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Resumo Abstract
O presente artigo faz uma análise This present article does a liter-
literária do texto bíblico de Marcos 10, ary analysis of the text Biblical text
46-52 do Novo Testamento. O texto of Mark 10, 46-52 of the New Testa-
relata a cura de Bartimeu e descreve ment. The text narratives the cure of
a atuação da pessoa de Bartimeu e Barthimaeus and describes the action
de Jesus na passagem por Jericó. of the person of Barthimaeus and
Estes sujeitos sociais desempenharam of Jesus’ passage through Jericho.
papeis importantes que deram origem These social subjects exert important
à construção da história de milagre. role that give origin to the construction
Fazendo uso dos métodos exegéticos of the history of the miracle. Making
e hermenêuticos quer-se evidenciar as use of the exegetic and hermeneutic
experiências de Bartimeu que reflete methods which are evident in the ex-
uma história de exclusão, de grito, de perience of Barthimaeus that reflects
resistência e de esperança em relação a history of exclusion, cry, resistance
ao exercício de sua autodeterminação and the hope in relation to the exer-
e seu testemunho de fé. cises of self- determination and the
testimony of his faith.
Palaras-chave: Jesus, esperan Key-word: Jesus, hope, cure.
ça, cura.
Introdução
1. Tradução do texto
48
a) E muitos o repreendiam
b) para que se calasse;
c) mas ele gritava muito mais:
d) filho de Davi tem misericórdia de mim!
49
a) Parou Jesus e disse:
b) chamai-o!
c) E chamaram o cego,
d) dizendo-lhe:
e) Tem bom ânimo;
f) levanta-te,
g) ele te chama.
50
a) E ele lançou seu manto,
b) saltou e põe-se de pé
c) e foi ter com Jesus.
51
a) E dirigindo-se a ele Jesus disse:
b) que queres que te faça?
c) o cego respondeu-lhe:
d) Mestre, que eu recupere a vista.
52
a) Jesus lhe disse:
b) vai,
c) a tua fé te salvou.
d) E imediatamente recuperou a vista
e) e seguia-o pelo caminho.
2. O tempo de Bartimeu
HOUTART, F. Religião e modo de produção pré-capitalista, p.200.
STEGEMANN W. E, Storia sociale del Cristianesimo primitivo, p. 342.
Ib. p. 161.
O termo ochlós é caracterizado como aqueles que formam o pano de fundo onipresente do
ministério de Jesus; como pecadores e marginalizados sociais; membros da comunidade de
Jesus; sem direito a liderança judaica e são temidos. Cf. MYERS, Ch. O evangelho de São
Marcos, p. 198-9.
MORIN, E. Jesus e a estrutura de seu tempo, p. 137.
Cf. BROWN, C., COENEN, L. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, v.
I, p. 396.
TERUMOT, Orden Primero, c. I, 6, p. 138.
Cf. SCHIAVO, L., VALMOR, S. Jesus, milagreiro e exorcista, p. 43-5.
ANDERSON, A. F., GORGULHO, G. Jesus e seu tempo, p. 10.
10
Cf. BROWN, C., COENEN, L. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, v.
I, p. 396.
11
Cf. DISEASE H. R.K. The Interpreter’s Dictionary of the Bible, v. I, p. 851-4.
12
Cf. BROWN, C, COENEN, L. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. v.
I, p. 396.
Foi Bartimeu que “ouviu” (akúsas) passar Jesus pelo caminho e sem
duvidar começou a gritar (v.47c). O ouvido foi essencial para Bartimeu. Na
perspectiva da sabedoria o “ouvir” tem um significado importante para o
judeu, pois por ele todo o corpo se mobiliza (cf. Jô 4,12-13)15.
13
Cf. MATEOS, J. Marcos 13: p. 63-6.
14
Cf. MCKENZIE, J. L. Dicionário Bíblico, p. 601.
15
WOLFF, H. W. Antropologia do Antigo testamento, p. 109.
16
Cf. JENNI, E., WESTERMANN, C. Diccionario Teológico Manual del Antiguo Testamento, v.
II, p. 162-3.
17
WOLFF, H. W. Antropologia do Antigo testamento, p. 109.
18
Ib. p. 108.
19
Cf. JENNI, E., WESTERMANN, C. Diccionario Teológico Manual del Antiguo Testamento, v.
II, p.720-1.
20
Cf. BALZ, H.; SCHNEIDER, G. Diccionario exegético del Nuevo Testamento, v. II, p. 2391.
21
Apresenta-se 12 vezes em Mateus, 10 em Marcos e 04 em Lucas, cf. BALZ, H.; SCHNEIDER,
G. Diccionario exegético del Nuevo Testamento, v. II., p. 2391.
22
Cf. LENTZEN-DEIS, F. Comentario al Evangelio de Marcos, p. 331.
23
A raiz aparece em hebraico e aramaico 245 vezes no AT. Em hebraico domina o sentido
positivo (bondade, graça). Cf. JENNI, E., WESTERMANN, C. Diccionario Teológico Manual del
Antiguo Testamento, v. I, p. 832-3.
24
BROWN, C., COENEN, L. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, p. 1294.
renovava. Logo, Israel podia pedir da parte dele a eléeos, que incluía a
misericórdia de perdão quando a nação quebrasse a aliança (Ex 34,9; Nm
14,19; Jr 3,12).
Quando YHWH age assim, é também, quando o homem age de modo
semelhante, ressalta-se, não a atitude básica de eléeos, mas sim, sua ma-
nifestação nos atos25. Dessa mesma forma, a atitude de Bartimeu perante
a misericórdia de Jesus se manifesta no seguimento.
A forma verbal eléeson que coloca em relevo “a irrupção da misericór-
dia divina encontra-se nos lábios dos que se acercam a Jesus pedindo-lhe
salvação e invocando sua messianidade”26, eles são: os cegos, um deles
Bartimeu (10,47s e paralelos), o endemoninhado (Mt 20,30s), a mulher Ca-
nanéia (Mt 15,22 a diferencia de Mc 7,25) e o endemoninhado epilético (Mt
17,15, a diferencia de Mc 9,17).
Jesus, o nazareno, ‘irrompe da misericórdia divina’ no meio da realidade,
da desgraça humana. Mediante sua obra de libertação, anúncio, ensinamen-
tos, curas e outros demonstrava sua autoridade.
Bartimeu, no entanto, investe totalmente na sua fé. Ao destacar o
verbo “gritar” mais o discurso direto “Filho de Davi, Jesus tem misericórdia
de mim” (v. 47d), Egger o traduz na expressão de oração confiante, pois
ela exprime tanto a confiança em Jesus enquanto Filho de Davi como a
invocação à misericórdia27.
Jesus atendia o grito de auxílio, de ajuda, de socorro da parte dos
doentes, dos endemoninhados, dos cegos como no caso de Bartimeu. Esta
resposta de Jesus provocou uma atitude súbita em Bartimeu que somente
Marcos o narra.
5. A reação de Bartimeu
25
Ib. p. 1294.
26
BALZ H., SCHNEIDER, G. (Org.) Diccionario exegético del Nuevo Testamento, v. I, p. 1310-4.
27
Cf. EGGER, W. Metodologia do Novo Testamento, p. 127.
de trajar mostrava a todos sua condição miserável. Esse manto devia servir-
lhe, também, de esteira, onde dormia. “Atirá-la longe, sugere que o homem
acreditava que não precisaria mais dele, que ficaria curado”28.
Diversos intérpretes vêm aqui um colorido oriental29. A roupa, no AT,
junto com o alimento constitui uma necessidade vital e básica (Is 4,1)30.
Parece que o manto representava um estorvo, pois lhe servia como leito de
repouso e como capa para cobrir-se31. Como a roupa identifica a condição
social e a situação da pessoa, deixar o manto, além de desembaraçar-lhe
os movimentos, sugere também mudança de vida: ele estava deixando as
dificuldades, as trevas da cegueira e o opróbrio da mendicância, para tornar-
se um discípulo de Jesus.
O ato de Bartimeu, em desfazer-se do manto indica à comunidade que,
no seguimento de Jesus, deve desfazer-se de tudo o que atrapalha esse
seguimento. Deve lançar fora toda indiferença, descrença e des-compromisso.
Deve, audazmente, seguir o salvador, testemunhando dele em palavra e ação,
como fez o cego curado, mas antes tinha que ir ao encontro com Jesus.
Logo após, vêm, no v.50b, o verbo “saltou e põe-se de pé” (anapedésas).
Foi “um salto da alma, e não apenas das pernas”32. Quando “Ele lançou o
seu manto, saltou e põe-se de pé e foi ter com Jesus” (v. 50) destaca-se
a imensa emoção do momento. Antes, o cego se mantinha imóvel, sentado
por causa de sua cegueira, agora, sabendo que Jesus estava passando,
ele está em movimento ativo. A saída triunfal de Jericó, por parte de Jesus,
não teria sido triunfal para Bartimeu, se Jesus tivesse passado por ele, e
ele continuasse cego. Bartimeu sabia que Jesus era capaz de curá-lo, mas
ele sabia, também, que era por causa de sua fé.
Esta frase dita por Bartimeu é o centro do texto, vejamos a sua importân-
cia. O AT, como já foi dito, destaca a importância do ouvido e da linguagem
28
HURTADO, L.W. Novo comentário bíblico contemporâneo – Marcos, p.192.
29
Cf. LOHMEYER, E. Das Evangelium des Markus, p. 225.
30
JENNI, E., WESTERMANN, C. Diccionario Teológico Manual del Antiguo Testamento, v. I,
p. 1186.
31
Cf. PESCH, R. Das Markusevangelium II Teil, p. 173.
32
CHAMPLIN, R.N. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. v. I, p. 754.
6. Fé e cura
33
WOLFF, H. W. Antropologia do Antigo testamento, p. 109.
34
GRINGRICH, F. W. Léxico do Novo Testamento grego/português, p. 19.
35
NOLLI, G. Evangelo secondo Marco, p. 272.
36
Cf. TAYLOR, V. Evangelio según San Marcos. p. 534-8.
37
BALZ, H.; SCHNEIDER, G. Diccionario exegético del Nuevo Testamento, v. I, p. 224-5.
par na comunidade cultual ou teria que ser separado38. Para Israel é YHWH
quem tem a exclusividade no trato com a enfermidade.
Unicamente Yahvé é Senhor da enfermidade e da curação.
Essa é a constante certeza bíblica. No AT normalmente não se
distingue entre curas naturais e milagrosas. Intervem ou não
prescrições e remédios humanos, é essencial sempre que o
doente na sua enfermidade e aquele que se está curando na
sua cura encontre a Deus. [...] Vai por conta do interessado
se manter a experiência de Yahvé e o incorpora a toda sua
vida39.
A função da cura no AT não era o caráter extraordinário da instrução
divina que impressionava, mas antes a própria intervenção em si. Essa
intervenção em si era o sinal de misericórdia e benevolência divina de oni-
potência e glória. “Os sinais de Jesus, no NT, faziam parte se sua missão
messiânica”40 (11,5; Lc 7,22).
A cura acontece por causa da fé: “Va, a tua fé te salvou” (v. 52b-c).
O elogio que Jesus faz a Bartimeu é o mesmo elogio feito à mulher que
tinha fluxo de sangue (Mc 5,34). A fé é uma qualidade que Bartimeu e dos
amigos do paralítico demonstraram (Mc 2,5). Estas são as únicas pessoas
cuja fé é elogiada em Marcos41, embora poder-se-ia incluir, também, a fé
que demonstrou a mulher siro-fenícia (Mc 7,29).
De fato, Bartimeu tinha fé porque ele imediatamente recuperou a vista
– euthús avéblepsen (v. 52c). A fé dos evangelhos como a fé42 do AT, não
é simplesmente crença e confiança; a crença e confiança surgem da fé,
que, por sua vez, é aceitação de uma pessoa e de suas exigências. Nessa
aceitação está implícita a adesão ao poder que Jesus mostra possuir; fé
no poder e na pessoa de Jesus foi necessária para que Bartimeu fosse
curado. No evangelho de Marcos, a fé é o meio, pelo qual o homem tem
poder mediante a ‘entrega’.
38
Cf. WOLFF, H. W. Antropologia do Antigo testamento, p. 198.
39
WOLFF, H. W. Antropologia do Antigo testamento, p. 200-1.
40
BORN, A. van den et al. Dicionário Enciclopédico da Bíblia, p. 989.
41
Cf. HURTADO, L.W. Novo comentário bíblico contemporâneo – Marcos, p. 192.
42
No AT fé significa “ser firme ou sólido”, e daí, “fiel”. Cf. MCKENZIE, J. L. Dicionário Bíblico,
p. 341-2.
43
JEREMIAS, J. Teologia do Novo Testamento, p. 250-1.
7. Conclusão
Esta afirmação deve-se ao fato de que o redator do texto lembrou o nome de Bartimeu, cf.
44
Referências Bibliográficas
BROWN, Colin, COENEN, Lothar. Dicionário Internacional de Teologia do Novo
Testamento. v.I-II. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 2000
CHAMPLIN, Russell Norman. O Novo Testamento interpretado versículo por
versículo. v.I-II. São Paulo: Milenium, 1982.
HOUTART, François. Religião e modo de produção pré-capitalista. São Paulo:
Paulinas, 1982
HURTADO, L.W. Novo comentário bíblico contemporâneo – Marcos. Florida:
Vida, 1995.
JENNI, Ernst, WESTERMANN, Claus Diccionario Teológico Manual del Antiguo
Testamento. v. I-II. Madrid: Cristiandad, 1978.
MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1983
LENTZEN-DEIS, Fritzleo s.j. Comentario al Evangelio de Marcos: modelo de
nueva evangelización. Navarra-España: Verbo Divino, 1998.
LOHMEYER, Ernst. Das Evangelium des Markus. Gottingen: Dandehoed &
Ruprecht, 1967.
STEGEMANN, W. Ekkehard, STEGEMANN, Wolfgang. Storia sociale del Cris-
tianesimo primitivo. Bologna: EDB, 1998. (Or. Al. 1995).
WOLFF, Hans Walter. Antropologia do Antigo testamento. São Paulo: Paulinas,
1993.