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Teoria da Argumentação Jurídica

Book · January 2016

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Fábio Shecaira
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Fábio P. Shecaira
domínio do “vale-tudo principiológico”, Argumentar juridicamente sempre pa-
nem se confunde com as argumenta- receu misterioso ao leigo. Por vezes se
ções morais substantivas. tem a impressão de que os juristas, tal
Esta obra é importante por apresen- como sofistas, sempre colocam a lin-
Juízes e juristas não falam nem pensam como os ou-
tar ao leitor brasileiro uma teoria arti- guagem a serviço de seus preestabele-
culada da argumentação jurídica bem tros cidadãos. O que ao cidadão comum parece corre- cidos interesses ou objetivos. Outras
adaptada ao positivismo jurídico con- to ou razoável nem sempre é considerado legal por vezes, mais como pregadores moralis-


Noel Struchiner
temporâneo. Isto não é pouco, em par- juízes e juristas. O que é legal, por sua vez, depende tas, parecem depositar uma fé exage-
ticular para a cultura jurídica brasileira, rada na crença de que através de argu-
do que é dito em uma aparente infinidade de leis e de-
ainda difusamente muito marcada por mentos se poderá realizar a justiça
um positivismo kelseniano no qual não cisões judiciais de difícil acesso. Esses aspectos da substantiva no direito.
há espaço para uma teoria da argu- prática jurídica causam perplexidade entre cidadãos Este sintético e provocativo livro, di-
mentação jurídica mais elaborada. Este comuns e também entre estudantes de direito. ferentemente de outros que focalizam
livro é mais do que oportuno por reali- fundamentalmente a dimensão norma-
Este livro procura esclarecer o que há de peculiar,

Teoria da argumentação jurídica


zar sua tarefa com elegância, simplici- tiva ideal da argumentação jurídica (isto
dade e clareza, e certamente será de curioso e até mesmo paradoxal na argumentação jurí- é, como os juristas deveriam argumen-
enorme proveito para estudantes e pro- tar), pretende oferecer ao leitor uma
dica. Escrito em linguagem acessível e livre dos exces-
fissionais de direito. descrição da argumentação jurídica
sos do formalismo acadêmico, o livro é indicado tanto como ela é. Em outras palavras, expli-
Ronaldo Porto Macedo Junior
para iniciantes quanto para especialistas em direito e Fábio P. Shecaira • Noel Struchiner car como profissionais do direito tipica-
Professor titular da Faculdade de Direito
da USP e da Direito FGV – São Paulo estudiosos da argumentação jurídica. Os especialistas mente argumentam e como juízes che-
encontrarão aqui uma análise incomum (e possivel- gam a uma decisão judicial.

Fábio Perin Shecaira é professor ad-


mente controversa) de temas tradicionais como inter-
Teoria da Este viés metodologicamente realis-
ta bem se ajusta às premissas teóricas

argumentação
junto da Faculdade Nacional de Direito pretação jurídica, precedentes judiciais, analogias, positivistas que os autores didaticamen-
(UFRJ); professor dos Programas de princípios gerais do direito e raciocínio probatório. te explicitam. Para eles, há fundamen-
Pós-Graduação em Direito (PPGD- talmente dois modos de argumentar: “o

jurídica
UFRJ) e Filosofia (PPGF-UFRJ); doutor modo institucional, limitado por regras e
em Filosofia (McMaster University). procedimentos previamente estabeleci-
dos em fontes dotadas de autoridade; e
Noel Struchiner é professor adjunto do o modo substantivo, baseado em consi-
Programa de Pós-Graduação em Direi- derações morais, políticas, econômicas,
to da PUC-Rio; pesquisador da FAPERJ sociais etc.” Para eles, a argumentação

CONTRAPONTO
(Jovem Cientista do nosso Estado) e do jurídica é predominantemente institucio-
CNPq (Bolsista de Produtividade em nal. Isto demarca os limites da objetivi-
Pesquisa); doutor em Filosofia (PUC- CONTRAPONTO dade e da parcial indeterminação do
-Rio). direito. Ou seja, o direito não é nem um
Sumário

Introdução: a crítica de Gulliver 7

1. Argumentação: noções básicas 11


1.1 O que é argumentar? 11
1.2 Padronização de argumentos 12
1.3 Argumentos complexos 15
1.4 Justificação externa e justificação interna 21
1.5 Resumo 26

2. Argumentação prática 29
2.1 Argumentação teórica e argumentação prática 29
2.2 Argumentação institucional e argumentação substantiva 35
2.3 Conclusão 45
2.4 Resumo 47

3. Fontes do direito 49
3.1 Fontes formais e materiais 49
3.2 Fontes obrigatórias e opcionais 53
3.3 Acúmulo de fontes 57
3.4 Resumo 67

4. Métodos de interpretação jurídica 69


4.1 O que é interpretação 69
4.2 Formalismo e não formalismo 71
4.3 Interação entre os métodos de interpretação 83
4.4 Interpretação constitucional 92
4.5 Resumo 101

5
T EOR I A DA A RG UM E N TAÇ ÃO JU RÍ DI CA

5. Integração de lacunas 103


5.1 O que são lacunas na lei 103
5.2 Princípios 105
5.3 Analogias 112
5.4 Jurisprudência 124
5.5 Costumes 131
5.6 Doutrina 137
5.7 Resumo 142

6. Argumentação teórica no direito 145


6.1 Argumentação institucional e argumentação substantiva 145
6.2 Resumo 153

7. Descoberta e justificação 155


7.1 Processo de descoberta e processo de justificação 155
7.2 Atalhos e vieses 160
7.3 Resumo 174

Conclusão: o que dizer a Gulliver? 175

Referências bibliográficas 183

6
INTRODUÇÃO

A crítica de Gulliver

Gulliver, o célebre personagem de Jonathan Swift, não gostava


muito de juízes e advogados. Veja o que disse Gulliver durante
a sua viagem ao país dos Houyhnhms (Swift, 1983: 229):
Importa observar também que essa sociedade [de advoga-
dos e juízes] tem uma algaravia, ou geringonça especial, que
outros mortais não entendem, e na qual são escritas todas as
suas leis, que eles tomam o especial cuidado de multiplicar,
por onde conseguiram confundir de todo ponto a própria
essência da verdade e da falsidade, da razão e da sem razão;
por maneira que são precisos trinta anos para decidir se o
campo que me legaram há seis gerações os meus antepassa-
dos pertence a mim, ou pertence a um estranho que mora a
300 milhas de distância.

São três os traços da prática jurídica que mais desagradam a


Gulliver: 1) o uso de linguagem (uma “algaravia”) técnica e
inacessível para leigos; 2) o recurso a leis obscuras e numero-
sas; 3) o apego excessivo ao conteúdo dessas leis, o que, por
sua vez, gera ineficiência, lentidão burocrática e, ainda pior,
decisões que ofendem o bom-senso.
De todas as críticas de Gulliver, provavelmente é menos justa
aquela que diz respeito ao jargão dos advogados. Há de fato
quem diga que os advogados, indivíduos vaidosos e propensos à
falsa erudição, comprazem-se em alienar os leigos. Mas todo
grupo profissional — médicos, engenheiros, economistas etc.
— tem o seu vocabulário técnico. A linguagem jurídica realmen-
te é estranha, mas será que advogados e juízes pecam mais nisso
que os membros de outras profissões? A especialização profis-

7
T EOR I A DA A RG UM E N TAÇ ÃO JU RÍ DI CA

sional tem o seu preço, e parte desse preço consiste justamente


no surgimento de vocabulários acessíveis apenas a iniciados.
Seja como for, as demais críticas de Gulliver merecem a
nossa atenção. Gulliver reclama da complexidade e do volume
do material de trabalho dos juízes e advogados. Ele mencio-
na apenas as leis, mas sabemos que advogados e juízes mo-
dernos também têm de lidar com outras “fontes do direito”,
a exemplo da jurisprudência e dos escritos de juristas influen-
tes (a dita “doutrina”). Gulliver critica, ainda, a lealdade dos
juízes e advogados ao conteúdo do seu material de trabalho.
Estritamente aplicadas, as leis às vezes regulam a vida social de
formas que, do ponto de vista do leigo, parecem pouco razoá-
veis e excessivamente burocráticas.
Complexidade, burocracia, falta de bom-senso. Ainda hoje,
as pessoas se impressionam com esses aspectos do pensamen-
to jurídico. São coisas que geram perplexidade até mesmo
entre estudantes e profissionais do direito.* Como professores
de faculdade de direito, percebemos que muitos alunos, desde
muito cedo, adaptam-se aos costumes da profissão, leem o
material obrigatório e imitam a retórica convencional sem
compreender bem (ou tão bem quanto poderiam) aquilo que
estão sendo treinados para dizer e fazer. Este livro objetiva
contribuir para o esclarecimento daqueles aspectos do discur-
so jurídico que têm impressionado as pessoas desde os tempos
de Gulliver. O livro enfrenta várias perguntas. O que torna a
argumentação jurídica tão complexa? Como contribuem para
isso as leis, a jurisprudência, a doutrina etc.? Por que os pro-

* Ao longo do livro, usaremos a expressão “profissionais do direito” para de-


signar o amplo grupo de profissionais composto de juízes, advogados e ju-
ristas acadêmicos. A palavra “advogado”, por sua vez, pode ser entendida de
maneira suficientemente ampla para incluir, entre outros, aqueles que atuam
como promotores e defensores públicos.

8
I N TRO DU ÇÃO • A CRÍTICA DE GU L L IVER

fissionais do direito tomam decisões ou defendem teses que


parecem ofender o bom-senso do leigo? Quão conscientes são
os próprios profissionais do direito a respeito dos defeitos que
os leigos atribuem à sua forma de pensar e falar?
O livro pretende ser introdutório sem ser banal. Como li-
vro introdutório, é relativamente curto, evita terminologia
técnica, oferece exemplos variados para ilustrar as lições mais
abstratas, economiza no uso de notas de rodapé e referências,
e apresenta resumos didáticos ao final de cada capítulo. Por
outro lado, nem tudo o que o livro diz, sobretudo a partir do
Capítulo 3, é óbvio ou sabido. Pelo contrário, algumas das
suas conclusões prometem ser controvertidas. O objetivo, por-
tanto, é proporcionar uma obra acessível ao iniciante e, ao
mesmo tempo, interessante para o iniciado. Pode ser que o
aluno do primeiro semestre do curso de direito tenha dificul-
dade para entender alguns dos conceitos usados ao longo do
livro. O ideal é que o estudante o leia depois de ter tido acesso
a pelo menos um semestre de “Introdução ao estudo do direi-
to”, “Teoria do direito” ou alguma disciplina equivalente.
Já existem boas obras desse tipo no mercado, isto é, bons
livros sobre teoria da argumentação jurídica que têm apelo
tanto para iniciantes quanto para iniciados. Temos em mente,
por exemplo, o livro Thinking like a lawyer: A new introduction
to legal reasoning (2009), de Frederick Schauer. O livro é exce-
lente, mas foi escrito por um norte-americano que se refere
constantemente a instituições, regras e procedimentos pró-
prios de sistemas jurídicos que fazem parte da tradição da
common law. São instituições, regras e procedimentos um
pouco remotos e misteriosos para a maioria dos estudantes
brasileiros (que compõem o nosso público-alvo).
Este livro começa com algumas lições gerais e elementares
sobre argumentação. A partir do Capítulo 3, concentra-se na

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T EOR I A DA A RG UM E N TAÇ ÃO JU RÍ DI CA

argumentação jurídica. O objetivo central é apresentar a argu-


mentação jurídica tal como ela é. O propósito, portanto, não
é falar sobre como juízes, advogados e juristas devem argu-
mentar (embora essa questão seja brevemente discutida na
Conclusão). Neste livro não há, por exemplo, nenhuma re-
comendação específica sobre aquilo que um advogado deve
fazer para aperfeiçoar suas habilidades retóricas, convencer os
juízes e prevalecer nos tribunais. Aqui também não se encon-
tram muitas recomendações sobre como os juízes e outros
profissionais devem argumentar para que consigam satisfazer
ideais políticos importantes, como aquele do “estado de di-
reito”. Em vez disso, o objetivo central é explicar como os pro-
fissionais do direito tipicamente argumentam. Como é que o
juiz costuma defender a conclusão a que chega em uma deci-
são judicial? E o advogado em uma petição? E o jurista em um
artigo científico?

Alguns agradecimentos. A nossa pesquisa contou com o


apoio do CNPq e da Faperj. O manuscrito foi lido por dois
alunos de graduação da Faculdade Nacional de Direito, Júlia
Massadas e Vinicius Dantas, que ofereceram comentários e
sugestões de grande utilidade. Embora destaquemos o nome
desses dois, devemos muito a diversos alunos de graduação
e pós-graduação com quem nos relacionamos ao longo dos
anos na PUC-Rio e na UFRJ. Um livro escrito para alunos só
tem chance de ser um bom livro quando inspirado pelas per-
guntas e inquietações de verdadeiros alunos.
As nossas esposas, Natália Jordão Shecaira e Cinthia Dutra
Struchiner, contribuíram com coisas muito mais valiosas do
que apoio financeiro, técnico ou acadêmico. Agradecemos o
seu carinho e paciência durante essa e todas as outras emprei-
tadas em que temos nos envolvido nos últimos anos.

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