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ANTAGÔNICAS
REVISÃO
Wilson Veado
INTRODUÇÃO
À propósito desta antiga “rixa”, transcreverei, a seguir, um curioso ensaio que fiz nos
idos anos 70, provavelmente quando tinha meus 13 ou 14 anos de “vida terrícola”. Com
certeza, nessa época, começaram a pulular em minha mente os enigmas da vida que até hoje
me acompanham nessa eterna interrogação que permeia o misterioso ciclo humano.
“É preciso primeiro haver o Bem, para que possa haver um oposto arbitrário como o
Mal. A partir desta máxima, tentarei expressar minha opinião acerca dessa polêmica que
surgiu no começo dos tempos e que ainda atordoa o Homem.
Para mim, o Bem e o Mal dependem um do outro. Para que um tenha efeito, o outro
tem que existir e vice-versa. Na verdade, ambos são gerados a partir dos atos do Homem e a
partir da opinião de cada um. Quem sabe se um Bem que eu acho pode ser um Mal para
outrem? E verdadeiramente, qual é o certo? Para mim, doar sangue é um bem, mas para os
Testemunhos de Jeová este ato é um Mal. Afinal, quem está certo?
Os homens criam suas próprias crenças e nelas esbarram com seus atos. Haveria o
Mal se não existisse o Bem? Haveria o Bem se não existisse o Mal? Em verdade, eu digo que
ambas rotulações não passam de títulos ou até mesmo de formas adotadas pelos Homens
para justificarem ou não, seus atos para com o próximo.
E se não houvesse o Bem? É claro que não existiria o Mal, pois este só existe graças
ao surgimento do Bem. E se não houvesse nem um nem outro? Os atos seriam bons ou maus?
A meu ver o Mal é fruto do Bem e este, por sua vez, é um fruto do Mal.
O Homem aplica o Bem, assim como o faz com o Mal. Uns encaram o Bem à sua
maneira, outros fazem o mesmo com o Mal. E é assim que é a vida. A maioria das pessoas
consideradas pessoas de bem, empregam cotidianamente adjetivos tais como bondade, amor,
compaixão, etc. Os maus empregam o ódio, a impiedade, e a maldade propriamente dita.
Se a retidão fosse a Lei Universal, não haveria nem Bem, tampouco Mal na vida do
Homem. Todos viveriam imitando os exemplos do seu Criador Maior e os rótulos de bondade
ou maldade não existiriam, pois com a retidão não seria necessário diferenciar o Bem do
Mal.”
Como se pode atestar pelo depoimento acima, a dúvida suscitada pela intricada divisão
que o Homem inventou, já martelava-me as entranhas cerebrais! A dualidade, portanto,
sempre foi a constante na vida do Ser Humano. Esquecemos do Deus que existe em nós
próprios e resolvemos bipartí-lo para justificar nossos atos.
O tempo o dirá.
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PARTE 1
No envelope que recebi, via correio, não havia remetente. Vi, porém, que era uma
correspondência procedente da nossa cidade, tendo em vista o carimbo. Era um invólucro de
papel pardo, bem lacrado com fita adesiva e todo selado. Continha um calhamaço de folhas
datilografadas. Pelo caracteres, pude deduzir que eram de uma máquina de escrever,
daquelas bem antigas.
Um tanto curioso, dei uma vista d'olhos no material e vi que era mais um caso para
fazer parte da coluna “Formiga e Seus Causos”. Verídico ou não, o que importa é que ele é
um tanto interessante e merece ser divulgado. É mais uma história para os alfarrábios
formiguenses. Vamos a ela.
- Não se exaspere ainda, meu caro Silveira! Como sabe, nossas forças são renovadas
todos os dias. As energias que liberamos após essas estafantes doutrinações, são sempre
repostas, estando nosso corpor em repouso ou não. Foi muito importante termos aprendido
“reiki”. Assim, podemos nos revitalizar constantemente. As energias que saem são
imediatamente revigoradas. Na verdade, esta técnica deveria ser também assimilada pelos
demais Centros e Clínicas existentes. É uma maneira quase incansável de combatermos
forças opostas! - disse o médico Castro, um dos integrantes da “tropa de choque” que tentava
conscientizar seres espirituais errantes que ali pululavam sem parar, ávidos por auxílio.
Mesmo falando daquela maneira, Castro sabia que a situação estava quase
incontrolável. O ambiente estava pesado. A força negativa era tão forte que até o odor do local
não era agradável. Como se não bastasse, o que mais impressionava, era o número de óbitos
que aconteciam na cidade. E o pior: todos aqueles que passavam pela transição,
invariavelmente “apareciam” nas sessões de doutrinação. Muito estranho. Como e por quê
isso acontecia? Por que de uma hora para outra, o espírito, independente do que fôra em vida,
passava a sofrer e a pedir por ajuda? Que ocorrência os tornava desesperados de uma hora
para outra? E suas proteções espirituais? Por que não ajudavam?
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Ninguém no Centro Espírita, ou em qualquer outro local que “tratava” dos sofredores
falecidos, podia entender o motivo daquela avalancha de pedintes do mundo extrafísico.
Foi aí que eu entrei na história.
Certo dia, tive um repentino desmaio. De repente, vi-me em um lugar lúgubre, muito
escuro e de cheiro nauseabundo. De esguelha, reparei que vultos me acenavam como se
estivessem pedindo ajuda. Um pouco grogue, pude, ainda vislumbrar uns homens de braços
cruzados. Tudo indicava que faziam a guarda do local. Ao tentar levantar, vi que um dos
guardas corria em minha direção com uma estranha lança de onde saiam raios de luz.
Assustado, notei que ele queria partir o cordão brilhante que eu emitia do corpo. Dei uma
guinada e consegui me desvencilhar do ataque a tempo. Mas, quando ele iria desferir outro
golpe, fui puxado de volta à lucidez terrena.
Fui literalmente “puxado” de volta ao meu corpo. Durante o rápido trajeto, pude
reparar o cordão brilhante diminuindo aos poucos até o momento em que senti o safanão ao
adentrar novamente a caixa de carne que "guarda" minha alma.
Um pouco atordoado, levei algum tempo para colocar as imagens recém vivenciadas
bem concatenadas em meu cérebro. Fiquei me questionando sobre o motivo daquele sonho
tão real. A maior prova da autenticidade do sonho, foi o fato de meu corpo estar impregnado
pelo mau cheiro do lugar onde eu havia estado. Para mim, isto comprovou a experiência
extra-corpórea. Portanto, eu trouxera as moléculas de odor agregadas no meu corpo sutil que,
por um motivo desconhecido, ficaram também coladas ao corpo físico!
Enquanto imaginava e refletia sobre aquele rápido acontecimento, que durou pouco
mais de um minuto, ouvi algumas palmas vindas do lado de fora de minha casa, situada no
Engenho de Serra, importante bairro desta querida cidade. Coloquei minha cabeça para fora
da janela e vi um homem acenando, querendo falar comigo.
- Bom dia, meu amigo. Você não me conhece, mas eu já sei exatamente quem é. Já nos
encontramos em outros lugares, que você naturalmente não vai se lembrar. O motivo de
minha vinda é muito importante. Precisamos de seus auspícios!
- Pois não. Pode se apresentar e me dizer o motivo de estar em minha casa. Sou
escritor e tenho ainda algumas laudas para terminar, uma vez que dependo de prazos para
finalizar um livro.
- Sei disso. Como disse, conheço muito bem a sua vida. Por sinal, esse seu livro tem
algumas “contribuições” minhas... Bem, isto não interessa agora. Precisamos de você. Ou
melhor, precisamos de sua potência vibracional!
Continuei sem entender. Nada indaguei, porque sentia que ele estava sendo sincero.
Pude observar que sua aura emitia uma luz brilhante, quase violeta. Então ele prosseguiu,
agora com mais veemência.
- Não pretendo deixá-lo apreensivo por mais tempo. Em síntese, você é o escolhido
para uma missão de importância vital. Forças invisíveis negativas estão querendo
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definitivamente dominar o planeta, começando por Formiga! Na verdade, hordas de espíritos
já estão agindo em outras partes. Realizarão, finalmente, o que pretendiam desde que o
homem passou a viver na Terra, ou seja, torná-la regida pelas forças do mal, as forças
opostas às leis que regem o Cósmico. O plano deles é literalmente “sugar” o espírito
desencarnado e impedí-lo de reencarnar, tornando-o um gerador de energia vital. Assim, terão
repositórios energéticos perenes, suprindo-lhes as necessidades para agirem também em
outros orbes. Tememos que correntes antagônicas possam prevalecer no Universo doravante,
caso tenham êxito. O objetivo luciferiano toma forma!
- Se é o que estou entendendo, o senhor quer que eu o ajude a impedir tudo isto? Mas
como pode ser? Logo eu, um pacato escriba que, apesar de certas experiências metafísicas,
não consegue sequer galgar postos avançados na vida! - disse-lhe com toda ênfase, tentando
também descarregar as minhas decepções de escritor frustrado e sem perspectivas.
- Calma, meu amigo. Antes de explicar os detalhes, e pedir que me acompanhe, peço-
lhe desculpas por não ter me apresentado e ter invadido a sua privacidade assim, tão
abruptamente. Meu nome é Castro. Faço parte de uma equipe de sensitivos, cujo objetivo
precípuo era auxiliar as pessoas portadoras de distúrbios psíquicos não explicados pela
psiquiatria convencional. Além de mim, fazem parte do time, o Silveira, o Sanches, dentre
outros. Depois de muitas pesquisas e até viagens astrais, descobrimos o que está por acontecer
e que você é um dos escolhidos para tentar impedir que essa mudança de polaridade se
concretize
Confesso que não acreditei muito naquele relato do sensitivo Castro. Ora, quantas
vezes já ouvi este tipo de conversa fatalista? Ainda mais agora, na virada do século e do
milênio! Os alarmistas sempre aparecem nessas horas para nos amedrontar com ameaças
catastróficas que, afinal de contas, jamais acontecem. Uma tragédia aqui, outra ali, mas
jamais em proporções rigorosamente globais. Todos sabem que o mundo anda ruim desde os
primórdios da raça humana. Desde os tempos que adquirimos consciência, na idade da pedra,
que nos tornamos hostis uns com os outros. Não tem jeito. Na verdade, quando não tínhamos
essa plena consciência, éramos até menos maus. O sentido do antagônico, ainda não estava
bem definido. O bem-estar, sim, era um sentimento real, pois na medida em que o homem se
sentia tranqüilo, em paz, sem ameaças de seus semelhantes, exceto das forças da natureza e
dos animais, ele podia ter a sensação de felicidade. Assim, rotulou tal sentimento como o
estado ideal para viver. Mas, começaram a surgir as disputas, as competições. Apareceu o
lado negativo. E a ambivalência tornou-se uma nova realidade. Bom e mal tornaram-se pólos
contrários e o ser humano pensou que tinha evoluído...
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PARTE 2
Da descrença inicial, passei a prestar atenção nas palavras de Castro. Algo me dizia
que aquilo poderia ser verdadeiro. Eu sentia isso. Não sei o que. As cenas durante o desmaio
pareciam dar razão ao que ele dizia. E enquanto falava, eu o reparava. Era um senhor de porte
físico franzino, barba e cabelos grisalhos, óculos com lentes grossas e fala pausada.
- Descobrimos que você é remanescente do planeta Kryon, que não está nesta nossa
forma tridimensional. Sua evolução o impeliu à quarta dimensão. Você, além de alguns
outros poucos, foram convocados para renascer neste planeta, provavelmente visando evitar
justamente uma eventual tentativa de desestabilização por parte das forças contrárias. Em
suma, caro amigo, rogo-lhe que me acompanhe até a clínica para que possamos melhor
inteirá-lo de sua missão. Isto, claro, se aceitá-la...
- Sinto que este é o meu dever. Antes, porém, devo contar a você o que houve comigo
nesta manhã. Desmaiei e durante esse tempo algo muito real aconteceu. Por pouco, não fui
atacado! Imagine: seres armados queriam destruir o meu cordão de luz. Segundo me consta,
se isto acontecesse, creio que eu poderia ter morrido e...
Sem perder mais tempo, ingeri o líquido - um floral - que Castro me recomendara. Em
seguida, partimos rumo à clínica, situada num local próximo à velha Escola Normal. Fomos
a pé, pois carro em Formiga, só em extrema necessidade.
- Veja só. Os cemitérios estão lotados. Os óbitos não param. O pior é que a maioria das
mortes ainda não é explicada sob o ponto de vista clínico. O quadro é idêntico: desmaio
repentino e depois, parada cardíaca irreversível. Temos reparado que a expressão do falecido
denota sofrimento. Segundo pesquisas científicas, já comprovadas, um corpo sem vida passa a
pesar menos, logo em seguida à sua morte. Isto é, fica pesando menos uma ou duas gramas
imediatamente após seu derradeiro estertor, e antes mesmo do natural inchaço por causa dos
gases. Foi especulado que esse seria o peso aproximado da alma. Mas, ultimamente, em nossa
cidade, a pessoa que acaba de morrer, perde em torno de quinhentas gramas! Concluímos
que é o volume de energia perdido, ou melhor, drenado. Não sabemos ainda como o processo
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se desenvolve, apesar de toda a informação, via canalização e outros meios, de que dispomos.
Só temos certeza de que esse roubo de energia vital é o que lhes dará a sustentação necessária
a fim de conseguirem a almejada inversão da condição vibracional do globo terrestre! Você é
um dos que poderá interromper esse inédito assalto energético!...
A cada nova revelação, eu ficava ainda mais estarrecido. Minha intuição me fazia
sentir, porém, que algo pesado estava no porvir. Infelizmente, não estava errado...
Chegamos à clínica. Subimos as escadas e fomos até uma ampla sala do último andar
do prédio. A decoração do lugar era condizente com a aura mística que a rodeava. Muita
planta ao derredor, além de copos com líquidos de variadas cores. O teto era majestoso. Todo
de vidro e em formato piramidal. Dali eu podia ver perfeitamente o azul turquesa do belo céu
formiguense. Tudo muito claro. O aroma de mirra invadia o ambiente.
Fui apresentado aos outros dois pesquisadores. Sanches era um senhor meio baixo,
também de feições serenas e voz macia. Quando falava, ofegava um pouco. Era psicólogo e
responsável pelas regressões que, ajudaram a descobrir o que acontecia nos “bastidores dos
umbrais”...
Por sua vez, Silveira era o contrário, em termos físicos. Mais alto, tinha uma voz
grave, demonstrando firmeza no que dizia. Era também potente sensitivo, além de especialista
eletrônico. Era aquele que cuidava da aparelhagem de transcomunicação.
Sentamos numa mesa bem comprida. À nossa frente estava uma tela de projeção quase
do tamanho da parede. Enquanto me expunham em maiores detalhes a situação, o projetor
exibia transfotos, que eram imagens nítidas do Outro Lado! Sons estranhos também
acompanhavam as grotescas cenas. Tudo fruto da chamada "Transcomunicação Instrumental",
que, afinal, servira para uma causa vital para todos.
- Meu amigo, você deve saber muito bem que cada corpo físico é uma usina energética
com eletricidade para operar no plano material. Por ocasião da morte, o desligamento
demanda um certo tempo. Junções fluídicas ainda permanecem ativas entre as células físicas e
espirituais. Mesmo o corpo físico, sendo tido como morto, retém tanta energia que
transborda... É nesse momento crucial que as entidades atacam. Indiscriminadamente, elas
usurpam o fluido vital contido no corpo recém abandonado. Não só fortalecem a si próprias,
como o armazenam, visando a etapa definitiva para a concretização do plano de alterar
definitivamente a polaridade terrestre...
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PARTE 3
- Conforme disse nosso irmão Castro, nós nos cientificamos dessas ocorrências, não
só em sessões de hipnose que fazemos com nossos pacientes terminais, como também, por
intermédio da projeção, que nos permite 'visitar' a dimensão, onde tudo está acontecendo,
conquanto temos grande cuidado ao fazê-lo, pois, se formos percebidos, poderá significar o
fim... Tudo indica que queriam pegá-lo ainda vivo. Senão, teriam sumariamente abalado o seu
cordão de prata, esse facho de luz: elo do corpo material aos outros corpos sutis que todos
temos. E você conseguiu escapar justamente graças às características exclusivas de seu
genoma, cuja configuração é especial, evidentemente. Os espíritos dos formiguenses que ora
estão sucumbindo sistematicamente, são de mal-afortunados que têm suas almas literalmente
aprisionadas. Geralmente, são capturados os mais fracos. Depois, sem energia, eles
adormecem e ficam estagnados no tempo e no espaço, sabe-se Deus até quando... Como já
sabe, essa energia surrupiada, será a força-motriz de que maldosos seres necessitarão para
concretizarem o plano de inverter a polaridade terrestre, tornando-a refém das forças do mal!
Então, Silveira, com sua voz de barítono, cortou o colega, dando a impressão de que
não tínhamos mais tempo para explanações. Gelei. Meu momento chegara! O coração
acelerou seu ritmo.
- Em suma, queremos lhe dizer que vocês terão a missão de desintegrar a usina de
força que está sendo abastecida. E se isto não acontecer logo, falharemos no nosso intento e o
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pior vai acontecer, queriam os Mestres, ou não. Será uma tarefa árdua, como é óbvio. Disse
'vocês', porque ao seu lado estarão outros abnegados como você: escolhidos para tentar evitar
a maior calamidade da raça humana que subsiste nesta esfera da Via Láctea chamada Terra!
Após as explanações fantásticas dos três sensitivos daquela clínica onde eu estava,
tomei um gole d'água. Estava com a boca seca e também precisava do precioso e magnético
líquido para desanuviar meus pensamentos. Ainda custava-me compreender o porque de uma
pessoa tão normal como eu, que dormia, comia e bebia tal como a maioria dos mortais,
poderia estar num rol tão seleto. Era incrível imaginar que eu poderia ser um dos responsáveis
por salvar nosso conturbado planeta! Mais parecia um filme de ficção científica. Mas não. Era
real! Real até demais, pois, enquanto saciava a sede, suava e tinha calafrios constantes. Meu
corpo se manifestava e tais sensações eram palpáveis. Na verdade, o estresse estava apenas
começando. Estava muito preocupado. De fato, eu "pré-ocupava" a minha mente com coisas
que ainda nem tinham acontecido, mas que davam sinais irrefutáveis de sua iminência! De
qualquer forma e, temores à parte, o momento era delicado. Momento de ajudar aos outros.
Eu, que tanto reclamara de pessoas que só ajudam, se obtiverem o troco, a contra-partida
imediata. Interesseiros e oportunistas que visam só e somente só, o proveito próprio. Agora
era a minha vez de desmistificar essa triste tese! Sem querer dar uma de bom samaritano,
aquela seria a minha oportunidade de ajudar pensando somente no benefício de meus
semelhantes. Claro que no final de tudo, eu também seria beneficiado, mas era apenas devido
à inevitável lei de causa e efeito, nada mais, nada menos! Antes de concluir meus
pensamentos, inspirados pela saborosa água que descia minha garganta abaixo, Silveira
expôs a parte prática da missão. Sua voz grossa, ressoava aumentava a gravidade da situação.
- Enquanto você estiver “trabalhando” do Outro Lado, seu corpo ficará em estado
cataléptico. Isto é, ele será imediatamente criogenizado. Permanecerá numa câmara
hiperbárica, monitorada por nós e por potentes computadores quânticos. Antes da hibernação,
você terá uma breve, porém eficiente dieta de florais especiais, além de outros extratos
energéticos, próprios para suas configurações anatômicas e atômicas. Em seguida, sua
projeção será induzida. Estaremos monitorando o tempo todo, através da própria TCI, e até
em projeção, função do nosso amigo Castro. Tais emissões não são captadas pelos espíritos de
vibrações diferentes, o que nos dá mais segurança. Contudo, terá que ter cuidado especial com
o seu cordão de prata, o luminoso “facho umbilical” que liga os seus corpos sutis. Ainda terá a
própria energia para se fortalecer. As “forças da inércia” terão muito trabalho, tenha certeza!
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Dito isto, fui conduzido até uma outra sala. Meu coração estava acelerado. Meu auto-
domínio não estava funcionando muito bem naquela altura. Eu sequer imaginava o que estava
por vir...
Depois de um rápido banho de luzes coloridas, vesti uma roupa colante, de cor igual à
pele e comecei a ingerir líquidos de diversas tonalidades, mas de gosto idêntico. Eram os
florais e energéticos de que falaram. Uns brilhavam, outros espumavam. Enfim, bebi todos.
Apesar do ar condicionado, ainda sentia calor. É claro...tudo fruto de minha angústia e
expectativa. Um detalhe que reparei e ainda me lembro, é que ali não havia relógios!
Senti uma incrível revitalização de meu corpo. Só faltava voar, pensei naquela hora,
tamanha a minha disposição. No topo de minha cabeça, pude sentir também um leve ardor.
Sabia que ali estava minha pineal, a sede da alma. De repente, me acalmei. Sensação
indescritível! Autêntica paz profunda! Acabaram o medo e a tensão. Tive a certeza de que
estava preparado para o encargo crucial de minha vida ou, quem sabe, vidas!
Entrei na câmara. A tampa foi fechando vagarosamente. Olhei em volta e só deu tempo
para vislumbrar as silhuetas de Silveira, Sanches e Castro. O sono chegou de súbito.
Uma luz violeta ajudou-me a adormecer. Reabri os olhos e vi aqueles mesmos homens com
lanças luminosas correndo em minha direção! Dessa vez, não consegui escapar. Um raio me
atingiu! Ainda cambaleante, tentei me levantar. Em vão. Senti mãos me segurando,
encaminhando-me à força para uma fortaleza sem portas, nem janelas. Uma ponte elevadiça
desceu vagarosamente e entramos no local. Gritos ribombaram em meus ouvidos...
Formiga tem muitas casas antigas. Algumas, remanescentes do século 19. Quando
passava perto delas, um arrepio subia-me à nuca. A sensação era indescritível e desagradável.
Numa dessas casas, vivia um senhor que eu conhecia bem. Descendente de uma tradicional
família da cidade (não cabe a mim revelar seu sobrenome), tinha como maior patrimônio o
casarão de mais de dez cômodos em que vivia, ou melhor, sobrevivia. Sua aparência, apesar
dos 50 e poucos anos, era de um velho alquebrado, pois não fazia a barba e vivia mal vestido.
Bebia e fumava sem parar e, por isso mesmo, exalava um nauseabundo e peculiar
cheiro de tabaco misturado com álcool. Vivia cabisbaixo e, por ser solitário e taciturno, tinha
vontade de acabar com a própria vida. A cada procissão dos tantos enterros que aconteciam
na cidade, sentia inveja do morto e pedia a Deus que o levasse também. Mas, não tinha
coragem de se matar. Escondia suas frustrações na bebida. Tal ação o consumia aos poucos.
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PARTE 4
Enquanto isso, entrei na fortaleza, seguro pelos animalescos guardas que portavam as
lanças luminosas que tanto me chamaram a atenção quando do meu desmaio. Gritos de horror
ecoavam em cada canto. Horrorizado, vi criaturas sendo vilipendiadas indiscriminadamente.
Gritavam sem parar, pedindo por socorro. Era uma cena típica do “Inferno de Dante. Ao virar
a cabeça, reparei o grotesco serviço em cima de de um infeliz que acabara de "chegar".
Era o meu conhecido de Formiga que estava ali à minha frente! Debatia no chão,
tentando gritar. Estava engasgado com a água que entrava e saía sem parar de sua boca, cheia
de baba. Seus olhos, esbugalhados, se reviravam e sua língua estava toda para dentro,
obstruindo sua respiração. De seus ouvidos e nariz, saía um filete de sangue. Então, vi o seu
cordão de prata sendo brutalmente desatado - nesse momento, reparei que o meu cordão ainda
estava intacto, não sabia o motivo...ainda - por várias entidades de aparência repugnante.
Umas tinham formas humanas, outras tinham pelos no corpo e, o mais incrível, alguns eram
de formato ovóide, sem braços, sem pernas, mas eram animados, não sei explicar como.
Observei, ainda, que tentavam retirar a luz que vinha diretamente do peito do meu pobre
amigo. Concluí que ali poderia ser um dos chacras que ouvira na explanação na clínica. A luz
seria, claro, a energia daquela vítima que se debatia desesperadamente. Notei, ainda, que do
cérebro, buscavam um substância gosmenta, de cor cinza, onde encontraram grandes
concentrações de corpúsculos e neurônios que não paravam de mexer, como se estivessem
vivos. A retirada dessa substância cinzenta fora feita através da nuca. Depois, colocaram-na
num recipiente transparente. Buscavam, também, um líquido leitoso que saía em abundância
do umbigo do achacado ser humano, outra vítima dos algozes extradimensionais. Ele
esperneava sem parar, parecendo sentir toda aquela imoral usurpação de sua alma moribunda
e indefesa. Como se não bastasse, os malignos indivíduos, começaram a drenar a medula
espinal. O material, de cor avermelhada, foi armazenado em galões maiores, pois eram
abundantes. Ainda retiraram-lhe a pineal, a hipófise e o timo, guardando-as com cuidado.
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Não podia admitir que o livre-arbítrio pudesse ser tão “liberal” assim. Teria que haver
algum controle da “parte” rotulada de positiva! Por quê tanta condescendência? Afinal, que
polaridade prevalecia no Universo? Pelo menos no nosso contexto, dentro de nossos padrões
de comportamento, aquilo que eu estava vendo era imoral, negativo e absolutamente contrário
à natureza cósmica do ser dito inteligente e racional! Então, por qual motivo acontecia?
Após literalmente "desenergizarem" o infeliz espírito, que àquela altura jazia quase
inerte no chão, aplicaram-lhe uma espécie de injeção, paralisando-o totalmente. O serviço
havia terminado. A energia vital, extraída do cérebro, glândulas e órgãos fora aproveitada para
se tornar "carga" da bateria que tinha como propósito inverter o lado prevalecente do nosso
Planeta! Uma autêntica alquimia às avessas! Os espectros demonstraram intensa satisfação
por mais uma missão cumprida. Como disse, cenas semelhantes à que eu acabara de ver,
aconteciam em vários blocos. Espíritos recém-desencarnados, no caso, vindos de Formiga,
não paravam de "chegar"... e não paravam de ser assintosamente “drenados”! Infelizmente,
nossa cidade ainda iria passar pelo pior...
O céu estava sem estrelas: cenário ideal para tanto horror e degradação. Súbito, ouvi
galopes se aproximando. Uma espécie de diligência, conduzida por cavalos malhados, cujos
olhos soltavam faíscas, então, parou perto do vasilhame onde estava armazenado o precioso
conteúdo "roubado". Cuidadosamente, colocaram o material dentro do veículo. O condutor,
estranhamente coberto por uma manta reluzente, deu uma chicotada para o alto e a carruagem
saiu em disparada. O som do galope e os estalos de chicote ecoaram no vale pantanoso,
fazendo coro com os gritos e lamentos...
O trabalho fora dado como de fato terminado. A seguir, pegaram o inanimado corpo
espiritual do meu amigo formiguense, e o jogaram numa vala, onde havia outras carcaças sem
sinal de vida de qualquer espécie. Lembrei-me dos campos de concentração nazistas (afinal,
quem copiara quem?). Aqueles invólucros, que um dia foram pessoas normais como eu,
permaneceriam ali: estagnados no tempo e no espaço. Apesar de todas as minhas indagações,
reforcei meu desejo de contribuir ainda com mais fervor contra tal iminência. Os maus
augúrios estavam no ar e, se dependesse de mim, nada aconteceria! Reanimado, aproveitei a
distração dos boquiabertos guardas e deles me desvencilhei. Mesmo com dificuldades, pois o
chão era lodoso, escapei e corri sem sequer olhar para trás. Assustados, os guardas correram
em minha direção, soltando jatos de luz que passavam raspando o meu corpo astral. A
sensação era idêntica à um pesadelo, no momento em que tentamos correr e não conseguimos
galgar um passo. O cansaço chegou rápido e, quando ia desistindo, surgiu uma luz ofuscante
bem à frente. Fiquei na dúvida. Entrava nela, ou cedia e me tornaria prisioneiro novamente?
A situação era de puro desespero! Não hesitei mais e entrei naquela luminosidade!
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PARTE 5
Dentro do facho luminoso, cobri os olhos para proteger-me. Respirei fundo e senti um
relaxante calor correndo pelo corpo. Um leve toque bateu-me aos ombros e uma voz suave,
mas firme, sussurrou:
Entendi, em parte, as palavras metafóricas advindas daquela pessoa que irradiava luz
por todos os lados. Sua presença deu-me segurança. Mesmo assim, estava apreensivo.
- Por quê permitem que as forças da inércia tentem transmutar a polaridade de nosso
Planeta? Por quê deixam que nossos irmãos sejam espoliados assim tão brutalmente, sem
poderem se defender, ou sem contarem com a habitual proteção espiritual, que têm o pleno e
justo direito de ter? Nosso mundo ficará negativo?", perguntei sem tomar fôlego, tamanha a
minha impaciência e decepção com as cenas que vira há pouco e a situação então presente.
- Cromaat! Assim seja feito! Tudo pode acontecer. Outras habitações do cosmos
sucumbiram dessa maneira, e outras tornar-se-ão parte do fictício lado oposto da energia! A
concepção de bipolaridade é ilusória. O Universo é uno, como o próprio nome induz.
Contudo, tal mistificação deve acabar, pois quando houver a percepção de que os opostos são
um, a discórdia cessará e se tornará concórdia, os inimigos serão amigos. Nesse momento, a
liberdade será definitivamente vivenciada, porque, a Terra, dentre outras orbes, será parte do
Todo, tornando-se o Universo, e não apenas a metade dele...
Lúcio, o ser da Luz, todavia, finalizou com um aviso enigmático e nada auspicioso,
fazendo-me arrepiar de temor. Meu estado de espírito oscilava. Precisava dessa advertência!
- A tendência sempre estará voltada para o todo, a unicidade. Não há bom, nem ruim, a
natureza já é bela... No seu Sistema Solar, houve planetas que cederam às forças retrógradas,
uma vez que as vibrações negativas eram intensas e constantes, inibindo o contrário. Nesse
momento, as duas facetas surgirão. O Sistema Solar poderá contar com mais um planeta com
vibrações similares àquele que chamam de Plutão: a Terra! Seu caminho será árduo e o seu
sucesso não dependerá dos seres da Luz. Não bastará somente a destruição da usina que está
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sendo abastecida das energias dos seres indefesos. Chega de retóricas, de poesias, de
romantismos e lirismos lançados ao léu! Teorias terminam quando práticas começam. Faça a
sua parte. Cumpra o seu dever. Mas, atente para o seu corpo material, pois a escolha poderá
ser difícil de ser decidida. O arbítrio impera... infelizmente...
Fiquei ainda mais atônito com tanto enigma. Por quê atentar-me para o meu corpo de
carne, que jazia na câmara hiperbárica na clínica em Formiga? E que escolha seria essa?
Quem se envolveria? Dúvidas. Muitas dúvidas pairavam no ar. Então, ele desapareceu, assim
com surgiu. De repente, vi-me novamente solitário. Lembrei-me da transfoto com o mapa,
fornecido pelos pesquisadores Sanches, Castro e Silveira e peguei o caminho rumo à usina de
energias.
Enquanto ia em direção à usina, cujo caminho era rememorado, graças ao mapa que
tinha em mente, não tive outra alternativa, senão tornar a reparar em detalhes a tenebrosa
paisagem ao meu derredor. O mal personificado, estava ali espelhado. Era um verdadeiro
circo de aberrações. O pensamento negativo moldara o lugar. Seria o quadro que iria dominar
no meu mundo, caso falhasse? As árvores, deformadas, tinham galhos semelhantes a garras
que pareciam ter vida, pois não paravam de se mover como se quisessem pegar quem
passasse por perto. Havia abismos em toda parte. Redemoinhos intensos faziam os rios
ficarem revoltos. Suas águas eram enegrecidas e vaporosas e soltavam gases fétidos.
Tremores de terra aconteciam com freqüência. Às vezes, o chão se abria e engolia as pessoas
que nele se debatiam. Agradecia a Deus por ainda ter a chance de poder ajudar meu mundo e
livrá-lo da crueldade que queria tomá-lo à revelia das boas almas que ainda existiam. Como se
não bastasse, além de ter que destruir a usina, pululava em minha mente o estranho "aviso" de
Lúcio, para ficar atento ao meu corpo material. Não compreendia, naquela altura, como isso
poderia acontecer. Novas surpresas me aguardavam...
Pé ante pé, consegui entrar na usina. Na verdade, eu já estava achando estranho por
causa da facilidade até então encontrada. Ninguém por perto. As instruções eram claras.
Quando achasse a bateria carregada de energias, deveria forçar a minha mente e gerar a
explosão do complexo. Isso seria executado após prender a respiração, mentalizando
simultaneamente a explosão de tudo. Muito simples. Achei um enorme tambor. Ali deveria
estar a energia guardada. Preparei-me para efetivar o plano. Não deu tempo. Agarraram-me!
- Desta vez, você não escapa! - disse um guarda que na mesma hora passou em meus
pulsos uma espécie de algemas magnéticas, que me imobilizaram totalmente. Fui então
arrastado até o interior de uma casamata. Lugar sombrio e gelado. Escuridão total. O odor era
forte, semelhante a enxofre. De vez em quando, um gemido entrecortava o ar pesado.
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- Ah! Finalmente, capturamos mais um da casta! O potente está finalmente em nosso
poder! O plano chega à sua fase decisiva! - surgiu do breu uma voz soturna e arranhada, de
tonalidade gutural.
- Minha função é de sua ciência, mas não me roubaram as energias. Por quê? Quem é
você, e o que quer de mim?
- Um dos sete magos negros! Minha função é transmutar a circunscrição onde se situa
a cidade de Formiga, escolhida para ser o foco inicial da retomada do mundo terreno! Por ser
detentor de padrões atômicos especiais, de conformação atípica à maioria dos encarnados, o
escolhemos para que possamos utilizar seus padrões e complementarmos o planejado!
Comecei a captar o motivo de minha presença e o por quê de não terem me "sugado",
tal como fizeram com tantos outros infelizes.
- No seu corpo, estaremos livres de sermos apanhados pelo “cinturão de fótons”, que é
uma energia que tenta reciclar o planeta. Isto é, estaremos “enganando” as presenças que
vocês consideram aprazíveis. O choque dessa carga, poderia abortar a nossa intenção magna
de ‘corrigir’ essa parte da galáxia!
- Isto é um grande paradoxo, pois os seus servos sugaram as energias sem pedir
permissão. E como podem ter tanta certeza que a cidade de Formiga os apoiará? O que lhes
fazem crer que o mal vencerá?, ousei perguntar, mesmo temendo pela minha integridade.
- Como pode ser tão inocente, meu caro? As energias foram colhidas porque o torpor
pós-morte, nos permitiu fazê-lo sem exigências maiores. Agora, porém, vamos lidar com
pessoas que ainda têm o controle do corpo material. Como sabe, é com o corpo físico que
todos pagam seu carma, pois a matéria densa causa as dores necessárias Para que a matéria se
reconduza. Receio que na capa de carne, o ser humano tenha que aprender a se dominar, a não
sofrer. É o que não tem acontecido. Ele não sabe manipular sua vontade e é dominado por ela.
Não imagina que a liberdade de escolha lhe causa transtornos, justamente porque não
compreende que, controlando-a, poderá obter a tão almejada maestria. Mas, vamos oferecer-
lhes os prazeres da carne! Assim, só poderemos agir de fato e definitivamente, quando
obtivermos o seu consentimento através de sua livre e espontânea vontade.
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PARTE 6
- Eu não posso conceber esta idéia. Para mim, não passa de um delírio infundado!
Nossa cidade sempre primou pela decência e pelas ações positivas de sua bondosa
população! Isto, sem contar com as energias especiais que ali permeiam. Tanto, que existem
clínicas psiquiátricas gabaritadas e até uma agência de inteligência respeitada em todo o
mundo! Não seria agora que daríamos um passo na direção contrária! Ora, para mim, tudo
isso não passa de um pesadelo, um sonho ruim que vai acabar quando eu acordar...”, disse
com veemência, ao mesmo tempo, com receio de aquilo tudo ser de fato verdade. Afinal, tanta
coisa fantástica já havia acontecido que nada mais me surpreendia.
- Eis um humano tridimensional típico! Vocifera como sempre. Esboça suas vaidades e
tem a pretensão de duvidar de mim! Além do mais, vê-se que ainda não conhece bem os de
sua espécie! Como pode confiar em sua raça se a sua história diz o oposto? Se não vencemos,
deixamos seqüelas. Mas chegou finalmente a hora de transformar tais efeitos em forma, em
ação perene! Já disseram que os tempos estão chegados! Acertaram. O tempo principal surge
no ao nascer do sol, mas o seu brilho vai se esvanecer!.
O que o ser disse, soou como metáfora, mas seria uma realidade. Antes de questionar-
lhe o processo da tomada de meu corpo e o por quê, ele explicou. Eu ouvia tudo custando a
crer naquela realidade arrepiante. O fim estaria mesmo tão próximo?
- Sua sintonia e força psíquica estão no nível vibratório compatível com a carga de
energia armazenada em nossos reservatórios. Para efetuar a permuta corporal, liberaremos
bolsões energéticos e os projetaremos em forma de pulsos rítmicos. Nesse momento, dar-se-á
a ligação de nossas junções etéreo-corporais. O seu padrão genético, o GNA, me impulsionará
e me imunizará da contaminação fotônica que é a camada etérea de fótons que impede de
agir sem a interferência daquilo que chamam de forças positivas. É como nas vacinas: o
germe só pode eliminar os da mesma espécie. Dessa maneira, poderemos cumprir a segunda e
penúltima parte de nosso plano!
Dito isto, aplicaram-me uma injeção parecida com a mesma que eu vira aplicando nos
espíritos que tiveram suas energias roubadas. A paralisação foi imediata. Não podia sequer
mexer um dedo de meu corpo astral! Transformara-me literalmente numa estátua. O pior é
que eu estava consciente da situação. Foi um sono acordado, ou vice-versa...
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- O que poderá ter acontecido com o nosso agente? Terá tido o mesmo destino
daqueles infelizes? Não. Sabemos que suas características genéticas o protegeriam tal como
um escudo protetor. Então, como desapareceu por completo do nosso alcance? - disse
desesperado o “projeciologista” Castro, sob os olhares espantados de seus dois amigos
cientistas.
Os três então correram até o local. A porta estava caída ao chão. Como se tivesse sido
arrancada. Todos os objetos, aparelhos, enfim, tudo estava fora de seus lugares.
- Uma forte descompressão causou o impacto. Vejam, a câmara está vazia! Mas...como
o corpo desapareceu se nele não há vida?
Num gesto de autodefesa, Silveira tentou pegar uma arma com dardos tranqüilizantes.
Nem houve tempo de esboçar o movimento suspeito. Imediatamente, era brutalmente lançado
de encontro à parede. Nesse exato momento, os três ficaram paralisados, tal como eu e outras
vítimas estávamos no Outro Lado.
- Não adiantam gestos! O pensamento domina a matéria. Com este pesado transporte
carnal, poderemos concretizar mais uma etapa do processo que mudará este lugar que
chamam de Terra para a sua devida concepção cósmico-molecular!
Estupefatos e imóveis, os três viram o incorporado mago negro, deixar o lugar tomar o
caminho rumo a um dos lugares mais altos da cidade.
Conforme disseram para mim, ele saiu do prédio e, sem dificuldades, conseguiu
transpor a cidade sem ser percebido por eventuais entidades benevolentes que poderiam estar
no seu trajeto. As emissões fotônicas não lhe importunavam. Meu código genético o servia!
O local fora escolhido propositalmente. Naquele local existira uma igreja, já destruída.
Mas, ela ainda se encontrava no mesmo lugar, porém no astral...
Em silêncio absoluto, o ser subiu num antigo palanque, onde antigamente os padres e
autoridades assistiam às procissões e, sob os olhares atentos da população - que o fitava sem
entender porque ali se encontrava - falou em tom pausado e magnético:
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- Povo formiguense! Acaso, desejam que cessem em definitivo as constantes mortes de
seus entes queridos?
- Acaso, querem viver cercados de riqueza que fará inveja a qualquer outra cidade
deste país e deste mundo?
Novamente, o clamor afirmativo ecoou nos prédios e nas casas vizinhas. Alguns,
porém ficaram na dúvida. Eram os de índole menos maleável. Mas, as promessas estavam
sendo bem recebidas pela maioria intrigada, ainda que mirabolantes.
- A sua decisão será o passo inicial para um novo limiar que se aproxima! Sua cidade
foi escolhida como o ponto de partida para que o seu mundo se torne diferente do que é agora!
Neste lugar privilegiado há portas que dão para outros mundos de dimensões diferentes!
Daqui as locomoções interdimensionais acontecem sem interferências. Por isso, aqui será a
entrada e o início do novo paraíso terrestre!”
- Chegue logo ao ponto – disseram - como nos atraiu até aqui à nossa revelia? Como
sabe das mortes que estão acontecendo nesta cidade? Por acaso, é o responsável? Quem é
você, afinal? É mais um louco que quer aparecer? Vamos, manifeste-se! Prove que diz a
verdade! - gritou um dos líderes da cidade - que não me cabe aqui revelar seu nome.
- Perguntas: oportunas e corajosas. Não importa quem eu seja, o que importa é que
vocês são os eleitos para catapultar a Terra rumo à um novo tempo! Não importa saber a
razão, mas o que importa é que a sua escolha será decisiva. Seu livre arbítrio é que lhes
indicará o caminho a tomar. As leis do universo somente tornam efeito, quando há uma
escolha espontânea. Não podemos alterar o seu poder de escolha. A vontade impera e assim
deve ser. Por isso, para concluirmos o nosso trabalho, temos que contar com o seu aval! Vocês
pedem para eu provar que falo a verdade... Pois bem...
Para o espanto geral, o céu tornou-se cinza repentinamente. Nuvens negras e baixas se
formaram, como por encanto. O vento começou a soprar, uivando forte nos ouvidos da
população assustada, que fitava para o alto sem compreender direito a inusitada situação.
Uma chuva forte desabou sobre todos que tentavam se proteger. A ventania fez derrubar
algumas árvores. Surgiram então labaredas de fogo que se encarregaram de destruí-las em
poucos segundos, transformando-as em cinzas. Em seguida, e para completar, a terra então
tremeu.
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PARTE 7
Por pouco o pânico não se instalou. Porém, todos se acalmaram após um gesto do
mago negro. Tudo voltara como antes. Estarrecimento geral.
- Se acha que vamos aceitar, por que a troca? - gritou um dos espectadores presentes
na platéia alvoroçada e ansiosa, pois agora estavam certos que aquele homem falava a
verdade. Começavam a vislumbrar uma vida nababesca. Além do mais, as mortes freqüentes
iriam cessar!
- Dizem, neste seu mundo, que a mão precisa de outra mão para se lavar! Claro! A
mão não se lava sozinha! Esta é a lei do menor esforço. Portanto, população formiguense,
terão a vida que pediram ao seu Deus, mas há um preço!”
O silêncio que se fez naquele local foi constrangedor. As respirações pararam, como se
o tempo tivesse também parado.
O alvoroço foi intenso. Desmaios aqui, choros acolá. Desespero. Ninguém acreditava
no que via e ouvia. O pior é que a brusca revolta dos quatro elementos já os havia convencido
que tudo o que ali se passara. Era a mais pura das verdades!
- É claro! Como disse, o seu livre arbítrio é o direito inalienável e que devemos acatar,
quer queiramos, ou não. Se assim for, terão o que merecem. Os elementos engolirão esta
cidade. Não restará pedra sobre pedra. Subsistirá a lagoa, que se tornará pútrida como nossos
pântanos em outras dimensões, além de rastros de uma civilização que teve a seu tempo, uma
oportunidade, mas que não utilizou-a ao nosso contento! Somente o pó indicará que aqui
existiu um povoado! Conquanto, dou-lhes uma chance: devem, até amanhã, até o raiar do sol,
decidirem o seu destino. Enfim, lembrem-se de Pompéia...
Fico cá pensando: meu corpo foi literalmente usurpado à minha revelia e as energias
daquele elemento nocivo, nele ficaram. Como é difícil sua higienização! Tenho um rosto
marcado? Este é o meu estigma... Não é à toa que ainda aqui estou confinado...
Então, o mago negro, deixou o local e desapareceu na multidão. Ninguém ousou olhar
para sua direção. Só viram sua sombra desaparecer no meio de todos. Naquela hora fatídica,
soube que uns ouviram nitidamente o badalar seco dos sinos da velha igreja do Rosário, que
não estava mais no plano físico... Sinal do fim dos tempos?
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Formiga literalmente parou.
Todos estavam apavorados. O dilema era inimaginável.
Apesar de tantas surpresas, ninguém ainda podia crer naquilo que presenciara.
Todavia, a súbita e rápida amostragem da “ira” dos quatro elementos, era por demais palpável
e insofismável. O ar, a água, o fogo e a terra foram manipulados de fato! Como? Valeria a
pena ceder os descendentes nascidos após 1971? Era digna a troca proposta? Nenhuma morte
e riqueza material seriam suficientes para compensar as perdas? E se não aceitassem?
A cidade seria tragada pelos ventos, pelos incêndios, pelas inundações e pelos terremotos?
Os religiosos mais convictos, agiam com moderação. Uns achavam que de fato o fim
dos tempos estava próximo, outros pensavam que "para Deus nada era impossível", e taxavam
o maluco como mais um falso profeta que iludira a massa, tal e qual tantos existentes.
Acreditavam que a repentina mudança de clima e os outros acontecimentos eram "apenas uma
coincidência metereológica”. Outros, concordavam com os cientistas: tudo não passara de
uma alucinação em massa, nada mais. Por via das dúvidas, oravam sem parar. A igreja Matriz
e outros templos eclesiásticos estavam abarrotados. Cada um expunha seu pensamento e seu
voto. Ninguém passava incólume ao sinistro pleito. Todos, sem exceção, tinham que opinar.
Por outro lado, os políticos discutiam acaloradamente entre si. Uns achavam a
proposta nem tão indecorosa assim e prometiam “pensar no assunto, após consultar as bases”.
Mais uma pecha de ficarem ricos, sem ter mais que "roubar do povo". Os mais sérios, viam o
evento como um "acinte à cidadania e à dignidade humana". Além do mais, tinham filhos e
não queriam que eles fossem "trocados como mercadorias baratas."
O tempo de discussão era curto. Apenas meio-dia para discutir e votar. O amanhecer,
prazo final já estava se aproximando. E os jovens nascidos após 1971? Que achavam?
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PARTE FINAL
Ao término das votações, os líderes de cada classe e setor social se reuniram para que
fosse obtido o resultado final.
Estava decidido que o veredito seria dado em cima da hora aprazada, pois assim
seriam evitados os discursos prolongados e inócuos, que só faziam aumentar ainda mais a
ansiedade da população alarmada e desorientada.
O povo voltou a se reunir no local onde, um dia existira a velha igreja do Rosário.
Local de difícil acesso, íngreme, mas que cabia toda a população da cidade.
Na clínica, onde ainda estavam "presos" os meus amigos, Sanches, Castro e Silveira,
aconteceu algo sutil. Da janela, surgiu um filete tênue de luz solar que invadia a sala onde
estavam. Castro viu a esperança!
Então, ele reuniu todas as suas forças, e mentalizou o reflexo em cima de si próprio.
Imaginou-se todo tomado pelos raios do Sol.
E a visualização surtiu o efeito desejado. Pouco a pouco, foi se soltando das “amarras
magnéticas” que o atrelavam inexoravelmente. Seus companheiros presenciaram a cena
deslumbrados e extasiados pela boa nova.
- Achei a solução, meus amigos. Mentalizem esta luz de sol em cima de vocês!
Imaginem a sua força os libertando! É a força da natureza nos ajudando novamente!
Num passe de mágica, os outros dois também se livraram das correntes invisíveis que
os aprisionavam.
- Como conseguiu fazer isto, Castro? O que o inspirou a ter tão iluminada idéia?
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- Verdadeiramente! Essa emanação dinâmica tem a propriedade de influir
magneticamente nos campos de freqüência mais baixa, desfazendo-os completamente. Castro,
você pensou no momento certo! - complementou o reanimado Silveira, ainda trôpego por
causa dos ferimentos de quando fora atirado contra a parede pela entidade maligna que se
apoderara de meu corpo. Atordoados, mas animados, os três traçaram os planos para tentar
“abortar” as ações do mago negro!
- Já que não temos mais o funcionamento efetivo dos nossos aparelhos de TCI, o que
nos resta agora, é trabalhar para arranjar uma solução a fim de salvar nosso amigo que está
no Outro Lado, por certo ainda aprisionado como nós ficamos. Antes, temos de verificar para
onde foi aquele espírito que se apossou de seu corpo. Mas, devemos nos munir de proteção.
Temos de estar preparados contra as investidas daqueles que trabalham do lado oposto! - ao
que Castro propôs:
- Sim. À esta altura, o plano de transmutação da Terra deve estar adiantado. O dia está
raiando. Vamos criar mentalmente uma pirâmide de proteção! Devemos enchê-la de luz verde
esterelizante, a fim de que nenhum microorganismo astral possa nos atacar, sequer emanações
negativas de qualquer ser advindo da inércia extradimensional! Ficaremos ainda circundados
por um anel energético que fortalecerá ainda mais a nossa pirâmide, que se tornará
inexpugnável. Para confundir, o anel deverá ter uma outra freqüência. Devemos, inicialmente,
comunicar este plano, via telepática, com os outros que ora agem da mesma forma em
diversos lugares do mundo, tentando subjugar os outros seis magos negros. Depois, ficaremos
imunes e aptos para agir!
Assim foi feito. Em uníssono, os três mentalizaram ao seu redor, uma pirâmide
esverdeada e, em volta da mesma, uma capa protetora em forma de anel. Estavam prontos. A
transmissão do plano fora repassada para outros obreiros que lutavam contra o mal em todos
os cantos do globo terrestre. O Todo começara a atuar! Finalmente!
O mago negro, calmamente subiu no palanque. Somente seus passos podiam ser
ouvidos. Lentamente, o ar ia ficando carregado. A aflição era inevitável...
- Posso sentir que a decisão já foi tomada. O sol já aparece no leste. Será a única
testemunha de sua deliberação. Outros lugares estão fazendo o mesmo. Devo esperar a
unanimidade. O triunfo final está próximo! Pergunto-lhes agora: qual o destino que seu livre
arbítrio indicou para todos vocês, cidadãos de Formiga e da Terra?
O líder comunitário caminhou para o palanque. Respirou fundo e declarou com uma
surpreendente firmeza, vinda das suas entranhas, típicas de um formiguense de fibra.
- Senhor. Preferimos ser parte da história viva, do que parte de um presente sem vida!
Nosso povo prefere a morte digna do que a vida indigna. Acima de tudo, somos seres
humanos que prezam pela decência em detrimento do fugaz conforto material. O senhor
mostrou que comanda a natureza. Faça o que tem de fazer e nos deixe morrer em paz!
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Todos aplaudiram com um fervor jamais presenciado. Estavam ali pessoas que
amavam a sua cidade. Pessoas que amavam a si mesmos, acima de tudo! Como me orgulhei
de ser formiguense e terráqueo, quando ouvi essa passagem!
- Vejo que o erro ainda persiste. Bem, se já houve quem aceitasse nossas oferendas,
ainda há aqueles impetuosos que as recusaram, para o seu infortúnio! Este recanto será parte
do lamaçal mais danoso desta era! Preparem-se ímpios e covardes seres que se intitulam
humanos!...
Nesse exato momento, um novo tremor de terra fez com o palanque se desmoronasse,
fazendo com que o ser encarnado caísse de uma altura razoável. O pânico e o corre-corre
subseqüentes impediram-no de fugir. Além do mais, quebrara a perna com a queda, ou
melhor, a “minha” perna.
Foi quando surgiram meus três amigos. O espetáculo que se seguiu foi de rara beleza.
Jamais os olhos formiguenses presenciaram uma cena tão fulgurante! Raios de variadas
matizes surgiram no céu e em toda parte; estrondos e luzes diversas se entrecortavam em
pleno amanhecer! Um fantástico e real espetáculo espectral!
Travava-se naquele instante, em plena cidade de Formiga, uma autêntica luta do Bem
contra o Mal! E nas barbas do povo, impressionado, mas maravilhado pela oportuna ajuda dos
Céus! Tudo fora encarado naturalmente. Não houve mais histeria, parecendo que o povo já
estava preparado para o auxílio das correntes proativas!
Na verdade, Castro teria sido devidamente "inspirado" para agir no momento certo.
Fiquei sabendo que as forças do Bem ou do Todo, “esperaram” que as correntes antagônicas
atuassem até quase à conclusão de seu projeto hediondo, justamente para pegá-los com a
“boca na botija”. Assim, atingiriam um universo maior de entidades malignas, lideradas pelos
sete magos negros. Estes, também foram devidamente trancafiados em masmorras energéticas
de forma piramidal, totalmente intransponíveis, até que se arrependam de suas ações e possam
voltar ao caminho natural da evolução do ser vivente comum como todos nós.
Felizmente, mais uma vez, nosso planeta se livrou de se transformar num covil de
sangues-sugas do éter! Pelo que deduzi, foi a última chance a nós presenteada. Não iremos
mais seguir o caminho que o planeta Plutão tomou, tampouco repetir, em proporção menor,
os destinos de civilizações que pecaram em demasia, como Sodoma, Gomorra, Atlântida,
dentre outras tantas!
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O torpor veio depois. Imediatamente, o povo formiguense caiu em estado letárgico
coletivo. O objetivo era fazê-los esquecer aqueles acontecimentos. Não que os mortos
regressariam, mas pelo menos, iriam esquecer a presença de um dos sete magos negros e sua
proposta indecorosa, prontamente recusada por causa da índole positiva da população.
Assim, termina mais um “causo formiguense”. Conforme disse no início desta incrível
história, encontro-me ainda convalescendo-me da perna quebrada, num cubículo de uma casa
infestada de teias de aranha. Já o disse também: lugar com muita energia sempre atrai os
aracnídeos! Não obstante tanta energia, aqui não tem mais eletricidade. Por isso, escrevi tudo
numa antiquada máquina “Remington”.
Em tempo: soube que este acúmulo energético é fruto dos resquícios que meu corpo
ainda possui, por ter sido “utilizado” por uma entidade perniciosa. Devo avisar ao distinto
leitor deste Jornal que, enquanto esta casa não vem abaixo, passem, por favor, ao largo deste
local, que se encontra exatamente no número 471, da rua Barão de Piumhi...
FIM
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