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Revista Critica Historica ‘Ano I, N*4, Junho!2010 Histéria e Antropologia: Relagdes Teérico-Metodolégicas, _ Debates sobre os Objetos e os Usos das Fontes de Pesquisa Irineia M. Franco dos Santos” Universidade Federal de Alagoas Resumo: O objetivo deste artigo é apresentar as principals rolagdes tedrico-metodologicas entre as areas de Histéria @ Antropologia e seus debates no uso das fontes de pesquisa ¢ escolha dos objetos. Sabe-se que as tematicas enfocadas pela Historia a partir da década de 1970 privilegiaram objetos de pesquisa até entéo pouco trabalhados na historiogratia o que levou a uma busce por referéncias de andlise das ciéncias socials. Assim, os estudos historicos dos grupos culturais © suas teméticas (religiéo, simbolos, arte, educacdo, relagées Comunitérias @ de poder etc) passaram a usar métodos de colsta de dados @ andlise com influéncias antropolégicas. Quer-se aqui, refletir o quanto esses usos s40 bem entendidos pelos pesquisadores @ como as duas areas se veer na produgdo do conhecimento especifico. antropolégico @ histérico. O cardter interdisciplinar (multdisciplinar) das ciéncias sociais © humanas deve ser discutide com o intuito de aprimorar as suas relagdes e esclarecer suas citerengas levando em conta as perspectivas polticas por trés das escolhas tedricas, Palavras-chave: Historia e Antropologia, uso das fontes, problemas tedrico-metodologicos Abstract: The objective ofthis article is to present the main relations theoretic-methodological between the areas History and Anthropology and its debates in the use of the research sources and choice of objects. One knows that the thematic ones focused for History trom the decade of 1970 had privileged objects of research until then little worked in the historiography what it led to a search for references of analysis of social sciences. Thus, the historical studies of thomatic the cultural groups and its (religion, symbols, art, education, communitarian relations etc) had Started to use methods of collection of data and analysis with anthropological influences. It is Wanted here, to reflect how much these uses well are understood by the researchers and as the {wo areas if they see in the production of the anthropologic and historical specitic knowledge. The character to interdiscipinary (to multidiscipline) of social sciences and human beings must be argued with intention to improve its'relations and to clarity its differences leading in aecount the perspectives poltcs for backwards of the theoretical choices. Key-words: History and Anthropology; use of the sources; theoretic-methodological problems “ Os Negros néo se sentem frustrados de sua Histéria porque eles jamais tiveram Historia, e nem desejeram ter uma. Coe os Gauleses ou os Germanos de antes da conquista romana ou que numerosos povos asidticos ou ocedinicos. Se eles desejassem hole crlar uma, seria o sinal de que eles queriam entrar no jogo _ do Mundo, que é, em grande parte, o jogo do Ocidente. (H. Brunschwig.’ Histoire Passée et Frustration en Atrique Noire)! Recusamos a teoria que nega a possibilidade de esorever a Historia da Africa Negra, deixando a este continente o direito apenas de uma einohistéria. Somos. or uma histéria de miitiplas fontes e polivalente que “Este texto fol apresentado como pelestra durante o | Encontro de Histéia: Histria de Alagoas, Hstoriografa e Documentagéo no Curso de Historia da Universidade Federal de Alagoas na mesa Abordagens Tedricas 6 ‘Metodolégicas da histéria, 24 de novembro de 2008, as 79hs. { Professora Assistant do curso de Histéra da Universidade Federal de Alagoas (UAL), Doutorenda em Histria Social pela Universidade de So Paulo (USP) "Annales, set-out, 1962 in Dirceu LINDOSO. Ligdes de Etnologia Geral: introdugéo aos seus estudos 6 principios, p.107. 192 Revista Critica Historica ‘Ano IN? 4, Junho!2010 tome em conta absolutamente todos os vestigios humanos deixados pelos nossos antepassados. (KLZERBO, A Histéria da Africa Negra, volume I, p. 17) Desde que o homem existe, a hist6ria existe. (...) A escrita fixa a meméria da historia, mas quem cria @ histéria é a vida social. (Dirceu Lindo. Liges de Etnologia Geral, p. 56) Sobre os conceitos A chamada “virada antropolégica” na Histéria deu-se nas décadas de 4970 e 1980 com a ampliagao de temas de pesquisa ligados & cultura’. De fato, ao voltar o olhar para a tematica cultural - movimento que ja vinha acontecendo na historiografia desde 0 século XVIll e intensificado com a Escola dos Annales — os historiadores puderam refletir objetos que, até entéo, estavam mais fortemente vinculados as pesquisas antropolégicas © etnolégicas. Um aspecto a ser levado em consideragao nesse novo momento do século XX so os contextos politico-econémicos do “teroeiro mundo" e as pesquisas sociais af desenvolvidas. As lutas de independéncia em Africa, contra os regimes totalitérios na América Latina e a valorizagao dos estudos culturais populares impunham novas necessidades a disciplina. Ou seja, percebia-se que, diferente do embate politico oficial, formas culturais subalternas serviam nesses contextos como instrumentos de contestagéo (no caso da América Latina), valorizagao e criagdo de uma identidade local de resisténcia em contraponto ao colonialismo (no caso de Africa), etc. Parte dos estudos histéricos sobre as culturas passaram a buscar referéncias tedricas, conceitos e ferramentas metodolégicas capazes de extrair um entendimento completo dessas realidades sociais especificas @ a se fazer a critica do tipo de producdo existente até o momento. A interdisciplinaridade nas ciéncias sociais @ humanas passou a ser uma aliada para tals estudos. [Tpavmbni elecal e material ~quase sempre heterogéneo, mas &s vezesreltivamente integra, outa vezes Farrer estagnicy,durve em sei conuma, mas suelo e continues tansfomagées, em ino que vere srerata nalieza dos seus elemenioe e ds epoces ~ consi po: a) por vars, noma, cnceios ertese untdos snes, modece de compotameni,tercas merase corpora, com filo cognava re eae ns sive, expressive, requlacre, maniuledor;b) ples objevagbes, supates,veclos mates 08 sere du mesos) pls mics mates pare a rogue ea reprodufo sol do hone que © prods fe desenvolvido intelramente pelo trabalho e pela interagdo social, patriménio esse geralmente herdado das eres pases, csi de cures soedaes,e somento em pequna pate produio ognaineric Feet aac teagaes wes — que os meres de uma delerinada socedae comparihamn. em vaiaus modiead pel orc podem sliver ter acess ou dle eprops tas conde, DIIONARIO DE SOCIOLOGIA. Cura. 174, 193 Revista Critica Histrica ‘Ano I, N°, Junho/2010 Historiadores, educadores e outros comegaram a utilizar, por exemplo, as metodologias de pesquisa-acao e pesquisa-participante numa clara afirmagao de posigées politicas vinouladas a pratica de pesquisas diversas. Minha preocupagdo é discutir parte da problematica criada nesse amplo contexto de produgao. Para ai identificar alguns caminhos de pesquisa aos estudantes-pesquisadores de Historia. Busca-se refletir aqui, em especial, a relagao interdisciplinar da Histéria com a Antropologia e a Etnologia. E necessério para isso apresentar sucintamente o entendimento que se tem dos coneeitos € das escolas tedricas utilizados nesse didlogo. Primeiro: o que se entende por Histéria. Segundo: 0 que se entende por Antropologia e Etnologia, Essa preocupagao nao é meramente didética. Ela indica a priori a escolha de determinados métodos e também o enfoque dado A pesquisa. Além do mais existem diferentes definigdes para estes termos ou Areas que se moditicaram @o longo do tempo em fungao de seus “usos e abusos"; mudangas de paradigmas, novas teorias que puseram em cheque as anteriores, tensdes Politicas no campo da ciénoia, etc, Faz-se util, pois, esclarecé-los. Para o historiador iniciante a definigao de sua disciplina, ou do campo de agao de sua area, nem sempre est claro. Multas vezes, em sala de aula, estudantes e professores ao falarem sobre histéria tém entre si concepgdes muito diferentes. Entre os pesquisadores é provavel que essa diferenga aumente consideravelmente j4 que af se colocam as balizas de escolas te6ricas, temas @ métodos. Dessa forma, a concepgao que apresento é aquela gue escolho como referéncia em minha pesquisa e que a meu ver expressa melhor a prética historiogréfica, como oficio e como praxis politica. Nao tenho a pretens&o de que essa definigéo faga eco total com aquela utlizada pelos meus colegas no Curso de Hist6ria. Entendo a Histéria como a ciéncia que estuda as transformagées na sociedade humana no tempo e no espaco. Sua Preocupagao 6 descrever, analisar e interpretar essas transformagdes numa relacdo dialética entre passado e presente. E ciéncia porque se esforga para que 0 conhecimento produzido. tenha ‘validade em si mesmo" e nao seja simplesmente “senso comum" ou meras opiniées eruditas. Para isso, desenvolve um ferramental metodolégico que sistematiza os passos para a pesquisa, sem amarrar o processo. A Histéria, jé dizia um mestre, é a disciplina que melhor desenvolve consciéncia critica. Seu proprio campo de acdo e 194

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