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DEGRADAÇÃO DO PAPEL ISOLANTE EM ÓLEO VEGETAL ISOLANTE

H. M. Wilhelma; M. B. C. Stoccoa; A. Cabrinoc; P. Fernandesa


a
Rua México, 1053, Curitiba – PR, CEP: 82510-060 helenaw@diagno.com.br
a
Diagno Materiais e Meio Ambiente e Análises Químicas LTDA.
c
Elektro – Eletricidade e Serviços S.A

RESUMO

O objetivo da pesquisa é avaliar a migração da umidade do papel isolante para o


óleo vegetal isolante (OVI) e a possível reação de esterificação entre a celulose e os
ácidos graxos formados na degradação do OVI. O OVI utilizado foi o BIOVOLT A na
presença de cobre e papel Kraft neutro e termoestabilizado. Ensaios de
envelhecimento acelerado foram realizados. As amostras tiveram o teor de água
determinado por uma nova metodologia desenvolvida para o OVI, pois até então a
técnica utilizada é a normatizada para óleo mineral isolante (OMI). As amostras
passaram por ensaios de determinação do grau de polimerização (GP). Os
resultados obtidos demonstraram o aumento da umidade no OVI, indicando que o
óleo BIOVOLT A mostrou-se eficiente na remoção de água dos papéis Kraft, e o
decréscimo do GP da celulose.

Palavras-chave: Óleo vegetal isolante, Papel isolante, Biovolt A, migração da


umidade.

INTRODUÇÃO

Os transformadores elétricos tem um sistema de isolamento constituído por um


líquido isolante e uma isolação sólida, o papel Kraft. O OMI vem sendo largamente
utilizado como fluido isolante e refrigerante por mais de um século devido à sua
grande disponibilidade, baixo custo e por apresentar ótimas características
dielétricas e refrigerantes.
O OMI, por ser um derivado do petróleo, pode provocar impactos ambientais graves
no caso de acidentes com vazamentos ou derramamentos, além de ter sua
disponibilidade questionável devido à crise de escassez de petróleo que assola o
mundo. Visando minimizar estes problemas, novos fluidos isolantes vêm sendo
desenvolvidos à base de ésteres vegetais, chamados de óleos vegetais isolantes
(OVIs) que apresentam características biodegradáveis, renováveis e de fluidos de
segurança.
Devido sua composição química, os ésteres naturais apresentam maior afinidade
com a água se comparados ao OMI, o que pode lhes conferir a propriedade de
(1)
"secar" a celulose que compõe o papel Kraft isolante .
O envelhecimento da isolação sólida é um processo acelerado pelos efeitos
combinados de temperatura, umidade e oxigênio. A umidade é, então, um agente
poderoso no envelhecimento precoce do papel, pois, promove a degradação da
celulose com consequente perda da sua massa molar. Remover o máximo de
umidade pelo emprego de métodos de secagem é uma das metas dos fabricantes
de transformadores (1).
Segundo WILHELM e colaboradores a migração da umidade do papel para o OVI é
um dos parâmetros que deve ser considerado na avaliação da extensão da vida útil
do papel isolante. Não existem dados na literatura, até o presente, comprovando a
taxa de migração da umidade presente no papel isolante para o óleo vegetal isolante
(2)
em função da temperatura e do tempo .
A literatura também reporta que uma das principais vantagens do OVI frente ao OMI
é a ocorrência de uma reação de esterificação da celulose presente no papel Kraft
(3-6).
com os produtos de oxidação do OVI Segundo fabricantes de OVI esta reação é
responsável pela extensão da vida útil do transformador de 2 a 10 vezes a mais em
comparação ao equipamento isolado com OMI. A comprovação desta reação de
transesterificação, na literatura, se deu em condições atípicas de operação de um
transformador. Resta investigar se essa reação ocorre de fato em condições normais
(7) (8)
de operação e qual é a sua dependência com a temperatura e o tempo .
Elucidar essas questões é um dos objetivos dessa pesquisa desenvolvida pela
ELEKTRO em parceria com o DIAGNO.

MATERIAIS E MÉTODOS

Adaptação do método de determinação de teor de água em fluidos vegetais


isolantes

A norma ABNT NBR 5758 para determinação do teor de água contemplada na


norma ABNT NBR 15422 (que trata da especificação de fluido vegetal isolante), é
empregada com sucesso para o OMI. Porém para o OVI, viram-se necessárias
algumas adaptações e considerações para obtenção de um resultado mais efetivo:
Mudança da quantidade volumétrica de óleo isolante utilizada no ensaio: para o
OMI, a norma recomenda 3 mL do fluido isolante. Este volume foi alterado para 5mL
no caso do OVI; mudança do tempo de extração do óleo no equipamento Karl
Fischer de 30s para 60s; número máximo de análises utilizando a mesma Solução
Karl Fischer igual a 10 ensaios; não reaproveitamento da Solução Karl Fischer para
ensaios com OVI e OMI.

Adaptação do método de determinação de teor de água em materiais celulósicos


isolantes

O método “D” da norma ASTM 3277:1995, norma esta não mais vigente, foi usado
como base para o desenvolvimento da metodologia para a determinação da
umidade nos papeis isolantes.
Os parâmetros utilizados nestes ensaios são: quantidade mássica de papel isolante
utilizada no ensaio igual a 2,0±0,5 g; papel isolante picado em pequenos pedaços,
com área por pedaço de aproximadamente 1 cm 2; tempo de extração do papel no
equipamento Karl Fischer igual a 15 min; número máximo de análises utilizando a
mesma Solução Karl Fischer e mesmo tipo de papel igual a 10 ensaios; não
reaproveitamento da Solução Karl Fischer para ensaios com outros papéis
impregnados em OVI ou OMI.

Ensaios de envelhecimento acelerado em laboratório

Foram realizados envelhecimentos acelerados a 140 oC, com base no apêndice A do


guia da IEEE ANSI C57.100:1992, com o intuito de verificar a migração da água do
papel isolante para o OVI e investigar a ocorrência da reação de esterificação na
superfície do papel. As proporções adotadas entre BIOVOLT A e papel nos
experimentos realizados foram baseadas na real proporção que um transformador
apresenta de isolante líquido e de isolação sólida (10:1, m/m). O envelhecimento foi
conduzido na presença de cobre metálico, cuja quantidade adicionada também
seguiu a mesma proporção utilizada em um transformador, 20 cm 2 de superfície de
contato para cada 1 g de isolação sólida.
Estes materiais foram acondicionados em frascos de aço inox com tampa
esmerilhada de acordo com a Fig. 1: Materiais utilizados no ensaio de
envelhecimentoFig. 1: Materiais utilizados no ensaio de envelhecimento. Foi
borbulhado gás nitrogênio no óleo para a retirada de oxigênio. Cada tubo foi cheio
com OVI BIOVOLT A com 500 ppm de água e inserido o cobre. Foi utilizado papel
Kraft neutro e papel Kraft Termoestabilizado.

Fig. 1: Materiais utilizados no ensaio de envelhecimento acelerado.

Ao término do envelhecimento, que teve duração de 360 h, foi determinado o teor de


água nos óleos pelo método Karl Fischer (ABNT NBR 5758) e nos papéis isolantes
(metodologia adaptada da norma ASTM 3277).
Os papéis Kraft e Termoestabilizado tiveram determinados o Grau de Polimerização
(GP) de acordo com a norma ABNT NBR 8148.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Adaptação do método de determinação de teor de água em fluidos vegetais


isolantes

Por se tratar de um líquido isolante relativamente novo no mercado, o OVI não


possui normatização própria que abranja todos os ensaios necessários para sua
completa caracterização. Os ensaios utilizados são, na sua grande maioria, os
ensaios padrões usados na caracterização do OMI.
O método para determinação do teor de água no OMI que vem sendo aplicado para
o OVI apresentou valores com desvio padrão muito altos, o que caracteriza
respostas aos ensaios com pouca confiabilidade.
A padronização do método consiste indicar a massa a ser analisada no aparelho
Karl Fischer como a correspondente a 5 mL de OVI e aumentar o tempo de extração
para 60 s.
O OVI apresenta uma afinidade com a água muito maior que o OMI. Esta
característica hidrófila deste isolante é constatada na diferença média do teor de
água nestes dois tipos de fluidos isolantes, enquanto o OMI, segundo a resolução
n˚36 da ANP, deve apresentar valor máximo de teor de água de 35 ppm, o OVI tem
como parâmetro máximo o valor igual a 200 ppm, estipulado na ABNT NBR 15422.
Por esta maior quantidade de umidade no OVI, faz-se necessário o aumento da
amostragem (de 3 mL do OMI para 5 mL do OVI) e o dobro do tempo de extração.
Devido a maior miscibilidade do OVI na solução Karl Fischer do que no OMI, o
indicado é realizar, no máximo 10 ensaios de OVI e, após, trocar a solução de Karl
Fischer. A grande diferença do método para OVI e OMI provém da densidade dos
mesmos comparada à densidade da solução de Karl Fischer. O OMI apresenta
densidade menor que a solução, logo o OMI, após descanso da solução se acumula
na camada superior, enquanto o OVI por ser mais denso que a solução, decanta no
frasco. Este fato é de suma importância na predileção que a mesma solução de Karl
Fischer não pode ser usada para os dois tipos de óleo.
Os resultados alcançados mostrados na Fig. 2: Teor de água de amostras de OVI de
acordo com a norma ABNT NBR 5758 e com modificações sugeridas e desvio
padrão dos resultados obtidos apresentaram desvio padrão mínimos, com total
repetitividade, o que torna a técnica confiável.

Fig. 2: Teor de água de amostras de OVI de acordo com a norma ABNT NBR 5758 e
com modificações sugeridas e desvio padrão dos resultados obtidos.

Adaptação do método de determinação de teor de água em materiais celulósicos


isolantes
A Fig. 3: Teor de água e desvio padrão de resultados nas amostras de Papel isolante
Kraft neutro e papel isolante Kraft termoestabilizado de acordo com as adaptações
realizadas na norma ASTM 3277 mostra os resultados de repetitividade dos ensaios
de determinação do teor de água no papel Kraft e papel Kraft termoestabilizado
adotando a metodologia desenvolvida.

Fig. 3: Teor de água e desvio padrão de resultados nas amostras de Papel isolante
Kraft neutro e papel isolante Kraft termoestabilizado de acordo com as adaptações
realizadas na norma ASTM 3277.

Ensaios de envelhecimento acelerado em laboratório

Devido a sua natureza química, o óleo vegetal pode apresentar dez vezes mais
moléculas de água na sua composição que o óleo mineral. A umidade é tida como
(5)
inimigo número um da isolação sólida do transformador . Por causa da sua grande
capacidade de saturação de água e outras características químicas, o óleo vegetal
isolante pode prolongar a vida útil do papel isolante absorvendo a água do papel.
Esta transferência das moléculas de água do papel isolante para o BIOVOLT A pôde
ser comprovada nos ensaios de envelhecimento acelerado realizados a 140 °C por
360 h, cujos resultados estão apresentados na . Pode-se observar uma diminuição
do teor de água nos papéis Kraft neutro e Kraft termoestabilizado e um aumento na
quantidade de água no BIOVOLT A.
Fig. 4: Teor de água no óleo isolante após envelhecimento acelerado a 140 oC.

Os dados obtidos para os ensaios de Grau de Polimerização GP estão dispostos na


Fig. 5.

Figura 5: Grau de Polimerização nos papéis isolantes após envelhecimento


acelerado a 140 oC.

Os valores do grau de polimerização de todas as amostras apresentaram um


comportamento de diminuição do GP proporcional ao tempo de envelhecimento.
Este fato indica que houve a degradação do papel, ficando os valores do papel
termoestabilizado abaixo do permite pela norma, onde o valor mínimo de um papel
utilizável é igual a 200.

CONCLUSÃO

O procedimento descrito na norma ABNT NBR 5758 precisa ser revisado e adaptado
para análise do teor de água em óleos vegetais isolantes.
A água migra preferencialmente do papel isolante para o óleo BIOVOLT A.
Estudos adicionais estão sendo realizados neste projeto para correlacionar a
diminuição do GP do papel isolante com a provável reação de esterificação entre a
celulose e o ácido graxo livre do OVI.

REFERÊNCIAS

1. WILHELM, H.M.; STOCCO, M.B.C; GALDEANO, C.A; et. al. Avaliação da


extensão da vida útil do papel kraft isolante em ésteres naturais; XXI SNPTEE -
Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica; Florianópolis:
2011.
2. WILHELM, H.M.; GRANATO, R.C.; TÚLIO, L.; et. al. Aspectos relacionados
com a utilização de óleo vegetal isolante no Brasil; IV WORKSPOT -
International Workshop on Power Transformers; Recife: 2006.
3. RAAP, J. L. K, McSHANE, C. P., CORKRAN, J. L., GAUGER, G.A., LUKSICH,
J. Aging of paper insulation in natural ester dielectric fluid. IEEE/PES
Transmission & Distribution Conference & Exposition. Atlanta, nov, 2001.
4. RAAP, J. L. K., McSHANE, C. P., CORKRAN, J. L., GAUGER, G. A.,
LUKSICH, J. Aging of paper insulation in natural ester dielectric fluid.
Proceedings of 14th International Conference on Dieletric Liquids (ICDL). Austria, jul,
173-177, 2002.
5. RAAP, J. L. K., McSHANE, C. P., LUKSICH, J. Interaction mechanisms of
natural ester dielectric fluid and Kraft paper. 15th International conference on
dielectric liquids, Coimbra, Portugal, Jun, 2005.
6. CLAIBORNE, C. C., CHERRY, D. B. A status update on the use of natural
ester (vegetable oil) dielectric fluids in transformers. Doble, 2006.
7. MARTINS, M. M.; Óleo Vegetal Isolante Envirotemp® FR3™ e sua
Influência no Envelhecimento de Transformadores: Superação de Equipamentos
– Aspectos conceituais, critérios e procedimentos. Cigré Brasil, Cepel. Rio de
Janeiro, 2008.
8. MENDES, J. C.; Biotemp®: Óleo Vegetal da ABB – Aplicação em
Transformadores de potência em alta tensão; Workshop: Superação de
Equipamentos – Aspectos conceituais, critérios e procedimentos. Cigré Brasil, Cepel.
Rio de Janeiro, 2008.

DEGRADATION OF INSULATING PAPER IN INSULATING VEGETABLE OIL

ABSTRACT

The joint research project of Diagno and Elektro aims to evaluate the migration of
moisture and the occurrence of esterification reactions between cellulose and the
fatty acids produced by degradation of VIO. For this purpose, accelerated aging tests
were carried out in the laboratory. The VIO used was Biovolt A, in the presence of
copper and neutral and thermostabilized kraft paper. The water content of both the
VIO and the insulating paper were measured by a new method developed in this
study, due to the inexistence of a specific standard for this fluid (previous studies
have used the standard established for mineral oils). The paper samples were tested
to determine their degree of polymerization. The results obtained demonstrated an
increase in moisture of the VIO, indicating that the Biovolt A oil is efficient in
removing water from both neutral and thermostabilized kraft paper; and a decrease
in the degree of polymerization of the cellulose.

Key words: insulating vegetable oil, insulating paper, Biovolt A, migration of moisture.

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