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Diário de bordo: Um voo com destino à carreira diplomática
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Diário de bordo: Um voo com destino à carreira diplomática

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O concurso de admissão à carreira diplomática (CACD) é um dos exames públicos mais exigentes do Brasil, mas tornar-se diplomata era a meta dessa aeromoça que trabalhava para uma empresa aérea árabe, baseada no Golfo Pérsico. Sem saber do nível de exigência da prova, acreditando que conhecer o mundo e falar idiomas lhe bastariam, prestou o concurso pela primeira vez em 1996, aos 24 anos de idade. Arrasada ao ler as primeiras linhas da prova, desistiu da ideia de ser diplomata e continuou na aviação. Progrediu na carreira de comissária, chegando a chefiar voos na frota de aviões presidenciais dos Emirados Árabes Unidos, verdadeiros palácios voadores.
Depois de um acidente aéreo conjugado com a saudade que sentia de morar na sua terra natal, o Brasil, com as pessoas que amava, deixou o Oriente Médio – para onde retornaria, anos mais tarde, como diplomata do Serviço Exterior Brasileiro. Diário de Bordo – um voo com destino à carreira diplomática é um exercício autobiográfico que a autora apresenta, dividindo com o leitor por que decidiu se tornar diplomata e como foi sua jornada para este fim, desde a desistência inicial, passando pela determinação, anos mais tarde, da meta "passar no CACD", chegando ao dia em que finalmente era aprovada no concurso de 2006. O objetivo central da obra é mostrar que a realização de um sonho é possível desde que sejamos realistas e passemos a agir para alcançá-lo. Começando a estudar do zero, Claudia Assaf mostra como planejou seus estudos estratégicos que resultou na sua aprovação no CACD durante o quarto ano de seu processo preparatório.
LanguagePortuguês
PublisherFolio Digital
Release dateOct 1, 2015
ISBN9788561012199
Diário de bordo: Um voo com destino à carreira diplomática

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    Book preview

    Diário de bordo - Claudia Assaf

    leitura!

    Prefácio

    Cristovam Buarque¹

    Você vai gostar, certamente!

    Raramente o título de um livro diz com precisão o que nele está escrito. O título é mais para chamar a curiosidade do possível leitor. Um subtítulo indica com mais precisão de que ele trata. Neste caso, título e subtítulo complementam-se com perfeição. Diário de Bordo, nome dado ao documento em que os principais acontecimentos da viagem são anotados pelo comandante do transporte utilizado no trecho percorrido, trata da jornada feita por uma brasileira até a carreira diplomática depois de anos como aeromoça. Com ele, Claudia Assaf mostra que é uma personagem deslumbrante e uma excelente escritora.

    A leitura é cativante, o texto com estilo, a estória fascinante. De uma menina carioca que se forma em matemática e decide fazer pós-graduação na Síria, pelo desejo de aprender árabe e por curiosidade com o mundo de seus antepassados. Depois do curso, se faz aeromoça em uma companhia do Golfo Pérsico.

    Só isto seria suficiente para imaginar que o livro saiu das Mil e Uma Noites. Mas a jovem matemática, aeromoça nos céus do mundo, voando por uma empresa de xeiques, decide, logo depois de um grave acidente aéreo na Grécia, voltar para o Brasil e ser diplomata.

    Com o patrimônio de falar bem inglês e árabe, faz o difícil concurso para ingressar na carreira pelo curso do Instituto Rio Branco. Depois de formada volta para Doha, Catar, como representante diplomática do Brasil.

    Mais um capítulo das Mil e Uma Noites.

    Claudia agarrou um pedaço determinado de sua vida e transformou em um belo livro que permite diversas leituras. Pode ser lido como um manual de orientação para candidatos ao Instituto Rio Branco, indicando bibliografia, os métodos que usava para estudar, como escolhia professores e assistia aulas, as páginas em que descreve seus exercícios de inglês são não apenas instrutivas, mas especialmente agradáveis para o leitor. Como se não bastasse fazer um eficiente manual, Claudia tira inspiração de sua reprovação na primeira tentativa do concurso e passa uma aula de auto ajuda, com mensagens fortes para induzir a persistência no estudo.

    Seu livro pode ser lido com muito prazer por quem deseja fazer concurso para o Instituto Rio Branco, ou busca motivação e incentivo à luta por um sonho, ou simplesmente por quem deseja ler um belo livro de aventura humana. Além do imenso prazer de ler, razão suficiente para um bom livro, você termina a leitura aprendendo o que a persistência focada em um objetivo pode fazer para mudar a vida de uma pessoa.

    Mas, como ela própria diz: Tudo o que sou ou o que hoje tenho justifica-se pelo estudo. Se você quiser incentivar alguém a estudar, mostrar-lhe como vale a pena, dê este livro de presente a algum amigo jovem. Mas, pode dar também aos mais velhos. Eles vão gostar, certamente.

    Vencer a si próprio é a maior das vitórias.

    PLATÃO

    Apresentação

    Durante os três longos anos que dediquei aos estudos diários para realizar o sonho de ingressar na carreira diplomática, sentia falta de ter acesso a alguém que já estivesse exercendo a carreira. Eu teria perguntado para essa pessoa por que ela havia escolhido a diplomacia, como ela havia organizado seus estudos para ser aprovada no desafiante concurso de admissão à carreira diplomática (CACD), o que ela, já exercendo a profissão, exatamente fazia e o que ela me recomendaria. Seriam tantas perguntas, que a pessoa fugiria de mim!

    Sei bem que cada diplomata terá sua história para contar, mas todos decidiram, um dia, sair de sua zona de conforto para encaixar na sua rotina boas doses de estudo ao longo de alguns anos. Para uns, apenas um ano, haja vista sua formação ou sua experiência profissional dialogar diretamente com o programa cobrado pelo CACD; para outros, que, como eu, decidiram começar a estudar do zero, procedentes de áreas de formação não-humanas, demorando um pouco mais. Fato é que todos tivemos de estudar muito, focados no extenso programa cobrado pelo CACD.

    Mesmo sem conhecer diplomatas de carreira, continuei estudando, seguindo as recomendações de professores familiarizados com a prova e do próprio guia de estudo disponibilizado pelo Instituto Rio Branco. E pensei: se um dia conseguir tornar-me diplomata, tomarei a iniciativa de dividir com os candidatos ao CACD a minha experiência de antes e depois de ingressar no Itamaraty. Buscarei contar o que funcionou para mim durante meu processo preparatório e o que eu faria de forma diferente. Esse dia chegou. Aqui está meu depoimento sobre como se deu uma das jornadas mais enriquecedoras da minha vida, que mais me proporcionou oportunidades de aprendizado. Foi a jornada que me deu o privilégio de conhecer a essência de um sentimento e ter a noção exata de sua dimensão: a autossuperação.

    O candidato que já está na linha de frente para ser aprovado no CACD, aquele que vem estudando há algum tempo, optará, talvez, por não ler meus melodramas psicológicos vividos durante o árduo processo preparatório que caracterizaram aqueles quase quatro anos seguidos, de 2003 a 2006. Mesmo para esse grupo, posso afirmar sem medo de errar: o psicológico em ordem tem papel crucial na aprovação. E recomendo: além de estudar, cuide da saúde do corpo e da mente para realizar boas provas. Conheço pessoas que dominam profundamente temas cobrados pelo concurso do seu sonho, mas não têm a tranquilidade e a segurança necessárias para fazer o exame – qualidades importantes no agir diplomático. Talvez resida precisamente aí a complexidade do desafio do CACD: a serenidade estará sendo avaliada subliminarmente, na medida em que quem não estiver sereno e tranquilo provavelmente não conseguirá obter a aprovação. Em suma, na história que vivi, a ser narrada nas páginas seguintes, posso dizer que a ansiedade havia sido meu maior inimigo quando eu já me sentia apta a ser aprovada, a julgar pelo que havia estudado. Só quando consegui deixar a ansiedade do lado de fora da sala da prova, e, portanto, amadurecer perante o desafio, foi que logrei êxito no concurso. Esse amadurecimento por que passei ao longo da fase preparatória vem sendo meu maior aliado no exercício de minhas funções diplomáticas e, sobretudo, no relacionamento interpessoal.

    Da mesma forma, a humildade em reconhecer que nunca saberemos tudo e, mesmo assim, seremos capazes de passar no CACD, é fundamental no processo preparatório, colocando em xeque-mate a insegurança. O Itamaraty não busca um candidato enciclopédico, mas um candidato analítico, capaz de refletir a respeito da questão proposta pelo examinador, fazendo bom uso da interdisciplinaridade, identificando oportunidades estratégicas para o interesse nacional.

    Quando finalmente percebi a prova do CACD dessa forma – sem ansiedade, sem ter nada a perder, escrevendo as respostas com a alma e o coração, apenas deixando fluir minha capacidade de análise com base na interdisciplinaridade resultante de três anos de estudo diário –, fazendo uso da Geografia na prova de Política Internacional, e vice-versa, do fato histórico para justificar uma regra em Direito Internacional Público, ou da Economia para explicar uma passagem na História do Brasil, temperando tudo isso com a minha vivência até então, aí sim, a missão passar no CACD pôde ser cumprida.

    Não é minha pretensão ensinar nada a ninguém, mesmo porque ainda estou aprendendo. Sou uma eterna aprendiz. Aprendo com os diplomatas mais experientes, com os menos experientes, com os demais funcionários, aprendo com os mais velhos, aprendo com meus filhos pequenos, aprendo com meus erros. A ideia deste livro é dividir, com quem tiver interesse, a minha história de ingresso na carreira diplomática, com vistas a mostrar ao candidato ainda inseguro, que está quase desistindo ou já desistiu por não acreditar em si, que é possível realizar seu sonho, entre eles o de ser aprovado no CACD. Poderá demorar, mas há fortes chances de acontecer, caso persista. Sua tarefa será apenas PLANEJAR, estrategicamente, seus estudos diários com base no programa do concurso, fazendo os ajustes necessários em sua rotina, mesmo que isso signifique acordar às quatro horas da manhã, e AGIR para cumprir o que planejou, dentro de um espectro temporal ao longo do qual continuará tentando. O espectro temporal que defini para mim havia sido de sete anos. A aprovação aconteceu no quarto ano do caminho.

    Não há fórmula mágica. O segredo é simples: estudar diariamente, por médio ou longo prazo, aprendendo e amadurecendo com cada reprovação, com muita paciência e resiliência para continuar o processo preparatório dentro do espectro temporal previamente definido, com humildade para reconhecer que não será possível saber muito bem de cada detalhe do extenso programa. Fosse assim, todos os aprovados teriam tirado cem em todas as provas, o que não ocorre.

    Chico Xavier falava de duas sabedorias: a inferior e a superior. A sabedoria inferior é dada pelo quanto uma pessoa sabe, e a superior é dada pelo quanto ela tem consciência de que não sabe. Chico recomendava que tivéssemos a sabedoria superior, que fôssemos um eterno aprendiz na escola da vida. Para ele, a sabedoria superior tolera, a inferior julga; a superior alivia, a inferior culpa; a superior perdoa, a inferior condena. Ele afirmava que há coisas que o coração só fala para quem sabe escutar!

    Este livro foi escrito pelo meu coração para o leitor que queira escutar. Todos os aprovados, independentemente de sua área, terão muito o que contribuir na defesa dos interesses brasileiros. Há muitos temas que desconheço e meus colegas diplomatas conhecem bem, da mesma forma que deva haver temas que eu conheço um pouco mais que eles. E assim complementamo-nos no mesmo objetivo dentro do Serviço Exterior Brasileiro: defender os interesses nacionais, determinados pelo governo democraticamente eleito pela sociedade. A ideia central do livro é a autossuperação e a realização do sonho por meio do estudo. O público-alvo que, talvez, mais se identificará com o que relatarei é o candidato ao CACD – considerado um dos concursos mais desafiantes do Serviço Público Federal – que, como eu, decidiu estudar começando do zero, somando mais de trinta anos de idade, procedente de uma carreira que pouco ou nada dialoga diretamente com o fazer diplomático estatal propriamente dito. Digo diretamente porque, indiretamente, o conhecimento de toda e qualquer área do saber será útil ao longo da carreira, a depender da temática em que o diplomata preferir atuar.

    Não há mágica, não há segredo, não há fórmulas sobrenaturais. Há apenas um caminho para a aprovação: estudo diário ao longo de alguns anos. Sonhar é importante, mas sonho sem ação de nada adiantará. Foque nos estudos, na caminhada. O resultado virá naturalmente dentro do prazo que você definiu para si como aquele período em que estará disposto a tentar. Findo seu prazo, se não der certo, pelo menos você terá tentado e estará com um conhecimento sem precedentes em sua vida.

    Há aqui duas certezas: se não estudar muito, organizada e estrategicamente, não será aprovado; mas se estudar muito, poderá dar certo. Se for a vontade d’Ele que o sonho que você escolheu para si se realize, se estiver em sintonia com o que Ele planejou para você, relaxe, porque vai acontecer no momento certo, nem antes, nem depois. Apenas preocupe-se em fazer sua parte, marcar um golzinho por dia, porque, parafraseando Ayrton Senna, "quando Ele quer, não tem quem não queira".

    Boa leitura.

    Introdução

    Em 1996, com quase 25 anos de idade, comissária de bordo de uma empresa aérea árabe havia três anos, residindo no Oriente Médio havia mais de cinco, pensei em mudar de profissão. Com a internet ainda pouco difundida, sentia falta de estar mais conectada ao Brasil, às minhas raízes, ao jeito brasileiro de viver, ao mesmo tempo em que queria manter na nova profissão que eu viesse a exercer a dimensão internacional que a aviação me proporcionava. Falava inglês fluentemente e o árabe consolidava-se a cada dia, ambas as proficiências adquiridas em função do uso constante que fazia daqueles idiomas no trabalho. A combinação dos três elementos – amor ao Brasil, identificação pessoal com a área internacional e fluência em línguas –, embora fosse graduada em um curso da área de ciências exatas, fez que eu pensasse, intuitivamente, em ingressar na carreira diplomática; afinal, a palavra diplomata, para o cidadão comum, remete àquelas características que eu julgava possuir.

    Sem conhecer nada a respeito do concurso de admissão à carreira diplomática (CACD), tampouco ter ouvido falar na renomada academia diplomática do Serviço Exterior Brasileiro, o Instituto Rio Branco (IRBr), marquei, sem titubear, minhas férias daquele ano de modo que minha estada no Brasil coincidisse com o dia da prova de primeira fase do CACD-1996, denominada de teste de pré-seleção (TPS), para a qual havia me inscrito na Embaixada do Brasil em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos (EAU), Golfo Pérsico².

    Cabe assinalar que o TPS é uma prova objetiva, espécie de triagem que determinará quais candidatos poderão realizar de fato as provas discursivas das fases subsequentes. Essa primeira etapa elimina a maior parte dos inscritos no concurso.

    Com esse pano de fundo, prestei o meu primeiro CACD, o que a gente nunca esquece. Aprendi, por meio do choque, na prática, naquela minha primeira tentativa inocente de ingressar na carreira diplomática, que amar o Brasil, gostar de atuar profissionalmente na área internacional e saber idiomas até poderiam ser qualidades necessárias ao diplomata, mas definitivamente não suficientes para habilitar o aspirante à admissão. À medida que lia o TPS de 1996, mais agoniada, desnorteada e envergonhada eu ficava de mim mesma por entender pouco ou quase nada do que se pedia – logo eu, que havia sido boa aluna a vida toda. Sentindo-me impotente diante da situação em que estava naquela sala de prova, decidi aguardar, pacientemente, os trinta minutos iniciais obrigatórios para poder deixar o recinto. Saí atordoada; não me reconheci.

    Após deixar a prova, extirpei de minha mente a ideia absurda de ser diplomata. Não é para o meu bico, pensei, ao saborear o saudoso cafezinho no primeiro bar de esquina que encontrei no Centro do Rio de Janeiro. Ser aprovada no CACD tornara-se uma fantasia, um desejo irrealizável. Sentenciei que esse desejo era algo que transcendia minha capacidade intelectual, independentemente do esforço que eu viesse a fazer. Com base na prova a que fui apresentada da forma a mais cruel – naïve que eu era por pensar que, sem estudar, poderia obter a aprovação no CACD –, ser diplomata, a partir daquele exato momento, tornou-se um desejo enigmático e inatingível, uma fantasia. Restava-me concluir que apenas estariam habilitados a ser diplomata os que já nasceram dotados com algum dom especial, uma espécie de gênio, a julgar por essa experiência traumatizante por que passei em 1996.

    Obviamente, essa percepção revelar-se-ia, anos mais tarde, igualmente equivocada, na medida em que o trauma nada mais era do que reflexo do meu despreparo para ser aprovada naquele momento. Todos temos nossa genialidade dentro de nós, aguardando ser despertada. Minha primeira desastrosa tentativa de me tornar uma diplomata foi um erro justificável pela falta de informação de minha parte. Tratava-se de uma época em que a internet apenas começava a ser difundida. Navegar pela rede ainda não era comum na minha rotina de então. Ademais, não havia cursinhos preparando para este concurso específico, como ocorre hoje. Talvez apenas os que conhecessem um diplomata de carreira ou estudassem alguma graduação relacionada de alguma forma à diplomacia poderiam estar cientes do que significava o CACD, mas eu, formada havia alguns anos na área das exatas, sem conhecer ninguém do ramo, morando no exterior havia cinco anos, sem acesso à internet, não sabia em que consistia a carreira, tampouco qual o nível de exigência do certame para nela ingressar.

    Findas as férias, traumatizada com a minha primeira tentativa em tornar-me diplomata, retornei ao Golfo, onde permaneci por mais cinco anos atuando na aviação como comissária de bordo – uma carreira que me proporcionou amadurecimento sem igual e oportunidade de conhecer de muito perto os perversos contrastes sociais mundo afora.

    Creio que o amor ao país de origem seja um sentimento natural que, ao morarmos no exterior, recrudesce involuntariamente. Não raras vezes, estava eu explicando aos colegas tripulantes das mais variadas nacionalidades as curiosidades que eles manifestavam acerca do Brasil nas conversas que se iniciavam com pergunta deles em torno de rótulos a nosso respeito. Nessas oportunidades, eu descrevia o Brasil como se fosse sua advogada de defesa. Se elogiassem, afirmando que éramos os melhores no futebol ou tínhamos as mulheres mais bonitas, agradecia-lhes os elogios, para, em seguida, iniciar um sermão com vistas a mostrar que o país não se resumia àquelas características estereotipadas. Se criticassem, comentando o analfabetismo, o desmatamento da Amazônia, a desigualdade regional, a pobreza, o tráfico de drogas, a violência, entre outras mazelas de nossa sociedade, concordava em parte, para, logo depois, elaborar acerca das raízes desses desafios, desde a exploração colonial a que estivemos expostos por séculos às soluções que o Estado implementava para superá-las, lembrando, ademais, que todos os países têm seus problemas. Tudo muito intuitivo; não conseguia ficar calada.

    Ouvir críticas ao Brasil dentro do Brasil, feitas por brasileiros, é excelente, pois vivemos na democracia, e a crítica bem argumentada contribui para o melhoramento do Estado; entretanto, ouvir as mesmas críticas proferidas por estrangeiros que nunca haviam pisado em nosso território é situação completamente distinta, intolerável até. Não conseguia ficar calada de forma alguma. É como ouvir alguém de fora da nossa família criticar um de nossos parentes, ainda que se trate de parente com quem rotineiramente discutimos. Defenderemos o ente amado, por mais que concordemos com a crítica a ele feita; era assim que eu me sentia. Entendia intuitivamente que essa seria também a função de um diplomata, com a diferença de que faria isso oficialmente, usando argumentos que fôssemos instruídos a usar. A ideia me agradava, e muito.

    Foi nesse contexto intuitivo que considerei migrar para a carreira diplomática. Desconhecendo em que consistia o ofício do diplomata, o CACD, o IRBr, o Itamaraty, inscrevi-me, na Embaixada do Brasil em Abu Dhabi, Emirados Árabes Unidos, no concurso de admissão de 1996. Acreditava que, facilmente, poderia ser uma diplomata de um ano para o outro.

    Meu desconhecimento acerca de como ingressar na carreira diplomática resultou no trauma vivido durante a prova e implicou a minha desistência imediata. Foram o trauma vivido na prova de 1996, a desistência que se seguiu, e a decisão, anos mais tarde, em superar o trauma e concretizar o sonho de ser diplomata de carreira os motivos que me inspiraram a escrever este livro, com vistas a mostrar ao candidato descrente no próprio potencial, que pensa ser impossível passar no concurso de admissão à carreira diplomática, assim como eu um dia também pensei, que você poderá, sim, ser aprovado, basta Querer, com Q maiúsculo. Querer, com Q maiúsculo, implicará estar disposto a reestruturar a rotina e abdicar de afazeres, sobretudo sociais, por longo período. Pelo menos foi como aconteceu comigo; só assim consegui realizar meu sonho, saindo de minha zona de conforto e agindo.

    Atuando como diplomata de carreira há sete anos, olhando para trás, posso afirmar, sem medo de errar, que a minha fórmula para ser aprovada no CACD baseou-se em três ações basilares por três anos seguidos: acreditei genuinamente em mim, sem me comparar com os outros, apenas comigo mesma em diferentes momentos do processo preparatório; estabeleci a logística que me permitiu estudar; e estudei, criando técnicas próprias que aumentaram a produtividade, com a humildade de começar pelo simples, para, gradativamente, avançar nos estudos que exigiam pensamentos mais sofisticados.

    Mesmo com a internet mais bem difundida nos dias atuais, percebi que não havia, na rede, depoimentos pragmáticos e detalhados como o que relatei nesta publicação. O objetivo precípuo é mostrar, a quem tiver interesse, que passar no CACD é possível, depende tão somente de nossa disposição em enfrentar, por longo prazo, os desafios de múltiplas naturezas que se apresentarão a todos os candidatos. A fonte primeira dessa disposição está em você acreditar que é capaz, trabalhando bem seu lado emocional e psicológico; em seguida, a outra fonte do seu sucesso não poderá ser outra, senão arregaçando as mangas e estudando muito, muito mesmo, por meio de estabelecimento de uma logística que funcione para você, seja para o leitor que, como eu, decidiu iniciar seus estudos depois dos trinta anos de idade, procedente de carreiras as mais diversas, seja para aquele que, ainda muito jovem, presta o vestibular já pensando no Itamaraty e foca no CACD antes mesmo de completar 21 anos. Equacionar seu planejamento financeiro para o período em que se dedicará ao projeto é, igualmente, de extrema importância, nada obstante a riqueza de material oferecido gratuitamente pela internet hoje e a tentativa de se democratizar o processo preparatório por parte do Estado. Soma-se a isso a difusão de cursos altamente especializados no CACD pelas grandes capitais do país, o que torna a competição para o candidato residente em localidades as mais distantes de nosso imenso Brasil ainda mais acirrada – mas não impossível.

    Por sua vez, acreditar e estudar pressupõem planejamento de longo prazo no que concerne à forma e à substância. A forma refere-se à logística a ser estabelecida em coordenação com suas responsabilidades na família, no trabalho, nos compromissos sociais. A substância respeita ao planejamento contínuo e detalhado em quebrar os diversos temas cobrados pelo programa do concurso em pequenas metas, diárias e palatáveis, e alcançá-las. Um golzinho por dia. Não é demagogia barata, é fato. Funcionou comigo, poderá funcionar com você também.

    A administração do tempo é outro fator decisivo no processo. Quer o planejamento de forma, quer o de substância, ambos exigirão do candidato excelente administração do próprio tempo. O tempo passa a ter status de sagrado para aquele que traçou, verdadeiramente, a meta de passar no CACD. O candidato não poderá se dar ao luxo de desperdiçar tempo. Se você é daqueles que acreditam não ter tempo para acomodar as ações necessárias para a realização

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