Wanderley, Maria de Nazareth Baudel. Um saber necessário: os estudos rurais no Brasil.
Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2011, 151 p.
Maria de Nazareth Baudel Wanderley, advogada e doutora em Sociologia, é uma
referência obrigatória para quem se propõe estudar o mundo rural no Brasil. Com mais de 50 anos de carreira acadêmica, foi professora de pós-graduação em Ciências Sociais na UNICAMP e na UFPE, Brasil. Seus artigos sobre a diversificação dos espaços rurais como espaços de vida tornaram-se referentes clássicos deste campo de estudo. Pesquisadora e formadora de pesquisadores, ela continua (já não desde a docência, mas sim a partir dos seus escritos e participações em eventos) inspirando às novas gerações a seguir suas pegadas e a combinar o conhecimento com a emoção e a responsabilidade social.
O livro aqui resenhado constitui um balanço da produção científica dos estudos
rurais no Brasil a partir de meados da década de 1960 até o ano de 2010. Nesse Estado da Arte, a autora dá conta dos desenvolvimentos do estudo temático das relações de produção no setor rural, as diferentes visões sobre a propriedade da terra e as políticas que derivam delas, a perspectiva do desenvolvimento rural sustentável, entre outros temas. O primeiro capítulo do livro, intitulado “Agricultura e acumulação do capital” abrange o essencial dos debates sobre o estabelecimento do modelo econômico capitalista no setor agrícola. No caso do Brasil, a autora assinala três particularidades que foram favoráveis ao avanço capitalista: A condição colonial original, a relevância estrutural do sistema de escravidão e a importância histórica da concentração da terra. Posteriormente, a autora realiza algumas críticas ao modelo de modernização conservadora implantado no Brasil, sustentando-se nos estudos de autores como Silva (1982) e Delgado (1985) conclui que dito modelo acentuou os níveis de desigualdade econômica no Brasil, subordinou a agricultura à indústria e converteu terras produtivas em “reserva de valor”, tornando-as improdutivas. O segundo capítulo do livro trata sobre a subordinação do trabalho e a resistência dos trabalhadores rurais. Nesta parte, a autora descreve o processo sistemático de expulsão dos trabalhadores rurais e a sua subsequente proletarização. Expropriados dos seus meios de produção os trabalhadores rurais passaram a adaptar-se às exigências do modelo produtivo industrializado. Isto, aconteceu no meio de resistências que fundamentaram a conformação de movimentos sociais de base rural. O terceiro capítulo enfoca-se na concentração fundiária e as lutas pela terra. Nessa parte, a autora explica quais são as continuidades existentes nas formas de dominação do processo produtivo. A aliança entre capital e propriedade fundiária incorporou novos olhares sobre velhas relações de poder. Assim, o “latifúndio” passou a ser chamado “agronegócio” e os “latifundiários” foram reconhecidos como “empresários” que receberam privilégios para seus empreendimentos, ainda passando por cima dos direitos de posse da terra dos pequenos produtores. No quarto capítulo, em contraposição à corrente avassaladora do agronegócio, Wanderley destaca o fato de que as unidades familiares de produção são compatíveis com o desenvolvimento agrícola e “são capazes de transformar seus processos de produção no sentido de alcançar novos patamares tecnológicos, que se traduzam por maior oferta de produção, maior rentabilidade dos recursos produtivos aplicados e a plena valorização do trabalho” (Wanderley, 2011, p. 89). Além disso, recalca que existem rupturas e continuidades no modo de vida de um “camponês” que passa a ser reconhecido como “agricultor familiar”, e alerta que ser “camponês” vai além de ser meramente produtor agrícola, de modo contrário, está se conduzindo a uma perda do conteúdo histórico-político que implica ser “camponês”. O quinto e último capítulo, intitulado “O mundo rural no Brasil moderno: espaços de diversidade”, destaca as contribuições dos estudos rurais no Brasil nos últimos cinquenta anos, entre elas, os aportes teóricos para a consolidação dos movimentos sociais, o aprofundamento das críticas ao modelo produtivista de modernização da agricultura brasileira, a revalorização da dimensão do espaço social, o foco colocado no estudo dos sujeitos sociais rurais e nos efeitos do modelo de crescimento agroindustrial e das políticas sociais sobre a pobreza rural. Nas conclusões, a autora amplia seus comentários sobre a importância dos estudos rurais no Brasil que abrangem temas ambientais, econômicos, tecnológicos, políticos e sociais. Ressalta sua importância na orientação do papel do Estado e da cidadania e no estudo das dinâmicas demográficas urbano-rurais. Referências
DELGADO, Guilherme Costa. Capital financeiro e agricultura no Brasil 1965 - 1985.
São Paulo: Ícone, 1985. SILVA, José Graziano da. A modernização dolorosa. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. Um saber necessário: os estudos rurais no Brasil. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2011.