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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

MARIA ISABEL CAMAÑES GUILLÉN


UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM ARQUITETURA E URBANISMO
Maria Isabel Camañes Guillén

SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da


Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção de título de Mestre em
Arquitetura e Urbanismo.

Orientador: Prof. Dr. Carlos Egídio Alonso

Com apoio: Mackpesquisa

São Paulo 2016


G958s Guillén ,Maria Isabel Camañes.
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA.
/ Maria Isabel Camañes Guillén- 2016.
187 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade


Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2016.
Bibliografia: f. 181 – 187.

1. Minhocão. 2. manifestações artísticas. 3. caminhar.


4. paisagem urbana. 5. intervenções temporárias. 6. condição
efêmera. 7. I. Título
CDD 720.7

São Paulo 2016
Dedico esta obra a meus pais Joaquim (in memorian) e Maria, pelo empenho e dedicação que sempre tiveram
para que eu pudesse estudar e pelos ensinamentos que deixaram de persistência e superação.
Ao meu marido Carlos Henrique, pelo apoio constante, paciência e amor, fundamental para me manter no foco.
E a meus filhos Helena, Felipe e Julia, meu combustível para seguir em frente sempre.
Prazer! Encantado...
Meu nome é Elevado.
Costa e Silva, vulgo Minhocão.
Por favor, empreste-me atenção.
Pra muitos sou estorvo,
Pra outros solução.
Derrubar ou tombar?
Eis a questão.
Quer motivos pra me conhecer?
Eis, aqui estão
Chamam-me Minhocão,
Mas não sou animal.
É concreto o meu sistema vital.
Minhas veias são vias
de comunicação.
Veicular é minha função.
Odisseia e romaria,
Via-sacra e carnaval...
Meu ser é invertebrado.
Empresto, de bom grado,
Minha coluna serviçal.

Gil Veloso
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu orientador Carlos Egídio Alonso, pela sua dedicação e carinho enquanto estivemos
juntos, em que me transmitiu não apenas ensinamentos acadêmicos, mas também lições para a vida.

Agradeço à coordenadora do programa de Pós Graduação Eunice Abascal, pela dedicação e amizade
que pautou nossa vivência durante os últimos meses de dissertação, durante os quais me acolheu e
orientou. A Eunice dedico profunda admiração.

A todos os professores do programa, sempre disponíveis e atentos aos questionamentos. Em especial,


à Maria Isabel Villac, que me acompanhou com mais proximidade, contribuindo com direcionamentos
fundamentais.

Aos colegas do Grupo de Pesquisa Culturas e Cidade, pela contribuição com as experiências e
companheirismo.

Aos colegas de turma, unidos sempre na direção da colaboração e do crescimento coletivo.

Ao Mackpesquisa pelo financiamento, essencial ao desenvolvimento desta pesquisa.


RESUMO
Esta pesquisa tem como objetivo o estudo das apropriações dos espaços públicos por meio das
manifestações artísticas contemporâneas abordando as descontinuidades, rupturas, fragmentações,
fluxos e constituição da paisagem urbana no contexto da vida contemporânea. Para tanto, o foco da
pesquisa é o Elevado Costa e Silva, vulgo Minhocão, na cidade de São Paulo. O trabalho, dividido em três
partes principais, busca identificar o modo de construção das cidades e a relação das manifestações
artísticas na apropriação dos espaços públicos, identificando assim seu poder de ressignificação
do lugar e de manifestação de inquietações sociais. Procura-se visualizar o “Minhocão” dentro do
contexto da metrópole, elaborando uma leitura específica desse território por meio da prática da
errância como formação da paisagem urbana, que coloca o território como um meio de interação e
vivência do real, manifestando assim uma narrativa bastante introspectiva e pessoal sobre o espaço.
Desenvolve-se, com isso, uma leitura e escrita das atribuições de sentido nas relações entre as
apropriações e o espaço público. Em seguida, parte-se para o reconhecimento das pré-existências
locais, com suas características físicas e de uso e a abordagem das temáticas relevantes em suas duas
cotas, analisando as manifestações realizadas naqueles locais e classificando-as como características
da condição efêmera do mundo contemporâneo, de acordo com os conceitos, visões e experiências
relatadas e verificadas por meio da funtamentação teórica. O método adotado é o de observação
sistemática do objeto de estudo por meio de mapeamentos, produção de registros fotográficos, bem
como do avanço na compreensão dos conceitos aplicados.

Palavras-chave: Minhocão; Manifestações Artísticas; Caminhar; Paisagem Urbana; Intervenções


Temporárias; Condição Efêmera.
ABSTRACT
The objective of this research is the study of the appropriation of public spaces, by means of
contemporary artistic manifestations, approaching the discontinuity, ruptures, fragmentation, flows
and constitution of urban landscape in the contemporary life context. In order to do that, it is used
the Elevated Highway Costa e Silva, aka Minhocão, in São Paulo City. The work, split in three main
sections, aims to identify the way in which cities are built and the relationship between artistic
manifestations with public space appropriation, identifying their power of re-signification of the sites
and how they translate the social concerns The “Minhocão” is visualized in the Metropolis context,
elaborating a specific reading of this territory by means of wandering around, as means to build the
urban landscape. This puts the territory as a way to interact and experience reality, manifesting a very
personal and introspective narrative about space, as well as developing means to read and write about
the sensorial attributes in the relationship between public space and its appropriations. Afterwards,
it takes of to recognize the local pre existing environment, with its physical and usage characteristics
and the approach to the relevant issues in both dimensions, analyzing the manifestations that
happen in those places, and, labeling them with the ephemeral characteristics of the contemporary
world, regarding to concepts, visions and recorded experiences, and crosschecking them by means
of theoretical foundation. The chosen method is the sistematic observation of the object of study by
mapping, photographic recording and comprehension of the adopted concepts.

Key-words: Minhocão; Artistic manifestations; wandering; Urban landscape; temporary inerventions;


Ephemeral conditions.
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01 PG 041 Moradores de Rua e o Minhocão


FIGURA 02 PG 051 Diagrama de Interdependência
FIGURA 03 PG 054 Diagrama de Interrelação
FIGURA 04 PG 056 Moradores lamentam tinta cinza
FIGURA 05 PG 056 Diagrama de Conceitos
FIGURA 06 PG 059 Esquema de Conceitos
FIGURA 07 PG 063 Paris de Haussmann
FIGURA 08 PG 063 Paris de Haussmann
FIGURA 09 PG 064 Natureza Morta
FIGURA 10 PG 064 Suprematist Composition
FIGURA 11 PG 065 As Musas Inquietantes
FIGURA 12 PG 065 A Persistência da Memória
FIGURA 13 PG 066 Croqui Le Corbusier
FIGURA 14 PG 066 Croqui Le Corbusier
FIGURA 15 PG 067 Bandido da luz vermelha
FIGURA 16 PG 067 Palmeiras e Flamengo
FIGURA 17 PG 068 “The New Yorkais”
FIGURA 18 PG 068 “The long island duckling”
FIGURA 19 PG 068 O galpão decorado
FIGURA 20 PG 069 FAU-USP
FIGURA 21 PG 069 FAU-USP
FIGURA 22 PG 070 Porte Bouteilles
FIGURA 23 PG 070 Fluxus Chant
FIGURA 24 PG 070 Ponta Cabeça
FIGURA 25 PG 070 Objeto Preenchido
FIGURA 26 PG 070 Letras
FIGURA 27 PG 070 Desvio para o vermelho
FIGURA 28 PG 071 Escadaria V. Mariana
FIGURA 29 PG 071 Parangolé capa 30
FIGURA 30 PG 072 Penetráveis PN2 e PN3
FIGURA 31 PG 072 Penetráveis PN2 e PN3
FIGURA 32 PG 072 Divisor
FIGURA 33 PG 072 Roda dos Prazeres
FIGURA 34 PG 074 Lajes
FIGURA 35 PG 075 Máquinas Urbanas
FIGURA 36 PG 076 La Grande Vitesse
FIGURA 37 PG 076 Tilted Arc
FIGURA 38 PG 076 Tilted Arc
FIGURA 39 PG 077 The garden
FIGURA 40 PG 078 Les deaux plateaux
FIGURA 41 PG 079 Wheatfield - A Confrontation
FIGURA 42 PG 079 Santa Monica Museum Instalation
FIGURA 43 PG 080 Grafite no pilar do Minhocão
FIGURA 44 PG 080 Passagem da Rua Consolação
FIGURA 45 PG 080 Exposição Divagando pelo feminino
FIGURA 46 PG 081 Acesso à Passagem da Rua Consolação
FIGURA 47 PG 081 Pixação com estêncil
FIGURA 48 PG 082 Lambe-lambe-Crítica à falta de paciência
FIGURA 49 PG 082 Lambe-lambe-Crítica à falta de amor
FIGURA 50 PG 083 Lambe-lambe
FIGURA 51 PG 089 Diagrama de Interrelação
FIGURA 52 PG 091 Avenida São João
FIGURA 53 PG 091 Rua Amaral Gurgel
FIGURA 54 PG 092 Convite à População
FIGURA 55 PG 092 Destaque para região de estudo
FIGURA 56 PG 093 Corte Genérico do Elevado
FIGURA 57 PG 094 Ciclovia sob Elevado
FIGURA 58 PG 095 Congestionamento
FIGURA 59 PG 096 Uso em dia de Domingo
FIGURA 60 PG 096 Uso em dia de Domingo
FIGURA 61 PG 096 Domingo no Minhocão
FIGURA 62 PG 097 Domingo no Minhocão
FIGURA 63 PG 098 Prédios Deteriorados
FIGURA 64 PG 099 Emprendimento Novo
FIGURA 65 PG 099 Elevado Paralelo à Malha Ortogonal Urbana
FIGURA 66 PG 104 Visão da Av. Angélica
FIGURA 67 PG 104 Visão do Automóvel
FIGURA 68 PG 104 Vista do Largo do Arouche
FIGURA 69 PG 105 Empenas de Edifícios
FIGURA 70 PG 106 Edifício Racy
FIGURA 71 PG 106 Baixios
FIGURA 72 PG 107 Grafite no Pilar
FIGURA 73 PG 112 Av. Amaral Gurgel
FIGURA 74 PG 112 Largo do Arouche
FIGURA 75 PG 112 Novos empreendimentos
FIGURA 76 PG 112 Pichação
FIGURA 77 PG 113 Comércio
FIGURA 78 PG 113 Igreja Universal
FIGURA 79 PG 113 Comércio de Móveis Antigos
FIGURA 80 PG 113 Lançamento do Edif. Porchat
FIGURA 81 PG 113 Acesso ao Elevado e Metrô Marechal
FIGURA 82 PG 113 Acesso ao Elevado Fechado
FIGURA 83 PG 114 Edificio antigo
FIGURA 84 PG 115 Vista do Minhocão
FIGURA 85 PG 115 Reforma do Castelinho
FIGURA 86 PG 118 Vista Skiline
FIGURA 87 PG 118 Igreja Santa Cecília
FIGURA 88 PG 119 Funarte
FIGURA 89 PG 119 Paróquia São Geraldo
FIGURA 90 PG 119 Externato Casa Pia
FIGURA 91 PG 118 Teatro São Pedro
FIGURA 92 PG 118 Hospital Santa Cecília
FIGURA 93 PG 118 77º. Delegacia de Polícia Santa Cecília
FIGURA 94 PG 119 Irmandade Santa Casa de Misericórdia
FIGURA 95 PG 119 Biblioteca Monteiro Lobato
FIGURA 96 PG 119 Teatro Sesc Anchieta
FIGURA 97 PG 122 Túnel de acesso
FIGURA 98 PG 122 Grafite
FIGURA 99 PG 122 Vista parcial do Minhocão
FIGURA 100 PG 123 Vista parcial de um dos prédios
FIGURA 101 PG 124 Quadro-resumo
FIGURA 102 PG 125 Vista do Minhocão
FIGURA 103 PG 126 Intervenção cromática
FIGURA 104 PG 127 Corrida de São Silvestre
FIGURA 105 PG 128 Domingo de lazer
FIGURA 106 PG 128 Domingo de lazer
FIGURA 107 PG 128 Elevado Costa e Silva aos domingos e feriados
FIGURA 108 PG 129 Elevado Costa e Silva aos domingos e feriados
FIGURA 109 PG 129 Elevado Costa e Silva aos domingos e feriados
FIGURA 110 PG 130 Jardim Vertical Absolut
FIGURA 111 PG 130 Empena de edifício com Jardim Vertical
FIGURA 112 PG 131 Empena de edifício com Jardim Vertical
FIGURA 113 PG 132 Divulgação Intervenção Elevado Costa e Silva
FIGURA 114 PG 132 Intervenção Elevado Costa e Silva
FIGURA 115 PG 133 Intervenção Elevado Costa e Silva
FIGURA 116 PG 134 Intervenção Elevado Costa e Silva
FIGURA 117 PG 134 Festa Junina no Minhocão
FIGURA 118 PG 135 Chefs de Rua
FIGURA 119 PG 135 Apresentação do Grupo Esparrama
FIGURA 120 PG 135 Apresentação do Grupo Esparrama
FIGURA 121 PG 136 Cena do Filme Ensaio
FIGURA 122 PG 136 Documentário Elevado 3.5
FIGURA 123 PG 137 Menina que doa livros no Minhocão
FIGURA 124 PG 137 Pintura em empena cega
FIGURA 125 PG 138 Pintura em empena cega
FIGURA 126 PG 138 Pintura em empena cega
FIGURA 127 PG 138 Pintura em empena cega
FIGURA 128 PG 139 Marechal Deodoro
FIGURA 129 PG 142 Aplicação de conceitos
FIGURA 130 PG 143 Aplicação de conceitos
FIGURA 131 PG 144 Aplicação de conceitos
FIGURA 132 PG 145 Vista do túnel sob a Av. Consolação
FIGURA 133 PG 146 Uso dos Fins de Semana
FIGURA 134 PG 148 Intervenção Flávio Motta
FIGURA 135 PG 149 Reedição dos Paineis de Flávio Motta
FIGURA 136 PG 149 Projeto Giganto
FIGURA 137 PG 150 Projeto Giganto
FIGURA 138 PG 151 Projeto Giganto
FIGURA 139 PG 152 Projeto Giganto
FIGURA 140 PG 153 Praça Marechal Deodoro
FIGURA 141 PG 154 Projeto Máscaras Afro-Brasileiras
FIGURA 142 PG 155 Projeto Máscaras Afro-Brasileiras
FIGURA 143 PG 156 Desenho Cotidiano Minhocão
FIGURA 144 PG 157 Grafite Tunel sob Praça Roosvelt
FIGURA 145 PG 158 Artistas em ação
FIGURA 146 PG 158 Grafite-retrato de mulher
FIGURA 147 PG 159 Intervenção com caráter de protesto
FIGURA 148 PG 160 Artistas em ação
FIGURA 149 PG 161 Horror da Menina
FIGURA 150 PG 162 Rato
FIGURA 151 PG 162 Empena de Prédio
FIGURA 152 PG 163 Corpo Mutilado
FIGURA 153 PG 163 Televisão.
FIGURA 154 PG 163 Máscaras Africanas
FIGURA 155 PG 164 Lambe-Lambe
FIGURA 156 PG 164 Retratos e Picho
FIGURA 157 PG 165 Máscara Africana
FIGURA 158 PG 165 Colagem
FIGURA 159 PG 165 Projeto Retratos
FIGURA 160 PG 166 Projeto Retratos
FIGURA 161 PG 166 Meninos andando de skate
FIGURA 162 PG 166 Grafite
FIGURA 163 PG 167 Lambe-lambe
FIGURA 164 PG 167 Grafite
FIGURA 165 PG 167 Imagem Noturna
FIGURA 166 PG 169 Grafiti

MAPA 01 PG 090 Localização do Minhocão


MAPA 02 PG 100 Espaço Construído
MAPA 03 PG 102 Áreas Verdes
MAPA 04 PG 108 Gabarito
MAPA 05 PG 110 Rede Cicloviária e Metroviária
MAPA 06 PG 116 Pontos Notáveis
MAPA 07 PG 120 Concentração de Pessoas
MAPA 08 PG 171 Grafites
SUMÁRIO

27 INTRODUÇÃO

37 PAISAGEM E TERRITÓRIO
47 INTERVENÇÕES TEMPORÁRIAS
49 OS GRANDES EVENTOS
52 ESPAÇO PÚBLICO E VIDA COTIDIANA
54 CONDIÇÃO EFÊMERA NA CIDADE

61 ARTE E CIDADE
75 ARTE URBANA TRANSFORMADORA DO SUPORTE
81 CARÁTER CRÍTICO DA ARTE

85 PERCURSOS DO MINHOCÃO
90 MINHOCÃO
126 SOBRE O MINHOCÃO
147 SOB O ELEVADO
161 PERCEPÇÕES DOS PERCUSOS NOS BAIXIOS

175 CONSIDERAÇÕES FINAIS

181 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


INTRODUÇÃO

INTRODUÇÃO
Assim como outras capitais brasileiras, a cidade de São Paulo é marcada por profundos processos
de desigualdade (políticos, econômicos, urbanos, sociais e culturais). Tais processos, porém, ao
contrário invés de conduzirem mundos sociais estanques e incomunicáveis, produzem, em suas
fronteiras, relações que se desdobram em práticas e modos de interpretação diferentes acerca do
próprio espaço urbano. O modo de construir a cidade e a consequente relação com a apropriação do
espaço público norteia o desenvolvimento deste trabalho, visando a elaboração de um olhar para a
leitura do território da cidade, fruto de ações e processos humanos e políticos.

Nesse sentido, a dissertação analisa as formas de organização e intervenção espaciais que procuram
criar imaginários mais agradáveis e alternativos à cidade, mantendo foco sobre a dimensão social e
artística de apropriação de seus espaços.

O local escolhido como objeto de estudo é o Elevado Costa e Silva, popularmente conhecido como
Minhocão. O Elevado Costa e Silva ligação viária concebida no início dos anos de 1970, como
alternativa para o escoamento do trânsito da capital paulista entre as zonas leste e oeste. Tendo sido
construído sobre as avenidas São João, General Olímpio da Silveira e Amaral Gurgel, tornou-se objeto
de polêmica desde a sua instalação.

Uma grande massa de concreto e asfalto que passa a poucos metros das janelas dos prédios se
tornou sinônimo da degradação da região. A grande área coberta, criada sob o extenso viaduto, de
cerca de 3km de extensão, gerou áreas de sombra, segregadas e marginalizadas do entorno.

Logo após sua inauguração, se vislumbravam ações no sentido de tornar a parte inferior do Minhocão
mais agradável por meio de intervenções de caráter artístico, que utilizavam o grande suporte de
concreto ali disponibilizado. Os pilares foram grandemente explorados ao longo dos tempos e, por
meio desta pesquisa, é possível identificar muitas apropriações criativas feitas.

Procura-se, assim, investigar esse espaço público e as relações sociais entre seus usuários e a cidade,
verificando quais os significados do elevado e como a apropriação artística interfere no cotidiano e

27
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

na vida dos cidadãos.

Esse objeto de estudo foi escolhido, particularmente, devido à curiosidade da autora a respeito da
dinâmica social que envolve as relações naquele local. As quatro décadas de idade do emblemático
Elevado, símbolo de segregação sócio-espacial da região, coincidem com a idade da autora, que
sempre se deparou com a imensidão do artefato de concreto, em situações e em períodos variados de
sua vida. Há aproximadamente 10 anos, quando se mudou para a região, teve contato mais estreito
com a “vida” que há naquele lugar e as diversas apropriações que o Elevado e seu entorno vivenciam.
Esta investigação é fruto de uma curiosidade a respeito da relação entre essas apropriações e a
cidade, bem como os modos pelos quais as pessoas se utilizam daquele lugar e o sentimento que
essas interações produzem no contexto urbano. Também se partiu de uma curiosidade existente
acerca da comunicação, a partir das interferências no espaço público, por meio da linguagem de
signos, sejam grafites, grapichos, pinturas, bombs e demais intervenções que dialogam com a cidade,
e também a respeito dos eventos, festas, apropriações espontâneas que utilizam a estrutura do
Elevado como suporte de arte pública.

Atualmente está em pauta um importante debate a respeito da desativação do Minhocão. Pensa-


se que o viaduto deva ser progressivamente desativado, até que seja viável sua demolição ou
transformação em parque, mesmo que habitantes da região já utilizem a estrutura do Elevado há
anos para este fim, nos períodos que ele se mantém fechado aos veículos. Não se tem a pretensão
de avaliar as implicações urbanísticas da desativação do Elevado, mas não se pode deixar de debater
a forma pela qual essas questões afetam a percepção e comportamento dos cidadãos ao passo que
os espaços, foco da presente análise, têm se configurado.

A pesquisa procura gerar um ganho de repertório acerca da apreensão da cidade e da leitura do


espaço urbano e decodificação das linguagens não verbais que as manifestações artísticas daquele
local carregam, preenchendo de significados aquele espaço urbano. Pretende-se criar relações entre
as formas de manifestação da arte e percepções que os cidadãos constroem nas relações sociais e
em seu viver cotidiano.

28
INTRODUÇÃO

Acredita-se que a virtuosidade cívica pode ser desenvolvida mediante a intervenção no espaço urbano
criada. A alienação e os efeitos segregadores sentidos no espaço, gerados pelo capitalismo (DEBORD,
1992) atingem o centro da questão debatida neste trabalho, de porque razão a participação coletiva
é importante [arte participativa]: para humanizar a sociedade que vive em um espaço atavicamente
fragmentado pela instrumentalização repressiva da produção capitalista.

A arte do fraco (CERTEAU, 1998), o usuário possível de todos os espaços formais e informais, manifesta
o espaço público como expressão legítima da contemporaneidade, na Metrópole. As manifestações
artísticas nas pilastras do Minhocão são desprovidas de poder, mas apontam legitimidade,
reconhecimento, moralidade.

A “arte participativa”, em seu sentido mais restrito, acaba com a ideia de espectador e sugere um novo
entendimento de arte sem audiência, uma arte em que todos são produtores. A pesquisa se divide em
três etapas, que expressam diferentes temas: Paisagem e Território, Arte e Cidade e Percursos. Optou-
se por articular a fundamentação teórica e conceitual da pesquisa ao desenvolvimento desses três
tópicos. No primeiro capítulo, procuramos entender o que seria a paisagem urbana contemporânea,
por meio da observação de diversas manifestações artísticas na cidade. Verificamos assim que a
cidade não é feita exclusivamente de infraestrutura e técnica, a arte é parte constituinte de seu
corpo. Pensar em cidade sem arte significa a eliminação da cena urbana, corresponde a um processo
de “degradação do fenômeno urbano”. (ARGAN, 1992, p. 43). A observação empírica e a experiência
urbana do cotidiano sugerem um estado de deslocamento do cidadão como que habitante de “não
lugares” (AUGÉ, 1994, p. 73) (assentamentos desprovidos de significado). É possível localizar uma
inquietação, um desconforto: qual é o nosso lugar na cidade? Nosso, como coletivo; lugar na cidade
como esfera pública no espaço público. (GHIRARDO, 2009).

Ainda neste primeiro capítulo, onde o olhar se volta para a paisagem urbana, procura-se revelar
situações sobretudo afeitas à própria área de estudo (Minhocão) relativos à vivência da condição
efêmera do mundo contemporâneo, desenvolvendo importantes conceitos que são ferramentais
para compreender e analisar as apropriações espaciais de que nos ocuparemos adiante.

29
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

No segundo capítulo, procuramos verificar as principais manifestações artísticas que caracterizam a


arte contemporânea, em espacial, a arte urbana (PALLAMIN, 2002) e suas relações com a produção
da cidade, para reconhecer as principais vanguardas artísticas (VILLAC, 2006).

A característica crítica da arte urbana, na articulação das apropriações do espaço citadino é fator
importante no estudo para entendimento destas relações do cidadão com o espaço público que
detem um sentido estético.

No último capítulo (Percursos), por meio da vivência e da experimentação destes (JACQUES, 2014),
desenvolvemos o reconhecimento das apropriações, manifestações de arte e festas que acontecem
no Minhcão, procurando compreender o que o constitui como um lugar, estabelecendo relações
com as características urbanas. As manifestações artísticas serão analisadas por meio de conceitos
atribuídos às intervenções temporárias e às características que os lugares tendem a estabelecer em
função da apropriação por meio destas intervenções (FONTES, 2013). Serão verificadas por meio
de observações sistemáticas e pesquisa bibliográfica, as dimensões artísticas destas intervenções,
ou seja as convergências e divergências com o mundo da arte formal; as dimensão simbólicas, a
interação e vivência com o real, manifestando uma narrativa introspectiva particular a respeito das
manifestações artísticas e destacando seu caráter transgressor como forma de dialogar com a cidade
e, por fim, a dimensão urbana, Influência na paisagem urbana do bairro, reconhecimento das pré-
existências, fluxos e vida.

O Minhocão, grande obra de infraestrutura urbana da cidade, representa uma grande cicatriz, marca
da fragmentação do tecido urbano da região. É também produto de um processo crescente de
desativação e subutilização do território que é visto como um lugar adjetivado como desqualificado,
perigoso e mal frequentado. Verificam-se entre as manifestações artísticas que ali acontecem
apropriações não autorizadas, que tem como suporte a estrutura física do Elevado, simbolizando a
troca de experiências que os sujeitos têm ou tiveram, como atores históricos e parte da identidade
daquele lugar.

Procura-se analisar como recorte espacial o território inscrito nos baixios e na parte superior do

30
INTRODUÇÃO

Elevado, numa extensão de aproximadamente 3 Km , que se inicia na parte inferior à Praça Roosvelt,
início da Av. Amaral Gurgel e termina no Largo Padre Péricles, início da Av. Francisco Matarazzo,
sentido zona oeste da Capital. A questão principal é debater como se dá a apropriação dos espaços
públicos nestes locais, principalmente por meio das manifestações de caráter artístico, caracterizadas
como permenentes ou eventuais. Procuramos verificar como a degradação manifesta naquele espaço
intersticial, segregado pela metrópole e elemento segregador, um corte na paisagem, mas ao mesmo
tempo, um interstício, entre duas porções consolidadas do tecido urbano, como o Minhocão é um
elemento de desencadeamento de ações contestadoras, evidenciando o papel poético e político
destas apropriações.

As perguntas ou os problemas de pesquisa que alentam o trabalho podem ser assim enunciados:
é possível encontrar uma relação entre os anseios e vivências e a realidade social dos usuários da
região e as manifestações artísticas realizadas? A arte de alguma forma pode ser responsável por
requalificar os locais degradados? Como a arte pode contribuir para o imaginário coletivo?

Nas cidades contemporâneas, o espaço público constitui-se fora da escala dos seus habitantes, e, que
o infinitamente grande para o coletivo manifesta-se, relativamente, como infinitamente pequeno para
o indivíduo. A dimensão monumental da cidade, hoje, se revela não propriamente na sua escala, mas
na sua dinâmica, uma vez que a cidade atual “não pode mais ser considerada um espaço delimitado,
nem um espaço em expansão; ela não é mais considerada espaço construído e objetivado, mas um
sistema de serviços, cuja potencialidade é praticamente ilimitada” (ARGAN, 1998, p. 215). Dentro
desse quadro, o papel da arte no contexto urbano se faz relevante, segundo Argan:

“[...] o artista integrado ou apocalíptico que seja não pode deixar de existir no contexto social, na
cidade; não pode deixar de viver suas tensões internas. A economia do consumo, a tecnologia
industrial, os grandes antagonismos políticos que delas derivam, a disfunção do organismo
social, a crise da cidade são realidades que não se pode ignorar e com relação às quais não se
pode deixar de tomar, mesmo involuntariamente uma posição.” (ARGAN, 1998, p. 215).

A poética da arte nos espaços públicos permeia, além das questões físicas e culturais da cidade,
outras questões, fundamentadas numa dimensão filosófica, em que a categoria estética do sublime

31
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

(ARGAN, 1991) ressurge no contexto contemporâneo, frente à fragilidade humana em relação às


catástrofes naturais, às transformações climáticas, à violência urbana, às epidemias, acontecimentos
recorrentes na sociedade contemporânea. Desta forma podemos verificar que, a cidade reflete o
mundo, e o artista, atento a isto, utiliza-a como meio de reflexão das relações entre o sujeito e a
realidade.

Procura-se estabelecer uma interpretação por meio da aplicação de conceitos (abstrações) sobre
situações de uso dos espaços públicos, incorporando as contribuições da sociologia da vida cotidiana,
de acordo com autores aqui referenciados. Segundo Zioni; Kato (2012, p.6): “as experiências de
espacialidade e as atribuições de sentido são socialmente construídas e, por isto mesmo são prenhes
de conflitos e intermediações”.

A presente pesquisa parte do pressuposto de que a arte é elemento mediador para manifestação
de inquietações sociais, pressupõe-se que a pessoa humana se expresse de maneira que os ímpetos
estéticos e políticos convivam, e se concretizem nas manifestações artísticas. Procura-se verificar que
as apropriações do Minhocão são concebidas como negação da cultura como mercadoria, mas fazem
parte de um universo de expressões que passam pela espontaneidade, ou por projetos culturais com
apelo coletivo, contra a estetização da prática da cultura como mercadoria.

As manifestações de arte urbana contribuem para a melhoria das características do espaço-público,


interferindo na interação do cidadão com este espaço, trazendo melhoria para as formas de convívio
coletivas.

As intervenções temporárias, características do Minhocão, tem a capacidade de colocar o espaço “em


ação”, em movimento, gerando diversas relações e habilidades subjetivas na tarefa de reconquistar
o espaço público.

As reivindicações e ações de movimentos sociais, seja pelas questões culturais, de segregação sócio-
espacial, tomam outras vertentes através da força dos movimentos coletivos e do poder da imagem,
carregadas de representação simbólica. O trabalho tem como objetivo geral a investigação e a
reflexão sobre os espaços públicos e as experiências de arte urbana como meio de expressão dos

32
INTRODUÇÃO

indivíduos de um determinado território da cidade, frente aos seus desejos e consciência crítica. É
objetivo também entender como as apropriações dos espaços, por meio de manifestações artísticas
podem interpretar estas relações sociais e evidenciá-las coletivamente, e de que forma a arte pode
contribuir para requalificar espaços e áreas degradadas, conferindo-lhes novos significados.

O objetivo específico desta pesquisa é compreender e analisar as manifestações de arte urbana


realizadas no Elevado Costa e Silva (Minhocão), no recorte de 1971-2016. Procura-se compreender
a proposta, a realização e eventuais efeitos destas intervenções, no que tange ao objetivo geral, de
requalificação do espaço urbano relativo a esse objeto-fragmento. A análise proposta será realizada
por meio de fontes secundárias (relatos e aporte bibliográficos sobre as manifestações das décadas
de 1970, 80 e 90 e 2000, e fontes primárias – percursos e documentação fotográfica e icônica, no que
diz respeito à situação contemporânea do trajeto-alvo). Impõe-se ao método investigativo analisar
a complexidade da realidade social dos usuários do Elevado Costa e Silva, compreendendo-os por
moradores de rua, moradores da região, trabalhadores, estudantes, comerciantes e os que por ali
passam, tanto em carro como bicicleta ou transporte público. Os percursos realizados não se ativeram
às pessoas propriamente, mas ao suporte e à sua transformação por meio de intervenções artísticas,
que de alguma forma, de algum ponto de vista da percepção, afetam a esse conjunto de usuários.
O objetivo específico se coaduna ao método adotado, no que diz respeito à realização de ensaios
fotográficos para captar a atmosfera do lugar transformado pelas intervenções artísticas, elaboração
de mapas e reconhecimento da região, e identificação das apropriações criativas do espaço público,
procurando atribuir à arte uma qualidade unificadora e regeneradora.

Pretende-se identificar e analisar as apropriações realizadas, as manifestações de arte urbana que


envolvem expressões permenentes e efêmeras no Minhocão, e avaliar o seu potencial transformador,
enquanto agente social e regenerador na intervenção urbana. Pretende-se compreender como as
intervenções artístico-culturais naquele território, tem o poder de (re) qualificar, (re) significar e (re)
inventar os espaços da comunidade e como repercutem no cotidiano dos indivíduos que ali habitam.

A pesquisa de campo compreenderá a observação sistemática do objeto de estudo nas áreas objeto
de análise do Elevado Costa e Silva e nas regiões fronteiriças, paralelas ao viaduto. Será realizada

33
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

por meio de mapeamento e produção de registros fotográficos que ocorrerão no período de 2015
e 2016. O mapeamento será elaborado pela autora a partir do acompanhamento das observações
preliminares de reconhecimento do objeto, bem como do avanço na compreensão da fundamentação
teórica e dos métodos empregados.

O Minhocão será abordado em nossa investigação através da análise das atribuições de sentidos
que se manifestam nos seus baixios, entorno e parte superior (tabuleiro). A dissertação procura
identificar as manifestações artísticas e apropriações do espaço estabelecidas ali como linguagem
dos sujeitos que vivem e estabelecem ligação com aquele espaço da cidade. As manifestações de
caráter artístico dialogam com os transeuntes. Isso implica entender essas manifestações como
produção de linguagem codificada por sistemas de signos em pleno espaço urbano, utilizando como
suporte a estrutura do Elevado.

O recorte empírico que aborda a investigação toma o percurso por três partes distintas, que serão
denominadas de trecho 01, 02 e 03, sendo respectivamente: Trecho 01 - Avenida Amaral Gurgel
até o Largo Santa Cecília; Trecho 02 - Avenida São João até a Praça Marechal Deodoro; e Trecho
03 - Avenida General Olímpio da Silveira até o túnel de ligação com o Largo Padre Péricles, início da
Avenida Francisco Matarazzo. O percurso constitui um total de aproximadamente 3km de extensão,
onde serão analisados os espaços urbanos delimitados pela sombra do Elevado e os espaços vizinhos,
paralelos ao percurso estabelecido. Essa segmentação do percurso tem como objetivo identificar os
segmentos conforme suas vias (onde o elevado as sobrepõe) e estabelecer uma diferenciação dessas
apropriações,se for possível, de acordo com a relação das mesmas com o entorno.

Os percursos tomarão a prática da errância, “caminhada exploratória” (CARRERI, 2013), para


estabelecer um reconhecimento do usuário, seja através do automóvel, bicicleta ou caminhando, com
o artefato e seu entorno. A observação direta é uma técnica importante da pesquisa empírica que
pode incorporar uma variedade de procedimentos, desde observação visual, auditiva, fotográfica,
etc... e pressupõe, num sentido restrito, contatos não verbais com o observador, podendo ser
aplicada a uma gama limitada de dimensões do social.

34
INTRODUÇÃO

Podemos perceber que” em todas as épocas o caminhar tem produzido arquitetura e paisagem, e
que essa prática, quase inteiramente esquecida pelos próprios arquitetos, tem sido reabilitada pelos
poetas, pelos filósofos e pelos artistas capazes precisamente de ver aquilo que não há, para brotar
daí algo. ” (CARRERI, 2013, p.18).

O uso proveitoso desta técnica pode ser otimizado se associado a construção de tipologias de
classificação das observações bem estruturadas e fundamentadas teoricamente. Estabelecem-se com
isto elos entre os referenciais teóricos e os dados empíricos. As tipologias conceitualmente definidas
servem como informantes do olhar e possibilitam o reconhecimento de distinções empíricas.

Inicialmente serão mapeados e identificados os percursos e o entorno. Identificados as características


mais significativas dos usos como as transposições, acessos viários e de pedestres, mobilidade,
transportes e características das edificações.

Posteriormente serão identificadas as apropriações realizadas na parte superior e inferior do


Elevado (sobre e sob o Minhocão), com o objetivo de identificar, através da aplicação dos conceitos
apresentados para as características das intervenções e da condição efêmera, as manifestações que
ocorrem ou ocorreram no Minhocão, procurando estabelecer sua relação com o contexto espacial e
social da cidade.

35
PAISAGEM E TERRITÓRIO
PAISAGEM E TERRITÓRIO

PAISAGEM E TERRITÓRIO
O conceito de paisagem tem sido abordado por diversas disciplinas, especialmente a geografia,
arquitetura e arqueologia. Em função de sua característica subjetiva, o valor científico de algumas
abordagens tem sido negado. Levando em consideração a superfície denominada território, que hoje
são encontradas nas cidades contemporâneas, será seguido no presente estudo o conceito cultural,
em que se registra a presença do homem e suas interferências no espaço e no tempo, por meio
de seus anseios, suas ações e sua cultura. Aqui se procura visualizar a forma pela qual a cultura
humana modifica a paisagem urbana como um todo, a partir de intervenções pontuais, setoriais ou
regionais. Esta paisagem deixou de ser vista como cenário, dando lugar à paisagem como processo
ou atividade, caracterizada por suas propriedades dinâmicas. A cidade não é mais estável e a noção
de paisagem urbana não é estática, já que se desloca ao ritmo constante da cidade. Esta última, por
sua vez tem duas faces: aquela fixa, imóvel, quase permanente da arquitetura, e uma mutável, que
se transforma constantemente.

As cidades contemporâneas são feitas de fluxos e trânsitos permanentes, um sistema de camadas


(PEIXOTO, 2004) que permeiam a arquitetura da metrópole, heterogênea e desorganizada, suas
estruturas, as ruas, as praças, os espaços vazios, e para o interesse deste estudo, todas aquelas
expressões artísticas que nela nascem e existem. Segundo Peixoto (2004, p. 11), “as cidades são as
paisagens contemporâneas”. Falar em paisagem remete ao visual, e ainda faz pensar em um espaço
muito amplo, incapaz de ser medido. Se juntarmos a noção de paisagem ao contexto urbano, o
objeto de estudo se torna ainda mais difícil de delimitar. Segundo Lefebvre (1969, p. 102), “o urbano
[...] possui um caráter de totalidade altamente complexo, simultaneamente em ato e em potencial,
que visa à pesquisa, que se descobre pouco a pouco”.

“O espaço demarcado por monumentos, radiais ou fronteiras implica em visão de longe, distâncias
invariáveis em relação a referenciais inertes, perspectiva central. Aqui se dá o contrário, estar
muito próximo, não poder mais ver, ficar sem referências. Uma variação contínua de orientações
ligadas à observação em movimento. O espaço não é visual: não há horizonte, nem perspectiva,
nem limite, contorno ou centro. Não há distância intermediária: estamos sempre no seu interior,
no meio”. (PEIXOTO, 2004, p.405).

39
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

A paisagem urbana é um contexto rico em imagens, porém de característica efêmera: as imagens


se deslocam constantemente, de acordo com os suportes que tomam emprestados da estrutura
da cidade para manifestações artísticas, ou o que pode ser também nomeado de intervenções, no
sentido de intervir no espaço urbano. Nas palavras de Saussure (apud ARGAN, 1992, p. 272), “a
cidade é intrinsecamente artística”.

A cidade está em constante transformação: tudo é derrubado, substituído e reconstruído. Verifica-


se uma diversidade de pontos de vista, perspectivas e linguagens sobrepostas, observadas
simultaneamente, pois “o olhar contemporâneo não tem mais tempo.” (PEIXOTO, 2004, p. 179).

As manifestações de arte urbana apontam para essa atmosfera da cidade, em que o olhar
contemporâneo quase se perdeu por completo: uma observação tranqüila, que revela o “invisível”
das coisas, o “aquém da imagem” (DELEUZE apud PEIXOTO, 2004, p.31).

A cidade contemporânea pode ser encarada como um caleidoscópio, na medida em que exige uma
reorganização da visão através de um novo tipo de espectador, inaugurado pelo flâneur. (PEIXOTO,
2004). Não existe mais um olhar contemplativo, “não há visibilidade imediata” (PEIXOTO, 2004 p.
127). A paisagem urbana é construída através de uma visão móvel e múltipla, adquirida por um
movimento constante e acelerado do espectador, já que é impossível ter uma visão conjunta da
totalidade. Dessa maneira, a arte tenta expressar o inexprimível, procurando pronunciar aquilo que
não se pode expressar ou dizer de outra maneira, dando “luz” às paisagens invisíveis das metrópoles.
Essas paisagens podem também ser fisionomias, como nos retratos antigos que, através de longo
tempo de exposição do modelo, conseguiam revelar aquilo que não se percebe diretamente, o
invisível deste, a expressão da interioridade do modelo, sem máscaras ou poses, o que está perdido
na maioria dos retratos contemporâneos. (PEIXOTO, 2004). É esta imagem invisível que é aqui tratada.
A paisagem requer um olhar diferenciado atento aos diferentes ritmos das coisas;

“As transformações mais radicais na nossa percepção estão ligadas ao aumento da velocidade da
vida contemporânea, ao aceleramento dos deslocamentos cotidianos, à rapidez com que nosso
olhar desfila sobre as coisas. Uma dimens -o está hoje no centro de todos os debates teóricos,
de todas as formas de criação artística: o tempo. O olhar contemporâneo não tem mais tempo.”
(PEIXOTO, 2004, p. 209).

40
PAISAGEM E TERRITÓRIO

Assim, a arte presta-se à missão árdua de apreender permanência no efêmero, de extrair beleza e
eternidade do transitório - em suma, de resgatar o invisível na cidade, aprender a enxergá-la como o
fez Baudelaire¹ , de modo a construir uma postura crítica da paisagem que ora se apresenta:

“Baudelaire, os dadaístas, os surrealistas e ainda os letristas e situacionistas praticavam


errâncias urbanas – e levantaram essas experiências através de narrativas errantes explícita
ou implicitamente críticas – em uma mesma cidade, Paris, em três momentos bem distintos.”
(JACQUES, 2014, p.41).

A sensibilização na visão daquilo que se apresenta além de si mesmo, o entender e o interpretar de


paisagens constitui uma postura essencial para a construção de algo melhor e reconstruir a cidade e
a cidadania (TELLES, 2011). Nesse caminho, verifica-se que o ambiente e o indivíduo se influenciam
mutuamente: à medida que o homem descobre o local, propõe suas intervenções e sente as reações
do local modificado, e assim reformula suas propostas com o objetivo de produzir novas paisagens.

“A função da arte é construir imagens da cidade que sejam novas, que passem a fazer parte
da própria paisagem urbana. Quando parecíamos condenados às imagens uniformemente
aceleradas e sem espessura, típicas da mídia atual, reinventar a localização e permanência.
Quando a fragmentação e o caos parecem avassaladores, defrontar-se com o desmedido das
metrópoles como uma nova experiência das escalas, da distância e do tempo. Através dessas
paisagens, redescobrir a cidade.” (PEIXOTO, 2003, p. 15).

No Minhocão verifica-se a produção de uma variedade de imagens da cidade, por meio das
apropriações do território que é ali disponibilizado. Isso pode ocorrer por meio da apropriação da
estrutura dos pilares como suporte para os grafites, ou por meio das festas ou eventos que acontecem
Figura 1: Moradores de Rua e o Minhocão. na parte superior aos fins de semana, quando aquele território se altera e se transforma, devido à
FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2011)
diferença de uso que lhe é dado. Aqui quando nos confrontamos com o objeto de estudo verificamos
o território como palco das atividades e práticas sociais.

¹ Charles-Pierre Baudelaire (Paris, 1821 - 1867) foi um É um território em constante transformação, a apropriação dos territórios pelos moradores de rua e
poeta boêmio e teórico da arte francesa. É considerado
um dos precursores do simbolismo e reconhecido catadores, que por vezes tomam o espaço de tal maneira a deixar seus pertences ali para pernoitar
internacionalmente como o fundador da tradição no mesmo dia, guardados nas fendas, frestas e buracos. “As populações inseridas nas dinâmicas
moderna em poesia. Sua obra teórica também influenciou
profundamente as artes plásticas do século XIX. informais hoje transbordam os limites espaciais tradicionais [...] Infiltram-se nas fissuras do tecido

41
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

urbano, nos desvãos do construído [...] habitam as dobras e as fissuras da cidade”. (PEIXOTO, 2004,
p. 426).

São muitos os autores que tratam de questões relacionadas ao território com ênfase nos usuários.
Podem ser citados Lefebvre (2006), Guatarri (1985); Foucault (2008); Augé (1994) e Castells (1999).
Um aspecto em comum abordado por esses autores é a relação entre a escala local e a global, e a
maioria deles reconhece a necessidade de reforçar a identidade e os valores locais para fazer frente
ao processo de globalização.

É o uso do território, e não o território em si, que faz dele um objeto de análise. O mundo que caminha
da antiga comunhão individual para uma comunhão global na qual a interdependência universal dos
lugares é a nova realidade do território, que é concebido como território habitado (SANTOS, 1994)
e impõe uma revanche através de novas sinergias, o que justifica a metáfora d’o retorno. Nesse
sentido, os territórios são também formas, mas os territórios usados são objetos e ações, sinônimo
de espaço humano, espaço habitado.

As grandes contradições do mundo contemporâneo passam pelo uso do território, e deve-se insistir
no conhecimento sistemático de sua realidade, do território usado e do uso do território. A tendência
atual é que os lugares se unam verticalmente através das redes, mas também deviam se reunir
horizontalmente a serviço da sociedade como um todo. (SANTOS, 1994).

O território imerso em relações de dominação e/ou apropriação sociedade-espaço, é, ao mesmo


tempo e obrigatoriamente, em diversas combinações, funcional e simbólico, pois é exercido domínio
sobre o espaço tanto para realizar funções quanto para produzir significados:

“A prática crítica da arte urbana inclui dentre seus propósitos estéticos o desafio a certos
códigos de representação dominantes, a introdução de novas falas e a redefinição de valores
como abertura de outras possibilidades de apropriação e usufruto dos espaços urbanos físicos e
simbólicos.” (PALLAMIN, 2002, p. 107).

Dessa forma, considera-se que o território é um espaço específico com características próprias que
o distinguem de outros territórios, sobre o qual o individuo ou grupos de indivíduos realizam suas

42
PAISAGEM E TERRITÓRIO

práticas sociais, culturais, econômicas, políticas, etc conferindo significado e identidade ao espaço
real. Esse último, por outro lado, se encontra conectado, principalmente pelos meios de comunicação,
à rede, em que também se dão as práticas sociais, conformando o território globalizado. Entre o local
e o global é possível identificar uma série de escalas de aproximação – edifício, rua, bairro, cidade,
metrópole, planeta - e, em cada uma delas é possível praticar uma ou mais interações sociais, que
geram dinâmicas permanentes e complexas sobre o território. Assim, pode-se dizer que o território
merece constante revisão, a fim de levantar alternativas para o aperfeiçoamento de seu processo
de funcionamento. Essas alternativas se configuram como propostas (projetos) que também podem
acontecer na escala global, por exemplo, através de novas propostas de comunicação; ou na escala
local, por exemplo, com intervenções de caráter artístico em determinado bairro por diferentes
grupos sociais. São imagens projetivas que se descolam do real e se apresentam como projeto para
aperfeiçoar as práticas sociais nos territórios que estão em permanente processo de mutação.

“Em meio aos espaços públicos, as práticas artísticas são apresentação e representação dos
imaginários sociais. Evocam e produzem memória podendo, potencialmente, ser um caminho
contrário ao aniquilamento de referências individuais e coletivas, à expropriação de sentido, à
amnésia citadiana produzida por um presente produtivista.” (PALLAMIN, 2000, p. 57).

SUPORTE: APROPRIAÇÂO DE ESPAÇOS PÚBLICOS

O conceito de apropriação se refere ao ato do usuário se apoderar de um espaço de uso público.


Nessa relação, pode-se apontar o usuário como aquele que desfruta e tem direito ao local físico.
Trata-se então de um usuário com caráter urbano, aquele que utiliza a cidade, chamado também de
cidadão, porque exerce seus direitos civis e, entre eles, o uso do espaço urbano.

Compreendendo o papel do usuário, ele só terá sucesso e fará do espaço um local mantido e cuidado
se houver o chamado pertencimento ou sentimento de pertencer, que significa o envolvimento por
algo ou pelo lugar.

A vida contemporânea contribui para um distanciamento entre o usuário e os espaços ditos públicos,
devido a uma série de fatores que envolvem a vida cotidiana contemporânea: falta de segurança,

43
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

trânsito caótico, malha de transportes carente, poluição sonora, etc. Assim se instala o isolamento,
grande mal da sociedade nos dias atuais, fator também estimulado pela arquitetura enclausurada dos
edifícios e a carência de espaços públicos de qualidade, como é o caso de São Paulo. Nessa vertente
caminha a apropriação destes espaços públicos feitos pelos praticantes ordinários da cidade.

“Os praticantes ordinários das cidades atualizam os projetos urbanos e o próprio urbanismo,
através da prática, uso ou experiência cotidiana dos espaços urbanos e, assim, os reinventam,
subvertem, ou profanam. Os urbanistas indicam usos possíveis para o espaço projetado, mas
são eles que o experimentam no cotidiano que os atualizam.” (BRITTO; JACQUES, 2010, p. 113).

O homem que vivencia a cidade, sem pressa, nesse sentido, seria o praticante ordinário, aquele
que tem a habilidade de experimentar o espaço urbano. Essa visão leva a crer que o isolamento
das pessoas em espaços privados as destitui da vivência da cidade, gera desconforto na convivência
dentro da cidade; percebe-se, assim, que as pessoas se dividem em classes sociais e mostram atitudes
individuais e egoístas, buscando seus próprios interesses em soluções particulares, pessoais e menos
coletivas. Como exemplo, podemos apontar a mobilidade urbana, cada vez mais individual pelo uso
do automóvel e menos coletiva pelo uso do transporte público.

“A cidade – os sistemas de comunicação e transporte – impõe ganhar tempo. Andar depressa


é esquecer rápido, reter apenas a informação útil no momento. Seria a anamnese o antípoda
da pressa, da velocidade? Em vez de acelerar cada vez mais, diferenciar: conservar várias
temporalidades no mesmo tempo, simultaneamente de passado e presente, presente e futuro.
Introduzir um intervalo – uma diferença – no ritmo das coisas, provocando uma sobreposição
de andamentos. Retardar o fluxo, criando um espaço vazio no qual outra coisa pode se instalar.”
(PEIXOTO, 2004, p. 213).

Verifica-se, assim, uma dicotomia: a aceleração da vida contemporânea e a vivência da cidade


remetem ao experimento dos espaços numa velocidade menor – algo que pode ser analogado ao
objeto de estudo da presente análise.

O Elevado nas alturas remete ao ser emancipado, elevado, sublime, no alto. É veloz e apressado,
exercendo a função para que foi de fato concebido: o transporte rápido e eficaz para transpor duas
regiões da cidade. O Minhocão, como popularmente é conhecido, é um ser rastejante, lento, cavador

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PAISAGEM E TERRITÓRIO

de túneis e galerias, que vive no subterrâneo, embaixo da terra é mais lento, faz sua trajetória abrindo
caminho lentamente e deixando seu rastro. Desse ser pode-se tomar a característica da imagem que
emprestou à cidade, imagem degradada, pertencente àqueles indivíduos que vivem à margem da
sociedade. Essa “cena feita à margem do ritmo acelerado das informações dos acontecimentos –
consiste em geral, justamente nisso: imagem do invisível” (PEIXOTO, 2004, p. 214).

Na reflexão acerca das práticas cotidianas, em meio às quais se ambientam as práticas artísticas,
Certeau (1998, p. 87) afirma que “o ato de andar é para o sistema urbano o que o ato de falar é para a
linguagem.” O pedestre, ao caminhar, legitima ou não algumas possibilidades produzidas pela ordem
construída, e pode também ampliar as possibilidades e proibições envolvidas nessa ordem, por meio
de desvios que ele mesmo cria ou adota. (PALLAMIN, 2000).

O espaço do pedestre define um “espaço de enunciação”, distinto daquela espacialidade de ordem


cartesiana, panótica, funcionalista (CERTEAU, 1998). O espaço de enunciação vivido nos baixios do
Minhocão é cartesiano, funcionalista, ao passo que os automóveis tomam seu rápido percurso, na
parte superior.

Essa diferenciação nas operações “desviantes” (CERTEAU, 1998), leva a constatar que a sociedade não
é reduzida a um padrão dominante de procedimentos e que as práticas ditas como “menores”, são
impregnadas de caráter provocativo, não se estabelecendo em lugares próprios, mas se espalhando
pela cidade. “Sua importância reside em seu uso autônomo de construções simbólicas, por serem
modos de operar não domesticados” (PALLAMIN, 2000, p. 39).

As dimensões do espaço na cidade são representadas através de formas, ícones, imagens:


representações que se distinguem, de um lado, como estáveis características culturais de um rito,
um mito, de uma instituição ou empresa, tão fixas como uma simples árvore ou montanha; do outro,
são como velozes informações e ações que, com indispensável visibilidade, se processam na vida de
uma só cidade ou entre cidades no mundo em ritmo global. (FERRARA, 2002, p. 118).

O espaço habitado é uma manifestação exemplar de uma linguagem carregada de signos: esse
texto não verbal se espalha pela cidade e incorpora tudo à sua micro-linguagem: a paisagem, a

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

urbanização, a arquitetura, o desenho industrial ambiental, a comunicação visual, a publicidade, a


sinalização viária.

Os elementos que compõem o espaço interferem em sua forma, uma vez que a paisagem é sugerida
como complemento para captar a forma fluida e irregular desses horizontes. Conforme Ferrara (1997),
a cidade é o resultado da atuação de um conjunto de elementos dinâmicos denominados “contexto
urbano”. Tal contexto é composto por ruas, muros, escadarias, fachadas, edifícios, multidões em
locomoção, ruídos, luzes, cor, volume.

A cidade é tratada como comunicação porque o contexto urbano se constitui como conjunto de
elementos significativos da reflexão acerca da própria cidade. Qualquer alteração nesse contexto
implica mudança em seu significado. A cidade é percebida como um cenário que possui vida
própria, socialmente construída e dinâmica. Entre as intervenções e a cidade se cria um diálogo,
transformando-a em parte constituinte do conteúdo da obra de arte e de seu processo de criação:
ela é fonte de significado e de produção. Está, assim, carregada de imagens, espaço, tempo, o que se
torna suporte para todo tipo de expressões artísticas:

“A cidade é também cenário da linguagem, de memórias e sonhos, as imagens de várias


escritas... a cidade é o mundo de uma imagem, que coletivamente, é construída e reconstruída
continuamente.” (SILVA, 2006, p. 12).

Estudar as obras de arte no espaço urbano é um processo complexo que envolve a análise da
criação artística e do contexto cultural, bem como de suas implicações estéticas e da conjuntura
socioeconômica da cidade. As tatuagens urbanas² alteram e modificam a paisagem urbana,
compondo um processo dinâmico que não para.

Não se pode afirmar que todo espaço público se define como tal a partir de uma obra de arte, mas
toda vez que uma obra de arte é instalada em algum espaço público, esse ganha toma um novo
significado, um novo valor de uso e um valor simbólico, que são acrescentados na cotidianidade.

A arte urbana é tratada em sentido contrário à fetichização do espaço urbano (LEFEBVRE, 2006), ² Termo do pesquisador colombiano Armando Silva no
livro Imaginários Urbanos (2006), para falar de grafite.

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PAISAGEM E TERRITÓRIO

efetivando-se antes como prática crítica na cidade. Segundo Deutsche, apud Pallamin (2000, p. 48),
“esta prática crítica da arte pode efetivar-se através da crítica institucional, da crítica da representação
e no traço com a especificidade local da obra”.

De acordo com Hal Foster (2001), a arte e a crítica devem trabalhar juntas no processo de escolha
de um lugar e no aprofundamento da cultura local, para depois pensar e apresentar um projeto. O
artista e o crítico devem se alinhar para conhecer a estrutura do espaço que analisam o suficiente
para mapeá-lo. Devem também conhecer sua história para poder contá-la, bem como entender o
discurso do espaço assim como o valor histórico de suas manifestações. “Segue uma lógica espacial:
não é apenas mapear o lugar, mas também trabalhar em termos de tópicos, sub-temas, etc.” (FOSTER,
2001, p. 206).

INTERVENÇÕES TEMPORÁRIAS

As intervenções temporárias às quais o presente estudo se refere são aquelas que interferem no
espaço urbano como forma de manifestação artística ou apropriação dos espaços públicos. De
acordo com o que foi verificado na presente pesquisa durante os percursos pelo Minhocão, o mais
relevante são as intervenções (sejam elas manifestações ou apropriações) que causam algum tipo de
transformação.

Essas transformações podem ser percebidas nos espaços que recebem as manifestações, bem como
nos usuários destes espaços, no ambiente ou naqueles que de alguma forma irão interagir com essas
intervenções, sendo agentes delas.

De acordo com Fontes (2013), é possível classificar tais intervenções em: espontâneas; apoiadas
nas atividades do cotidiano; e outras que podem ser chamadas de eventos, com sentido de
particularidade, pelo fato delas produzirem transformações mais significativas aos espaços públicos
em que se aplicam. As intervenções, portanto, seguem temporalidades distintas: as espontâneas
acontecem com uma maior frequência e as singulares, denominadas aqui de eventos, são eventuais.
As primeiras estão apoiadas ao uso cotidiano, e as segundas, ao fato de possuirem habilidades

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

requalificadoras do espaço urbano.

Segundo Fontes (2013, p. 52) “[...] eventos memoráveis deixam marcas duradouras nos lugares e
dão forma aos espaços públicos, transformando pouco a pouco as cidades”. Podem-se verificar nas
intervenções temporárias algumas características que são determinantes para que sejam clasificadas
de tal maneira (FONTES, 2013): a qualidade do transitório, o pequeno, o particular. De acordo com
essas qualidades, é preciso buscar apoio no urbanismo cotidiano para avaliar os acontecimentos:
as intervenções temporárias são aquelas que pertencem à vida cotidiana. De acordo com Fontes
(2013, p. 50), urbanismo cotidiano seria “o modo de vida no físico das atividades públicas cotidianas,
predominantemente econômicas e culturais que ocorrem entre as esferas residencial, institucional e
profissional, denominado espaço cotidiano”.

No espaço cotidiano acontece a vida diária, com seus itinerários e ritmos impostos pelos ritmos
de trabalho e lazer, durante a semana e o fim de semana. Tais acontecimentos diários podem ter
repetição cíclica com frequência alta e homogênea, ou serem eventuais, quando não acontecem
rotineiramente, podendo assim ser acontecimentos eventuais em fins de semana, apropriações
eventuais, ou até grandes eventos instalados nos espaços:

“[...] estas ações na cidade são naturalmente moldadas pelos contextos culturais, sociais, políticos,
inclusive climatéricos do momento de sua realização. Nesta ação/ acontecimento, ao colocar-se o
corpo na cidade – e automaticamente a cidade no corpo, emergem uma série de condicionantes
que têm que ser negociadas, moldadas, adaptadas, incorporadas a cada instante: os ritmos da
cidade, os comportamentos e as reações dos passantes, as leis (formais e /ou informais) que
regulam os usos do espaço, a própria atitude que os artistas / interventores tomam (ou são
levados a tomar) no lugar que “intervem”.” (BRITTO; JACQUES, 2010, p. 124)

Há também as qualidades do subversivo e ativo. Seria essa a qualidade das intervenções de aderência
à malha urbana, que podem ser nomeadas, conforme Fontes, “A Post it City”, a rede fragmentada
e temporária de estruturas funcionais que ocupa os interstícios do tecido urbano e promove a
escrita temporária de seus espaços públicos. Essa rede revela uma habilidade subjetiva na tarefa de
conquistar o espaço: tratam-se de formas de resistência à normatização do espaço público da cidade
contemporânea, trazendo toda a dimensão subversiva da apropriação temporária.

48
PAISAGEM E TERRITÓRIO

“O entendimento da arte como um sistema de forças que atuam sobre o corpo, sendo
potencialmente capazes de intensificar e monumentalizar sensações não conhecidas
previamente.” (BRITTO; JACQUES, 2010, p.125).

Essas intervenções se pautam na intenção estética ou transformadora, como as intervenções artísticas


ou arquitetônicas, que se caracterizam pela “vontade de interagir, ativar, produzir, expressar, mover
e relacionar, agitando os espaços e as inércias através dos acontecimentos ou eventos.” (FONTES,
2013, p. 55).

Ademais, podem ser apontadas as qualidades do interativo, do participativo, do relacional. Trata-


se da qualidade de interação dos usuários de conexão e relação com os espaços de apropriação das
intervenções e também com o outro.

Nesse tipo de intervenção, o usuário se apropria de espaços que por algum motivo estão vazios,
observando as relações sociais e explorando nichos, “apresentando-se muitas vezes como alternativas,
potência e forma de movimento para a revitalização das áreas residuais e dos espaços ociosos na
cidade, movimento com potencial elástico que permite o fazer e o desfazer.” (FONTES, 2013, p. 56).

OS GRANDES EVENTOS

Atualmente, acontece uma variada programação cultural, que envolve eventos atraentes ao ar livre
em comemoração a centenários de cidades, mostras de paisagismo, festivais e exposições. Segundo
Büttner (2002), entre os anos de 1987 e 1991 as exposições e produções dessa natureza haveriam
duplicado.

No início dessa tendência, os eventos sofriam um questionamento quanto à legitimidade da arte


apresentada fora dos ambientes institucionais. Todavia, aos poucos esses eventos tomaram forma e
ganharam espaço, estabelecendo-se como arte sitespecific ou específica ao contexto em que seria
aplicada.

Os interesses e focos das questões dos artistas eram os mais diversos: podiam ser aqueles encontrados

49
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

no local, ou até mesmo questões sociais, políticas e culturais. De acordo com Büttner (2002, p. 74),
“importante era seu caráter único, de modo que não pudesse ser transportados ou transferidos para
outros contextos, o que frequentemente redundava em sua destruição após o término da exposição.”

Verificou-se, porém a substituição dos questionamentos tão importantes inicialmente, que eram as
preexistências do local para a construção da arte urbana, pela encenação espetacular do ambiente:

“Abriu-se então um mercado formidável: realizadores de festivais e megaeventos, secretarias


culturais e muitos empreiteiros de feiras, aeroportos e shopping centers passaram a explorar a
eficácia pública da arte em benefício da sua própria imagem e da do local do evento.” (BÜTTNER,
2002 p. 75).

Como pensar a intervenção crítica na cidade quando ela se apresenta no formato de mega-eventos?
É possível analisar essa questão como uma “intervenção ampliada” no espaço urbano, na qual se
produzem diferentes visibilidades, interesses e reverberações.

“Assim, pode-se tomar o espaço público como local de manifestações culturais da comunidade,
local onde é possível, em oposição aos espaços privados, a realização das trocas, os conflitos e
os encontros (espaço cívico), e também como locais de consumo, espetáculos, festas, turismo e
sociabilidade. Esses locais são passíveis das mais diferentes formas de apropriação, desde aquelas
fundadas na participação popular (de baixo para cima), até as controladas pelo espetáculo (de
cima para baixo).” (BÜTTNER, 2002).

Como forma de resistência às manifestações controladas pelo espetáculo, verificam-se as intervenções


de arte pública, consideradas como estratégias de requalificação. Pode-se afirmar que a arte urbana
participa da produção simbólica do espaço urbano.

“Sendo partícipe na produção simbólica do espaço urbano, a arte urbana – compreendida no


campo das relações sociais e não reduzida a uma dimensão estetizada – repercute as contradições,
conflitos e relações de poder que o constituem.” (PALLAMIN, 2002, p.105).

Se por um lado a arte publica é agente de produção simbólica, a participação popular, por outro
lado, aparece na forma de apropriação espontânea. Assim, a respeito desse assunto pode-se citar as
festas regionais ou locais, que também têm responsabilidade nessa tarefa, contribuindo para reforçar
a coesão social e para a resistência à matriz estetizante dos grandes eventos.

50
PAISAGEM E TERRITÓRIO

INTERVENÇÕES TEMPORÁRIAS

USO COTIDIANO GRANDES EVENTOS


APROPRIAÇÕES ARTE PÚBLICA
ESPONTÂNEAS FESTAS LOCAIS

Transitória
Pequena
Relacional
Pequeno Participativa Grande
Espontâneo Ativa Projetado
Constante Interativa Eventual
Subversiva
Particular
Figura 02: Interdependência temporária entre usos
cotidianos e grandes eventos.
FONTE: Diagrama adaptado pela autora. (FONTES, 2013).
INTENÇÃO TRANSFORMADORA

51
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

“[...] as intervenções temporárias – na forma de apropriações espontâneas, intervenções de arte


pública e festas locais, cuja marca é a intenção transformadora, representam uma ruptura no
cotidiano que registra um “pico” no espaço-tempo, localizando-se entre os usos cotidianos (
o plano de fundo da cidade) e os grandes eventos (seu lado espetacular e de grande escala).”
(FONTES, 2013, p. 69).

ESPAÇO PÚBLICO E VIDA COTIDIANA

O espaço público nas cidades tem passado por mudanças significativas. O crescimento urbano e
a organização econômica são irregulares, impacto de um mundo em constante globalização e
consequente mutação. Em meio a esse cenário o cidadão contemporâneo se desenvolve, e assim
as relações sociais se manifestam, bem como as formas simbólicas de apropriação. De acordo com
Peixoto:

“[...] paralelamente aos projetos de desenvolvimento urbanos, rigidamente estruturados, surgem


territórios informes onde novas configurações espaciais e sociais ocorrem. [É preciso] libertar a
cidade das estruturas rígidas e tomá-la como uma rede dinâmica de relações.” (PEIXOTO, 2004,
p. 420).

O espaço urbano tem implicações sociais, políticas, econômicas e artísticas. Trata-se de um objeto rico
cuja leitura exige uma aproximação interdisciplinar, para que seja possível compreender seu sistema
de relações. O espaço é formado por objetos técnicos e naturais, mas também os determina, uma vez
que é constituído por um conjunto de objetos organizados e utilizados segundo uma lógica própria.
O espaço é criado conforme o homem vive e atua nele: a intervenção do homem cria o espaço. De
acordo com Santos, o espaço “é um misto, um híbrido, um composto de formas-conteúdo”. (SANTOS,
2002, p. 19).

O espaço físico, mensurável, que pode ser quantificado, pode explicar relações subjetivas. A cidade
e sua realidade urbana dependem do valor de uso. O valor de troca e a generalização da mercadoria
pela industrialização tendem a destruir, ao subordiná-las a si, a cidade e a realidade urbana, refúgios
do valor de uso, embriões de uma virtual predominância e revalorização do uso. (LEFEBVRE, 1991).

52
PAISAGEM E TERRITÓRIO

Diante da a segregação espacial da cidade latino-americana, surgem também respostas alternativas:

“Desertos urbanos, ocupações temporárias, imensas favelas... essas formas de espacialidade


se estendem infinitamente, sem pontos de referência... surgem configurações informes que
escorrem e vazam, preenchendo todos os vazios existentes.” (PEIXOTO, 2004, p. 422).

São esses espaços afastados, que fogem ao olho policial e à segurança privada, aqueles que
aparentemente propiciam situações e experiências artísticas nos seus muros e paredes.

É também necessário neste momento analisar a vida cotidiana do cidadão. Segundo Pallamin (2000),
a valorização das práticas cotidianas é fundamental para a arte urbana pois, enquanto a cotidianidade
puder se manifestar através da arte, terá onde se propor a apropriação do espaço público e alteração
de sua carga simbólica. Nesse sentido, pode-se dizer que toda a produção artística feita nas ruas gera
um impacto e é reconhecida ao passo em que constrói um diálogo com o cotidiano do cidadão e seus
problemas reais, bem como a subjetividade da cidade. A arte urbana em todas suas formas precisa
elaborar um discurso próprio, com peso, que dê valor às suas propostas e a fixe no espaço público.

É interessante observar que os novos fenômenos urbanos criam espacialidades heterogêneas, de


usos variados, além de novas lógicas de mercado e de ocupação, novos atores sociais com maior
disponibilização, com maior senso crítico, e com absoluta mobilidade na cidade:

“Atividades econômicas e modos de ocupação do espaço informais, aparentemente desregrados,


mas que operam segundo outra lógica, largamente baseadas na auto-organização [...] a relação
entre mutação territorial e auto-organização, num panorama em que inovação e mudança
derivam de processos não planejados ou regulados.” (PEIXOTO, 2006, p. 421).

Segundo Vera Pallamin (2000), a abordagem da cidade como forma social ao invés de objeto físico
(não como infraestrutura externa aos “usuários”, mas produzida por eles) encara a arte urbana como
certo empenho na requalificação do seu cotidiano. A autora, usando termos de Argan, fala em fazer
urbanística, o que significa contribuir para a transformação qualitativa do espaço urbano alterando
seus objetos, sua espacialidade, qualificações, através de um trabalho que provoca e, ao mesmo
tempo, exige a compreensão de seus códigos e a interpretação de suas múltiplas significações.

53
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

“A questão que se coloca é que princípios estabelecer para detectar o surgimento dessas novas
condições urbanas. Reconhecer as novas formas de ocupação do espaço urbano, largamente
informais, e as práticas engendradas por seus agentes econômicos e sociais. Um procedimento
que questiona as regulações urbanas existentes e revela as configurações dinâmicas ocultas pelo
planejamento e pelos grandes projetos de desenvolvimento urbano.” (PEIXOTO, 2006, p. 419).

Portanto, cabe aos pesquisadores urbanos olhar com maior detalhe o diálogo do artista urbano –
cidadão. A paisagem urbana não é apenas arquitetura, mas considera também tal conversa através
da arte.

CONDIÇÃO EFÊMERA NA CIDADE

A linguagem efêmera é perceptível. Da mesma forma, o homem é um ser efêmero por natureza,
uma vez que se encontra em constante transformação. O homem moderno muito se transformou
para tornar-se o homem contemporâneo. As relações entre os homens na pós-modernidade, de
acorco com as ideias de Bauman (2003), são “líquidas” e frágeis: são diferentes, pois os laços se
afroucharam. Sendo assim, o tempo na contemporaneidade é, de certa forma, mais efêmero do que
o tempo passado: tudo está em fluxo e as redes de conexões digitais permitem que todos estejam
conectados no mesmo tempo presente.

“A cidade – os sistemas de comunicação e transporte – impõe ganhar tempo. Andar depressa


é esquecer rápido, reter apenas a informação útil no momento. Seria a anamnese o antípoda

CONDIÇÃO
EFÊMERA
INTERVENÇÃO
TEMPORÁRIA
ESPAÇOS
COLETIVOS
Figura 03: Interrelação entre os temas.
FONTE: Diagrama adaptado pela autora. (FONTES, 2013).

CONTEXTO SUPORTE

54
PAISAGEM E TERRITÓRIO

da pressa, da velocidade? Em vez de acelerar cada vez mais, diferenciar: conservar várias
temporalidades no mesmo tempo, simultaneamente de passado e presente, presente e futuro.
Introduzir um intervalo – uma diferença – no ritmo das coisas, provocando uma sobreposição de
andamentos. Retardar o fluxo, criando um espaço vazio no qual outra coisa pode se instalar. Um
mundo da lentidão, que se dá tempo, simultaneidade de presente, passado e futuro.” (PEIXOTO,
2006, p. 213).

É possível dizer que os caminhos da arquitetura também estão orientados no efêmero e no


movimento, levando em consideração a configuração das cidades atuais e as relações entre as
pessoas e o espaço urbano. A cidade possui identidades segmentadas, quase impossíveis de serem
apagadas, mesmo com tantas transformações que ocorrem dentro desses espaços. Como exemplo,
pode-se citar o centro da cidade: embora suas condições sejam de decadência e deterioração,
ainda sim é lembrado, metaforicamente, como o coração da cidade pela população local. O mesmo
acontece com o Minhocão, objeto do presente estudo. Os automóveis não transitam naquele lugar
aos domingos e o espaço toma outra configuração devido a esse uso diferenciado, mas as vias e o
suporte permanecem rígidos, alinhados pelo chão. Junto a eles há a eterna memória da função pela
qual foi concebido aquele artefato de concreto.

A linguagem do espaço consolidado é forte, difícil de ser apagada, e não permite que seja criada e
imposta uma nova linguagem ou maneira de se apropriar do espaço. Nesse âmbito, as intervenções
urbanas de caráter pontual ganham uma dimensão nas cidades, justamente por terem um conteúdo e
interpretação mais abertos, além da “possibilidade de trazer à tona significados ocultos ou esquecidos
e apontar para novas possibilidades de uso” (PEIXOTO, 1997, p. 13). Criar espaços, linguagens e perfis
arquitetônicos que pretendam perdurar ao longo do tempo já não faz sentido para as cidades, uma
vez que a arte não é mais considerada eterna. Criar obras mestras ou criar um estilo que perdure por
séculos e lembrado na eternidade foi substituído pela efemeridade. (JAMESON, 2011).

Tendo em vista essa linguagem e a maneira de reviver o espaço urbano, sem tentar efetivar reformas
na estrutura da cidade e ao mesmo tempo atentando para o tema do presente estudo, pode-se dizer
que se trata de um cenário de decadência e degradação, mas que possui um forte significado na
memória histórica da cidade.

55
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Um lugar específico da cidade pode mudar em questão de dias, a depender de vários fatores. Por
exemplo, um graffiti pode ser apagado pela prefeitura, pelo dono do imóvel ou por outro grafiteiro
que resolveu pintar em cima ou ao lado. Nesse sentido, verifica-se o caráter efêmero das intervenções

Figura 04: Moradores lamentam tinta cinza em cima das


DINAMISMO cores. FONTE:<http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/
geral,prefeitura-passa-tinta-cinza-sobre-grafites-no-
minhocao,10000019250>
Acesso em 10.04.2016

REVERSIBILIDADE
CONDIÇÃO
EFÊMERA FLEXIBILIDADE

IMPREVISIBILIDADE
Figura 05: Cinco conceitos extraídos da Condição efêmera
CONEXÃO FONTE: Diagrama adaptado pela autora (FONTES, 2013)

56
PAISAGEM E TERRITÓRIO

A condição efêmera da vida contemporânea toma forma nos espaços físicos das cidades, não
configurando um fenômeno cultural isolado, mas atravessando culturas e propiciando novos
entendimentos da paisagem (FONTES, 2013). Verificando as intervenções temporárias, que são
aquelas que pom ser elencadas como objeto de presente estudo nas apropriações do Minhocão,
foram elencados alguns conceitos da condição efêmera:

O Dinamismo.

Como já foi apontado, a aceleração do tempo é uma das características que afeta significativamente
a mobilidade da cidade contemporânea. A paisagem urbana está em constante mutação, em um
processo de superposição temporal e social. A paisagem é suporte para elementos fixos e móveis e
“deve criar condições para um futuro impreciso, pois as atividades se diversificam ao longo do tempo,
exigindo dessa superfície a capacidade de suporte da mutalibilidade e impermanência.” (WALL apud
FONTES, 2013, p. 85).

O olhar dinâmico, lançado sobre as intervenções, estrutura novas relações sociais espaciais,
permitindo transformações de relações do usuário com o espaço. São propostas que criam novos
compromissos com a cidade, contribuindo para “fortalecimento do caráter coletivo local”. (FONTES,
2013, p. 89).

A Reversibilidade.

As intervenções e apropriações através desse caráter dinâmico passam a ter identidades distintas,
notadamente efêmeras e nômades, ocupando o espaço de forma intermitente, assim testando a
capacidade do território para acomodá-las. O sujeito contemporâneo, nômade, “demanda de uma
idéia alternativa de espaço, em sintonia com uma nova imagem” (FONTES, 2013, p. 91). Por meio
desse conceito, é possível caracterizar a intervenção como transformadora constante do espaço:
trata-se de projetos reversíveis que trabalham temporariamente no espaço. Pode-se dizer que esa
característica, a reversibilidade, “traz à tona novamente o nômade, aquele que perambula e não se
fixa, mas que transforma a paisagem e complexifica o cenário estático da antiga cidade.” (FONTES,
2013, p. 93).

57
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

A Flexibilidade.

Esse conceito se move no sentido de findar com a rigidez, na qual a cidade é vista como território
imprevisível, onde não cabem mais as regras impostas anteriormente. De acordo com Gausa,
apud Fontes (2013), flexibilizar significa abrir o indeterminado, trabalhando em um campo aberto
à transformação. Pode-se dizer que o conceito de flexibilidade nas intervenções visa a ativação
das áreas em que estão instaladas, agitando e ativando os espaços e promovendo reflexão. As
intervenções que trabalham com o conceito de flexibilidade têm caráter investigativo e “se propõem
a uma reflexão sobre as potencialidades dos espaços públicos subutilizados.” (FONTES, 2013, p. 98).

A Imprevisibilidade.

A cidade é um território imprevisível, onde não cabem mais as normas rígidas da antiga modernidade
sólida. Crawford, apud Fontes (2013), destaca a qualidade imprevisível e efêmera da cidade em
função das ações fluidas do viver cotidiano. A qualidade imprevisível destaca a forma de criação de
oportunidades nos espaços, por meio de suportes indefinidos, para que os usuários daquele lugar
sejam responsáveis pelo seu destino, se tornando assim agentes comprometidos com a transformação
do lugar. (FONTES, 2013, p. 102).

A Conexão.

De acordo com os conceitos de Bauman (2004), a sociedade contemporânea é caracterizada pela


fluidez e descontinuidade, de forma fragmentada, porém concentrada. Nesse sentido, a cidade é
percebida como uma superfície fragmentada que necessita de conexão. Wall, apud Fontes (2013),
trabalha com o conceito de conectividade dessa superfície, possibilitando a articulação de espaços
ou programas díspares.

As intervenções temporárias que buscam conexão ou conectividade são responsáveis pela articulação
de diferentes fragmentos socioespaciais na busca de uma visão diferenciada, de forma a aglutinar
tecidos e espaços fragmentados. (FONTES, 2013, p. 105).

58
PAISAGEM E TERRITÓRIO

DINAMISMO APROPRIAÇÕES
ESPONTÂNEAS

REVERSIBILIDADE

ARTE
PÚBLICA
FLEXIBILIDADE

IMPREVISIBILIDADE

FESTAS
CONEXÃO LOCAIS
Figura 06: Esquema de aplicação de conceitos.
FONTE: Diagrama executado pela autora. (FONTES, 2013).

59
ARTE E CIDADE
3
Georges-Eugène Haussmann (1809 - 1891), largamente
conhecido apenas como Barão Haussmann, o “artista
demolidor”, foi prefeito do antigo departamento do
Sena (que incluía os atuais departamentos de Paris,
Hauts-de-Seine, Seine-Saint-Denis e Val-de-Marne), entre
1853 e 1870. Durante esse período, foi responsável pela
reforma urbana de Paris, determinada por Napoleão III, e
tornou-se muito conhecido na história do urbanismoe das
cidades.
4
Charles-Pierre Baudelaire (1821 - 1867) foi um poeta
boêmio ou dandy ou flâneur, além de teórico da
arte francesa. É considerado um dos precursores do
simbolismo e reconhecido internacionalmente como
o fundador da tradição moderna em poesia. Sua obra
teórica influenciou profundamente as artes plásticas do
século XIX.
5
Walter Benjamin (Berlim, 1892 - 1940) foi um ensaísta,
crítico literário, tradutor, filósofo e sociólogo judeu
alemão. Conhecedor profundo da língua e cultura
francesas, traduziu para o alemão importantes obras
como Quadros Parisienses de Charles Baudelaire e
Em Busca do Tempo Perdido de Marcel Proust. O seu
trabalho, combinando ideias aparentemente antagônicas
do idealismo alemão, do materialismo dialético e do
misticismo judaico, constitui um contributo original para a
teoria estética.
6
Paul Cézanne (Paris,1839 -1906) foi um pintor pós-
impressionista francês, cujo trabalho forneceu as bases
da transição das concepções do fazer artístico do século
XIX para a arte radicalmente inovadora do século XX.
Cézanne pode ser considerado como a ponte entre o
impressionismo do final do século XIX e o cubismo do
início do século XX.
ARTE E CIDADE

ARTE E CIDADE
Durante o século XIX se verificou a hegemonia urbana voltada à industrialização e à ocupação maciça
dos espaços urbanos, assim como o imperialismo napoleônico do barão Georges-Eugène Haussmann3
em Paris. Essa modernidade imposta, porém, implicou na destruição da memória da cidade (VILLAC,
2006). Atento ao projeto de exclusão, o filósofo Charles Baudelaire4 vê nessa reforma a divisão do
espaço urbano, já que surgem novas avenidas com grandes perspectivas, que convivem com ruas
de traçado antigo que permanecem como espaços intersticiais, gerando assim uma maior distância
entre as diferentes classes sociais. (VILLAC, 2006).

Baudelaire define a vida moderna com as figuras que povoam esse cenário: há o snob, “aquele
burguês que acredita na fantasmagoria da história cultural das aparências, o dandy – aquele que está
sempre na moda e o flâneur – aquele outro cuja melancolia e inteligência o elege como habitante
boêmio da grande cidade”. (JACQUES,2014, p.57). Essa interpretação da vida moderna e tal visão dos
figurantes da nova cidade foram atualizadas por Walter Benjamin5 no século XX. (JACQUES, 2014).

Benjamin, assim como Baudelaire, denuncia a linguagem secreta dos locais deixados de lado: os
becos, as passagens, os desvios, as ruas de mão única. Nesse sentido, o filósofo trabalha com o
conceito de que a cidade precisa ser conhecida, assim como na concepção marxista, mas que
nenhuma cidade pode ser conhecida sem afeto (VILLAC, 2006). Benjamin cultiva a arte de deixar-se
comover, educando o olhar de forma a conciliar memória e imaginação. (JACQUES, 2014).

No mesmo sentido trabalha Paul Cézanne6 , no início do século XX, o direcionar seu olhar à natureza
com o objetivo de retratar a luz real dos momentos. Com um olhar que compreende a relação do
homem com a natureza, Cézanne pinta o que vê, mas também o que sabe. (VILLAC, 2006).

Tendo como inspiração as percepções dos objetos de Cézanne, no início do século XX surgiu a vanguarda
Cubista. O movimento Cubista abandonou a arte de composição clássica e deu início ao processo de
Figuras 07 e 08: Paris de Haussmann. abstração que suspende os antigos hábitos, de forma a fazer nascer uma nova visualidade. Nessa
FONTE:< https://parisianfields.com/2011/12/18/a-closer-
look-at-parisian-streets/ >
mesma linhagem do processo de abstração, surgiu a segunda vanguarda construtiva, o Futurismo,
Acesso em 10.04.2016

63
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

que enxerga não apenas o movimento, mas também a velocidade, como dinâmicas da vida urbana
moderna. No espaço futurista não existe mais um observador estático:

“O Futurismo se abre à percepção desta nova dinâmica do olhar urbano e inaugura outra imagem,
inspirada pela experiência e pela ciência e a técnica que trazem o fascínio pelo mundo inumano,
pela ausência de familiaridade.” (VILLAC, 2006, p. 6).

Após o movimento Futurista, surgiu o Neoplasticismo que, por sua vez, dirigia o olhar para as
especulações acerca do espaço, construindo a tridimensionalidade através de pontos, linhas e
planos. O Suprematismo foi, na sequência, um movimento de um único artista. Kasimir Malevitch7
empreendeu a redução à pintura, na busca de um novo espírito da arte. Nas artes plásticas, acredita
que apenas a Arquitetura, abstraída de seu caráter funcional, pode alcançar a complexidade do
espaço.
Figura 09: Paul Cézanne – Natureza Morta (1895-1900)
FONTE: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/
Herdeiros do suprematismo, os Construtivistas russos acompanham essa vertente, envolvidos com pessoa11627/paul-cezanne > Acesso em 10.04.2016.
as profundas transformações sociais advindas da Revolução Bolchevique8 , e assim “desenharam
cidades onde se mantém a harmonia entre o espaço rural e o espaço urbano.” (VILLAC, 2006, p. 9).

O processo Expressionista, a pintura Metafísica e o Surrealismo (vanguardas ditas expansivas)


deixaram legados para a imaginética da paisagem urbana (VILLAC, 2006). Seus primeiros seguidores
imaginaram um mundo novo, onde seria possível uma harmonia entra natureza e razão. Tem-se
como sucessor da possibilidade de expressão da angústia, Vicent van Gogh, e da liberdade informal,
Wassily Kandisnky:

“Atentos às mudanças, os pintores metafísicos criticaram o mundo da máquina, mas os


arquitetos expressionaistas o elegeram como um futuro desejável para o qual desenharam
as luzes e as escalas monumentais dos espaços e das novas estruturas da cidade industrial. A
cidade tradicional, suas ruas, esquinas, pequenas praças são insuficientes: começa-se a pensar o
conceito de metrópole, a inspiração da potencialidade que advirá da superposição entre avanço
técnico e concentração urbana.” (VILLAC, 2006, p. 10).

O Surrealismo nega a consciência. Sua linguagem é simbólica, remetendo ao sonho, ao pesadelo,


à intuição e ao subconsciente. Os pintores surrealistas construiram telas dos espaços urbanos Figura 10: Kasemir Malevitch - Suprematist Composition
(1914) FONTE:< http://enciclopedia.itaucultural.org.br/
desolados, destruídos pela guerra e habitados pelas almas penadas da pintura metafísica. No Brasil, pessoa341245/kazimir-malevich> Acesso em 10.04.2016

64
ARTE E CIDADE

a vanguarda se nomeia Modernismo brasileiro, com uma identidade própria para as artes, literatura
e música. Essa vanguarda brasileira revela suas diferenças de temperamento, história e experiência
local, revelando assim uma certa ambiguidade. Essa ambiguidade revela a característica desta
vanguarda de significar coisas diferentes, admitir variadas leituras a partir do mesmo objeto, em
função da oposição à abstração e ao antinaturalismo das vanguardas europeias. (VILLAC, 2006).

Figura 11: Giorgio de Chirico - As Musas Inquietantes


(1916): um exemplo de pintura metafísica.
FONTE:< http://electromundoblog.blogspot.com.
br/2012/07/a-pintura-metafisica-de-giorgio-de.html>
Acesso em 10.04.2016

Figura 12: Salvador Dali – A Persistência da Memória


(1931): um exemplo de pintura surrealista.
FONTE:< http://electromundoblog.blogspot.com.
br/2012/07/a-pintura-metafisica-de-giorgio-de.html>
Acesso em 10.04.2016

7
Kazimir Severinovich Malevich, (Kiev, 1878 – 1935) Na Arquitetura, a linha adotada durante esse período é racionalista, procurando uma reescritura do
foi um pintor abstrato soviético. Fez parte da vanguarda
russa e foi o mentor do movimento conhecido como passadon mais adaptada ao clima e costumes brasileiros. Ao longo da segunda metade do século XX,
Suprematismo. a construção da cidade moderna brasileira é concretizada, nos moldes de Lucio Costa e Le Corbusier,
8
Revolução Bolchevique ou Revolução Russa de
1917 foi um dos acontecimentos mais importantes “sem história e escala de cidade antiga a modernidade de Brasilia assusta.” (VILLAC, 2006, p.10).
da história do século XX. Ela foi o produto de um
amplo processo histórico. A Revolução Russa de 1905 A partir da terceira geração de arquitetos, as questões funcionalistas do Modernismo são deixadas
foi a primeira grande mobilização operária, quando
nasceram os conselhos operários, que reapareceriam de lado, e volta-se a atenção para a diversidade. Para esses arquitetos, o centro da cidade deve
em 1917. A Rússia era, até então, um país de população ser revitalizado para que volte a ser o coração da cidade. A escala humana, do pedestre, volta a
predominantemente camponesa (cerca de 70% da
população total) e que ainda mantinha relações de prevalecer. Na cidade pós-moderna não há símbolo, mas há alegoria - essa constatação representa
produção pré-capitalistas na agricultura, ao passo em que os momentos da arte em que a aparência é conectada a um tipo de realidade. A arte pós-modernista
passava por um processo acelerado de industrialização,
concentrada em alguns grandes centros urbanos. é alegórica não apenas por sua ênfase nos espaços em ruínas (como nas instalações efêmeras) e nas

65
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

imagens fragmentárias (como em apropriações da história da arte e dos meios de comunicação de


massa), mas, acima de tudo, por seu impulso pela subversão das normas (FOSTER, 2014).

A partir da terceira geração de arquitetos, as questões funcionalistas do Modernismo são deixadas


de lado, e volta-se a atenção para a diversidade. Para esses arquitetos, o centro da cidade deve
ser revitalizado para que volte a ser o coração da cidade. A escala humana, do pedestre, volta a
prevalecer. Na cidade pós-moderna não há símbolo, mas há alegoria - essa constatação representa
os momentos da arte em que a aparência é conectada a um tipo de realidade. A arte pós-modernista
é alegórica não apenas por sua ênfase nos espaços em ruínas (como nas instalações efêmeras) e nas
Figura 13: Croqui Le Corbusier – Ministério da Educação
imagens fragmentárias (como em apropriações da história da arte e dos meios de comunicação de e Saúde - RJ FONTE: Revista Vitruvius Disponível
massa), mas, acima de tudo, por seu impulso pela subversão das normas (FOSTER, 2014). em:http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/
resenhasonline/01.001/3271 Acesso: 04.05.2016

A revalorização da vida cotidiana e da complexidade das relações adquire importância entre os


arquitetos, marcando o retorno de uma concepção arquitetônica humanista. Destaca-se a conferência
de Martin Heidegger9 , que lembrou o vínculo entre saber morar e construir, assim como a forte
influência da Teoria da Complexidade de Edgard Morin10 e os critérios e metodologias projetuais de
Jane Jacobs11.

A Pop Art surgiu entre 1954 e 1955 na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, após a chegada de Jasper
Johns e Robert Rauschenberg às galerias de Nova Iorque, em um momento em que a arte estava
dominada pelo expressionismo abstrato. Todos os artistas pop representavam objetos fáceis de Figura 14: Croqui Le Corbusier – Plano Piloto de Brasília
FONTE: Revista Vitruvius Disponível em:http://www.
reconhecer: comics, geladeiras, celebridades, garrafas de Coca-Cola e outros elementos de consumo vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/07.075/1938
massivo que os abstracionistas rejeitavam por serem concretos e materiais. A despersonalização Acesso: 04.05.2016

dos objetos, o espírito do feito em série e as grandes quantidades cativaram o mundo das galerias. 9
Conferência Construir, habitar, pensar de Martin
Heidegger, em Darmstäd, 1951.
Logo depois, a estética do pop influenciou outros artistas como o Keith Haring e o Jean Michel 10
Edgard Morin, pseudônimo de Edgar Nahoum, é um
Basquiat, ambos intimamente ligados ao universo do graffiti de Nova Iorque. No Brasil, nomes como antropólogo, sociólogo e filósofo francês judeu de origem
sefardita. Formado em Direito, História e Geografia,
Claudio Tozzi, Antonio Dias e Rubens Gerchman se destacam no cenário da Artpop. Todavia, o início realizou estudos em Filosofia, Sociologia e Epistemologia.
da proliferação dos meios de comunicação de massa no Brasil, durante a década de 1960, leva, 11
Jane Butzner Jacobs foi uma escritora e ativista política
do Canadá, nascida nos Estados Unidos. Sua obra mais
paradoxalmente, esses artistas a aproximar as técnicas da arte pop (silkscreen e alto-contraste) a conhecida é Morte e Vida de Grandes Cidades, na qual
temas engajados politicamente. critica duramente as práticas de renovação do espaço
público da década de 1950 nos Estados Unidos.

66
ARTE E CIDADE

Nos anos 60, surgem novos fenômenos na arte que incorporam a propaganda como construtora
dos espaços urbanos: por exemplo, na pintura de Ricard Hamilton, nos edifícios anúncio de Robert
Venturi, que defendia uma arquitetura de percepção imediata. (VILLAC, 2006). São impulsionados
distintos projetos artísticos com o objetivo de recuperar o espaço público enquanto espaço de
expressão, de diversidade e de identidade.

Figura 15: Claudio Tozzi – Bandido da luz vermelha (1967)


FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/
pessoa8528/claudio-tozzi
Acesso: 02.05.2016

Figura 16: Rubens Gerchman – Palmeiras e Flamengo


(1965) FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/
pessoa2104/rubens-gerchman
Acesso: 02.05.2016

“Chegamos à conclusão de que a arquitetura comercial é orientada para o carro, típica do


espraiamento urbano, é nossa fonte para uma arquitetura cívica e residencial com significado,
tão viável agora quanto o vocabulário industrial do começo do século XX foi há quarenta anos
para uma arquitetura moderna do espaço e da tecnologia industrial.” (VENTURI apud FOSTER,
2015, p. 25).

67
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 17: Keith Haring “The New Yorkais” Speedy


Graphito (1978) FONTE: http://undergroundparis.org/
keith-haring-speedy-graphito-paris-street-art
Acesso: 02.05.2016

Figura 18: Robert Venturi - “The long island duckling”


(1972) FONTE: https://coisasdaarquitetura.wordpress.
com/2010/10/29/a-metafora-na-arquitetura-2/
Acesso: 02.05.2016

Figura 19: Robert Venturi – O galpão decorado


FONTE: https://coisasdaarquitetura.wordpress.
com/2010/10/29/a-metafora-na-arquitetura-2/
Acesso: 02.05.2016

68
ARTE E CIDADE

No Brasil, também ao longo da década de 60, percebe-se uma necessidade de manifestação mais
aberta de cultura. Instala-se uma diversidade de produção no país, tanto musical, quanto de cinema.
Desta época são os festivais de música popular que trouxeram o movimento Tropicália; o Cinema
Novo investiga o inconsciente coletivo do Brasil; os textos políticos de Florestan Fernandes; os estudos
indígenas de Darcy Ribeiro e a revolucionária Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire. (VILLAC, 2006).

Na Arquitetura, a ênfase vai para a produção ideológica da Escola Paulista com Vila Nova Artigas –
FAUUSP. No entanto, a mais revolucionária vanguarda é a arquitetura do concreto armado aparente
de Affonso Eduardo Reidy, Vila Nova Artigas, Lina Bo Bardi e Paulo Mendes da Rocha, que caracteriza
o rompimento do classicismo com o concreto aparente. O Neoconcretismo se estabelece com o
objetivo de envolver a sociedade e colaborar com a cultura universal. Helio Oiticica, Ligia Pape e
Lygia Clarck revogam o sujeito e fazem crítica ao excesso de racionalismo da arte construtiva das
vanguardas. Os artistas reagiam às condições de exposição, circulação e acesso das obras de arte
inseridas no espaço museológico e galerístico.

A Arte Conceitual surge e tem como origem os trabalhos de Marcel Duchamp. Na década de 60,
graças às idéias veiculadas pelo grupo Fluxus, a Arte Conceitual tornou-se um fenômeno mundial.
No Brasil, artistas como Artur Barrio, Baravelli, Carlos Fajardo, Cildo Meirelles, José Rezende, Mira
Schendel, Tunga e Waltércio Caldas começam a desenvolver um trabalho nessa forma de expressão.
Nesse momento, a Arte Conceitual se desenvolve somente no campo das idéias, abandonando um
pouco a materialidade da obra de arte.

Nessa forma de expressão artística, as ideias, reflexões e pensamentos do artista eram mais importantes
do que o objeto de arte em si. Com isso, o suporte da pintura ou intervenção artística era visto
também como suporte para as reflexões do artista. As obras de arte conceituais eram apresentadas
como meros documentos, um relato de reflexões do artista que não utiliza a linguagem escrita, mas a
linguagem visual, sua característica própria. Ao observador cabia estabelecer o entendimento dessa
Figura 20 e 21: FAU-USP – Vila Nova Artigas
FONTE: http://www.archdaily.com.br/br/01-12942/ linguagem. Surgiu, nesse contexto, a força crítica da arte conceitual.
classicos-da-arquitetura-faculdade-de-arquitetura-e-
urbanismo-da-universidade-de-sao-paulo-fau-usp-joao-
vilanova-artigas-e-carlos-cascaldi
Acesso: 02.05.2016

69
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

70
ARTE E CIDADE

Ainda nesse momento, é possível pensar em arte pública por meio de iniciativas individuais de artistas.
As manifestações ambientais de Hélio Oiticica, com suas capas, estandartes, tendas, parangolés, uma
sala de sinuca (1966) e Tropicália (1967, ambiente labiríntico composto de dois espaços associados a
Figuras 22: Porte Bouteilles – Marcel Duchamp (1914) plantas, areia, araras, poemas-objetos, capas de parangolé e um aparelho de televisão12) podem ser
tomadas como exemplos de produção artística que interpelam a cena pública.
Figura 23: Joseph Beuys, The Chief—Fluxus Chant (2015)
FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.org.
br/#!q=marcel%20duchamp Na década de 1970, podem ser lembradas as intervenções na cidade realizadas por Antonio Lizarraga
http://www.frenchandmichigan.com/fam/joseph-beuys- em parceria com Gerty Saruê, cujo primeiro resultado é Alternativa Urbana. A obra, definida pelos
and-martin-kippenberger
Acesso: 03.05.2016 autores como peça de “engenharia urbana”, é composta por 28 toneladas de vigas prismáticas de
cobertura (fabricadas pela Sobraf), pintadas com faixas azuis, pretas, brancas e vermelhas, cortadas
Figura 24: Ponta Cabeça, instalação de Tunga, 1994-97
por um desenho geométrico. A proposta liga-se à interação do público com a obra e à ideia de que a
Figura 25 - Objeto Preenchido de Waltércio Caldas arte deve ser “utilitária”. Esse projeto está primeiro na origem de um projeto coletivo, liderado pelo
FONTE: https://fotoclubef508.wordpress.
com/2008/11/24/alain-quemin-a-origem-em-discussao/ arquiteto Maurício Fridman. A Rua Gaspar Lourenço, na vila Mariana, São Paulo, é escolhida como
Acesso: 03.05.2016 cenário: o beco é pintado de branco com figuras negras representando as fases da evolução humana;
Figura 26 e 27 Letras - Schendel e Desvio para o vermelho a escadaria, também branca, leva uma lista azul e panos coloridos; os muros são recobertos com
- Cildo Meirelles letras, números, linhas e bolas coloridas que tomam a calçada.
FONTE: http://www.agachamento.com/?p=623
Acesso:03.05.2016 03.05

Figura 28: Antonio Lizarraga – Escadaria V. Mariana (1972)


FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.org.
br/#!q=antonio%20lizarraga
Acesso: 03.05.2016

Figura 29: Helio Oiticica – Parangolé capa 30 – RJ (1972)


FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra2723/
parangole-capa-30
Acesso: 03.05.2016
12
O termo Tropicália nasce como nome da obra de
Hélio Oiticica (1937 - 1980) exposta na mostra Nova
Objetividade Brasileira, realizada no Museu de Arte
Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ, em abril de 1967.
A obra pode ser descrita como um ambiente labiríntico
composto de dois Penetráveis, PN2 (1966) - Pureza É um
Mito, e PN3 (1966-1967) - Imagético, associados a plantas,
areia, araras, poemas-objetos, capas de Parangolé e um
aparelho de televisão.

71
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 30 e 31: Hélio Oiticica - Penetráveis PN2 e PN3 -


Tropicália (1969) FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.
org.br/obra66391/tropicalia
Acesso: 02.05.2016

Figura 32 e 33: – Lygia Pape – Divisor (1968) e Roda dos


Prazeres (1968) FONTE: http://enciclopedia.itaucultural.
org.br/pessoa950/lygia-pape
Acesso: 02.05.2016

72
ARTE E CIDADE

As manifestações artísticas, nesse momento, incorporam a emoção e o comportamento se abre à


vida. O interesse pelo lugar e sua relação com os objetos de arte leva muitos artistas à reflexão sobre
a relação da arte, o contexto social e o ambiente urbano, ao passo que os anos 60 trouxeram de volta
o valor da diversidade e a cidade volta a ter memória (VILLAC, 2006). Tal situação nos remete aos
dias atuais, em que não existe uma única definição de arte pública, apesar de existir um campo de
características definidas.

Foster (2014) propõe que a arte é, antes de tudo, atravessada pelas “contradições” próprias a ela
mesma e à teoria. Trata-se daquilo que Foster chama de ausência de centro e de presença. Como
Duchamp já havia assinalado a “instabilidade do signo” (Foster, 2014, p. 89), não seria possível
assumir qualquer estabilidade nesse momento.

No período pós-Duchamp, a arte se apresenta com um valor estético, mas subtrai-se em um valor de
uso. Com isso, arte e consumo tornam-se um só. Essa tendência mobiliza os autores mais diversos na
perspectiva de uma arte estritamente voltada ao mercado. Fredric Jameson, crítico contumaz desse
ideário, sugere uma oportuna vigência de cultura de massas e arte, mesmo que os artistas mais
novos nada citem, já que eles, antes, se introjetaram de tal maneira que são irreconhecíveis, advindo
daí uma impossível conciliação de análise que seja fruto de teorias anteriores a essa receita. “O que
se costumava ser estigmatizado como cultura comercial ou de massa passa agora a ser percebido no
recinto de um domínio cultural novo e ampliado.” (Jameson, 2011, p. 41).

Mas ainda se verifica outro problema: a assinatura do “autor” da obra vale mais que a própria obra.
(Foster, 2014). A arte é veículo de prestígio e de desejo. É dentro da arte que se compõe um quadro
cínico muito singular e específico, demanda dos tempos urgentes de hoje.

A arte pós-moderna é vivida como uma espécie de trauma, fato evidenciado pelo esquema do
real que transmite. A ordem simbólica, nesse sentido, está inscrita numa economia psíquica, via
acontecimento traumático. Os objetos artísticos são contaminados pelo olhar, além de compungidos
no tráfego de sentido que se coloca como condição de existência. “Eu estou no quadro” é o mote
que desata o narcisismo contemporâneo. Toda arte é uma “domesticação” do olhar. Daí a partilha

73
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

que o hiper-realismo traz para o debate contemporâneo. Seria um subterfúgio contra o real,
desrealizando-o, mas que “antes exalta que questiona” (Foster, 2014, p. 138) o presente em que se
insere.

Essa maneira de interpretar os dados da arte, condicionada por uma economia que, ao fim, é
economia em vários sentidos, inclusive o econômico, alcança pelo menos duas dimensões na obra
de dois pensadores atuais muito lidos no mundo inteiro: Barthes e Baudrillard. Para o primeiro, trata-
se de uma ruptura, daí a noção de “simulacro”. Para o segundo, porém, mercado e arte haviam
definitivamente se juntado em uma “política do signo-mercadoria” (Foster, 2014).

O ponto de inflexão dessa arte estaria associado à perspectiva do etnólogo, na qual a crítica à instituição
capitalista se voltaria para a alteridade e para a cultura, impregnada do contexto, conciliando assim
posições interdisciplinares e seria autocrítica. (Foster, 2014).

Pensar e refletir sobre a realidade de maneira sofisticada exige do artista uma referência que ele
muitas vezes não tem. Assim como um pintor figurativo necessita estudar profundamente a sua
técnica e forma de expressão para que possa fazer um retrato de qualidade, o artista conceitual
necessita ter um profundo conhecimento de filosofia, história, cultura e informação sobre o mundo
atual, assim como os artistas contemporâneos, para que possam criar “reflexões” visuais consistentes.
Atualmente, os artistas conceituais imprimem sua arte em vários formatos: vídeo arte, fotografia,
instalação, performance, internet art e Land Art. Cada uma dessas formas de expressão leva o artista
a novos desafios e, muitas vezes, a uma volta para as formas de expressão tradicionais das artes,
como a pintura, a gravura e a escultura.

Esse movimento de inter-relação entre tradições artísticas tradicionais e contemporâneas tem


muitas vezes sido chamado de Neo-Conceitualismo. Talvez o Neo-Conceitualismo nada mais seja do
que a superação das pré-concepções que tanto tem atrapalhado a livre expressão do artista plástico
na atualidade, possibilitando que ele possa enfim produzir arte sem ser rotulado como acadêmico
ou contemporâneo. É provável que o Neo-Conceitualismo permita ao artista ser simplesmente um Figura 34: Arte Cidade III- Nelson Felix – Lajes (1996
– 1997) FONTE: <http://chicago-outdoor-sculptures.
artista. (FOSTER, 2014). blogspot.com.br/2011/09/grand-rapids-michigan-la-
grande-vitesse.html>

74
ARTE E CIDADE

Quando tratamos de arte urbana, remetemos aos conceitos de Arte Site Specific. De acordo com
Peixoto (2004), o termo Site Specific tem uma conotação mais ampla ao levá-lo ao contexto urbano.

Os conceitos dessa arte estão ligados a movimentos como a Land Art e a Environmental Art, mas
investiga primordialmente as relações entre a paisagem construída (a arquitetura e suas dinâmicas
sociais), bem como entre as instituições artísticas, ou de outra natureza, e a prática artística. Formou-se,
assim, o que foi chamado de Installation Art e, a partir dos anos 80, também deu origem a movimentos
que evoluiriam no sentido de sua plena intervenção no espaço. Embora formas contemporâneas de
arte que respondem ao lugar para onde é realizada tendam a optar pela efemeridade, a arte site
specific foi inicialmente produzida segundo uma natureza relativamente permanente. Dessa forma,
diz-se que a arte site specific é realizada em função de um determinado local e leva em consideração
suas características físicas e dinâmicas sociais.

De acordo com Peixoto (2004), o termo site specific tem uma conotação mais ampla ao levá-lo ao
contexto urbano. A obra de arte não é um objeto independente, e ao ser colocado no espaço público
se impregna daquilo que a rodeia: a cidade completa seu conteúdo. Verificando a cidade como fonte
de significados, sua relação com a intervenção artística alimenta sua existência como obra.

“A função da arte é construir imagens da cidade que sejam novas, que passem a fazer parte
da própria paisagem urbana. Quando parecíamos condenados às imagens uniformemente
aceleradas e sem espessura, típicas da mídia atual, reinventar a localização e a permanência.
Quando a fragmentação e o caos parecem avassaladores, defrontar-se com o desmedido das
metrópoles como uma nova experiência das escalas, da distância e do tempo. Através dessas
paisagens, redescobrir a cidade.” (PEIXOTO, 2004, p.15).]

Ao verificar as cidades ao longo dos anos, podemos tomar a Paris de Haussmann como possuidora
Figura 35: Arte Cidade–Zona Leste - Máquinas Urbanas -
José Resende (2002) FONTE: <http://www.select.art.br/
de valor de limite, um ponto de partida para um processo de metamorfose. A cidade de Paris,
design-e-experimentacao-na-intervencao-urbana/> intimamente conectada com a cidade pré-industrial, inaugurada por espaços heterogêneos da
Acesso em: 27.04.2016.
capital como uma entidade única (CHOAY, 2008). As transformações nas cidades ficam evidentes
13
NEA – National Endowment Arts Grants [NEA] and ao estudarmos a história da urbanização das cidades europeias e verificarmos as similaridades e
private fund. Entidade de Artes americana que promove contribuições dos planos urbanísticos sobre as cidades. A construção e a permanência da urbanidade
a arte e a capacidade criativa nas comunidades. FONTE: <
https://www.arts.gov/ >. Acesso em 27.04.2016. metropolitana na segunda metade do século XIX se deram em grande parte aos planos de Haussman
(Paris), Wagner (Viena) e Cerdà (Barcelona), (CHOAY, 2008).

75
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Artistas como pintores, cineastas, fotógrafos nos confrontam desde o século passado, evidenciando
as relações sociais de uma cidade de “duas faces”, benéfica para uns, no entanto refém do progresso
e beleza. (CHOAY, 2008).

No entanto a medida que o tempo passa, tanto uns como outros designam de forma semelhante
a acumulação progressiva de pessoas, multiplicação de trajetórias e aceleração da velocidade,
o gigantismo contagioso de construções verticais e horizontais, a disseminação periférica e, por
fim, a imagem da ausência. (CHOAY, 2008, p. 9).

ARTE URBANA TRANSFORMADORA DO SUPORTE

O espaço das cidades é explorado pela arte pública de modos distintos. Alguns projetos artístico- Figura 36: La Grande Vitesse (1969) - Alexander Calder
FONTE: <http://chicago-outdoor-sculptures.blogspot.com.
arquitetônicos se associam diretamente aos processos de requalificação do espaço urbano e contam br/2011/09/grand-rapids-michigan-la-grande-vitesse.
com a participação da população local em sua execução (pode-se citar o trabalho de Eileen Adams na html> Acesso em: 27.04.2016

Figura 37 e 38 : Tilted Arc (1981) - Richard Serra


FONTE: https://br.pinterest.com/
pin/78883430949601427/
Acesso em: 27.04.2016

76
ARTE E CIDADE

Figura 39: Richard Meier: Getty Center. The Garden -


Robert Irwin (1999).
FONTE: http://friendsofsdarch.photoshelter.com/image/
I0000rP13JTEps5s
Acesso em: 03.05.2016

77
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 40: Daniel Buren - Les deaux plateaux (1986)


FONTE: http://www.agnesdenesstudio.com/works7.html
Acesso em: 03.05.2016

78
ARTE E CIDADE

Pembroke Street Estate, Plymouth, na Inglaterra). Outros planos de renovação de centros urbanos
se beneficiam de obras de artistas de renome. A encomenda feita a Alexander Calder pelo NEA13 é
uma delas.

Se o trabalho de Calder, instalado na região central de Grand Rapids, Michigan, 1969, reconheceu
acolhida imediata por parte da população, outra foi a reação mobilizada pelo Tilted Arc (1981), de
Richard Serra. Trata-se de uma gigantesca “parede” de aço inclinada que toma conta da Federal
Plaza, em Nova York, retirada do local em 1989, em função dos sucessivos conflitos entre o artista e
a opinião pública.

Exemplos de projetos e obras que lidam com a cidade como espaço de intervenção podem ser
encontrados na escola californiana de Los Angeles: Robert Irwin, James Turrell, Maria Nordman e
Michael Asher. Esses artistas realizam um trabalho sobre as construções urbanas com utilização de
fontes luminosas artificiais. A instalação permanente de Daniel Buren em frente do Palais Royal, em
Paris, e a intervenção coletiva no Battery Park City em Manhattan, envolvendo arquitetos e artistas
Figura 41: Wheatfield - A Confrontation: Battery Park como Armajani e M. Miss, exemplificam outras direções tomadas pela arte pública.
Landfill, Downtown Manhattan - Agnes Denes
FONTE: http://www.agnesdenesstudio.com/works7.html
Acesso em: 03.05.2016 No Minhocão, ambiente segregado e hostil manifestam-se diversas apropriações, mas as que se fixam
mais no imaginário paulistano são os grafites. “A cidade passa a ser reconhecida pelos sinais que a
ocupam e, por meio de inscrições e transformações exibidas nos suportes que a sustentam, conta a
sua própria história para um receptor sensível e atento.” (KHOURY; NASCIMENTO, 2014, p.115).

Nota-se que a cidade fornece inúmeras possibilidades de uso, a arte urbana pode estar nos muros, na
calçada, no topo de um prédio, no asfalto, no farol. Cada trabalho é diferente, mas todos compartilham
a intenção de participar no contexto urbano, dialogar com a arquitetura e com os moradores, além
de formar parte do imaginário artístico da rua. O objetivo da intervenção de arte pública é a ativação
dos espectadores passivos que passam pelos contextos trabalhados, transformando-os em usuários
ativos dos espaços urbanos. (FONTES, 2013).
Figura 42: Michael Ascher – Santa Monica Museum
Instalation ONTE: http://afasiaarchzine.com/2013/05/ A arte feita no espaço público, seja intervenção, evento ou graffiti, exerce sobre o social preexistente
michael-asher/
Acesso em: 03.05.2016 algum tipo de impacto, segundo Pallamin (2000, p. 10), “em que talvez a hegemonia seja confirmada

79
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 43: Grafite no pilar do Minhocão


FONTE: Foto da autora (Data: 28.02.16)

Figura 44 e 45: Passagem da Rua Consolação e Exposição


Divagando pelo feminino
FONTE: < http://www.paulista900.com.br/?p=966 >
Acesso em: 03.05.2016

80
ARTE E CIDADE

ou desafiada, mas, mais importante que isso, em que algo do novo desse social passa a ter existência”.
Verifica-se, na paisagem urbana, efeitos na percepção simbólica que são produzidos pela atividade
física: suas imagens e representações modificam a concepção do espaço. Surge então uma questão
relevante: a arte urbana possui a habilidade de alterar a percepção que os usuários possuem daquele
espaço público ou da sua cidade? Sobre isto, Argan afirma:

“É evidente que, se nove décimos da nossa existência transcorrem na cidade, a cidade é a fonte
de nove décimos das imagens sedimentadas em diversos níveis da nossa memória. Essas imagens
podem ser visuais ou auditivas e, como todas as imagens, podem ser mnemônicas, perceptivas,
eidéticas. Cada um de nós, em seus itinerários urbanos diários, deixa trabalhar a memória e a
imaginação: anota as mínimas mudanças, a nova pintura de uma fachada, o novo letreiro de uma
loja.” (ARGAN, 2005, p.232)

Silva (2006) cita como exemplo o projeto na passagem da rua da Consolação, na qual o município da
cidade autorizou a concessão do túnel de pedestres que comunica a Avenida Paulista com a Rua da
Consolação para fins artísticos. Esse mural mantém o desenho original feito nos anos 90, o que mostra
a valorização que os cidadãos e (aos poucos) as instituições formais dão a esse tipo de expressão
Figura 46 : Acesso a Passagem da Rua Consolação
FONTE < http://www.paulista900.com.br/?p=966 >
artística, uma vez que têm respeitado sua permanência como um ícone da paisagem da cidade.
Acesso em: 03.05.2016
O conceito de arte pública parece estar associado ao monumento, à arte patrocinada, oficial, que
depende da autoridade pública. A arte urbana e seus desdobramentos, por outro lado, podem ser
considerados, dentro dessa categoria, enquanto expressões que utilizam a cidade como suporte
e surgem a partir dela. Isso é especialmente válido para uma cidade como São Paulo, em que a
quantidade de manifestações desse tipo já se converte em parte da paisagem coletiva. Por outro
lado, Vera Pallamin (2000, p. 48) apresenta o problema ou, talvez, um dos seus pesares, da não
garantia de público: “a arte urbana pode desabar pela indiferença”.

CARÁTER CRÍTICO DA ARTE

A arte pública (ou arte urbana) possibilita que o público da rua entre em contato com manifestações
Figuras 47: Pixação com estêncil – CIDADE CINZA
que desafiam as normas sociais, questionando a noção de espaço público e contribuindo para
FONTE: Foto da autora (Data:13.02.2016) eliminar as possíveis barreiras entre arte e vida. Nas palavras de Brenson:

81
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

“[...] a arte pública é ainda uma prática social que se apropria do espaço urbano promovendo
mudanças, interligando e modelando a construção afetiva/coletiva de uma cidade.” (BRENSON,
1998, p. 19).

A cidade é planejada e analisada como um conjunto significativo de relações qualificadas e permeada


por uma malha que integra ações sociais, políticas, econômicas, culturais, históricas, estéticas, etc. e
cujos sentidos ultrapassam sua composição e seus processos formadores. A arte nos espaços públicos
lida com a recuperação das relações entre o homem e o mundo e entre o sujeito e a cidade, tendo em
vista os problemas que a área urbanística vem enfrentando e que afetam tais relações.

“[...] É obvio que, não obstante o que se programe, planeje ou projete, o objeto é sempre a
existência humana como existência social e que não se planejaria ou projetaria se não se
pensasse que a existência social será, deverá ou deveria ser diferente e melhor com relação ao
que é.” (ARGAN, 1998, p. 212).

A disponibilização da cidade para todos os grupos através da arte abre novas possibilidades de
apropriação e usufruto dos espaços urbanos. Segundo Pallamin (2002), a arte pública traz significado
para o espaço. As práticas artísticas podem criar situações inéditas de visibilidade, apontar resistências
às exclusões no domínio público, bem como desestabilizar expectativas e criar novas conveniências.
É importante considerar também o aspecto da condição urbana da arte: não haveria a arte se não
houvesse a cidade, de acordo com Argan. Ademais, Pallamin afirma que:

“A arte urbana é uma prática social. Suas obras permitem a apreensão de relações e modos
diferenciais de apropriação do espaço urbano, envolvendo em seus propósitos estéticos o
trato com significados sociais que as rodeiam, seus modos de tematização cultural e política.”
(PALLAMIN, 2000, p. 24).

Incansável pensador da vida cotidiana, Lefebvre dedicou-se ao ritmo dos espaços urbanos para
compreender seus efeitos sobre os habitantes e suas inter-relações. Segundo ele, o ritmo é encontrado
no trabalho, na vida urbana e no movimento através do espaço:

“[...] um campo é uma renovação simultânea, uma etapa e um trampolim, um momento


composto de momentos (necessidades, trabalho, diversão; produtos e obras; passividade e Figura 48: Lambe-lambe – Crírica a falta de paciência
criatividade; meios e finalidade), interação dialética na qual seria impossível não partir para Figura 49: Lambe-lambe – Crítica a falta de amor
realizar o possível.” (LEFEBVRE,1991, p.19). FONTE: Foto da autora (Data:13.02.2016)

82
ARTE E CIDADE

O cotidiano seria, assim, um pano de fundo de atividades que preparam e possibilitam os saltos
criadores. No caso da cultura contemporânea, a vida cotidiana se explicita como contraponto ao
esquecimento, à pobreza, ao desemprego. O território urbano torna-se suporte para a ação criadora
insurgente, simbólica e politicamente qualificadora do valor coletivo do espaço publico. O plano real
vivido, em sua natureza fragmentada agrega diferentes movimentos em tensão: homogeneização
de consumo e gostos; tribalismos e identidades culturais e religiosas segmentadas; aproximação
relacional e configuração de significados subjetivos na utilização dos espaços públicos. “A arte
mantém um vínculo forte com a realidade e é expressão da experiência cotidiana conflitiva de uma
vida de resistência à sociedade da segregação e da exclusão.” (VILLAC, 2012, p.163).

Os experimentos artísticos, que têm como a cidade fonte de inspiração, reflexão e atuação, poderão
revelar dimensões do urbano normalmente negligenciadas ou friamente capturadas em sistemas
de coordenadas e previsões pelos estudos urbanos tradicionais, tais como: sistemas de forças,
transitividades, ritmos e qualidades expressivas do território que são extraídas e extendidas em
afectos a perceptos (DELEUZE E GUATTARI, apud JACQUES, 2005, p. 125).

Pensar em arte urbana é produzir entendimento a respeito da vida social, aproximando-se do modo
como as pessoas produzem e são produzidas no âmbito da produção simbólica.

“O relevo dos significados das obras de arte urbana e sua concretização no domínio público
dão-se em meio a espaços permeados de interdições, contradições e conflitos. Sua efetivação
porta relações de força sendo exercidas entre grupos sociais, entre grupos e espaços, entre
interpretações do cotidiano, da memória e história dos lugares urbanos. Potencialmente
(sobretudo quanto às obras de caráter temporário) pode configurar-se num terreno privilegiado
para efeitos de choque de sentidos (negação, subversão ou questionamento de valores).”
(PALLAMIN, 2002, p. 24).

Figura 50: Lambe-lambe – Questão Sócio-Política


Municipal (Crise Hídrica).
FONTE: Foto da autora: 21.04.2015

83
PERCURSOS DO MINHOCÃO
PERCURSOS DO MINHOCÃO

PERCURSOS DO MINHOCÃO
A pesquisa de campo compreenderá a observação sistemática do objeto de estudo nas áreas objeto
de análise do Elevado Costa e Silva, e também nas regiões fronteiriças, paralelas ao viaduto, por
meio de observação empírica e pesquisas históricas. Para essa observação, foi eleito o método
da “caminhada exploratória” (CARERI, 2013), com o objetivo estabelecer um reconhecimento do
usuário, por meio de diferentes perspectivas. A observação do presente objeto de estudo se faz pelo
usuário do automóvel nas vias inferiores ao elevado e na parte superior, pelo usuário da bicicleta
nos percursos da ciclovia localizada sob o Minhocão, e pelos pedestres, durante o percurso de suas
caminhadas, seja no cotidiano, por meio dos deslocamentos diários ou pelo uso de lazer dos que
caminham sobre o Minhocaõ aos finais de semana.

A observação direta é uma técnica importante da pesquisa empírica que pode incorporar uma
variedade de procedimentos, desde observação visual, auditiva, fotográfica, etc. e pressupõe, em um
sentido restrito, contatos não verbais com o observador, podendo ser aplicada a uma gama limitada
de dimensões do social.

Pode-se perceber que em todas as épocas ”o caminhar tem produzido arquitetura e paisagem, e
que essa prática, quase inteiramente esquecida pelos próprios arquitetos, tem sido reabilitada pelos
poetas, filósofos e artistas, capazes precisamente de ver aquilo que não há, para brotar daí algo.”
(CARERI, 2013, p.18).

O uso proveitoso da técnica do caminhar pode ser otimizada, quando associada à construção de
tipologias de classificação das observações bem estruturadas e fundamentadas teoricamente.
Estabelecem-se, assim, elos entre os referenciais teóricos e os dados empíricos. As tipologias
conceitualmente definidas servem como informantes do olhar e possibilitam o reconhecimento de
distinções empíricas.

Inicialmente serão mapeados e identificados os percursos e o entorno da área de estudo: os quase


3km de extensão do Minhocão. Nesse mapeamento, procura-se identificar as características dos

87
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

deslocamentos, os meios pelos quais os usuários se deslocam (transportes), os pontos de referência, a


vegetação, além de características da malha urbana e adensamento das edificações. Posteriormente,
serão identificadas as apropriações realizadas na parte superior e inferior do Elevado (sobre e
sob o Minhocão), com o objetivo de classificar os tipos de apropriação, através da aplicação dos
conceitos apresentados para as características das intervenções e da condição efêmera, bem como
as manifestações que ocorrem ou ocorreram no Minhocão, procurando estabelecer sua relação com
o contexto espacial e social da cidade.

Nesses percursos de aproximação com o objeto de estudo, hpa grande interesse em observar o
conteúdo da paisagem e interpretá-lo, como se fosse um texto, lendo suas páginas e apreendendo
seus significados. A cidade comunica e produz sentidos. Procura-se, portanto, desenvolver uma
interpretação e um entendimento acerca de tais produções.

Por meio de documentação fotográfica e gráfica, procura-se estabelecer as dimensões da presente


pesquisa, criando entendimento acerca das manifestações artísticas por meio do que segue:

• Dimensão artística: Convergências e divergências com o mundo da arte formal.

• Dimensão simbólica: Seu caráter transgressor como forma de dialogar com a cidade.

• Dimensão urbana: Influência na paisagem urbana do entorno

O recorte empírico que aborda a investigação toma o percurso por três partes distintas, que serão
denominadas de trecho 01, 02 e 03, sendo respectivamente: Trecho 01 - Avenida Amaral Gurgel
até o Largo Santa Cecília; Trecho 02 - Avenida São João até a Praça Marechal Deodoro; e Trecho
03 - Avenida General Olímpio da Silveira até o túnel de ligação com o Largo Padre Péricles, início da
Avenida Francisco Matarazzo. O percurso constitui um total de aproximadamente 3km de extensão,
onde serão analisados os espaços urbanos delimitados pela sombra do Elevado, bem como sua parte
superior e os espaços vizinhos, paralelos ao percurso estabelecido. Essas três divisões do percurso
têm como objetivo identificar os segmentos conforme suas vias (onde o elevado as sobrepõe) e
estabelecer uma diferenciação desas apropriações, se for possíveis, de acordo com a relação das

88
PERCURSOS DO MINHOCÃO

mesmas com seu entorno.

Seguindo os conceitos abordados no primeiro capítulo, as intervenções serão classificadas


primeiramente em intervenções temporárias ou grandes eventos (FONTES, 2013), de acordo com a
atribuição de suas qualidades. Em um segundo momento, as intervenções serão classificadas como
apropriações espontâneas, de arte pública, instalações arquitetônicas ou festas locais, conforme as
qualidades e características particulares de cada situação apresentada. Todas tomam como suporte
o Minhocão, na sua parte superior ou inferior.

Posteriormente, já classificadas as apropriações, serão aplicados os conceitos apresentados por


Fontes (2013), destacando os que o espaço revelou por meio da intervenção artística ou apropriação.
Os espaços podem ser dinâmicos, reversíveis, flexíveis, imprevisíveis ou permitir conexão, por meio
das atividades que nele foram desenvolvidas. (FONTES, 2013).

DINAMISMO

REVERSIBILIDADE
CONDIÇÃO
EFÊMERA FLEXIBILIDADE
INTERVENÇÃO
IMPREVISIBILIDADE
TEMPORÁRIA

CONEXÃO

ESPAÇOS
COLETIVOS
Figura 51: Interrelação entre os conceitos.
FONTE: Diagrama executado pela autora. (FONTES, 2013).

CONTEXTO SUPORTE

89
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

MINHOCÃO

O Minhocão teve sua construção concebida de forma a facilitar a circulação dos automóveis,
possibilitando uma alternativa eficiente ao deslocamento entre as regiões Leste e Oeste da cidade.
Esse objetivo de facilitar a livre circulação é um paradigma central dentro dos princípios funcionalistas
do urbanismo moderno, corrente de grande expressão no país até o final do século passado. De
acordo com Le Corbusier (1887-1965), a cidade que dispunha de velocidade era também uma cidade
que dispunha de sucesso.

No contexto brasileiro, com o início das políticas de subsídio maciço à indústria automobilística, esses
ideais tiveram grande repercussão, e o resultado foi imediato. Sempre favorecendo o transporte
individual em detrimento do transporte público, houve proliferação de viadutos, túneis e vias
expressas, que alteraram drastica¬mente o convívio e o desenho da paisagem urbana das principais
cidades brasileiras.

Nesse sentido, o Minhocão é posicionado como um artefato simbólico, ele¬mento consequente dessa
forma de se pensar a cidade, vista nos dias atuais como uma maneira insuficiente de se enfrentar as
demandas da metrópo¬le contemporânea. Suas particularidades residem tanto em suas dimensões
quanto na condição urbanística em que foi implantado: sobre avenidas exis¬tentes, em bairros em
processo de verticalização, a poucos metros do entor¬no construído.

A cidade de São Paulo se transformou em campo de batalha. (PEIXOTO, 2003). Uma guerra foi
eclodida, pela ocupação de áreas urbanas e pelo controle da infraestrutura e dos espaços públicos. A
cidade se divide: por um lado há territórios modernizados, com torres corporativas e grandes edifícios
inteligentes, shoppings centers e condomínios fechados; de outro lado, há áreas abandonadas,
territórios vagos, tomados por populações itinerantes.

Segundo Peixoto (2003, p. 400), “os viadutos, autopistas, estacionamentos, canteiros de obras,
tubulações expostas e conjuntos residenciais populares são os monumentos das grandes extensões
urbanas devastadas contemporâneas”. Mapa 01: Localização do Minhocão no Município de
São Paulo. FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade
(MDC).

90
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Movimentos organizados por populações sem moradia invadem prédios inteiros no centro da cidade,
assim como terrenos nas áreas periféricas. Vive-se em um momento no qual a cidade se transforma
numa espécie de selva. A crise energética, hídrica, as enchentes e os congestionamentos apontam
para uma entropia generalizada.

Nesse contexto, volta-se o olhar para a região em que está inserido o Minhocão. Tal região serve de
ligação entre as regiões Leste e Oeste, e é integrante de uma gigantesca estrutura viária nesta cidade
que:

“Organizada funcionalmente, concebe lugar como pontos de partida ou de chegada, destinos


individuais: lugar de trabalho, de moradia, de estudo, de lazer. O deslocamento entre lugares,
antes feitos por ruas, alamedas, avenidas, cada vez mais se dá por acessos, corredores,
interligações, vias expressas, complexos viários, pelos quais se devem passar sem parar, a não
ser em obediência à sinalização de tráfego e nos inevitáveis congestionamentos. ” (ZAIDLER,
2014, p. 95).
Figura 52: Avenida São João antes do Minhocão.
FONTE: < http://www.saopauloantiga.com.br/ O território de que se ocupa o Minhocão estabelece uma das ligações possíveis entre a Praça
propagandas-do-minhocao >. Acesso em 13.12.2015.
Roosevelt, no centro da cidade, e a Largo Padre Péricles, na Água Branca/Perdizes. O percurso do
Minhocão segue pela Rua Amaral Gurgel, a Praça Marechal Deodoro, parte da Avenida São João e
a Avenida General Olímpio da Silveira, atravessando assim os bairros de Água Branca, Santa Cecília,
Higienópolis e Centro.

No início da década de 1970 foi inaugurado o Elevado Costa e Silva que, juntamente ao Edifício-
Praça Roosevelt, inaugurado um ano antes, constituiu a ligação Leste-Oeste. O elevado materializou
o caráter de monumentalidade que se pretendia para uma metrópole em plena era do progresso. O
Elevado Costa e Silva carrega em seu nome a condição histórica de sua construção.

“Batizado em homenagem ao marechal presidente que abriu caminho à radicalização do jugo


militar, seu nome oficial reforça tais associações com o período sombrio – o peso dos anos de
chumbo, a linha dura imposta à força, os tenebrosos porões do regime. ” (CAMPOS, 2008, p. 20).

Figura 53: Rua Amaral Gurgel antes do elevado. A urgência construtiva do regime militar visava unicamente aumentar a oferta viária e assim, por meio
FONTE: < http://otrecocerto.com/tag/minhocao// >. da grandiosidade das construções, traduzir a era do progresso. A desproporcionalidade do Elevado
Acesso em 13.12.2015.

91
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Costa e Silva em relação à área de implantação resultou em uma proximidade excessiva: o eleveado
se situa a cinco metros das janelas dos prédios lindeiros. Zaidler (2014) refere que o Minhocão:

“[...] inspirado em soluções viárias consagradas, ao longo do século XX, em diversas cidades
norte-americanas e europeias; uma via expressa segregada do tecido urbano, idealizada para
aumentar a velocidade de deslocamento de veículos a revelia de condicionantes topográficas,
visuais, históricas. ” (ZAIDLER, 2014, p. 108).

Considerado por muitos uma cicatriz urbana, o elevado rasgou o centro histórico da cidade,
transformando charme decadente em provisoriedade permanente. A feiura da obra é resultado
da somatória de uma estrutura rude, voltada exclusivamente à rapidez do processo construtivo, à
desproporção em relação às vias que encimou – Rua Amaral Gurgel e Avenida São João. Ademais,
devastou a vida doméstica dos apartamentos praticamente encostados à construção e, em um
processo inverso à gentrificação, irradiou rápida deterioração nos quarteirões adjacentes, como
se o sonho modernista de uma cidade multinivelada, de tráfegos independentes e desimpedidos,
se desdobrasse em pesadelo. A região central passou a ser considerado mero nó de articulação e
passagem na estrutura viária da cidade, priorizando a circulação em grande escala em detrimento das
áreas atravessadas. O Minhocão, em especial, resultou numa desvalorização drástica e imediata do
entorno, apesar de se situar em região até então muito procurada para empreendimentos verticais.
(CAMPOS, 2008).

Figura 54: Convite à População – 22.01.1971.


FONTE: < http://www.saopauloantiga.com.br/
propagandas-do-minhocao >. Acesso em 13.12.2015.

Figura 55: Destaque para região de estudo com incisão


do Elevado. FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade
(MDC).

92
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Procurou-se, no presente estudo, diferenciar as regiões do Minhocão de acordo com suas avenidas
de pertencimento, iniciando-se na Avenida Amaral Gurgel, onde o Elevado se conecta com o sistema
Leste-Oeste de ligação da cidade de São Paulo, passando então pelo Largo Santa Cecília, Terminal
Amaral Gurgel, e seguindo pela Avenida São João, passando pela Praça Marechal Deodoro e seguindo
para Avenida General Olímpio da Silveira, terminando assim no túnel de acesso à Avenida Francisco
Matarazzo e Largo Padre Péricles, na zona oeste da Capital.

Tomando os planos horizontais e verticais como referência, pode-se dizer que o plano vertical dividiu
o centro tradicional dos bairros de Campos Elíseos e Santa Cecília, regiões mais valorizadas da cidade:

“Esse verme urbano sem pé nem cabeça costuma ser apreendido de maneira fragmentada. Por
cima, por baixo, ou como segmento de algo do qual não se vislumbra começo nem fim. Para
motoristas usuários, é sempre trecho de trajeto maior; para transeuntes de baixios e entornos,
são pórticos de concreto que se sucedem, perdendo-se na distância e escondendo o lance
seguinte.” (CAMPOS, 2008, p. 20).

Já o plano horizontal separa os quadrantes superiores (e a circulação viária Leste-Oeste) dos


quadrantes inferiores, onde convive a circulação de automóveis, de pedestres e recentemente de
ciclistas, graças à implantação da ciclovia. A fronteira determinada pela construção do elevado isolou
a parte inferior da região, submetida ao que Campos (2008) denomina de ocultação:

“Cria uma zona de sombras, um mundo semi-enterrado, em que térreos e primeiros andares
se perdem em um longo subsolo. Seu próprio apelido evoca um ser subterrâneo. Nessa área
aparentemente escondida, surgem elementos e usos que não ousam se manifestar em locais
mais expostos, sempre com mão dupla: da arte proibida das pichações ao apelo ambíguo dos
travestir.” (CAMPOS, 2008, p. 20).

A sobreposição dos universos inferior e superior não permite interações. A parte superior é tomada
pelos automóveis, pelo fluxo, pela velocidade ou a ausência dela, no caso dos congestionamentos,
visto que o elevado foi concebido sem vias de escape. A porção inferior, subterrânea, também
prescrita em parte pelos mesmos componentes, contempla a interação do cidadão e do comércio
Figura 56: Corte Genérico do Elevado Costa e Silva. existente. Como limite para esses dois universos paralelos, há o que é lindeiro, o que emoldura: o
FONTE: Disponível em: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/
read/arquitextos/13.147/4455 >. Acesso em: 12.12.2015. entorno.

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 57: Baixios do Minhocão – Ciclovia.


FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016).

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 58: Congestionamento no Minhocão


FONTE: Disponível em < http://infograficos.estadao.com.
br/cidades/para-onde-vai-sao-paulo/capitulo-4.php >.
Acesso em: 11.05.2016

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Para Campos (2008), a drástica desvalorização do entorno de uma região até então extremamente
interessante à construção vertical contribui para que o Minhocão adquirisse uma aura transgressora:

“Nos casos dos trechos atravessados pelo Elevado, seu caráter aberto à transgressão e acolhedor
da diferença passou a ganhar valor com a ascensão do multiculturalismo, do pluralismo e das
identidades alternativas como traços definidores da paulistanidade. Suas pistas passaram a ser
aproveitadas, nos finais de semana, como área de lazer, na qual se manifesta a diversidade das
tribos urbanas.” (CAMPOS, 2008, p. 42).

Figura 59: Uso do tabuleiro superior em dia de Domingo


FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016).

Figura 60: Uso em dia de Domingo.


FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016).

Figura 61: Domingo no Minhocão


FONTE: Desenho da autora (Data: 21.02.2016)

96
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 62: Domingo no Minhocão


FONTE: Desenho da autora (Data: 21.02.2016)

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 63: Prédios Deteriorados em torno do Minhocão


FONTE: Janelas Paulistanas - Hélvio Romero. Disponivel
em :<http://flaviogomes.grandepremio.uol.com.br/tag/
minhocao>. Acesso: 28.08.2015

98
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Atualmente, é possível verificar que a área contígua à extensão total do Minhocão se mantém
extremamente adensada e verticalizada, conforme demosntra o Mapa 01. Grande parcela dos
imóveis é antiga, anteriores época da instalação do Elevado. Porém, pode ser também verificada a
instalação de novos empreendimentos na região, onde a principal estratégia de vendas se apoia na
possível transformação do Elevado no Parque Minhocão.

Ao verificar os espaços construídos (Mapa 01) na área do trecho 01, que vai daAvenida Amaral
Gurgel até o Largo Santa Cecília, e possível perceber que as ruas possuem um traçado ortogonal
e as quadras são relativamente proporcionais. Tal fator implica na posição paralela do Elevado em
relação à fachada frontal dos edifícios. Nessa área, pode-se verificar que os lotes são extremamente
aproveitados, com excessão de algumas quadras onde se encontram a Irmandade da Santa Casa
de Misericórdia e a Praça Rotary, onde se encontra a Biblioteca Monteiro Lobato (Mapa 03). Nessa
região há pouca vegetação, conforme demonstra o Mapa 02, e as áreas verdes se concentram-se na
praça e no Largo do Arouche, que faz divisa com o segundo trecho a ser analisado.

Quando foi analisado o percurso no trecho 02, que vai da Avenida São João até a Praça Marechal
Deodoro, a configuração da malha urbana é outra: ela se irradia a partir de um eixo que é o Largo
Figura 64: Foto de Emprendimento Novo nas do Arouche e se conecta à avenida São João, seguindo sua linearidade até pouco depois da Praça
proximidades do Minhocão Marechal Deodoro.
FONTE: Foto da Autora (Data: 20.03.2016)

A partir do Mapa 02, pode-se verificar que a configuração dos lotes e sua respectiva ocupação se
alteram de acordo com o lado do Elevado. Conforme o Minhocão segue para a região oeste, as
construções datam de épocas mais recentes e respeitam outras configurações. Nas construções
próximas ao bairro do Pacaembú (próximos à Av Pacaembu e fim do elevado), são encontrados imóveis
com recuos frontais e laterais, a maioria sendo edifícios de mais de dez andares, configurando outra
característica de ocupação. As áreas verdes são precárias (Mapa 03), restritas às pequenas praças, à
arborização das vias e à Praça Marechal Deodoro.

No último trecho, que vai da Avenida General Olímpio da Silveira até o túnel de ligação com o Largo
Padre Péricles, início da Avenida Francisco Matarazzo, a ocupação dos lotes e a arborização, conforme
mapas 02 e 03, se mantém regular, mas é verificada uma acentuada alteração no padrão dos edifícios.
Conforme avança-se para o bairro do Pacaembu, eos edifícios são de padrão mais elevado, o que
Figura 65: Elevado Paralelo à Malha Ortogonal Urbana
FONTE: Autora (Data: 28.02.2016) configura uma região mais nobre, do ponto de vista econômico dos habitantes da região.

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Mapa 02: Espaço Construído em torno da região do Elevado Costa e Silva.


FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Mapa 03: Áreas Verdes e Arborização em torno da região do Elevado Costa e Silva.
FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

104
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 66: Visão da Av. Angélica, sentido Av. Paulista.


FONTE: Autora (Data: 28.02.2016)
Figura 67: Visão do Automóvel, na Av. São João.
FONTE: Autora (Data: 28.02.2016)
Figura 68: Vista do Largo do Arouche e Grafite em
empena de edifício.
FONTE: Autora (Data: 28.02.2016)
Figura 69: Empenas de Edifícios –- Grafite de Tec – artista
argentino.
FONTE: Autora (Data: 28.02.2016)

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 70: Edifício Racy – Av. São João


FONTE: Desenho da autora (Data: 20.03.2016)
Figura 71: Baixios – Equipamentos públicos tomados por
arte pública.
FONTE: Autora (Data: 28.02.2016)
Figura 72: Grafite no Pilar e Ponto de Ônibus Pacaembu.
FONTE: Autora (Data: 28.02.2016)

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Mapa 04: Gabarito de altura das edificações da região em torno do Elevado Costa e Silva.
FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Mapa 05: Rede Cicloviária e Metroviária da região em torno do Elevado Costa e Silva.
FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Nas regiões que ladeiam o Minhocão, o padrão dos edifícios também se altera, mas em menor escala
de diferenciação, em função da poluição visual e da concentração do comércio nos térreos dos
edifícios.

É posível verificar que os edifícios, em sua grande maioria, são residenciais, com uso comercial ou de
serviço nos térreos e sobrelojas.

A região observada no presente estudo, inserida em toda extensão do Minhocão, é bem servida de
transportes (Mapa 05). A ciclovia percorre praticamente toda extensão do Minhocão, conectando-se
ao bairro dos Campos Elíseos, Pacaembú, Santa Cecília e Centro, através do Largo do Arouche.

Na mesma linha, sob a laje do Elevado, se concentram os pontos de ônibus. Na região há os terminais
Amaral Gurgel, ao lado do Largo Santa Cecília, e o Terminal Princesa Isabel, que não aparece na área
Figura 75: Novos empreendimentos entre os antigos.
de abrangência deste estudo. FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016).

Figura 73: Av. Amaral Gurgel e Ciclovia. Figura 74: Largo do Arouche – Vista a partir do Minhocão. Figura 76 Pichação e deterioração.
FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016). FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016). FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016)

112
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 77 Comércio localizado na Av. São João x Figura 79: Comércio de Móveis Antigos (Baixios do Edifício Figura 81: Acesso ao Elevado e Metrô Marechal. FONTE:
Al.Northmanh. FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016). Porchat).FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016). Foto da Autora (Data: 28.02.2016).

Figura 78 Igreja Universal (ao lado da Av. São João). Figura 80: Lançamento do Edifício Porchat – Arquiteto Figura 82: Acesso ao Elevado Fechado. FONTE: Foto da
FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016). Rino Levi - 1940 FONTE: Disponível em: < http:// Autora (Data: 28.02.2016).
armazemperisc.blogspot.com.br/2012/06/nem-o-melhor-
nem-o-pior.html >. Acesso: 28.02.2016.

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 83: Edifício antigo residencial com comércio no


térreo – Av. São João.
FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016).
Figura 84: Vista do Minhocão, sentido Higienópolis – Rua
Rosa e Silva..
FONTE: Foto da Autora (Data: 20.03.2016).
Figura 85: Reforma do Castelinho da Rua Apa – Grafite no
Tapume. – Av. São João
FONTE: Foto da Autora (Data: 20.03.2016).

114
PERCURSOS DO MINHOCÃO

115
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Mapa 06: Pontos Notáveis da região ao redor do Elevado Costa e Silva.


FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

116
PERCURSOS DO MINHOCÃO

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

01

Figura 87: Igreja Santa Cecília.


FONTE: < https://marroturismo.com/tag/templos-sp/>.
Acesso em: 30.04.2016
Figura 86: Vista do Skiline
FONTE: Desenho da autora (Data: 21.02.2016)

05 06 07

Figura 91: Teatro São Pedro. Figura 92: Hospital Santa Cecília Figura 93 77º. Delegacia de Polícia Santa Cecília
FONTE:< http://www.cultura.sp.gov.br>. FONTE: < http://santaceciliasp.blogspot.com.br/p/ FONTE: < https://www.google.com.br >.
Acesso em: 30.04.2016 . hospitais.html >. Acesso em: 30.04.2016 . Acesso em: 30.04.2016 .

118
PERCURSOS DO MINHOCÃO

02 03 04

Figura 88: Funarte Figura 89: Paróquia São Geraldo Figura 90: Externato Casa Pia São Vicente de Paula
FONTE: < http://vejasp.abril.com.br/estabelecimento/ FONTE: Disponível em:< http://planejandocasamento. FONTE: < http://www.jfsp.jus.br/20101130-
funarte >. Acesso em: 30.04.2016 com.br/fornecedores/paroquia-sao-geraldo/> Acesso em: memorialbaronesa/> Acesso em: 30.04.2016 .
30.04.2016.

08 09 10

Figura 94 Irmandade Santa Casa de Misericórdia Figura 95 Biblioteca Monteiro Lobato. Figura 96: Teatro Sesc Anchieta.
FONTE: < https://www.google.com.br >. Fonte:< https://blogcasasbacanas.wordpress.com/ >. Fonte:< http://www.encontraconsolacao.com.br/
Acesso em: 30.04.2016 . Acesso em: 30.04.2016 . consolacao/sesc-na-consolacao.shtm l>.
Acesso em: 30.04.2016 .

119
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Mapa 07: Concentração de Pessoas nas regiões ao redor do Elevado Costa e Silva.
FONTE: Autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

120
PERCURSOS DO MINHOCÃO

121
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

A circulação de pedestres e automóveis é verificada durante todo o dia, inclusive aos finais de
semana. No mapa 07, pé possível visualizar maior concentração de pessoas em regiões próximas aos
pontos de ônibus e metrô. O movimento é intenso durante o dia e as primeiras horas da noite, mas
o movimento de automóveis diminui com o fechamento do elevado às 21h.

Figura 97: Túnel de acesso à Av. Francisco Matarazzo


(Término do Minhocão). FONTE: Foto da Autora (Data:
20.03.2016).
Figura 98: Grafite – Retrato Travesti (Região Marquês de
Itu). FONTE: Foto da Autora (Data: 20.03.2016).

Figura 99: Vista parcial do Minhocão a partir de um


dos prédios que ladeiam o Minhocão. Imagens do
documentário
Elevado 3.5 dirigido por João Sodré, Maíra Santi Bühler e
Paulo Pastorelo.
FONTE : Disponível em: < http://colunas.revistaepocasp.
globo.com/centroavante/tag/minhocao/ >. Acesso em
18.11.2015.

122
PERCURSOS DO MINHOCÃO

A interação entre o elevado e os prédios que o ladeiam se resume a uma contemplação, que pode
ser considerada mútua, que se dá entre carros e habitantes, aquele que passa e o que habita. A
contemplação, no entanto, é certamente muito mais dos moradores em relação à presença ou a
ausência de automóveis no elevado, do que no sentido contrário. (CASTANHEIRA, 2015). Aquilo que
supostamente deveria ser um brutal contraste entre o interior dos prédios e o exterior, entre o que
é público e o que é privado, no caso do Minhocão, se confunde pela exagerada proximidade, pela
invasão de uma privacidade inexistente.

Figura 100: Vista parcial de um dos prédios que ladeiam o


Minhocão. FONTE: Foto da Autora (Data: 20.03.2016)

123
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

RESULTADOS

A partir da análise do lugar, apresenta-se a seguir um quadro-resumo com algumas análises dos
resultados. O quadro tem por objetivo facilitar a interpretação dos dados verificados por meio da
observação sistemática do espaço urbano que envolve a área objeto desta pesquisa.

LUGAR ELEVADO COSTA E SILVA

Malha irregular de ruas e quadras. Edificações coladas nas divisas e de alto gabarito (acima de 6 andares). Algumas
Morfologia
edificações se destacam em meio aos prédios que não possuem recuos laterais.

Edifícios Residenciais com térreos de uso comercial. Várias épocas de construção com características formais diferentes.
Arquitetura Poluição visual – comunicação e pichação. Ambiente inferior ao Minhocão escuro, enclausurado pela proximidade dos
edifícios.
Canteiro central em toda a extensão inferior ao Minhocão acompanhado pela ciclovia e interrompido pela sequência
de pilares. O canteiro central se mantém neutro, pontuado pelas pinturas. Calçadas na extensão lateral das avenidas
Plano Suporte com características heterogêneas, tomadas em alguns momentos pela invasão do comércio. Parte superior lateral do
Minhocão repleta de fachadas e empenas, que servem de suporte para grafite e apropriações de arte urbana. Pista
superior contínua com pequenas declividades em alguns pontos.
Domínio do espaço coletivo. Pedestres, bicicletas, skatistas, etc. tomando o espaço juntos, no mesmo momento, em
Domínios
ambas as partes-superior e inferior.

Local utilizado para prática esportiva e caminhadas – parte superior, atraente aos percursos. Parte inferior escura e
Tipologia
poluída visualmente. Misto de usos (carro, bicicleta, pedestre, skate) causa confusão visual e insegurança ao caminhar.

Fortes nas conexões com o transporte público – proximidades das estações de metrô, pontos de ônibus, Praça
Marechal Deodoro, Terminal Amaral Gurgel e Largo do Arouche. Percurso superior com apropriação intensa pelos
Percursos
pedestres aos fins de semana. Intensidade de fluxo de veículos sempre nos horários permitidos na parte superior e
todos os dias na parte inferior.
Restrita às praças e arborização das ruas. Ambiente superior e inferior destituído de qualquer vegetação. Áreas de
Áreas Arborizadas
concentração: Praça da República e Largo do Arouche.

Figura 101: Quadro-resumo – Leituras do Lugar. FONTE: Tabela executada pela autora. (FONTES, 2013).

124
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 102: Vista do Minhocão a partir da Rua das


Palmeiras
FONTE: Desenho da autora (Data: 21.04.2016)

125
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

SOBRE O MINHOCÃO

Aqui procura-se tratar das intervenções que ocorrem na parte superior do elevado, sejam elas
artísticas ou apropriações do espaço para outros fins que não aquele concebido inicialmente - o de
deslocamento de veículos, conectando duas importantes regiões da metrópole paulistana. Em um
aporte histórico, procura-se evidenciar as intervenções que já tomavam o Minhocão como suporte a
partir de sua inauguração, nos anos de 1970. Esses movimentos, que tinham como objetivo diminuir
o impacto da construção no entorno da região, se instalaram em diferentes momentos, procurando
amenizar a percepção daquele equipamento que impactou e segmentou a região.

Em 1997, a FUNARTE (Fundação Nacional de Arte) propõe a realização do Projeto Elevado à Arte,
cujo propósito era pintar os 54 mil m² de extensão que compõem o elevado. Essa proposta tinha
caráter permanente.

A intervenção na lateral norte ficou a cargo de Maurício Nogueira Lima que, por meio da inserção de
linhas diagonais em ocre e amarelo, procurou se aproximar do grafismo dos sinais de trânsito. Para
a intervenção na lateral oposta, aartista Sônia Von Brusly utilizou as cores cinza, vermelho e azul, de
forma a contrastar com o aspecto agressivo da construção.

“Hoje nada resta dessas primeiras intervenções. A via, cada vez mais congestionada, impedia
a visão em tempo cinematográfico e a pouca luz na parte inferior igualmente não auxiliava
visualização dos trabalhos. Outras camadas foram sobrepostas aos murais: cartazes publicitários,
grafites e a própria repintura da estrutura, em cor que mimetiza o concreto. A iniciativa de cobrir
parcialmente a enorme estrutura com trabalhos artísticos funcionou como uma espécie de
maquiagem, que se esvaiu no tempo.” (ARTIGAS, 2008, p. 49).

Ocupada intensamente por veículos durante a semana, a face superior do Minhocão, que oculta o
lado obscuro, as sombras do elevado, o avesso da edificação, se transmuta aos finais de semana e
feriados. Essa transformação efetiva a qualidade do equipamento de ser híbrido, transgredindo a sua
funcionalidade primordial. Figura 103: Intervenção cromática da autoria de Maurício
Nogueira Lima.
FONTE: < http://www.brasilartesenciclopedias.com.br/
nacional/brusky_sonia03.htm >. Acesso em: 19.10.2014.

126
PERCURSOS DO MINHOCÃO

A típica utilização dominical é antes de tudo um grande manifesto de ocupação: essa via expressa
nega a sua vocação original, facultando o seu território para uma atividade tão banal quanto caminhar.
(CASTANHEIRA, 2015).

O ato de caminhar ou espaço de enunciação, como refere Certeau (1998), é a privação do lugar
em um processo constante de sua procura, o que faz dessa trivialidade uma experiência social, e
assim faz da cidade um recinto próprio para as experimentações, um laboratório que torna possível
ao usuário extrair fragmentos do percurso e atualizá-los em segredo, como refere Barthes. (1996
apud CERTEAU, 1998). Tal relação entre o usuário e o percurso, é qualificada como enunciação,
“um processo de apropriação do sistema topográfico pelo pedestre” (CERTEAU, 1998, p.164), onde
o percurso se altera pelas práticas do usuário, se transmutando em singularidades aumentadas e
em ilhotas separadas (BOURDIEU, 1996 apud CERTEAU,1998). Assim, define o fenômeno social pelo
qual um sistema de comunicação se manifesta de fato, remetendo a um comportamento, entendido
como norma.

Figura 104: Corrida de São Silvestre, em percurso sobre o


Minhocão
FONTE : < http://arqmodernablog.blogspot.com.
br/2011/12/minhocao-em-sao-paulo-e-high-line-park.
html>. Acesso em: 15.11.2015.

127
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

A salubridade da ocupação pedestre reverberou e teve desdobramentos: o Minhocão fez parte do


percurso da corrida de São Silvestre entre 1980 e 2010. Além disso, é cenário frequente de skatistas
e ciclistas.

A apropriação interage, interfere, acrescenta. São muitas as ações que buscam refletir a falta de
verde no Minhocão. Em 2009, o fotógrafo Felipe Morozini, com a ajuda de 20 amigos, realizou uma
intervenção denominada Jardim Suspenso da Babilônia, onde foram desenhadas grandes flores, com
cal, na superfície do equipamento.

Figura 105 e 106: Domingo - Lazer no Minhocão.


FONTE: Foto da Autora (Data: 20.03.2016).

Figura 107: Elevado Costa e Silva aos domingos e feriados


FONTE: Felipe Morozini. Disponível em: < http://ffw.
com.br/blog/comportamento/em-nova-coluna-felipe-
morozini-declara-amor-e-odio-a- cidade-de-sao-paulo/ >.
Acesso em: 15.11.2015.

128
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Em 2012, o Festival Baixo Centro simulou o que poderia vir a ser o Parque do Minhocão. Esse festival
é um movimento de ocupação civil, transversal, que busca de forma colaborativa promover ações de
apropriação urbana. O Baixo Centro14 é um festival de rua colaborativo, horizontal, independente e
autogestionado, realizado por uma rede aberta de produtores interessados em ressignificar a região
da capital de São Paulo em torno do Minhocão, que compreende os bairros de Santa Cecília, Vila
Buarque, Campos Elísios, Barra Funda e Luz. Com o mote “as ruas são pra dançar”, busca estimular
a apropriação do espaço público pelo público a quem, de fato, pertence, motivando uma maior
interação das pessoas com seus locais de passagem, trabalho ou moradia cotidianos.
Figura 108: Elevado Costa e Silva aos domingos e feriados
FONTE: < http://www.hypeness.com.br/2011/03/artista-
Recentemente foram instalados Jardins Verticais no Minhocão. O primeiro projeto teve a iniciativa da
plastico-pinta-flores-no-asfalto-do-minhocao/>. Acesso marca Absolut e foi realizado em parceria com o Movimento 90º e a Escola São Paulo. Procurava-se
em: 15.11.2015.
colaborar para a alteração da cidade por meio de ações que estivessem em conexão com conceitos
novos ―Transform Today (estratégia concebida pela marca para assim estabelecer proximidade e
vínculos com a geração Y, também conhecida como Millenials, que para os patrocinadores constitui
uma geração ávida pela materialização do novo15). A instalação de Parques Verticais, segundo os
idealizadores do programa, pode reduzir em até 30% a poluição das áreas de proximidade, além de
desempenhar papel de isolante térmico. Na sequência desse, vieram outras empenas que tiveram
sua superfície coberta de vegetação.

Figura 109: Elevado Costa e Silva aos domingos e feriados. Essa plataforma a céu aberto que é o Minhocão hospedou, no âmbito da 10ª Edição da Bienal de
FONTE: Joel Silva/Folhapress. Disponível em: < http:// Arquitetura de São Paulo, uma intervenção subordinada ao tema Cidade: Modos de Fazer, Modos de
fotografia.folha.uol.com.br/galerias/7094-minhocao> .
Acesso em: 15.11.2015. Usar.

A bienal pretendeu promover uma reflexão sobre as possibilidades de construção do viver urbano e
sobre a cidade contemporânea a partir da sua própria estrutura espacial. Dessa forma, os conteúdos
foram alocados em diferentes pontos da cidade, cujos critérios de escolha recaíram sobre a qualidade
14
Baixo Centro – Quem Somos – Disponível em: <http://
do espaço e a respectiva acessibilidade,e permitindo uma experiência viva da cidade.
baixocentro.org/quem-somos/ > Acesso em: 09.11.2014.
15
Jardim Vertical Invade Minhocão – Disponível em:
<http://exame.abril.com.br/marketing/noticias/jardim-
vertical- invade-minhocao-em-sao-paulo >. Acesso em:
09.11. 2014.

129
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

130
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 110: Jardim Vertical Absolut - Elevado Costa e Silva


FONTE: Luisa Dorrl/Folhapress. Disponível em: <http://
hidrosuprimentos.wordpress.com/tag/guil-blanche/>.
Acesso em: 19.09.2014.
Figura 111 Empena de edifício com Jardim Vertical –
Largo Santa Cecília.
FONTE: Foto da Autora (Data: 28.02.2016).
Figura 112: Empena de edifício com Jardim Vertical – Av.
Amaral Gurgel.
FONTE: Foto da Autora (Data: 12.05.2016).

131
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 113: Divulgação Intervenção Elevado Costa e Silva –


X Bienal de Arquitetura.
FONTE: < http://madmag.com.br/2014/03/domingo-tem-
piscina-no-minhocao/ >. Acesso em: 15.11.2015.

Figura 114: Intervenção Elevado Costa e Silva – X Bienal


de Arquitetura – Artista Luana Geiger.
FONTE: Daniel Teixeira/Estadão. Disponível em: < http://
sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,piscina-e-
montada-em-cima-do-minhocao,1144198 >. Acesso em:
15.11.2015.

132
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 115: Intervenção Elevado Costa e Silva – X Bienal


de Arquitetura–Instalação de Luana Geiger - Bienal de
Arquitetura de São Paulo.
Foto: 23/03/2014.
FONTE: http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/
geral,piscina-e-montada-em-cima-do-minhocao,1144198.
Acesso em: 15.11.2015.

133
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Se por um lado a utilização do Minhocão como suporte de intervenções tem mobilizado agentes
de distintas esferas, por outro, as iniciativas coletivas que nascem da articulação de moradores se
efetivam de forma crescente. Em 2012 aconteceu a primeira Festa Junina no Minhocão. Tratou-se de
um processo colaborativo que mobilizou cidadãos animados pelo lema: “A Festa Junina no Minhocão
será dos cidadãos para a cidade e da cidade para cidadãos”16. A iniciativa visa chamar a atenção
para a função social da arte e a relevância da participação social individual, que constrói a coletiva.
É a legitimação de uma identidade construída, que ocorre da apropriação do espaço urbano, do
exercício do direito à cidade, e também por meio da concretização cultural.
Figura 116: Intervenção Elevado Costa e Silva – X Bienal
de Arquitetura – Artista Luana Geiger.
FONTE: Daniel Teixeira/Estadão. Disponível em: < http://
sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,piscina-e-
montada-em-cima-do-minhocao,1144198 >. Acesso em:
02.10.2014.

Figura 117: Festa Junina no Minhocão (junho/2015)


FONTE: < http://gabrielmedina13.com.br/2012/06/
agenda-cultural-2906/ >. Acesso em: 18.11.2015.

Em 2014, o Minhocão começou a abrigar feiras gastronômicas, na edição da Virada Cultural.

O Grupo de Teatro Esparrama concebeu um espetáculo, ambientado no Minhocão, que discute a


convivência cotidiana com a velocidade, a poluição e o barulho. A narrativa mostra como um morador
vizinho do Minhocãotransforma em música a sua vivência. A realidade se mescla à fábula e o prédio 16
Benfeitoria – Mobilização para Projetos de
se transforma em um castelo. O texto usa o humor e a fantasia para mostrar o caos da metrópole Impacto. Disponível em: < http://benfeitoria.com/
festajuninanominhocao >. Acesso em: 19.10.2014.

134
PERCURSOS DO MINHOCÃO

com um olhar difereciado17. A plateia é o chão do Minhocão. O palco se instala em duas janelas do
terceiro andar do Edifício São Benedito e a cenografia se resume a batentes azuis e uma floreira, além
do enfileirado de janelas vizinhas.

Figura 118: Chefs de Rua - Virada Cultural.


FONTE: Folhapres. Disponível em: < http://vejasp.abril.
com.br/materia/dez-motivos-para-nao-demolir-o-
minhocao/ >. Acesso em: 18.11.2015.

Figura 119: Público e apresentação do Grupo Esparrama


no Minhocão. FONTE: < http://arteessenciadavida.
blogspot.com.br/2014/02/grupo-esparrama-da-janela-de-
um.html >. Acesso em: 25.04.2015. A dramaticidade que o Minhocão atribuiu à região e às suas novas utilizações foram também
apropriadas por cineastas. Pelo olhar de João Sodré, o documentário Elevado 3.5 (2007) traça,
Figura 120: Público e apresentação do Grupo
Esparrama no Minhocão. FONTE: Disponível em: < em primeira pessoa, um panorama da realidade de quem convive com o Minhocão. As distintas
http://arteessenciadavida.blogspot.com.br/2014/02/ perspectivas mostradas pelo cineasta denunciam enquadramentos inimagináveis para aqueles que
grupo-esparrama-da-janela-de-um.html >. Acesso em:
25.11.2015. percebem o Minhocão como um mero recurso viário.
17
Grupo Esparrama encena peçaem janela do Minhocão O elevado serviu de locação para personagens do Ensaio Sobre a Cegueira (2008), filme de Fernando
- Disponível em: <http://www.redebrasilatual.com.br/
entretenimento/2014/01/grupo-esparrama-encena-peca- Meirelles baseado no livro homônimo de José Saramago, buscarem uma saída, um novo caminho.
em-janela-do-minhocao- 1686.html>. Acesso: 25.04.2015.

135
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

O peso da estrutura do Minhocão está presente no filme Terra Estrangeira (1995) de Walter Salles
e Daniela Thomas, e é retratado na dicotomia que a edificação contempla: o barulho e o silencio; a
velocidade e a lentidão; o fluxo e a escassez; a presença e a ausência. Seja como pano de fundo (em
o Signo da Cidade, de Carlos Alberto Ricceli, de 2007), como cenário romântico (em Estamos Juntos
de Toni Venturi, de 2011) ou como espaço de lazer (como em Não Por Acaso, de Philippe Barcinski,
de 2007), o Minhocão se presta a construir a realidade urbana com a dramaticidade inerente à sua
presença.

Figura 121: Cena do Filme Ensaio Sobre a Cegueira (2008).


FONTE: < http://universofantastico.wordpress.
com/2008/10/06/so-nao-ve-quem-nao-quer-ensaio-
sobre-a-cegueira/ >. Acesso em: 18.11.2015.

Figura 122: Documentário Elevado 3.5 (2007), dirigido por


João Sodré. FONTE: Flávia Guerra, O Estado de São Paulo,
30.05.2010. Disponível em: < http://www.minhocao.
com>. Acesso: 23.07.2015.

136
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 123: Menina que doa livros no Minhocão.


FONTE: Disponível em: < http://www.cartacapital.com.
br/revista/859/a-menina-que-doa-livros.html >. Acesso:
11.05.2016.
Figura 124: Pintura em empena cega, em construção
vizinha ao Minhocão.
FONTE: Foto da autora (Data: 28.02.16).

137
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

138
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 125: Pintura em empena cega assinada pelo


escritório Nitsche Projetos Visuais.
FONTE: < https://arcoweb.com.br/noticias/design/
nitsche-projetos-visuais-empena-viva-sao-paulo >. Acesso
em: 15.05.2016.
Figura 126 e 127: Pintura em empena cega assinada pelo
escritório Nitsche Projetos Visuais.
FONTE: < https://arcoweb.com.br/noticias/design/
nitsche-projetos-visuais-empena-viva-sao-paulo >. Acesso
em: 15.05.2016.
Figura 128: Marechal Deodoro (Av. Angélica)
FONTE: Desenho da autora (Data: 21.04.2016)

139
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

RESULTADOS

Atualmente, pode-se verificar uma diversidade de ocupações na parte superior do Minhocão, nos
horários em que está fechado para a circulação de veículos. Tratam-se de grupos teatrais, de dança,
ginástica laboral, comerciantes vendendo bebidas, sorvetes, bancas de ambulantes vendendo
bijuterias e artesanato. Os mais inusitados usos acontecem nesse local, nos momentos em que se
configura como Parque.

De acordo com as observações do objeto de pesquisa, pode-se relacionar uma diversidade de usos
que podem ser classificados como intervenções temporárias. As festas, apropriações espontâneas,
intervenções de arte urbana, bem como festivais, podem ser classificadas dessa forma, de acordo
com os conceitos abordados no primeiro capítulo. Na figura 124, conforme a tabela, podem ser
verificados os casos abordados e suas respectivas qualificações.

Também de acordo com os conceitos abordados anteriormente, esse espaço coletivo revela os
conceitos, de acordo com a apropriação apresentada, conforme figura 125, que apresenta a tabela
de conceitos.

Pode-se dizer que esses conceitos revelados (FONTES, 2013) são:

• Dinamismo: Nova atitude dos usuários em relação ao espaço, que toma outras configurações.
A reação dos usuários se altera conforme as diferentes apropriações.

• Reversibilidade: Capacidade elástica do espaço. Após diferentes situações, volta ao uso para
que foi concebido, o tráfego de veículos.

• Flexibilidade: Abertura para diferentes apropriações. O Minhocão tem a característica de


abrigar diferentes usos, apropriações e intervenções em tempos e formatos distintos.

140
PERCURSOS DO MINHOCÃO

• Imprevisibilidade: Não existe rigidez nos usos desse espaço. As configurações podem se
manifestar em diferentes formatos.

• Conexão: Existe uma fluidez e articulação de lugares e pessoas.

A partir da análise do lugar, apresenta-se, a seguir, um quadro-resumo com algumas análises dos
resultados. O quadro tem por objetivo facilitar a interpretação dos dados verificados por meio da
observação sistemática do espaço urbano que envolve a área objeto desta pesquisa.

A pesquisa tem como objetivo apresentar as características das atividades, procurando estabelecer
uma conexão entre tais características e o espaço urbano, evidenciando, por meio dos conceitos
revelados, as transformações que essas práticas tendem a manifestar naquele espaço.

O Minhocão, em função das diferentes apropriações de uso na sua parte superior, se tornou um
sinônimo de lazer para os paulistanos, aos fins de semana e feriados, no período em que os carros não
circulam. Pode-se verificar que a identidade se instalou com grande intensidade, de forma que vários
grupos da sociedade defendem a transformação definitiva daquele local em parque, procurando lhe
dar o caráter definitivo que lhe é emprestado em determinados momentos.

Em contrapartida, grupos contrários defendem seu desmonte e desativação definitiva, para que a
região, maltratada pelas décadas de deterioração que o elevado lhe causou, volte a reviver a aura dos
tempos remotos, quando era tida como área nobre do centro paulistano.

141
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

CASO CLASSIFICAÇÃO
PINTURA DAS LATERAIS DO ELEVADO - FUNARTE (1997) ARTE URBANA
CORRIDA DE SÃO SILVESTRE APROPRIAÇÃO ESPONTÂNEA
JARDIM SUSPENSO DA BABILÔNIA – PINTURA DE PISO (2009) ARTE URBANA
BAIXO CENTRO (2012) FESTAS LOCAIS
FESTA JUNINA FESTAS LOCAIS
JARDINS VERTICAIS ARTE URBANA
BIENAL DE ARQUITETURA ARTE URBANA
VIRADA CULTURAL – FEIRA GASTRONÔMICA FESTAS LOCAIS
TEATRO ESPARRAMA ARTE URBANA
ELEVADO 3.5 – DOCUMENTÁRIO DE CINEMA ARTE URBANA
GRAFITI NAS EMPENAS CEGAS ARTE URBANA
PARQUE MINHOCÃO APROPRIAÇÃO ESPONTÂNEA
Figura 129: Aplicação de conceitos para casos exemplares
COMÉRCIO AOS FINS DE SEMANA APROPRIAÇÃO ESPONTÂNEA da Parte Superior do Minhocão.
FONTE: Tabela executada pela autora. (FONTES, 2013).

142
PERCURSOS DO MINHOCÃO

CASO CONCEITOS REVELADOS


PINTURA DAS LATERAIS DO ELEVADO - FUNARTE (1997) Dinamismo Imprevisibilidade
CORRIDA DE SÃO SILVESTRE Dinamismo Reversibilidade
JARDIM SUSPENSO DA BABILÔNIA – PINTURA DE PISO (2009) Dinamismo Imprevisibilidade
Dinamismo Flexibilidade
BAIXO CENTRO (2012)
Imprevisibilidade
Dinamismo Flexibilidade
FESTA JUNINA
Reversibilidade Conexão
JARDINS VERTICAIS Reversibilidade
BIENAL DE ARQUITETURA Dinamismo Flexibilidade
Dinamismo Flexibilidade
VIRADA CULTURAL – FEIRA GASTRONÔMICA
Reversibilidade Conexão
TEATRO ESPARRAMA Flexibilidade Conexão
ELEVADO 3.5 – DOCUMENTÁRIO DE CINEMA Dinamismo Imprevisibilidade Conexão
GRAFITI NAS EMPENAS CEGAS Imprevisibilidade
Dinamismo Flexibilidade Reversibilidade
PARQUE MINHOCÃO
Imprevisibilidade Conexão
Figura 130: Aplicação de conceitos para casos exemplares
da Parte Superior do Minhocão.
FONTE: Tabela executada pela autora. (FONTES, 2013).
COMÉRCIO AOS FINS DE SEMANA Dinamismo Reversibilidade Conexão

143
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

DINAMISMO PINTURA FUNARTE - 1997 APROPRIAÇÕES


CORRIDA DE SÃO SILVESTRE ESPONTÂNEAS
JARDIM SUSPENSO DA
BABILÔNIA - 2009
REVERSIBILIDADE BAIXO CENTRO 2012
MOVIMENTO 90° - 2014
JARDINS VERTICAIS
FESTA JUNINA - 2012 ARTE
BIENAL DE ARQUITETURA PÚBLICA
FLEXIBILIDADE 2013
VIRADA CULTURAL FEIRA
GASTRONÔMICA
TEATRO ESPARRAMA
ELEVADO 3.5
IMPREVISIBILIDADE DOCUMENTÁRIO CINEMA
COMÉRCIO / DOAÇÃO
GRAFITI - EMPENAS CEGAS FESTAS Figura 131: Aplicação de conceitos para casos exemplares
CONEXÃO DOS EDIFÍCIOS
LOCAIS da Parte Superior do Minhocão.
FONTE: Diagrama executado pela autora. (FONTES, 2013).

CONCEITO CASO EXEMPLAR TIPO DE INTERVENÇÃO

144
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 132: Vista do túnel sob a Consoloção e Praça


Roosvelt
FONTE: Desenho da autora (Data: 21.04.2016)

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 133: Uso do Minhocão aos Fins de Semana


FONTE: Desenho da autora (Data: 21.04.2016)

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

SOB O ELEVADO

O Minhocão e as vias abaixo dele exercem centenas de relações e microssituações, que constituem
diferentes suportes. A via expressa na parte superior escoa o trânsito de veículos, enquanto a parte
inferior se divide entre a estrutura do gigantesco viaduto, as ruas, o trânsito, o comércio e os edifícios.

Percebe-se que os espaços intermediários entre as estruturas e pilares configuraram um novo lugar,
motividador de apropriações de caráter artístico e transgressor, como o grafite, apropriações não
autorizadas que se comunicam com os usuários daquele local, sejam eles pedestres, ciclistas ou
motoristas. De acordo dom Guatelli (2012), é justamente a possibilidade de constantes combinações
e recombinações entre espaços intransitivos e os dominantes, ou transitivos, que justifica a existência
e garante a vitalidade de ambos.

Os baixios do Minhocão constituem diferentes suportes e suplementos na sua parte inferior e


estrutural. Derrida, apud Tschumi (1999), relaciona suplemento às atividades não previstas em
sua intenção original, adicionando sentido à obra, que supera a ideológica, descrita como suporte,
através de novos sentidos e significados.

Desde sua inauguração, o Elevado foi explorado de diversas formas como suporte para intervenções
artísticas, sejam elas não autorizadas, aquelas de caráter transgressor, identificadas nos grafites,
sejam em projetos patrocinados pelo poder público ou por instituições culturais.

A primeira intervenção realizada no Minhocão teve autoria de Flávio Motta e Marcello Nitsche, e
explorava as variáveis de tempo e de posicionamento, conceitos da arte cinética para a percepção
da obra.

Segundo o artista, o objetivo do projeto era tornar a cidade um campo de relacionamento urbano
mais amplo. A intervenção, finalizada em 1974, integrou o projeto Arte e Planejamento, sob-
responsabilidade da Coordenadoria Geral de Planejamento do Município (1975). (ARTIGAS, 2008).

Intitulada Caminhos do Jaraguá, a intervenção tomava partido da sequência dos pilares do ponto de

147
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

vista do deslocamento do motorista, e marcava sua sequência da região central à zona Oeste, onde
à época era possível se avistar o Pico do Jaraguá. O trabalho de Flávio Motta marcou o deslocamento
dos trabalhos artísticos em empenas cegas para outras superfícies da cidade. (ZAIDLER,2014).
Paralelamente, o ineditismo na utilização dos pilares do Minhocão teve grande destaque, emancipando
esse tipo de apropriação e abrindo possibilidades inéditas para a concepção de trabalhos artísticos
visuais na cidade, pois, até então, as pinturas artísticas a céu aberto tinham o status de mural e as
empenas cegas eram o suporte preferencial.

“As pinturas recobriam a totalidade da área dos pilares, exclusivamente nas cores azul, vermelho
e branco; eram em sua maioria geométricas. Em alguns trechos, a sequência sugeria um pôr do
sol; em outros, movimentos de expansão e contração. A certa altura tornava-se figurativa: um
pássaro ocupava sempre a mesma posição relativa em pilares sucessivos, enquanto suas asas se
deslocavam alguns centímetros, primeiro para cima e depois para baixo, criando a ilusão do voo.
Tudo isso na direção oeste, na qual era visível o pico do Jaraguá, o mais alto da cidade e marco
referencial natural cuja visão, desde a Avenida São João, foi bloqueada pelo elevado.” (ZAIDLER,
2014, p. 100).

Nota-se ainda o caráter de transitoriedade da obra, na qual não foram utilizados materiais que
pudessem perpetuar a sua presença, como refere o mesmo autor.

Após algumas décadas, por sugestão da crítica de arte Radha Abramo, foram recriados os painéis de
Flávio Motta como forma de homenagem a um dos pioneiros interventivos.

A apropriação dos baixios do Minhocão como suporte para eventos mobilizou iniciativas também em
outras esferas. Em 2013, foi promovido pelo SESC e autorizado pela Prefeitura o projeto Giganto, de
autoria da jornalista Raquel Brust. Essa intervenção fez parte do festival PhotoEspaña, cuja proposta
era utilização da arquitetura da cidade como suporte para inserção de imagens de grandes formatos.

Figura 134: Intervenção Flávio Motta sob o Minhocão


(1971). FONTE: Artigas, 2008, p. 48.

148
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 135: Reedição dos Paineis de Flávio


Motta no Elevado Costa e Silva. FONTE:
<https://www.facebook.com/vilanova.artigas/
hotos/a.237769802917415.72151.218143798213349/
709042765790114/ >. Acesso em: 15.11.2015.

Figura 136: Projeto Giganto – Pilares do Elevado Costa


e Silva. FONTE: Raquel Brust. Disponível em: < http://
www.hypeness.com.br/2013/10/minhocao-em-sp-ganha-
galeria-de-arte-a-ceu-aberto-com-rostos-dos-moradores/
>. Acesso em: 15.112015.

149
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 137: Projeto Giganto – Pilares do Elevado Costa e


Silva.
FONTE: Raquel Brust. Disponível em: < http://www.
hypeness.com.br/2013/10/minhocao-em-sp-ganha-
galeria-de-arte-a-ceu-aberto- com-rostos-dos-moradores/
>. Acesso em: 15.11.2015.

150
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 138: Projeto Giganto – Pilares do Elevado Costa e


Silva.
FONTE: Raquel Brust. Disponível em: < http://www.
hypeness.com.br/2013/10/minhocao-em-sp-ganha-
galeria-de-arte-a-ceu-aberto- com-rostos-dos-moradores/
>. Acesso em: 15.11.2015.

151
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

A temática tinha por objetivo propor uma reflexão sobre a perfeição de rostos veiculados em
publicidade, por meio da utilização das imagens dos moradores de diferentes áreas da cidade,
cuja escala das fotografias altera a percepção do fotografado em relação a si mesmo, assim como
do observador em relação à cidade. Tinha como objetivo também discutir a individualidade e a
complexidade de cada unidade de apartamento que compõe a fronteira com o Elevado, levando em
consideração todos como uma massa crítica e sem rosto.

A exposição “Máscaras Afro-Brasileiras” também tomou as pilastras do Minhocão como suporte.


A mostra fez parte do Projeto Omô Lodjô e comemorou o mês da Consciência Negra, tendo sido
instalada no segundo semestre de 2014. No total, envolveu 20 pilares do Minhocão, situados na
região inicial para quem chega à Avenida Amaral Gurgel no sentido da zona Oeste, a partir da Rua
General Jardim até o Largo do Arouche.

Renato da Silveira é artista, pesquisador e escritor baiano, doutor em antropologia pela École des
Hautes Études en Sciences Sociales (Escola de Estudos Avançados em Ciências Sociais), de Paris. Sua
primeira aproximação com o tema das máscaras africanas aconteceu em 1967, ano em que visitou
a Bienal Internacional de Arte. Na concepção dos trabalhos em exposição nos pilares do Minhocão,
o artista buscou misturar elementos de origens diversas, como fragmentos de olhos e bocas, ora
humanas, ora de animais, detalhes de esculturas africanas, objetos móveis e imóveis, além de
vegetais.

Segundo material divulgado pela Prefeitura de São Paulo (Secretaria da Cultura, 18.11.2014) “embora
sejam misturadas e multicoloridas, as obras transmitem um ar de doçura, a agressividade fica de fora
na representação das expressões faciais, pois para Silveira ‘estamos ferozes demais, precisando de
máscaras mais tranquilas”.

Figura 139: Projeto Giganto – Pilares do Elevado Costa e


Silva.
FONTE: Raquel Brust. Disponível em: < http://www.
hypeness.com.br/2013/10/minhocao-em-sp-ganha-
galeria-de-arte-a-ceu-aberto- com-rostos-dos-moradores
/>. Acesso em: 15.11.2015.

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 140: Praça Marechal Deodoro - Grafiti


FONTE: Desenho da autora (Data: 21.04.2016)

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 141: Projeto Máscaras Afro-Brasileiras, sob o


Minhocão.
FONTE: < http://noticias.bol.uol.com.br/fotos/imagens-
do-di http://noticias.uol.com.br/album/2014/11/28/
sp-ganha-mostra-a-ceu-aberto-de-mascaras-afro-
brasileiras-nos-pilares-do-minhocao.htm a/ >. Acesso em:
13.12.2015

154
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 142: Projeto Máscaras Afro-Brasileiras.


FONTE: < http://noticias.bol.uol.com.br/fotos/imagens-
do-di http://noticias.uol.com.br/album/2014/11/28/
sp-ganha-mostra-a-ceu-aberto-de-mascaras-afro-
brasileiras-nos-pilares-do-minhocao.htm a/ >. Acesso em:
13.12.2015.

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Nos percursos feitos para registrar os grapichos, grafites, pinturas, bombs e demais intervenções que
dialogassem com os transeuntes, verificou-se que o Minhocão é uma galeria de arte espontânea sem
autorização que também conta com obras de projetos municipais. As possibilidades se estabelecem
à divisão em dois planos que a construção do Minhocão sedimentou na região. O plano vertical
dividiu o centro tradicional de regiões mais valorizados da cidade, como refere Campos:

“Esse verme urbano sem pé nem cabeça costuma ser apreendido de maneira fragmentada. Por
cima, por baixo, ou como segmento de algo do qual não se vislumbra começo nem fim. Para
motoristas usuários, é sempre trecho de trajeto maior; para transeuntes de baixios e entornos,
são pórticos de concreto que se sucedem, perdendo-se na distância e escondendo o lance
seguinte”. (CAMPOS, 2008, p. 20).

O plano horizontal separa os quadrantes superiores (e a circulação viária Leste-Oeste) dos quadrantes
inferiores, onde convive a circulação de automóveis e de pedestres. A fronteira determinada pela
construção do elevado isolou a parte inferior da região, submetida ao que se chama de ocultação.

“Cria uma zona de sombras, um mundo semienterrado, em que térreos e primeiros andares
se perdem em um longo subsolo. Seu próprio apelido evoca um ser subterrâneo. Nessa área
aparentemente escondida, surgem elementos e usos que não ousam se manifestar em locais
mais expostos, sempre com mão dupla: da arte proibida das pichações ao apelo ambíguo dos
travestis“. (CAMPOS, 2008, p. 20).

Essa “ocultação” marcada pela falta de luz, escuridão e desvalorização imobiliária estabelece um
estado psicológico nos usuários que circulam pelo local. Esse ambiente hostil, característico da
sociedade contemporânea, se contrapõe às inscrições deixadas na pele da cidade, na estrutura que
a sustenta. (FERES; NASCIMENTO, 2014).

A cidade-panorama a que Certeau (1998) se refere como sendo resultado de uma remota observação,
platonicamente empreendida do alto de um edifício, se contrapõe ao embaixo, ao down, onde estão
confinados os praticantes ordinários da cidade, cujas impossibilidades visuais efetivam a mobilidade
opaca e cega da cidade habitada. É no rés-do-chão que os passos da pressa moldam espaços e tecem
lugares que efetivam a cidade por meio de um processo de apropriação do sistema topográfico e da Figura 143: Desenho Cotidiano Minhocão: Praça Marechal
Deodoro.
realização espacial do lugar, implicando, segundo o autor, em contratos pragmáticos sob a forma de FONTE: Desenho da autora (22.04.2016).
movimentos.

156
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 144: Grafite Tunel sob Praça Roosvelt.


FONTE: Foto da autora (Data: 23.03.2016).

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 145: Artistas em ação sob o Elevado.


FONTE: Foto da autora (Data: 23.03.2016).

Figura 146: Grafite de retrato de mulher sob o elevado.


FONTE: Foto da autora (Data:23.03.2016).

Figura 147: Intervenção com caráter de protesto sob o


Elevado. FONTE: Foto da autora (Data: 23.03.2016).

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Figura 148: Artistas em ação sob o Minhocão.


FONTE: Foto da autora (23.03.2016).

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PERCURSOS DO MINHOCÃO

PERCEPÇÕES DO PERCURSO NOS BAIXIOS

Em percurso realizado entre a Praça Roosevelt e o Largo Padre Péricles pela parte inferior do Minhocão
(a ordem das fotos segue esse trajeto), foram verificadas diversas pinturas de grafite que utilizavam
como suporte os pilares do Minhocão, uma sequência de pilares que parecem retomar a sequência
de grandes telas de um museu. Atualmente, algumas intervenções não são as mesmas, uma vez que
a efemeridade é uma de suas principais características.

De acordo com Certeau (2011), a cidade é um recinto próprio para as experimentações, um


laboratório onde é possível ao usuário extrair fragmentos do percurso e atualizá-los em segredo.
Foi nesta aura de experimentação que as pinturas foram percebidas. Durante o percurso pela parte
inferior do Minhocão, apreendeu-se o espaço e as apropriações através da arte urbana, procurando
estabelecer uma significação18. A cidade, enquanto texto não verbal, é uma fonte informacional rica
em estímulos criados por uma forma industrial de vida e de percepção.

Na passagem sob a Praça Franklin Roosevelt, foi encontrada a imagem da menina, como mostra
a Figura 149. É evidente o horror estampado em seu rosto, mascarado pelo chapéu de Minnie,
uma visão hollywoodiana da vida. A vida é terrível em espaços sujos e degradados, a expressão se
apresenta como uma visão da sociedade do espetáculo que transforma o homem em ser passivo. O
espetáculo, nascido das condições modernas de produção, automatizou-se do homem.

“O mundo presente e ausente que o espetáculo faz ver é o mundo da mercadoria dominando
tudo que é vivido. E o mundo da mercadoria é assim mostrado como ele é, pois, seu movimento
Figura 149: “Horror da Menina” – Passagem sob a Praça
Franklin Roosevelt.
é idêntico ao afastamento dos homens entre si e em relação à tudo que produzem.” (DEBORD,
FONTE: < http://www.ideafixa.com/minhocao-e-guerrilha- 1997, p. 20).
semiotica >. Acesso em 20.11.2015.
18
Foram tomadas as contribuições do artigo do jornalista Nessa parte do percurso, que se localiza sob a Praça Roosvelt, chama a atenção a iluminação azul,
Caio Luiz, do movimento guerrilha-semiótica, onde são utilizada como mecanismo para afastar os moradores de rua daquele espaço. Trata-se de um lugar
entrevistados os especialistas Pedro Silva e Paulo Demuru,
componentes do Centro de Pesquisas Sócio semióticas em que alguns pernoitam, protegidos do sereno, entre os espaços dos pilares e as paredes do túnel.
da PUC para avaliar o percurso pela parte inferior do
Minhocão. Disponível em: < http://www.ideafixa. A imagem do rato na Figura 150 remete às profundezas da cidade. Os ratos são fortes, assim como
com/minhocao-e-guerrilha-semiotica >. Acesso em:
20.11.2015. as pessoas que vivem na parte inferior do Minhocão, os moradores de rua. Possuindo resistência

161
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

imunológica e resistência a um lugar hostil, desenvolvem os anticorpos daqueles que são vistos como
arautos do pavor da cidade.

Na Figura 151, pode-se ver a imagem do palhaço, arquétipo social, representação da falibilidade
humana, do fracasso, da inadequação, do ridículo que existe em cada um e que é presente na sociedade.
A Arte Pública aproxima a arte da vida, criando formas de interação entre um pensamento emocional
e um pensamento representacional, evidenciando as relações cotidianas no contexto urbano. Sua
manifestação no espaço possibilita o cultivo de um olhar reflexivo, questionador e racional.

São Paulo é uma grande sobreposição de mutilações. Na Figura 152, verifica-se a imagem de um corpo
mutilado. O Minhocão é o objeto que mais representa isso: uma grande cicatriz, que é residência de
gente mutilada, excluída, abandonada.
Figura 150: “Rato” – Início Minhocão – R. Amaral Gurgel
A temática da alienação está claramente estampada na Figura 153. Hoje, tal temática se manifesra FONTE: < http://www.ideafixa.com/minhocao-e-guerrilha-
não mais pela televisão, mas pelos smartphones, ícones contemporâneos do mundo globalizado. A semiotica >. Acesso em 20.11.2015.
imagem assim representa cabeças formatadas, todas iguais. Ao lado, carros passam despercebidos.
Motoristas conectados, protegidos pela película solar dos vidros, se mostram indiferentes à cidade.

A mostra das máscaras africanas fez parte do Projeto Omô Lodjô, vista na Figura 154. A mostra
comemorou o mês da Consciência Negra. No total foram 20 pilares do Minhocão que receberam
as pinturas assinadas pelo artista Renato da Silveira, pesquisador e escritor baiano, doutor em
antropologia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (Escola de Estudos Avançados em
Ciências Sociais). Encontram-se ainda algumas máscaras que receberam intervenções de picho e
grafite, ao longo do percurso.

As intervenções institucionalizadas convivem com as outras não autorizadas, por vezes transformando-
se e se fundendinda, como que concebidas unicamente.
Figura 151: Empena de Prédio na R. Amaral Gurgel.
FONTE: Foto da autora (Data: 21.4.2015).
Segundo material divulgado pela Prefeitura de São Paulo19, “embora sejam misturadas e multicoloridas, 19
Disponível em :< http://noticias.uol.com.br/
as obras transmitem um ar de doçura. A agressividade fica de fora na representação das expressões album/2014/11/28/sp-ganha-mostra-a-ceu-aberto-
faciais, pois para Silveira estamos ferozes demais, precisando de máscaras mais tranquilas’”. de-mascaras-afro-brasileiras-nos-pilares-do-minhocao.
htm#fotoNav=6 >. Acesso em: 12.12.2015.

162
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 152: Corpo Mutilado sob o Minhocão.


FONTE: Foto da autora (Data: 21.04. 2015)

Figura 153: Televisão. Figura 154: Máscaras Africanas.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04. 2015). FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

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SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Na Figura 155, há o marginal empunhando arma, como muitos que frequentam a região.

Na Figura 156, verifica-se o picho como instrumento de contestação, de luta, e sinônimo de voz para
aqueles que não são vistos e ouvidos pela sociedade. A pichação sobre a foto, na cor rosa, representa
o processo de estetização em que o indivíduo afirma a quem de fato pertence à rua. As fotos fizeram
parte de um projeto chamado Giganto20 , promovido pelo SESC. A fotógrafa Raquel Brust estampou
18 fotos de moradores da região.

O morador de rua é o grande anti-sujeito da cidade, visto na Figura 157. O poder público faz ações
sistemáticas no sentido de esconder o que considera desagradável, como os moradores de rua.
Para essas pessoas resta seguir para áreas onde possam ser incluídos na paisagem: lugares sujos,
degradados.
Figura 155: Lambe-Lambe: Marginal controlando arma.
Fonte: Foto da autora. (Data: 21.03.2015).
A parte inferior do Elevado, mesmo sendo parte do todo, é marginalizada e negligenciada. Nela
se esboça o esgoto, a degradação. Segundo Peixoto (2003, p. 400): “Os viadutos, autopistas,
estacionamentos, canteiros de obras, tubulações expostas e conjuntos residenciais populares são os
monumentos das grandes extensões urbanas devastadas contemporâneas”.

Esses sujeitos são tidos fora do padrão. A colagem mostra a diversidade das tribos urbanas,
característica da cidade de São Paulo, como pode-se visualizar na Figura 158.

A herança negra é forte, e a Figura 159 reforça o pertencimento do negro na sociedade.

Na Figura 160, pode-se ver um grafite sobre a foto da tribo indígena, uma sobreposição de camadas
que se fundem e se tornam uma só. A auréola remete ao ser celestial, acima do bem e do mal.

Na Figura 161, a mulher muçulmana é retratada através do grafite, símbolo do individuo que Figura 156: Retratos e Picho
FONTE: < http://www.ideafixa.com/minhocao-e-guerrilha-
permanece excluído, privado dos mesmos direitos dos homens. É um caso semelhante ao daqueles semiotica >. Acesso em 20.11.2015
que vivem o subterrâneo do Minhocão, excluídos dos mesmos direitos que aqueles que passam logo
acima dirigindo seus automóveis.
20
Disponível em : < http://projetogiganto.com.br/ >.
Acesso em 12.12.2015.

164
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 157: Máscara Africana.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

Figura 158: Colagem feita em pilar sob o Minhocão. Figura 159: Projeto Retratos – SESC.
FONTE: < http://www.ideafixa.com/minhocao-e-guerrilha- FONTE: Foto da autora (Data: 21.04. 2015).
semiotica >. Acesso em 20/11/2015

165
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

Na Figura 162, a imagem do líder Mandela, aparece sobre a imagem de um homem negro,
desconhecido e negligenciado dormindo no chão. A associação dos negros à vulnerabilidade social
está manifestada nesse grafite.

166
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 160: Sobreposição de Intervenções.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

Figura 161: Meninos andando de skate sob o Elevado.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

Figura 162: Grafite sob o Minhocão.


FONTE: < http://www.ideafixa.com/minhocao-e-guerrilha-semiotica >.
Acesso em 20.11.2014.

Figura 163: Lambe-lambe.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

Figura 164: Grafite.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

Figura 165: Imagem Noturna.


FONTE: Foto da autora. (Data: 21.04.2015)

167
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

À noite nos baixios, conforme mostra a Figura 165, as sombras se multiplicam e os signos parecem
tomar corpo, como protagonistas de um filme de suspense. A cidade fala através de suas imagens.

Acredita-se que a virtuosidade cívica pode ser desenvolvida interagindo com a intervenção criada.
A afirmação (DEBORD, 1992) sobre a alienação e os efeitos divisórios do capitalismo n’A Sociedade
do Espetáculo atinge o centro da razão pela qual a participação é importante (arte participativa):
ela reumaniza a sociedade atávica e fragmentada pela instrumentalização repressiva da produção
capitalista.

A arte do fraco, segundo Certeau (2011), manifesta o espaço público como legítimo da
contemporaneidade na Metrópole. As manifestações artísticas nas pilastras do Minhocão são
desprovidas de poder, mas apontam legitimidade, reconhecimento, moralidade.

A “arte participativa”, em seu sentido mais restrito, acaba com a ideia de espectador e sugere um
novo entendimento de arte sem audiência, uma arte da qual, todos são produtores.

168
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Figura 166: Grafiti


FONTE: Desenho da autora (Data: 21.04.2016)

169
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

RESULTADOS

As manifestações de caráter artístico encontradas na superfície inferior do Minhocão, os baixios, têm


caráter temporário e tomam a estrutura, principalmente os pilares, como suporte. De acordo com
Fontes (2013), as intervenções podem ser caracterizadas como Arte urbana.

Essas intervenções de arte urbana têm caráter transitório, uma vez que não permanecem por muito
tempo no local, passando por diferentes intervenções e sobreposições de novas pinturas que a
transformam em outra arte, em um processo de constante mutação. Têm caráter pequeno, pontual
e relacional, se instalando nos pilares, que têm características físicas e dimensões semelhantes
às grandes telas de pintura e se relacionam com aqueles que passam usuários da região. São
participativas, pois acontecem com a participação espontânea daqueles sujeitos que procuram
intervir e deixar sua marca na cidade, através da arte. Essa qualidade leva as intervenções a ativarem
os locais em que estão inseridas, onde possuem características subversivas e particulares. Os baixios
do Minhocão apresentam os seguintes conceitos (FONTES, 2013), revelados através das intervenções
de arte urbana e dos usos espontâneos: dinamismo, uma vez que revelam uma nova atitude em
relação ao espaço; flexibilidade, já que revelam a abertura para diversas apropriações; e conexão de
pessoas, de usos e de espaços públicos.

Em função dos conceitos revelados, pode-se afirmar que o espaço é transformado pela apropriação
de usos que se manifestam nos baixios. Apropriações espontâneas, manifestas nos deslocamentos
dos pedestres, dos ciclistas e do uso dos skatistas, e também por meio das pinturas, apropriações de
arte urbana dos pilares, que são impregnadas de caráter transgressor, típico das pinturas de grafite e
de caráter político. Os baixios do Minhocão são uma obra:

“sem expressão ou arquitetura que ressurge como suporte do posicionamento político das
intervenções de arte do grafite e que compõem juntamente com os sem-teto, a geografia do
lugar. Por seu caráter efêmero e sua forte intromissão visual, o grafite contribui para que os
espaços residuais e sem expressão voltem a participar dos fluxos da cidade – que resgatem
seu aspecto simbólico – estabelecendo diálogocom os passantes e também leitura de parte da
cidade”. (TELLES, 2011, p. 254)

170
PERCURSOS DO MINHOCÃO

Mapa 08: Grafites ao longo do Minhocão.


FONTE: Execução da autora.

171
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

O Mapeamento dos grafites foi elaborado (figura 157), com inserção dos grafites mais atuais, no
percurso de coleta de dados fotográficos feito ao final de março de 2016. O objetivo desse mapeamento,
além de localizar as imagens de maior relevância, é marcar uma diferenciação nas características
dos grafites nos baixios do Minhocão, além de justificar de acordo com as interpretações feitas nos
outros mapas (leituras do urbano).

Podemos afirmar que a manifestações mais significativas acontecem na Avenida Amaral Gurgel,
seguidas pela região da Praça Marechal Dodoro, próximo à Avenida Angelica e os pontos de ônibus.

Entre a estação Santa Cecília e a Praça Marechal Deodoro e a estação Santa Cecília e Terminal Amaral
Gurgel, há uma região com muita pichação e lambe-lambe, assim como a região da Avenida General
Olímpio da Silveira seguindo para o término do Minhocão. Essas regiões coincidem com regiões de
maior fluxo de moradores de rua e onde não há muito fluxo de pedestres, em função de poucos
pontos de ônibus. Na Avenida Amaral Gurgel há poucos pontos de ônibus, mas muita concentração
de trânsito de veículos, usuários que parecem ser objeto de atenção dos grafiteiros da região.

Pode-se concluir que as intervenções de arte urbana, nos baixios do Minhocão, têm comunicação
com seu entorno e com os usuários do local. Os automóveis, ciclistas, pedestres, moradores de rua
e comerciantes têm relação direta com a linguagem que as pinturas expressam. É fato que cada
usuário, por meio do modo como interage com a intervenção, terá percepções diferentes.

Nesse sentido, os artistas desenvolvem sua comunicação de diferentes maneiras ao longo do percurso,
manifestando diferenças significativas, principalmente no que diz respeito ao foco do expectador,
mas também levando em consideração as características físicas urbanas. Os grafites próximos à Praça
Marechal Deodoro têm outra questão de perspectiva, em função da abertura que o local permite,
bem como os diferentes modos de visualização.

O percurso que foi realizado ao ver a cidade leva a confrontar o espaço, o urbano, a cidade e o
lugar. Os elementos que compõem o espaço interferem na forma deste, quando é verificado que a
paisagem é sugerida como complemento para captar a forma fluida e irregular desses horizontes.
Segundo Ferrara (1997), a cidade é o resultado da atuação de um conjunto de elementos dinâmicos

172
PERCURSOS DO MINHOCÃO

denominados de contexto urbano. Esse contexto é composto por ruas, muros, escadarias, fachadas,
edifícios, multidões em locomoção, ruídos, luzes, cor e volume.

A cidade é tratada como comunicação porque o contexto urbano se constitui de um conjunto de


elementos significativos da reflexão sobre a própria cidade. Qualquer alteração nesse contexto
implica mudança em seu significado: “a cidade constrói uma relação comunicativa onde a imagem é
mediação do seu ideal de plano urbano, de valores e hierarquias. ” (FERRARA, 2004, p.140).

O Minhocão é símbolo de resistência, de luta, de manifestação daqueles que não são vistos pela
sociedade como figuras excluídas do contexto social, e as intervenções por meio do grafite, nos
baixios, são acompanhadas dessa aura contestadora que o próprio suporte já incorpora em relação
à cidade: a resistência daqueles que vivem naquele local, a despeito dos problemas que o artefato
criou ao longo de sua história.

O espaço habitado é uma manifestação exemplar de uma linguagem carregada de signos, e esse
texto não verbal se espalha pela cidade e incorpora toda a sua micro linguagem: a paisagem, a
urbanização, a arquitetura, o desenho industrial ambiental, a comunicação visual, a publicidade, bem
como a sinalização viária.

“A experiência dos lugares constitui-se entre a mobilidade e a permanência. Se a cidade é


reconhecida pela sua face fixa, construída, é, no entanto, a mobilidade que a anima. Na sua
gênese, a cidade é um lugar de troca e encontro”. (BOGEA, 2009, p. 158).

173
CONSIDERAÇÕES
CONSIDERAÇÕES

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As transformações econômicas e sociais vivenciadas no urbano elaboram o que Ferrara (1997)
chama de história não verbal da cidade. É possível vivenciar a imagem da cidade por meio das
realizações humanas. No Minhocão, pode-se perceber que na apreensão dessas imagens residem as
representações, que constituem por sua vez a linguagem urbana, uma linguagem sem palavras. Tal
linguagem não se apreende apenas por meio da abstração, mas também pela recorrência dos fatos
urbanos que constroem o cotidiano da cidade.

Na história da cidade de São Paulo, o Minhocão constitui um marco, não só por causa dimensão formal
que se constitui, mas também por remeter a uma herança do período de ditadura militar. Nessa era
da nossa história brasileira, pautada pelo culto ao automobilismo, as prioridades construtivas tinham
por objetivo ofertar escoamentos viários em grandiosos equipamentos que revelassem o caráter de
um país em desenvolvimento. Desconsiderava-se, assim, qualquer condicionante topográfica, visual
ou histórica, como refere Zaidler (2014). A desproporcionalidade do Elevado em relação à área em
que foi implantado estabeleceu dois territórios distintos em uma área anteriormente valorizada da
cidade. A interrupção que representa o sinuoso elevado resultou em uma fronteira que materializa a
desproporção, o incômodo e a invasão da privacidade.

Enquanto um espaço de permanente publicação (o espaço público, do público), o Minhocão passa


paulatinamente a ser visto como anacrônico, tornando-se assim objeto de propostas de demolição
total ou parcial.
“Com o novo século, a situação se galvanizou. De um lado, ressuscitou-se mais uma vez a ideia de
renovar a área de Santa Ifigênia, transformando a Cracolândia em Nova Luz; de outro, começou-
se a pensar em reaproveitar elementos e situações urbanas até então desprezados, como o
próprio Elevado, repropondo-se como ponto de partida para outras visões da cidade. Artistas,
cineastas e arquitetos lançam olhares que tentam desvendar essa multiplicidade de sentidos. O
Minhocão segue dividindo opiniões, incomodando, revelando diferenças e invertendo valores”.
(ARTIGAS, 2008, p. 43).

O Minhocão se faz e refaz no caráter efêmero de suas manifestações, mas mantém o significado de
símbolo de resistência, cicatriz urbana que fere, mal trada, dói. Seu caráter se legitima através dos
conceitos que foram contextualizados nesse percurso. As intervenções temporárias funcionam como

177
SOB [RE] O MINHOCÃO: APROPRIAÇÕES, ARTE E FESTA

catalisadoras de relações de proximidade e intimidade, de conexões tanto com o próprio espaço,


quanto com os indivíduos da urbes. (FONTES, 2013). Os percursos realizados e as análises sistemáticas
das intervenções artísticas temporárias têm o objetivo propositivo de reflexão a respeito do futuro
dos espaços contemporâneos da coletividade, buscando a valorização do humano na cidade, por
meio da ativação da vida urbana.

Quando se reflete a respeito do atual estágio da modernidade, que é a condição efêmera dos nossos
dias e do mundo contemporâneo, visualizam-se traços que podem ser considerados negativos, no
espaço coletivo, tais como hostilidade, individualismo e relações superficiais entre os indivíduos.

O Minhocão, espaço coletivo, objeto de estudo desta investigação, é o suporte onde se desenrolam
as manifestações negativas e positivas. Tais condições são pautadas na aceleração da vida
contemporânea e na flexibilidade e leveza em que se move o indivíduo dentro desse contexto. Essa
leveza pode ser caracterizada como o aspecto positivo que impulsiona esta pesquisa e que implica no
aspecto temporal das atividades observadas no Minhocão.

Apesar da rejeição que o equipamento suscita nos usuários, constatou-se que os mesmos encontraram
modos de reinventar a sua vocação original, transformando sua estrutura, no caso dos pilares, ou
reinventando usos e fluxos, como é o caso das apropriações realizadas no tabuleiro, parte superior
do elevado. A apropriação se dá em diversos formatos, mas o que se verifica nos baixios do Elevado
é o caráter artístico das intervenções. Na parte superior, as apropriações têm carater espontâneo,
enquanto nos baixios as intervenções de arte urbana manifestam as disputas, as inquietações, as
revoltas daqueles sujeitos deixados de lado, os anti-sujeitos que a sociedade procura ocultar.

Essa visibilidade das relações encontradas na cidade, que se dá por meio da observação do uso do
público e das apropriações dos espaços coletivos, estimula reflexão acerca de novas possibilidades de
leitura do espaço, consistindo em variáveis de projeto importantes para o pensamento das cidades
e do futuro dos espaços coletivos.

Na observação das intervenções temporárias, pode-se verificar que elas provocam uma ruptura nos
eventos cotidianos, pois não são vistas como uso corriqueiro do espaço. (FONTES, 2013).

As intervenções, portanto, constituem usos excepcionais do espaço, tendendo assim a aproximar as

178
CONSIDERAÇÕES

pessoas, diminuirndo o distanciamento entre elas e pressupondo um espaço coletivo, não no sentido
espacial, mas no sentido do coletivo social.

No momento em que foi aprofundada a análise das observações a respeito das intervenções
temporárias realizadas no Minhocão, nos níveis superior e inferior, verificou-se que se tratam de
agentes transformadoras. Esse conceito se torna evidente quando se comparam as intervenções de
caráter artístico dos usos cotidianos, os quais foram nomeados de usos espontâneos. Nesse sentido,
as intervenções artísticas são aquelas que manifestam uma ruptura no cotidiano, registrando uma
elevação dentro da frequência do espaço-tempo. Em outra perspectiva se encontram os grandes
eventos, localizados do lado oposto ao das intervenções temporárias, os seriam ações de caráter
“projetado de cima para baixo” (FONTES, 2013, p. 381).

As intervenções temporárias, portanto, são caracterizadas pelo convívio social 3 se movem no âmbito
do pequeno, particular, envolvendo participação, ação, interação e subversão, sendo assim motivadas
por situações particulares que se contrapões aos movimentos estandardizados, em grande escala.

As intervenções analisadas nesta pesquisa, conforme conceitos de Fontes (2013), têm como
composição essas oito dimensões, em diferentes porções, que conduziram à classificação tipológica
de apropriações espontâneas, intervenções de arte públicaou arquitetônicas ou festas locais.

Verificadas e classificadas as intervenções, por meio de observações sistemáticas, pode-se visualizar


seu potencial transformador nos ambientes e em seus usuários. Nesse sentido, qualificaram-se
qualidades positivas na intenção libertadora dessas intervenções que caminham no contexto da
condição efêmera dos tempos contemporâneos, “essa liberdade criativa permite novas formas de
atuação na cidade”. (FONTES, 2013, p. 381).

A condição efêmera, mesmo abstrata, pode tomar corpo nos espaços da cidade, como verificado nos
percursos pelo Minhocão, e para tanto foram trabalhados cinco conceitos dessa condição (FONTES,
2013), criando conexões com as intervenções observadas, tornando visível o contexto contemporâneo
na avaliação da condição efêmera das intervenções do Minhocão.

Essa articulação de conceitos procurou evidenciar as características positivas dessas intervenções


realizadas no Minhocão no sentido da criação de um potencial transformador dos espaços da cidade
e de seus usuários.

179
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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM ARQUITETURA E URBANISMO
SÃO PAULO 2016

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