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PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIC/PIBIC/UniCEUB

EDITAL DE 2018

PROJETO DE PESQUISA

Imaginários da Guerra Grande:


representações da Guerra do Paraguai
nas ilustrações da revista carioca Semana
Ilustrada (1865-1870)

PROFESSOR PESQUISADOR: FREDERICO CASTILHO TOMÉ

ALUNO PESQUISADOR: CLEUDON PAULO CARVALHO JUNIOR


I – INTRODUÇÃO

O tema do Projeto de Pesquisa ora apresentado – Imaginários da Guerra


Grande: representações da Guerra do Paraguai na revista carioca Semana Ilustrada
(1865-1870) – situa-se na confluência de recortes que se desdobram de uma
problemática inicial: quais projeções de nação emergiram do imaginário político
fluminense no contexto belicoso do conflito no Prata?
A Corte Imperial brasileira, na segunda metade do século XIX, já sentia o
impacto da aceleração do tempo promovida pela irrupção da modernidade. Passeios
públicos, teatros, bares, botequins, instrução pública, belas artes, vida noturna e outras
tantas práticas sociais passaram a fazer parte do cotidiano dos súditos do império,
principalmente daqueles situados no Rio de Janeiro. E entre esses novos padrões de
sociabilidade, especificamente no campo político, a imprensa ganha destaque. Surgida
com a instalação da Tipografia Régia, autorizada pelo príncipe regente D. João VI em
1808, a imprensa foi responsável pelo fomento de uma opinião pública localizada no
âmbito de uma esfera pública de debate. Por meio dos periódicos que se multiplicavam
pelas ruas da Corte, circulavam ideias e projetos de país alimentados pela urgência da
construção de um Estado nacional. E se o desenvolvimento do campo literário foi
tímido até os anos 1830, o que se presenciou após essa data foi uma explosão no
número de publicações destinadas a leitores das mais variadas matizes, atingindo por
meio de leituras coletivas até mesmo aqueles desprovidos da habilidade de decodificar
textos.
Coube à imprensa, juntamente com as práticas parlamentares, sedimentar os
projetos de Estado levados a diante pelos operadores políticos do Império. E para além
das dificuldades em se delinear as estruturas fundamentais da ordem estatal brasileira,
também enfrentou a imprensa a tarefa premente de projetar uma nação, cuja construção
ocorria de forma paralela e por vezes imbricada à edificação do incipiente Estado. Nesse
sentido, dentre as várias publicações relevantes que fomentavam a esfera pública,
destaca-se a revista Semana Ilustrada, publicada no Rio de Janeiro por Henrique Fleiuss
entre 1860 a 1875. Em suas páginas, constaram textos de nomes como Machado de
Assis, Joaquim Manoel de Macedo e Joaquim Nabuco, entre outros, conduzindo
magistralmente os debates que cercavam a consolidação do Estado e a elaboração da
nação. Porém, por mais relevantes que fossem os textos ali publicados, o que chama a
atenção nesta revista são as ilustrações, forma até então inovadora na tarefa de

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promoção de ideias. Faziam muito sucesso entre os leitores, e também entre os não
leitores, as revolucionárias caricaturas e charges que ocupavam metade das oito páginas
deste periódico, e mais passaram a fazer após a conflagração da Guerra do Paraguai, em
1865.
Esse conflito externo, conhecido pelos paraguaios como La Guerra Grande,
acabou por promover o encontro entre identidades e alteridades regionais brasileiras,
produzidas e reconfiguradas em processos estanques de modernidade cujos espaços de
experiência apontavam mais para trajetórias coletivas singulares do que para uma
unidade histórica. Em outras palavras, os brasis se encontraram nas contingências da
guerra, pondo em relevo uma percepção fragmentada que apenas ratificava a existência
de uma nação possível em detrimento de uma identidade única que compartilhava
estruturas simbólicas nacionais. Nestes termos, a busca que aqui propomos recai nas
seguintes questões. Qual nação se projetava dos traços da Semana Ilustrada? Manteve
essa publicação, do início ao fim do conflito, a mesma representação de nação que
muito alimentava o registro simbólico na esfera pública de debate?
E por que investigar tais representações na imprensa? Acreditamos ser a
república das letras um espaço público privilegiado de análise, constituindo-se como um
mediador de debates e legitimador de práticas políticas.

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II – JUSTIFICATIVA

O Projeto de Pesquisa aqui exposto, tendo como objeto de estudo as


representações sobre a nação brasileira no contexto de uma guerra na qual enfrentaram-
se forças de quatro Estados sul-americanos, justifica-se por ser relevante, viável e
original.
Relevante, pois tratará de um tema até pouco tempo desprezado pela
historiografia brasileira. Este silêncio não faz mais do que evidenciar um recalcamento
da energia pulsional ativada pelos traumas da guerra. A nação brasileira formatara-se
após o conflito às custas de um massacre. Era preciso então preservar os elementos
políticos e militares da responsabilidade da ação, ainda que fundamental para a
constituição nacional. E essa narrativa oficial e institucional perdurou até avançado o
século XX, perdendo força com a redemocratização dos anos 1980. Assim, o momento
atual ainda é favorável à revisão das bases analíticas e à formulação de novas visões
sobre o conflito em si e sobre o sujeito brasileiro.
É viável porque há disponibilidade de fontes, como se verá adiante. Além disso,
existe uma farta bibliografia a respeito da imprensa como lugar privilegiado de
investigação do político, como por exemplo Mudança estrutural da esfera pública, de
Jürgen Habermas e A revolução impressa – livro organizado por Robert Darnton e
Daniel Roche a respeito da imprensa francesa em tempos revolucionários (Habermas,
1984; Darnton, 1996) .
Por fim, a percebemos como original pois, seguindo os ditames de uma Nova
História Política agora alimentada por um conceito dilatado de cultura política, abraça
como objeto de análise ilustrações satíricas, ampliando as fronteiras que limitam as
escolhas sobre as tradicionais fontes documentais.

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III – OBJETIVOS

Objetivo Geral
• Analisar as representações sobre a nação brasileira publicadas na imprensa do
Rio de Janeiro, em especial na revista Semana Ilustrada, no contexto da Guerra
do Paraguai (1865-1870).

Objetivos Específicos
• Investigar o conflito platino sob o arcabouço conceitual de nação, regionalismo,
raça e identidade coletiva.
• Realizar uma revisão historiográfica sobre a Guerra do Paraguai, levando-se em
consideração o contexto de produção de cada tempo narrativo.
• Investigar os usos e apropriações da Guerra do Paraguai nas construções
discursivas dos projetos de poder do Império.
• Analisar o papel da imprensa no processo de construção da nação brasileira.
• Cotejar as representações da nação brasileira produzidas pela imprensa
fluminense com as realizadas por periódicos do Prata, nominalmente o El
Centinela, periodico serio y jocoso, publicado no Paraguai no ano de 1867.

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IV – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E REVISÃO DA BIBLIOGRAFIA

Não é de hoje que ecoam os anúncios de um revigoramento do Político. Desde


os oitenta do século passado rumores dão conta da retomada da História do
Acontecimento, posta em segundo plano durante décadas em favor dos preceitos
totalizantes que menosprezavam as contingências e as ações humanas como dimensões
significativas da interpretação histórica (Sábato, 2007). Contudo, a queda do socialismo
real e o desgaste das interpretações teleológicas e estruturais deram novo alento às
pesquisas que privilegiam as análises políticas, submetidas agora a interrogações e
temáticas inovadoras.
Na América Ibérica, esse fenômeno ocorreu concomitantemente ao desmonte
das ditaduras militares e à reconstrução democrática das instituições. Assim, ao passo
das “experimentações” e renovações no campo da História Política, surgiram
investigações, instigadas pelos problemas do presente, que tinham por objeto principal a
temática cidadã, aqui entendida como a maneira pela qual os indivíduos se relacionam
com o Estado, no exercício dos direitos e no cumprimento de deveres cívicos (Carvalho,
1996; Varella, 2012).
Na verdade, uma renovação na historiografia ibero-americana já aparece por
volta da década de 1960, quando um marxismo não dogmático, somado aos aportes
teóricos dos Annales, fundou bases para os estudos econômicos e sociais que
dominaram, pelo menos em termos quantitativos, as produções nos vinte anos
subsequentes. Data também dos sessenta um pensamento dito pós-estrutural, nascido
nos questionamentos radicais que culminaram nas revoltas antissistêmicas de fins da
década (Malerba, 2010). Negando o realismo, ou seja, a verdade totalizadora, e
baseando-se nas ideias de Michel Foucault e Roland Barthes, tal corrente enxergava na
linguagem e no discurso o local de construção das possíveis realidades. Novos temas
então foram trazidos ao debate, como a história das mulheres, dos negros, dos grupos
étnicos, entre outros, marcando assim uma pulverização dos sujeitos dos discursos
históricos. E a proliferação de trabalhos que utilizavam essas novas abordagens foi
dando vigor a outras propostas do pensar e do fazer a História.
Dois campos – o Cultural e o Político – foram beneficiados com a evolução do
marxismo e do pós-estruturalismo na América Ibérica, e de um certo entrelaçamento
entre eles, justamente no contexto político agitado dos anos 80. No primeiro caso, a
proximidade com a Antropologia criou espaços para os estudos das mentalidades, do

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cotidiano, da vida privada e do poder nas relações de gênero. Já no segundo, ganharam
destaque os trabalhos sobre os regimes populistas, bem como os referentes à construção
do Estado e da nação, sendo que esse último constitui um dos temas de História Política
onde a historiografia latino-americana apresenta significativa distinção.
Estando então sob a cobertura desta Nova História Política, e guiados pelos
referenciais teóricos de Reinhart Koselleck (2006), Peter Burke (2002), René Rémond
(1996), Pierre Bourdieu (2011) e Norbert Elias (2011), buscaremos dialogar com
autores que, em obras relativamente recentes, abordaram a nação brasileira no contexto
da Guerra do Paraguai, com destaque para Francisco Doratioto (2002), Vitor Izecksohn
(2002) e Ricardo Salles (2002), que procuraram enxergar o conflito como elemento
restante da política colonial. Além disso, percebem a guerra como ponto de virada do
Império brasileiro, no momento em que o reconhecimento da negritude brasileira
começava a criar constrangimentos nos projetos de construção identitária.
A hipótese aqui levantada é de que a Guerra do Paraguai está inscrita em um
complexo de relações fundamentais para a constituição da nacionalidade brasileira. Não
obstante, nossa intenção é comprovar que a nacionalidade brasileira, se projetada no
início do conflito a partir da unidade, rapidamente assumiu uma característica, uma
quase-essência fragmentária. Além disso, acreditamos ser possível encontrar nas
páginas impressas do Rio de Janeiro, em especial nas ilustrações da revista Semana
Ilustrada, representações que delineavam negativamente a questão da nacionalidade
brasileira, havendo então um prenúncio do bovarismo brasileiro já apontado por Sérgio
Buarque de Holanda e Maria Rita Kell (Holanda, 1995; Kell, 2018).
No que tange à revisão bibliográfica, há uma literatura abrangente que incide
diretamente sobre a questão aqui levantada. São vários os autores contemporâneos que
apontaram suas penas para os assuntos correlatos à nacionalidade e à Guerra do
Paraguai. Vale salientar que boa parte das obras selecionadas no presente projeto foram
escritas por pesquisadores que ainda estão em ritmo de produção acadêmica, ou seja,
que ainda podem rever suas posições, o que demonstra a atualidade da investigação
pretendida.
O revisionismo da historiografia brasileira contemporânea sobre a Guerra do
Paraguai está muito ligado à obra Maldita Guerra, de Francisco Doratioto (2002).
Questionando a visão consagrada da culpabilidade inglesa na dimensão da tragédia
paraguaia, este autor pondera que questões continentais fronteiriças, principalmente
aquelas de interesse imperial brasileiro, é que causaram e postergaram o conflito para

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além do ponderável. Para ele, foram o orgulho ultrajado do imperador e as correlações
de forças na tríplice fronteira, e não as práticas do imperialismo britânico, as reais
causas do massacre. Também tem importância nesse revisionismo a obra O Cerne da
Discórdia: Guerra do Paraguai e o núcleo profissional do Exército, de Vitor Isecksohn
(2002). Nela, o autor argumenta que muito embora o exército brasileiro tenha emergido
de fato deste conflito, manteve ele ainda um certo grau de distanciamento político e de
fragilidade institucional. Não só o exército, mas também todo o império saiu, embora
vencedor nos campos de batalha, enfraquecido na arena política. Para ele, a Guerra do
Paraguai representou o enlace final da nação, embora condenasse de morte o império,
mesmo que uma morte lenta. Por sua vez, Ricardo Salles chama a atenção para as
questões de recrutamento e racialidade no livro Guerra do Paraguai: escravidão e
cidadania na formação do exército (Salles, 2002). Para ele, a escravidão passou a ser
encarada como um problema do Estado e não mais como um assunto doméstico. Isso
porque a formação das tropas imperiais deixou em descoberto, segundo Ricardo Salles,
o peso do componente negro na constituição populacional do país, provocando assim
inúmeras questões e contradições. Pode um escravo ser soldado da pátria? Pode se
confiar a segurança do Estado a braços não-libertos? É possível equalizar os desejos de
liberdade com os interesses privados dos proprietários da força de trabalho? Como
manter a invisibilidade da negritude nas projeções de nação no pós-guerra? O mesmo
autor aponta que, não por acaso, a primeira norma legal que versava pelo fim da
escravidão, a lei do ventre livre, foi discutida e aprovada no contexto da guerra.
Sobre nação, cidadania e cultura política no Prata, apontamos para a obra
Ciudadanía política y formación de las naciones: perspectivas históricas de América
Latina, coordenada por Hilda Sábato (1999). Neste livro, encontramos a tese de que a
dissolução da ordem colonial na América espanhola implicou na instauração de normas
e mecanismos concretos de vinculação entre o conjunto da população e quem exercia o
poder em seu nome. Haveria assim um espaço de convergência, ainda pouco estudado,
onde a problemática da cidadania ganhava forma. As perguntas agora deveriam girar em
torno das formas de soberania, de participação e representação, da atuação na esfera
pública e em suas instituições. E amparada por renovadas ferramentas teórico-
metodológicas, uma outra geração deu atenção a essas novas possibilidades de
investigação, como Raúl Fradkin (2008) ao se debruçar sobre cultura política e ação
coletiva em Buenos Aires entre 1806 a 1829 e Pilar Gonzáles Bernaldo de Quirós
(2008) e seus estudos sobre as sociabilidades nessa mesma cidade.

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No Brasil, o campo conceitual foi repensado por István Yancsó (2000). Em
artigo publicado juntamente com João Paulo Pimenta, esse professor da USP procurou
apontar para a diferenciação semântica dos termos pátria, país e nação. Tal estudo
mostrou, com propriedade, um distanciamento entre Estado e Nação, essa última sendo
resultado da consolidação posterior do primeiro, processo no qual não faltaram
conflitos. Evaldo Cabral de Mello (2004), nesse sentido, trará a luz uma “outra
independência”, onde 1817 e 1824 ganham ares mais dramáticos de contestadores da
ordem emanada da Corte, inaugurando assim uma versão alternativa de nação brasileira.
E é José Murilo de Carvalho (2002) quem irá se ocupar mais decisivamente com
questões relativas à cidadania. Para ele, a ausência de um campo de convergência como
pontuado por Hilda Sábado seria o fator responsável por uma cidadania negativa, pois
esta existiria somente como reação contra a imposição de um sistema político-
burocrático que afetava as relações tradicionais, além da sombra constante de uma
realidade escravista e excludente. Outros tentaram colocar em evidência a existência de
forças até então renegadas, como o mundo negro de João José Reis (1991) ou as
práticas sociais em torno dos símbolos e festividades cívicas de Iara Lins Schiavinatto
Souza (1999).
No campo da imprensa da Corte, continua imbatível a obra História da Imprensa
no Brasil, de Nelson Werneck Sodré (1999). Utilizando um arcabouço teórico e
conceitual marxista, Sodré enfatiza as conexões superestruturais dos meios de
comunicação no Brasil com o domínio da infraestrutura pelas forças locais, associadas
ao mercado internacional. Para ele, já na primeira metade do século XIX operou-se um
controle político sobre a imprensa, retirando em muito seu caráter combativo e
questionador da ordem. A formatação de verdadeiras estruturas industriais ainda não
estava totalmente sedimentada nos tempos da guerra, segundo ele, mas já se apresentava
enquanto elemento embrionário. E sobre as possibilidades investigativas no que diz
respeito à inventividade e criatividade no selecionar das fontes, apontamos para o
trabalho de André Toral, Imagens em desordem: a iconografia da Guerra do Paraguai
(Toral, 2001). Nele, o autor procura entender o impacto do conflito no Prata a partir das
fotografia tiradas nos campos de batalha e envidadas para os centros urbanos brasileiros,
alimentando assim as projeções imagéticas das caricaturas impressas. Ou seja, para
André Toral, as representações produzidas pelos periódicos do império tinham por base
registros fotográficos que foram dando sentido real ao que se passava tanto na guerra
quando na percepção de irmandade nacional.

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Diante desse quadro, cabem duas indagações. Primeiro, há a possibilidade de
promover o cotejamento com as representações da nação brasileira produzidas tanto no
Rio de Janeiro quanto em Assunção? Parece exeqüível essa pretensão, já que tanto no
Paraguai quanto no Brasil os autores do Político usam as mesmas referências, de E. P.
Thompson, Quentin Skinner, Roger Chartier e Pierre Rosanvallon a Eric Hobsbaw,
Benedict Anderson, Jürgen Habermas e Hannah Arendt. Além disso, já ocorre uma
sinergia entre os historiadores brasileiros e paraguaios, além de argentinos e uruguaios,
com influências recíprocas e trabalhos realizados de maneira conjunta, ou pelo menos
coletiva.
Segundo, o que esperar de tal aproximação? Mesmo percebendo que não são
incipientes os trabalhos sobre a temática nacional, principalmente no Brasil, é possível
projetar caminhos que destoam do distanciamento secular entre as partes. Talvez, com
um processo de retorno ao trauma menos ufanista, seja possível estabelecer novas
considerações a respeito da construção da nação brasileira.

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VI – FONTES E METODOLOGIA

As fontes aqui elencadas foram selecionadas pelos critérios de relevância


histórica, circulação abrangente, tempo de publicação, diversidade ideológica e
disponibilidade de consulta. A princípio, serão analisados dois periódicos, um do Rio de
Janeiro e outro de Assunção. É importante frisar que a seleção aqui apresentada não é
exaustiva. Outras fontes, na esteira das indicações de Nelson Werneck Sodré (1966),
Galván Moreno (1944) e Daniel Ferret Jans (1986), poderão e serão chamadas para
compor o mosaico discursivo construído acerca da Guerra do Paraguai.
São essas as fontes. Do Rio de Janeiro, serão analisadas as ilustrações presentes
na revista Semana Ilustrada (1860-1875), principalmente no período correspondente à
Guerra do Paraguai, ou seja, 1865 a 1870. Vale lembrar que todas as edições da Semana
Ilustrada encontram-se disponíveis na página eletrônica da Hemeroteca Digital
Brasileira da Fundação Biblioteca Nacional. De Assunção, serão examinadas as
ilustrações presentes no jornal El Centinela: periodico serio y jocoso, publicado pelas
forças de Solano Lopes em 1867. Tanto quanto a Semana Ilustrada, todas as edições do
El Centinela encontram-se disponíveis na página eletrônica da Hemeroteca Digital
Brasileira da Fundação Biblioteca Nacional.
Já quanto à metodologia, a própria natureza da investigação pretendida a define
no âmbito da História Comparada, que apresenta certo grau de complexidade com seus
desafios e possibilidades. Promessa da historiografia ocidental durante o século XX,
teve em Marc Bloch um de seus incentivadores. Esse autor sugeriu duas perspectivas
para o desenvolvimento dos estudos comparados. A primeira, que houvesse certa
similaridade nos fatos observados e certa dessemelhança dos ambientes em que eles
ocorriam. A segunda, por ele preferível, apontava para um cotejamento de sociedades
próximas no tempo e no espaço que exercessem influência entre si.
Um estudo entre Brasil e Paraguai atenderia então a esses requisitos, mesmo
considerando o isolamento e a percepção mútua de estranhamento entre os vizinhos.
Boris Fausto e Fernando Devoto apostaram no método, sem contudo deixar de apontar
problemas em sua execução. Um deles – conhecimentos desproporcionais de um sobre
o outro – seria responsável por um desequilíbrio na coleta de dados e nas análises daí
resultantes (Fausto, 2004).
José D’Assunção Barros (2007) é outro entusiasta. A comparação, segundo
afirma, é uma forma específica de propor e pensar as questões, uma maneira de iluminar

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um objeto ou situação a partir do outro, além de iluminação recíproca. Também
enumera riscos e armadilhas a se evitar em História Comparada. O ‘anacronismo’, ou
seja, o transporte de um elemento de uma sociedade a outra sem o devido encaixe, a
‘leitura forçada’, isto é, a insistência em ajustar as realidades examinadas em modelos
inadequados, e a ‘ilusão sincrônica’, ideia equívoca de que todas as sociedades são
comparáveis quando em estágios similares de desenvolvimento, estariam à espreita do
investigador menos atento.
Outros problemas também aparecem nas considerações de Flávio Heinz (2009),
para o qual a suposição da eficácia dos estudos comparados em História é mais visível
do que os resultados alcançados, fazendo com que o método comparativo atraia
simpatias de um público que apenas realiza o comparativismo histórico, comum a todos
na Disciplina, nos moldes apresentados por Paul Veyne (1998). Para eles, a ausência de
um rol claro de procedimentos a serem seguidos e a exigência de maturidade intelectual
e erudição dariam o tom da complexidade da empresa comparativista, ainda com um
ritmo lento de crescimento.
Mas mesmo diante dos desafios apresentados, o horizonte para os estudos
comparados em História é promissor, já que o modelo de interpretação genuinamente
nacional – comum nos tempos de Bloch – tende a ceder espaço para os estudos que
transitam impunemente pelas fronteiras regionais e nacionais, tal como o gaúcho nas
páginas de Jorge Luis Borges.

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VII – PLANO DE TRABALHO E CRONOGRAMA

A realização deste trabalho está prevista dentro de um prazo de doze meses.


Neste período, várias atividades serão realizadas em etapas cronologicamente divididas
como demonstrado a seguir.

Atividades ago/set out/nov dez/jan fev/mar abr/mai jun/jul


2018 2018 2018/19 2019 2019 2019

Levantamento * *
bibliográfico
Contextualização * *
histórica

Elaboração do *
relatório parcial

Leitura-fichamento * * *
das fontes
Análise das fontes * * *

Elaboração do *
relatório parcial
Elaboração do * *
relatório final

O aluno Cleudon Paulo Carvalho Junior, vinculado ao presente Projeto de


Pesquisa, seguirá, sob a direta influência do cronograma acima exposto, o seguinte
Plano de Trabalho.

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Plano de Trabalho
Aluno pesquisador: Cleudon Paulo Carvalho Junior
Agosto-Setembro 2018
• Levantamento historiográfico sobre o processo de construção do Estado e da
nação no Brasil.
• Contextualização histórica.
• Relatórios mensais.

Outubro-Novembro 2018
• Levantamento historiográfico sobre a Guerra do Paraguai.
• Contextualização histórica.
• Relatórios mensais.
• Relatório parcial.

Dezembro 2018 – Janeiro 2019


• Leitura e fichamento das fontes: imprensa do Rio de Janeiro.
• Leitura e fichamento das fontes: imprensa de Assunção.
• Análise das fontes.
• Relatórios mensais.

Fevereiro-Março 2019
• Análise das fontes.
• Relatórios mensais.
• Relatório parcial.

Abril-Maio 2019
• Análise das fontes.
• Elaboração do relatório final.

Junho-Julho 2019
• Relatório final.

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VIII – ORÇAMENTO

O presente Projeto de Pesquisa não irá precisar de recursos orçamentários, já que


as fontes já se encontram disponíveis em meio eletrônico. Além disso, a bibliografia a
ser consultada consta, em grande medida, na biblioteca particular do professor
propositor desta pesquisa, na biblioteca do UniCeub ou nas demais bibliotecas da
cidade.

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IX – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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In: Revista de História Comparada. Vol. 1, nº 1. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007.

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