RESUMO
ABSTRACT
3. A socialização mais ampla das teorias e seus conceitos nas estruturas formativas, as
escolares, por exemplo, em que entram os processos de convencimento, construção de
adesões, de cooptação, o que se associa a posições conquistadas pelos emissários da
abordagem (doutrina?). Aqui, como nos demais pontos levantados, configura-se uma
espécie de luta entre determinadas construções e posições simbólicas, ou luta para
manutenção de uma só perspectiva analítico-científica.
Seria pretensioso tentarmos dar conta dessas questões em um artigo. Por isso
apenas as aponto como elementos para reflexão, e, quem sabe, provocação de
futuros trabalhos para seu exame mais detalhado e fundamentado.
Apenas quero ainda sinalizar que não podemos deixar de considerar que há
possibilidades, em certas circunstâncias, que pesquisadores ou grupos de cientistas
evidenciem construções de pensares críticos - no sentido de desenvolverem uma
atenção ampliada e diferenciada em relação à sua particular posição nos
arcabouços vigentes - científicos e societários. Aproximo-me aqui da ideia de Hanna
Arendt (1999), de preservar nossa condição e possibilidade de PENSAR. Nossas
dinâmicas sociais, a pensar com Marx, não favorecem a consciência aberta ou
crítica, dado que processos de alienação constituem a regra de nosso cotidiano em
todos os setores de nossa vida societária, seres humanos e agregativos que somos,
na busca de nossa sobrevivência.
1. Conceituações e campo
b) O que concebemos como Psicologia, seu campo e enfoque básico. O que a diferencia
de outras ciências?
2. Conceitos e Pré-conceitos
Aspectos próprios das sociedades humanas, entre eles os ideológicos, colocam nos
grupos científicos, nos vividos institucionais, ambiguidades e confundimentos
próprios da dialética histórica, típicos dos processos de alienação (dos quais
raramente temos consciência) - alienação em relação ao concreto material no que
se refere à construção de conhecimentos e seus usos, o que traz anuviamentos de
perspectivas, ou inversão de perspectivas, ou domínio de uma só perspectiva
(certas hegemonias) substituindo visões esclarecidas vocacionadas à análise de um
tipo de objeto em sua constituição. Fica então confundida a perspectiva própria de
determinados campos do conhecimento com derivações claras para campos
dominantes, social e academicamente falando. Por exemplo, a impregnação quase
total do campo da educação na década de 1960 e 1970 pela visão economicista, e
nas de 1980 e 1990 pela sociologia, processo que percebemos também estar sendo
instaurado nas psicologias.
Retomando no tempo
Por tão espinhosa missão, optei, então, por fazer uma retomada de alguns
trabalhos que trataram da questão e que marcaram discussões entre nós. Eles
foram reunidos na revista Psicologia da Educação, número 9 (1999), do Programa
de Estudos Pós-Graduados em Psicologia da Educação da PUC-SP. Nessa Revista
são reproduzidos alguns textos publicados anteriormente sobre o tema. O artigo de
Maria Amélia Azevedo, que já havia sido publicado em 1980, provoca com o
título: Psicologia Educacional e Educação: uma relação teoricamente eficaz, porém,
praticamente ineficiente?. Aí discute a pertinência de se ter como abordagem
dominante nesse campo dois enfoques: o da Psicologia da Aprendizagem ou a
Psicologia do Ensino, mostrando suas decorrências teórico-práticas, e também
quanto a métodos de pesquisa.
Essa autora, ao final de sua análise, a partir de estudo com as produções científicas
da área, traz a questão do polo dominante na relação Educação-Psicologia:
dominantes são os enfoques da psicologia, com a educação como polo menor,
como ponto de passagem. Considera-se "a Educação como seu objeto, encarando-a
como fato psicológico" o que acaba enriquecendo o cabedal teórico da Psicologia e
não o da Educação. A Educação é assim, um campo de aplicação, uma atividade
reflexa, o que leva a conflitos históricos diante desse tipo de relação, uma vez que
"a relação entre Psicologia Educacional e Educação tenha servido muito mais aos
propósitos de desenvolvimento científico da primeira que às necessidades urgentes
da segunda e, que, portanto os educadores, mais do que os psicólogos
educacionais, estejam insatisfeitos com essa relação" (op. cit.,1999, pp. 82-83). Os
estudos em Psicologia da Educação, nessa direção, parecem não ter contribuído
com a superação da seletividade educacional e com a educação das classes
populares e sua luta. Ao contrário, seus estudos parecem reforçar as desigualdades
de aprendizagem e a seletividade nos processos de ensino. Esta, a perspectiva
vigente no campo da Educação, nesse momento, em que críticas acirradas à
Psicologia Educacional são feitas, e, esta está começando a perder espaço nos
currículos formadores de professores, por exemplo. Azevedo termina colocando: "...
restaria indagar se educadores e psicólogos educacionais estariam dispostos a
aceitar o desafio de colocar em novas bases a relação entre Psicologia Educacional
e Educação, de modo a torná-la tão eficiente na prática quanto eficaz em
teoria (sic)". Isso pressupõe, segundo a autora, "um diálogo crítico e um ajuste de
perspectivas entre psicólogos educacionais e educadores a fim de que ambos os
campos do conhecimento e da ação humanas possam se fertilizar mutuamente."
(op. cit.,1999, p. 84, p. 85) Termina dizendo que, como isso ainda não ocorreu, ela
deixa o capítulo em aberto...
Creio que o capítulo, 30 anos depois, ainda continua em aberto. Campos onde há
transvariação de áreas de conhecimento, nas ciências humanas, têm mostrado
dificuldade em sair da perspectiva de domínio de um sobre outro e entrar na
perspectiva de uma verdadeira transdisciplinaridade - constituindo realmente um
novo campo. O que ocorre, em geral, é a emergência de subáreas, sem caracterizar
inter ou transdisciplinaridade. Aqui também cabe evocar a necessidade de se
superar a visão tácita ou espontaneísta de "educação" que geralmente se observa
no campo da pesquisa em Psicologia da Educação para se incorporar
conceitualmente e trabalhar com uma visão mais esclarecida sobre seu significado
social e suas formas institucionais, conforme bem lembra Regina Maluf, em artigo
reproduzido na mesma revista acima citada (op. cit.,1999, p. 27). Educação não é
"qualquer coisa".
Seguindo a ideia de um rastro histórico das ciências, o artigo de Joel Martins (op.
cit.,1999, p. 53), publicado originalmente em 1983, sobre os limites da Psicologia
da Educação, em que destaca o processo de dissolução das grandes doutrinas
científicas, enfocando em particular a Psicologia. Atribui essa dissolução às
excessivas especializações que se arvoram em subcampos autônomos e que se
afirmam não por teorizações fortes, mas, por suas atividades diversas, gerando
nomenclaturas inúmeras (psicologia experimental, psicologia clínica, social,
educacional, psicologia fisiológica, projetiva, política, etc., etc.), com adjetivações
variadas, considerando o autor que este movimento se mostra como "uma solução
desesperada de definir uma ciência segundo aquilo que os pesquisadores fazem e
os métodos que empregam nas suas buscas, mais do que o gênero de coisas
pesquisadas que deve produzir o conhecimento". Propõe-se a examinar
historicamente como se colocou a Psicologia Educacional e traz a lembrança de que
se associa o surgimento dessa área à obra de Thorndike, publicada em 1903. Isso
já vinculou a Psicologia Educacional a um tipo de pensamento e método, na
tradição de legitimação cientificista, que, segundo ele, continuaria a dominar o
pensamento dos pesquisadores da área, travestido de uma forma ou outra.
Repassando no tempo a contribuição de vários pensadores e pesquisadores,
problematiza os limites epistemológicos que envolvem os trabalhos nesse campo,
mostrando como a atividade real, histórica, determina encaminhamentos diversos,
porém, com o mesmo pano de fundo, a saber: o querer fazer valer um campo como
"científico", o que acaba por subjugá-lo a mimetismos, a critérios externos e
vicissitudes de momentos. Ao lembrar a contribuição de George Santayana, nos
inícios do século XX, "que vê a Psicologia derivando da literatura e assumindo
fórum de ciência quando busca as bases mecânicas e materiais para qualquer
evento mental" (op. cit., 1999, p. 58), encontra as bases das concepções da
Psicologia como ciência, que estarão presentes até hoje, mesmo que sob variadas
formas lógicas. Então, para esse autor, a Psicologia da Educação, nesse contexto,
nasce como uma área de estudo da Psicologia aplicada à Educação, e assim se
mantinha. A saída estaria na capacidade dos estudiosos em criar novas formas de
enunciar seus problemas de pesquisa, formas que refletissem um programa
realmente inovador de pesquisa. Sua reflexão é convergente com a análise de
Maria Amélia Azevedo, acima referida.
Na maioria das licenciaturas não se oferece essa disciplina. Nas poucas em que a
disciplina é ofertada, o típico é a oferta de um semestre, seja com a denominação
de Psicologia da Educação ou Fundamentos de Psicologia da Educação ou Psicologia
do Desenvolvimento e Aprendizagem entre outras denominações. As ementas
mostram uma abordagem eclética, e as bibliografias mais indicadas refletem uma
perspectiva mais estrutural e funcionalista da psicologia. As bibliografias que
refletem concepções mais processuais-sócio-históricas aparecem pouco.
Bruner (1986, 1990), com outros e entre outros, vem sinalizando que a Psicologia
da Educação poderia buscar suas bases no fato de que todos, e as novas gerações
também, participamos de matrizes sociais, que compreendem a cultura e a ciência,
e, nelas e com elas, adquirimos maneiras de entender e participar, construímos
representações e referências, formas cognitivas e destrezas específicas. As
subjetividades - que têm o seu lastro no social - organizam-se nas redes destas
representações e referentes, com a construção de perspectivas que criam
suposições, pressupostos, projetos, portanto, desejos, motivações, expectativas. O
olhar é, pois, sobre a transformação e a transmutação que se processa nas
pessoas, crianças, jovens, adultos, idosos, pelas interações de caráter educativo -
intencionais -, como também pelos processos autoeducativos. A ótica a privilegiar é
multidimensional, transformadora, uma ótica de alternativas, de flutuações, ou
seja, ao lado dos processos construtivos e auto-organizativos deve-se considerar a
mudança e a incerteza presentes nesses processos. Para a compreensão desses
fenômenos respostas genéricas, ou as fragmentárias e específicas, vêm se
mostrando pouco consequentes, e por esta razão tem-se buscado na Psicologia da
Educação novas formas de olhar os fenômenos educativos. Formas que permitam
integrar, sob certas condições, o social e o pessoal, sem dissolver um no outro.
Este é um desafio e tanto para os cientistas do campo.
Bibliografia
Gatti, B. A. (1997). O que é Psicologia da Educação? Ou, o que ela pode vir a ser
como área de conhecimento?. Psicologia da Educação, 5, São Paulo, Educ.