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Responsabilidade civil

1 CONCEITOS BÁSICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil só aparece diante de uma ação ou omissão que cause algum
dano, pois é a obrigação do dever de reparar. Ela surge em face do descumprimento
obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por
deixar determinada pessoa de observar um preceito normativo que regula a vida.

Quanto à origem, a responsabilidade civil admite a seguinte classificação:


 Responsabilidade civil contratual ou negocial: dá-se em razão do
inadimplemento de uma obrigação (arts. 389, 390 e 391, CC). Trata-se de um
ato/negócio jurídico, pois se observa a norma do contrato.
 Responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana: decorre de um fato
jurídico (observa uma norma da sociedade) materializado em um ato ilícito.
Arts. 186 e 187, CC.

É possível o sancionamento corporal (prisão)? Não, somente em caso de pensão


alimentícia.
É possível a dívida recair sobre todo patrimônio? Não, pois existem os casos de
impenhorabilidade (art. 833, CPC) e o bem de família (Lei nº 8.009/90).

• A responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana se refere a duas práticas: ao ato


ilícito e ao abuso de direito (novidade do CC/02). O ato ilícito (art. 186) é um ato que
viola uma regra e causa um dano, que é o pressuposto para incidência da RC (art. 927).
É a prática de um comportamento que não está amparado pelo ordenamento jurídico.

• O ato ilícito em geral pode recair a responsabilidade para outras esferas. Por
exemplo, um acidente de veículo pode ter efeitos penais e administrativos. O art. 935
traz a ideia que as esferas são independentes. Isto significa dizer que se na penal não
houver a existência de crime, não significa que na civil será extinta também. Mas é
importante pontuar que quando houver existência de fato e autoria penal, não se
discute mais na esfera civil.
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• O abuso de direito (art. 187) é o uso de um poder, de uma faculdade, de um direito,


além do razoavelmente permitido pelo Direito e pela sociedade. É ser titular de um
direito e exceder manifestamente (a boa-fé, os bons costumes, fins sociais...).

Enunciados do Conselho da Justiça Federal


- 539 (“O abuso de direito é uma categoria jurídica autônoma em
relação à responsabilidade civil. Por isso, o exercício abusivo de
posições jurídicas desafia controle independentemente de dano”);
- 37 (“A responsabilidade civil decorrente do abuso do direito
independe de culpa e fundamenta-se somente no critério objetivo-
finalístico”);
- 414 (“A cláusula geral do art. 187 do Código Civil tem fundamento
constitucional nos princípios da solidariedade, devido processo legal
e proteção da confiança, e aplica-se a todos os ramos do direito”).

• Um exemplo de abuso de direito é a publicidade abusiva. O §2º do


art. 37 do CDC informa sobre a prática de condutas abusivas ao
consumidor. O TJ/SP já resolveu algumas questões nesse sentido
como: campanha publicitária que incita crianças (vulneráveis) a
jogarem os tênis velhos fora (a intenção de vender, excessivamente,
torna ilícita); a greve abusiva e a lide temerária (litigante de má-fé –
art. 79/80, CPC).

• É mais comum ocorrer no exercício de direito de propriedade. O


caso chaminé traz a intenção excessiva do proprietário de um imóvel
ao colocar uma chaminé do lado do vizinho com quem ele tem
desavenças. Prática excessiva do direito subjetivo. O SPAM
também é uma prática abusiva, pois é uma publicidade sem
solicitação, consentimento.

1.1 PRESSUPOSTOS
“Art. 927 – Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-
lo.”
Podem ser apontados quatro pressupostos do dever de indenizar:
 A conduta humana, que pode ser causada por uma ação ou omissão;
 A culpa genérica ou lato sensu, que abrange o dolo (violação intencional) e a
culpa estrita (imprudência, negligência e imperícia).
 O nexo de causalidade que constitui o elemento imaterial da responsabilidade
civil, constituindo a relação de causa e efeito entre a conduta culposa – ou o
risco criado – e o dano suportado por alguém.
 O dano que pode ser:
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- Material (atinge o patrimônio, podendo ser um dano emergente, o que


efetivamente se perdeu, ou lucros cessantes, o que razoavelmente
deixou de lucrar);
- Imaterial (lesão a direitos da personalidade – dano moral, à honra, à
imagem). Art. 5º, V, X, CRFB.
OBS.: quando se fala em “perdas e danos”, conforme o art. 402 do CC, refere-se
a dano em sentido lato, isto é, danos emergentes e lucros cessantes.

1.1.1 CONDUTA HUMANA


A conduta humana pode ser causada por uma ação ou omissão. A regra é ação
(conduta positiva). Então para a configuração da omissão é necessário que exista o
dever jurídico de praticar determinado ato (omissão genérica), bem como a prova de
que a conduta não foi praticada (omissão específica).

a) Responsabilidade do condomínio por furtos que ocorrem no seu interior – dever


de segurança. A jurisprudência tem entendido que só há responsabilidade civil do
condomínio pelo que ocorre em suas áreas comuns compartilhadas se estiver
expressamente previsto na convenção, configurando em uma omissão do dever de
segurança do condomínio. Ele somente responde quando há um comprometimento
com a segurança.

b) Responsabilidade por ato de terceiro.


- Art. 932, CC (responsabilidade objetiva – ainda que não haja culpa): a
responsabilidade das pessoas nesse rol independe de culpa (teoria do risco-criado),
sendo necessário provar somente a culpa daqueles pelos quais são responsáveis. Por
exemplo, a instituição hospitalar privada responde, na forma do art. 932, III, pelos atos
culposos praticados por médicos integrantes do seu corpo clínico.
- Art. 936, CC (custodiar objetos e animais): o detentor de animal ressarcirá o dano
causado por este a terceiros, exceto se for por culpa da vítima ou força maior.
- Art. 937, CC: trata-se de mais um caso de responsabilidade objetiva, respondendo o
dono de edifício, em razão de risco criado ou risco proveito, se o dano resultar de suas
ruínas por falta de reparos, cuja responsabilidade fosse manifesta.
- Art. 938, CC: responsabilidade civil objetiva por defenestramento (arremesso de
coisas). É objetiva pois não importa se o líquido ou o objeto tenha caído
acidentalmente, pois ninguém pode colocar em risco a segurança alheia. Nos casos de
cessão de prédio, não haverá solidariedade, respondendo somente o locatário ou o
comodante, a menos que exista coautoria.
Enunciado CJF 557 – “nos termos do art. 938, se a coisa cair ou for lançada de
condomínio, não sendo possível identificar de qual unidade, responderá o condomínio,
assegurado o direito ao regresso”.
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1.1.2 CULPA GENÉRICA LATO SENSU


a) Dolo – violação intencional do dever jurídico com o objetivo de prejudicar outrem.

b) Culpa estrita ou stricto sensu – desrespeito a um dever preexistente, não havendo


propriamente uma intenção de violar.
 Imprudência: falta de cuidado + ação (art. 186). Dirigir em alta velocidade.
 Negligência: falta de cuidado + omissão (art. 186). Não cuidar do cão que foge e
fere; e empresa que não treina o empregado para exercer determinada função.
 Imperícia: falta de qualificação ou treinamento para desemprenhar função (art.
951). Médico que faz cirurgia sem ter habilitação para tanto.

c) Elementos de culpa
- Culpa concorrente: a vítima contribui com o evento danoso e ato ilícito. É importante
avaliar a culpa concorrente, pois ela tem influencia para o “quantum” indenizatório.
Exemplo: acidente de veículo sem o pedestre estar na faixa de segurança.
Enunciado CJF 459 – “A conduta da vítima pode ser fator atenuante do nexo de
causalidade na RC objetiva”.

d) Responsabilidade objetiva da Administração Pública – principal exemplo: art. 37,


§6º, CF.
Art. 944 – culpa, extensão do dano.

e) Intensidade da culpa: padrão médio de conduta.


 Grave: erro grosseiro. O agente não queria o resultado, mas agiu com tamanha
culpa que parecia que o quisesse. Não liga os faróis à noite.
 Leve: sem a atenção devida. Ultrapassar o limite de velocidade.
 Levíssima: só teria sido evitado mediante o emprego de cautelas
extraordinárias.

1.1.3 NEXO DE CAUSALIDADE


É o vínculo que liga a conduta ao dano/prejuízo. Para que se concretize a
responsabilidade é indispensável se estabeleça uma interligação entre a ofensa à
norma e o prejuízo sofrido, de tal modo que se possa afirmar ter havido o dano porque
o agente procedeu contra o direito.

a) Teorias:
 Teoria da causalidade adequada (Von Kries): conforme esse pensamento,
somente o fato relevante ao evento danoso gera a responsabilidade civil,
devendo a indenização ser adequada aos fatos que a envolvem (arts. 944 e
945). Dano é efeito necessário de causa/conduta.
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 Teoria do dano imediato ou direto ou da interrupção do nexo de causalidade:


havendo violação do direito por parte do credor ou do terceiro, haverá
interrupção do nexo causal com a consequente irresponsabilidade do suposto
agente. Desse modo, somente devem ser reparados os danos que decorrem
como efeitos necessários da conduta do agente. Essa teoria foi adotada pelo
art. 403, sendo a prevalecente segundo parcela considerável da doutrina.
Devem ser reparados os danos provenientes da conduta.
Ambas a teorias são adotadas pelo STJ – consideram sinônimas.

1.1.4 DANO OU PREJUÍZO


Para que haja pagamento de indenização, além da prova de culpa ou dolo na conduta é
necessário comprovar o dano patrimonial ou extrapatrimonial suportado por alguém.
Em regra, não há responsabilidade civil sem dano, cabendo o ônus de sua prova ao
autor da demanda (art. 373, I, CPC – obs.: em alguns casos envolvendo relações de
consumo se admite a inversão do ônus da prova).
Súmula 37 STJ – possibilita a cumulação dupla dos danos (material e moral).
Súmula 387 STJ – cumulação tripla incentivando os novos danos (danos estéticos +
morais + materiais).
Danos clássicos – danos materiais e danos morais.
Danos novos – danos estéticos, danos morais coletivos, danos sociais e danos por
perda de uma chance.

a) Danos patrimoniais ou materiais: constituem prejuízos ou perdas que afetam o


patrimônio corpóreo de alguém. Não cabe reparação de dano eventual ou hipotético,
necessitam de provas efetivas (art. 186 e 403). O cálculo é a partir do valor do bem.
Conforme o art. 402, os danos materiais podem ser subclassificados:
 Danos emergentes ou danos positivos: o que efetivamente se perdeu.
Exemplo: estrago de automóvel em acidente de trânsito e art. 948.
 Lucros cessantes ou danos negativos: o que realmente se deixou de lucrar.
Exemplo: o taxista pode pedir os lucros cessantes em razão do tempo de
trabalho perdido após acidente de trânsito e art. 948, II.

I) Alimentos indenizatórios: art. 948 – a indenização no caso de homicídio. Tais


alimentos não podem ser confundidos com os do Direito de Família, sendo assim, não
cabendo prisão civil por não pagamento. É devida a indenização a título de lucros
cessantes aos dependentes do falecido, levando-se em conta a vida provável daquele
que faleceu (cálculo: obedecendo a expectativa de vida pelo IBGE – 74 anos).

b) Danos morais: constituem-se em lesão a direitos da personalidade. Tipo de


reparação nova no Brasil, tendo sido tornada pacífica com a CF de 88, conforme seu
art. 5º, V e X. Com a reparação não se requer o ressarcimento de um preço para o
sofrimento, mas sim um meio para atenuar as consequências do prejuízo imaterial. O
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dano moral não é visto como um acréscimo patrimonial, mas sim a compensação dos
males suportados.
Por isso possui um caráter compensatório e um caráter punitivo (pedagógico).
Nesse sentido, a Súmula 498 do STJ não permite a incidência do IR sobre os danos
morais.
Teoria do Punitive Damages ou Teoria do valor do desestímulo: essa teoria legitima o
juiz a majorar a indenização. A análise do caso concreto poderá implicar no caráter
punitivo-compensatório. Se o comportamento do agente for extremamente reprovável
é possível a majoração arbitrariamente pelo juiz em razão das circunstâncias graves do
fato.

Enunciados e jurisprudência relevantes:


• Enunciado 589 CJF: a compensação pecuniária não é o único modo de reparar o dano
extrapatrimonial, sendo admitida a reparação in natura, na forma de retração pública
ou outro meio (ex.: direito de resposta);
• Súmula 281 STJ: a indenização por dano moral não está sujeita à tarifação;
• Súmula 227 STJ: é possível que pessoa jurídica sofra dano moral. Atinge a sua honra
objetiva, tendo em vista que tem uma reputação perante a coletividade. É um exemplo
a inscrição indevida de seu nome no rol de inadimplentes;
• Enunciado 445 CJF: “O dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a
verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento.”
Possibilita dano moral à PJ, pois esta não possui sentimentos;
• Enunciado 560 CJF: “No plano patrimonial, a manifestação do dano reflexo ou por
ricochete não se restringe às hipóteses previstas no art. 948 do CC.”
• Enunciado 411 CJF: o descumprimento de contrato pode gerar dano moral quando
ofender valores fundamentais.
• Súmula 385 STJ: não cabe
• Súmula 387 STJ: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano
moral.”
• STJ REsp 1245550: cabe dano moral à absolutamente incapaz.
• STJ REsp 1292141: existência do dano moral in re ipsa, isto é, do dano presumido, o
qual não precisa de comprovação, como a inscrição indevida da pessoa no
SPC/SERASA.
• STJ REsp 1644405/RS: o simples fato de encontrar o corpo estranho no alimento, sem
levá-lo à boca, gera dano moral. Dano moral presumido.

As suas principais classificações são:


I) Quanto ao sentido da categoria:
- Dano moral em sentido próprio: constitui aquilo que a pessoa sente (dano
moral in natura), causando na pessoa dor, tristeza, vexame, humilhação,
amargura, sofrimento, angústia e depressão;
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- Dano moral em sentido impróprio ou em sentido amplo: constitui qualquer


lesão aos direitos da personalidade, como, por exemplo, à opção sexual.

II) Quanto à necessidade ou não de prova:


- Dano moral provado ou dano moral subjetivo: é aquele que necessita ser
provado pelo autor da demanda, ônus que lhe cabe;
- Dano moral objetivo ou presumido: não necessita de prova, como nos casos
de morte da pessoa, lesão estética, lesão a direito fundamental da CF ou uso
indevido de imagem para fins lucrativos (Súmula 403 STJ).

III) Quanto à pessoa atingida:


- Dano moral direto: atinge a própria pessoa, a sua honra subjetiva
(autoestima) ou objetiva (repercussão social da honra). Ex.: art. 953;
- Dano moral indireto ou em ricochete: atinge a pessoa de forma reflexa, como
a morte de um parente na família (art. 948), lesão à personalidade do morto
(art. 12) e perda de uma coisa de estima (art. 952). O dano atinge uma pessoa e
repercute em outra pessoa, como uma bala que ricocheteia.

• Tabelamento e critérios para a quantificação dos danos morais: existe uma corrente
que acredita na inconstitucionalidade de qualquer tarifa ou tabelamento dos danos
morais. Tornou-se comum a fixação em salários mínimos. O magistrado deve analisar
alguns critérios no momento da fixação, como: a extensão do dano; as condições
socioeconômicas e culturais dos envolvidos; as condições psicológicas das partes e o
grau de culpa do agente, do terceiro ou da vítima (arts. 944 e 945).

c) Danos estéticos: quando se fala em dano estético se quer significar a lesão à beleza
física. Basta a pessoa ter sofrido uma “transformação” para que seja caracterizado,
como as feridas, cicatrizes, cortes superficiais ou profundos, lesão ou perda de órgãos
internos ou externo, aleijões, entre outras anomalias.

• O STJ vem entendendo há tempos que o dano estético é diferente do dano moral,
pois há no primeiro uma “alteração morfológica de formação corporal que agride a
visão, causando desagrado e repulsa”. Já no dano moral há um “sofrimento mental –
dor da mente psíquica, pertencente ao foro íntimo”. O dano estético seria visível,
“porque concretizado na deformidade”. Consolidando esse entendimento, o teor da
Súmula 387 do STJ: “é lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano
moral”.

d) Danos morais coletivos (Enunciado 456 CJF): atingem direitos individuais


homogêneos e coletivos em sentido estrito, em que as vítimas são determinadas ou
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determináveis. O CDC admite expressamente a reparação dos danos morais coletivos,


mencionando-os no seu art. 6º, VI.
Direitos transindividuais (art. 81, CDC)
- Difuso (pessoas indeterminadas – ex.: desastre ambiental);
- Coletivo (pessoas determinadas quanto a um grupo ou categoria);
- Individuais homogêneos (pessoas indeterminadas – ex.: pessoas que compram
carro em lote, explosão em shopping). Pode postular, se preferir,
individualmente.
• O pedido é feito via Ação Civil Pública (MP).
O tema é bem controverso na jurisprudência nacional, pois existem julgados que
admitem a existência dos danos morais coletivos (pílulas de farinha) e outros não
(danos morais são apenas individuais - STJ, REsp 971.844/RS).

e) Danos sociais: os danos sociais são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto
por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança –
quanto por diminuição na qualidade de vida. Decorrem de condutas socialmente
reprováveis ou comportamentos exemplares negativos. Os danos sociais são difusos,
envolvendo direitos dessa natureza, em que as vítimas são indeterminadas ou
indetermináveis. A grande dificuldade do dano social refere-se à questão da
legitimidade, ou seja, para quem deve ser destinado o valor da indenização. Junqueira
de Azevedo aponta que, além do pagamento de uma indenização, deve ser destinado o
valor a um fundo de proteção, o que depende dos direitos atingidos. Cita também o
art. 883, parágrafo único, do CC. A ideia é: se os prejuízos atingiram toda a
coletividade, em um sentido difuso, os valores de reparação devem também ser
revertidos para os prejudicados, mesmo que de forma indireta.
São exemplos: A fraude de um sistema de loterias (caso Toto Bola), que gerou danos à
sociedade. Fixada a indenização pelo TJ-RS, os valores foram revertidos a favor do
fundo gaúcho de proteção dos consumidores; O STJ condenou empresa de cigarro por
publicidade abusiva dirigida ao público infanto-juvenil. O julgado faz menção a danos
morais coletivos, quando, na verdade, trata de danos sociais ou difusos, pois os valores
da condenação são direcionados ao fundo de proteção dos direitos dos consumidores
do DF.
DANOS MORAIS COLETIVOS DANOS SOCIAIS OU DIFUSOS
Atingem vários direitos da personalidade Causam um rebaixamento do nível de
Direitos individuais homogêneos ou vida da coletividade
coletivos em sentido estrito – vítimas Direitos difusos – vítimas
determinadas ou indetermináveis indeterminadas. Toda a sociedade é
Indenização é destinada para as próprias vítima da conduta
vítimas Indenização para um fundo de proteção
ou instituição de caridade
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f) Danos por perda de uma chance


Teoria da perda de uma chance: trata-se de uma construção doutrinária aceita no
ordenamento jurídico brasileiro como uma quarta categoria de dano, ao lado dos
danos materiais, morais e estéticos. O dano que se origina a partir de uma
oportunidade perdida está lidando com uma probabilidade, uma situação que
possivelmente aconteceria caso a conduta do agente violador não existisse.
Enunciado 444 CJF – a responsabilidade civil pela perda de chance não se limita à
categoria de danos extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso
concreto, a chance perdida pode apresentar também a natureza jurídica de dano
patrimonial. A chance deve ser séria e real, não ficando adstrita a percentuais
apriorísticos.
São exemplos: advogados por perderem prazos de seus clientes, gerando perda da
chance de vitória judicial; o TJ-RS responsabilizou um curso preparatório para
concursos públicos que assumiu o compromisso de transportar o aluno até o local da
prova. Porém, houve atraso no transporte, o que gerou a perda da chance de disputa
em concurso público; o TJ-RS já responsabilizou um hospital por morte de recém-
nascido, havendo a perda de chance de viver.

• Indenização: valor de base – o que se teria e o que se tem.


Além dos arts. 944, 945 e 948, existem outros artigos que tratam da fixação da
indenização.
• Art. 946 – tal dispositivo não traz tarifação ou tabelamento, o que é inconstitucional.
• Art. 947 – merece aplicação nos casos em que envolvem danos imateriais em que
não é possível retornar ao estado anterior. Nessas situações, deverá ser fixada uma
indenização em moeda nacional corrente.
• Art. 949 – esse “outro” prejuízo pode ser o dano moral (art. 186), bem como o dano
estético (Súmula 387 STJ). Enunciado n. 192 CJF.
• Art. 950 – indenização por perda da capacidade laborativa, devendo-se verificar qual
o percentual ou montante de capacidade perdido pela vítima e sua real condição de
trabalho, para então fixar o quantum. Pode ser pleiteada de uma só vez.
• Art. 951 – regulamenta a responsabilidade subjetiva dos profissionais da área de
saúde em geral (médicos, dentistas, enfermeiros). Caso o profissional assuma uma
obrigação de resultado, como no caso do cirurgião plástico estético, a sua
responsabilidade é objetiva, independe de culpa.
• Art. 952
• Art. 953
• Art. 954

1.2 TEORIAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL (arts. 927 e 186, CC)


 Teoria subjetiva – regra geral do direito privado. Só é responsável pelo dano se
agiu com culpa lato sensu (negligência, imperícia, imprudência ou dolo);
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Exceção: dano in re ipsa (dano presumido, onde não há necessidade da


comprovação da culpa lato sensu). Exemplo: inscrição indevida no SPC,
gafanhoto em lanche.
 Teoria objetiva – não se verifica culpa lato sensu. Ocorre independente de
culpa quando:
- Previsão em lei (art. 927, parágrafo único; art. 931 – empresários por
produtos postos em circulação; Decreto-Lei 438/38 – acidente de avião; art. 14,
§1º, Lei 6.938/81 – RC ambiental; art. 37, §6º, CF – RC Estado).
- Risco decorrente da atividade (explosão de posto de gasolina).
Atividade de risco normalmente desempenhada pelo autor do dano.

2 RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA


O Código Civil admite a responsabilidade objetiva expressamente no parágrafo único
do art. 927, que diz: “Haverá obrigação de reparar do dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de
outrem”.
A RO independe de culpa e é fundada na teoria do risco (que não cabe excludente do
dever de indenizar). Sendo as principais modalidades:
- Teoria do risco administrativo: adotada nos casos de RO do Estado. Há
necessidade de que o dano sofrido e o nexo de causalidade estejam interligados com
atividade pública (art. 37, §6º, CF);
- Teoria do risco criado: presente nos casos em que o agente cria o risco,
decorrente de outra pessoa ou de uma coisa (art. 938 – defenestramento);
- Teoria do risco da atividade ou risco profissional: quando a atividade
desempenhada cria risco a terceiros (segunda parte do parágrafo único do art. 927,
CC);
- Teoria do risco-proveito: situações em que o risco decorre de uma atividade
lucrativa, isto é, o agente retira proveito do risco criado (riscos de um produto –
aplicada nas relações de consumo – empresa farmacêutica que coloca um produto
para diabetes no mercado, ainda em fase de testes);
- Teoria do risco integral: não há excludente de nexo de causalidade ou de RC a
ser alegada (Danos ambientais – art. 14, §1º, Lei 6.938/81 – entendimento chancelado
pelo STJ/ Dano nuclear – art. 21, XXIII, “d”, CF).

Para esclarecer o que consiste em atividade de risco, o Enunciado 38 da CJF traz que se
configura quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a
pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade. Ou
seja, um risco excepcional, acima da situação de normalidade. São critérios de
avaliação a prova técnica e as máximas de experiência.
Jurisprudência nacional
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 Acidente de trabalho – a regra da RC subjetiva prevista no art. 7º, XXVIII da CF


entra em conflito com a responsabilidade objetiva do art. 927 do CC (norma
geral superior vs norma especial inferior). Uma das soluções que têm sido
adotada é o juiz escolher uma entre as duas normas, não sendo impedida a
aplicação do dispositivo do CC. Para ser RO, pode-se aplicar um dos princípios
do Direito do Trabalho, pela interpretação da regra mais favorável ao
empregado.
 Ambientes virtuais de relacionamento: há um debate acerca da aplicação da
RO na responsabilização da empresa que mantém o sitio digital. Segundo
algumas decisões, pode ser considerada objetiva, pois tais ambientes
enquadram-se como de potencial risco de lesão a direitos de personalidade.
“Restando demonstrado nos autos que a apelante (Google Brasil) atua como
representante da Google inc., no Brasil, fazendo parte do conglomerado
empresarial responsável pelo site de relacionamento denominado ‘Orkut’,
compete-lhe diligenciar no sentido de evitar que mensagens anônimas e
ofensivas sejam disponibilizadas ao acesso público, pois, abstendo-se de fazê-lo,
responderá por eventuais danos à honra e dignidade dos usuários decorrentes
da má utilização dos serviços disponibilizados.” Outras decisões, no entanto,
têm afastado a incidência da RO. “O dano moral decorrente de mensagens com
conteúdo ofensivo inseridas no site pelo usuário não constitui risco inerente à
atividade dos provedores de conteúdo, de modo que não se lhes aplica a
responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do CC/02”.

• Enunciado da CJF 443 – o caso fortuito e a força maior somente serão considerados
como excludentes da responsabilidade quando o fato gerador do dano não for conexo
à atividade desenvolvida.
Exemplo: assalto a ônibus, banco (via pública) = quebra o dever de indenizar.
• Teoria sem adoção do risco integral: cabe excludente – exclui a responsabilidade.
Exemplo: dano ao consumidor (art. 12, 18, CDC) + art. 36, §6º, CF (administração
pública).
• Responsabilidade civil por violação dos direitos dos presos: dever de custódia.
Exemplo: indenização (doenças – tuberculose, HIV, moléstias/ dano moral – recente
decisão: RE 580.252/2018).

3 DAS EXCLUDENTES DO DEVER DE INDENIZAR


I) Da legítima defesa: de acordo com o art. 188, I do CC, não constituem atos ilícitos os
praticados em legítima defesa. O conceito desta pode ser retirado do art. 25 do CP
(“Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios
necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”) ou
do art. 1.210 do CC (caso de ameaça e de turbação). Cabe análise caso a caso para a
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configuração da legítima defesa, sendo certo que o agente não pode atuar além do
indispensável para afastar o dano ou a iminência de prejuízo material ou imaterial.
- Se o proprietário de uma fazenda desfere tiros contra invasores, não haverá
legítima defesa, e sim excesso da defesa (abuso de direito), configurando o dever de
indenizar.
- A legítima defesa putativa não exclui o dever de indenizar! Ocorre quando o
agente imagina que está defendendo um direito seu, o que não ocorre no plano fático.
C imagina que está sendo perseguido por D, e joga seu veiculo sobre o outro causando
estragos e acidente. Evidenciando-se que não há perseguição, o caso é legítima defesa
putativa.
- Havendo exercício imoderado da defesa ou defesa putativa e sendo o fato
causado por terceiro, é reconhecido o direito de regresso do ofensor contra aquele que
gerou a situação que causou o dano (art. 930).

II) Do estado de necessidade ou remoção de perigo iminente: conforme art. 188, II,
não constitui ato ilícito a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão à
pessoa, a fim de remover perigo iminente, prestes a acontecer. O parágrafo único
disciplina que o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem
absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável à remoção do
perigo. Havendo excesso, tanto poderá estar configurado o abuso de direito (art. 187)
quanto o ato ilícito propriamente dito (art. 186).

Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não
forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que
sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro,
contra
este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido
ao lesado.
- Se um pedestre que está passando na rua no momento que uma criança grita
em meio às chamas de um incêndio, vê a cena, arromba a porta da casa e salva a
criança da morte iminente, poderá ter que indenizar se o proprietário da casa não
causou o incêndio. O herói terá direito de regresso contra o real culpado pelo incêndio
(art. 930).
- O supracitado artigo representa um absurdo jurídico ao dar prioridade ao
patrimônio frente à vida humana. O STJ tem entendido que o estado de necessidade
pode influir no valor da indenização, reduzindo o quantum debeatur (quantia devida).

III) Do exercício regular de direito ou das próprias funções: não constitui ato ilícito o
praticado no exercício regular de um direito reconhecido (excludente mais debatida na
jurisprudência – art. 188, I, 2ª parte).
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A inclusão do nome de devedores no rol dos inadimplentes ou devedores, em cadastros


de natureza privada (Serasa e SPC) constitui um exercício regular de direito do credor,
conforme entendimento unânime dos Tribunais e dicção do art. 43 do CDC (serve o
raciocínio para o protesto de título em casos de não pagamento no prazo fixado. No
entanto, antes da inscrição no cadastro de inadimplentes, deve ocorrer a comunicação
ao devedor pela empresa que mantém o cadastro (Súmula 359 STJ). A falta dessa
comunicação constitui abuso de direito, gerando o dever de reparar. Conclui-se que
“nas ações de responsabilidade civil por cadastramento indevido nos registros de
devedores inadimplentes realizados por instituições financeiras, a responsabilidade
civil é objetiva”.
• Pode ser aplicada para o caso do condomínio que publica o número da unidade
inadimplente na prestação de contas que circula entre os condôminos. No caso em
questão, não há que se falar em ato ilícito, mas em exercício regular de direito se a
dívida realmente existir.

No que concerne ao exercício regular das próprias funções, constitui uma espécie de
exercício regular de direito, eis que a pessoa tem uma incumbência legal ou
administrativa de atuação. É o que ocorre com o policial quanto ao combate ao crime e
no caso do bombeiro ao apagar um incêndio.
- No exemplo que foi exposto, quanto ao estado de necessidade, se um
bombeiro arromba uma porta para salvar a criança de um incêndio, sua situação não
está enquadrada no inciso II do art. 188. Assim, não se aplica o art. 929, que dispõe o
seu eventual dever de indenizar. Isso porque, para o caso do bombeiro, deve subsumir
o inciso I do art. 188.

IV) Das excludentes do nexo de causalidade: tendo em vista que o nexo de


causalidade é constituído pela relação de causa e efeito entre a conduta e o dano, e
que, ainda, o nexo é formado pela culpa (na RC) e pela previsão da responsabilidade
sem culpa relacionada pela conduta ou pela atividade de risco (RObjetiva), são
excludentes de nexo de causalidade:
 Culpa ou fato exclusivo da vítima (não se fala em nexo causal entre a ação do
agente e a lesão. Pedestre que atravessa fora da faixa e com o sinal verde para
os veículos);
 Culpa ou fato exclusivo do terceiro (nexo de causalidade entre o dano e a ação
do terceiro. Pedestre é atropelado por um motorista de táxi em função de um
ônibus desgovernado, que lança o automóvel sobre o transeunte);
 Caso fortuito (evento totalmente imprevisível) e força maior (evento previsível,
mas inevitável) – existem exceções: devedor em mora (art. 399).
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V) Da cláusula de não indenizar (cláusula de irresponsabilidade ou cláusula


excludente de responsabilidade): constitui a previsão contratual pela qual a parte
exclui totalmente a sua responsabilidade.
• A cláusula de não indenizar vale somente para casos de responsabilidade contratual,
pois nos casos de extracontratual, por ato ilícito, envolve ordem pública (não vale de
nada o condomínio colocar uma placa dizendo que não se responsabiliza pelo que vier
a cair e ser arremessado, pois o art. 938 traz a RC);
• Não incide quando o agente agir com dolo ou na presença de atos criminosos da
parte;
• É nula quando inserida em contrato de consumo (arts. 25 e 51, Lei 8.078/90);
• É nula nos contratos de adesão (art. 424, CC);
• É nula nos contratos de transporte (art. 734, CC e Súmula 161 STJ);
• Não tem validade e eficácia nos contratos de guarda em geral, em que a segurança é
buscada pelo contratante, constituindo a causa contratual (depósito em cofre de
banco).

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