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Organização Comitê Científico
Double Blind Review pelo SEER/OJS
Recebido em: 06.07.2016
Revista de Direito Sociais e Políticas Públicas Aprovado em: 17.12.2016
RESUMO
O tema aborda a intrínseca e necessária relação que existe entre a ordem econômica e sua geração
de impostos e a ordem social presentes no ordenamento jurídico brasileiro. De um lado, os alicerces
constitucionais do sistema econômico brasileiro encontram-se nos artigos 170 a 192 e de outro, não
opostos, mas interdependentes, o rol de Direitos Sociais insculpidos no art. 6º da Constituição
Federal de 1988. A possibilidade de efetivação dos Direitos Sociais através e pelo Estado, somente
será possível a partir da valorização do trabalho humano e da geração da renda, quer seja do
particular, quer seja do Estado e suas consequentes gerações e pagamentos de impostos, que
garantem através do Welfare State ou de políticas públicas a efetivação dos direitos sociais.
Amparado na ideia do ser humano como destinatário final das normas e embasado em uma
hermenêutica constitucional voltada para o pleno desenvolvimento do ser, é imperiosa a
interpretação do alcance da norma de forma prospectiva, voltada para a construção dos ideais plenos
de cidadania e sua consequente sociedade justa, fraterna e solidária, conforme os ditames
constitucionais. A ordem econômica é usada para referir-se à uma parcela da ordem jurídica que
compõe um sistema de princípios e regras, compreendido por uma ordem pública, uma privada, uma
econômica e uma social. Através do dispositivo constitucional podemos inferir que a ordem
econômica constitucional brasileira tem como fundamentos a valorização do trabalho humano e da
livre iniciativa privada e que por sua vez asseguram a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social. O presente estudo objetiva demonstrar a existência e a relevância da noção de
deveres fundamentais como categoria constitucional autônoma e demonstrar que os direitos
fundamentais possuem custos para sua efetivação e que esta efetivação se consolida pela geração e
1 Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP na área de concentração “Função
Social do Direito”, linha de pesquisa “Acesso à Justiça e as Constituições”. Mestre em Direito Penal pela Universidade
Estadual de Maringá (UEM). Professor efetivo da Universidade Estadual de Londrina (UEL) em nível de graduação e
pós-graduação; Professor convidado de pós-graduação em diversas instituições. Lattes:
http://lattes.cnpq.br/9128785672361403. Paraná (Brasil). E-mail: ajma.adv@gmail.com.
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Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo – FADISP - na área de concentração
“Função Social do Direito”, linha de pesquisa “Acesso à Justiça e as Constituições”. Mestre em Direito pelo Centro
Universitário de Maringá (CESUMAR). Pós-graduado em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica
do Paraná/PR. Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina/PR. Lattes:
http://lattes.cnpq.br/4726181643915483. Paraná (Brasil). E-mail: rogerio@capelari.com.br.
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Antonio José Mattos do Amaral & Rogerio Sato Capelari
ABSTRACT
The theme addresses the intrinsic and necessary link between the economic order and its generation
of taxes and social order present in the Brazilian legal system. On the one hand, the constitutional
foundations of the Brazilian economic system are in Articles 170-192 and the other, not opposites,
but interdependent, the role of Social Rights sculptured art. 6 of the Federal Constitution of 1988.
The possibility of realization of social rights through and the state will only be possible from the
value of human labor and the generation of income, whether the particular, whether the state and its
subsequent generations and payments taxes, guaranteeing through the welfare state or public policy
the realization of social rights. Supported the idea of the human being as an end standards and
grounded in a constitutional hermeneutics toward the full development of, is imperative interpreting
the scope of the standard prospectively, dedicated to building a just, fraternal and united, as the
constitutional dictates. The economic order, although it opposes legal system, is used to refer to a
portion of the legal system, which comprises a system of principles and rules, comprised of a public
order, a private, economic and social. Through the constitutional provision can be inferred that the
Brazilian constitutional economic order is founded on the value of human labor and free enterprise,
which are designed to ensure to all a respectful existence, as the dictates of social justice. This study
aims to demonstrate the existence and relevance of the notion of fundamental duties as an
autonomous constitutional status and demonstrate that fundamental rights have costs for its
effectiveness and that effective consolidates the generation and payment of taxes, which, in fact,
contributes to develop the spirit of citizenship in all members of society.
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A ordem econômica constitucional como proporcionadora da máxima eficácia dos direitos sociais: o
desenvolvimento da cidadania possibilitado pelos deveres fundamentais
INTRODUÇÃO
3 Para uma compreensão da evolução do Direito na contemporaneidade, conferir as seguintes obras: SCHIOPPA,
Antonio Padoa. História do Direito na Europa: da Idade Média à Idade Contemporânea, 2014; KELLY, John. Uma
Breve História da Teoria do Direito Ocidental, 2010.
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O tema do artigo aborda a relação que há entre a ordem econômica e a ordem social
constitucional brasileira. A efetivação dos Direitos Sociais através da via jurisdicional é um caminho
possível quando existir uma melhor interpretação e entendimento de que tais direitos, somente serão
efetivamente possíveis a partir da valorização do trabalho humano e da geração da renda, quer seja
do particular, quer seja do Estado que garante, através do Welfare State de suas políticas públicas, a
efetivação dos direitos sociais. Ocorre que tal compreensão dos direitos fundamentais, que os
classifica a partir de um critério de intervenção estatal no domínio econômico, se mostra incapaz de
aprender a essência do objeto que procura compreender. O presente estudo procura analisar tal
classificação a fim de apontar que a adoção dessa perspectiva termina por esconder um conceito
essencial na compreensão dos direitos fundamentais, qual seja: a noção teórica de deveres
fundamentais como categoria autônoma e sua importância na efetivação dos direitos sociais. O
presente estudo objetiva demonstrar, por meio de uma revisão da tradicional classificação de direitos
individuais como direitos “negativos” e direitos sociais como direitos de “prestações positivas”, a
importância da categoria de deveres fundamentais como categoria constitucional autônoma.
Como Jano, a divindade grega guardiã das portas, das mudanças e tradições (BULFINCH,
2001, p. 17), é possível afirmar que os direitos fundamentais – considerados aqui lato sensu, como
gênero – possuem duas faces distintas: uma voltada para os direitos fundamentais stricto sensu e
outra para os deveres fundamentais. Ambas, porém, se complementam intimamente estando unidas
metaforicamente pelo mesmo corpo. Uma perspectiva científica que procure esclarecer os contornos
gerais de uma das “faces” desconsiderando a outra, não será capaz de apreender a real essência do
objeto que procura conhecer. Torna-se necessário, assim, investigar a outra a face, a face oculta dos
direitos fundamentais.
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A ordem econômica constitucional como proporcionadora da máxima eficácia dos direitos sociais: o
desenvolvimento da cidadania possibilitado pelos deveres fundamentais
Para tratarmos da ordem econômica constitucional faz se necessário tecer algumas noções
sobre a ordem econômica, seus conceitos e finalidades.
Para Eros Roberto Grau, a ordem econômica, ainda que se oponha a ordem jurídica, é usada
para referir-se uma parcela da ordem jurídica, que compõe um sistema de princípios e regras,
compreendendo uma ordem pública, uma privada, uma econômica e uma social (GRAU, 2004, p.
51). André Ramos Tavares que também a concebe como uma ordem jurídica da economia,
definindo-a como sendo “a expressão de certo arranjo econômico, dentro de um específico sistema
econômico, preordenado juridicamente. É a sua estrutura ordenadora, composta por um conjunto de
elementos que confronta um sistema econômico.” (TAVARES, 2006, p. 81).
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O Art. 170 da Constituição Federal de 1988, em suave síntese, promulga que toda ordem
econômica de uma sociedade deverá ter como alicerce a valorização do trabalho humano e da livre
iniciativa para que esses alicerces componham uma sociedade permeada de justiça social, com o
intuito de promoção do desenvolvimento do homem4. Da dicção do preceito constitucional podemos
4
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:I -
soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do
consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental
dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional VI
- defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e
serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de
19.12.2003); VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e
administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995). Parágrafo único. É assegurado a
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inferir que a Ordem Econômica Constitucional Brasileira tem como fundamentos a valorização do
trabalho humano e da livre iniciativa privada.
Eros Roberto Grau assevera que esta caracterização principiológica, denota uma
preocupação com um tratamento peculiar ao trabalho que, “em uma sociedade capitalista moderna,
peculiariza-se na medida em o trabalho passa a receber proteção não meramente filantrópica, porém
politicamente racional”. Seguindo este raciocínio e conforme os dizeres de Nagib Slaib Filho, é
inegável que o trabalho diz respeito ao fator social da produção, “porém ele está muito além da
necessidade econômica de suprir as necessidades materiais, é uma necessidade, inerente à natureza
humana e ao instituto da auto-preservação e progresso pessoal”. (SLAIB FILHO, 2006, p. 702).
José Afonso da Silva por sua vez, alerta que nossa ordem econômica embora de natureza
capitalista, enfatiza que “dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais
valores da economia de mercado” (SILVA, 2001, p. 766).
A livre iniciativa capitulada no Art. 1º, inciso IV da Constituição Federal de 1988, como
segundo fundamento da ordem econômica, a seu turno também é fundamento da República
Federativa do Brasil. Trata-se, pois, também de “princípio político constitucionalmente
conformador”, que segundo Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior possui uma
densidade normativa, da qual se pode extrair a “faculdade de criar e explorar uma atividade
todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo
nos casos previstos em lei.
5
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania;III -
a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.Parágrafo
único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição.
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econômica a título privado e a não sujeição a qualquer restrição estatal, senão em virtude de lei”.
(ARAUJO; SERRANO JUNIOR, 2006, p. 466).
José Afonso da Silva comenta que a livre iniciativa consagra uma economia de mercado,
de natureza capitalista, já que a iniciativa privada é um princípio básico da ordem capitalista e afirma
também que “a liberdade de iniciativa envolve a liberdade de indústria e comércio ou liberdade de
empresa e a liberdade de contrato”. Porém, em contrapartida, Eros Roberto Grau reconhece e insiste
que a liberdade de iniciativa não se identifica apenas com a liberdade de empresa, pois ela abrange
todas as formas de produção individuais ou coletivas. (GRAU, 2004, p. 186-187).
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desenvolvimento da cidadania possibilitado pelos deveres fundamentais
Na mesma estrada, ressalta-se a lição de José Afonso da Silva que anuncia que a “justiça
social só se realiza mediante equitativa distribuição da riqueza” (SILVA, 2001, p. 767),
possibilitando que o capitalismo se humanize. Ocorre que, segundo Uadi Lammêgo Bulos trata-se
de “um dos instrumentos de tutela dos hipossuficientes, conforme Art. 6º da Constituição Federal
de 19886, que até hoje não saiu do papel. O espírito do neoliberalismo não conseguiu estancar as
desigualdades sociais, criadas e produzidas pela iníqua distribuição de rendas” (BULOS, 2007, p.
1238).
Por fim, para que ordem econômica, cujos fundamentos são a valorização do trabalho
humano e a livre iniciativa, que objetivam assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social deverão ser observados os princípios indicados nos incisos do art. 170 da
Constituição Federal de Outubro de 1998. Estes princípios, bem como os que já mencionamos, são
princípios gerais da atividade econômica, considerados núcleos condensadores de diretrizes ligados
à apropriação privada dos meios de produção e a livre iniciativa que consubstanciam a ordem
capitalista de nossa economia.
Nas palavras de José Afonso (1992, p. 288) os direitos sociais, também denominados de
direitos de segunda dimensão, encontram-se intrinsecamente entrelaçados à ordem econômica e
6
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010)
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Fábio Nusdeo (2000, p. 53) define a economia como ciência ou arte da organização, direção
e administração, que trata das relações do homem em sociedade e que o conduzem à satisfação de
suas necessidades. É a economia com caráter social, conceito metaindividual voltado para o coletivo
e que existe porque os recursos são escassos frente às múltiplas necessidades humanas e por isso o
direito se faz presente na economia, regulando esses interesses. Francisco Carnelutti, citado por
Fabio Nusdeo (2000, p. 65), diz que “Quanto piu economia, piu direito”, ou seja, quanto mais
economia mais se faz necessário o direito para regular essas relações.
A ordem econômica determina a ordem social. Através desta, é possível atingir os direitos
sociais presentes no Art. 6º da Constituição Federal de 1988 pois ao empregar o trabalhador, a
empresa garante a ele um retorno financeiro que advém de seu trabalho, gerando o sustento e
promoção de dignidade, e através dos tributos pagos pela livre iniciativa e demais cidadãos ao
Estado, este pode realizar suas ações afirmativas. É o próprio Welfare State ou Estado de bem estar
social. Só pode haver uma ordem social fundada na ordem econômica e neste caso destaca-se a livre
iniciativa, pois ela como fundamento da economia produz trabalho, e este sustento e dignidade ao
homem.
Ao governo cabe seguir uma sistemática de efetivação dos direitos visando cumprir e
efetivar os pilares constitucionais econômicos do Art. 170 da Constituição Federal de 1988: a
valorização do trabalho humano, a livre iniciativa e da busca da justiça social. Tais pilares que
sustentam a economia e, por consequência, a efetivação dos Direitos Sociais pelo Estado, pois
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através dos tributos arrecadados com a geração e movimentação das empresas e suas formas
indiretas de arrecadação, são de ordem imperiosa de proteção e efetivação pelo poder público que o
próprio texto normativo constitucional prevê a responsabilização do Presidente da República se
omisso for, conforme preceitua o Art. 85 da Constituição Federal. Os direitos sociais e econômicos
entrelaçam-se pois sem empresas privadas não há trabalho, e sem trabalho, não se pode falar em
valorização do trabalho humano e consequente promoção de sua dignidade humana.
Os direitos sociais como dimensão dos direitos fundamentais podem ser conceituados como
prestações positivas proporcionadas pelo Estado, enunciadas em normas constitucionais, que
possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos. São direitos que tendem a realizar a
igualização de situações sociais desiguais (SILVA, 1992, p. 289). Os operadores do direito devem
interpretar os direitos sociais como cláusulas pétreas, pois tais direitos representam uma garantia
elevada, de grande valor axiológico, encontrando-se dispostos como direitos fundamentais, com
caráter absoluto e intangível, não podendo ser modificado nem por Emendas Constitucionais.
A relação entre o mínimo existencial e a máxima eficácia dos direitos sociais pode ser
visualizada nas palavras de Ingo Sarlet (2001, p. 39), quando este diz que o mínimo existencial não
significa que os direitos sociais só são fundamentais quanto ao mínimo de suas possibilidades e a
sua relação entre exigibilidade de uma norma constitucional imperativa e a reserva do possível.
A norma constitucional que tutela os direitos sociais, oriunda da intervenção direta do poder
legislativo - um cumprimento ao princípio democrático e pluritarismo político - possui caráter
cogente tanto em sua aplicabilidade, “quanto ao dever de legislar” (CANOTILHO, 1993, p. 478).
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Pode-se entender que a reserva do possível - tanto pelo seu uso inequívoco pela doutrina
pátria em sua interpretação original de matiz alemã - é um verdadeiro entrave para possibilidade de
se extrair da norma jusfundamental posição ativa de direitos que versam sobre prestações fáticas,
como por exemplo, a efetivação dos direitos sociais. Conjugar a efetivação deste direito à reserva
do possível é muitas vezes um argumento para explicar a inércia do poder legislativo e a
incapacidade de interpretar teorias amplamente difundidas e aplicadas em países da Europa, no que
diz respeito à concretização legal de normas que efetivem esses direitos.
Como os direitos sociais demandam prestações de caráter material, estes dependem com
mais vigor de recursos financeiros (BITTENCOURT NETO, 2010, p. 146), que estão diretamente
ligados à produção e recolhimento de impostos pelos membros de uma sociedade que orbitam e
nascem na ordem econômica constitucional.
Também é função do Judiciário o controle dos atos dos demais poderes. Segundo Gilmar
Mendes (2009, p. 284) é função das cortes conferirem a tais direitos a máxima eficácia possível.
Aos juristas é autorizado na ausência de lei, a concretização dos direitos fundamentais, através da
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interpretação e os juízes podem e devem aplicar as normas garantidoras de tais direitos mesmo que
haja lei proibindo.
Segundo José Afonso da Silva (1992, p. 79) os direitos fundamentais, mesmo que não
regulamentados pelo legislador ordinário possuem aplicabilidade imediata, não devendo os
integrantes dos poderes do Estado procrastinarem sua aplicabilidade. Isto não significa que pela
inércia do legislador tal direito não será assegurado. Cabe ao Poder Judiciário interferir fazendo
valer tal direito. Celso Bastos (1992, p. 393) sobre isso ensina que:
Peca o Poder Legislativo ao se omitir de criar leis que visem à melhor efetivação dos
direitos sociais do cidadão e peca também, muito mais o Executivo quando em sua má gestão desvia
os recursos que deveriam ir para a efetivação dos direitos sociais e são destinados para outros fins,
muitas vezes ilícitos. Para Virgílio Afonso (2005, p. 46) os princípios são como Mandamentos de
Otimização; normas que exigem que algo seja realizado na maior medida possível diante das
possibilidades fáticas e jurídicas existentes.
Como observado, trata-se de aplicar os direitos sociais, que têm para sua realização, a mola
impulsionadora e geradora de recursos financeiros pautados em uma ordem econômica e financeira
constitucionalmente organizada e incentivada a todos os homens para que seu desenvolvimento seja
linear e contínuo, sempre observando os parâmetros de um mínimo necessário para sua plena
existência.
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7 ROVAN, Joseph. Citoyen d’Europe - Comment le devenir? Les devoirs avant les droits, 1993.
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fundamentais – quer em termos extensivos quer em termos intensivos. Nesse sentido, Nabais destaca
que a mais célebre das declarações de direitos – a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
de 26 de Agosto de 1789 – é uma declaração que rejeitou integrar uma declaração de deveres
(NABAIS, 2007, p. 3).
O esquecimento dos deveres fundamentais teria causas mais próximas. Dentre estas, o
professor de Coimbra aponta como motivos relevantes a conjuntura política, social e cultural do
segundo pós-guerra, por um lado, e o regresso a uma estrita visão liberal dos direitos fundamentais,
de outro. A primeira causa refere-se à preocupação dominante nessa época, pois, era necessário
exorcizar o passado dominado por deveres, ou melhor, por deveres sem direitos8. A segunda causa,
mais próxima, consiste num regresso a uma visão liberal estrita dos direitos fundamentais que
postula a rejeição da proposta de integrar também uma declaração de deveres às declarações de
direitos, sob o argumento de que numa comunidade liberal os deveres se identificam com os direitos
(deveres reflexos)9.
José Casalta Nabais salienta que a argumentação liberal contra os deveres apenas seria
válida face aos deveres correlativos dos direitos fundamentais, ou seja, face aos deveres que
podemos designar por deveres de direitos fundamentais. Afirma o professor português que “ela não
atinge os verdadeiros deveres fundamentais, os deveres enquanto categoria ou figura jurídica
autônoma” (NABAIS, 2007, p. 4). Isto, pois, enquanto parte ou face passiva de cada um dos direitos
fundamentais, os deveres correlativos de direitos estão constitucionalmente previstos nas normas
que consagram os direitos, dispensando a sua previsão constitucional direta ou expressa (NABAIS,
2007, p. 4).
O esquecimento da problemática dos deveres teria ainda, segundo Nabais (NABAIS, 2007,
p. 4-5), um outro suporte ou apoio suplementar nos dias de hoje:
Na verdade, esse desprezo pelos deveres está presentemente ancorado também
naquilo que podemos designar por discurso quantitativo dos direitos fundamentais,
um discurso que, convém dizê-lo, é mais amplo e perturba ou domina mesmo a
nossa visão da sociedade e da vida.
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Contudo, ainda é preciso indagar: qual é o fundamento dos deveres fundamentais? Para
Nabais existem duas espécies de fundamento: de um lado, a razão de ser lógica dos deveres
fundamentais e, de outro, o seu fundamento jurídico. A razão de ser lógica de tais deveres consiste
em ser a expressão da soberania fundada na dignidade da pessoa humana. Isto significa que o
Estado, e naturalmente a soberania do povo que suporta a sua organização política, tem por base a
dignidade da pessoa humana. Disto resulta que, “ao contrário do que se passa com os direitos, os
deveres fundamentais são, em larga medida, criação do legislador constituinte” (NABAIS, 2007, p.
6). Por seu turno, o fundamento jurídico dos deveres fundamentais "reside na constituição, ou talvez
melhor, na sua previsão constitucional” (NABAIS, 2007, p. 7).
Segundo José Casalta Nabais (2007, p. 7), isto significa que
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desenvolvimento da cidadania possibilitado pelos deveres fundamentais
Desta concepção decorre a ideia de tipicidade ou de lista fechada dos deveres fundamentais.
Isto é, “apenas podemos considerar como deveres fundamentais, entre os que o possam ser de um
ponto de vista material ou substancial, aqueles que figurem, de maneira expressa ou implícita, na
constituição” (NABAIS, 2007, p. 7)10. De tal modo, os deveres extra-constitucionais – idênticos na
sua substância aos deveres constitucionais – devem ser considerados como deveres puramente
legais, não havendo outros deveres fundamentais para além dos previstos na constituição.
Assim, tendo em mente certo paralelismo para com as características essenciais da noção
constitucional de direitos fundamentais oferecidas pela doutrina, seria possível afirmar que
(NABAIS, 2007, p. 8):
Os deveres fundamentais se configuram como posições jurídicas passivas (não
activas), autónomas (face aos direitos fundamentais), subjectivas (já que exprimem
uma categoria subjectiva e não uma categoria objectiva), individuais (pois têm por
destinatários os indivíduos e só por analogia as pessoa colectivas) e universais e
permanentes (pois têm por base a regra da universalidade ou da não discriminação).
10
Por outro lado, Nabais acrescenta: “Uma conclusão que, naturalmente, não impede o legislador ordinário de os impor
e sancionar. Muito embora tais deveres não possam ser tidos por deveres fundamentais, mas apenas por deveres legais.
[...] Uma ideia que é válida mesmo face a constituições que, ao menos prima facie, parecem conter uma cláusula geral
de deveres fundamentais. É o que acontece com a Constituição italiana, cujo art. 2º dispõe: ‘A República reconhece e
garante os direitos invioláveis do homem seja como indivíduo seja nas formações sociais em que desenvolve a usa
personalidade, e exige o cumprimentos dos deveres imprescritíveis de solidariedade política, económica e social’”.
(NABAIS, José Casalta, Op. cit. p. 7).
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Por fim, no que tange ao regime jurídico dos deveres fundamentais, José Casalta Nabais
destaca dois aspectos significativos: primeiramente, a existência de um regime geral característico
e, em segundo lugar, a inaplicabilidade direta dos preceitos constitucionais que preveem os deveres
fundamentais.
Quanto ao primeiro aspecto, Nabais (2007, p. 9) destaca que, não obstante autonomia e a
relativa independência dos deveres fundamentais face à figura ou categoria jurídica dos direitos
fundamentais, os mesmos participam do regime geral destes. Isto ocorria, pois, na verdade, haveria
um regime relativo ao estatuto constitucional do indivíduo, isto é, relativo aos direitos e aos deveres,
englobando ambas as espécies em um mesmo gênero.
Assim, de acordo com o entendimento do professor de Coimbra, também se aplicam
aos deveres fundamentais, nomeadamente, os seguintes princípios:
1) da universalidade ou da aplicação categorial, 2) da igualdade enquanto proibição
do arbítrio, 3) da não discriminação em razão de critérios subjectivos ou de critérios
interditos pela constituição como os que constam da lista, aliás bastante completa
do art. 13º, nº 2, da Constituição portuguesa12, 4) da proporcionalidade nos três
aspectos conhecidos (ou seja, da necessidade, da adequação e da proporcionalidade
em sentido estrito) relativamente à sua concretização pelo legislador, 5) da
aplicabilidade aos estrangeiros e apátridas, e 6) da tutela judicial (NABAIS, 2007,
p. 9)
Por sua vez, no que tange ao segundo aspecto – a inaplicabilidade direta dos deveres
fundamentais –, ao contrário do que ocorre em matéria de direitos fundamentais, as normas
constitucionais relativas aos deveres fundamentais não seriam diretamente aplicáveis aos seus
destinatários subjetivos. Isto porque os deveres fundamentais, por via de regra, “não têm o seu
conteúdo concretizado na constituição, sendo, pois, deveres de concretização legal” (NABAIS,
2007, p. 9). Todavia, “mesmo quando a sua concretização se realiza ao nível da constituição, o
legislador dispõe de uma ampla liberdade, nomeadamente para estabelecer as sanções aplicáveis no
caso da sua não observância” (NABAIS, 2007, p. 9).
Do exposto acima, é possível observar que a noção dos deveres fundamentais constitui uma
série de nuances e características demasiadamente importantes para que fique relegada às águas do
Letes – o mitológico rio do esquecimento que corria no Hades (BULFINCH, 2001, p. 325). Tal qual
o deus Jano, que possuía duas faces, o estatuto constitucional do indivíduo possui natureza dúplice
e apenas será corretamente compreendido quando, ao lado da noção de direitos fundamentais, for
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atribuída a devida importância à complexa categoria dos deveres fundamentais enquanto categoria
constitucional autônoma, em razão de suas inequívocas especificidades normativas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo tem como tema central a relação entre a ordem econômica e a ordem
social, buscando chegar à possibilidade da efetivação dos Direitos Sociais através do subsídio
necessário aos custos dos direitos fundamentais, demonstrando que esse caminho se faz possível
quando há a valorização do trabalho humano e da geração da renda, quer seja do particular, quer
seja do Estado que garante através do Welfare State ou de suas políticas públicas, bem como na
geração e no consequente recolhimento de impostos (dever fundamental de pagar impostos).
Considerando o ser humano como destinatário final das normas e embasado em uma
hermenêutica constitucional voltada para o pleno desenvolvimento do ser, é dado ao intérprete o
direito de interpretar o alcance da norma de forma prospectiva, voltada para a construção de uma
sociedade justa, fraterna e solidária, dentro dos parâmetros de legalidade constitucional.
Através da relação entre a ordem econômica e social, busca-se elucidar a compreensão que
só é possível a obtenção de garantia de direitos que tragam dignidade ao homem se o Estado tiver
uma Ordem Econômica voltada na valorização do trabalho humana, na justiça social e na livre
iniciativa.
Ressalta-se que o fato da teoria vigente sobre o mínimo existencial determinar a existência
de algo abstrato que garanta uma vida digna e este fundamentado na dignidade humana, princípio
iluminador que deve ser levado em conta pelo legislador, sob pena de suas leis emanadas serem
consideradas inconstitucionais, entende-se não ser digno o homem viver sem ter necessariamente o
mínimo que lhe garanta sua dignidade, sua vida. Tal garantia de padrões mínimos de dignidade são
produzidos pelo Estado que prioriza e incentiva o desenvolvimento econômico, como forma de
proporcionar aos seus jurisdicionados, através de recursos financeiros – que são oriundos da geração
e pagamento de impostos - aplicados à efetivação dos direitos sociais, uma vida digna.
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organizada em sua forma de produção econômica. Quando se diz mínimos necessários de direitos
sociais efetivados para trazer dignidade a alguém, tais percentuais não podem ser mensurados, pois
versam sobre algo subjetivo do indivíduo e o que é necessário para garantir a dignidade de um não
o é de outros. Sendo assim, não se pode dizer que tendo o homem alimento, moradia e saúde, este
pode ser considerado digno, e seus direitos estarão garantidos. Também, de igual forma, reduzir o
homem aos mínimos padrões de sobrevivência e a ele atribuir dignidade, não é fruto de governo que
governa para o povo e com o povo.
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necessário para que esse homem possa viver em sociedade, viver com dignidade dentro de sua
família.
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Imperiosa a busca por uma sociedade que contemple os ditames fundamentais de uma
Constituição voltada para a busca de uma sociedade justa, livre e solidária, pautadas no pleno
desenvolvimento da cidadania dos homens.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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