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O ESPAÇO DOMÉSTICO CONTEMPORÂNEO NO DESIGN DE INTERIORES: UMA RELAÇÃO FÍSICA,

SOCIAL E SENSORIAL
Profa. Ms. Eliana Maria Tancredi Zmyslowski
Este artigo aborda a inter-relação do espaço residencial doméstico contemporâneo com os habitantes desse espaço.
Percebemos cada vez mais na contemporaneidade a humanização entre os espaços, que fortemente é marcada
através da relação física, social e emocional, dos habitantes. No mundo contemporâneo percebemos que os espaços
domésticos estão mudando, ou melhor, se transformando em função, entre alguns fatores, do comportamento dos
habitantes desses espaços. Muitas mudanças culturais e sociais influenciam, e um dos fatores fundamentais que
contribui para essas mudanças é a inserção das tecnologias de informação e comunicação (TIC).

Palavras-chave: espaço, inter-relações e tecnologia.

1. Os espaços físicos, sociais e sensoriais nos espaços residenciais domésticos

Dentro de várias áreas do conhecimento que dão significados a palavra espaço, tomaremos para esse artigo
elementos baseados de significação na arquitetura.
Segundo Mirian Gurgel (2005: pg.26) “É chamado de espaço a área compreendida entre paredes, piso e o teto de um
determinado ambiente, ou ainda a área compreendida entre limite da marcenaria de um armário”.
Portanto, para um reconhecimento conceitual de espaço físico, será tratado nesse artigo como um espaço
construído, melhor dizendo, arquitetonicamente construído. Ao descrever graficamente o espaço construído através
dessa representação, geralmente usa-se um sistema de projeção ortogonal bidimensional – largura e comprimento.
Esse sistema estabelece uma relação geométrica com o espaço arquitetônico, que gera uma projeção tridimensional
- com três dimensões tradicionais - largura, comprimento e altura.
Neste sentido, podemos afirmar que a construção geométrica de um espaço construído vem conseqüentemente da
representação gráfica e física desse espaço. Aproveitando também o viés da arquitetura residencial para dar
significado ao espaço social, dizemos que ele determina ou é determinado por áreas que são setorizadas de acordo
com a função destinada a esse espaço, por exemplo setores; íntimos, sociais e de serviços.
Portanto, o espaço social é composto pelo mobiliário e/ou habitantes que pertencem a esse espaço residencial
doméstico e se apropriam estabelecendo relações sociais e funcionais que dependam do fim a que se destina.
“O espaço social, é o espaço destinado a sociabilizarão, deve ter uma atmosfera que propicie a convivência entre as
pessoas” (Gurgel, 2005, p.121).
“É a sociedade que produz o espaço social, através da apropriação da natureza, da divisão do trabalho, e da
diferenciação. O próprio espaço físico é também construção do imaginário individual e coletivo” (Fernandes, 1992,
pg.62).
O espaço sensorial é conceituado no espaço residencial doméstico através das relações experimentais com os
habitantes. Buscamos componentes abstratos que o definem em sua natureza física e social, a serem
experimentados emocionalmente através dos sentidos, como; visão, tato, olfato, entre outros. Portanto, o espaço
sensorial no espaço residencial doméstico é resgatado pelos sentidos através de seus habitantes. Dizemos que o
espaço sensorial é imensurável, instável e não linear.
Segundo Antônio Fernandes (1992: pg.69) “Trata-se de um espaço descontínuo, em correspondência com a própria
visualidade do mundo simbólico. É uma representação que resulta de uma repreensão sensorial e imagética da
realidade”.

2. As inter-relações nos espaços residenciais domésticos com o sujeito e a tecnologia na contemporaneidade

Percebemos nos dias de hoje, que os espaços residenciais domésticos, em uma grande parte das classes sociais,
culturais e regionais no Brasil, seguem ainda o mesmo modelo tripartido burguês francês do século XIX, que serve
como exemplo padrão de divisão e organização para espaços domésticos contemporâneos. Uma das características
marcantes de tal modelo é sua configuração interna tripartida em setor social, íntimo e de serviços.
Verificamos esse modelo repetitivo e refletido por várias vezes nos espaços residenciais domésticos principalmente
no Ocidente, que satisfaz a convivência social e familiar entre os habitantes. Também podemos verificar o mesmo
modelo em várias plantas e layout residenciais projetados por profissionais da área de engenharia e arquitetura.
Modelo padrão de espaços residenciais que mesmo sem limitações por paredes que dividem esses setores –
chamados “lofts” e também independentemente da metragem de sua área, localização ou mesmo padrão
econômico das regiões que eles situam. Contudo, esse modelo cria uma linguagem arquitetônica visual e espacial
entre as pessoas em que conhecem e compreendem independentemente de seus conhecimentos culturais, sociais
e regionais. Percebemos por exemplo, ao analisarmos uma planta atual de uma casa na cidade de São Paulo (ou em
qualquer lugar do Brasil), notamos claramente a presença da tripartição em setores: social (living, sala de jantar e
lavabo), íntimo (quartos e banheiros) e de serviços (cozinha, lavanderia e dormitório de empregados).
Respectivamente identificados no layout com as cores; vermelho, azul e amarelo. Percebemos que na imagem
abaixo possui uma distribuição nitidamente setorizada e compartimentada.

Figura 01 – Modelo tripartido de espaços interiores residenciais.


Layout decorado para um cliente criado pela autora do artigo.

Portanto, ao abordar esse assunto, percebemos que o habitante busca através da semelhança e associação ao
modelo tripartido que acaba sendo adequado ao seu perfil e transferido ao seu espaço residencial doméstico. Para
tanto, é notável o quanto o espaço influencia o sujeito, e como o sujeito é influenciado pelo espaço. E também o
quanto o espaço traduz o comportamento e o perfil do sujeito. Esses dados são muito importantes para a
organização e hierarquização dos espaços residenciais domésticos e também para o atendimento das necessidades,
anseios e desejos, que são específicos e individuais para cada habitante do espaço. Cria-se um espaço construído
chamado de casa.
“Nota-se que “casa” não é apenas a edificação, o conjunto arquitetônico, ainda que possa ser tomado como tal, até
porque o que a define, em arquitetura, não é configuração espacial, mas seu uso. Grosso modo, a casa seria
resultante de uma modalidade de uso de um espaço construído, ou seja, quando atendesse às funções previstas para
operar como uma casa” (Brandão, 2002: pg. 64).
Os habitantes de uma casa como um espaço construído, faz dessa casa um lugar próprio, um lugar seu, personalizado
individualmente ou familiarmente. A casa como um lugar caracterizado por um espaço imaginário, um espaço
chamado de “lar”. Entretanto, para um espaço ser chamado de “lar”, precisa ter a participação não só física e social
do sujeito, mas também emocional. A casa é um espaço-lugar e o “lar” é um não-espaço/não-lugar. Para Marc Augé
o não-lugar é próprio da contemporaneidade, designado um espaço que não pode ser definido e construído.
Portanto, a casa e os seus habitantes criam um contato físico, social e emocional com esse espaço doméstico. Desta
maneira, podemos dizer que o espaço doméstico residencial, como “nossa” casa, pode “falar” por nós e se torna um
“lar”. Podemos dizer que os espaços e lugares estão interligados com os não-espaços e não-lugares.
Muitas mudanças culturais e sociais influenciam os espaços domésticos, e um dos fatores fundamentais que
contribui para essas mudanças é a inserção das tecnologias de informação e comunicação (TIC) que provocam
alterações e transformações nos espaços. Por exemplo, percebemos que antigamente os dormitórios eram muito
espaçosos e tinham apenas como mobiliário: a cama, o armário e quando muito uma cômoda, pois a sua função era
apenas de descanso e depósito de vestimentas. Hoje, os dormitórios são pequenos e triplicaram suas funções, nesse
espaço precisamos estudar, assistir televisão, jogar videogame, entre outras, exigindo um planejamento mais
detalhado para esse espaço.
A cozinha foi o primeiro e talvez, o principal, até os dias de hoje, espaço doméstico a sofrer modificações em seus
projetos espaciais devido à influência tecnológica. Antigamente, ela era espaçosa para receber muitas pessoas, um
verdadeiro local onde acontecia de tudo, desde o ato de cozinhar, conversar, receber, entre outros. Hoje, e pequena,
compacta, não recebe tantas pessoas, mas adquire máquinas para todos os tipos; trituradores, multiprocessadores,
purificadores, entre outros, além do sofisticado fogão, geladeira e freezer. As alterações e transformações dos
espaços domésticos estão diretamente relacionadas com a evolução da tecnologia em nosso cotidiano.
Perguntamos então - Será que os espaços estarão sempre em mudança em função da tecnologia?
De fato, percebemos que a tecnologia contribui para as mudanças e transformações nos espaços gerando sempre
um planejamento e projeto para que os mesmos surgem através de formas diferenciadas do padrão que estamos
acostumados a viver.
“Para pensar casas contemporâneas convém começar por suas transformações mais evidentes. Novas atitudes e
novas máquinas combinam-se produzindo novos espaços domésticos” (Brandão, 2002, pg.94).
Com isso, conseguimos perceber e compreender como a tecnologia pode influenciar na relação do habitante com
os espaços residenciais domésticos. De certa forma, ele é influenciado pelo habitante e como o mesmo interage
interferindo na sua relação física, social e emocional.
Podemos dizer que os espaços são reconfigurados, que estimulam os profissionais a criarem espaços residenciais
domésticos lúdicos, abrigando novas formas espaciais e novas funções, tornando os espaços um verdadeiro
laboratório de experimentações físicas, sociais e sensoriais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AUGÉ, Mac. Não Lugares. Introdução a uma antropologia da supermodernidade. São Paulo, Papirus, 1994.
BRANDÃO, Ludmila de Lima. A casa subjetiva: matérias, afetos e espaços domésticos. São Paulo, Ed. Perspectiva,
2002.
FERNANDES, Antônio Teixeira. Espaço social e suas representações. Porto-Portugal: Revista da Faculdade de letras
da Universidade do Porto, 1992.
GURGEL, Mirian. Projetando Espaços: guia de arquitetura de interiores para áreas residenciais. São Paulo: Ed. SENAC,
2005.
_____________. Projetando Espaços: guia de arquitetura de interiores para áreas comerciais. São Paulo: Ed. SENAC,
2005.

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