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E s c o l a B á s i c a e S ec u n d á r i a D i o g o B er n a r d e s

Ano Lectivo 2009/2010

Materiais de Apoio | 12.º ano | Português | Felizmente Há Luar!

I. A fábula histórica

Tempo dramático – 1817 (século XIX) Tempo da escrita – 1961 (século XX)
• Agitação social que levou à revolta • Agitação social dos anos 60, que levou à
liberal de 1820: Revolução de 25 de Abril:

- Conspirações internas; - Conspirações internas, «golpes


palacianos»;
- Revolta contra a presença da Corte no
Brasil e contra a situação de «colónia» do - Revolta contra a guerra colonial, que teve
país; início em Angola (1961);

- Contestação à influência inglesa no - Movimentos de contestação política e


governo e no exército; social (greves, revolta estudantil);

- Movimentos de revolta, ligados às lojas - Protestos dos militantes comunistas e


maçónicas e aos estrangeirados. antifascistas, exigindo eleições livres e
democráticas.

• Regime absolutista e tirânico: • Regime ditatorial de Salazar:

- A estranha ligação entre o poder político - A amizade entre Oliveira Salazar e o


(D. Miguel, Beresford) e a Igreja (Principal Cardeal Cerejeira, e a defesa intransigente
Sousa); dos valores da Pátria, Família e Fé;

- A perseguição a todos os que denunciam a - A Censura, a perseguição política aos


hipocrisia, a violência, a injustiça, o contestatários do Poder (PIDE), a falta de
obscurantismo, a falta de escrúpulos do liberdade de opinião e de expressão, o
Poder, e apelam à justiça e à liberdade; exílio;

- A censura, a repressão severa dos - A parcialidade da Justiça (prisão, medidas


conspiradores, os processos sumários, a de repressão, tortura, condenações sem
pena de morte; provas);

- As redes de denunciantes, traidores e - As redes de conspiradores e denunciantes


conspiradores que compactuam com o («bufos») que actuam na sombra.
Poder.

• Os conflitos sociais: • Conflitos sociais:

- Classes dominantes motivadas por - Classes privilegiadas e exploradoras, com


interesses mesquinhos e pelo medo de reforço do seu poder;
perder privilégios;
- Povo reprimido e explorado, condenado à
- Povo oprimido e resignado à miséria, ao miséria, ao medo, ao analfabetismo.
medo, à ignorância.

• A execução do general Gomes Freire • O assassinato do general Humberto


Delgado, por elementos da PIDE

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II. Simbologia do título

A frase «felizmente há luar» é proferida por duas personagens de mundos diferentes:


- D. Miguel, símbolo do Poder (Acto II, 131);
- Matilde, símbolo da resistência à tirania (Acto II, 140).

Luar

- Para D. Miguel, o luar permitirá que o clarão da fogueira atemorize todos os que querem lutar pela liberdade,
confirmando assim o efeito dissuasor e exemplar das execuções perante aqueles que ousassem desafiar a
autoridade dos Governadores (a noite é mais assustadora, as chamas poderiam ser vistas em toda a cidade, o
luar convidaria toda a gente a assistir ao castigo).

- Para Matilde, o luar sublinhará a intensidade do fogo, que simboliza a coragem e a força de um homem que
morreu pela liberdade e, por isso, se torna símbolo do esclarecimento e da revolta contra a tirania (anúncio da
revolução liberal / 25 de Abril?).

- A lua, porque privada de luz própria e sujeita a fases, representa a periodicidade e a renovação, a
transformação. Ela é também o símbolo da passagem da morte para a vida (durante três noites em cada ciclo
lunar desaparece, para voltar a surgir).

Fogo

- A fogueira acaba por ter um carácter redentor, simbolizando a purificação, a morte da «velha ordem», a vida e
o conhecimento. O fogo traduz a chama que se mantém viva e a fé na liberdade que há-se chegar («Julguei
que isto era o fim e afinal é o princípio. Aquela fogueira, António, há-de incendiar esta terra!», 140).

- Na perspectiva dos Governadores, o fogo traduz a destruição, o castigo de todas as tentativas de rebelião do
povo em prol da liberdade.

Luz / noite

- A luz traduz a caminhada da sociedade em direcção à liberdade, vencendo o medo e a insegurança da noite,
recusando a violência e a repressão.

- A noite (escuridão, trevas), por contraste, representaria a morte, a repressão, a violência, o castigo, o
obscurantismo, a conspiração.

III. O carácter apoteótico e trágico

A dimensão trágica

A obra de Sttau Monteiro, pela reflexão que faz sobre o destino do homem, enquanto membro de uma sociedade, sujeito
às suas normas e valores, lembra a tragédia clássica, nomeadamente, pelos elementos seguintes:

- O carácter excepcional das personagens:


 Gomes Freire, pela coragem, determinação e defesa intransigente dos ideais de justiça e liberdade;
 Matilde, pela nobreza moral, pela grandeza dos seus sentimentos e pela progressiva consciencialização
do seu dever de verdadeira patriota.

- A simplicidade da acção e o despojamento cénico.

- O desenlace trágico: o martírio e morte de Gomes de Freire.

A dimensão apoteótica

- O clima apoteótico da obra é recriado através da fogueira onde Gomes de Freire é martirizado que, em vez de
ser dissuasora, torna-se inspiração para que outros lutem pela liberdade:
Matilde: Olhem bem! Limpem os olhos no clarão daquela fogueira e abram as almas ao que ela nos
ensina! Até a noite foi feita para que a vísseis até ao fim... (140)

- Assim, o sacrifício do general é também uma homenagem à sua heróica defesa da liberdade, um símbolo de
esperança para o povo oprimido e um apelo à transformação da sociedade (o ambiente mágico e espectral

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que a execução recria garante uma interpretação simbólica da noite, a traduzir a opressão, a violência, o
obscurantismo, e da luz, como representação do esclarecimento, da liberdade de expressão e opinião):

Matilde: Julguei que isto era o fim e afinal é o princípio. Aquela fogueira, António, há-de incendiar esta
terra! (140)

- No final, o espectador percebe que os acontecimentos a que assistiu são de todos os tempos, pois é o próprio
homem que está em causa e a obra torna-se, assim, épica.

IV. O teatro épico (inspiração em Bertolt Brecht)

A obra de Sttau Monteiro, à semelhança do que acontece com a de outros escritores, como Bernardo
Santareno (O Judeu) e José Cardoso Pires (O render dos heróis), aparece nitidamente influenciada por linhas
dramáticas inovadoras, não só pelo suporte histórico da intriga, mas também pela relação que pretende
estabelecer com o espectador, que deve assumir um papel testemunhal e crítico face aos acontecimentos
apresentados em palco, para mais lucidamente intervir e transformar a sociedade em que está inserido.

A fábula histórica

- Sttau Monteiro recupera acontecimentos que marcam o início do século XIX, para servirem de denúncia da
situação social e política do país dos anos 60 do século XX, em plena ditadura salazarista. Assim, as primeiras
manifestações sociais e políticas, que levaram à revolução liberal de 1820, servem também como denúncia da
miséria, da opressão e da injustiça que dominam o Portugal da década de sessenta. O martírio de Gomes
Freire é também o do general Humberto Delgado, silenciado pelo regime, porque símbolo do protesto e do
inconformismo face à ditadura. Ao evocar situações e personagens do passado, o autor tem um pretexto para
falar do presente.

- A revolta dos mais esclarecidos, muitas vezes organizados em sociedades secretas (lojas maçónicas), contra
o poder absolutista e tirânico dos Governadores, que culminará na morte de Gomes Freire, herói que reclama
o direito do povo à dignidade e à indignação contra os poderosos, é também o apelo à revolta dos militantes
antifascistas que puseram em causa o Estado Novo.

- A obra exprime, assim, a revolta contra o Poder e a convicção de que é necessário mostrar o mundo e o
homem em constante devir. Defende as capacidades do homem que tem o direito e o dever de transformar o
mundo em que vive.

- Esta forma de teatro também denuncia um dos dramas da criação literária durante o Estado Novo: a censura.

Análise crítica da sociedade

- Ao mostrar a realidade, em vez de a representar, o drama épico leva o espectador a reagir criticamente e a
tomar posição. Este, enquanto elemento de uma sociedade, assume a sua posição testemunhal,
interpretando, reflectindo e julgando os acontecimentos apresentados.

- O espectador pode, assim, analisar e julgar o homem no seu devir histórico, na sua situação social, podendo
modificar-se e modificar o curso da história.

A técnica da distanciação

- À semelhança de Brecht, Sttau Monteiro propõe um afastamento do espectador perante a história narrada,
para que, de forma mais autêntica, possa emitir juízos críticos sobre a realidade apresentada em palco. Ao
contrário do teatro clássico, o drama épico não procura criar um efeito hipnótico sobre o espectador,
inspirando-lhe emoções e sentimentos, como o terror e a piedade (catarse), mas antes torná-lo uma voz activa
no julgamento da própria sociedade em que se insere.

- A identificação com o herói desperta emoções, transporta o espectador para o universo fictício do palco, mas
prejudica a visão crítica do público, tornando-o incapaz de uma análise objectiva da acção. A exposição em
palco de formas erradas ou alienadas de vida levarão o espectador a descobrir a sua situação no mundo e a
encontrar formas de combater as injustiças sociais.
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A função pedagógica

- O teatro assume, assim, uma finalidade pedagógica, já que move o espectador a intervir lúcida e criticamente
sobre a realidade social em que vive, incita-o a actuar e alerta-o para a condição humana, de modo a que se
aperceba de todas as formas de injustiça e opressão.

A intemporalidade da obra

- Fazendo a ligação entre dois momentos históricos (séculos XIX e XX), a intemporalidade da obra remete para
a luta de sempre do ser humano contra a tirania, a opressão, a traição, a injustiça e todas as formas de
perseguição. Felizmente há luar! põe em destaque a preocupação do homem com o seu destino, em luta
contra a miséria e a alienação, denunciando a ausência de moral e de liberdade... O homem é, assim,
colocado perante o desafio de se conhecer e de conhecer o mundo em que se insere («Todos somos
chamados, pelo menos uma vez, a desempenhar um papel que nos supera. É nesse momento que
justificamos o resto da vida, perdida no desempenho de pequenos papéis indignos do que somos.» 89)

Estratégias para a criação de um teatro épico

- O efeito de distanciação entre a realidade apresentada em palco e o espectador, para garantir a capacidade
de observação crítica deste, é conseguido através de vários recursos cénicos, como as didascálias, as
personagens e o cenário.

- As didascálias apresentam uma orientação precisa de leitura, claramente subjectiva, sugerindo ao


espectador/leitor a construção de sentidos que ultrapassam o gozo estético e literário da obra. O dramaturgo
convida o espectador/leitor a assumir uma atitude empenhadamente crítica e distanciada face aos
acontecimentos que lhe são apresentados:

 O público tem de entender, logo de entrada, que tudo o que se vai passar em palco tem um significado
preciso. Mais: que os gestos, as palavras e o cenário são apenas elementos duma linguagem a que
tem de adaptar-se. (15)

 Pretende-se criar desde já, no público, a consciência de que ninguém, no decorrer da peça, vai
esboçar um gesto para o cativar ou para acamaradar com ele. (O réu não se senta ao lado dos juízes.)
(16)

- As personagens desdobram-se em várias «personalidades» ou assumem várias «máscaras», o que impede a


integridade, a consistência ou coerência dos seus gestos e valores, mas também a própria identificação do
espectador com essas personagens ou figuras fictícias. Veja-se, por exemplo, a simulação de Vicente, que
recusa a sua origem humilde e revela as suas mesquinhas ambições (27), e a de Manuel, que representa
simultaneamente o papel de mendigo e de fidalgo petulante (78-79).

- O próprio cenário, despojado e pobre em recursos cénicos, evita que o espectador se deixe envolver com os
dramas apresentados e interprete toda a organização cénica como simbólica: as cadeiras (opulência e
autoridade dos governantes) contrastam com as ruas (miséria e opressão do povo, sempre vigiado pela
polícia).

V. PERSONAGENS DRAMÁTICAS

1. Os Revolucionários

GOMES FREIRE DE ANDRADE

• É um homem instruído, letrado, um «estrangeirado», símbolo da integridade de carácter, da recusa


da tirania em defesa dos ideais de justiça e liberdade (137). É também o símbolo da modernidade e
do progresso, já que adepto das novas ideias liberais;

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• A sua mitificação pelo povo, que vê nele a personificação do esclarecimento, do inconformismo
corajoso e da esperança na luta contra a repressão e o terror (20, 24, 34), vai torná-lo num homem
incómodo, subversivo e perigoso para o poder instituído;

• É assumido como uma ameaça à autoridade dos Governadores, gerando ódios e desejos
mesquinhos de vingança (21-22, 71), seja pela sua lúcida integridade moral, seja pela sua argúcia
excepcional de militar, ou até mesmo pela admiração incontestável que lhe dedica o povo;

• Inteligente, lúcido, capaz de ver para além da hipocrisia dos poderosos (95), mas humilde e
discreto, já que nunca se serviu do seu estatuto para influenciar o povo (87);

• A prova da sua inocência está na imagem que dele dá Matilde: uma conduta moral irrepreensível
(83), uma coragem inabalável que o faz lutar até à morte (132), o seu sacrifício injusto, como o de
Cristo (122, 130).

MATILDE

• Amante, esposa e «companheira de todas as horas» do general, exprime romanticamente o amor


(85, 132) que a faz acreditar no sentido da sua vida (92) e a ajuda a manter a esperança de o
marido conseguir vencer a vilania da morte a que foi sujeito;

• É o símbolo da sensibilidade feminina, que se revela no desespero da perda (97, 116, 130), no
sofrimento de quem ama e se vê despojado do ser que o completa (120). O seu grito alucinado de
desespero representa a necessidade de reaver o homem que o destino tornou seu (94);

• Reage violentamente perante o ódio e as injustiças, desmascarando o interesse mesquinho, a


hipocrisia, a traição, a manipulação perversa do Poder (93, 94, 95). Revela uma inteligência subtil e
uma grande capacidade de argumentação, capaz de desarmar os falsos valores dos governantes
(124-126);

• Corajosa, assume-se como a voz da consciência dos governantes (88), obrigando-os a enfrentar os
seus actos de cobardia (118, 128-129). O seu discurso final é uma resposta provocatória à
violência da sociedade e um anúncio de esperança numa nova era (136-137);

• Profundamente humana (101), luta sempre pelos ideais que aprendeu a defender junto do marido,
sejam eles o da sinceridade, o da caridade, ou o da revolta e da indignação perante a prepotência
dos poderosos (90-92), destacando-se pela sua excepcionalidade num mundo de ganância e
hipocrisia (85).

ANTÓNIO DE SOUSA FALCÃO

• Símbolo da impotência perante o despotismo dos Governadores (86);

• A sua lealdade a Gomes Freire e Matilde é revelada na profunda admiração (89), no apoio
incondicional que lhes dedica (115), acompanhando a esposa do general na angustiosa tentativa
de o libertar (116-117), não poupando elogios à conduta do homem corajoso com quem partilhara
sonhos e ideais (110, 136-137);

• O seu sentido crítico fá-lo duvidar da justiça dos governantes e revoltar-se contra a indignidade do
tratamento dado ao general, durante a sua prisão (111-112);

• Perante o exemplo de coragem do general, chega a reconhecer a sua cobardia e a inutilidade da


sua luta (136-137), embora não se contenha e chegue mesmo a pôr em risco a sua vida ao insultar
D. Miguel (119);

• O destino do amigo fá-lo encontrar-se consigo próprio, a «rever-se por dentro», o que altera a sua
concepção do mundo e das coisas (89, 137).

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2. Os Governadores

Os três elementos que compõem o Conselho de Regência representam o poder político e


todas as suas manipulações para manter uma autoridade continuamente ameaçada, porque
ilegítima. São eles os chefes da conspiração, pois escolhem alguém que «valha a pena crucificar»,
mesmo sem provas concretas. Embora se aproximem no carácter vil e mesquinho, cada um deles
simboliza diferentes interesses e invoca diferentes razões para a morte de Gomes Freire (42).

D. MIGUEL FORJAZ

• É o protótipo do pequeno tirano, inseguro e arrogante, simbolizando a decadência do país que


governa, minado pela hipocrisia e pela mesquinhez. O seu espírito decrépito e caduco impede o
progresso, já que acredita fanaticamente na manutenção de um governo absolutista e numa
sociedade perfeitamente estratificada (69);

• De carácter megalómano e prepotente, revela o seu calculismo político, a sua ambição desmedida
e um egoísmo arrogante, no exercício do Poder (60-61, 65-66);

• Desprovido de integridade moral e corrupto, personifica a injustiça, a traição, aliada à vingança


(43), pois vê na popular figura do primo uma ameaça ao seu prestígio e poder, condenando-o sem
escrúpulos (70-71);

• Frio, desumano, é a «personificação da mediocridade consciente e rancorosa» (71-72, 116-117). A


sua crueldade revela-se perante a execução de Gomes Freire, que será exemplo para os que
ousem desafiá-lo (131).

PRINCIPAL SOUSA

• Representa o poder eclesiástico dogmático, fanático, persecutório e repressivo (69), que se deixa
corromper, aliando-se perversamente aos interesses políticos (36-37, 64-65);

• De carácter mesquinho e vingativo, diz odiar os franceses, os principais responsáveis pelo clima de
revolta que agita o reino (39-40), e justifica a condenação de Gomes Freire por um desagravo
cometido sobre um familiar (68, 72), embora tente dissimulá-la sob a forma de um acto de defesa
do reino, apenas para manter a sua consciência tranquila (40, 67, 74);

• A sua cobardia impede-o de manter uma discussão séria com Beresford, embora não esconda a
sua animosidade pelo inglês (41, 59);

• Hipócrita, o seu discurso religioso é continuamente deturpado em função dos seus interesses (36),
e recorre a um tom falsamente paternalista e compreensivo (38,121), embora a sua falsidade e
infâmia sejam desmascaradas por Matilde (122-123).

BERESFORD

• Representa o poder calculista e o interesse material, que fazem dele um mercenário astuto e
arrogante (58, 59);

• De carácter trocista e mordaz, não esconde o seu desprezo pelo país onde é obrigado a viver, não
desperdiçando qualquer oportunidade para ridicularizar a sua pequenez e provincianismo (55-57) e
até para provocar Principal Sousa de forma irónica, porque representante de um catolicismo
caduco (41, 54);

• Reconhecendo ser alvo do desprezo do povo, procura a todo o custo salvaguardar o seu posto de
militar, participando activamente no processo de condenação do homem que poria em risco a sua
carreira, o seu prestígio e os seus privilégios (63-64). Embora sorria da corrupção generalizada que
domina o país, serve-se da denúncia para manter o seu estatuto (44, 68-69);

• O seu cinismo e a sua arrogante crueldade revelam-se na humilhação a que sujeita Matilde,
quando esta lhe pede a vida do marido (93-94, 99).

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3. Os Delatores

VICENTE

• Símbolo da falsidade, da ambição e do oportunismo (103), defende o valor do dinheiro e do poder


como forma de ascender socialmente (25), ainda que o faça pela traição e pela denúncia (30-32).
Hipócrita, tenta dissimular a indignidade dos seus actos através do serviço a el-rei e à Pátria (39);

• Servil e materialista, procura, através da astúcia e da adulação, conquistar a simpatia dos


Governadores, mesmo que tenha de trair os da sua classe (34, 38);

• A imoralidade e mesquinhez do seu carácter insinuam-se no seu discurso demagógico e


provocador, que revela a sua revolta e desprezo por uma classe na qual se recusa a inserir (26-27).
É um homem frustrado por ter nascido pobre e movido pela inveja e pelo ressentimento;

• Reveste-se de um falso humanismo e de uma solidariedade duvidosa para fomentar a ira popular
contra Gomes Freire (21-22).

ANDRADE CORVO / MORAIS SARMENTO

• Tal como Vicente, representam o grupo dos delatores, que colaboram com o regime, visando o
lucro pessoal (44, 47). A falta de escrúpulos e de valores éticos (43), a ganância e a preguiça
justificam a denúncia do general e a traição aos valores que defendem, nomeadamente os ideais
maçónicos e o seu pretenso patriotismo (46, 48-50);

• O seu carácter cobarde enuncia-se no modo como se apresentam perante os Governadores,


«embuçados», e a adulação é também a forma usada para cair nas graças dos poderosos (64).

4. O Povo

MANUEL

• «O mais consciente dos populares» é também a voz da denúncia crítica continuamente silenciada
(16), da ironia abafada pela repressão contínua das forças policiais (77);

• Representa metaforicamente o povo português condenado a uma existência ignóbil, coexistindo


com a miséria, a fome, a opressão, desanimado e impotente para alterar o seu destino (16, 78,
105-106);

• O conformismo é a alternativa possível perante um governo decadente e fútil, que garante a sua
autoridade através do medo e da violência (105-109). O cansaço de sobreviver num mundo onde a
vida é um vazio é alternado com a profunda consciência das desigualdades sociais e um tocante
respeito pela dor alheia (108-109).

RITA

• A solidariedade para com Matilde é marcante (104), pois como mulher compreende a perda
irremediável do amor e da família (82-83). É com comoção que a beija, depois de lhe entregar a
moeda, símbolo da sua cumplicidade (110).

ANTIGO SOLDADO

• A identidade anónima confirma a simbologia da sua personagem: reconstrói o percurso militar de


Gomes Freire, lembrando o valor da luta pela liberdade, mas é também a representação do
desprezo a que o regime vota os homens que se sacrificam nos seus exércitos (22);

• Também ele personifica o desalento, o pessimismo e a decepção do povo que vê adiada a


possibilidade de mudança com a prisão do general (80).

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VI. ESPAÇO

Espaço cénico

- O espaço cénico contribui para a construção de sentidos da obra, expondo a dimensão


ideológica da mesma. Os sons, os jogos de luz/sombra, os objectos decorativos e a posição das
personagens em palco são os elementos a destacar.

- Manuel, situado num espaço cénico dominado pela escuridão, é subitamente exposto à luz,
ocupando um lugar à frente do palco. O carácter simbólico da sua presença é posto em
evidência através dos seguintes aspectos:

• Manuel, enquanto símbolo do povo oprimido, traduz a estagnação de um país, a


impossibilidade de mudança, pela repressão imposta pelo Poder, através da sua
pergunta absurda, do gesto de impotência e dos trajes andrajosos que veste;

• A escuridão que rodeia a personagem sugere o abismo que a engole, enquanto


representação da miséria, da ignorância e da opressão;

• A nível da movimentação, a impossibilidade de continuar, por parte da


personagem («detém-se»), indicia a perda irremediável do general Gomes
Freire e, em consequência, a perda da esperança.

Espaço físico

- Lisboa surge como um macroespaço, onde se inscrevem espaços de dimensão mais reduzida:

• Ruas – local onde os populares mendigam e comentam os acontecimentos,


embora sempre intimidados pela presença da polícia
• Rossio – sede da Regência
• Rato – casa do general
• Sé – local onde Manuel costuma pedir esmola
• Campo de Sant’Ana – local das execuções (posteriormente será designado por
Campo dos Mártires da Pátria)
• Serra de Santo António – local de onde Matilde assiste à execução do marido
• S. Julião da Barra – local onde Gomes Freire é preso e sentenciado

Espaço social

Classes sociais: Povo / Poderosos

- O povo é caracterizado pela sua pobreza, doença e miséria: o vestuário andrajoso, os sacos e
caixotes que servem de acomodações, o contínuo mendigar;

- Os poderosos, pelo contrário, surgem representados na sua riqueza ostensiva e arrogante


(guarda-roupa cuidado, cadeiras como «tronos»).

Conflitos políticos / sociais

- No período posterior às Invasões Francesas e à partida da corte para o Brasil, o reino vive uma
conjuntura política e social marcada pela crise e pela luta entre um poder repressivo e a
aspiração da liberdade que conduzirá à revolução liberal:

• O Conselho de Regência, que integrava oficiais ingleses e membros do clero,


mantém uma política de tirania, repressão e perseguição de todos os que se
insurgissem contra o poder oficial;

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• A atitude persecutória dos Governadores é particularmente evidente na
condenação e proibição das sociedades maçónicas e de qualquer tipo de
associação;

• O povo, descontente, votado à miséria e ao silêncio, mas desejoso de liberdade,


confere ao general Gomes Freire o estatuto de herói, já que representa a única
esperança de revolta contra a opressão.

Valores sociais em crise

- A impotência do povo contra o despotismo

• Manuel, o homem do povo, reflecte a sua incapacidade para resistir ao sistema,


através da interrogação que abre os dois actos («Que posso eu fazer?», 15 e
77).

- A recusa do progresso e da cultura

• Principal Sousa clarifica as directrizes de um regime absolutista, em que cultura


é sinónimo de Poder e, por isso, deve ser mantida inacessível às massas
populares («...a sabedoria é tão perigosa como a ignorância! (...) Sei bem como
a palavra “liberdade”, na boca dos demagogos, se torna aliciante ...» 36; «Por
essas aldeias fora é cada vez maior o número dos que só pensam aprender a
ler... Dizem-me que se fala abertamente em guilhotinas e que o povo canta
pelas ruas canções subversivas.» 40).

- A corrupção, a imoralidade e a injustiça dos políticos

• D. Miguel põe em destaque a corrupção que garante a autoridade do Poder («A


questão que temos de resolver (...) Consiste apenas em chegarmos a acordo
acerca da pessoa que mais nos convém que tenha sido o chefe a conjura.» 61),
deixando também evidente que são os caprichos pessoais que motivam a
actuação política, ao serviço de interesses que se sobrepõem à verdade e à
justiça («Para o público não compreender o que se passa, o julgamento será
secreto, e para evitar o perdão de el-rei, a execução seguir-se-á imediatamente
à sentença.» 65).

- A ambição mesquinha e a conspiração

• Beresford mantém-se atento à defesa dos interesses do reino («Neste país de


intrigas e de traições, só se entendem uns com os outros para destruir um
inimigo comum...» 63), mas apenas por interesses materiais, não escondendo o
seu desprezo pelo país onde trabalha, já que «reduz os presentes, a cidade e o
país a uma insignificância provinciana e total» («Pretendo uma única coisa de
vós: que me pagueis – e bem!» 58).

- A traição, a conspiração generalizada

• A corrupção material e moral parece atingir todas as classes sociais, como se


depreende da traição de Vicente e de Andrade Corvo e Morais Sarmento («Se
eu souber render o peixe, sou capaz de acabar com uma capela... ou chefe de
polícia, quem sabe?» 31; «Meu amigo: você desconhece o que se compra de
respeitabilidade com uma pensão anual de 800$00...» 47).

- A condenação dos ideais maçónicos

• O ataque à Maçonaria, que para os Governadores era sinal de agitação e


revolução, surge identificado na intervenção de D. Miguel («...aí tendes o chefe
da revolta. Notai que lhe não falta nada: é lúcido, é inteligente, é idolatrado pelo
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povo, é um soldado brilhante, é grão-mestre da Maçonaria e é, senhores, um
estrangeirado...» 71) e de Principal Sousa («Os piores, Srs. Governantes, são
os pedreiros-livres... Ninguém mais do que eles contribui para o alastramento da
gangrena. Quem será o chefe da Maçonaria?» 67).

- Os caprichos pessoais dos poderosos contra a vontade do povo

• Os interesses de Estado não são os interesses do povo, mas das classes


privilegiadas («Pergunto-vos, senhores: que crédito, que honras, que posições
seriam as nossas, se ao povo fosse dado a escolher os seus chefes?» 69),
movidas pelas vinganças pessoais e pela ambição («Se eu fosse a falar do ódio
que lhe tenho...»; «Agora me lembro de que há anos, em Campo d’ Ourique,
Gomes Freire prejudicou muito a meu irmão Rodrigo!» 72);

• Matilde, a voz da indignação e do inconformismo, expõe de forma clara a


podridão de uma sociedade corrupta e mesquinha («Ensina-se-lhes que sejam
valentes, para um dia virem a ser julgados por covardes...»; «Não seria mais
humano, mais honesto, ensiná-los, de pequeninos, a viverem em paz com a
hipocrisia do mundo?» 83;«...rodeada de inimigos numa terra hostil a tudo o que
é grande, numa terra onde só cortam as árvores para que não façam sombra
aos arbustos...» 85).

Espaço psicológico

- As recordações de Matilde de uma felicidade passada ao lado de Gomes Freire remetem para o
carácter redentor e purificador do amor, em contraste com a violência e a hipocrisia da
sociedade (90-92).

VII. TEMPO

Tempo histórico

- Século XIX – período posterior às Invasões Francesas, que antecede as primeiras manifestações
de revolta popular, que conduzirá à Revolução Liberal;

- Século XX – regime ditatorial do Estado Novo, representado por Oliveira Salazar.

Tempo dramático

- 0s acontecimentos dramáticos remetem para a referência a factos ocorridos alguns anos antes:

• Manuel relembra as Invasões Francesas e a presença dos ingleses no governo (16)


• Vicente recorda a partida do rei para o Brasil (27)
• O antigo Soldado refere as batalhas ocorridas há dez anos (18)
• Matilde recorda a sua vida com o general e as batalhas em que participou pela Europa (90)

- As referências temporais situam em dois dias os acontecimentos mais dramáticos da obra,


embora historicamente tudo se tenha passado em cinco meses (Maio/Outubro). A redução
temporal traduz simbolicamente a parcialidade da justiça da época, que condena sem provas, e
contribui para a intensidade trágica da morte do general.

- O Acto I tem início de madrugada e prolonga-se por dois dias:

• «Eram quase cinco horas...» (17)


• «Há dois dias...» (50)
• «Há dois dias que quase não durmo...» (68)

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- O Acto II começa na manhã do dia em que prenderam o general e prolonga-se por seis dias:

• «Passaram toda a noite a prender gente...» (80)


• «Vem aí a madrugada...» (108)
• «Ah! Senhora, se o general estivesse esta noite aqui... » (108)
• «Amanhã, quando começarem a agradecer a Deus a prisão do general...» (109)
• «Depois de amanhã, senhora...» (109)
• «Esta madrugada prenderam Gomes Freire...» (79)
• «Desde aquela noite que só penso em si.» (104)
• «Só ao fim de seis dias lhe abonaram dinheiro para comer...» (111)
• «Há quatro dias que me não deito...» (130)
• «...hoje, 18 de Outubro de 1817.» (129)

- No Acto I, os acontecimentos precipitam-se até à prisão do general, embora no Acto II o tempo


flua lentamente, o que intensifica o dramático sofrimento de Matilde, que acompanha o sacrifício
do marido.

VIII. SÍMBOLOS

Luar

- Para D. Miguel, o luar permitirá que o clarão da fogueira atemorize todos os que querem lutar pela
liberdade, confirmando, assim, o efeito dissuasor e exemplar das execuções perante aqueles que
ousassem desafiar a autoridade dos Governadores (a noite é mais assustadora, as chamas
poderiam ser vistas em toda a cidade, o luar convidaria toda a gente a assistir ao castigo);

- Para Matilde, o luar sublinhará a intensidade do fogo, que simboliza a coragem e a força de um
homem que morreu pela liberdade e, por isso, se torna símbolo do esclarecimento e da revolta
contra a tirania (anúncio da revolução liberal / 25 de Abril?);

- A lua, porque privada de luz própria e sujeita a fases, representa a periodicidade e a renovação, a
transformação. Ela é também o símbolo da passagem da morte para a vida (durante três noites em
cada ciclo lunar desaparece, para voltar a surgir).

Fogo

- A fogueira acaba por ter um carácter redentor, simbolizando a purificação, a morte da «velha
ordem», a vida e o conhecimento. O fogo traduz a chama que se mantém viva e a fé na liberdade
que há-de chegar («Julguei que isto era o fim e afinal é o princípio. Aquela fogueira, António, há-de
incendiar esta terra!», 140);

- Na perspectiva dos Governadores, o fogo traduz a destruição, o castigo de todas as tentativas de


rebelião do povo em prol da liberdade.

Luz / noite

- A luz traduz a caminhada da sociedade em direcção à liberdade, vencendo o medo e a insegurança


da noite, recusando a violência e a repressão;

- A luz é a metáfora do conhecimento que permite o progresso da sociedade e a construção do


futuro, assente na defesa dos valores da liberdade, da igualdade e da fraternidade;

- A noite (escuridão, trevas) representa a morte, a repressão, a violência, o castigo, o obscurantismo,


a conspiração;

- A noite simboliza ainda o poder maldito e as injustiças dos Governadores («Como é que se pode
lutar contra a noite?» 116).

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Saia verde

- Símbolo de esperança na renovação, da superação da violência e da repressão, da defesa da


liberdade (fora comprada em Paris, foco dos ideais revolucionários liberais);

- Traduz o amor verdadeiro e redentor, capaz de conduzir a personagem a superar o seu estado de
revolta e a comunicar aos outros, apáticos e indiferentes, o futuro, a esperança;

- Sugere a tranquilidade e a felicidade do reencontro, embora numa outra dimensão, ou num futuro
diferente;

- Pela cor, simboliza ainda a fertilidade, a vida e a renovação da Natureza, que conduzem à noção
de imortalidade (a mensagem de liberdade do general poderá, afinal, tornar-se válida nos séculos
vindouros).

Moeda

- Simboliza a miséria, a pobreza de um povo que mendiga pela sobrevivência, pela dignidade, pelo
direito à vida e à liberdade;

- Traduz a traição, a corrupção, a submissão dos poderosos a interesses mesquinhos e materiais


(Matilde, quando a atira ao Principal Sousa, lembra a bíblica traição de Judas).

Tambores

- Símbolos da repressão militar e policial que desagrega e aniquila, traduzem a morte, a violência e a
intimidante perseguição a que o povo era sujeito para não pôr em causa a autoridade tirânica dos
Governadores, «sempre presente e sempre pronta a intervir»;

- Traduzem também a hipocrisia e a corrupção de todos os que traem para obter favores do regime,
como Vicente, «um provocador em vias de promoção» (21).

Sinos

- Traduzem o perverso envolvimento da Igreja nos assuntos do Estado, contribuindo para a


repressão imposta sobre o povo (anunciam a morte de Gomes Freire);

- Contribuem para a denúncia da deturpação da mensagem evangélica ao serviço de interesses


mesquinhos e materiais.

Cadeiras

- Descritas como «pesadas e ricas com aparência de tronos», simbolizam a opulência, o poder
tirânico e absolutista dos Governadores e a violência e caducidade do sistema monárquico.

Outros textos

- A referência feita pelo Principal Sousa ao Eclesiastes foi intencionalmente deturpada para justificar
a validade do poder real como resultado da vontade divina, anulando, assim, a vontade popular nas
decisões do Estado (36);

- A deturpação intencional do texto bíblico põe em destaque o poder manipulatório da Igreja, distante
da pureza original;

- Há referências à parábola dos trinta dinheiros, numa alusão à traição de Judas, equiparado a
Vicente e a todos os delatores, e ainda à que remete para o servo que tenciona servir a dois
senhores, numa clara denúncia da hipocrisia da Igreja e, por extensão, do Principal Sousa.

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IX. LINGUAGEM

Oralidade / ironia crítica

- A linguagem da obra é natural, viva, próxima do discurso oral (interrogações, exclamações,


vocabulário familiar e popular, orações coordenadas, construção sintáctica simples,
redundâncias e pleonasmos...) e tradutora das emoções das personagens (hesitação,
interrupção...), mas surge também dominada pela ironia e pelo sarcasmo.

Conflito poder / antipoder

- A linguagem traduz, assim, o conflito entre o poder e o antipoder:

• A linguagem dos representantes do Poder evidencia um sentido prático, utilitário


e material da vida. As falas são mais longas, excessivamente discursivas;

• A voz do contrapoder (Matilde, povo) ganha frequentemente um sentido poético,


expondo a afectividade e os dramas interiores das personagens. A ironia,
porém, funciona como denúncia da crítica, da hipocrisia e da violência dos que
representam o Poder;

• O discurso do autor/encenador é essencialmente valorativo, uma vez que


convida o espectador a assumir uma atitude crítica em relação aos factos
apresentados.

Nível lexical

- O léxico remetendo para o domínio político: reino, nobreza, povo, pátria, patriotas, política,
conspirações, revolta;
- O léxico de carácter religioso: rebanho, ovelhas, salvador, Senhor, Cristo, Deus, Dia do Juízo,
almas, condenação, divina.

X. ESTILO

- A confirmar a intencionalidade crítica da obra, é de salientar a importância do discurso das


personagens, que assume variadas funcionalidades:

• O estilo «salazarista» utilizado por D. Miguel, cuja tónica essencial é a defesa da


Pátria e dos ideais patrióticos. O tom didáctico empregue pela personagem
confirma a demagogia política das suas intervenções (49, 59);

• A retórica jesuítica usada pelo Principal Sousa deixa escapar o abuso da Igreja,
ao reivindicar como vontade divina aquilo que não passava de interesses de
ordem política (37, 40, 59);

• A ironia que marca o discurso mordaz de Beresford deixa perceber a diferença


cultural entre Portugal e Inglaterra (56, 57);

• O discurso dos populares é desolador e resignado, embora seja também irónico


e acusador (16, 78, 106);

• O tom de lamento usado por Matilde, perante a perda do seu «homem» e do


seu amor (90), dá lugar à contestação, à acusação mordaz (128-129) e à
profecia de um futuro regenerador (140);

• O uso do latim, que ocorre no momento da sentença e da execução, funciona


como denúncia de uma sociedade arcaica e regida por valores caducos e
estritamente vinculados a uma hierarquia social (98, 134).
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