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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/50ed...

Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


Processo: 712/00.9JFLSB-Q.L1-3
Relator: RUI GONÇALVES
Descritores: PRESCRIÇÃO
PROCEDIMENTO CRIMINAL
CONHECIMENTO OFICIOSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 14-12-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: I – No Estado Democrático de Direito, é dever estatal e, portanto,
do Poder Judicial, conferir a devida eficiência ao Direito Penal,
para que possa desenvolver com plenitude a sua missão
fundamental de protecção social.
II – Há ao lado do direito fundamental do arguido de se ver
julgado em prazo razoável um direito fundamental da sociedade
de obter o resultado deste julgamento em prazo que não torne
inócua a tutela penal dos bens jurídicos que a incriminação da
conduta almeja salvaguardar. A prescrição penal, resultante da
demora na persecução penal.
III – O fenómeno prescritivo apresenta idiossincrasias e
consequências negativas: a impunidade, a selectividade da justiça
penal, a violação do princípio da igualdade e, com particular
relevo, a insuficiência na protecção e garantia de direitos
fundamentais diante das ameaças e lesões decorrentes de
condutas tipificadas na lei como crime.
IV – A situação do arguido que se vê indiciado e processado por
longos anos é aflitiva, pois o próprio processo contempla em si
uma pena processual severa, e muito mais a daquele que deve
responder ao processo em situação de prisão preventiva. “[A] rapidez
do julgamento é justa ainda porque a perda da liberdade sendo já uma pena, esta só deve
preceder a condenação na estrita medida que a necessidade o exige”.
V – Não se mostra razoável sustentar que o titular originário do
jus puniendi (a sociedade) não dispõe de meios eficazes de exercer
este direito em relação ao Estado-Ministério Público (In casu após um
inquérito que perdurou mais de 6 anos e uma acusação anulada, o arguido I… foi acusado
em 2007. )
ou ao Estado-Juiz e que a demora do processo penal, com
a consequente impunidade, é irrelevante à sociedade e somente
interessa às partes formais do processo.
VI – A sociedade assume sempre a condição de vítima de
qualquer tipo legal de crime, mas ao mesmo tempo tem interesse
no resultado da actuação estatal espelhada na tutela jurisdicional
penal, enquanto conjunto de pessoas entre as quais se encontram
os possíveis autores de futuros tipos legais de crime,
convertendo-se, neste sentido, em destinatária da mensagem
dissuasória que procura transmitir por meio da pena.
VII – A pena aplicada ao cometimento de um tipo legal de crime

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apresenta um fim de resposta positiva do direito penal à


sociedade. A tramitação célere do processo penal, para
possibilitar a sua aplicação e execução, representa um interesse
relevante do grupo social.
VIII – Este direito fundamental, da titularidade do arguido e da
sociedade, é uma afirmação deduzida de uma proposição já
demonstrada do dever punitivo do Estado em relação aos
infractores da lei penal, a quem não é conferido apenas o direito,
mas também o dever de punir, que se desdobra na actuação
efectiva e eficaz de todos os agentes públicos implicados na
persecução penal: autoridades policiais, Ministério Público e
Magistratura Judicial. “[Q]uanto menos tempo decorrer entre o delito e a pena,
tanto mais os espíritos ficarão compenetrados da ideia de que não há crimes sem castigo;
tanto mais se habituarão a considerar o crime como causa da qual o castigo é o efeito
necessário inseparável.”
IX – A demora do processo penal, além dos funestos prejuízos
para o arguido, abala a eficiência do Direito Penal, na medida em
que frustra os seus principais objectivos, comprometendo a
legitimidade social e a credibilidade do Poder Judicial ao
disseminar um senso de descrédito na actuação da justiça penal.
X – O dever de protecção jurídico-penal impõe ao Tribunal
criminal a prestação de uma tutela judicial efectiva, consistente
na apreciação da causa em tempo hábil e razoável.
XI – Praticado o ilícito penal, nasce para o Estado, em nome da
sociedade, o direito de punir o infractor. Este direito tem o seu
exercício condicionado no tempo. Se dentro de certo lapso
temporal, que varia em razão da pena máxima abstractamente
prevista para o crime ou da pena concretamente aplicada na
sentença, o Estado não exercer a sua pretensão punitiva ou
executória, ocorre a prescrição, que é a perda do direito de punir
ou executar a pena aplicada.
XII – O instituto da prescrição funda-se no princípio da
segurança jurídica e traduz instrumento jurídico destinado a
reforçar o aspecto preventivo da pena e a evitar a eternização do
clamor social em relação à prática delituosa, é a prescrição
imprescindível ao Direito Penal de todos os Estados Democráticos
de Direito, sendo admitida desde o berço das instituições
jurídicas e assim exercida pelos povos antigos, com relevo
especial entre os romanos, que conheciam as duas espécies de
prescrição (da acção penal e da pena).
XIII – Mais relevante do que o aspecto do “esquecimento” e da
“expiação” vale destacar a “perspectiva funcional” do instituto
da prescrição, enquanto instrumento tendente a evitar que a pena
seja utilizada com fins distorcidos do seu mais importante
desiderato que é o “preventivo”. Se o decurso de tempo não
permite que se consagre este fim, passa a pena a ser
desnecessária, pois que assume uma feição meramente

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retributiva, incompatível com os ideais do Estado Democrático de


Direito e com o seu valor supremo que é a dignidade da pessoa
humana.
XIV – A prescrição penal é um instituto que se vincula
directamente ao direito fundamental ao prazo razoável do
processo constitucionalmente reconhecido no nosso sistema.
XV – A prescrição é matéria de ordem pública e interesse social,
portanto, a qualquer tempo e grau de jurisdição, deve ser
declarada, inclusive ex officio, se bem que num Tribunal
Superior, como o Tribunal de Relação, deve ter-se presente que,
como regra, qualquer decisão que encerre “questão nova” não
pode ferir um grau de jurisdição e a mesma deve ser tomada,
livremente, pelo Tribunal de 1.ª instância, pois caso contrário tal
decisão transforma-se-ia em decisão insindicável (cf. art. 32.º, n.º
1 da C.R.P.).
XVI – Não pode pairar sobre o arguido a ameaça ad perpetuam
do poder repressivo estatal.
XVII – É inegável a importância da prescrição como instrumento
de política criminal destinada a reforçar o aspecto preventivo da
pena e impedir a eternização do clamor social em relação à
prática delituosa. O tempo parece apagar todas as feridas,
individuais ou sociais.
XVIII – Aplicando-se uma pena ao arrepio dos postulados
preventivos gerais positivos, implica dizer que essa pena é
desnecessária e assim sendo reconhecida, a mesma atenta contra
a dignidade da pessoa humana e à ordem democrática, servindo
então a prescrição como instituto garantista contra o abuso do
próprio Estado em executar uma pena na situação descrita.
XIX – A doutrina funcionalista (JAKOBS e ROXIN) até certo
ponto explica o instituto da prescrição acenando com a
desnecessidade da pena enquanto resposta à estrutura social.
XX – A advocacia precisa de estar ciente do seu indispensável
papel de auxiliar nas questões da administração da justiça
enfocar a questão da demora do processo penal enquanto
problemática complexa cuja solução demanda a cooperação
activa de todos os operadores judiciários.
XXI – Necessário se torna criar uma cultura de agilização,
eliminando as práticas dilatórias e tratando o processo como um
instrumento ético de pacificação social, que, portanto, precisa ter
um curso abreviado.
XXII – O chamado “terrorismo processual-penal” é mais grave do
que a demora do processo penal. Assim, o ideal almejado
pressupõe uma ponderação, um equilíbrio entre a necessidade de
racionalizar o direito e o processo penal, pondo fim à impunidade
e à não menos imperiosa necessidade de preservar as garantias e
os direitos fundamentais do arguido.

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XXIII – O sistema de justiça criminal e o garantismo penal,


enquanto instrumentos de garantia dos direitos fundamentais,
diante da ocorrência patológica de prescrição penal, necessitam
ser readequados às inspirações de um órgão legiferante que
confira a efectiva segurança diante dos riscos que ameaçam a
sociedade moderna.
XXIV – É facto público e notório que o arguido mais bem
aquinhoado economicamente recebe a assistência,
invariavelmente, de uma defesa técnica que lança mão de todos
os meios defensivos.
Nenhuma crítica a esta amplitude defensiva, quando não ingressa
no perigoso e ilegal campo da protelação e da chicana — o que é
muito comum —. Há a incidência quase que elitista do fenómeno
prescritivo penal.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 3.ª Secção Criminal do Tribunal da
Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
1.1. Nos Autos de Processo Comum com intervenção de Tribunal
Colectivo n.º 712/00.9JFLSB do 2.º Juízo Criminal do Tribunal
Judicial de Oeiras, no Translado N, por despacho de 28SET2011,
foi decidido pela Senhora Juíza, no que ao caso releva: “[…]
consideramos que, na presente data, mostra-se afastada a
possibilidade de apreciação e conhecimento da prescrição do
procedimento criminal suscitada pelo arguido I…, face ao trânsito
em julgado da decisão condenatória e, em consequência,
indefere-se o requerimento apresentado pelo arguido.”

1.2. Inconformado com a referida decisão da Senhora Juíza do 2.º


Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Oeiras, dela recorreu o
arguido I…, em 24OUT2011, apresentando as seguintes
conclusões (transcrição):
“- Do erro acerca dos pressupostos de facto:
1.º - A douta decisão recorrida parte do errado pressuposto de que o Acórdão do Tribunal da
Relação de Lisboa, que condenou o arguido no cumprimento de uma pena de prisão efectiva
de dois anos, já transitara em julgado, quando só transitaram o douto Acórdão do STJ que
rejeitou conhecer do recurso [do arguido] para o STJ que incidiu sobre a condenação penal
contida no Acórdão do TRL, e a decisão sumária do TC, que confirmou tal rejeição.
2.º - Como resulta da certidão do TC junta aos autos em 30SET11 pelo arguido, ora
Recorrente, à data da decisão recorrida encontrava-se pendente junto do Tribunal
Constitucional recurso de constitucionalidade que incide sobre o referido douto Acórdão do
Tribunal da Relação de Lisboa, o qual obsta ao trânsito, nos termos do artigo 80.º n.º 4, da
LTC.
3.º - Da certidão de fls. 223 a 235 do traslado apenas decorre que o Acórdão proferido pelo
Tribunal Constitucional (que confirmou a rejeição do recurso para o STJ) transitou em
julgado (em 12SET11). Do trânsito em julgado da decisão do Tribunal Constitucional que
confirmou a irrecorribilidade da decisão do TRL para o STJ, não decorre o trânsito em
julgado da decisão condenatória do TRL, desde logo atento o disposto nos artigos 75.º, n.º 2, e
80.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, da Lei do Tribunal Constitucional e a pendência do recurso a que se

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reporta a conclusão anterior.


4.º - Tal recurso refere-se ao segmento daquele Acórdão do TRL que confirmou o
indeferimento da intervenção do Tribunal do Júri no julgamento de todos crimes imputados
ao arguido.
5.º - Assim sendo, o que se discute naquele recurso junto do TC é a própria competência do
Tribunal Colectivo para proceder ao julgamento dos crimes imputados ao arguido.
6.º - Consequentemente, está em causa uma questão processual capaz de invalidar a decisão
condenatória proferida, atentos os efeitos da decisão do Tribunal Constitucional legalmente
previstos no artigo 80.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, da Lei do Tribunal Constitucional.
7.º Como, com propriedade, se refere na própria decisão recorrida: “(…) há que ter presente
que o caso julgado material – limitado às decisões de mérito, segundo o entendimento comum
— pressupõe o caso julgado formal e que este respeita a quaisquer decisões (quer de mérito,
quer meramente processuais) — vide Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal
III 3.ª Edição, Lisboa, 2009, p. 39”.
8.º - Ou seja, estando pendente recurso atinente à competência do Tribunal Colectivo, a
inexistência de caso julgado formal quanto a esta questão obsta à existência de caso julgado
material quanto ao mérito da causa, leia-se quanto à decisão condenatória, que,
consequentemente, não transitou em julgado.
9.º - Se a decisão do Supremo - que rejeitou o recurso penal - foi objecto de recurso para o
Tribunal Constitucional e se a Decisão Sumária que apreciou tal recurso só transitou em
13SET11, em rigor, o prazo de 10 dias a que alude o artigo 75.º da LTC, para o arguido
interpor recurso para o TC do douto Acórdão da Relação de Lisboa, apenas começou a contar
em 14SET11.
10.º - Perante tal realidade processual, que era facilmente cognoscível pela Mmª. Juíza “a
quo” quando pretende fazer equivaler o trânsito em julgado do douto Acórdão do STJ, que
rejeitou o recurso penal que incidia sobre o Acórdão do TRL, ao trânsito em julgado deste
último Acórdão, uma vez que o mesmo foi objecto de interposição de recurso para o TC, o
qual foi admitido, com efeito suspensivo.
11.º - Mesmo que ao dito recurso para o TC tivesse sido atribuído efeito meramente
devolutivo, a decisão condenatória não passaria a definitiva sem que o recurso pendente no
TC fosse julgado, ou sem que fosse conhecida a prescrição invocada antes do esgotamento
dos recursos ordinários (ou de constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão
condenatória.
12.° - Nem se diga, igualmente, que o recurso de constitucionalidade não configura um
recurso ordinário ou reclamação, capaz de obstar ao trânsito da decisão condenatória, nos
termos a que se referem os artigos 668.°, 669.° e 677.°, do C.P.Civil, aplicável “ex vi” artigo
4.° do C.P.Penal, ou seja, que a decisão condenatória “já se encontra transita em julgado,
entendendo-se como tal a insusceptibilidade de instaurar qualquer recurso ordinário”; é que
se o recurso de constitucionalidade previsto no artigo 70.°, n.° 1, al. b) da LTC, não configura
um verdadeiro recurso ordinário, pois só pode ser interposto após o esgotamento dos mesmos
(artigo 70.°, n.° 3, da LTC), não é também um recurso extraordinário, ou seja, a interpor após
o trânsito em julgado. Trata-se de um recurso de espécie diversa, que é processado à luz do
regime previsto no Código de Processo Civil, aplicável à apelação, esta sim, um recurso
ordinário, conforme resulta do artigo 69.°, da LTC (cfr. Ac. do TC n.° 1166/96), e que obsta
ao trânsito da decisão recorrida (artigo 80.º,n.º 4, da LTC).
13.° - Consequentemente, por expressa remissão do artigo 69.° da LTC para o regime da
apelação em processo civil, cumpre incluir o recurso de constitucionalidade na previsão dos
recursos a que se refere o artigo 677.° da CPP, aplicável ex vi artigo 4.° do Código de
Processo Penal, no sentido de a respectiva pendência obstar ao trânsito em julgado da
decisão.
14.º Ao partir do pressuposto de que existe trânsito em julgado, que não ocorre (porque estava
pendente o recurso junto do Tribunal Constitucional sobre o indeferimento do Júri), incorreu
a douta decisão recorrida em erro acerca dos pressupostos de facto e, por via disso, na
violação dos artigos 677.°, 671.°, n.° 1 672.°, e 497.°, todos do C.P Civil, ex vi artigo 4.° do
Código de Processo Penal, e artigo 69.° e 80.º da LTC.
15 – Mas, incorreu igualmente num erro na aplicação do Direito, visto que não extraiu as
consequências legais da pendência de um requerimento onde foi atempadamente suscitada a
questão da prescrição, bem como da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, essa sim,
transitada em julgado, que ordenou que o mesmo fosse conhecido.
- Da violação do caso julgado formado pelo douto Acórdão do STJ, datado de 13 de Julho de
2011, decorrente do erro acerca de pressupostos quanto à existência de trânsito em julgado da
decisão condenatória:
16.° - Conforme resulta da douta decisão recorrida, a Mm.a Juiz “a quo” considerou que o
douto Acórdão do STJ, datado de 13 de Julho de 2011, apenas impõe à 1ª instância o dever de

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“conhecer da prescrição do procedimento criminal suscitada pelo arguido (…) se e enquanto


não transitasse em julgado a decisão condenatória (…) Ou seja, deixou de subsistir o
pressuposto que o Supremo Tribunal de Justiça partiu (…)”, razão pela qual, pese embora o
arguido tenha suscitado a questão tempestivamente (isto é, antes do pretenso trânsito) a
mesma já não poderá ser conhecida.
17.° - Salvo o devido respeito, não se verificando o pressuposto de facto que justificaria (na
tese da decisão recorrida) a não execução do decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, a
decisão que rejeitou conhecer da invocada prescrição do procedimento criminal reconduz-se
(também por isso) a uma manifesta violação do caso julgado formado pelo douto Acórdão do
STJ, datado de 13 de Julho de 2011, o qual deixou indevidamente de ser cumprido, com
violação manifesta do disposto nos artigos 497.º e 498.º. 677.º. 668.º. 669.º, 671.º, n.º 1. 672.º,
673.°. 675.°. n.° 1 e 2. 676.°. n.°s 1 e 2. e 497.°, todos do C.P.Civil., aplicáveis ex vi artigo 4.°
do Código de Processo Penal. e artigos 69.°. 70.°, n.° 1, al. b), n.° 2, 3, 4, 5, 6, 71.°, 72.°, n.° 1.
al. b), n.° 2, 73.°, 75.°, n.°s 1 e 2, 76.°. 78.°, e 80.º , n.ºs 1, 2, 3 e 4. da LTC.

- Da violação do caso julgado formado pelo douto Acórdão do STJ, datado de 13 de Julho de
2011, decorrente da inexecução do mesmo:
18.º° - Acresce ao que acima se referiu - de onde decorre já a violação do caso julgado - que,
mesmo que à data da douta decisão recorrida já existisse caso julgado da decisão
condenatória, não seria possível deixar de cumprir o primeiramente decidido pelo Supremo
Tribunal de Justiça sem manifesta violação do caso julgado contido no mesmo.
19.° - Na óptica do ora Recorrente, mesmo que a decisão condenatória tivesse transitado à
data do despacho recorrido (o que, como se viu, não ocorreu), sendo a execução do douto
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça incompatível com a execução daquele outro que
houvesse condenado o arguido em pena de prisão, estaríamos perante casos julgados
contraditórios.
20.º - O caso julgado não visa obviar a uma colisão teórica ou lógica de julgados mas sim a
uma contradição prática de decisões – e serão concretamente incompatíveis duas decisões
quando não possam executar-se ambas sem detrimento de alguma delas.
21.º - Mesmo que houvesse trânsito em julgado do Ac. do TRL de 13.07.2011 (falso
pressuposto da decisão recorrida), haveria contradição entre os dois casos julgados - aquele
que decorre do Ac. do STJ de 13.07.2011, e aquele que se houvesse formulado após o trânsito
do douto Ac. do TRL, datado de 13.07.2011 -, pelo que haveria que cumprir aquele que
“passou em julgado em primeiro lugar ou seja, aquele que decorre do douto Acórdão do STJ,
isto é, haveria que aprecia a questão da prescrição do procedimento criminal por decisão
transitada em julgado, e só após isso se poderia cumprir executar o caso julgado que se
tivesse formado e fosse contido pela decisão condenatória.
22.º - O artigo 675.º do Código de Processo Civil, aplicável "ex vi" artigo 4.º do Código de
Processo Penal, interpretado no sentido de não existir incompatibilidade entre o caso julgado
de um Acórdão do Supremo que ordene ao tribunal de 1.ª instância que conheça da questão
da prescrição, e o caso julgado (formado em data posterior) de uma decisão condenatória da
Relação, e consequentemente da prescrição não dever ser conhecida antes da eventual
execução da decisão condenatória, é materialmente inconstitucional por violação dos artigos
9.º, n.º 1, al. b), 29.º, n.º 6, 32.º. n.º 2 e 282.º, n.º 3, da CRP, princípio da tutela das expectativas
legítimas (artigo 9.°, al. b). CRP), com corolários no artigo 282.º. n.º 3 e n.º 4 ("segurança
jurídica") da CRP, princípio da obrigatoriedade das sentenças judiciais para quaisquer
autoridades (incluindo judiciais), princípio da superioridade do Supremo Tribunal de Justiça
na hierarquia dos tribunais judiciais (artigos 205.º. n.º 2 e 210.º, n.º 1. da CRP), e a tutela
particular conferida pela Constituição ao caso julgado (cfr. artigo 282.º, n.º 3, da CRP).

- Da violação do direito a um processo equitativo e à tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º,


n.ºs 4 e 5, da CRP):
23.º - A interpretação normativa aplicada, mesmo em casos em que o arguido suscitou a
questão da prescrição atempadamente e o Supremo ordenou que a mesma fosse conhecida
pela 1.ª instância, reconhecendo ao arguido o direito à sua apreciação, nega ao arguido o
direito ao conhecimento de tal questão a pretexto do trânsito em julgado da decisão
condenatória. (pretensamente) verificado em data posterior à decisão do Supremo, que
ordenou o conhecimento da prescrição.
24.º - Tal interpretação normativa aplicada é materialmente inconstitucional por violação dos
direitos a um processo equitativo e à tutela jurisdicional efectiva, constitucionalmente
consagrados nos artigos 20.º, n.º 4 e 5, da CRP, violando ainda o artigo 6.º da CEDH.
26.º - Ao restringir um instrumento processual potestativo (o requerimento do arguido de
invocação da prescrição do procedimento criminal antes do trânsito em julgado da decisão

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condenatória), não conhecendo da prescrição, sobretudo após uma decisão de tribunal


superior transitada em julgado ter ordenado que a mesma fosse apreciada, nos casos em que,
entre o momento da invocação e o momento em que a prescrição seria apreciado pelo tribunal
competente, se tiver verificado o esgotamento dos recursos ordinários (ou de
constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão condenatória, viola a norma aplicada
e, de forma desnecessária, o direito a um processo equitativo e à tutela judicial efectiva artigo
20.º n.ºs 4 e 5, da CRP).
27.º - Ainda que se alegasse que a norma aplicada tutela o valor do caso julgado, que tem
subjacente o interesse constitucional na segurança e certeza jurídica, sempre se diria que o
valor do caso julgado a tutelar de imediato, em casos como os que regula a norma em
questão, será — sob pena de ofensa ao mesmo - o caso julgado da primeira decisão a passar
em julgado. e assim, da decisão que ordenou, ainda antes do (in casu. pretenso) trânsito em
julgado da decisão condenatória, o conhecimento da questão da prescrição.
28.º - Ou seja, não colhe dizer que a norma aplicada visa salvaguardar o valor constitucional
do caso julgado, porquanto redunda exactamente na manifesta violação deste, e assim, dos
artigos 29.°, n.° 6, 32.°, n.° 2 e 282.°, n.° 3, da CRP, sendo por isso tal entendimento imputado
à norma inconstitucional.
29.º - Mas, independentemente disso, tal restrição ao direito à tutela jurisdicional e ao
processo equitativo sempre se revelaria completamente desproporcionada, em violação do
artigo 18.°, n.° 2, da CRP, e do artigo 6.° da CEDH. Não é admissível que se promova a
segurança e certeza jurídica com desprezo pelas garantias de defesa do arguido (art.° 32.°, n.°
1, da CRP), sendo certo que o direito à invocação da prescrição se reconduz ao exercício
legítimo do direito de defesa do arguido, e em violação da referida certeza e segurança criada
no destinatário de uma decisão anterior que lhe reconhece o direito a ver apreciada a questão
da prescrição pelo tribunal anterior.
30.º A norma acima enunciada, aplicada na douta decisão recorrida, é majoradamente
inconstitucional em casos em que a respectiva aplicação se faça na pendência de um recurso
de constitucionalidade que incida sobre a decisão condenatória, ou seja, com preterição do
direito ao recurso previsto no artigo 32.°. 1, da CRP; e os artigos 497.° e 498.°, 677.°, 668.°,
669.°, 671.°, n.° 1, 672.°, 673.°, 675.°, n.° 1 e 2, 676.°, n.°s 1 e 2, todos do C.P.Civil, aplicáveis
"ex vi" artigo 4.° do Código de Processo Penal, e artigos 69.°, 70.º, n.° 1, al. b), n.°s 2, 3, 4, 5,
6, 71.°, 72.°, n.° 1, al. b), n.° 2, 75.°, n.°s 1 e 2, 76.°, 78.°, e 80.°, n.°s 1, 2, 3 e 4, da LTC, ou
quaisquer outras normas que em concreto venham a ser aplicadas para sustentar, de forma
singular ou conjugada, a norma aplicada. são materialmente inconstitucionais.
31.° - Tal interpretação normativa constitui uma restrição ao direito à tutela jurisdicional
efectiva e ao processo equitativo (artigo 20.°, n.° 4 e 5, da CRP) que não prossegue qualquer
bem constitucional em violação do artigo 18.°, n.° 2 e 3, da CRP, esvaziando o núcleo
essencial do direito ao recurso (artigo 32.°, n.° 1, da CRP).

- Da violação do direito a todas as garantias de defesa, incluindo o recurso (artigo 32.º, n.º 1,
da CRP):
32.° - No âmbito daquelas que constituem as garantias de defesa do arguido em processo
penal encontra-se, sem dúvida, a possibilidade de invocar a prescrição do procedimento
criminal, ou seja, a inexistência de interesse punitivo do Estado relativamente aos factos que
lhe estão imputados, e isto até ao trânsito em julgado da decisão condenatória.
33.° - É direito do arguido invocar a prescrição até ao trânsito em julgado da decisão, é
igualmente seu direito ver a questão efectivamente apreciada se a tiver colocado antes de tal
trânsito, independentemente de posteriormente à suscitação da prescrição se tiverem esgotado
os recursos ordinários (ou de constitucionalidade) e as reclamações sobre a decisão
condenatória, e independentemente de existir uma decisão que lhe reconheça o direito à
respectiva apreciação.
34.° - Parece evidente que, sobretudo quando até já existe uma decisão transitada que ordena
que a prescrição seja conhecida, se o arguido tem o direito de se defender invocando a
prescrição, tal direito não pode deixar de abranger o direito a ver efectivamente apreciada a
questão, sob pena de desnecessário esvaziamento do direito de defesa do arguido, e de mera
tutela aparente do mesmo.
35.º - O arguido colocou a questão de forma tempestiva, e a mesma só não foi apreciada por
tal decisão não poder ser automática ou instantânea, como idealmente deveria ocorrer.
36.º - Se a questão não foi de imediato apreciada por forma a que a sua decisão – que tutela o
direito de ver apreciada a prescrição - ocorresse antes do esgotamento dos recursos ordinários
(ou de constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão condenatória, tal realidade
processual não é já imputável ao arguido, mas à (in)capacidade de resposta célere do sistema
judicial.

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37.º - Invocar tal realidade processual para justificar o coarctar do direito de defesa do
arguido, esgrimindo a salvaguarda do interesse na segurança e certeza jurídica, não é
proporcional ou adequado à tutela dos interesses conflituantes, podendo até gerar casos de
manifesta discriminação entre casos idênticos, com violação do princípio da igualdade (artigo
13.° da CRP).
38.º - Consequentemente, os artigos 497.° e 498.°, 677.°, 668.º, 669.°, 671.°, n.° 1, 672.°, 673.°,
675.°, n.º 1 e 2, 676.°, n.°s 1 e 2, todos do C.P.Civil. aplicáveis"ex vi”. artigo 4.° do Código de
Processo Penal, e artigos 69.°, 70.°, n.° 1, al. b), n.°s 2, 3, 4, 6, 71.°, 72.°, n.° 1, al. b), n.° 2.
75.º, n.°s 1 e 2, 76.º, 78.°, e 80.°. n.°s 1. 2. 3 e 4, da LTC, ou quaisquer outras normas que em
concreto venham a ser aplicadas para sustentar, de forma singular ou conjugada, a
interpretação normativa aplicada, a interpretados no sentido de, tendo sido suscitada pelo
arguido a prescrição do procedimento criminal antes do esgotamento dos recursos ordinários
(ou de constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão condenatória, permitirem o não
conhecimento da mesma, por entre o momento da invocação da prescrição e o momento da
sua eminente apreciação pelo tribunal de 1.ª instância, se ter verificado o referido
esgotamento dos meios processuais acima referidos, são materialmente inconstitucionais por
violação do direito à tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.°, n. 4 e 5, da CRP) e dos direitos
de defesa do arguido (artigo 32.°. n.° 1, e 18.°. n.° 2 e 3, da CPR).
39.º - A mesma norma, em casos em que exista decisão transitada, mas não cumprida, que
tenha ordenado à 1.a instância o conhecimento da questão, é ainda mais flagrantemente
inconstitucional, por violação das mesmas normas da CRP.
40.º - Uma interpretação dos artigos 675.° do Código de Processo Civil, aplicável "ex vi”
artigo 4.° do Código de Processo Penal, e 80.°. n.° 4, da LTC, que levasse a concluir que, não
obstante a pendência do recurso interposto para o Tribunal Constitucional, se verificou o
trânsito em julgado da decisão condenatória, precludiria o conhecimento da prescrição,
constituiria uma violação, designadamente, dos artigos 20.º, n.º 4 e 5. 32.º, n.° 1, ambos da
CRP, e do princípio da legalidade e da segurança jurídica.

- Da violação do direito à liberdade (art.° 27.°, n.° 1, da CRP) e do princípio da proibição do


excesso das penas (artigo 18. n.° 2, da CRP):
41.º - A aplicação de penas e a exigência da respectiva execução acarreta uma restrição ao
direito à liberdade (artigo 27.°. n.° 1. da Constituição) que deve obediência estrita aos
pressupostos materiais, que legitimam, constitucionalmente, as restrições de direitos,
liberdades e garantias fundamentais, constantes do artigo 18.°, n.° 2, da Constituição, ou seja,
o princípio da proporcionalidade, que tem como sub-princípio o da proibição do excesso.
42.º - Considerando que o decurso do prazo legal da prescrição materializa a perda do
interesse punitivo do Estado relativamente a uma determinada conduta, e dá azo ao
desaparecimento de um pressuposto da punição. "esfuma-se a carência de pena, e com ela, as
necessidades de prevenção especial e geral da punição" relativamente ao crime prescrito.
43.º - O juiz, mesmo após a prolação da sentença que apenas diz respeito à decisão de fundo,
pode e deve conhecer causas de extinção do procedimento criminal ou do procedimento
contra-ordenacional, como a prescrição, desde que suscitadas antes do trânsito da sentença.
44.º - Da interpretação normativa adoptada na douta decisão recorrida resulta que a
invocação e, no limite, a verificação da prescrição não conhecida até ao esgotamento dos
recursos ordinários (ou de constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão
condenatória, mas suscitada antes do mesmo, é irrelevante para obstar à exequibilidade da
decisão condenatória e ao respectivo trânsito em julgado, o que é manifestamente
desconforme com os princípios constitucionais, por implicar condenação por um delito
insubsistente.
45.º - Ao recusar reconhecer da questão da prescrição, admitindo porém a hipótese da sua
verificação, e invocar interpretação que permite a execução de uma pena que, aos olhos do
interesse punitivo do Estado, se tornou inútil, configurando, assim, uma restrição do direito à
liberdade da pessoa humana que já não se justifica à luz das necessidades de prevenção
especial ou geral, nem tão pouco à luz de qualquer outro interesse constitucional.
46.º - Nem se diga que o interesse constitucional que valida tal interpretação é a salvaguarda
do caso julgado e, assim, da segurança e da certeza jurídica, uma vez que a tutela de tais
valores é, no caso, totalmente desproporcional e desadequada.
47.º - De outra forma estar-se-á, como o faz a norma aplicada, a justificar a privação da
liberdade da pessoa humana e da pena não à luz da necessidade da mesma, ou sequer do
interesse punitivo do Estado (que já desapareceu), mas à luz da salvaguarda de um mero
instituto jurídico (o caso julgado), para tutela cega (e constitucionalmente insustentável) do
mesmo.
48.º - Não é o interesse na certeza e na segurança jurídica que pode justificar, com base na

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teoria dos interesses constitucionais conflituantes, a privação da liberdade da pessoa humana


(através da aplicação de urna pena privativa de liberdade), mas sim a respectiva necessidade.
É que o direito à liberdade da pessoa humana é manifestamente prevalecente sobre o
interesse na salvaguarda do caso julgado. Por isso mesmo, a Constituição manda reabrir o
caso julgado quando estejam em causa condenações injustas (artigo 29.°, n.° 6. da CRP) ou
que tenham aplicado norma penal ou de mera ordenação social inconstitucional desfavorável
(artigo 282.°. n.° 3. da CRP).
49.º - Recusar conhecer da prescrição tempestivamente invocada pelo arguido e insistir, por
via disso, em executar uma pena que, pelo menos numa das hipóteses admitida pela norma, se
tornou desnecessária, a pretexto da tutela de um superveniente caso julgado não tutela
qualquer bem constitucional substancial (mas apenas uma visão formal inconstitucional do
caso julgado), constitui portanto uma medida desadequada para a defesa de qualquer bem
constitucional valioso: revela-se desnecessária, pois, a mera apreciação da prescrição não
impedirá a formação de caso julgado, caso o arguido não tenha fundamento na sua alegação:
e constitui ainda uma medida desproporcionada, pois sacrifica um dos bens constitucionais
mais valiosos (a liberdade) em função de um pretenso caso julgado, em violação dos artigos
18.°, n.° 2 e 3 e 27.°, ambos da CRP.
50.º - Consequentemente, os artigos 497.° e 498.°, 677.°, 668.°, 669.°, 671.°, n.° 1, 672.°,
673.°, 675.°, n.° 1 e 2, 676.°, n.°s 1 e 2, todos do C.P.Civil, aplicáveis “ex vi” artigo 4 ° do
Código de Processo Penal, e artigos 69.°, 70.°, n.° 1, al. b), n.°s 2, 3, 4, 5, 6, 71.º, 72.°, n.° 1,
al. b), n.° 2, 75.º, n.ºs 1 e 2, 76.º, 78.°, e 80.°, n.°s 1, 2, 3 e 4, da LTC, ou quaisquer outras
normas que, em concreto, venham a ser aplicadas para sustentar a norma aplicada, de forma
singular ou conjugada, interpretados no sentido de, tendo sido suscitada pelo arguido a
prescrição do procedimento criminal antes do esgotamento dos recursos ordinários (ou de
constitucionalidade) e das reclamações sobre a decisão condenatória, sobretudo quando
tenha sido ordenado por decisão de um tribunal superior, já transitada, que a 1.ª instância
deveria conhecer da questão, permitirem o não conhecimento da mesma, por entre o
momento da invocação da prescrição e o momento da sua eminente apreciação pelo tribunal
de 1.a instância, se ter verificado o referido esgotamento daqueles meios processuais, são
materialmente inconstitucionais por violação dos artigos 27.°, n.° 1 e 2, e 18.°, n.° 2 e 3, da
CRP.
51.º - Como são inconstitucionais os artigos identificados na conclusão anterior, ou aqueles
que venham a ser em concreto aplicados, no sentido de se considerar que o eventual trânsito
em julgado do Acórdão do Tribunal Constitucional que decida o recurso relativo ao
indeferimento da intervenção do Júris em sentido improcedente, provoca o trânsito em
julgado do douto acórdão condenatório, e impede o conhecimento da prescrição cujo
conhecimento foi oportunamente requerido e ordenado, por violação dos artigos 20.°, n.°s 4 e
5, 27.°, n.° 1 e 2, 32.°, 1 e 2, e 18.°, n.° 2 e 3, da CRP, e da salvaguarda do caso julgado
previsto nos artigos 29.°, n.° 6, 32.°, n.°2 e 282.°, n.° 3, da CRP.
52.º - Ao considerar que não devia conhecer da prescrição tempestivamente invocada pelo
arguido, a douta decisão recorrida violou as normas constantes dos artigos 6.°, n.° 1, da
Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 9.°, n.° 1, al. b), 13.°, 18.º n.°s 1 e 2, 20.°, n.°s 4
e 5, 27.°, n.°s 1 e 2, 29.°, n.° 6, 32.°, n.° 1 e 2, 282.°, n.° 3, todos da Constituição da República
Portuguesa, 497.°, 498.°, 668.°, 669.°, 671.°, n.° 1, 672.°, 673.°, 675.º, n.°s 1 e 2, 676.º, n.°s 1 e
2 e 677.° do C.P.Civil, aplicáveis “ex vi” artigo 4.° do C.P.Penal, e os artigos 69.°, 70.°, n.° 1,
alínea b), e n.°s 2, 3, 4, 5 e 6, 71.°, 72.°, n.° 1, alínea b), e n.°2, 73.°, 75.°, n.°s 1 e 2, 76.º, 78.°
e 80.°, n.°s 1, 2, 3 e 4 da LTC, e o princípio da tutela das expectativas legítimas (artigo 9.°. al.
b), CRP), com corolários no artigo 282.°, n.° 3 e n.° 4 ("segurança jurídica") da CRP, o
princípio da legalidade, o princípio da obrigatoriedade das sentenças judiciais para quaisquer
autoridades (incluindo judiciais), o princípio da superioridade do Supremo Tribunal de
Justiça na hierarquia dos tribunais judiciais (artigos 205.°. n.° 2 e 210.º, n.° 1. da CRP, e a
tutela particular conferida pela Constituição ao caso julgado (cfr. artigo 282.°, n.° 3, da
CRP).
53.º - Ao deixar de conhecer da prescrição, questão que podia e devia ter conhecido, incorreu
a douta decisão recorrida na nulidade por omissão de pronúncia, prevista no artigo 379.°, n.°
1, al. b), do CPP.
VI - PEDIDO:
Nestes termos, e nos demais de direito que V. Exas. suprirão, deve o presente recurso ser
julgado procedente e, consequentemente, revogada a decisão recorrida e substituída por outra
que determine que o Tribunal de 1.ª instância conheça da questão da prescrição
tempestivamente colocada pelo arguido em cumprimento do douto Acórdão do STJ. de
13.07.2011, consignando-se que tal conhecimento não será, como não pode ser, afectado pelo
trânsito em julgado de qualquer Acórdão do Tribunal Constitucional incidente sobre normas,

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alheias a tal questão, que foram oportunamente objecto de impugnação.


Assim se fazendo a costumada Justiça!”
*

1.3. Na 1.ª instância, em 14NOV2011, respondeu O Ministério


Público, concluindo do seguinte modo:
“1-) Do teor textual do Acórdão do STJ de 13 de Julho de 2011 não resulta qualquer
comando expresso ou injunção para a apreciação da questão da prescrição, ao contrário
daquilo que o arguido recorrente pretende e, consequentemente, não existe qualquer
incumprimento de decisão superior ou caso julgado formado sobre tal matéria.
2-) Sobre o douto despacho recorrido de 28 de Setembro de 2011 sufraga-se o entendimento,
anteriormente expresso pelo MºPº, segundo o qual o STJ ao devolver os autos à 1.ª instância a
título definitivo com nota de trânsito do Tribunal Constitucional, considerou e bem que a
questão quanto aos crimes porque o arguido foi condenado e à condenação em pena de
prisão, estavam julgados definitivamente.
3-) Assim, o STJ considerou que o recurso interposto pelo arguido para o Tribunal
Constitucional sobre a intervenção do tribunal de júri não interferia na decisão condenatória,
sendo a prova disso que a existência de tal recurso (quanto à admissibilidade do tribunal de
júri) nunca suspendeu os normais trâmites do processo no que toca à marcha do processo,
designadamente, houve subida subsequente de recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça,
no que à decisão condenatória diz respeito e bem assim, subida e decisão do Tribunal
Constitucional, no que toca à apreciação das normas aplicadas na condenação.
4-) Pelo que o douto despacho recorrido, de 28 de Setembro de 2011, ao não conhecer da
prescrição e ao considerar o Acórdão condenatório transitado em julgado tem fundamento e
será de sufragar na totalidade.
5-) Porém, tal discussão está neste momento completamente ultrapassada porquanto a
decisão condenatória do Tribunal da Relação de Lisboa está, desde 31 de Outubro de 2011, de
forma inequívoca e incontroversa, transitada em julgado (ver explicitamente o Acórdão do
Tribunal Constitucional de 31 de Outubro de 2011, constante de fls. 1039 e 1040 do 4º volume
traslado).
6-) No caso em apreço, com o trânsito em julgado, a controvérsia sobre a condenação acabou
e o acto jurisdicional tornou-se irrevogável, impondo-se a todos (art.º 205 CRP) e aos demais
tribunais.
7-) O caso julgado tem sido mesmo considerado como um verdadeiro princípio constitucional
implícito, sendo recorrente a referência ao valor constitucional reforçado da sua
intangibilidade.
8-) Pelo que o douto Acórdão condenatório, transitado em julgado, não pode ser afrontado
senão pelo mecanismo do recurso de revisão (art. 449 do CPP), única forma de quebrar o
caso julgado.
9-) E se não pode ser atacado de forma directa, muito menos o poderá ser de formas
enviesadas, como pretende o arguido recorrente, quebrando princípios elementares de
segurança jurídica inerentes ao Estado de Direito.
10-) A única prescrição que poderá ser, neste momento, conhecida é a prescrição da pena
aplicada ao arguido pelo que o presente recurso não poderá ser conhecido sob pena de
hipotética contradição com o caso julgado condenatório.
11-) Não assiste, pois, qualquer razão ao recorrente devendo a decisão recorrida ser
integralmente mantida.”

*
1.4. Foi cumprido na oportunidade o disposto no n.º 1 do art.
416.º do Código de Processo Penal, apondo, em 07DEZ2011, o
Ex.mo Procurador-Geral Adjunto o seu “visto” (cf. fls. 48).

*
1.5. Colhidos os vistos legais, procedeu-se à conferência neste
Tribunal, a qual veio a decorrer com observância do legal
formalismo, cumprindo decidir.

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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. DA QUESTÃO DE FACTO
Comecemos por nos deter sobre as ocorrências relevantes para
decisão do presente recurso:
2.1.1. O arguido I… desavindo com o Acórdão condenatório
proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 13JUL2010 [
Proc. n.º 712/00.9JFLSB.L1-5, cujo texto integral se mostra disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec

] que o condenou numa


/4ea124142619cd83802577740038bf4d?OpenDocument&Highlight=0,Juri

pena única de 2 (dois) anos de prisão, bem como no pagamento


de uma indemnização civil, dele interpôs recurso para o S.T.J. em
12JAN2011.
2.1.2. Em 15FEV2011, o Senhor Desembargador Relator do
Tribunal da Relação de Lisboa admitiu o recurso interposto pelo
aludido arguido, com efeito suspensivo e a subir de imediato e nos
próprios autos.
2.1.3. O Supremo Tribunal de Justiça admitiu o recurso
apresentado pelo referido arguido relativamente ao Acórdão
condenatório do Tribunal da Relação de Lisboa e fixou-lhe efeito
suspensivo.
2.1.4. O Supremo Tribunal de Justiça por Acórdão de
27ABR2011 decidiu não conhecer do recurso interposto pelo
arguido I…, na parte criminal, rejeitando-o por
inadmissibilidade legal, bem como rejeitou o recurso interposto
pelo mesmo arguido na parte cível, por manifestamente
improcedente e deu, ainda, parcial provimento ao recurso
interposto pelo Ministério Público.
2.1.5. Em 13MAI2011, o aludido arguido invocou a nulidade do
Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça por omissão
de pronúncia.
2.1.6. Em 17MAI2011, o arguido I… requereu ao Supremo
Tribunal de Justiça a apreciação, conhecimento e decisão sobre a
prescrição do procedimento criminal relativo aos crimes de
fraude fiscal de 2001 e 2002, requerendo que dessa decisão fossem
retiradas as necessárias consequências.
2.1.7. O arguido I… em 20MAI2011 interpôs recurso do Acórdão
do Supremo Tribunal de Justiça de 27ABR2011 (decisão que
rejeitou conhecer do recurso da parte penal interposto para
aquele Supremo por inadmissibilidade legal do mesmo) para o
Tribunal Constitucional.
2.1.8. Por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de
15JUN2011, foram indeferidos os requerimentos do arguido I…,
por falta de fundamento legal.
2.1.9. Por despacho Proferido pelo Senhor Juiz Conselheiro do
Supremo Tribunal de Justiça datado do mesmo dia foi
determinado o envio dos autos principais para o Tribunal

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Constitucional com vista a apreciação do recurso interposto pelo


arguido I… do Acórdão desse mesmo Supremo Tribunal.
2.1.10. O arguido I…, em 16JUN2011, veio alegar factos que
considerou relevantes para a apreciação da medida da pena ou
para a sua suspensão (pagamento de impostos reportados aos
anos de 2001, 2002 e 2003, juros de mora e acréscimos legais) e
requerer a reabertura da audiência de julgamento e remessa dos
autos para a 1.ª instância para o efeito.
2.1.11. Por Acórdão de 22JUN2011 tal requerimento foi
classificado como manifestamente infundado e considerado como
meio dilatório susceptível de obstar à remessa do processo para o
Tribunal Constitucional, o que levou a que fosse julgado
improcedente, bem como a que se tivesse ordenado nos termos do
art. 720.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, ex vi do art. 4.º do
Código de Processo Penal, a extracção de traslado a prosseguir
no Supremo Tribunal de Justiça, se fosse caso disso, prosseguindo
os autos principais para o Tribunal Constitucional.
2.1.12. Em 27JUN2011, o arguido I…arguiu a irregularidade e
correcção do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de
15JUN2011, por não conhecer da prescrição do procedimento
criminal.
2.1.13. Em 05JUL2011, o arguido I… arguiu, também, a nulidade
do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15JUN2011, por
omissão de pronúncia quanto à prescrição do procedimento
criminal e remessa dos autos para o Tribunal de 1ª Instância.
2.1.14. Veio, ainda, o arguido, em 07JUL2011, arguir a
irregularidade e correcção do acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça de 22JUN2011.
2.1.15. Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido
em 13JUL2011, foi decidido que inexistia qualquer omissão de
pronúncia, nem nulidade ou qualquer irregularidade
relativamente aos acórdãos do Supremo, tendo sido, por isso,
indeferidos os preditos requerimentos do arguido por
manifestamente infundados no que vinha impetrado quanto aos
acórdãos proferidos pelo Supremo sobre o conhecimento de
questões postas, ao mesmo tempo que se determinou que a
questão suscitada pelo arguido – prescrição do procedimento
criminal – deveria ser decidida pelo Tribunal de 1ª Instância,
enquanto a decisão condenatória não transitasse em julgado,
tendo sido remetido o traslado (Processo 712/00.9JFLSB-N) para
tal efeito.
2.1.16. Naquele aresto do Supremo Tribunal de Justiça foi feita
especial referência a que se remetia o traslado para a 1.ª
Instância para decidir sobre a questão suscitada da prescrição,
porque a decisão [O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27ABR2011, de
que foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, não constituía decisão
condenatória penal, mas decisão que rejeitou conhecer do recurso da parte penal

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ainda não havia


interposto para aquele Supremo por inadmissibilidade legal.]
transitado em julgado, encontrando-se pendente de recurso, para
o Tribunal Constitucional, do Acórdão desse mesmo Colendo
Tribunal que não admitiu o recurso na parte criminal (tendo sido
remetido os autos principais para o Tribunal Constitucional),
conforme se pode verificar do seguinte segmento daquele
acórdão: “(…) a questão de direito assim suscitada, configurada sempre como questão
nova, porque posterior à decisão da 1.ª instância é a de saber se e enquanto não houver
trânsito em julgado pode ou não o tribunal do julgamento – o da 1ª instância - conhecer
oficiosamente ou a requerimento de questões novas – caso da suscitada prescrição de
procedimento criminal – que possam reflectir-se na amplitude e eficácia da condenação, ou
seja, na responsabilidade criminal do arguido, enquanto a condenação não tiver transitado
em julgado (…) Incorpore ainda no traslado certidão do acórdão da 1ª Instância e do acórdão
da Relação, informando que do acórdão do Supremo que não admitiu o recurso interposto
pelo arguido do acórdão da Relação, foi interposto recurso et admitido, para o Tribunal
Constitucional”.
2.1.17. Em 13JUL2011, quando o Supremo Tribunal de Justiça
decide a remessa do traslado para a 1.ª Instância não havia ainda
conhecimento da decisão do Tribunal Constitucional, desse
mesmo dia, nem do trânsito dela.
2.1.18. A extracção do traslado (actualmente com o n.º
712/00.9JFLSB-N) foi ordenada pelo Supremo Tribunal de
Justiça, no já aludido pressuposto de que os incidentes suscitados
pelo arguido eram manifestamente, infundados e se
configuravam como meios anómalos que visavam impedir a
remessa do processo para o Tribunal Constitucional e,
consequentemente, a obstar ao andamento dos autos no Tribunal
recorrido.
2.1.19. O S.T.J. ordenou a extracção de tal traslado com vista a
não atrasar o conhecimento do recurso pelo Tribunal
Constitucional, quanto à decisão condenatória [ Summo rigore a decisão
penal condenatória é o Acórdão da Relação de Lisboa de 13JUL2010 (Proc.
712/00.9JFLSB.L1-5) que fixou a pena única de 2 (dois) anos de prisão efectiva, uma vez
que o recurso dela interposto para o Supremo Tribunal de Justiça foi rejeitado por
inadmissibilidade legal.].
2.1.20. Desde 22JUN2011, o Supremo Tribunal de Justiça, nesse
traslado conheceu dos requerimentos qualificados como
manifestamente infundados e, ainda, conheceu dos requerimentos
posteriores à sobredita data, julgando-os improcedentes, com
excepção do requerimento da prescrição do procedimento
criminal, por entender que seria o Tribunal de 1.ª instância a
conhecer de tal incidente e determinou a remessa do traslado
para a 1ª Instância, para conhecimento da prescrição do
procedimento criminal.
2.1.21. Entretanto, o Tribunal Constitucional proferiu decisão
sumária, com trânsito em julgado de 19SET2011 e, por força
disso, o Supremo Tribunal de Justiça, em 22SET2011, ordenou a
remessa, a título definitivo, dos autos principais à 1.ª Instância.
2.1.22. O Supremo Tribunal de Justiça, antes de ser remetido o

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traslado, para o Tribunal de 1.ª Instância juntou a esse traslado


(Processo n.º 712/00.9JFLSB-N) certidão com nota de trânsito em
julgado do acórdão do Tribunal Constitucional (que decidiu
sobre o recurso apresentado pelo arguido do acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça que havia decidido pela não
admissão do recurso apresentado pelo arguido na parte
criminal).
2.1.23. O arguido I…interpôs recurso para o Tribunal da Relação
de Lisboa do despacho, proferido pelo Tribunal de 1.ª instância,
que indeferiu a intervenção do Tribunal do Júri.
2.1.24. Este recurso foi admitido na 1.ª instância com efeito
meramente devolutivo e a subir com a decisão final (cf. despacho
de fls. 9257)
2.1.25. Por força do efeito deste recurso, os autos prosseguiram
normalmente a sua tramitação, tendo o julgamento sido realizado
com intervenção de Tribunal Colectivo.
2.1.26. O Tribunal da Relação de Lisboa admitiu o recurso
interposto pelo arguido I…relativamente ao despacho que não
admitiu a intervenção do Tribunal do Júri com o mesmo efeito
(efeito meramente devolutivo) — cf. despacho de fls. 12182 — e
decidiu-o no Acórdão de 13JUL2010 (Proc. n.º
712/00.9JFLSB.L1-5) num segmento decisório prévio, relativo à
competência do Tribunal Colectivo, julgando improcedente o
recurso interposto pelo arguido considerando “[…]Com isto, ficam
afastadas todas as razões do pedido formulado pelo arguido de revogação do despacho
judicial que lhe indeferiu a intervenção do tribunal de júri.” [() Os fundamentos deste
segmento decisório prévio plasmado no referido Acórdão de 13JUL2010 estão disponíveis
em:
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec

].
/4ea124142619cd83802577740038bf4d?OpenDocument&Highlight=0,Juri

2.1.27. O arguido inconformado com esta decisão do Tribunal da


Relação de Lisboa, em 13SET2010, a fls. 12350/12351, interpôs
recurso para o Tribunal Constitucional.
2.1.28. Por despacho de 21SET2010 (cf. fls. 12367), reportando-se
ao recurso interposto pelo arguido para o Tribunal
Constitucional (sobre o indeferimento da intervenção do Tribunal
do Júri), o Senhor Desembargador Relator do Tribunal da
Relação, decidiu que oportunamente apreciaria a sua admissão.
2.1.29. Como já acima dito fica, o arguido inconformado com o
Acórdão condenatório proferido pelo Tribunal da Relação de
Lisboa que o condenou numa pena única de 2 (dois) anos de
prisão efectiva e numa indemnização civil ao Estado Português,
interpôs recurso em 12JAN2011, para o Supremo Tribunal de
Justiça.
2.1.30. Por despacho proferido pelo Ex.mo Juiz Desembargador
Relator, no Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 15FEV2011
(cf. fls. 12546), admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de

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Justiça, quanto à decisão condenatória, com efeito suspensivo a


subir de imediato e nos próprios autos e decidiu que o recurso
interposto a fls. 12350/12351 pelo arguido para o Tribunal
Constitucional (quanto ao indeferimento da intervenção do
Tribunal do Júri) “será oportunamente apreciado, se for o caso e seja mantido
interesse no mesmo”.
2.1.31. O processo foi remetido para o Supremo Tribunal de
Justiça (em 07MAR2011), sem ser apreciada a admissibilidade do
recurso interposto, a fls. 12350/12351, pelo arguido I… para o
Tribunal Constitucional relativo ao indeferimento do Tribunal do
Júri.
2.1.32. O Supremo Tribunal de Justiça admitiu o recurso
apresentado pelo arguido relativamente ao Acórdão condenatório
do Tribunal da Relação de Lisboa de 13JUL2010 e fixou-lhe
efeito suspensivo.
2.1.33. Como acima aludido foi, o Supremo Tribunal de Justiça
por Acórdão de 27ABR2011, decidiu não conhecer do recurso
interposto pelo arguido I…, na parte criminal, rejeitando-o por
inadmissibilidade legal, bem como rejeitou o recurso interposto
pelo arguido na parte cível, por manifestamente improcedente e
deu, ainda parcial provimento ao recurso interposto pelo
Ministério Público.
2.1.34. O arguido I… em 20MAI2011 interpôs recurso do
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça para o Tribunal
Constitucional.
2.1.35. O arguido I… em 17MAI2011 (cf. fls. 1267) veio requerer
ao Supremo Tribunal de Justiça o reenvio dos autos ao Tribunal
da Relação de Lisboa para ser apreciada admissão do recurso
por si interposto a fls. 12350/12351 para o Tribunal
Constitucional (relativo ao indeferimento do Júri)
2.1.36. Por despacho de fls. 12700/12701, em 01JUN2011, do
Supremo Tribunal de Justiça, foi determinado o envio de
translado ao Tribunal da Relação de Lisboa para apreciação do
recurso para o Tribunal Constitucional “do despacho interlocutório” [Cabe
aqui ter presente que, salvo o devido respeito por opinião em contrário, se bem vemos,
verdadeiramente o recurso interposto pelo arguido I… do Acórdão da Relação de Lisboa
de 13JUL2010 para o Tribunal Constitucional (relativo ao Júri) não incidiu sobre uma
decisão interlocutória, mas sobre um segmento decisório prévio, relativo à competência do
Tribunal Colectivo, como se enxerga da leitura integral do referido aresto deste Tribunal
da Relação de Lisboa (decisão penal condenatória), que se mostra disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec
/4ea124142619cd83802577740038bf4d?OpenDocument&Highlight=0,Juri)] “(…) constituído por certidões
das peças processuais – fotocópia autenticada – indicadas a fls. 12699 e deste despacho, para
os fins que a Relação tiver por convenientes sobre a interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional ali efectuada, informando que o Acórdão deste Supremo ainda não transitou
em julgado”.
2.1.37. Em 05JUL2011, o Tribunal da Relação de Lisboa, por
força de requerimento apresentado pelo arguido I… a reclamar
do efeito atribuído ao recurso, dá razão a este arguido, invocando
um mero lapso de escrita, e altera o efeito do recurso para

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suspensivo.
2.1.38. O Tribunal da Relação da Lisboa nada comunicou aos
autos principais ou ao translado (relativo à prescrição do
procedimento criminal) relativamente à alteração do efeito
atribuído ao recurso, de meramente devolutivo para efeito
suspensivo.
2.1.39. O Tribunal Constitucional, por despacho de 12JUL2011,
atribuiu ao recurso efeito suspensivo, por remissão ex lege para o
efeito antecedentemente atribuído pelo Tribunal da Relação.
2.1.40. Igualmente o Tribunal Constitucional nada comunicou aos
autos principais ou ao translado (relativo á prescrição do
procedimento criminal) quanto ao efeito suspensivo atribuído ao
recurso.
2.1.41. No Tribunal a quo, após a prolação do despacho judicial
proferido pela senhora Juíza titular dos autos principais, de
30SET2011 (cf. fls. 12961 e 12962) o arguido I… juntou aos autos
certidão emitida pelo Tribunal Constitucional que declarava o
efeito suspensivo do recurso.
2.1.42. Após informação oficial que chegou ao Tribunal a quo, a
senhora Juíza titular dos autos principais tomando conhecimento
do “efeito suspensivo do recurso pendente no Tribunal Constitucional” de imediato
determinou a emissão de mandados de libertação do arguido I….
2.1.43. Por despacho proferido pela Senhora Juíza do 2.º Juízo
Criminal do Tribunal Judicial de Oeiras no âmbito do Processo
n.º 712/009.JFLSB-N, datado de 28SET2011, que consubstancia a
decisão recorrida, integrante de fls. 240 a 244 (cf. fls. 3 a 7 dos
presentes autos) e cujo teor se dá aqui por integralmente
reproduzido, foi decidido:
“[…] consideramos que, na presente data, mostra-se afastada a possibilidade de apreciação e
conhecimento da prescrição do procedimento criminal suscitada pelo arguido I…, face ao
trânsito em julgado da decisão condenatória e, em consequência, indefere-se o requerimento
apresentado pelo arguido.”.
Para tal, aduz os seguintes argumentos relevantes:
— “A decisão condenatória já se encontra transitada em julgado, entendendo-se como tal a
insusceptibilidade de instaurar qualquer recurso ordinário”;
— O caso julgado formado pelo Acórdão do S.T.J. datado de
13JUL2011 impõe à 1.ª instância “conhecer da prescrição do procedimento
criminal suscitada pelo arguida (…) se e enquanto não transitasse em julgado a decisão
condenatória (…) Ou seja, deixou de subsistir o pressuposto que o Supremo Tribunal de
Justiça partiu (…)”;
— Não obstante o arguido ter suscitado a questão da prescrição
antes do trânsito, “Com o trânsito em julgado da decisão condenatória, já não
estamos perante urna situação de apreciação de procedimento criminal mas sim perante uma
apreciação dos efeitos e execução da pena e, inclusive, surgem novos prazos de prescrição,
conforme se verifica dos arts. 118.º a 121.º e art. 122.º a 126.º do CP” e “fica afastada a
possibilidade do Tribunal conhecer de questões atinentes ao procedimento criminal ou
nulidades do processo”.

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2.2. DA QUESTÃO DE DIREITO


2.2.1. Conforme jurisprudência consolidada pelo Acórdão do
Plenário das secções do S.T.J. de 19OUT1995 [In D.R., I.ª Série -A de
28DEZ1995. ], é nas conclusões da motivação que se delimita, se fixa
o objecto do recurso, o qual pode restringir-se a questões
específicas, revestidas de alguma autonomia decisória – art. 403.º
n.ºs 1 e 2, e art. 412.º, ambos do Código do Processo Penal –, sem
prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso,
designadamente, a verificação da existência, ou não, dos vícios
elencados no n.º 2, do art. 410.º, do Código de Processo Penal.
2.2.2. O objecto do presente recurso delimitado pelas respectivas
conclusões acima indicadas prende-se no seu “núcleo duro” com
o seguinte:
§ Saber se deve ou não determinar-se que a 1.ª instância conheça
da excepção de prescrição do procedimento criminal contra o
arguido/recorrente?
*
Se a resposta a esta questão for afirmativa todas as demais
questões suscitadas mostram-se prejudicadas.
*
O arguido I…, com demais sinais nos autos, desavindo o
despacho proferido pela Senhora Juíza no âmbito do Traslado N,
datado de 28SET2011, certificado a fls. 1 e cuja cópia se mostra
junta a fls. 2 a 7 (constante de fls. 12933 e ss. dos autos de
Processo Comum Colectivo n.º 712/00.9JFLSB), veio interpor o
recurso apresentando a sua motivação recursória junta a fls. 8 a
26 (fls. 13142-13160), aduzido teses argumentativas tendentes a
demonstrar causas de pedir [Com cinquenta e três conclusões.] que, a seu
ver, apontam no sentido de que a decisão impugnada na
interpretação seguida terá violado direitos fundamentais com
tutela na nossa Lei Fundamental e em legislação convencional
internacional, bem como a nossa lei penal substantiva e adjectiva
positivada, que, tendo em mente o pedido formulado a fls. 26 (fls.
13160) [“(…) se determine que o Tribunal de 1ª instância conheça da questão da prescrição tempestivamente
colocada pelo arguido, em cumprimento do douto Acórdão do STJ de 13.07.2011, consignando-se que tal conhecimento
não será, como não pode ser, afectado pelo trânsito em julgado de qualquer Acórdão do Tribunal Constitucional incidente

, já acima
sobre normas, alheias a tal questão, que foram oportunamente objecto de impugnação”.]

transcrito, na sua verdadeira essência se reconduzem a saber se


deve ou não determinar-se que a 1.ª instância conheça da
excepção de prescrição do procedimento criminal contra o
arguido/recorrente?
Como acima referimos se a resposta a esta questão for positiva
todas as demais questões suscitadas mostram-se prejudicadas.
*
Salvo o devido respeito por opinião em contrário, desde já
adiantamos que tem razão o recorrente quanto ao núcleo duro da
questão que coloca à apreciação deste Tribunal.

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Isto é, indo direito ao assunto: o Tribunal a quo podia e devia ter


apreciado a questão da prescrição oportunamente suscitada pelo
arguido / recorrente.
Antes de expormos o porquê desta afirmação, considerando a
globalidade da motivação recursória apresentada pelo
arguido/recorrente essencial se torna fazer uma abordagem
necessariamente breve à problemática da prescrição com
incidência no objecto do presente recurso delimitado pelas
conclusões.
*

BREVE ABORDAGEM À PROBLEMÁTICA DA


PRESCRIÇÃO COM INCIDÊNCIA NO OBJECTO DO
PRESENTE RECURSO
No Estado Democrático de Direito, é dever estatal e, portanto, do
Poder Judicial, conferir a devida eficiência ao Direito Penal, para
que possa desenvolver com plenitude a sua missão fundamental
de protecção social.
Há, ao lado do direito fundamental do arguido de se ver julgado
em prazo razoável, um direito fundamental da sociedade de obter
o resultado deste julgamento em prazo que não torne inócua a
tutela penal dos bens jurídicos que a incriminação da conduta
almeja salvaguardar. A prescrição penal, resultante da demora
na persecução penal.
O fenómeno prescritivo apresenta idiossincrasias e consequências
negativas: a impunidade, a selectividade da justiça penal, a
violação do princípio da igualdade e, com particular relevo, a
insuficiência na protecção e garantia de direitos fundamentais
diante das ameaças e lesões decorrentes de condutas tipificadas
na lei como crime.

BECCARIA [BECCARIA, Cesare, Dos Delitos e das Penas. Trad. Flório de Angelis.
Bauru-SP: EDIPRO, 2000. p. 59.] na sua obra clássica Dos Delitos e das
Penas, tece considerações sobre a necessidade de agilidade da
aplicação da pena:
“Quanto mais rápida for a aplicação da pena e mais de perto seguir o delito, tanto mais justa
e útil ela será. Mais justa, porque poupará ao acusado os cruéis tormentos da incerteza,
tormentos supérfluos, cujo horror aumenta para ele na razão da força de imaginação e do
sentimento de fraqueza.”

Está consignado nessa expressão o duplo aspecto desta


contingência necessária do processo penal, ou seja, a de conferir
utilidade e justiça à tutela penal, aspectos que interessam, com
igual intensidade, tanto ao arguido como à sociedade.
A situação do arguido que se vê indiciado e processado por
longos anos é aflitiva, pois o próprio processo contempla em si
uma pena processual severa, e muito mais a daquele que deve
responder ao processo em situação de prisão preventiva.

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No dizer de BECCARIA [Ob. cit., p. 59]


“[A] rapidez do julgamento é justa ainda porque a perda da liberdade sendo já uma pena, esta
só deve preceder a condenação na estrita medida que a necessidade o exige”.

Não obstante constitua uma verdade apodíctica que a sociedade é


também titular do direito ao processo penal no prazo razoável,
convém reafirmar esta premissa que muitas vezes é esquecida em
nome de uma racionalidade apenas parcial do alcance do Direito
fundamental ao curso do processo penal em prazo razoável.
Temos aqui que admitir duas ordens de titularidade do direito à
duração razoável do processo: a primeira, bem delimitada nos
seus contornos e lavrada pela doutrina respeita ao direito
fundamental daquele que sofre os efeitos da persecução penal (o
arguido); a segunda, que, destaca do jus persecutio in juditio, a
titularidade emprestada pelo pacto social ao Estado, encontra na
essência e na origem do referido direito a titularidade da
sociedade, atribuindo a esta, com igual consistência normativa, o
direito fundamental ao desfecho do processo penal em tempo
razoável.
A sociedade é a principal interessada na eficácia da resposta
penal às condutas tidas por inconvenientes no âmbito da
convivência comunitária.
Na verdade, se bem vemos, afigura-se-nos que não se mostra
razoável sustentar que o titular originário do jus puniendi (a
sociedade) não dispõe de meios eficazes de exercer este direito em
relação ao Estado-Ministério Público [In casu após um inquérito que
perdurou mais de 6 anos e uma acusação anulada, o arguido I… foi acusado em 2007.] ou
ao Estado-Juiz e que a demora do processo penal, com a
consequente impunidade, é irrelevante à sociedade e somente
interessa às partes formais do processo.
Com efeito, se bem vemos, a sociedade assume sempre a condição
de vítima de qualquer tipo legal de crime, mas, ao mesmo tempo,
tem interesse no resultado da actuação estatal espelhada na tutela
jurisdicional penal, enquanto conjunto de pessoas entre as quais
se encontram os possíveis autores de futuros tipos legais de crime,
convertendo-se, neste sentido, em destinatária da mensagem
dissuasória que procura transmitir por meio da pena.
A pena aplicada ao cometimento de um tipo legal de crime
apresenta um fim de resposta positiva do direito penal à
sociedade.
Parece, portanto, fora de qualquer dúvida metódica que a
tramitação célere do processo penal, para possibilitar a sua
aplicação e execução, representa um interesse relevante do grupo
social.
Este direito fundamental, da titularidade do arguido e da
sociedade, é uma afirmação deduzida de uma proposição já
demonstrada do dever punitivo do Estado em relação aos

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infractores da lei penal, a quem não é conferido apenas o direito,


mas também o dever de punir, que se desdobra na actuação
efectiva e eficaz de todos os agentes públicos implicados na
persecução penal: autoridades policiais, Ministério Público e
Magistratura Judicial.
BECCARIA [ BECCARIA, ob. cit., p. 60.], em lição antiga, mas sempre
actual, realça o aspecto preventivo positivo, no seio da sociedade,
da agilidade da aplicação da pena, asseverando que:
“[Q]uanto menos tempo decorrer entre o delito e a pena, tanto mais os espíritos ficarão
compenetrados da ideia de que não há crimes sem castigo; tanto mais se habituarão a
considerar o crime como causa da qual o castigo é o efeito necessário inseparável.”

Podemos pois concluir que a demora do processo penal, além dos


funestos prejuízos para o arguido, abala a eficiência do Direito
Penal, na medida em que frustra os seus principais objectivos,
comprometendo a legitimidade social e a credibilidade do Poder
Judicial ao disseminar um senso de descrédito na actuação da
justiça penal.
O dever de protecção jurídico-penal impõe ao Tribunal criminal
a prestação de uma tutela judicial efectiva, consistente na
apreciação da causa em tempo hábil e razoável.
***
Praticado o ilícito penal, nasce para o Estado, em nome da
sociedade, o direito de punir o infractor. Este direito tem o seu
exercício condicionado no tempo. Se dentro de certo lapso
temporal, que varia em razão da pena máxima abstractamente
prevista para o crime ou da pena concretamente aplicada na
sentença, o Estado não exercer sua pretensão punitiva ou
executória, ocorre a prescrição, que é a perda do direito de punir
ou executar a pena aplicada.
Não cabe nesta sede aprofundar a discussão teórica sobre a
natureza jurídica da prescrição, se instituto de direito material,
de direito processual ou misto.
Nenhuma das correntes, summo rigore, fica imune à crítica.
Prepondera, no entanto, até pelo aspecto topográfico do instituto,
que está, na sua essência, disciplinado no Código Penal, a posição
que sustenta a natureza jurídico-material. Afinal, a prescrição,
embora comporte algum matiz processual, pois que obsta a
propositura e o desenvolvimento da acção, extingue o direito
punitivo do Estado – e não apenas o direito de acção –,
devendo-se a nosso ver considerá-la instituto de direito material.
Na verdade, se bem vemos, trata-se de instituto de direito
material, embora algumas de suas consequências influam sobre a
acção penal e a condenação.
O instituto da prescrição funda-se no princípio da segurança
jurídica e traduz instrumento jurídico destinado a reforçar o
aspecto preventivo da pena e a evitar a eternização do clamor

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social em relação à prática delituosa, é a prescrição


imprescindível ao Direito Penal de todos os Estados Democráticos
de Direito, sendo admitida desde o berço das instituições
jurídicas e assim exercida pelos povos antigos, com relevo
especial entre os romanos, que conheciam as duas espécies de
prescrição (da acção penal e da pena).
Mais relevante do que o aspecto do “esquecimento” e da
“expiação”, vale destacar, a “perspectiva funcional” do instituto
da prescrição, enquanto instrumento tendente a evitar que a pena
seja utilizada com fins distorcidos do seu mais importante
desiderato, que é o “preventivo”. Se o decurso de tempo não
permite que se consagre este fim, passa a pena a ser
desnecessária, pois que assume uma feição meramente
retributiva, incompatível com os ideais do Estado Democrático de
Direito e com o seu valor supremo que é a dignidade da pessoa
humana.
Como expressa FIGUEIREDO DIAS [DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito
Penal Português: as consequências jurídicas do crime, Coimbra Editora: Coimbra, 2005, p.
699. ]:
“Por outro lado, e com maior importância, as exigências de prevenção especial, porventura
muito fortes logo a seguir o cometimento do facto, tornam-se progressivamente sem sentido e
podem mesmo falhar completamente os seus objectivos: quem fosse sentenciado por um facto
há muito tempo cometido e mesmo porventura esquecido, ou quem sofresse a execução de
uma reacção criminal há muito tempo já ditada, correria o sério risco de ser sujeito a uma
sanção que não cumpriria quaisquer finalidades de socialização ou segurança. Finalmente, e
sobretudo, o instituto da prescrição justifica-se do ponto de vista da prevenção geral positiva:
o decurso de um largo período sobre a prática de um crime ou sobre o decretamento de uma
sanção não executada faz com que não possa falar-se de uma estabilização contrafáctica das
expectativas comunitárias, já apaziguadas ou definitivamente frustradas.”

A prescrição penal tal como nós a entendemos é um instituto que


se vincula directamente ao direito fundamental ao prazo razoável
do processo [O n.º 2 do art. 32.º da Constituição da República (C.R.P.) expressa “(…)
devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”, E o n.º 5 do
art. 20.º dispõe (…) de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou
violações desses direitos” [direitos, liberdades e garantias pessoais],
constitucionalmente reconhecido no nosso sistema. Pese embora
não se possa equiparar os prazos prescricionais de extinção da
pretensão punitiva / executória e os prazos que se pode
considerar razoáveis à tramitação do processo, que devem ser
mais exíguos, o fundamento é o mesmo: o decurso de tempo.
*
A prescrição, vale lembrar, é matéria de ordem pública e
interesse social, portanto, a qualquer tempo e grau de jurisdição,
deve ser declarada, inclusive ex officio, se bem que num Tribunal
Superior, como o Tribunal de Relação, deve ter-se presente que,
como regra, qualquer decisão que encerre “questão nova” não
pode ferir um grau de jurisdição e a mesma deve ser tomada,
livremente, pelo Tribunal de 1.ª instância, pois caso contrário tal
decisão transforma-se em decisão insindicável (cf. art. 32.º, n.º 1

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da C.R.P.).
***
Não pretendemos lançar dúvida sobre a importância do instituto
da prescrição, fundado no princípio da segurança jurídica, como
instrumento jurídico destinado a evitar a eternização dos
conflitos. Não pode pairar sobre o arguido a ameaça ad
perpetuam do poder repressivo estatal.
Como assinalou VON LISTZ [ VON LISTZ, Franz, Tratado de Derecho Penal,
Tradução de Jiménez de Asúa, 20.ª ed. alemã, 2. ed. Madrid, 1929, v. 3. p. 40]:
“Os efeitos da pena, quando a execução é distanciada da prática do ato punível, estariam, por
certo, malogrados, pela completa desproporção com as dificuldades e incertezas que
ofereceria a verificação do fato, e com a perturbadora intromissão nas novas relações
originadas, e já consolidadas.”

Inegável também a importância da prescrição como instrumento


de política criminal destinada a reforçar o aspecto preventivo da
pena e impedir a eternização do clamor social em relação à
prática delituosa. O tempo parece apagar todas as feridas,
individuais ou sociais.
Os principais fundamentos da prescrição, tais como a teoria do
esquecimento, a presunção de boa conduta e a ineficácia da pena
tardia, esmorecem diante de nova prática delituosa [habituais,
arguidos que ostentem condenações transitadas em julgado,
reincidência apenas afecta à prescrição da pretensão executória].
Se o agente não permite que a sociedade esqueça o seu acto
criminoso, praticando outro logo a seguir, que reaviva o anterior
na consciência social, não parece razoável sustentar-se o
desinteresse estatal na punição.
Quando se trata dos efeitos do tempo no processo penal,
olvidando que a demora neste tipo de processo sempre traz
impunidade, prejuízo social e total desprestígio para a justiça,
apenas se examina a questão do ponto de vista da esfera dos
direitos do arguido e, geralmente, enquanto arguido em situação
de prisão preventiva, porque, de contrário, o atraso passa a
interessar à esmagadora maioria dos arguidos.
Embora o estudo da problemática do tempo no processo penal na
perspectiva do prejuízos dos direitos do arguido, acabem, em
rigor, por se reflectir na sociedade como um todo, seja mesmo o
mais relevante – principalmente na irrefutável visão garantista
de consagração dos direitos fundamentais –, não é admissível que
se olvide a melhor doutrina sobre o factor “tempo no processo
penal” como instrumento de impunidade e insegurança social.
***
Estará a prescrição, com a incidência ocorrente no sistema
judiciário penal português, em sentido contrário à visão
funcionalista do Direito Penal, na linha de ROXIN [ ROXIN, Claus,
Política Criminal y Sistema del derecho penal, Tradução e introdução de Francisco Muñoz
Conde, Barcelona: Bosch, 1972; Funcionalismo e imputação objetiva no Direito Penal.

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Tradução de Luís Greco, Rio de Janeiro: Renovar, 2002.] e JAKOBS [JAKOBS,


Günther, Derecho Penal: parte general – fundamentos y teoría de la imputación. Trad.
Joaquim Cuello Contreras e Jose Luiz Serrano Gonzales de Murillo, Madrid: Marcial
Pons, 1995. ]?
A Teoria Funcional do Direito Penal, embora comporte
discussões em relação ao alcance e adaptação ao nosso sistema
penal, parece ter impregnado de forma definitiva, quase que
como uma metodologia universalizada a afectar principalmente a
teoria geral do crime e da pena, o ideário do direito penal
moderno, até mesmo enquanto solução para o problema da falta
de efectividade da tutela penal protectiva de bens jurídicos
relevantes. A sua racionalidade consiste numa visão sistemático-
teleológico-valorativa, e não mais lógico-objectiva ou causal, do
Direito Penal, que tende ter seus institutos orientados por
finalidades absorvidas da sociologia e da política criminal, a
comprometer todo o contexto da dogmática e o conjunto das
decisões judiciais no campo penal. Enquanto alicerçado em
postulados sociológicos e de política criminal, o funcionalismo
encontra seu principal fundamento de validade na perspectiva de
conferir efectividade às aspirações de um grupo social num dado
momento histórico, que exige afirmação da própria norma e das
respostas penais respectivas diante das infracções às regras de
convivência social (problemas sociais ou ameaças à estabilidade
social), no funcionalismo normativista puro de JAKOBS.
O instituto da prescrição, à luz das perspectivas sociológicas e de
política criminal, está plenamente fundamentado. Hipóteses
haverá em que não se justifica perante a estrutura social e o
sistema penal a punição do infractor das regras de convivência
social. É o caso do tempo passado entre o facto tido por delituoso e
a oportunidade da repreensão, que faz empalidecer a própria
funcionalidade da pena. Deixa a pena de servir aos seus
desideratos relevantes de prevenção geral positiva, passando a
constituir mera vingança, e, para além deste aspecto, o risco de
desacerto e injustiça de uma condenação cresce
consideravelmente na proporção directa do tempo transcorrido.
Analisando o instituto da prescrição na perspectiva funcionalista
de ROXIN E JAKOBS, podemos dizer que, o fundamento
primário da prescrição está inserido na Constituição da
República, orientada pelos postulados do Estado Democrático de
Direito, notadamente no que se refere à dignidade da pessoa
humana, inserindo-se no sistema penal como instituto de política
criminal. Quando reconhecemos essa base constitucional à
prescrição, tem-se em consideração que o Estado garantista
tutela o ius libertatis do cidadão, em desprestígio do exercício da
acção penal ou da aplicação de uma pena contra aquele,
denominado pela doutrina clássica como ius puniendi, em razão
da ausência de motivos de prevenção geral positiva que

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acarretassem ao final na aplicação de uma pena. Com isso se


quer dizer que, ainda que violada a norma penal, não se
consubstancia por parte do Estado e da sociedade qualquer
dúvida acerca da motivação ou confiança de que a norma é capaz
de solucionar o conflito in abstracto, ou de que deve a norma ser
cumprida pelos demais, até mesmo pelo convencimento de sua
qualidade e propriedades, mantendo-se reforçada essa convicção
e a solidariedade social.
Ora, a nosso ver, aplicando-se a contrario sensu uma pena ao
arrepio dos postulados preventivos gerais positivos, implica dizer
que essa pena é desnecessária, e, assim sendo reconhecida, a
mesma atenta contra a dignidade da pessoa humana e à ordem
democrática, servindo então a prescrição como instituto
garantista contra o abuso do próprio Estado em executar uma
pena na situação descrita.
Assim, assentamos a ideia de que doutrina funcionalista até certo
ponto explica o instituto da prescrição acenando com a
desnecessidade da pena enquanto resposta à estrutura social.
Na visão sociológica de JAKOBS, verifica-se que o instituto da
prescrição, tal como ora disciplinado, é incompatível com as
aspirações sociais, pois, ao neutralizar as demais normas penais
punitivas, gera a incerteza de aplicação a norma penal. Se a ideia
de que as normas penais, diante da prescrição, remanescem para
incidência em outros casos, é verdadeira a partir de uma análise
do instituto em si mesmo, deixa de sê-lo, todavia, quando se
constata que a prescrição, em razão da exiguidade dos prazos de
reconhecimento, das antinomias e idiossincrasias do sistema
penal, passa a ocorrer num número considerável de casos.
Para a corrente funcionalista roxianiana, que assenta na ideia de
uma política criminal alicerçada em postulados sistemático-
valorativos, as antinomias evidenciam-se com maior intensidade.
A ruptura da coerência sistemática frustrando as linhas traçadas
pela política criminal do Estado fica patente quando se examina a
estatística e constata-se que a prescrição ocorre em considerável
percentagem de casos, parecendo desnudar a eficiência e eficácia
social do Direito Penal.
***
Neste campo que ora nos ocupa a advocacia precisa estar ciente
do seu indispensável papel de auxiliar nas questões da
administração da justiça enfocar a questão da demora do
processo penal enquanto problemática complexa cuja solução
demanda a cooperação activa de todos os operadores judiciários.
Necessário se torna criar uma cultura de agilização, eliminando
as práticas dilatórias e tratando o processo como um instrumento
ético de pacificação social, que, portanto, precisa ter um curso
abreviado.

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O chamado “terrorismo processual-penal” é a nosso ver mais


grave do que a demora do processo penal.
Assim, o ideal almejado pressupõe uma ponderação, um
equilíbrio entre a necessidade de racionalizar o direito e o
processo penal, pondo fim à impunidade e à não menos imperiosa
necessidade de preservar as garantias e os direitos fundamentais
do arguido.
Afigura-se-nos que o sistema de justiça criminal e o garantismo
penal, enquanto instrumentos de garantia dos direitos
fundamentais, diante da ocorrência patológica de prescrição
penal, necessitam ser readequados às inspirações de um órgão
legiferante que confira a efectiva segurança diante dos riscos que
ameaçam a sociedade moderna.
É consabido, que o arguido mais bem aquinhoado
economicamente recebe a assistência, invariavelmente, de uma
defesa técnica que lança mão de todos os meios defensivos.
Nenhuma crítica a esta amplitude defensiva, quando não ingressa
no perigoso e ilegal campo da protelação e da chicana — o que é
muito comum —. Há a incidência quase que elitista do fenómeno
prescritivo penal.

***

À luz do exposto entremos no cerne do objecto do presente


recurso.
Analisada a decisão impugnada verificamos que a mesma no que
tange ao não conhecimento da prescrição do procedimento
criminal quanto à fraude fiscal de 2001 e 2002 se alicerça no
seguinte:
(i) “A decisão condenatória já se encontra transitada em julgado, entendendo-se como tal a
insusceptibilidade de instaurar qualquer recurso ordinário”;
(ii) O caso julgado formado pelo Acórdão do S.T.J. datado de
13JUL2011 impõe à 1.ª instância “conhecer da prescrição do procedimento
criminal suscitada pelo arguida (…) se e enquanto não transitasse em julgado a decisão
condenatória (…) Ou seja, deixou de subsistir o pressuposto que o Supremo Tribunal de
Justiça partiu (…)”;
(iii) Não obstante o arguido ter suscitado a questão da prescrição
antes do trânsito, “Com o trânsito em julgado da decisão condenatória, já não
estamos perante urna situação de apreciação de procedimento criminal mas sim perante uma
apreciação dos efeitos e execução da pena e, inclusive, surgem novos prazos de prescrição,
conforme se verifica dos arts. 118.º a 121.º e art. 122.º a 126.º do CP” e “fica afastada a
possibilidade do Tribunal conhecer de questões atinentes ao procedimento criminal ou
nulidades do processo”.
*
Como resulta das ocorrências relevantes acima fixadas, e a
própria decisão impugnada reconhece “(…) o arguido suscitou a questão da
prescrição antes da decisão condenatória transitar em julgado”. Porém, é consabido
que a prescrição ocorre pelo simples lapso de tempo,
independentemente de qualquer outra condição e, diferentemente

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do que sucede no direito civil — em que deve ser excepcionada


pelo interessado — é a autoridade judiciária que deve invocá-la
ex officio em qualquer momento ou fase do processo.
Ora, memo de acordo com a teoria mista, a prescrição do crime é
uma causa pessoal de anulação do crime (ausência da necessidade
da pena) que, num prisma penal adjectivo se configura como um
obstáculo processual.
In casu emerge das ocorrências processuais acima descritas que
efectivamente assiste razão ao arguido / recorrente quando aduz
que a decisão impugnada incorre em erro acerca dos pressupostos
de facto, pois na data da prolação do despacho em crise
efectivamente não existia decisão penal final condenatória
transitada em julgado.
Na verdade, salvo o devido respeito por opinião em contrário, a
decisão impugnada parte a nosso ver do errado pressuposto de
que o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13JUL2010,
que condenou o arguido no cumprimento de uma pena única de
prisão efectiva de 2 (dois) anos, já transitou em julgado.
Ora, como resulta da certidão junta aos autos em 30SET2011
pelo arguido I…, ora recorrente, encontrava-se pendente junto
do Tribunal Constitucional recurso de constitucionalidade que
incide sobre o referido Acórdão do Tribunal da Relação de
Lisboa.
Tal recurso reporta-se ao segmento daquele Acórdão que
confirmou o indeferimento da requerida intervenção do Tribunal
de Júri no julgamento de todos crimes imputados ao arguido.
Deste modo facilmente se enxerga que o que se discute naquele
recurso é a própria competência do Tribunal Colectivo para
proceder ao julgamento dos crimes imputados ao arguido, ora
recorrente.
Nesta linha de pensamento, estamos perante questão processual
com virtualidade bastante para invalidar a decisão condenatória
proferida, face os efeitos da decisão do Tribunal Constitucional
legalmente previstos no art. 80.º, n.ºs 1, 2, 3, e maxime o n.º 4, da
Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
Ora, se bem vemos, estando pendente recurso atinente à
competência do Tribunal Colectivo, a inexistência de caso julgado
formal quanto à mesma obsta à formação de caso julgado
material quanto à decisão condenatória, que, consequentemente,
na data de 28SET2011 não transitou em julgado.
Salvo o devido respeito por opinião em contrário, não colhe a
afirmação plasmada na decisão impugnada, de que dos autos
consta certidão (emitida por um mero funcionário judicial) [Como
bem decidiu o Acórdão do S.T.J. de 19FEV2004 (Lopes Pinto), Proc. n.º61/04, “I- O que
transita em julgado é a decisão, não o documento que certifica ter ocorrido o trânsito. II- Uma decisão não transita em
julgado pelo facto de a certidão passada pelo funcionário judicial o dizer.”
Disponível em:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814

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/8b5de18b1237d7ca80256e4c005b2d49?OpenDocument] “de fls. 223 a 235 do presente translado o


Acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional já transitou em julgada (em 12.09.2011) e
assim consequentemente se encontra definitiva a decisão condenatória, isto é, a decisão
condenatória já se encontra transitada em julgado, entendendo-se como tal a
insusceptibilidade de instaurar recurso ordinário”.

Quanto a nós, salvo o devido respeito por opinião em contrário,


da nota de trânsito da decisão do Tribunal Constitucional que
confirmou a irrecorribilidade da decisão do Tribunal da Relação
de Lisboa para o Supremo Tribunal de Justiça não decorre o
trânsito em julgado da decisão condenatória face o disposto nos
arts. 75.º, n.º 2, e 80.º, nºs 1, 2, 3 e 4, da L.T.C..
Com efeito, se bem vemos, o despacho que admitiu o recurso para
o Tribunal constitucional (quanto ao indeferimento do Júri)
determinou a subida imediata dos autos ao Tribunal
Constitucional para apreciação do mesmo sem aguardar pelo
trânsito do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que
rejeitou o recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
interposto para aquele Supremo Tribunal (com fundamento na
irrecorribilidade da decisão penal condenatória).
A respeito do prazo para a interposição do recurso de
constitucionalidade, em situações como a dos autos, dispõe o art.
75.º, n.º 2, da LTC, o seguinte: “Interposto recurso ordinário, (…),
que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da
decisão, o prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional
conta-se do momento em que se torna definitiva a decisão que não
admite recurso.”.
Deste modo, face ao aludido normativo, o prazo para a
interposição do recurso para o Tribunal Constitucional que
incidia sobre o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de
13JUL2010 (que manteve o indeferimento do Júri) apenas se
conta a partir do momento em que a decisão do Supremo
Tribunal de Justiça (que não admitiu o recurso da parte penal
para aquele Tribunal com fundamento em irrecorribilidade dessa
parte da decisão) se tornar definitiva, isto é, transitou em
julgado.
Esta direcção tem agasalho no art. 80.º n.º 4, LTC:
“Transitada em julgado a decisão [do Tribunal Constitucional] que não admita o recurso ou
lhe negue provimento, transita também a decisão recorrida, se estiverem esgotados os
recursos ordinários, ou começam a correr os prazos para estes recursos, no caso contrário.”
In casu, se a aludida decisão do Supremo Tribunal de Justiça foi
objecto de recurso para o Tribunal Constitucional, e se a decisão
sumária que apreciou tal recurso só transitou em 14SET2011,
summo rigore, o prazo de 10 (dez) dias que refere o art. 75.º da
L.T.C. para o arguido interpor recurso para o Tribunal
Constitucional que incida sobre o aludido Acórdão da Relação de
Lisboa, apenas se iniciou em 14SET2011, ou seja, após o trânsito
em julgado da decisão que rejeitou o recurso ordinário interposto

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e rejeitado para o Supremo Tribunal de Justiça.


Esta interpretação que levamos a efeito dos arts. 75.º, n.º 2, e 80.º,
n.º 4, da LTC, brota dos preceitos em causa, e vem sendo
Jurisprudência unânime do nosso Tribunal Constitucional.
Com efeito, é consabido que o recurso de constitucionalidade
(tendo como objecto as normas aplicadas) incide sobre decisões
judiciais que não sejam susceptíveis de recurso ordinário.
Na verdade, dispõe o art. 70.º, n.º 2, da LTC, que: “Os recursos previstos
nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de decisões que não admitam recurso
ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso
cabiam, salvo os destinados a uniformização de jurisprudência.”.
Como realça o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 228/2005:
“(…)apenas [podem] ser sindicadas pelo Tribunal Constitucional, como órgão jurisdicional
de fiscalização concentrada de constitucionalidade, as decisões jurisdicionais que constituam
a palavra definitiva dessas ordens desses tribunais nos casos em que estes se tenham
pronunciado pela conformidade da norma questionada com a Constituição e os princípios
nela consignados”.
Por outra banda, apresenta-se como verdadeiro requisito de
admissibilidade do recurso “o esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70º, nº
2, da L.T.C.)” [Cf. neste sentido Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 296/201,
disponível em www.tribunalconstitucional.pt.].
Na verdade, “(…) só se pode recorrer das decisões que já constituam decisão definitiva
na ordem jurisdicional de onde provêm” (Acs. do Tribunal Constitucional n.ºs
97/85, 21/87).
A esta Luz, tendo presente a Jurisprudência uniforme do
Tribunal Constitucional, não sendo definitiva (até 13SET2011) a
decisão que se pronunciou no sentido da irrecorribilidade do
Acórdão Tribunal da Relação de Lisboa para o Supremo
Tribunal de Justiça, só após o trânsito, em 14SET2011, do
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que rejeitou o recurso
ordinário interposto para o Supremo Tribunal de Justiça,
incidente sobre a parte penal, é que se iniciou a contagem do
prazo de 10 (dez) dias para a interposição de recurso de
constitucionalidade relativo àquele mesmo Acórdão da Relação
de Lisboa.
Assim sendo, salvo o devido respeito por opinião em contrário,
falece a razão ao Tribunal a quo quando quer fazer equivaler o
trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça,
que não conheceu sequer o recurso penal que incidia sobre o
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, ao trânsito em
julgado desde último Acórdão, uma vez que o mesmo foi objecto
de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, o qual
foi admitido, com efeito suspensivo.
Contudo, afigura-se-nos que mesmo que ao referido recurso
enviado para o Tribunal Constitucional tivesse sido atribuído
efeito meramente devolutivo a decisão condenatória não passaria
a definitiva sem que o recurso pendente no Tribunal
Constitucional fosse julgado, ou sem que fosse conhecida a

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prescrição invocada antes do esgotamento dos recursos


ordinários (ou de constitucionalidade) e das reclamações sobre a
decisão condenatória.
Assim, salvo o devido respeito por opinião em contrário, em face
das ocorrências acima descritas e do que anteriormente dito fica,
o despacho impugnado de 29SET2011 que não conheceu a
questão suscitada da prescrição, partiu do pressuposto que a
decisão condenatória nessa data já havia transitado em julgado,
quando tal não corresponde à verdade, pela singela razão de que
a mesma cai em erro quanto a pressuposto de facto, não se
verificando, por isso, qualquer omissão da pronúncia prevista no
art. 379.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal.
Na verdade, em 29SET2011, se bem vemos, a única decisão
condenatória penal existente, é o Acórdão do Tribunal da
Relação de Lisboa proferido em 13JUL2010, exactamente o que
alterou a condenação do arguido de 7 (sete) para 2 (dois) anos de
prisão efectiva. Ora, essa decisão não transitará enquanto
estiverem pendentes recursos ordinários, instaurados durante a
pendência do processo, que possam contender com a subsistência
dessa decisão condenatória.
É verdade que o recurso do Tribunal do Júri, inicialmente (na 1ª
instância), foi admitido com efeito meramente devolutivo. Esse
recurso foi, juntamente com outros recursos interlocutórios,
conhecido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no Acórdão
proferido em 13JUL2010.
Assim, apresentado cautelarmente o recurso para o Tribunal
Constitucional (o que aconteceu aos 10SET2010), o arguido
apresentou de seguida recurso para o Supremo Tribunal de
Justiça.
Contudo, como se veio a verificar, o Supremo Tribunal de Justiça
não chegou a conhecer o objecto penal do recurso, ou seja, não se
pronunciou sobre o mérito da causa ou da condenação penal; daí,
salvo o devido respeito por opinião em contrário, não poder
considerar-se como sendo "A" decisão condenatória penal.
Do mesmo modo, a decisão sumária proferida pelo Tribunal
Constitucional em 12JUL2011, que transitou em julgado,
também não conheceu o mérito da causa penal, pois versou
apenas sobre a questão da recorribilidade do acórdão do
Tribunal da Relação de Lisboa para o Supremo Tribunal de
Justiça. Quer isto dizer que a nota de trânsito proveniente do
Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça se
reporta unicamente a este segmento do processo [à questão do
(não) conhecimento do recurso do arguido pelo Supremo
Tribunal de Justiça e às inconstitucionalidades arguidas quanto a
este (não) conhecimento].
Em face de tudo que até agora dito fica, facilmente se enxerga

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que a decisão recorrida ao afirmar a existência de caso julgado


impeditiva do conhecimento da excepção de prescrição
oportunamente deduzida pelo arguido partiu do pressuposto
errado de que a decisão condenatória penal (que é a do Tribunal
da Relação de Lisboa) havia transitado em julgado.
A propósito da suscitação da prescrição do procedimento
criminal tendo o seu não conhecimento sido suscitado durante a
pendência do processo (isto é: antes do trânsito e, portanto, da
possível entrada em cumprimento de pena), salvo o devido
respeito por opinião em contrário, afigura-se-nos que não podia o
Tribunal a quo recusar o seu conhecimento – mesmo que isso não
lhe tivesse sido expressamente determinado (como foi) pelo
Supremo Tribunal de Justiça. Na verdade, se bem vemos, a
simples e atempada invocação da prescrição sempre obstaria à
exequibilidade da decisão condenatória.
Assim, quando a decisão impugnada parte do equivocado
pressuposto de que existia trânsito em julgado, por desconhecer a
existência do recurso pendente no Tribunal Constitucional sobre
o indeferimento do Tribunal do Júri, incorreu a mesma em erro
acerca dos pressupostos de facto e, por via disso, pôs em crise os
arts. 677.º, 671.º, n.º 1, 672.º, e 497.º, todos do Código de Processo
Civil, aplicáveis ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal, e arts.
69.º e 80.º, n.º 4, da L.T.C..
*
Por tudo o que exposto fica, o presente recurso, vai a bom porto,
mostrando-se prejudicado o conhecimento das demais questões
suscitadas pelo arguido/recorrente.
*
3. DISPOSITIVO
Perante tudo o que exposto fica, acordam os juízes que compõem
a 3.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:
& Em julgar provido o recurso, e consequentemente, revoga-se a
decisão recorrida que deverá ser substituída por outra que
conheça da questão da prescrição tempestivamente colocada pelo
arguido em cumprimento do Acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça datado de 13JUL2011, consignando-se que tal
conhecimento não será afectado pelo trânsito em julgado de
qualquer Acórdão do Tribunal Constitucional incidente sobre
normas alheias a tal questão, que foram oportunamente objecto
de impugnação.
& Em declarar que não é devida tributação.
*
Lisboa, 14DEZ2011 (processado e revisto pelo primeiro
signatário, que rubrica as restantes folhas)

______________________

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(Rui Gonçalves)

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(Conceição Gonçalves)

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