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UFRGS – Filosofia Moderna

Agenor Canal – 28/05/2013

Análise do capítulo XIII do Livro Leviatã de Thomas Hobbes

Este trabalho pretende identificar as principais ideias apresentadas por Hobbes no capítulo XIII
do Livro Leviatã.

Antes de iniciarmos a análise dos argumentos de Hobbes, devemos entender, como


nos adverte Balthazar Barbosa Filho, que os resultados alcançados com os argumentos de
Hobbes tem caráter prudencial ou comparativo, sem a pretensão de justificativa incondicional
de suas teses. O que ele esperar provar é a razoabilidade e justificativa destas teses.

As noções fundamentais para Hobbes são as de corpo e de movimento, e a partir delas


irá construir, nesta ordem, as teorias da sua física, da natureza humana e as implicações para a
ciência política. Para ele o movimento é causa de tudo o que existe, e a vida nada mais é que
movimento, e todo ser finito persevera em manter seu estado de movimento, por isso é
natural que o homem queira manter o movimento que o constitui, ou seja a vida.

Hobbes inicia o capitulo XIII afirmando a igualdade por natureza entre os homens
quanto as faculdades do corpo e do espirito. Não se trata de igualdade absoluta entre os
homens, mas somente para um certo propósito, como nos afirma José Oscar de Almeida
Marques:

“Mais precisamente, o essencial da igualdade proclamada é a


igualdade quanto à impotência de impor sua vontade aos
demais com base em qualquer superioridade natural de força
física ou acuidade mental. Essas superioridades podem muito
bem existir, mas são incapazes, no estado de natureza, de
prover qualquer homem de um poder irresistível ao qual todos
os demais tivessem de se curvar”.

Desta igualdade segundo Hobbes, deriva-se também a igualdade quanto a esperança


de atingirmos nossos fins. Se juntarmos a isso o pressuposto razoável de que no estado de
natureza os bens não são infinitos, podemos como Hobbes propõe admitir que se duas pessoas
desejam a mesma coisa ao mesmo tempo, eles tornam-se inimigos, pois cada um tem o
mesmo direito natural de tomar as atitudes que visem a manutenção de seu movimento, de
sua vida. Da mesma forma no estado de natureza ninguém é invulnerável à possibilidade de
ataques, os outros podem me ver como uma ameaça potencial e por isso preventivamente
querer me atacar. Nas palavras de Limongi:

“Dessa razoável disputa, segue-se ser também razoável


desconfiarmos dos outros homens. Isto é, a desconfiança é
uma paixão que se explica pela circunstância de uma possível
disputa. E da desconfiança, justifica-se o comportamento de
nos anteciparmos ao eventual ataque que possamos sofrer,
garantindo-nos com todos os meios disponíveis contra ele.
Assim, nessas circunstâncias, é razoável que nos antecipemos,

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procurando aumentar ao máximo nosso poder de resistir a um
ataque, cuja possibilidade não é insensato supor.”

Segundo Balthazar, não se trata de admitir como pressuposto a competitividade entre


os homens pelo poder, entendida como uma generalização a partir das observações empíricas,
mas pelo contrário trata-se de supor a oposição entre poderes e dali extrair a competição pelos
bens, como vemos no texto a seguir:

“Em outros termos, é suficiente admitir a possibilidade de que


o poder de um homem se oponha àquele de um outro para
que se torne inevitavelmente competitiva a busca de poder
após poder. Ora a admissão desta possibilidade impõe-se
racionalmente, quer dizer do cálculo das consequências.”

Dos pressupostos da igualdade, da não infinitude dos bens e da incerteza, Hobbes


conclui que o estado de natureza será um estado de guerra.

Hobbes enumera três causas principais de discórdia entre os homens: a competição a


desconfiança e a glória. Nesta ordem buscando o lucro, a segurança e a reputação. Mas o que é
exatamente este estado de guerra entre os homens? Limongi também esclarece este ponto:

“Não que por natureza estejamos sempre em guerra. O que


Hobbes quis dizer é que nossa condição natural é tal — a
condição de igualdade de poder — que a guerra permanece no
horizonte sempre possível das relações entre os homens e,
sendo possível, isto basta para justificar o comportamento
efetivo de nos anteciparmos às suas consequências e nos
comportarmos efetivamente de modo a fomentar uma
situação de disputa.”

Neste sentido Hobbes claramente afirma: “a natureza da guerra não consiste na luta
atual, mas na conhecida disposição para tanto, durante todo o tempo em que não houver
segurança do contrário”. Fica desta forma criado um campo de batalha entre os homens, não
com uma luta constante, mas com uma disposição permanente para a luta visando a auto
conservação.

As consequências deste estado natural de guerra são devastadoras, chegando Hobbes


a afirmar que: “Numa tal situação não há tempo para a indústria, pois seu fruto é incerto;
consequentemente não há cultivo da terra nem navegação ... nem artes, nem letras; não há
sociedade; e o que é pior do que tudo, um constante temor e perigo de morte violenta”.

Para aqueles que ainda tem dúvida sobre este estado de guerra e desconfiança mutua,
Hobbes dá o exemplo, mesmo com a existência de leis e a autoridade do Estado, da opinião
que temos sobre os outros homens se ao viajarmos trancamos nossas portas; ou sobre nossos
familiares e empregados aos trancarmos as gavetas e cofres. Não seriam estas atitudes
também um reconhecimento do estado natural dos homens? Com isso Hobbes que dizer que
se fazemos isso com a existência do Estado, mais estaríamos justificados a proceder de tal
forma em estado natural.

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São consequência deste estado natural:

 Que todo homem tem direito a todas as coisas que puder manter, mesmo ao
corpo de outros;

 Que nada pode ser dito injusto;

 Que não há propriedade nem domínio, nem distinção entre o meu e o de


outro;

 Que só pertence a cada um aquilo que ele é capaz de conseguir e enquanto


puder mantê-lo.

Não é sem razão que diante destas consequências Hobbes possa afirmar: “E a vida do
homem é solitária, pobre, sórdida, embrutecida e curta”.

Hobbes termina o capitulo XIII afirmando que a condição que se encontra o ser
humano, é perfeitamente justificável e razoável diante das condições naturais da existência
humana, mas segundo Hobbes também é possível escapar desta situação, motivado em parte
pelas paixões e em parte pela razão humana. As paixões que fazem os homens tender a paz
são: o medo da morte, o desejo das coisas que são necessárias à uma vida confortável e a
esperança de consegui-las através do trabalho. E a razão por outro lado sugere as normas mais
adequadas para o convívio social.

Bibliografia:

Balthazar Barbosa Filho – Condições da autoridade e autorização em Hobbes. Revista de


Filosofia Política 6 – O Poder, 1989.

José Oscar de Almeida Marques - Hobbes e a medida da desigualdade entre os homens.


Cadernos de Ética e Filosofia Política 14 ,2009.

Jonathan Wolff – Introdução a Filosofia Política, Gradiva, 1996.

Maria Isabel Limongi – Hobbes, Jorge Zahar Ed. 2002.

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