“Mesmo na Europa, a ideia e a instituição dos direitos humanos não existiam na época
pré-moderna. O que existia eram direitos ou privilégios específicos realizados por
membros de grupos específicos, como a nobreza e o clero. Os direitos e privilégios constantes na Magna Carta são bons exemplos. Eles podem ser caracterizados como uma espécie de precursor dos direitos humanos. Entretanto, eles não eram direitos humanos per se. Os direitos cujas características associavam-se aos indivíduos absorvidos por um determinado grupo específico nasceram somente depois que os corps intermédiaires foram dissolvidos na formação de Estados soberanos e na criação de economias capitalistas [...]. Cada civilização tinha seus próprios mecanismos para buscar o bem-estar espiritual e material da humanidade. Mas, no momento pré-moderno, esses mecanismos não foram caracterizados como direitos humanos. Nenhum desses mecanismos eram direitos humanos por si só. Eles eram, para usar a charmosa terminologia de Raimundo Pannikar, o ‘equivalente funcional’ dos direitos humanos ” (ONUMA, p. 246)
A historicidade dos direitos humanos, intimamente vinculados ao desenvolvimento
do capitalismo, de fato nos impele à uma concepção estritamente ocidental, que se reflete num discurso e prática de direitos humanos ocidentocêntrico. Em verdade, os próprios marcos epistemológicos que conformam a conceituação daquilo que é humano, enquanto um reflexo do contexto colonial de constituição das identidades, já limitam o sujeito de tais direitos específicos à uma classe específica.
Embora essa constituição primeira seja um obstáculo à efetiva universalização dos
Direitos Humanos, deve ser levada em consideração. Apenas assim será possível conceber as particularidades de cada lugar que, afastado das narrativas ocidentais, enfrenta com estranheza os direitos humanos. Para isso é necessário ressignifica-los, alterando seus marcos fundantes, questionando, inicialmente, aquilo que lhes é evidente.