Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
.921.0�
�g9q,�
!�. CCJ.
�---------
.. :", ,i
Y
, ' --
�
�
FORMAÇÃO DO BRASIL
CONTEMPORÂNEO
COLONiíl
ll�HHIMI IIHl"I
DIRBI/UFU 00071170
.- .� i
lQljQl)';J.299
fl.• E n I Ç ÃO
EDITÔllA llílASILIENSE
L
SENTIDO DA COLONIZAÇÃO
i,l
que damos como claras e que dispensam explicações; mas que não
resultam na verdade senão de hábitos viciados de pensamento.
Estamos tão acostumados em nos ocupar com o fato d!!... coloill:zaç!Q_
brasileira, que a iniciativa dela, os motivos que a inspiraram e de
terminaram, os rumos que tomou em virtude daqueles impulsos
iniciais, se perdem de vista. Ela parece com9 um_ acoQ_t�_cime.pto \
fatal e necessário, derivado natural e espontâneamente do simples
fato do descobrimento. E os rumos que tomou também se afiguram
como resultados exclusivos daquele fato. Esquecemos_ aí os ante
cedentes qu� se acumulam _atrás_ de tais_ ocorr�nci-ª-ª., �...gr�
..E.��ero_ de circunstâncias __ particulares que ditaram as no� a
seguir. A consideração de tudo isto, no caso vertente, e tanto
mais necessária que os efeitos de tôdas aquelas circunstâncias ini
ciais e remotas, do carácter que Portugal, impelido por elas, dará
à sua obra colonizadora, se gravarão profunda e indelevelmente na
formação e evolução do país.
_A._ e�l!._[lsã_o __maríJim:1-9-os_p�íscs çla Europa, dep9ili dq séc. XV,
expansão de que o descobrimento e colonização da América cons
tituem o capítulo que particularmente nos interessa aqui, l!e. J.H:igi.ua
de_ simp�s em11Iêsa.L.Ç_QJJ1�i;:çiai[_!_cm1d11:u1_ ef.êHo_pelo:Luav:egadm:es
daqueles países. D.f!:i.Y.il:. çl9 _desenvolvtm..entQ ..do comé.n;io conti-..
fil:!!!ª1....�r.Qpcq, que até o séc. XIV é quase unicamente terrestre,
e limitado, por via marítima, a uma mesquinha navegação costeira
e de cabotagem. Çomo �e-�_a.�, a grande �!�com�E_cial do mundo
�..2neu _que sll,i. do _esf11.��la_1�1.cnto do Imp_�1}0_.,?�_ Õciúeiúe'"ê"· a
que liga por terra o Mediterrâneo ao mar do Norte, desde as repú
blicas italianas, através dos Alpes, os cantões suíços, os grandes
empórios do Reno, até o estuário do rio onde estão as cidades fla
mengas. No_ séc. XIV, mercê de uma verdadeira revolução na
arte de navegar e nos meios de transporte por mar, outra __ r_g!_a
.ligará ª'quêl�L_qo_i1._ .p--º.lQs.. do _çomérci_9_ eqropJ�u.: será a marítima-·
que contorna o continente pelo estreito de Gilbraltar. ]lot_ a que,
subsidiária a princípio, suq[titajJ! afinal a__p_r..imitjy� _po grande.
Jµg�F, que ela_ ocup�':�· _(? prir:neiro refle_xCJ desta_ !(;u:�s.fQ®ªçªo, a
principio imperceptivel, mas que se revelará profunda e revolucio
nará to�o � equilíbri? europeu,_ foi_ gesl9car a primazia coITlercial
,
cl0s terntonos ,centrais do contmcntc, por onde passava a antiga
rota, para aquêles que f �m1ai11 a sua fachada o�ânica: ª �olanda,
,
a Inglaterra, a Normandia, a Bretanha e a Penmsula Ibenca.
.1;:ste nôvo equilíbrio firma-se desde o princípio do séc. XV.
Dêle d�rivará não s6 todo um nôvo sistema· de relações internas
do contmente, como nas suas conseqüências mais afastadas, a ex
pansão eu�opé!a ultr�marina. '? primeiro passo estava dado e a
.Elli.QpíLQêhrn rn_g e viver __ i.
recollud; _ sôbre si __ mes�ara. enfrentar
16 CAIO PRADO JúNIOR
__Q_ 9 c�::,i_�Q.- O_p.apel de pioneiro nesta - �ova etapa caberá aos por
t.Ygµ_.ê§_e1,, os melh._qres situa_dos, geogràf1camente, n9 _ex�remo d<:�!ª
península que avança pelo mar. En �uanto h?landeses, ing1êses,
normandos e bretões se ocupam na via comercial recém-aberta, e
que bordeja e envolve pelo mar o ocidente europeu, os portuguêses
vão mais longe, procurando emprêsas cm que não encontrassem
concorrentes mais antigos e íá instalados, e .Para que contavam com
vantagens geográficas apreciáveis: buscarão a costa ocideI).(áD da
Africa, traficando aí com os mouros que dominavam as populações
indígenas. N��-ta. avançada pelo Oceano descobrirãp as Ill1ª-ª- (C�}o
Verde, Madeira, Açôres), _e continuarão perlongando o �.ontinente
��0_2_ara o sul. Tudo isto �e passa ainda na primeira metade do •
7. _ g�c.....XY� L�--Pº!:.._:!E ��c!� dele, começa2_..se desenhar um__p}!J.J!9
mais amplo: llt.ingü:_ º- Or.i en_te contornando a Afric_a:_ Seria abrir
para seu proveito _l}.!.D;i JQ.9 .nuc os poria _c_1T1_ COI!![!ct9_ �ir_et9 com
ª-�--9R1=!lq11t.a� 1ndias das preciosas especiari�s, cujo comércio fazia
a riqueza das repúblicas italianas e <los mouros por cujas mãos
transitavam até o 1foditcrn1nco. Não é p reciso repetir aqui o que
foi o périplo africano, realizado afinal depois <le tenazes e siste
máticos esforços de meio século.
Atrás dos portuguêscs lançam-se _o_s.._ espanhóis. Escolherão
o utra_ rota, pelo ocidente ao invés do oriente. D��<?<;>brirão a A.mé
rica, seguidos aliás de perto pelos portuguêses que também toparão
com o uôvo continente. Virão, cle�ois do� países peninsulares, os
franceses, inglêses, holandeses, ate dinamarqueses e suecos. A
gmmle nay�gação oce�nica º�tava . ap_e1ta,. � todos procuravam tirar
Vll.t:tJçlQ _dela:;) Só ficarão atrás aquêles que dÕminávâm·· no antigo
sistema comercial terresh·e ou mediterrâneo e cujas rotas iam pas
sando para o segundo plano: mal situados, geogràficamente, com
relação às novas rotas, e presos a um passado que ainda pesava
sôbre êlcs, serão os retardatários da nova ordem. A Alemanha e
a Itália passarão para um plano secundário. a par dos novos astros
que se levantavam no horizonte: os países ibéricos, a Inglaterra, a
_;França, a Holanda.
Em suma e no essencial, toc,los _os grandes acontecimentos desta
era, que se convencionou c;om razão chamar dos "descobrimentos",
üfücula1�-sc num_ co�unto . q_u e _ não é _senão um_ capítulo _da história
elo comercio . europeu. I!:!�l� que se passa são incidentes da imensa
cmprêsa comercié!I a que se dedicam os países da Europa a partir
do s�<::.:..... �, e que lhes alargará o horizonte pelo Oceano afora.
Não têm outro carácter a exploração da costa africana e o desco
brimento e colonização das Ilhas pelos portuguêses, o roteiro das
índias, o descobrimento da América, a exploração e ocupação de
seus vários setores. :E: êste último o capítulo que mais nos interessa
FORMAÇÃO DO BRASIL CONTEMPORÂNEO 17
· aqui; mas não será em sua essência, diferente dos outros. E sempre
como traficantes que os vários povos da Europa abordarão cada
uma daquelas emprêsas que lhes proporcionarão sua iniciativa, seus
esforços, o acaso e as circunstâncias do mom ento em que se acha
vam. Os P.?.:.t_�g�êses traficarão na costa africana com marfim,
our91 _ ���!.ª�<?�;._ 1?ª __1_!1<lil_l__ i_I!o__ . b_usca�eciarias.x; Para concorrer
com êles, os espanhóis, seguidos de perto pelos inglêses, frnlli!?S e.�
___e demai�_procurarão _ outrQ_ caminl}o__p<:tJ.a _ o_ Qrie.nte; _a Am�ríca,
com que toparam nesta pesquisa, não __foi_ para êle� a princípio,
senão um obstáculo oposto �-realí�a_çã_2 de -�eus planc:>s e que devia
ser··confoiiiadõ. Todos os- esforços se orientam então no sentido
de encontrar uma passagem, cuja existência se admitiu a priori .
.Os espanhóis, situados nas Antilhas desde o descobrimento de Co
lomfo, ·explõram _ a_parte _central _do _C�I_l-���-n t�: deS <::()bdrã2__2._M_�
XÍCO• Balboa avistará o Pacífico; mas a passagem não será encontrada.
Pro�ura-se entãÕrnàis 'pãra-o sul: a__s_ _viage11.� . de S_gli,s, de que resul
tará o descobrimento do H�_ da Prata, _não_ !iveram outro 9bj�t�"-º·
!vlagâlhães"sêri"séu continuador e encontrará o estreito que con- .
servou o seu nome e que constituiu afinal a famosa passagem tão
procurada; mas ela se revelará pouco praticável c se desprezará.
Enquanto isto se passava no sul, as pesquisas se ativam para 0
norte; a iniciativa cabe aí aos inglêses, embora tomassem para isto
o serviço de estrangeiros, pois não contavam ainda com pilotos
nacionais bastante práticos para emprêsas de tamanho vulto. As
�primeiras pesquisas serão empregadas pelos italianos João Cabôto
e seu filho Sebastião. Os portuguêses também figurarão nesta
exploração do Extremo-Norte americano com os irmãos Côrte Real,
que descobrirão o Labrador. Os franceses encarregarão o floren-
tino Verazzano · de iguais objetivos. Outros_ mais___ se sucedem, e
embora tudo istQ__sen'.tss� Pª-r_a__explq�ar. � .. tornar conhccidq o___n�y9._
ª
mundo, füma11_g9__ �1Ja p_Qfil,_e . pelos_ yá_riq� . países da E uropfl, não
se encontrava_ a almejada. passagem J:10je sabcmos__I.:illQ existir (1).
Ainda em princípios do séc. XVII, � · tghtiu Cumpany of Concliiii.>
incluía entre seus piincipais objetivos o descobrimento da brecha
para o Pacífico que se esperava encontrar no continente.
Tudo isto lança muita luz sôbre o espírito com que os povos
da Europa abordam a América. A_I_déia de poyoar nI.\Q__ QÇQrre
..inicialmmi.t.e._a_ne.nhi..un...__Jt o . comércio __ qµ� _ _c>s . jnJ!'!.res_Sf\, e daí o
.i:elativo desp_rêzo por êstc território primitivo � . .vazio ..qu_e é a Ainé
....nca..
e.Jnversamente, o pI_Ç_Stigio. do Oriente, qnde n1io faltava obj�tQ
Eara ativida des m ercantis,' .·IA idéia de ocupar, não como se fizera
atéentã'õ·ê-mterras-estranhás, apenas como agentes comerciais, fun
cionários e militares para a defesa, organizados em simples feitorias
destinadas a mercadejar com os nativos e servir de articulação entre
as rotas marítimas e os territórios ocupados; mas ocupar com povoa
mento efetivo, isto só surgiu CQI!:9 contingência, necessidade imposta
por circunstüncias ·novas . é . imprevistas. Alias, nenhum povo da
Europa estava em condições naquele momento de suportar sangrias
na sua população, que no séc. XVI ainda não se refizera de todo
elas tremendas devastações da peste que assolou o continente nos
dois séculos precedentes. Na falta de censos precisos, as melhores
probabilidades indicam que em 1500 a população da Europa oci
dental não ultrapassava a do milênio anterior.
Nestas condições, "coloni;z;ação" ainda era. en�e!]diçl�- como
aquilo que dantes se praticava; fala-se cm colonização, mas o que
o têrmo envolve não é mais que o e�tabeledmento _sl�__fai!.Qr.ias /
QQ!Ilei:�:i.�!!i, como os italianos vinham de longa data praticando no
Meeliterrâneo, a Liga Hanseática no Báltico, mais recentemente os
inglêses, holandeses e outros no Extremo-Norte da Europa e no
Leva nte; como portuguêses fizeram na África e na fodia. Na. Amé- _
r:i.ca a situação se . apr���I),!�. d� forma inteiramente diversa: um
-· tt:rri t9.�i<_> .J?�!-�_i!iyo l 1'.1l�i_ta_d.9 . i?:0:�-��ãJj�__p�}�9.f0.=É��íg�Jia:-i�1�.ªpaz
êl� forn�_cer qualquer cqi��-çl� i:�-�lm�nte___�E[�áveT.- Para os fins
me rcantis que se tinham em vista, a ocupação não se podia fazer
como nas simples feitorias, com um reduzido pessoal incumbido ..
apen�s do negócio, sua administração e defesa armada; era pre�iso
ampliar estas bases, cria! um ll�_:12�n-�o., _?.ªP!1-Z _,,de_ abastecer e
�anter as fei!Q.r�f_!� que_ ��,,fonc1.1E�zy. ·_e_�<?E�U.��.,ª!.,.,3:,, R.1.:�.q��ªQ., _dos 1
_g.§';1_e..rC>s que }nteressa�sem o seu co_mercio. � �aeia d� p<_Jvçiar .�l!rge �_J
dai, e só d a1.
' A qui ainda, Portugal foi um pioneiro. Seus primeiros passos,
neste terreno, são nas ilhas do Atlântico, '> postos avançados, pela
identidade ele condições para os fins visados, do continente ame
ricano; e isto ainda no séc. X� . _Era preciso povoar_ e_ orga�i�ar a
prillluç.ãQ;__P..Qrtugl!.L @J!lizq_u estes 09jetivos brilhantemente. Em
todos os p roblemas r1ue se propõem desde que uma nova ordem
econômica se comr:'ça a desenhar aos povos da Europa, a partir
d o séc. XV, os por tuguêses sempre aparecem como pioneiros. Ela
boram tôdas as soluções até seus menores detalhes. Espanhóis,
depois inglêses, franceses e os demais, não fizeram outra coisa,
durante muito tempo, que navegar em suas águas; mas navegaram
tão bem, que acabaram suplantando os iniciadores e arrebatando
-lhes a maior parte, se não pràticamente tôdas as realizações e em
prêsas ultramarinas.
FORMAÇÃO DO BRASIL CONTEMPORANEO 19
_E�-ª�
-� ����em.a _1ª� foit9ria_�_ P!l:Z:�-�c_nte ccnnerçi_i;i is. Serão as madeiras, de
construção ou tinturiais (como o pau-brasil entre nós) na maior
.t parte dêles; também as --��i�ais e a pes_?a no Extremo
:�!!� como na Nova I0g1aterra; a pesca será particUl.armente�ya
n� bancos d.ª__T.eIJ:a...No:V.1!, onde desde os primeiros anos do sec.
XVI, possivelmente até antes, se reúnem inglêses, normandos, vas
conhos. Os espaobói:, serão os ma is felizes: toparão desde logo,
nas áreas que lhes couberam, com _os metais _precioso��prata �
q_oµro do México e Peru. Mas Q.LIDj:!tais, incentivo e base sufi
ciente para o sucesso de qualquer emprêsa colonizadora,� !1�º--2.':..�
pªm na formaçij9_ da América senão um lugar relativame_nte _P.<:.:•
.qu�nq. Impulsionarão o estabelecimento e ocupação das colônias
espanholas citadas; mais tarde, já no séc. XVIII, intensificarão
a colonização portuguêsa na America elo Sul e a levarão para 0
_centro elo continente. Mas é só. Os metais, que a imaginação
escaldante <los primeiros exploradores pensava enconh·ar em qual
quer território nôvo, esperança reforçada pelas prematuras des
cobertas castelhanas, não se revelaram tão disseminados como se
esperava. Na maio�·- e_xtensão ela A_II1é,ri��-Ji�()_u.��� ;1_ princ_ípfg___�;<-
clusivam_���e .i:ias_ �a_deirns,_ nas .11eles, ...na p.esc.-i; e a ocupação de
,.. territórios, seus progressos e flutuações, subordinam-se por muito
_" tempo ao maior ou menor sucesso daquelas atividades. Viria de-
12 isJ · em substituição, uma...b.a.s.� .JlÇO.P.ômi ç�...Ilillfa�áx.cl. maiLrun-
l___ p1a: ser!a.. -�- �_g�_i_ c:u_!!_ll r::t:_
Não é meu intuito entrar aqui nos pormenores e vicissitudes
da colonização européia na América. J\fas podemos, e isto muito
interessa nosso assunto, distinguir duas áreas diversas, além daquela
em que se verificou a ocorrência de metais preciosos, em que a
colonização toma rumos inteiramente diversos. São elas as que
correspondem respectivamente às 7,onas temperada, de um lado;
tropical e subtropical, do o utro. A primeira, que -�-on:ip_ree11de gros
seiramente Q.. 1c.njtprio . ameiicano . ao norte da . baía de Delaw.ftrn
(a outra extremidade temperada do continente, hoje países platinos
e Chile, esperará muito tempo para tomar forma e significar al guma
coisa), .!lâQ. _o.fore.C.tl:L.l__ re;iJmente nada de . muito_ interessante, e per
manecerá ainda por muito tempo adstrita à exploração de produtos
espontâneos: madeiras, peles, pes';ª· Na Nova Inglaterra, nos pri-
20 CAIQ PRADO JÚNIOR