionará o máximo escopo de expressão
de seus próprios samskáras inerentes. Dessa forma, um microcosmo pode nascer em qualquer planeta por
este universo.

Diz-se nas escrituras que a alma desencarnada primeiro aceita o gene paternal com a ajuda da Mente
Cósmica, e então, ao unir-se com o gene materno, produz um embrião para a expressão apropriada dos seus
samskáras latentes. Por um lado, o embrião adquire nutrição psíquica, e por outro lado seus samskáras são
expressos internamente. Até que a mente adquira poder suficiente para agir de acordo com o seu sentimento
desenvolvido de “eu” existencial, ela terá de passar pelos tormentos das aflições (bhava jantrańá)
internamente como agente de ações não-originais. Nessa situação, ela não é o agente. Mas assim que as
células nervosas adquirem a capacidade para funcionar de acordo com o sentimento desenvolvido de “eu”,
ela começa a realizar ações originais (pratyaya mulaka karma) 28.

Pessoas sábias dizem que os seres vivos são nutridos inicialmente no corpo do pai, e depois no útero da mãe,
e finalmente na Terra, depois que nascem. Usualmente, depois da idade de trinta e nove anos (é claro que o
período pode variar um pouco de acordo com mudanças de tempo, espaço e pessoa), o seu corpo começa a
se deteriorar.

Sthuláni sukśmáni bahúni caeva rúpańi dehii svaguńaervrńoti


Kriyáguńaerátmaguńaeshcáteśáḿ saḿyogaheturaparo’pi drśt́ah.

Uma entidade adquire um corpo físico de acordo com a natureza dos seus samskáras. Um ser humano que se
comporta como uma cabra ou um cachorro, poderá nascer como uma cabra ou um cachorro em sua próxima
vida, porque um tal corpo de animal é a base apropriada para a expressão adequada dos {seus} samskáras
latentes. Portanto, não é nem um pouco impossível que um ser humano renasça como um suíno, um verme,
uma árvore ou mesmo um pedaço de pedra. O destino da entidade será decidido de acordo com a natureza
do seu karma 29 – esta é uma lei infalível. Com relação a isso, nem Paramátmá nem Prakrti podem fazer
qualquer coisa para ajudar. Mas Parama Brahma, através da Sua Infinita graça, irá transformar novamente
esses ahalyás (pessoas convertidas em pedra como resultado de ações grosseiras) em seres humanos
gloriosos no decorrer do processo de Pratisaiňcara, e irá proporcionar oportunidades para que movam-se
em direção à vida mais elevada.

Para ser mais preciso, são os samskáras (impulsos reativos) que renascem. Filosoficamente falando, não é
correto dizer que o átman (a consciência {ou alma} unitária) renasce, porque o Átman não é nem corpo, nem
intelecto ou mente; ele é apenas a entidade testemunhal, o sujeito que testemunha as metamorfoses do seu
objeto – algumas vezes em uma outra forma finita e algumas vezes em uma forma infinita.

O átman não está sujeito a dor nem prazer, porque essas são propensidades psíquicas da mente. É claro que
os desejos e anseios da mente unitária afetam o Átman em certa medida. E isto aparentemente é visto como
se o Átman também estivesse envolvido no ciclo vicioso de ações e reações.

28
N.T.p.: Em outro texto o autor diz que:
“Se chamarmos uma ação de pratyaya múlaka karma, então a reação da ação será chamada de samskára múlaka karma
(impulsos reativos).”
[“Ação, Reação e Autoria”. Ánanda Vacanámrtam Part 19.]
29
N.T.p.: “Ação”.
Quando, devido à graça de Parama Brahma, técnicas de prática intuicional (sádhaná) são conferidas à
mente unitária através do meio de um Guru, o caminho para a emancipação das amarras é aberto, e a mente
unitária começa a transcender todas as tristezas e sofrimentos. Por virtude dessa sádhaná, a pessoa também
consegue libertar-se do ciclo vicioso de karma, resultando que o Átman obtém liberação imediata de todas as
amarras mentais. Ao abandonar o desejo por objetos finitos em diferentes lugares, em diferentes formas e de
diferentes maneiras, e abraçar a Entidade Original Suprema, a pessoa alcança a mais elevada realização.
Esse feito é conseguido com a graça de Parama Puruśa na forma de um Guru. Portanto, somente existe um
Guru: somente a Entidade Suprema é o Guru Universal.

Nityaḿ shuddhaḿ nirábhásaḿ nirakáraḿ niraiňjanam;


Nityabodhaḿ cidánandaḿ Gurubrahma namámyaham.

[Eu ofereço minha saudação a Brahma na forma do Guru – que é eterno, sempre puro, sem igual,
sem forma, absolutamente imaculado e sempre estabelecido no profundo estado intuicional e na bem-
aventurança cognitiva.]

***

Anádyanantaḿ kalilasya madhye vishvasya srastáramanekarúpam


Vishvasyaekaḿ pariveśt́itáraḿ jiňátvá devaḿ mucyate sarvapáshaeh.

Quando uma pessoa está estabelecida no estado glorioso devido à graça do Guru, qual estágio atinge a
intuição da pessoa? Que tipo de realização ela alcança? A pessoa descobre o jogo divino da Entidade Infinita
em toda e cada manifestação finita. Ela realiza que a Entidade Infinita que está sempre presente na Sua vasta
condição Cósmica também está sempre presente em cada molécula e átomo. Ela experimenta que o universo
inteiro está sendo vibrado e animado com o Seu infindável fluxo Cósmico. Cada entidade deste universo,
seja grande ou pequena; cada mínima expressão de dor e de prazer dos numerosos microcosmos está dentro
do Seu vasto Oceano de Bem-aventurança Cósmica. Neste universo em contínuo jogo, Ele é o Árbitro
Supremo. A pessoa realiza que a Faculdade Cognitiva Suprema reside na Sua tumultuosa criação
Macrocósmica, e que Ela é portanto o Desideratum Supremo de cada entidade finita. Os sádhakas realizam
que Ele está manifesto em Suas muitas formas, e fundem suas individualidades Nele.

Existe algum lugar no qual Ele não resida? Ele estava residindo em cada lugar muito muito antes que vocês
sequer soubessem que Ele existia, preenchendo o espaço com a Sua bem-aventurança Cósmica. Portanto,
para os devotos, todo este universo é uma expressão bem-aventurada do Supremo.

Por trás dessa condição brincalhona da Entidade Cósmica está a Sua condição imutável e eterna, que é uma
testemunha passiva das formas sempre-transformadas da Sua manifestação Macropsíquica. Quando os
devotos vêem as Suas formas mutáveis com visão genuinamente espiritual, eles vivenciam que já estão
estabelecidos na Sua condição imutável. Este é o estado da realização suprema. Nesse estado, as misérias
causadas pelas amarras limitadoras desaparecem e os sádhakas tornam-se iluminados pelo doce toque do
brincalhão, bem-aventurado e imutável Parama Puruśa. Esta é a satisfação espiritual suprema.

Nityánandaḿ paramasukhadaḿ kevalaḿ jiňánamúrtim;


Vishvátiitaḿ gaganasadrshaḿ tatvamasyádilakśyaḿ.
Ekaḿ nityaḿ vimalam acalaḿ sarvadhisákśiibhútam;
Bhávátiitaḿ triguńarahitaḿ Sadguruḿ Taḿ namámi.

[Eu ofereço minha saudação ao Sadguru que é a encarnação do conhecimento absoluto na forma de
bem-aventurança eterna; que proporciona alegria infindável; cuja periferia estende-se além do vasto
céu azul, além da fronteira final do universo; que é Uno sem um segundo, que tem a significância de
“Tu és aquilo” 30; que é sempre permanente, sempre imutável, sempre imaculado; a testemunha de
tudo, além do escopo do pensamento; e livre da influência dos três princípios 31.]

Ainda que Ele seja difícil de alcançar, Ele não é inatingível. Uma pessoa cuja existência esteja saturada com
o fluxo do conhecimento, da ação e da devoção pode facilmente atingí-Lo.

Bhávagráhyamaniid́ákhyaḿ bhávábhávakaraḿ shivam


Kalásargakaraḿ devaḿ ye viduste jahustanum.

Você jamais irá alcançá-Lo através de sua erudição, intelecto, valor ou vaidade. Você tem de alcançá-Lo
através de ideação constante, doce sentimento devocional e busca espiritual intensa. Você somente
conseguirá alcançá-Lo em troca de sua existência individual inteira. Como regra, uma pessoa tem de
oferecer alguma coisa a outra pessoa em troca de um objeto. Se você quer conseguir arroz, sal, óleo,
manteiga e assim por diante, você terá de pagar dinheiro. Similarmente, para alcançá-Lo, você terá de pagar
com o seu Eu existencial, você terá de render-se completamente a Ele. Aqueles sádhakas que aceitaram o
Supremo como o seu único objetivo na vida jamais poderão adorar Prakrti, porque eles sabem que a
entidade que desejam alcançar é tudo o que existe e que ainda virá a existir. Este vasto fluxo da criação é a
expressão brincalhona daquela Entidade Eterna.

Os dezesseis fatores (śoŕashakalá) 32 dos quais os microcosmos são compostos – este fenômeno inteiro da
criação – são as expressões finitas da Entidade Suprema Infinita. As pessoas que abrigam-se nessa vasta
Entidade Integral não têm sentimentos de mediocridade ou de imperfeição individual. Tais pessoas não
renascem novamente após a morte. Alguém que conheceu Brahma torna-se Brahma.

Ye ye ujuvát́e gelá
Anávat́á bhailá soi.

[Quem se move ao longo do caminho reto de susumná 33 jamais retorna.]

* * *
Título Original: “Form and Formless”

30
N.T.p.: Em inglês, “Thou art that”. Neste contexto, por não estar especificado a qual “aquilo” a afirmação se refere, pode-se
deduzir que ela não esteja sujeita a nenhuma restrição e que, portanto, refira-se a qualquer possível “aquilo”. Em outras palavras:
nada está fora do escopo de existência dessa entidade; ela é ilimitada.
31
N.T.p.: Isto é, das três guńas de Prakrti. (Vide nota 1.)
32
N.T.p.: Citações de explicações do autor sobre os dezesseis fatores:
“A existência está relacionada com dezesseis fatores (kalás), dos quais não há maneiras de escapar enquanto os desejos
humanos forem eferentes ou extroversivos – enquanto o ser humano estiver ocupado procurando objetos de felicidade em
meio a este mundo material. Existem dez órgãos {indriyas} (cinco órgãos sensoriais, a saber: olhos, ouvidos, nariz,
língua e pele; e cinco órgãos motores, a saber: órgão fonador, mãos, pés, ânus e órgão reprodutor), cinco práńáh ou ares
vitais {váyus} internos – a saber: Práńa, Apána, Samána, Udána e Vyána (Nága, Kúrma, Krkara, Devadatta e
Dhanaiňjaya – esses cinco váyus ou ares externos não pertencem aos dezesseis kalás pois são resultantes dos próprios
ares internos) e Ahamtattva (ego) – dezesseis ao todo.”
[“A Ciência Intuicional dos Vedas – 3”. Subháśita Samgraha Part 2.]
“Será que a Entidade Suprema, depois de criar os cinco fatores fundamentais no fluxo extroversivo da Imaginação
Cósmica, pôs um fim ao ciclo da criação? Não. Com o surgimento dos cinco fatores fundamentais, um após o outro,
como expressões progressivamente mais densas no fluxo Cósmico, uma fase da criação foi completada. A outra fase da
criação começou a partir desse ponto. Com a ajuda da Sua Aśta-Prakrti (Prakrti óctupla) e das Suas Śoŕaśa Vikrti
(dezesseis modificações {ou fatores}), foram criadas estruturas cada vez mais complexas.”
[“Em Adoração ao Supremo”. Subháśita Samgraha Part 6.]
33
N.T.p.: Susumná é a denominação de um dos três principais nádiis (canais de energia psíquica), a saber:
“O canal psico-espiritual dentro da coluna vertebral, através do qual a kulakuńdalinii ascende durante a meditação.”
[“Glossário”. Shabda Cayaniká Part 4 / Part 5.]
Fonte: Edição Eletrônica das Obras de P. R. Sarkar – versão 7.5 (em inglês).

Publicado em:
Ananda Marga Ideology and Way of Life in a Nutshell Part 7
(Obra ainda não publicada no Brasil.)
Subháśita Saḿgraha Part 5
(Obra ainda não publicada em inglês.)

Tradução, Revisão e Notas: Mahesh – Florianópolis


(9 de janeiro de 2009 – 26 de março de 2011; 3 de outubro, 14 de novembro de 2011).

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