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BRANQUIDADE E RACISMO NO BRASIL: O BRANQUEAMENTO

ASSIMILACIONAISTA NA TRANSIÇÃO DA MONARQUIA PARA A REPÚBLICA


Renato Pasti1
Resumo: O presente artigo tem por objetivo fazer uma breve análise sobre racismo nas
relações socais, a partir do pensamento de branquidade expresso no contexto da transição
do Segundo Reinado para a República. O pensamento de branquidade é definido pela
naturalização do padrão branco, tomado como sinônimo de humanidade, ao passo que o
não-branco, nesse sentido, é discriminado, categorizado e negado, ou seja, posicionado
fora dos espaços de prestígio social (Feres Júnior, 2015). Neste trabalho, analisou-se o
conceito de branquidade, dando relevo às características que marcaram o racismo no
Brasil, principalmente, quanto ao racismo estrutural e à manutenção de privilégios por
meio da naturalização das formas de exclusão racial. Nesse sentido, a construção da
narrativa fundacional do Brasil, enquanto Estado-Nação, orientou o projeto de
branqueamento assimilacionista, com o objetivo de extinguir a população não-branca,
como se observa na obra Como se deve escrever a história do Brasil, de Carl Friedrich
Philip von Martius (1845). O recém independente Estado nacional forjou, através do ideal
de branqueamento, narrativas e símbolos que naturalizaram o racismo ao mesmo tempo
que justificaram a subordinação da população não-branca. Mesmo com a transição do
Império para a República, o branqueamento não interferiu na lógica racializada dos
privilégios sociais, resguardados à população branca. Significa, portanto, dizer que o
racismo se manteve, como modelo estruturante na distribuição das vantagens e
desvantagens, orientando os sujeitos, nos alinhavos do tecido social.
Palavras-chave: Branquidade; Branqueamento; Racismo Estrutural; Relações Sociais;
Privilégios

1. A BRANQUIDADE E A NATURALIZAÇÃO DO RACISMO

O branco como característica fenotípica foi ao longo da colonização, império e


república, marca que garantiu privilégios sociais e legitimidade de poder. Em
contrassenso a essa perspectiva as produções acadêmicas têm sido amplamente voltadas
à desconstrução dos estereótipos racistas, contudo, ainda pouco espaço é dado às análises
das relações de poder ligadas à branquidade e seu status quo (Cardoso, 2011, p.83).
Embora os questionamentos sobre os privilégios raciais da população branca tenham
surgido nos discursos de intelectuais negros como Aimé Césaire, Franz Fanon e W. E. B.
Du Bois, carece esclarecer que os conceitos de branquidade e branquitude são divergentes
entre si. Edith Piza nota que “[...] branquidade diz respeito a ser branco como uma
identidade social e cultural não demarcada racialmente e voltada para os valores do seu
grupo racial, geralmente associados a traços de racismo” (2005, p. 07). Para Bento (2002,
p. 29) esse é um dos “traços da identidade racial do branco brasileiro a partir das ideias
sobre branqueamento” remetendo a aceitação do racismo como forma de organização
social. No entanto branquitude representa uma outra dimensão de percepção onde o “[...]
conceito que expressa a aceitação, por parte de pessoas brancas, da existência de
privilégios e, a partir daí uma atuação consequente dessas pessoas no combate ao racismo
[...]” (Paterniani, 2016, p. 02). Contrariamente o pensamento da Branquidade tende a
hierarquização das relações raciais a partir do pensamento etnocêntrico europeu. Portanto
a utilização do conceito de branquidade segue o sentido acrítico que naturaliza o racismo
na medida em que esse se torna o modus operandi nas relações sociais. O conceito de
branquidade, segundo Garner (2007, p. 01), é polissêmico e orientado,
epistemologicamente, pelas relações de privilégios raciais gestados em espaços políticos
e sociais, onde, a partir do pensamento eurocêntrico, são pautadas as concepções de
superioridade do branco. Lourenço Cardoso lembra que a

[...] a investigação e análise sobre a identidade racial branca procura


problematizar aquele que numa relação opressor/oprimido exerce o
papel de opressor, ou por outras palavras, o lugar do branco numa
situação de desigualdade racial (Cardoso, 2010, p. 610).

No contexto colonial, as relações de privilégio/obrigação geralmente são


analisadas de modo a dar foco à escravidão, sendo raras vezes notadas as estruturas de
privilégios, onde foram erigidos os lugares de poder. Dar foco as análises pela perspectiva
da branquidade significa desnaturalizar os lugares de poder, associados aos privilégios
raciais da população branca. Sobre a universalização do que é branco e a discriminação
do não-branco, Garner ainda afirma que

A branquidade passou a representar humanidade, normalidade e


universalidade: “os brancos são não somente uma determinada raça eles
são apenas a raça humana” (1997:3). Se branco equivale a humano,
então tudo mais requer qualificação: tudo se torna desviante. Assim
para tornar o argumento mais claro, não é que a branquidade seja
propriamente invisível. Melhor expressão seria não Marcada”
[unmarked] (Garner, 2007, p. 34).
É notório que branquidade expressa uma certa unidade de percepção e
entendimento sobre o que é ser branco nas relações de poder, onde ser branco pode
significar estar no poder ou ser poder (Cardoso, 2008, p. 204). Portanto, o conceito de
branquidade marca o lugar dos privilégios normatizados, naturalizados e corporificados
pelas relações socais eurocêntricas, implementadas no processo colonizador e que se
enraizou institucionalmente na formação do Estado brasileiro. O ser branco pressupõe um
lugar de poder, de quem denomina, portanto, categoriza. Tornou-se na estrutura de poder
social, o elemento que normatiza a posição de privilégio, tornando “não marcado” o lugar
do opressor, na prática constituindo o racismo como simbionte2. Essa característica foi
notada por Lilian Moritz Schwarcz ao analisar dados de uma pesquisa feita pela USP, no
ano de 1988, onde revelam que

97% dos entrevistados afirmaram não ter preconceito, 98% disseram


conhecer, sim, pessoas e situações que revelam a existência de
preconceito racial no país. Ao mesmo tempo, quando inquiridos sobre
o grau de relação com aqueles que denominam racistas, os entre
vistados indicaram com freqüência parentes próximos, namorados e
amigos íntimos. A conclusão informal da pesquisa era, assim, que todo
brasileiro parece se sentir como uma “ilha de democracia” cercado de
racistas por todos os lados (Schwarcz, 2001, p. 76).

Perceber o racismo como ação do “outro” torna evidente como o preconceito se


manifesta e é praticado socialmente. A não percepção do racismo pelo sujeito que o
pratica revela a naturalização desse no fazer social, que de maneira consciente, ou não,
age na reprodução dos desníveis nas relações socais pelo prisma da branquidade (Feres
Júnior, 2015, p. 98).

2. BRANQUIDADE, BRANQUEAMENTO E O RACISMO ESTRUTURAL NA


TRANSIÇÃO DO IMPÉRIO PARA A REPÚBLICA

A fundação do Estado brasileiro, que se deu em 1822, foi atravessada por diversas
“pré-condições”, notadamente a manutenção da organização econômica e a reprodução
da estrutura social, herdadas do sistema colonial (Prado Jr, p. 366). Assim, a lógica
agroexportadora sustentada por mão-de-obra escrava e administrada por descendentes de
europeus foi assentada em uma estrutura racializada, onde Estado foi erigido (Furtado,
2016, p. 145). A organização do Estado se deu entorno do controle e manutenção da mão-
de-obra cativa, consolidando a naturalização dos desníveis e relações de poder no corpo
social, através de uma hierarquia pigmentária, ou seja, do racismo de marca3 (Nogueira,
2006, p. 291). A fundação do Estado implicou em certas demandas que corresponderam
a criação do conceito de nação, aos moldes dos Estados-Nação europeus, irredutivelmente
ligados a unidade territorial, linguística e, de certa forma, cultural (Reis, 1988, p. 93). A
fundação do Estado foi seguida da necessidade de invenção da cidadania, abrindo espaços
para o surgimento das narrativas destinadas a construção da comunidade imaginada nação
brasileira. Influenciado fortemente pelo pensamento filosófico positivista do século XIX,
as teorias racistas ganharam terreno nos projetos nacionais, sobretudo a corrente do
darwinismo social e a defesa da eliminação das raças “não-civilizadas”, ou seja, os povos
não-brancos, como percebido nos pensamentos dos principais representantes brasileiros
dessa corrente teórica: Raimundo Nina Rodrigues, Silvio Romero e Oliveira Viana
(Pinheiro, 2014, p. 28).
Em concordância com as teorias racistas eurocêntricas, em 1847, o Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) premiou o alemão Carl Friedrich Philipp Von
Martius pelo texto “Como se deve escrever a história do Brasil”. Correspondendo aos
interesses narrativos do recém-formado Estado imperial brasileiro, o texto de Von
Martius assevera que “o sangue portuguez, em um poderoso rio deverá absorver os
pequenos confluentes das raças Índia e Ethiopicas” (1845, p. 383). O “rio” que absorve
seus “afluentes” se estabelece como metáfora sobre a miscigenação e o branqueamento
da população, tendo em vista a extinção dos “afluentes menores”, ou seja, as “raças índia
e etíope” (Guimarães, 1988, p. 16). Considerou que a história do Brasil deveria ser
contada a partir da perspectiva da branquidade, através do branqueamento em uma lógica
assimilacionista. A justificativa de Von Martius correspondia aos anseios do império
brasileiro, que com a recente independência, necessitava construir a concepção de nação,
através de mitos fundadores, símbolos pátrios e das narrativas legitimadoras da nova
comunidade imaginada4. Sobre os mitos fundadores Marilena Chauí afirma que

Se também dizemos mito fundador é porque, à maneira de toda


fundatio, esse mito impõe um vínculo interno com o passado como
origem, isto é, com um passado que não cessa nunca, que se conserva
perenemente presente e, por isso mesmo, não permite o trabalho da
diferença temporal e da compreensão do presente enquanto tal. Nesse
sentido, falamos em mito também na acepção psicanalítica, ou seja,
como impulso à repetição de algo imaginário, que cria um bloqueio à
percepção da realidade e impede lidar com ela (Chauí, 2000, p. 05).

Assim, narrativas que fundaram a compreensão de nação no Brasil operaram no


sentido de branquear a população e consolidar o imaginário racial, definido como o modus
operandi das relações sociais. A consolidação do Estado-nação brasileiro trouxe em seu
bojo os traços marcantes da escravidão, orquestrada pela desigualdade e racismo. Sobre
a construção do racismo Anibal Quijano afirma que

[...] na medida em que as relações sociais que se estavam configurando


eram relações de dominação, tais identidades foram associadas às
hierarquias, lugares e papéis sociais correspondentes, com constitutivas
delas, e, conseqüentemente, ao padrão de dominação que se impunha.
Em outras palavras, raça e identidade racial foram estabelecidas como
instrumentos de classificação social básica da população (Quijano,
2005, p. 117).

Ao analisar a permanência e reprodução do racismo no Brasil, Antônio Sérgio


Guimarâes concorda com Anibal Quijano quando afirma que

Em primeiro, a ordem estamental (de estatus), ainda que historicamente


tenha nascido e se nutrido do escravismo, não ficou restrita a essa
formação social e econômica, tendo sido preservada, e se ampliado, em
termos absolutos até os nossos dias; segundo, a ordem capitalista, longe
de prescindir do “preconceito de cor”, parece ter feito dele um dos
principais mecanismos de reprodução de desigualdades sociais
(Guimarães, 2009, p. 126 - 127).

A formação do racismo estrutural se liga a uma ordem reprodutiva das relações


de privilégio social fundada no pensamento de branquidade, ou seja, onde os privilégios
são dispensados através de uma hierarquia pigmentária. Sobre isso Oracy Nogueira
compreende que “o preconceito, tal como se apresenta no Brasil, foi designado por
preconceito de marca” (2006, p. 291). Assim, o preconceito de marca foi fundado como
mecanismo discriminatório, tornando os traços fenotípicos símbolos de acesso ou de
privação nas relações sociais
Onde o preconceito é de marca, como no Brasil, o limiar entre o tipo
que se atribui ao grupo discriminador e o que se atribui ao grupo
discriminado é indefinido, variando subjetivamente, tanto em função
dos característicos de quem observa como dos de quem está sendo
julgado, bem como, ainda, em função da atitude (relações de amizade,
deferência etc.) de quem observa em relação a quem está sendo
identificado, estando, porém, a amplitude de variação dos julgamentos,
em qualquer caso, limitada pela impressão de ridículo ou de absurdo
que implicará uma insofismável discrepância entre a aparência de um
indivíduo e a identificação que ele próprio faz de si ou que outros lhe
atribuem (Nogueira, 2006, 293).

O branqueamento ou a aproximação do não-branco com o estereótipo físico, social


e cultural eurocêntrico pode ser interpretado como a negação do pertencimento ao lugar
de submissão, logo esquivar-se dos símbolos de exclusão social pode ser interpretado
como uma maneira de mitigar as violências físicas e simbólicas5 (Gadea, 2013, p. 327).
Sobre essa perspectiva Franz Fanon (2008, p. 66), assevera que “o preto, no seu
comportamento assemelha-se a um tipo neurótico obsessional, ou, em outras palavras, ele
se coloca em plena neurose situacional”. No entanto o racismo de marca gestou a
distribuição de privilégios e desvantagens sociais através das evidências inescapáveis das
marcas corporais, como princípio da exploração social e econômica.
Em O Mulato, romance escrito em 1881, Aluísio de Azevedo ilustra o racismo
estrutural e apresenta a braquidade como elemento de distinção e privilégio, simbolizado
no pedido de casamento feito por Raimundo a Manoel, pai de Ana Rosa, sua pretendida
esposa

– Recusei-lhe a mão de minha filha porque o senhor é... é filho de uma


escrava...
– Eu?!
– O senhor é um homem de cor!... Infelizmente esta é a verdade...”
E o rosário de desculpas, desfiado por Manoel Pescada, constrangido,
na tentativa de atenuar o impasse:
– Já vê o amigo que não é por mim que lhe recusei Ana Rosa, mas é por
tudo! A família de minha mulher sempre foi muito escrupulosa a esse
respeito, e como ela, é toda a sociedade do Maranhão! Concordo que
seja uma asneira; concordo que seja um prejuízo tolo! O senhor porém
não imagina o que é por cá a prevenção contra os mulatos!... Nunca me
perdoariam um tal casamento; além de que, para realizá-lo, teria que
quebrar a promessa, que fiz a minha sogra, de não dar a neta senão a
um branco de lei, português ou descendente direto de portugueses!... O
senhor é um moço muito digno, muito merecedor de consideração,
mas... foi forro à pia, e aqui ninguém o ignora (Azevedo, 2003, p. 134
– 135).

No romance, Azevedo apresenta o casamento em uma dimensão política, gestado


por interesses sociais dando evidências das limitações de ascensão social para não-
brancos e suscitando a manutenção do vínculo entre cor, classe e prestígio social. Se por
um lado, o pensamento de Von Matius sobre o branqueamento pela miscigenação era
consonante a estratégia do governo imperial para a formação da nação, por outro, os
lugares de poder nas relações sociais e políticas mantiveram-se ligado a noção de
branquidade, como notado em O Mulato. Nota-se que o racismo estrutural configura as
relações sociais, legitimando o status e operando de maneira orgânica na manutenção de
privilégios. Antônio Sérgio Alfredo Guimarães salienta que

No entanto, em qualquer dos casos, é certo que a reprodução das


desigualdades raciais se articula com três diferentes processos: primeiro
com a formação e atribuição de carismas, algo que não se limita apenas
ao racial, mas que atinge praticamente todas as formas de identidade
social; segundo com o processo político de organização e representação
de interesses na esfera pública; e terceiro, justamente por se tratar de
uma estrutura, há que se ter em mente os constrangimentos
institucionais que funcionam como verdadeiros mecanismos de
retroalimentação (Guimarães, 2004, p. 32).

Nesse arranjo de legitimação de poder e organização social, o branqueamento


tornou-se um mecanismo auto-reprodutivo dentro das dinâmicas racializadas do status
quo. Se em certo momento a miscigenação passou a ser uma estratégia de Estado para
embranquecer a população, enquadrando-a nos moldes eurocêntricos, por outro lado os
lugares de poder político e econômico continuaram pertencentes a população branca.
Assim, os binômios privilégio/obrigação e branquidade/discriminação se articulam na
balança de poder de forma interdependente. As forças que atuam nas inter-relações sociais
são ordenadas, portanto, pelas relações de privilégio/obrigações definidas pela
aproximação ou distanciamento dos lugares de poder. Nesse sentido, para Emilia Viotti
da Costa (1988, p. 137), nota que “o preconceito racial servia para manter e legitimar a
distância do mundo dos privilégios e direitos do mundo das privações e deveres”, que
corresponder organização hierarquizada racialmente.
A abolição da escravidão, em 1888, e sucessivamente a transição para a república,
principiada em 1889, conduziu à reordenação das relações sócias que por característica
demandou a reelaboração do discurso de segregação para a manutenção dos espaços de
poder dentro da sociedade republicana (Fernandes, 2008, p. 30). Silvane Silva (2011, p.
180) nota que a transição do sistema político monárquico para o republicano não alterou
a ordem das relações de trabalho e preconceito, ao contrário, novos discursos
segregacionistas se estabeleceram para justificar a manutenção do poder como lugar de
privilégio branco. Ainda segundo Petrônio Domingues, “a visão quixotesca de um
imigrante branco europeu [...] experiente em muitas técnicas de plantio e cultivo,
habilitado nas mais difíceis operações do maquinário fabril não condiz com os fatos”
(2004, p. 89). Na prima metade do século XX, com o fim da escravidão as imagens
estereotipadas do negro foram fomentadas no sentido de “marcar os lugares sociais” nas
relações de raça entre brancos e negros pobres. Assim, os mecanismos ideológicos foram
utilizados para desqualificar a população negra e manter os lugares de poder sociais
atrelados a imagem e estereótipo do branco, mantendo as relações sociais em um caráter
ideológico arraigado a mentalidade coletiva (Domingues, 2004, p. 56).
Os símbolos criados sobre a abolição da escravidão, de acordo com a ordem
política republicana que se instalou (1889), implementaram narrativas de cunho
ideológico a fim de naturalizar as relações racistas e desiguais na organização social
(Chalhoub, 1986, p. 51). Maria Aparecida Lopes (2009) observa que símbolos como a
Mãe-Preta6 e a Princesa Isabel foram oficializadas como narrativas e forjaram a imagem
do abolicionismo como fruto da caridade paternalista provida pelas mãos de uma princesa
branca. No mesmo sentido a Mãe-Preta, maternal e pacífica, harmoniza e naturaliza as
desigualdades, em perspectiva subserviente, para a manutenção consentida das
desigualdades de raça e classe. O mito como elemento fundacional produz modos de ser
e pensar, orientando as relações sociais, portanto, notado no contexto republicano
brasileiro, os referidos mitos, escamotearam e legitimaram o racismo. No entanto as
narrativas abolicionistas não foram completamente exitosas, suscitando questionamentos
de parte dos movimentos negros que, ainda na primeira parte do século XX, passaram a
reivindicar uma história escrita na perspectiva do negro, assim como a criação de
símbolos de luta antirracista.
1
Mestrando em Ensino e Relações Étnico-Raciais (PPGER) pela Universidade Federal
do Sul da Bahia (UFSB), pós-graduado lato sensu em Ciência Política (FESV), Graduado
em História Licenciatura pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
2
Expressa a maneira com que o racismo enquanto elemento de poder se vincula aos
sujeitos na ordem hierárquica social se reproduzindo nos desníveis das relações
interpessoais.
3
O racismo de marca é um conceito utilizado por Nogueira para caracterizar a forma do
racismo desenvolvido no Brasil, baseado nas marcas corporais ou fenótipos, onde a
aproximação e o distanciamento do fenótipo europeu corresponde a aceitação ou exclusão
social.
4
O conceito de comunidade imaginada é utilizado por Benedict Anderson no sentido de
analisar como o sentimento de pertencimento a um determinado grupo, abstrato, se faz
através da mídia e a construção de uma narrativa nacional.
5
Fazendo uso do conceito estruturalista de Burdieu que se concebe nas relações
simbólicas de dominação e submissão.
6
Segundo Sônia Roncador a Mãe-Preta surge como “símbolo da fidelidade incondicional
e servilismo absoluto à classe senhorial [...]” (2008, p. 130) e portanto representa uma
figura conciliadora entre as violências raciais sofrida pela população não-branca e a elite
branca senhorial.

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