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A Declaração, nos seus artigos 2° e 5°, afirma ainda que educar é promover um
direito, não um privilégio; que educar não se resume a um treinamento prático, mas sim
a destacar as dimensões sociais, profissionais e culturais da cidadania. Assim,
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Professor Doutor do Instituto de Educação de Angra dos Reis e do Programa de Pós-graduação em
Educação da UFF; vice-coordenador do Observatório Jovem do Rio de Janeiro e do Núcleo de Estudos e
Documentação sobre Educação de Jovens e Adultos – Nedeja.
comum, nos valores e nas experiências anteriores de cada comunidade, e que
estimulem o engajamento ativo e as expressões dos cidadãos nas sociedades em
que vivem (MAEYER, 2006, pp. 20-21).
Nesse sentido, a educação de jovens e adultos não pode ser compreendida como
uma segunda chance de educação, tampouco a última oportunidade de se fazer parte da
comunidade de letrados (aqueles que estudaram e têm conhecimento). Passamos a
compreender então que a educação não pode ser considerada em momento algum como
um prêmio de consolação ou um tipo de educação reduzida, oferecida àqueles que, por
diversas razões (sociais, familiares ou políticas), não foram capazes de tê-la durante a
infância, pois não é uma educação pobre para pobres, mas sim um direito de todos.
Com o objetivo de apresentar algumas reflexões sobre as questões que envolvem
os sujeitos da EJA na atualidade, o presente artigo, fundamentado em alguns
documentos aprovados nos últimos anos no Brasil, visa contribuir com a discussão
sobre a diversidade desses sujeitos.
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Síntese de Indicadores Sociais divulgados pelo IBGE (2012).
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O agregado nacional reduziu em 31% a proporção de pessoas que não sabiam ler nem escrever,
passando de 12,1% em 2001 para 8,6% em 2011. A maior queda no índice de analfabetismo se deu entre
os jovens de 15 a 24 anos de idade, cuja taxa passou de 4,2% para 1,5% no período considerado. A
redução desse índice também foi alta entre as pessoas de 25 a 59 anos de idade (de 11,5% para 7,0%).
Esses resultados apontam para o progressivo envelhecimento do perfil do grupo mais afetado pelo
analfabetismo (Tabela 3.17). Contudo, isso não significa que a maioria dos analfabetos está nessa faixa
etária. Do total de analfabetos de 15 anos ou mais, 50,7% têm de 25 a 59 anos de idade, representando um
montante superior a 6,5 milhões de pessoas.
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Distribuídas por região, a maior taxa de analfabetismo do país está na Região
Nordeste, com 16,9%, seguida, respectivamente, pela Região Norte, com 10,2%;
Centro-Oeste, com 6,3%; Sul, com 4,9%; e Sudeste, com 4,8%.
Quanto à média de anos de estudo das pessoas de 15 anos ou mais de idade, a
média nacional saltou de 7 anos, em 2001, para 9,6, em 2011. A média da Região
Sudeste é a maior, alcançando 10,1 anos de média para jovens entre 18 e 24 anos. A
menor é a da Região Norte, com 8,7 anos, seguida pela da Região Nordeste com 8,8
anos. Já a média da Região Sul está em 10, enquanto a da Centro-Oeste está em 9,9.
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Na busca pela compreensão dos atuais sujeitos da EJA, passamos a identificar
que estamos falando de um campo muito diverso, com muitas particularidades,
especificidades e armadilhas. Hoje, principalmente, necessitamos compreender melhor
essa modalidade de ensino diante da diversidade do público. Compreendendo o conceito
diversidade, conforme o Dicionário Aurélio, como “diferença, dessemelhança,
dissimilitude; caráter do que, por determinado aspecto, não se identifica com algum
outro” (BRASIL, 2008), defendemos que, em sua amplitude, a diversidade deve ser
entendida como uma construção histórica, cultural, social e econômica das diferenças.
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garantia da permanência de crianças, jovens e adultos nas instituições de ensino
brasileiras, além de consolidar o respeito à diversidade. Reconheceu-se que, para tanto,
seria indispensável o enfrentamento de, pelo menos, quatro grandes desafios:
promover a construção de um Sistema Nacional de Educação, responsável pela
institucionalização de uma orientação política comum e de um trabalho permanente
do Estado e da sociedade na garantia do direito à educação;
indicar, para o conjunto das políticas educacionais implementadas de forma
articulada entre os sistemas de ensino, a garantia da democratização da gestão e da
qualidade social da educação básica, assim como as condições adequadas e
necessárias para o trabalho dos docentes e funcionários;
definir parâmetros e diretrizes para a qualificação e valorização do professor, e o
direito do aluno à formação integral com qualidade; e
propiciar condições para a definição de políticas educacionais que promovam a
inclusão social e o respeito à diversidade de forma articulada entre os sistemas de
ensino.
Na prática, o fórum representou um ringue de lutas, em que os delegados,
orientados pelos seus respectivos segmentos, buscavam a qualquer custo defender os
seus interesses, não enxergando muitas vezes os dos demais. A busca por uma política
que respeite a diversidade foi esquecida em detrimento de interesses particulares.
Embora existisse como eixo temático a Inclusão e Diversidade na Educação Básica,
todos, com poucas exceções, apresentaram discursos que contrariaram tal concepção,
deixando de defender uma orientação agregadora que valorizasse a luta pela
compreensão da inclusão e da diversidade.
Apesar disso, destacamos, no documento (BRASIL, 2008), os seguintes pontos
primordiais para a reflexão acerca das atuais discussões na área de EJA:
O documento nos chama a atenção para o consenso na educação brasileira acerca da
necessidade da inclusão, sobretudo quando se observa o caráter excludente da
sociedade brasileira e suas repercussões na garantia dos direitos sociais e humanos,
porém, para compreender, agir e garantir a diversidade, são necessários:
além da sensibilidade e reconhecimento para desencadear ações concretas, são
necessários posicionamentos, práticas políticas e o entendimento da relação
entre inclusão, exclusão e diversidade, articulados a uma visão ampla de
educação e desenvolvimento sustentável; compreender que nem sempre a
discussão sobre a inclusão ‘social’ incorpora e pondera a complexidade da
diversidade na vida dos sujeitos sociais; que a política de inclusão que
contemple as diferenças vai além do aspecto social, trata-se de noção mais
ampla e politizada de inclusão que tem como eixo o direito ao trato democrático
e público da diversidade em contextos marcados pela desigualdade e exclusão
social; e que “as políticas educacionais devem se estruturar de forma a contribuir
na discussão da relação entre formação, diversidade, inclusão e qualidade social
da educação básica. (BRASIL, 2008)
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Nesse sentido, é fundamental problematizar questões como a contextualização
curricular a partir da diversidade regional; a educação indígena; a educação e
a afrodescendência; a educação no campo; a educação de pessoas com
deficiências, e altas habilidades; a educação de pessoas privadas de liberdade; a
educação e a diversidade sexual.
Como desafios, o documento ainda destaca ser necessário:
desenvolver uma postura ética e de não hierarquização das diferenças e entender
que nenhum grupo humano e social é melhor do que outro. Na realidade, todos
são diferentes; [que] na educação básica exigem-se medidas políticas que
garantam a todos os grupos sociais, principalmente àqueles que se encontram
histórica e socialmente excluídos, o acesso a uma educação de qualidade
(BRASIL, 2008).
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desigualdade, que se propaga via conjugação de relações assimétricas de classe,
raça, gênero, idade e orientação sexual”; [... e que] “falar sobre diversidade e
diferença implica compreender e lidar com relações de poder. É importante
perceber como, nos diferentes contextos históricos, políticos, sociais e
culturais, algumas diferenças foram neutralizadas e inferiorizadas e
encaradas de forma desigual e discriminatória (grifo do autor) (BRASIL,
2008).
Nessas condições, conclui o documento,
o poder público poderá indicar políticas que possibilitem: a implantação e
implementação de política de formação inicial e continuada de profissionais da
educação comprometida com o reconhecimento da diversidade, e com a
superação das desigualdades constatadas no interior do sistema de ensino,
visando à qualidade social da educação; as condições estruturais, de formação e
salariais aos profissionais da educação para que tornem o espaço escolar um
espaço sociocultural pleno de direitos, de aprendizagem e de respeito à
diversidade; reorganização do trabalho da escola, do tempo escolar e da
formação de professores e o trato ético e democrático dos alunos e seus
familiares, trazendo novas alternativas para a condição docente e uma postura
democrática diante do diverso; a implementação de novas formas de
organização e gestão para a educação de jovens e adultos, inclusive aqueles
em situação de privação de liberdade, para as escolas do campo, indígenas,
quilombolas, para os povos da floresta e para os estudantes com deficiência
e/ou altas habilidades/superdotação, afro-descendentes e diversidade de
gênero (grifo do autor) (BRASIL, 2008).
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Destacamos ainda ser de extrema importância que invistamos e tomemos como
bandeira a discussão sobre a diversidade, já que a partir dela poderemos fundamentar as
nossas expectativas e necessidades, principalmente de forma agregadora, dialógica e
democrática.
Nessa direção, necessitamos que o poder público invista em políticas de Estado;
mobilize a comunidade acadêmica para pensar nos aspectos pedagógicos que envolvem
o tema; e, principalmente, que articule os programas governamentais já existentes,
viabilizando uma política social mais integrada.
No campo acadêmico, que as Universidades reconheçam e invistam em
pesquisas sobre o tema; que este seja incluído na grade curricular dos cursos de
Pedagogia e de licenciaturas; que mais debates sejam promovidos, instigando a
sociedade em geral sobre o tema; e que sejam implementados cursos de formação inicial
e continuada de forma a atender e dar conta da atual realidade.
Não podemos desconsiderar, no entanto, que já conseguimos algumas
conquistas: (1) dentro de uma política de governo, compreendendo a dimensão que
envolve o tema, a atual gestão federal criou, na estrutura do Ministério da Educação, a
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad)/Ministério da
Educação (MEC) – com o objetivo de estabelecer um norte político para tal discussão;
(2) deu-se a consolidação e a participação política dos Fóruns de EJA em todos os
estados da federação, promovendo uma discussão mais qualificada sobre o tema,
principalmente agregando os diversos atores sociais da área; (3) teve lugar a aprovação
do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb), que inclui (com ressalvas) a EJA nas discussões do
orçamento público; e (4) promoveu-se a regulamentação e a aprovação de Diretrizes
Curriculares Nacionais, como a da Educação das Relações Étnico-raciais e a do Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e África, bem como a da EJA em espaços de
privação de liberdade.
Para ainda avançarmos na discussão, acreditamos que, conforme o Documento
Base da Conferência Nacional de Educação Básica, “é importante que
[compreendamos] que a luta pelo reconhecimento e o direito à diversidade não se opõe
à luta pela superação das desigualdades sociais”. Pelo contrário, ela coloca em xeque a
forma brutal pela qual as diferenças vêm sendo historicamente tratadas na sociedade, na
escola e, principalmente, nas políticas educacionais.
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Referências