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COMO UMA TÉNUE CONFISSÃO DE TRESLOUCADAS

Como uma ténue confissão de tresloucadas


Assim como um marfim
Antigo e amarelado da patine
Dos dias carcomidos no país do verão
Como uma prestação
Vencida protestada e nunca recebida
Pela casa emissora do empréstimo
Com que se goza a vida
Vida emprestada
A juros incalculáveis nunca negociados
De limites nunca estabelecidos
Como um marfim usado
De uma boca nunca mais beijada
Assim eu vejo essas palavras
Presumidas de ideias nunca tidas
Assim como uma louca que gritasse
Sozinha pelas ruas
À noite interpelando os transeuntes
Assim como uma água
Apodrecida
Morna e cansada de não ser bebida
Essas tesouras que me cortam
A silhueta bolorenta e estéril
Eu vejo o ténue brilho
Com que as palavras ainda me cortam a impaciência
Como cortes de espadas ferrugentas
Assim eu vejo
O meu amor por ser o que eu ainda sou
A podridão dos dias transviados
Como uma ténue confissão de tresloucadas.
CAI A TARDE

Na minha cidade tem todos os dias uma tarde


Uma tarde que cai
E eu penso cai a tarde
Cai a tarde na minha cidade
E vejo aquela luz fosca e irradiante
Que me tinge a alma de prazer
Um prazer melancólico e difuso
Mas benfazejo e são.

Não tenho outros pensamentos


Naquele momento em que parado o tempo parece querer parar
Não penso em sóis nem luas
Nem em ontens
Nem em amanhãs
Penso quase inocente e contemplativo
Que a tarde cai
Como eu escutei centos de vezes em canções
E então aí
Vêm-me à cabeça as melodias.

THE FALLING DUSK

Every day there is a dusk in this town of mine


A falling dusk
And I think: it is the falling dusk
The dusk that falls on this town of mine
And I see that twilight matt and shining
Which dyes my soul over of plaisure
A plaisure which is melancholic and diffuse
However good and sane.

I have no other thoughts


In that moment on which time is still and seems to want to stop
Do not think about suns or moons
Neither yesterdays
Nor tomorrows
I think almost inocent and contemplative
That the dusk falls
As I’ve listen in songs so many handred times
Then at that point
Start coming to my mind the melodies.
Nota biográfica
Joaquim Ferreira de Jesus Morgado nasceu em Faro – Portugal, na região do Algarve, sob
o signo de Touro, no ano 56 do século passado, tendo muito cedo revelado a intuição e o
gosto pelas artes e pelas letras. Publicou os seus primeiros poemas no jornal do liceu,
tendo a partir daí desenvolvido actividade escrita como agitador e propagandista, bem
como na área do jornalismo político e, depois disso, como poeta e artista criativo,
actividade que desenvolveu ao mesmo tempo que exercia a sua profissão de professor
primário. Além de colaborar em inúmeras publicações e iniciativas de carácter local,
foram de sua iniciativa os ciclos de poesia «Leituras Perniciosas» primeiro sediados na
Galeria Margem (nos anos 90) e depois, entre 2010 e 2012, no espaço cultural da Livraria
Pátio de Letras, ambos em Faro. Depois de alguns poemas seus terem aparecido
esporadicamente em antologias promovidas por amigos ou correligionários, em Maio de
2013 foi lançado, pela Editora Arandis, o seu livro – CAOS & POLAROID – onde
aparecem poemas da juventude ilustrados pelo pintor e desenhista Fernando Lobo.

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