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Tecnologia Educacional: Atualização ou modismo?

Resumo: Inicia com algumas tentativas de definir o termo tecnologia, que tem
sido citado por várias pessoas que desconhecem o seu real significado. Em
seguida passa à discussão do que viriam a ser Tecnologias Educacionais, que
são elaboradas como soluções para problemas apresentados dentro da área
educacional. Em seguida é feita a distinção entre Tecnologia Educacional e
recurso didático. É recordada a presença das técnicas nas diversas sociedades
ao longo da História e em seguida abordada a presença de tecnologias nas
sociedades contemporâneas, destacando a substituição da racionalidade
filosófica pela racionalidade técnica e conseqüências desse fato, como por
exemplo, a influência da chamada Educação Tecnicista. Da Educação
Tecnicista, passa à abordagem do fascínio exercido pela tecnologia, discute
fatores contrários e favoráveis à presença de diferentes tecnologias nos
diversos campos de trabalho, assim como os exageros cometidos ao
considerar as aquisições de técnicas como o núcleo das atividades humanas. É
discutida a importação de tecnologias (e equipamentos) sem análise de reais
necessidades, assim como a conseqüente defasagem criada por esse tipo de
atitude, prejudicando pessoas impossibilitadas de rápido acesso a esses
meios. A influência do uso do computador na Matemática também é analisada.
Por fim, são analisadas posições opostas em relação ao uso didático do
computador, tanto sob a forma de máquina de treinamento como sob a forma
de instrumento a ser utilizado no desenvolvimento intelectual do estudante.

Palavras-chave: computador, comunicação, educação, tecnologia, tecnologia e


educacional .

1. Introdução
O texto é resultado de uma pesquisa de cunho bibliográfico, realizada com
objetivo de refletir junto a grupos de estudos o sentido da Tecnologia
Educacional como uma ciência e campo teórico de estudos.
Pode-se considerar as diversas tecnologias como algo presente no
cotidiano da humanidade desde os primórdios da civilização, mas o termo
Tecnologia Educacional parece exercer fascínio nas pessoas que
desconhecem o uso de recursos tecnológicos aplicados ao campo da
Educação. A partir desse fato, é necessário esclarecer alguns pontos de vista
do que viria a ser tecnologia Educacional, evitando assim desvios na condução
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das discussões concernentes ao assunto. Conforme afirmou Barreto (2003,


p.1), é necessário
trazer, para o centro da cena discursiva, o debate acerca dos modos
de aproximação das chamadas novas tecnologias educacionais. É
preciso introduzir algumas questões relacionadas à objetivação das
novas tecnologias no contexto educacional [...] novas [...] são as
tecnologias da informação e da comunicação (TIC), especificação que
demarca o seu pertencimento a áreas não-educacionais, no sentido
de produzidas no contexto de outras relações sociais e para outros
fins [...]

Além de realizar a discussão das questões mencionadas pela autora,


deve-se também ampliar as discussões sobre o que viria a ser novo ou antigo,
quando se trata de trabalho em Educação. Também é necessário discutir as
limitações das possibilidades de introduzir, nos meios educacionais, os
recursos tecnológicos criados fora desse contexto. Das discussões devem
resultar transposições didáticas que façam uso dos meios de comunicação
realmente úteis e necessários à Educação.

2. Tecnologia Educacional: um termo difícil de definir

Tecnologia Educacional é uma expressão freqüentemente citada nos dias


atuais. Além de citada de forma imprecisa, sem que as pessoas tenham noção
mais apurada do seu real significado, a expressão Tecnologia Educacional
parece carecer de uma definição mais precisa, sendo uso feito muitas vezes de
forma confusa.
A expressão Tecnologia Educacional é uma muitas vezes usada no lugar
do termo recurso material. Mimeógrafos, softwares, computadores e seus
periféricos, máquinas foto-copiadoras, retro-projetores, projetores de slides,
vídeo cassetes, aparelhos de DVD, televisão e aparelhagens eletrônicas em
geral são citados como Tecnologias Educacionais, quando na verdade são
apenas recursos materiais à disposição do professor.
Para Carvalho Neto e Melo (2004, p. 3)

[...] quando criamos uma solução para um problema construímos


conhecimento. Se a solução mostra-se eficaz, para um número
significativo de casos semelhantes, então estamos diante de uma
tecnologia! [...] uma tecnologia é uma solução elaborada que pode
ser aplicada em situações-problema semelhantes [...] tecnologia pode
ser entendida como um sinônimo para solução, solução que pode ser
aplicada a um problema ou a um conjunto deles (grifos do autor).
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A partir da conceituação apresentada acima, tecnologia pode ser


considerada como solução obtida para um conjunto de problemas semelhantes
entre si. Sendo assim, mimeógrafos, softwares, computadores e seus
periféricos, máquinas foto-copiadoras, retro-projetores, projetores de slides,
vídeo cassetes, aparelhos de DVD, televisão e aparelhos eletrônicos em geral
poderão ser considerados como tecnologias educacionais apenas quando a
utilização de qualquer deles estiver associada a uma atividade educacional (ou
seja, resolver algum tipo de problema ligado à ação educativa).
Seguindo o raciocínio apresentado no parágrafo anterior, já que cada tipo
de aplicação tem uma origem diferente, pode-se pensar em diferentes
tecnologias educacionais. Com o decorrer da História, tecnologias foram
criadas para substituir outras que existiam. Em cada época da História os seres
humanos desenvolveram tecnologias diferentes como soluções de problemas
que também eram diferentes. Em alguns casos, tecnologias que anteriormente
existiam continuaram a ser utilizadas em convivência com as criações mais
recentes. Como exemplo disso, a máquina de escrever pode ser citada, pois a
sua utilização não levou as pessoas a deixarem de produzir textos manuscritos.
Com a invenção dessa máquina, a localização da tinta usada na escrita passou
da caneta para uma fita que imprime caracteres numa folha de papel. Mesmo
depois da máquina de escrever passar a ser menos usada, em decorrência do
aperfeiçoamento dos editores de texto e impressoras, os textos manuscritos
ainda continuam a ser usados, devido à rapidez com a qual podem ser
produzidos, não necessitando ligar um equipamento eletrônico [no caso o
computador] para esse fim.
Outro uso indevido para o termo tecnologia educacional também é
consumado quando ele substitui a palavra mídia. Quadro [de giz ou para
escrever com caneta], papel, lápis, cinema, televisão, rádio, materiais
impressos em geral são apenas meios a serem utilizados para tentar transmitir
dados, que poderão ou não gerar informações usadas na elaboração de
conhecimentos. Para cada recurso material citado, a intervenção humana
determinará a utilização na solução do problema que se apresenta, ou seja, a
tecnologia a ser implementada.
Outro detalhe esquecido pelas pessoas em geral é a diferença entre a
mensagem e o meio pelo qual ela deverá ser apresentada. Por exemplo, a
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comunicação de uma descoberta científica recente pode ser realizada usando


um jornal impresso ou ema mensagem com os dados transmitidos pela
internet. A atualidade da descoberta não será invalidada pelo fato de se preferir
a primeira forma de comunicar e não a segunda.
Com respeito às mídias em geral, ainda pode ser lido em Carvalho Neto e
Melo (2004, p. 8) que

a mídia não é mensagem. Toda mídia, como meio que se interpõe e


viabiliza a interação entre pessoas participantes de um processo
educacional, não é o agente criativo; ela pode carregar mensagens e
informações, mas, por si só, é incapaz de produzir conhecimento,
pronto para ser oferecido.

Quando alguém critica um professor que prefira usar quadro de giz e não o
de fórmica branca, tentando enquadrá-lo como uma pessoa ultrapassada e
desatualizada em relação às novas tecnologias educacionais, comete um duplo
equívoco.
Um professor de Física Quântica pode usar um quadro de giz para
descrever os resultados obtidos em alguma pesquisa recente no seu campo de
trabalho. Isso não tornaria obsoleto o trabalho descrito. Diagramas e tabelas
podem ser apresentados escrevendo sobre o quadro. Certamente, caso
dispusesse de recursos visuais de melhor qualidade, isso talvez pudesse
colaborar para melhor esclarecer as idéias apresentadas.
Não pode ser esquecido que o quadro de giz é apenas um tipo de mídia,
surgida como auxiliar do professor na tentativa de fazer com que o estudante
entenda seu discurso. Até a invenção do quadro de giz, o professor tinha
apenas a sua voz como instrumento na tentativa de transmissão do saber.

3 . As tecnologias nas sociedades contemporâneas

As diversas sociedades conviveram e convivem com várias técnicas ao


longo da história, conforme já foi afirmado. Porém a noção moderna de técnica
se firmou com a consolidação, na Europa, da sociedade industrial durante o
século XIX. Passo-se a sua exaltar as inovações tecnológicas decorrentes de
descobertas científicas em detrimento das posições filosóficas, que não eram
aparentemente impulsionadas nem impulsionadoras dos avanços alcançados.
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O ser humano por trás dessas invenções, com a sua visão de mundo e seus
objetivos de vida, aos poucos passou ao segundo plano. A partir de então,
segundo Gonçalves (2001, p. 118), instala-se o primado da “razão científica”
que
[...] ganha dimensão inimaginável, daí a exaltação da ciência e da
técnica em oposição à filosofia especulativa e aos dogmas religiosos.
a “razão técnica” está preocupada com o agir-com-vistas-a-um-fim-
imediato, com a eficácia. Está ligada à intervenção do homem na
natureza, aos processos de trabalho [...] um dos campos da ação
humana [...] constituído também pela relação dos homens entre si,
mediatizadas por relações simbólicas, intersubjetivas [...] a “razão
técnica” tornou-se única razão (grifos do autor).

Com o desenvolvimento cada vez mais rápido de diversas técnicas nas


sociedades capitalistas, as relações do ser humano com os objetos parecem
ter sido substituídas pela noção do ser humano como um objeto apêndice
dessas mesmas técnicas. O relacionamento do ser humano com a natureza ao
seu redor cada vez mais é mediado pelas diversas técnicas, chegando à
aparência, em certos casos, da impossibilidade desse relacionamento sem a
intervenção de algum tipo de tecnologia específica.
Muitas vezes as inovações técnicas são vistas como necessariamente
inevitáveis e sinal de progresso da sociedade que conseguir alcançar o maior
número de renovações no menor intervalo de tempo. Em Gonçalves (2001, p.
119) a subordinação do ser humano à invenção técnica e a ocultação de
saberes nas sociedades industrializadas pode ser constatada a partir da
afirmação que
[...] agora é a máquina que faz [...] ficando o trabalhador subordinado
ao ritmo que o capital impõe [...] o saber fazer estava no próprio corpo
do trabalhador, já na maquinofatura há todo um saber contido na
máquina que o trabalhador vê diante de si, que não lhe pertence uma
vez que ficou transformado num mero apêndice dela, alimentando-a.

A maquinofatura permitiu um controle cada vez maior sobre o trabalhador


na sociedade capitalista, mudando relações sociais na tentativa de eliminar ao
máximo a subjetividade do ser humano ao se relacionar com o trabalho. O
trabalho a ser realizado passou a ser determinado por um grupo de pessoas
que, em relação aos executores das tarefas, representa uma menor quantidade
de indivíduos. Nas sociedades em que a relação entre trabalho intelectual e
trabalho braçal se constituiu como uma divisão de esforços, a criação humana
foi deslocada para dar lugar à execução de rotinas repetitivas por uma parcela
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cada vez maior da sua população, como condição de sobrevivência. Quanto à


perda da subjetividade de cada ser humano e a transformação de grupos
sociais em massas humanas, Gonçalves (2001, p. 121) observa que
[...] talvez resida aqui uma das razões da implantação dos chamados
sistemas de ensino de massa hoje. Assim, o extremo preparo de uma
parcela diminuta de trabalhadores corre paralela à não qualificação
da grande maioria. Aqui se coloca uma questão: o que significa a
natureza humana nesse contexto sócio-histórico específico?

Não se deve encarar o fato das técnicas assumirem papel de relevância


nas sociedades atuais como decorrência natural da evolução do gênio
inventivo humano, mas sim como uma tentativa de cada vez mais se controlar
a natureza e as individualidades humanas. Trata-se de um fenômeno histórico
e não simplesmente biológico.

4. Educação tecnicista

Como conseqüência da evolução tecnológica, existem seguidas tentativas


de aplicar na educação as mesmas tecnologias do mundo do trabalho. Essas
tentativas são realizadas mediante utilização de equipamentos ou das
diferentes metodologias de divisão do trabalho. Nos países dependentes em
relação às tecnologias [o Brasil se enquadra nesse grupo], são freqüentes as
tentativas de importar e aplicar essas tecnologias sem devidas análises de
necessidades, críticas dos métodos a serem utilizados e adaptações de suas
aplicabilidades. A partir desse tipo de comportamento, são geradas distorções
em relação aos contextos em que as técnicas importadas foram criadas. Até
mesmo a tentativa de diminuir a necessidade de mão de obra específica em
educação inspirou tentativas de adotar novas tecnologias.
A importação das tecnologias acaba por se transformar num fim, ao invés
de ser um meio de trabalho. Equipamentos e metodologias de trabalho são
importados e muitas vezes não existe necessidade ou possibilidade de
aplicações para eles. Isso gera desnecessariamente um problema, que é a
desqualificação dos profissionais sem possibilidade de utilizar as novas
técnicas, pelo simples desconhecimento da novidade recém chegada. Esse
contexto de importação, segundo Machado (1992, p. 98) se dá pelo fato de que
a Tecnologia
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[...] considerada amiúde a filha mui dileta da venerada Ciência, traz


consigo uma auréola de respeitabilidade, uma garantia de qualidade
que autoriza até a criar problemas que ela mesma se proporá a
resolver. Assim é que, por exemplo, a Tecnologia Educacional de
mão-de-obra [...] seria não qualificada? [...] e admitindo-se que não
fosse, por que não utilizar os recursos tecnológicos para “qualificar”
esta mão de obra em vez de marginaliza-la [...]

As tecnologias não se configuram como bens em si mesmas. São apenas


soluções desenvolvidas com finalidades de resolver problemas específicos. Os
problemas geradores do desenvolvimento de uma determinada tecnologia num
território demarcado, numa determinada época, podem não se repetir em outro
lugar, mesmo que contemporaneamente. Simplesmente importar determinados
meios materiais de forma a-crítica, como se eles fossem soluções definitivas
para os problemas educacionais de um país, acaba gerando despesas
desnecessárias ao mesmo tempo em que os problemas existentes podem não
ser resolvidos. Na década de 1970, um termo utilizado para justificar tais
importações era a “queima de etapas” no desenvolvimento do país. Segundo
Machado, (1992, p. 99)
[...] existem os que foram consultados e concluíram que, sem tais
recursos, não lograremos atingir o estágio de desenvolvimento
compatível com “o nosso destino histórico”, ou em outras palavras
“nós estamos perdidos” [...].

Existem pessoas que afirmam ser a Tecnologia Educacional um


instrumento de democratização da sociedade, sem levar em consideração o
fato desses meios não serem de fácil acesso à maioria da população do país,
por questões econômicas individuais ou orçamentárias dos poderes locais.
Assim, é possível notar que a posse dos meios qualificados como Tecnologias
Educacionais, pode servir como forma de controle social, separando os
estudantes em qualificados e não qualificados, pelo fato de dominarem ou não
determinadas técnicas.
Um exemplo do que foi exposto no parágrafo anterior é o fato das escolas
públicas terem sido equipadas tardiamente em relação aos estabelecimentos
privados. Os estudantes das escolas públicas acabaram prejudicados do ponto
de vista do manejo de equipamentos de informática, quando comparados com
aqueles que estudavam em instituições privadas.
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5. A atração exercida pela tecnologia

Pessoas que desejam fazer prevalecer o discurso da modernidade como


oposição ao atraso, sem maiores críticas em relação aos que utilizam meios de
comunicação considerados ultrapassados, fazem uso de certas dicotomias
[estático em oposição ao dinâmico, antigo em oposição ao moderno] na
tentativa de desqualificar o que não é recente, apelando para o que Machado
(1992, p. 100) classifica como
uma espécie de fascínio natural pelo Dinâmico, assim como pelo
Moderno, que obscurece o significado das relações entre os
elementos de pares como os citados e conduz a opções fáceis e
muitas vezes irrelevantes para o que se discute.

O fascínio e a atração exercidos pelos aparelhos eletrônicos resultantes da


evolução técnica em alguns campos, por vezes são utilizados por pessoas
interessadas em fazer avançar as vendas de equipamentos, como se apenas a
mudança da mídia utilizada pelo professor pudesse resolver os problemas de
ensino e aprendizagem.
Desde a década de 1970, até os dias atuais, a discussão a respeito da
utilização educacional de diversos meios de comunicação teve posta em
evidência as suas limitações, principalmente em relação às de ordem
econômica. Nessa época, foram feitas previsões (MacLuhan foi um dos que fez
tais previsões) a respeito da entrada dos meios de comunicação de massa nas
salas de aula como um processo inevitável e que também dificilmente poderia
ser contido. Particularmente no Brasil foi propagada a idéia da perda da corrida
na direção do desenvolvimento para os que não conseguissem acompanhar a
rápida evolução dos meios de comunicação.
Alguns discursos foram apresentados como exemplos de que seria urgente
acompanhar as mudanças resultantes da evolução dos meios de comunicação
de massa. O primeiro se refere à facilidade de massificação das informações.
Consecutivamente ao primeiro, poderia ser afirmado que os meios de
comunicação de massa seriam infalíveis na capacidade de reproduzir mais
rapidamente a informação. Em conseqüência dos dois pensamentos anteriores,
seria conseqüência lógica afirmar que a transmissão oral das informações (feita
pelo professor) não acompanharia a evolução vertiginosa dos meios de
comunicação. Em decorrência de tudo isso a não utilização dos meios de
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comunicação de massa seria um entrave ao desenvolvimento dos estudantes,


pois a transmissão instantânea das informações resolveria o problema da
defasagem de saberes.
Na década de 1990, o fascínio tecnológico foi desviado para um tipo de
meio que na década anterior entrou em ciclo de desenvolvimento mais rápido
que os meios de comunicação até então estabelecidos, sendo que esse ciclo
parece não ter mais fim: são as tecnologias de informática (mais precisamente
o computador de mesa produzido em larga escala), que chegaram rapidamente
ao cotidiano dos que vivem dentro e fora dessa indústria.
Na época em que esse fascínio se instalou, as opiniões eram quase
radicalmente opostas. De um lado os que aceitavam o uso do computador de
forma irrestrita e de outro, os que de qualquer forma se opunham ao uso desse
recurso. Em relação à presença maciça dos computadores nas escolas e os
exageros cometidos em decorrência das possibilidades de aplicações desse
instrumento de trabalho, Machado (1992, p. 108-109) afirmou que esse
aparelho
[...] deflagra ou alimenta uma corrida ansiosa, nos meios
educacionais, rumo aos equipamentos e às tecnicidades correlatas. O
computador é apresentado como um bem supremo, um atleta
velocista com uma memória de elefante, capaz de proezas
inimagináveis pelos pobres mortais, lentos e de memória curta. Sua
utilização efetiva, no entanto, tem-se caracterizado como um
espetáculo cuidadosamente produzido, cheio de luzes e fogos de
artifício, mas que carece de maior densidade, parecendo muito mais
um vôo entre o lusco e o fusco.

No início da década de 1990, as aulas de informática eram centradas nas


aprendizagens de como manusear os programas comerciais que eram
instalados no computador, quando ele era adquirido. O treino nas diversas
rotinas era aplicado como um fim educativo. Em seguida, durante essa década,
apareceram alguns exemplos de exploração das tecnologias de informática que
não mudavam a abordagem didática. Programas ditos educacionais foram
concebidos simplesmente utilizando a tecnologia informática para animar os
enunciados e as figuras dos livros didáticos, mudar as páginas com o auxílio do
teclado e apresentar essas imagens por meio do monitor do computador.
Outros programas também faziam apenas a substituição da calculadora
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comum ou do lápis e papel, por exemplo, em relação ao ato de executar


operações fundamentais em Matemática.
Alguns educadores afirmaram na época que a aplicação das tecnologias
de informática mudariam radicalmente a forma das pessoas pensarem
tornando quase ilimitadas as possibilidades de aprendizagem do estudante.
Porém eles esqueceram que apenas o meio não basta para transformar
qualquer ação em um processo educativo, pois a mensagem tem importância
no processo. Machado (1992, p. 104) criticou aqueles que esqueceram desse
fato, afirmando que
quando as atenções se centram nas técnicas de comunicação em
detrimento dos conteúdos, quando os objetivos a serem perseguidos
são suficientemente vagos [...] nenhuma alteração radical pode ser
esperada

No momento atual existe uma tendência em qualificar as tecnologias de


informática como novos meios de comunicação, em coexistência com outros
tipos de instrumentos de trabalho no ambiente escolar. Até mesmo nos países
em que o fator econômico não afetaria a adoção das tecnologias informáticas
de ponta, ocorreram análises confrontando a importância das aparelhagens em
relação aos conteúdos, métodos de ensino e preparação dos professores.
Fatores como a afetividade, por exemplo, não podem ser esquecidos na hora
de analisar as propostas pedagógicas.
Como meio de simplesmente apresentar dados, a eficiência da mídia
eletrônica [em especial a internet] não pode ser negada. Para uma pessoa que
saiba ler e navegar, buscar dados pode ser realização de qualquer horário,
desde que a aparelhagem funcione. Após os dados serem relacionados, a
utilidade deles como fonte de informação e base para formulação de
conhecimento dependem da ação do professor. O computador sozinho [assim
como qualquer outro meio] não serve como elemento de ensino e
aprendizagem significativa. A utilização de qualquer meio também depende da
atitude da coletividade responsável pelas práticas em aula. “[...] os mídia
eletrônicos, por mais sofisticados que pareçam, nunca serão suficientes para
desempenhar sozinhos funções docentes” (Machado, 1992, p.105).
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6. O computador e a Matemática
A respeito das influências que seriam decorrência do uso de computadores
nos trabalhos dos matemáticos, a formulação de novos conceitos dentro dessa
ciência e da renovação das metodologias operacionais, principalmente nos
estudos de nível superior, D’Ambrosio (1986, p. 103 a 105) afirmou que
conceitos matemáticos sempre dependeram de métodos de cálculo e
métodos de escrita [...] pode-se esperar que novos métodos de
cálculo e de escrita que os computadores e a informática oferecem,
permitam o surgimento de novos conceitos matemáticos [...] eles nos
permitem e solicitam considerar um novo aspecto das idéias
tradicionais [...] sempre houve um lado experimental na Matemática
[...] os computadores aumentaram rapidamente nossas possibilidades
para observação e experimentação em Matemática [...] uma nova
arte, totalmente de experimentação, está se desenvolvendo em todos
os ramos da Matemática [...] é agora uma questão de elaboração de
um plano adequado de ação [...]

A Matemática, como qualquer campo de atuação humana, também sofre


influências da informática. As rotinas de trabalho de um cientista matemático
não estão livres da influência das tecnologias informáticas. A respeito dessas
influências, das possibilidades de mudanças e também dos processos
essenciais que permaneceriam, pode ser lido em D’Ambrósio (1986, p. 105-
106) que
Matemática é também, e permanecerá, uma ciência de
demonstração. Mas o estudo de demonstração não é imutável. O
nível de rigor e grau de formalização depende do tempo e lugar [...]
hoje o ponto de vista mudou. Sempre que possível, faz-se uso de
uma demonstração de algum algoritmo que permite obter
eficientemente o objeto procurado.

Em relação à afirmativa acima, deve-se lembrar que o problema surgido


em relação aos irracionais levou os gregos antigos a tentar formular uma
geometria “sem números”. A noção de número irracional era um entrave na
época. Esse entrave foi satisfatoriamente resolvido a partir do século XIX,
juntamente com o desenvolvimento da Lógica Matemática e da Teoria dos
Conjuntos, o que possibilitou um “novo patamar” para o rigor e a
demonstração Matemática.
Mesmo com a possibilidade do uso de computadores acarretar mudanças
nas rotinas de trabalhos, a Matemática será cada vez mais necessária não
somente em relação ao seu aspecto de ciência teórica, mas também terá
campos de aplicação cada vez maiores. “[...] o uso de computadores e de
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informática exige mais Matemática, melhor compreendida, e levada a um novo


equilíbrio entre ‘pura’ e ‘aplicada’” (D’Ambrosio, 1986, p. 108, grifos do autor).
Com as pessoas liberadas dos problemas em relação às operações com
números e também da necessidade de memorizar fórmulas, a compreensão
dos conceitos e das propriedades matemáticas serão focos do
desenvolvimento de trabalhos, tanto do ponto de vista do Educador
Matemático, quanto do ponto de vista do matemático profissional.

7. Oposição de enfoques sobre o uso do computador

Se em relação aos softwares existem alguns que servem apenas para


comandar as ações de quem o utiliza, apresentando instruções a serem
seguidas de forma linear, também existem outros que servem a propostas
educacionais, nas quais o estudante é o foco da elaboração de conhecimentos.
No primeiro caso o programa é usado para passar instruções sem necessidade
de reflexões, visando ”não provocar conflitos cognitivos” (Almeida, 2000, p. 38).
No segundo caso o programa permite que o estudante comande a sua
construção seguindo uma abordagem construcionista. “[...]uma abordagem
construcionista, centra-se no pensamento e na criação, no desafio, no conflito e
na descoberta“ (Almeida, 2000, p. 38).
O aparente dilema estaria entre aperfeiçoar o ensino [na forma de
programação de instruções] ou elaborar softwares com possibilidades de servir
ao apoio do estudante na elaboração de conhecimento, invertendo o controle,
que passa da máquina para o ser humano.
É sabido, no campo da Educação, que o ser humano se apoia em sua
realidade concreta para construir imagens mentais do seu objeto de
aprendizagem. Essas imagens são abstraídas dando origem a novas
construções concretas e posteriores abstrações. O computador pode ser um
elemento de apoio a esse movimento entre o concreto e as novas
possibilidades de abstrações, caso seja deixado de lado o seu aspecto apenas
de instrumento de instrução e controle.
O computador tem a vantagem de acrescentar movimentos e sons ao
texto, dando movimento às imagens fixas usualmente encontradas nas mídias
impressas, possibilitando “[...] que o conhecimento que está sendo trabalhado
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tenha sentido [...] que a aprendizagem seja sintônica” (Almeida, 2000, p. 39).
Ao invés de simplesmente mudar páginas com o auxílio do teclado, um
programa para ensino de Física, por exemplo, pode ser usado na apresentação
de diversos tipos de movimentos e colisões, tendo como objetivo ilustrar o
estudo de forças, mas essa utilização do computador somente pode ser levada
a cabo se for realizada uma revisão de métodos didáticos acompanhada de
uma mudança na visão epistemológica a respeito do que é educação, dando
apoio às criações dos estudantes.
Outro fato é que deveria caber ao professor a escolha de trabalhar ou não
com o computador. A exemplo do livro didático, também pode acontecer que a
escola imponha ao profissional a utilização do computador por um número
mínimo de vezes durante o mês. Todavia, somente o professor é capaz de
avaliar a sua competência para uso desse aparelho como recurso didático.
Caso o professor opte por usar essa máquina, também ele deve estar livre para
escolher quais programas utilizar e em quais situações fazê-lo. Citando Dewey,
Almeida (2000, p. 50-51) lembra que
[...] toda experiência humana é social e decorre de interações, em
que estão desenvolvidas condições externas, ou objetivas, e
condições internas. A interação é decorrente do equilíbrio entre esses
dois fatores. O professor precisa identificar situações que conduzam
ao desenvolvimento [...] a máquina é vista como um instrumento
produzido pelo homem para regular interações e garantir
eficientemente determinadas conseqüências [...]

Considerações finais

Diferentes formas de tecnologias foram criadas pela humanidade ao longo


da História. Porém a consideração da técnica como centro da vida em
sociedade foi consolidada com a expansão do sistema capitalista no século
XIX. Desde essa época, a humanidade se vê cada vez mais cercada de
diversos meios de trabalho e comunicação, erroneamente chamados de
tecnologias. O termo tecnologia só é bem empregado ao se reportar às
soluções criadas para resolver problemas específicos. Assim, por exemplo, a
existência de um aparelho de fax pode não representar uma tecnologia, se não
for utilizado com o fim de enviar mensagens escritas por meio de impulsos
telefônicos.
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O termo Tecnologia Educacional, quando referido ao uso de algum meio


de comunicação sem que isso represente solução para qualquer problema na
área da Educação, também é uso impróprio dessa expressão. Muitas vezes o
fato de utilizar o computador em aula para um objetivo que não seja o
desenvolvimento de habilidades do estudante é confundido com o fato desse
uso representar a aplicação de alguma Tecnologia Educacional. Um livro
editado eletronicamente e que tenha a mudança de páginas realizada com
toques de teclas não apresenta em seu uso diferenças marcantes em relação
àquele fabricado em papel. Sendo assim, não se pode falar nesse caso de
mudança de tecnologia, mas sim da forma de comunicar dados.
Diferentes instrumentos de comunicação eletrônica [como rádio, televisão,
e vídeo cassete, por exemplo] foram usados em diversas tentativas de levar
alguns meios de comunicação de massa para o ambiente escolar durante as
décadas de 1970 e 1980. Porém foi feita simplesmente a substituição do
professor pelos instrumentos eletrônicos, na função de transmitir informações.
Esses fatos ocorreram sem que fossem analisadas as interferências desses
instrumentos na atividade do professor e quais seriam as possibilidades de
desenvolvimento do seu trabalho com a utilização de novas mídias.
É conhecido pelos profissionais atuantes na área da educação o fato de
que diferentes instrumentos de trabalho devem ser utilizados para diversificar
atividades didáticas e tentar melhorar a qualidade da aprendizagem. A
evolução dos meios de comunicação deve ser acompanhada pela sua
correspondente no meio escolar. Porém não se deve adotar qualquer
instrumento de trabalho pelo fato de ser novidade, sem que a real necessidade
de adoção seja estudada detalhadamente.
A implantação e inovação das Tecnologias Educacionais ultrapassam o
simples ato de adquirir instrumentos de comunicação e utilizá-los no ambiente
da escola. Também é necessário avaliar as reais necessidades do professor,
dos estudantes e da sociedade em geral. Isso feito, seriam evitadas aquisições
de aparelhagens muitas vezes caras e desnecessárias para o andamento dos
trabalhos em uma escola.

REFERÊNCIAS
15

ALMEIDA, M. E. Informática e formação de professores. Proinfo. Brasília:MEC,


2000.

BARRETO, R.G. As TIC na educação: das políticas às práticas de linguagem.


DataGramaZero, Rio de Janeiro, v.4, n.5, out. 2003. Disponível em
<http://www.dgz.org.br/out03/Art_01.htm>. Acesso em 14 abr. 2005.

CARVALHO NETO, C. Z; MELO, M. T. Afinal, o que é tecnologia educacional?


In: E agora professor? Por uma pedagogia vivencial. Disponível em
:<http://www.uniead.com.br/seminario/oquee.doc> Acesso em 27 fev. 2005.

D’AMBROSIO U. Da realidade à ação: reflexões sobre a Educação e


Matemática. 4.ed. Campinas: Summus, 1986.

GONÇALVES, C. W. A técnica, a sociedade e a natureza. In: Os


(des)caminhos do meio ambiente. São Paulo: Contexto, 2001, p.118-124.

MACHADO, N. J. Matemática e educação: alegorias, tecnologias e temas afins.


2. ed. São Paulo: Cortez, 1992.

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