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O REGIME INTERNACIONAL DE

MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL

Eduardo Viola

Este artigo é constituído de três partes. Na sões de carbono por parte dos países emergentes,
primeira, analisa-se o processo de formação do ao estabelecimento de mecanismos flexibilizadores
regime internacional de mudança climática, desde de mercado e à inclusão das emissões derivadas de
as negociações e a assinatura da convenção Qua- mudança do uso da terra. Em maio de 1997, o
dro das Nações Unidas sobre Mudança Climática, Brasil fez uma proposta original: a criação de um
no Rio de Janeiro (1992), passando pela negocia- Fundo de Desenvolvimento Limpo (FDL), que apli-
ção e a assinatura do Protocolo de Kyoto (1997), caria multas aos países desenvolvidos que não
até a conclusão das questões pendentes do Proto- cumprissem as metas de redução de emissões. A
colo na VII Conferência das Partes (COP), em proposta foi apoiada pelos países em desenvolvi-
Marrakesh (2001). mento e rejeitada pelos países desenvolvidos. Em
Na segunda, analisam-se as políticas públicas outubro de 1997, os Estados Unidos e o Brasil
relacionadas às emissões de carbono no Brasil, na elaboraram uma nova versão do FDL, que passou
década de 1990, e o posicionamento brasileiro a ser chamado de Mecanismo de Desenvolvimento
quanto ao regime de mudança climática. O Brasil Limpo (MDL). O MDL criou a possibilidade de os
teve uma posição de liderança no processo de ne- países desenvolvidos cumprirem parte de suas me-
gociação da Convenção de Mudança Climática tas de redução de emissão condicionada ao finan-
(1990-1992), pois sua política externa se afastava ciamento de projetos de desenvolvimento sustentá-
da posição desenvolvimentista radical predomi- vel nos países em desenvolvimento.
nante até 1988. Durante Protocolo de Kyoto Na terceira parte, analisam-se as perspectivas
(1996-2001), o país se opôs a compromissos de futuras do Protocolo de Kyoto depois dos acordos
redução da taxa de crescimento futuro das emis- nas convenções de Bonn e Marrakesh, particular-

RBCS Vol. 17 no 50 outubro/2002


o
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mente em relação à sua viabilidade com a ausência fonte essencial de competição e cooperação, com
dos Estados Unidos. diminuição do conflito e aumento da cooperação
(comparado com o período da Guerra Fria), devi-
do à intensificação da interdependência econômica
A Formação do regime internacional de e tecnológica. Na ordem interestatal, os Estados
mudança climática Unidos ocupam uma posição de superpotência,
sendo considerados hiperpotência militar e, econo-
O regime de Mudança Climática é um dos micamente, compartilham a centralidade com a
mais complexos e relevantes regimes internacio- União Européia e o Japão. Em seguida, têm-se as
nais porque implica profundas inter-relações en- potências regionais: Rússia, China, Índia e Brasil.
tre a economia e o ambiente global. Os principais Pelo critério da eficácia e da eficiência de governa-
instrumentos do regime são a convenção Quadro bilidade, os Estados podem ser classificados como:
das Nações Unidas sobre Mudança Climática, as- desenvolvidos, emergentes, semifracassados e fra-
sinada no Rio de Janeiro em junho de 1992, e o cassados. A ordem interestatal é fundamental ao se
Protocolo de Kyoto, assinado em Kyoto em de- analisar os problemas ambientais globais, na medi-
zembro de 1997. Um dos problemas fundamen- da em que são os Estados as partes contratantes
tais da viabilidade desse Protocolo deriva do fato nos regimes internacionais.
de ele ter sido aprovado no interior de uma ne- Na segunda, observa-se uma diferenciação
gociação extremamente difícil e emergencial. entre as grandes civilizações, cuja obra de Hun-
Além disso, vários artigos-chave ficaram em sus- tington tornou-se referência fundamental, a sa-
penso, devendo ser discutidos em uma conferên- ber: ocidental, latino-americana, eslava, japone-
cia posterior. Desde a IV Conferência das Partes, sa, confuciana, islâmica, hinduísta e africana. A
realizada em Buenos Aires, em 1998, até a VI, em civilização ocidental representa o que podería-
Haia, em 2000, tem predominado um impasse na mos chamar de “vanguarda do processo civiliza-
negociação dessas questões pendentes. O Proto- tório”, pois a integração de elementos como eco-
colo de Kyoto dividiu os países em dois grupos: nomia de mercado, individualismo, Estado de
os pertencentes (membros da OECD e países do direito e democracia representativa produziram
ex-bloco comunista do Leste Europeu) e os não uma sociedade “superior” quanto ao domínio da
pertencentes ao Anexo Um. Os do primeiro gru- natureza e à construção de uma tecnosfera. A ci-
po, ao contrário dos do segundo, têm compro- vilização japonesa já segue plenamente o mode-
missos obrigatórios de emissões máximas para o lo ocidental. A civilização latino-americana é,
ano 2010, ainda que os do segundo grupo pos- atualmente, bastante heterogênea – países como
sam tê-los em data posterior a esta. Chile, Costa Rica, Uruguai, Brasil e México se ali-
Os problemas ambientais globais, juntamente nham com a civilização ocidental e, em outro ex-
com a revolução da informação e a globalização tremo, observa-se uma grande distância, no caso
econômica, contribuíram para alterar as relações en- de Cuba, Haiti, Nicarágua, Guatemala e Hondu-
tre os Estados (North, 1990; Haas, Keohane e Levy, ras. A civilização eslava somente em 1989 iniciou
1993; Hurrell, 1995; Haas, 1997). Para compreender o processo de aproximação com o Ocidente,
a complexidade desses problemas é necessário não contando com avanços e retrocessos. A civiliza-
se restringir aos principais enfoques teóricos das re- ção confuciana tende, de um lado, a uma con-
lações internacionais – neo-realismo e instituciona- vergência com o Ocidente em virtude do vetor
lismo liberal – e analisar quatro dimensões de cliva- tecnológico e, de outro, a um distanciamento em
gem e alinhamento – interestatal, civilizatória, virtude do vetor sociopsicológico. A civilização
democracia versus não-democracia, e dentro da de- hinduísta mantém-se muito distante da ocidental,
mocracia, liberalismo versus comunitarismo. na medida em que conserva o regime de castas,
Na primeira dimensão, a clássica clivagem mas aproxima-se em virtude do vetor tecnológi-
entre os Estados nacionais continua sendo uma co e da democracia política. A civilização islâmi-
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ca vive atualmente um processo de confronto Se até a década de 1970 todos os Estados im-
com a civilização ocidental e, em menor grau, portantes, agindo em interesse próprio, eram capa-
com as civilizações hinduísta, eslava e chinesa. A zes de solucionar, seja pela conciliação, seja pela
civilização africana depois de ter sido parcial- imposição, a maioria de suas disputas com outros
mente ocidentalizada durante o período colonial Estados sem prejuízo de sua soberania, a partir da
de meados do século XIX a meados do século década de 1980 ocorreu uma perda diferenciada
XX encontra-se em processo de regressão. A ci- de autonomia de quase todos eles (com a única
vilização ocidental foi, na década de 1960, o ber- exceção dos Estados Unidos) e uma necessidade
ço do moderno ambientalismo. A partir de então, cada vez maior de cooperação internacional, o
houve uma expansão da discussão dos proble- que exige muita flexibilidade nas negociações. O
mas ambientais para a civilização japonesa, na benefício coletivo exige cada vez mais ações que
década de 1970, e para a latino-americana, na contrariam os interesses de cada Estado indivi-
década de 1980 até hoje. dual. A formação de regimes internacionais eco-
Na terceira, tem-se a clivagem entre o mun- nômicos, de segurança e ambientais passa a im-
do democrático (enraizado nas civilizações oci- por algumas restrições à soberania da grande
dental e japonesa, quase consolidado em alguns maioria dos Estados (Chayes e Handler Chayes,
países da civilização latino-americana, mas ainda 1995; Keohane e Miller, 1996). Existe, ao mesmo
frágil em outros e nas civilizações hinduísta e es- tempo, uma certa transferência de poder do Esta-
lava) e o mundo não-democrático (a maior parte do para instituições supranacionais que vão cons-
das civilizações chinesa, islâmica e africana). Com tituindo novos centros de autoridade e para cor-
exceção de Singapura, pode-se constatar uma for- porações transnacionais (Risse-Kappen, 1995; Co-
te relação entre democracia e expansão da preo- mission on Global Governance, 1995; Castells,
cupação pelos problemas ambientais. 1996; Rosenau, 1997; Keck e Sikkink, 1998).
Na quarta, tem-se a clivagem entre liberalismo Os problemas de mudança climática estão
e comunitarismo no interior do mundo democráti- vinculados aos bens comuns/coletivos globais
co. O liberalismo é a corrente dominante em todo (Kaul, Grunberg e Stern, 1999). A atmosfera, por
o mundo democrático (exceto Japão) e baseia-se exemplo, é um bem público global, desde que
no domínio do indivíduo sobre os grupos, do mer- sua utilização por um ator não exclua a possibili-
cado sobre a política, na meritocracia e na repre- dade de utilização por outro. Ela tem, no entan-
sentação política com participação esporádica atra- to, uma capacidade limitada em absorver polui-
vés de partidos. O comunitarismo é uma corrente ção ou emissões de gases de efeito estufa sem
secundária no mundo democrático (exceto no Ja- provocar alterações na saúde humana ou no cli-
pão, onde predomina) e apresenta períodos de ma. Em vista dessa limitação, as cúpulas e as con-
grande avanço, como na rebelião estudantil de venções internacionais da última década atribuí-
1968, na utopia da governabilidade por meio da ram à atmosfera o estatuto de “preocupação co-
sociedade civil mundial logo depois da Guerra Fria mum da humanidade”, e os problemas do seu
e no movimento antiglobalização de Seattle em uso foram consensualmente vinculados à constru-
Porto Alegre. Baseia-se no predomínio do grupo ção de regimes internacionais (McCormick, 1989).
sobre o indivíduo, da política sobre o mercado (nas Existem duas concepções gerais sobre os re-
formas mais extremadas há rejeição ao mercado) e gimes ambientais internacionais: uma formal
na alta participação política por meio de múltiplas (sentido estrito) e outra substantiva (sentido am-
estruturas associativas que podem ser mais adscri- plo) (Krasner, 1983; Keohane, 1983; Porter e
tivas ou mais baseadas nas opções construídas in- Brown, 1996; Hurrell, 1995; Soroos, 1997). De
dividualmente. O ambientalismo moderno origi- acordo com ambas as concepções, tais regimes
nou-se na vertente comunitária da democracia, mas são um sistema de regras, explicitadas num trata-
com o passar do tempo, uma parte importante dele do internacional pactuado entre governos, que
se converteu à vertente liberal. regulam as ações dos diversos atores sobre o as-
o
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sunto. Contudo, a visão mais abrangente também renda baixa (enchentes na África Austral e Norte da
considera os regimes ambientais um vetor tecno- Índia, furacões em Bangladesh e América Central,
lógico e cultural em desenvolvimento favorável à seca na Ásia Central etc.), destruição de patrimônio
proteção de um bem coletivo global (Sand, 1992; em países de renda alta (tormentas e enchentes na
Gehring, 1994; Norhaus, 1994; Young, 1997). Ou Europa Ocidental, seca no Meio Oeste e queimadas
seja, o regime de mudança climática, segundo no Oeste dos Estados Unidos etc.), prejuízos seme-
esta concepção, não se restringe aos acordos es- lhantes em graus variáveis nos países de renda mé-
tabelecidos na Convenção do Rio de Janeiro e no dia (enchentes na Venezuela e na província de
Protocolo de Kyoto, mas prevê também a neces- Buenos Aires etc.).
sidade de uma consciência pública favorável a es- A comunidade científica dos climatólogos,
tabilizar o clima e de um vetor tecnológico que que durante a década de 1980 formulou a teoria
favoreça o investimento em tecnologias não in- do aquecimento global, é constituída em aproxi-
tensivas em carbono. Neste trabalho utilizarei o madamente dois terços por cientistas que traba-
conceito de regime ambiental internacional em lham em instituições norte-americanas. Os Esta-
sentido amplo. dos Unidos, sob a recém-iniciada presidência de
A comunidade científica tem um papel-cha- Bush, assumiu um papel de liderança nas nego-
ve em relação a essas questões, pois quando a ciações que levaram à formação do Painel Inter-
grande maioria de cientistas concorda no diagnós- governamental sobre Mudança do Clima (IPCC) e
tico de um problema e é eficiente em comunicá- à convocação da UNCED, em 1989 (Weiss Brown
lo ao público em geral e aos decisores, cria-se e Jakobson, 1998). Durante a campanha eleitoral
aquilo que denominamos “comunidade epistêmi- de 1988, Bush tinha-se distanciado de Reagan,
ca”, adquirindo, então, peso internacional (Haas, afirmando que o aquecimento global seria uma
1992). A constituição do Painel Intergovernamen- das grandes prioridades de seu governo. Travou-
tal sobre Mudança do Clima (IPCC), em 1988, deu se uma disputa interna entre duas facções do go-
início ao processo de análise e avaliação dos efei- verno: os globalistas, liderados por William Reilly,
tos da mudança climática que foi traduzido politi- diretor da Environmental Protection Agency (equi-
camente na constituição do Comitê Negociador valente ao cargo de ministro do meio ambiente),
Internacional (INC) para uma Convenção sobre e os conservadores, liderados por John Sununu,
Mudança do Clima. Durante toda a década de chefe da Casa Civil. Desde meados de 1988 (ve-
1990, o IPCC forneceu subsídios fundamentais para rão mais quente do século no país) até julho de
a condução das negociações no âmbito da Conven- 1990, a questão do aquecimento global ocupou
ção e tem assumido um papel de referência na for- uma posição destacada em todas as pesquisas de
mação da opinião pública internacional sobre a opinião pública. A invasão do Kuwait pelo Iraque,
questão da mudança climática. O último relatório em agosto de 1990, e a subseqüente Guerra do
do IPCC (janeiro de 2001) estabeleceu o fim da in- Golfo desviaram a atenção e arrefeceram as opi-
certeza científica prévia sobre a mudança climática. niões pró-ambiente dos norte-americanos. A crise
A temperatura média da Terra poderá subir de 1,5 do Golfo mostrou claramente a intensa dependên-
grau até 6 graus, até o ano 2100, com impactos gi- cia do petróleo da economia norte-americana.
gantescos sobre os ecossistemas naturais, a agricul- Além disso, ficou evidente que a economia norte-
tura, as estruturas urbanas, as regiões costeiras e a americana é “carbono intensiva”, ou seja, metade
saúde humana. Fenômenos climáticos locais/regio- da energia elétrica é produzida a partir de termoe-
nais extremos (secas mais fortes e prolongadas, on- léctricas que queimam principalmente carvão e,
das de calor mais intensas, inundações mais seve- secundariamente, petróleo; outra metade é produ-
ras, tormentas e furacões mais fortes) já ocorrem zida por usinas hidroelétricas, nucleares, termoe-
com mais freqüência desde meados da década de léctricas de gás natural e, de maneira reduzida,
1990. Os países, em geral, têm sofrido com essas por usinas eólicas; o automóvel individual (de ta-
alterações: aumento de mortalidade nos países de manho médio maior que no resto do mundo) é o
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meio generalizado de transporte de passageiros. venção, um papel importante ao argumentar que,


Diminuir as emissões de carbono teria custos sig- numa primeira fase, não seria apropriado o esta-
nificativos em curto prazo. Entre o medo de uma belecimento de compromissos por parte dos paí-
mudança climática incerta e num futuro distante e ses em desenvolvimento, e, durante a discussão,
a perspectiva imediata de queda no padrão de conseguiu o apoio do Japão e de vários países eu-
vida material, a maioria dos norte-americanos in- ropeus, o que isolou a posição norte-americana
clinou-se em favor da manutenção de seu padrão. em relação a esta questão. Na II Conferência das
Essa mudança teve reflexos imediatos no in- Partes (Genebra, 1996), a delegação norte-ameri-
terior do governo Bush. A partir de agosto de cana liderada pelo subsecretário de Estado para
1990, os conservadores triunfaram em relação aos Assuntos Globais, Tim Wirth (senador ambienta-
globalistas. Nos PREPCOMS que negociaram a lista de Colorado), afirmou novamente a urgência
convenção de mudança climática nos anos de de se negociar metas obrigatórias de redução de
1990-1992, a posição norte-americana foi cada emissões de efeito estufa, introduzindo, pela pri-
vez mais contrária ao estabelecimento de metas meira vez, a idéia de cotas comercializáveis de
de redução da emissão de gases de efeito estufa, emissão de carbono, que serviriam como um me-
com o argumento de que havia muitas incertezas canismo flexibilizador complementar na redução
a respeito do assunto e que, portanto, era neces- de emissões entre os países do Anexo Um
sário uma maior investigação científica; e cada (Grubb, 1999). Esta idéia baseava-se na experiên-
vez mais favorável à promoção de sumidouros de cia com as cotas comercializáveis de emissão de
carbono por meio da plantação maciça de flores- enxofre e material particulado entre as usinas elé-
tas. Apenas os países escandinavos, a Holanda e tricas por bacias aéreas (Milner, 1997), implemen-
a Alemanha tinham posições definidas em favor tada há quatro anos no país e que tinha se mos-
de estabelecer metas obrigatórias de redução trado muito mais efetiva do que os clássicos me-
(Rowlands, 1995; O’Riordan, 1996). O texto final canismos de comando e controle na redução de
da United Nations Framework Convention on Cli- emissões. A proposta de Wirth foi, em termos ge-
mate Change (UNFCCC) estabeleceu um compro- rais, rejeitada por três razões: primeiro, em virtu-
misso genérico para os países pertencentes ao de da falta de compreensão do modelo, já que ne-
Anexo Um: o ano base das emissões seria 1990 nhum outro país havia experimentado tal meca-
e, em 2000, as emissões desses países não deve- nismo; segundo, havia um princípio contra o uso
riam ser superiores as de 1990. Para os países de mecanismos de mercado para a proteção am-
não pertencentes ao anexo, a convenção estabe- biental; terceiro, porque a proposta norte-ameri-
leceu o compromisso de se elaborar inventários cana incluía compromissos por parte dos países
nacionais de emissões de carbono. emergentes de reduzir a taxa de crescimento das
Durante a campanha eleitoral de 1992, logo emissões. Finalmente, a COP II concordou em ini-
depois da Conferência realizada no Rio de Janei- ciar imediatamente as negociações para estabele-
ro, Clinton e Gore articularam uma posição clara- cer um Protocolo que tornaria obrigatória a redu-
mente globalista e prometeram, aproveitando o ção de emissões por parte dos países pertencen-
impulso favorável da opinião pública norte-ameri- tes ao Anexo Um, e que tentaria estudar formas
cana, uma ação firme e de liderança para enfren- de estabelecer mecanismos complementares.
tar o problema do aquecimento global. Na I Entre a segunda e terceira conferência das
Conferência das Partes da Convenção de Mudan- Partes (Genebra, junho de 1996, e Kyoto, dezem-
ça Climática (Berlim, março de 1995), o governo bro de 1997) houve uma série de negociações
Clinton assumiu uma posição de liderança no sen- para a formulação do Protocolo de Kyoto. A posi-
tido de estabelecer metas obrigatórias de redução ção norte-americana seguiu três linhas principais:
para os países desenvolvidos e metas de redução o estabelecimento de metas baixas (menos de 5%)
da taxa de crescimento futuro das emissões para de redução de emissões até 2010, tendo como ano
os países emergentes. O Brasil teve, nessa con- base 1990; o estabelecimento de metas de redu-
o
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ção da taxa de crescimento das emissões por par- • Proporção na população mundial (1999): China
te dos países emergentes; e o estabelecimento de 21%, Índia 16,5%, União Européia 6,3%, Esta-
mecanismos de mercado que flexibilizassem as dos Unidos 4,6%, Indonésia 3,5%, Brasil 2,8%,
metas, particularmente as cotas comercializáveis Rússia 2,4% e Japão 2,1%.
de emissão entre os países do Anexo Um. Quan-
• Proporção na parcela do PIB mundial (por po-
to à primeira meta, os Estados Unidos obtiveram
der de compra, em 1999): Estados Unidos
sucesso em relação aos europeus, que queriam
21,3%, União Européia 20,5%, China 10,2%, Ja-
compromissos de redução mais contundentes.
pão 8%, Índia 5,4%, Brasil 2,9%, Rússia 2,4%,
Quanto à segunda, foram derrotados, como já ha-
Canadá 2,3%, Indonésia 1,3%.
viam sido nas conferências de Berlim e Genebra.
Em relação à terceira, condicionaram a assinatura • PIB per capita (poder de compra em 1999): Ca-
do acordo ao compromisso de flexibilização, con- nadá 31.000 dólares, Estados Unidos 29.200 dó-
tando com forte apoio do Canadá, da Austrália, da lares, União Européia 24.000 dólares, Japão
Rússia e dos países do Leste Europeu, membros 23.600, Brasil 6.500, Rússia 6.200, China 3.100,
do Anexo Um (Cooper, 1998). Indonésia 2.400 e Índia 2.100.
Em julho de 1997, durante a negociação do • Parcela nas emissões mundiais de carbono
Protocolo de Kyoto, o Senado norte-americano,
(1999): Estados Unidos 24,5%, União Européia
com maioria republicana, posicionou-se contrário
14,5%, China 13,5%, Japão 6%, Rússia 5%, Índia
à ratificação do protocolo, a menos que os países
4,5%, Canadá 2,5%, Brasil 2,5% e Indonésia 1,5%.
emergentes assumissem compromissos de dimi-
nuir sua taxa de crescimento futuro de emissões • Parcela da área florestal mundial (1995): Rússia
(Agrawala e Steinar, 1999). Apesar disso, o gover- 22%, Brasil 16%, Estados Unidos 6%, Canadá
no Clinton assinou o protocolo, mas não o enviou 5%, China 4%, Indonésia 3%, União Européia
ao Senado para ratificação. Começou, entretanto, 2%, Índia 2%, Japão 0,7%.
a articular politicamente no sentido de obter os
• Taxa de desmatamento médio anual (1990-
compromissos de atenuação no crescimento das
emissões por parte de alguns países emergentes- 1998): Indonésia 1,1%, Brasil 0,5%, China 0,1%,
chave (Lippman, 2000; Jacoby e Primm, 1998). A Rússia 0,1%, Índia 0,05%, União Européia 0%,
diplomacia norte-americana foi bem-sucedida so- Japão 0%, Canadá 0%, Estados Unidos aumen-
mente em relação à Argentina e à Coréia do Sul. ta sua área com florestas 0,3% ao ano.
O regime de mudança climática exige sem-
pre a presença de pelo menos um ator que impul- Os Estados Unidos, como se pode observar,
sione o processo e que seja capaz de liderar e é o único país que está incrementando anualmen-
sustentar o regime. Pela sua importância na eco- te uma área florestada e, por isso, tem defendido
nomia e no ambiente global e pela eficiência de a inclusão dos sumidouros de carbono no cálculo
sua governabilidade, apenas três países apresen- total de emissões (Brown, Flavin e French, 2001).
tam este potencial em primeira instância (Estados Os conflitos de interesse entre os países de-
Unidos, União Européia e Japão). O Estado Euro- senvolvidos, emergentes e pobres é um dos fato-
peu supranacional, neste caso, tem uma capacida- res determinantes na dinâmica das negociações
de de atuação muito maior do que os Estados na- no processo de estabelecimento do regime de
cionais. Países como China, Índia, Rússia, Canadá, mudança climática (Young, 1997; Claussen e
Indonésia e Brasil têm se revelado muito impor- McNeilly, 1998; Mueller, 1999). Nas democracias
tantes em todo o processo de decisão, apesar de existe uma forte disputa interna de interesses e de
não constituírem um potencial de liderança valores, o que faz com que a posição de um país
(Grubb, 1999). Enfim, a participação desses nove num momento específico da negociação resulte
países é condição básica para o funcionamento do de uma coalizão que oscila de acordo coma de-
regime de controle de emissões. Os dados, a se- finição da política do país no cenário internacio-
guir, são indicadores econômicos desses países: nal. As alianças e os blocos que se formaram desde
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a Conferência no Rio de Janeiro, em 1992, resulta- • Países desenvolvidos com média intensidade
ram de disputas acirradas entre os países, de cliva- de carbono, que têm dificuldades em reduzir
gens e de alinhamentos nacionais, internacionais e sua emissão, seja porque já haviam reduzido
transnacionais (Viola, 1998). O regime de mudança bastante suas taxas antes de 1990 (Japão, Nova
climática foi liderado pelos Estados Unidos e pela Zelândia, Noruega), seja porque possuam uma
União Européia entre 1989 e 1991; pela União Eu- opinião pública com baixa responsabilidade
ropéia entre 1991 e 1995; pelos Estados Unidos, global (Suíça, Islândia). O Japão assumiu o
União Européia e Japão entre 1995 e 1997; e, des- compromisso de reduzir as emissões em 6% até
de 1998, apenas pela União Européia. Os principais 2010, mas, em 1999, apresentou uma taxa 4%
blocos formados (desde 1992) são (Clark, Van Eijn- mais altas.
doven e Jaeger, 1998; Soroos, 1997; Vogler e Imbler,
• Países pertencentes à ex-União Soviética que
1996; Wasson, 1997; Schelling, 1997):
sofreram uma drástica redução nas emissões de
carbono (entre 40% e 60% mais baixas, em
• Países desenvolvidos com alta intensidade de
1999, comparadas com 1990) pelo colapso da
carbono por unidade de PIB e per capita (Esta-
economia (Rússia, Ucrânia, Bielo-rússia, Bulgá-
dos Unidos, Canadá e Austrália). Nesses países,
ria, Romênia) e, em conseqüência, têm créditos
ocorre uma divisão de forças clara entre, de um
no conjunto de compromissos assumidos. Nes-
lado, neoliberais e nacionalistas – contrários ao
sas sociedades, predominam os nacionalistas
regime de mudança climática –, e, de outro, neo-
ou neoliberais com posições favoráveis ao regi-
socialdemocratas e verdes – respectivamente, fa-
me de mudança climática desde que seus res-
voráveis de maneira moderada ao regime e for-
pectivos países sejam favorecidos a médio pra-
temente favoráveis ao regime (Inglehart 1997).
zo (até 2010/2020, aproximadamente) por meio
Os Estados Unidos encontram-se numa posição
do mecanismo de comércio de cotas, mas não
delicada, pois sua taxa de emissão de carbono
apóiam políticas públicas nacionais que preten-
em 1999 foi 14% superior à de 1990 (ano base
dam diminuir a intensidade de carbono de suas
para todos os países), e o compromisso assumi-
economias, muito alta por unidade de PIB. Já
do em Kyoto é diminuir 7% até 2010. No Cana-
os neosocialdemocratas, presença minoritária
dá há uma defasagem similar.
com relativa força na Rússia, na Ucrânia e na
• Países desenvolvidos com média intensidade de Romênia, são favoráveis a políticas orientadas a
carbono por unidade de PIB e per capita, orien- diminuir moderadamente a intensidade em car-
tados a assumir responsabilidades globais (Ale- bono da economia.
manha, Reino Unido, Holanda, Suécia, Dinamar-
• Países exportadores de petróleo (Arábia Saudi-
ca, Finlândia, França, Bélgica, Luxemburgo,
ta, Kuwait, Irã, Iraque, Emirados Árabes, Argé-
Áustria e Itália). Nesses países predominam os
lia, Líbia, Venezuela, Indonésia e Nigéria), com
neosocialdemocratas, fortemente favoráveis ao
alta intensidade de carbono por unidade de PIB
regime de mudança climática (Guidens 1998).
e alguns também per capita. Nesses países pre-
Também os verdes constituem uma minoria for-
dominam os neoliberais, os nacionalistas, ou as
te, que pressiona no sentido de fortalecer o regi-
coalizões entre estas facções, com posições
me. O restante da União Européia (Espanha,
neutras ou contrárias ao regime de mudança
Portugal, Grécia e Irlanda), embora tenha popu-
climática. Em algumas sociedades, como na Ve-
lações menos dispostas à redução de emissão,
nezuela, constitui uma força política importan-
apóia a posição dos primeiros devido às com-
te a presença minoritária dos neosocialdemo-
pensações recebidas dentro da União. Reino Uni-
cratas, que apóiam moderadamente o regime.
do, Alemanha, Dinamarca e Suécia são os únicos
países do Anexo Um que tinham, em 1999, emis- • Países emergentes com média intensidade de
sões compatíveis a atingir os compromissos esta- carbono por unidade de PIB derivada da matriz
belecidos para 2010. energética predominantemente de carvão e/ou
o
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petróleo (China, Índia, África do Sul e México) os setores da sociedade são favoráveis ao adensa-
ou do excessivo desmatamento (Brasil, Tailân- mento do regime tanto porque implica ganhos
dia, Malásia e Filipinas). Esses países, como um consideráveis advindos do Mecanismo do Desen-
todo, apóiam os compromissos firmados no volvimento Limpo quanto porque dificilmente te-
Protocolo de Kyoto em função dos benefícios riam compromissos de redução antes de 2050.
imediatos advindos da implementação do Meca-
• Pequenos Estados-ilhas (Fiji, Jamaica, Malta
nismo de Desenvolvimento Limpo. No entanto,
etc.), muito vulneráveis à mudança climática e
há diferenças de opinião entre os países-chave
onde o conjunto da sociedade é fortemente fa-
deste grupo. Na China e na Índia predominam
vorável ao adensamento do regime.
as coalizões entre nacionalistas e neoliberais,
contrários a assumir os compromissos de limita-
Durante as conferências das Partes posterio-
ção das emissões de carbono até aproximada-
res a Kyoto (Buenos Aires, 1998; Bonn, 1999 e
mente 2030. Eles são favoráveis ao regime so-
Haia, 2000), houve quatro coalizões principais de
mente em virtude da perspectiva de ganho com
negociação: União Européia, Grupo Guarda-chu-
a implementação do Mecanismo de Desenvolvi-
va (formado pelos países dos grupos 1, 3 e 4),
mento Limpo. Contudo, na Índia, por exemplo,
G77/China, formado pelos países dos grupos 5, 6,
existem fortes minorias verdes, favoráveis ao
7 e 8 (em algumas questões, dois subgrupos di-
adensamento do regime de mudança climática.
vergiram do G77/China – países exportadores de
No Brasil e no México predominam coalizões
petróleo e países mais pobres), e, por fim, Alian-
entre neosocialdemocratas e neoliberais (com
ça das Pequenas Ilhas (Viola, 2001).
apoio de setores nacionalistas), moderadamen-
A seguir, apresentarei um quadro da conjun-
te favoráveis ao regime. No Brasil, em particu- tura de forças estabelecida entre os grupos duran-
lar, há uma importante minoria verde favorável te as conferências de Bonn e Haia.
a uma diminuição drástica do desmatamento na O Grupo Guarda-chuva deu grande apoio
Amazônia (responsável por, aproximadamente, aos mecanismos flexibilizadores (Comércio de Co-
1,8% das emissões globais de carbono, ao pas- tas de Emissão e Implementação Conjunta entre
so que o restante da economia brasileira produz os países do Anexo Um, e Mecanismo de Desen-
apenas 0,7% das emissões globais), a assumir volvimento Limpo entre todos os países), contra a
compromissos voluntários de redução da taxa posição da União Européia. No geral, a posição
de crescimento futuro das emissões e a adensar dos países foi bastante variada e, muitas vezes,
o regime de mudança climática. oportunistas. O Brasil apoiou o Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (inclusive porque este
• Países emergentes com baixa intensidade de
mecanismo teve como base uma proposta origi-
carbono (Argentina, Chile, Uruguai, Costa Rica,
nalmente brasileira de junho de 1997), alinhando-
Coréia do Sul e Hungria). Igualmente ao grupo se ao Grupo Guarda-chuva, mas tendeu a limitar
anterior, existe um apoio genérico ao Protoco- a ação do Comercio de Emissões e da Implemen-
lo de Kyoto, em função do MDL. Nesses países, tação Conjunta, aproximando-se, então, da posi-
predominam coalizões entre neoliberais e neo- ção da União Européia.
socialdemocratas, moderadamente favoráveis O Grupo Guarda-chuva apoiou de maneira
ao regime. Além disso, os neosocialdemocratas incisiva a contabilidade de sumidouros de carbo-
são favoráveis a compromissos de redução por no (florestas, manejo do solo etc.) como dedução
parte dos países emergentes. Em muitos desses dos compromissos de redução de emissões, con-
países há uma presença minoritária dos verdes tra a União Européia. Os demais países dividiram-
muito ativa que defende o adensamento do re- se entre os dois grupos, além daqueles que per-
gime de mudança climática. maneceram em uma posição neutra. O Brasil
apoiou a União Européia, mas a maioria dos paí-
• Países pobres (África subsahariana, Bangladesh, ses latino-americanos se alinhou com o Grupo
Bolívia, Honduras, Guatemala etc.), onde todos Guarda-chuva.
O REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL 33

Os países do Grupo Um, apoiados em graus Neste fórum, o establishment da globalização ape-
variáveis pelos países dos Grupos 2 e 3, propuse- lou Bush para que, diante da nova certeza cientí-
ram a necessidade de os países emergentes assu- fica sobre a mudança climática, assumisse uma
mirem compromissos voluntários de redução da posição de liderança na negociação final de ratifi-
taxa de crescimento futuro das emissões, contra cação do Protocolo de Kyoto. No core do gover-
os países dos Grupos 5, 6 e 7 (exceto Argentina e no Bush, o secretário do Tesouro, O’Neill, e o se-
Coréia do Sul). cretário de Estado, Powel, assumiram uma posi-
O G77/China e a Aliança de Pequenas Ilhas ção favorável, porém moderada, enquanto o vice-
propuseram um amplo pacote de transferência livre presidente, Cheney, a assessora de Segurança Na-
de tecnologias limpas dos países desenvolvidos cional, Rice, e o secretário de Energia, Abraham,
para os em desenvolvimento, contra os países dos foram definitivamente contrários à ratificação do
grupos 1, 2 e 3, que mantiveram uma posição mais protocolo.
branda, propondo um pacote mais reduzido. O Bra- Em março de 2001, o governo Bush anun-
sil exerceu, nesta questão, um papel de liderança. ciou oficialmente que se retirava das negociações
Os países exportadores de petróleo, liderados do Protocolo de Kyoto por considerá-lo inapro-
pela Arábia Saudita, defenderam a possibilidade de priado para lidar com a mudança climática por
serem compensados pelas eventuais quedas nas re- duas razões: a falta de relevância depositada aos
ceitas de exportação, contra o resto do mundo. mecanismos de mercado e o não estabelecimento
A União Européia propôs um amplo regime de compromissos para os países de renda média
de sanção para aqueles que não cumprissem seus com rápido crescimento de emissões. A saída dos
compromissos, contra o Grupo Guarda-chuva, Estados Unidos causou furor na comunidade in-
que apresentou um regime menos radical (Weiss ternacional, mas, depois de algumas semanas de
Brown e Jacobson, 1998). O Brasil, neste caso, desorientação, a União Européia decidiu levar adi-
apoiou a União Européia. ante as negociações para completar e ratificar o
No final da Conferência de Haia houve cer- Protocolo.
to consenso nas propostas relativas a compromis- Em julho de 2001, em Bonn, todos os países,
sos voluntários, ao regime de sanções e à transfe- com exceção dos Estados Unidos, chegaram a um
rência de tecnologia que seriam discutidas na VII acordo sobre a maioria dos pontos que estavam
Conferência das Partes, em novembro de 2001. Os pendentes desde a Conferência de Haia, em 2000.
países exportadores de petróleo renderam-se ao Para obter o apoio dos outros países do grupo
resto do mundo na questão das compensações de Guarda-chuva a União Européia teve de ceder em
receitas de exportação, e chegou-se a um acordo vários pontos: reconhecer os créditos por seqües-
próximo da posição do Grupo Guarda-chuva com tro de carbono através do manejo das florestas e
relação ao papel dos mecanismos flexibilizadores. do solo; não colocar restrições ao uso dos meca-
O ponto que precipitou o fracasso das negocia- nismos flexibilizadores; e aceitar um regime redu-
ções foi o teto para a contabilidade dos sumidou- zido de sanções. Nessas três esferas, o acordo ob-
ros de carbono como deduções das emissões dos tido ficou muito aquém daquele proposto pelo
países do Anexo Um. Não houve acordo sobre a governo Clinton em Haia (2000) e que tinha sido
magnitude do teto: a União Européia, ao contrá- rejeitado pela União Européia. Em outra frente,
rio do grupo Guarda-chuva, só aceitaria os sumi- para conseguir o apoio ativo de países não per-
douros com teto bastante reduzido. tencentes ao Anexo Um, a União Européia mobi-
Em janeiro de 2001, foi aprovado em Shan- lizou o Canadá, a Noruega, a Suíça, a Nova Zelân-
gai o terceiro relatório oficial do IPCC, que alerta- dia e a Islândia no sentido de prometer financia-
va contra os riscos da mudança climática e para a mentos adicionais (em torno de meio bilhão de
necessidade de agir rapidamente. Esse relatório dólares por ano) para o desenvolvimento de ca-
causou grande impacto sobre o Fórum Econômi- pacidades institucionais e de transferência de tec-
co que ocorreu em Davos uma semana depois. nologias limpas, a partir de 2005.
o
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Depois da saída dos Estados Unidos, a posi- damentais da crise e do conseqüente declínio bra-
ção negociadora da União Européia baseou-se no sileiro na década de 1980, além de variáveis de
princípio de que um acordo mínimo seria melhor natureza estritamente política, vinculadas ao
do que o encerramento do Protocolo de Kyoto. A caráter da transição democrática e à falta de re-
arrogância de Bush transformou o Protocolo nu- novação das elites políticas. Apesar de seu ex-
ma espécie carro-chefe da política exterior da traordinário custo social, a crise do modelo de
União Européia – passou a ser operado pelos che- desenvolvimento da década de 1980 teve um as-
fes de governo e pelos ministros das relações ex- pecto benéfico, qual seja, a tomada de consciên-
teriores, em vez de ficar restrito aos ministérios do cia da opinião pública dos problemas relaciona-
meio ambiente. E, no geral, os países passaram a dos à devastação ambiental. Esta extraordinária
considerar a aprovação de Kyoto um emblema em mudança manifestou-se na posição do governo
favor de uma ordem mundial baseada na negocia- brasileiro em 1992, muito diversa da posição assu-
ção multilateral, em desacordo com a política uni- mida em Estocolmo, vinte anos antes, e bastante
lateralista do governo Bush. sensível aos problemas ambientais.
Quando Collor nomeou Lutzenberger como
secretário de meio ambiente, em março de 1990,
Políticas públicas e sua relação com as estava sinalizando uma nova responsabilidade
emissões de carbono no Brasil e a parti- ambiental que o governo brasileiro pretendia as-
cipação do país nas negociações do regi- sumir. A súbita conversão ambientalista de Collor
me de mudança climática explica-se pela necessidade de ganhar a confian-
ça da opinião pública dos países desenvolvidos
A posição brasileira no sistema internacional para seu programa econômico neoliberal, que ne-
sofreu mudanças consideráveis entre 1972 e 1990. cessitava novos investimentos estrangeiros. Além
Na Conferência de Estocolmo (1972), o Brasil li- disso, Collor também percebeu que a escolha do
derou juntamente com a China a aliança dos paí- Brasil para sediar a UNCED-92 por parte da As-
ses periféricos contrários a reconhecer a impor- sembléia Geral da ONU, efetuada poucos dias an-
tância em se discutir os problemas ambientais. O tes de sua eleição, lhe dava oportunidade para
modelo de desenvolvimento, que atingira o ápice projetar a si próprio e a seu governo no cenário
em 1972, baseava-se em uma forte depleção dos internacional (Viola, 1997).
recursos naturais – considerados, na época, infini- No primeiro ano de governo, Collor e Lut-
tos –, em sistemas industriais muito poluentes e zenberger tomaram algumas decisões importantes
na intensa exploração de mão-de-obra barata e que lhes deram credibilidade na esfera do am-
desqualificada. Entre 1950 e 1979, o Brasil era vis- bientalismo internacional, quais sejam, prorroga-
to pelo sistema mundial como um país que ascen- ção da suspensão de subsídios e incentivos fiscais
dia ao centro. Durante a década de 1970, foi um para agropecuária na Amazônia, suspensão do
dos principais receptores de indústrias poluentes programa de ferro-gusa da Amazônia oriental,
advindas dos países desenvolvidos, devido ao maior monitoramento e fiscalização do desmata-
“avanço” da consciência ambiental. Com o novo mento com queda de 50% nas queimadas em
paradigma tecnológico (informação intensiva) que agosto/outubro de 1990 (comparadas com o pico
se foi implantando no mundo a partir de início da de 1988), elaboração do macrozoneamento ecoló-
década de 1980, o Brasil passou a ter característi- gico-econômico, fim do programa nuclear parale-
cas pouco vantajosas para a perspectiva interna- lo dos militares e adesão do Brasil à política
cional de mercado: os recursos naturais clássicos ocidental de não-proliferação nuclear. Em conse-
perderam valor relativo, a tolerância para a polui- qüência, Collor tornou-se um presidente confiável
ção tornou-se um estigma e a força de trabalho para o establishment ocidental.
desqualificada era incapaz de operar os novos sis- As reuniões de presidentes em torno do Pac-
temas produtivos. Estas são algumas causas fun- to Amazônico e do Mercosul no início de 1992,
O REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL 35

promovidas pelo Brasil, enfatizaram a necessida- fato de a matriz energética brasileira estar funda-
de de uma reforma da ordem mundial na direção da em recursos naturais renováveis (basicamente
do desenvolvimento sustentável e do reconheci- hidroelétrica e biomassa) num contexto em que a
mento de que também os países emergentes de- quase totalidade dos países é dependente de
veriam fazer um esforço significativo para lidar combustíveis fósseis ou de energia nuclear; 4) a
com os problemas ambientais globais. consciência da importância da floresta Amazôni-
A posição do governo brasileiro no processo ca – grande reservatório mundial de biodiversida-
preparatório e na realização da Rio-92 baseou-se de e de apreensão de carbono – que tornava,
em dois princípios. Em primeiro lugar, de que os conseqüentemente, a política favorável ao des-
problemas ambientais globais eram relevantes e matamento (predominante até 1988) um consen-
deveriam ser tratados de maneira prioritária pela so favorável a uma combinação de preservação
comunidade internacional; em segundo, de que a com desenvolvimento sustentável; 5) pressão
responsabilidade se diferenciava tanto pela causa pelo compromisso com o globalismo, já que o
quanto pela solução dos problemas ambientais Brasil era o país-sede da UNCED-92.
globais, o que aumentava o custo dos países ricos. O governo Cardoso sedimentou a mudança
Contudo, a operacionalização da posição brasilei- na política externa iniciada por Collor. Houve um
ra nos PREPCOMS (até março de 1992) foi afeta- reforço dos laços econômicos com os Estados
da pelas divergências entre o Itamaraty e Lutzen- Unidos, a União Européia e o Japão e abandona-
berger, que mantinha uma posição mais radical. ram-se as tentativas prévias de estabelecer rela-
Um pouco antes e durante a conferência ções privilegiadas com a China, a Rússia e a Índia.
(maio/junho de 1992), o governo brasileiro pas- O Brasil aliou-se com os Estados Unidos e a Eu-
sou a implementar uma política exterior mais ropa na maioria dos foros multilaterais: proteção
responsável quanto aos problemas ambientais dos direitos humanos, dos direitos da mulher e
globais, mudança iniciada em 1989: assumiu um dos direitos reprodutivos; proteção do direito de
papel de co-liderança durante a redação dos re- propriedade intelectual; expansão do papel do
sultados da Convenção de Biodiversidade, facilitou Fundo Monetário Internacional, do Banco Mun-
o acordo na convenção de mudança climática e dial e da Organização Mundial de Comércio; es-
teve posições consistentes e favoráveis a compro- forços internacionais para combater o terrorismo e
missos em favor do desenvolvimento sustentável o crime globalizado. Fernando Henrique Cardoso
na Agenda 21 (Guimarães, 1994; Lafer e Fonseca, assinou, com muitos anos de atraso, os tratados
1994). Entretanto, a posição brasileira ficou aprisio- de não proliferação nuclear e de controle de tec-
nada pelo velho nacionalismo ao apoiar a Malásia nologia de mísseis. De uma maneira geral, seu go-
na oposição a uma convenção sobre florestas. verno tem um perfil neosocialdemocrata no que
Na UNCED, o Brasil assumiu uma posição diz respeito à inserção internacional do país, mas,
que pode ser considerada globalista ou neosocial- em aspectos secundários, o Itamaraty mantém
democrata, mesmo que inserida numa estrutura abordagens nacionalistas, como a continuidade de
estatal em que ainda predomina o nacionalismo. filiação ao Bloco G77 (com o intuito de ter apoio
A posição neosocialdemocrata foi influenciada para o país se tornar um novo membro perma-
por cinco fatores: 1) crise do modelo desenvolvi- nente do Conselho de Segurança da ONU), a ten-
mentista brasileiro na década de 1980 que produ- tativa de atrasar a formação da Associação de Li-
ziu uma significativa abertura da opinião pública vre Comércio Americana (ALCA), a crítica à Ar-
para com a idéia de desenvolvimento sustentável, gentina, devido à nova aliança militar deste país
mesmo que de forma difusa; 2) sensibilização do com os Estados Unidos e a oposição à interven-
governo em relação aos problemas ambientais, já ção da OTAN em Kosovo.
que o país detinha a soberania de 2/3 da maior A política energética deste governo seguiu
floresta pluvial do mundo e havia, portanto, a ne- os seguintes eixos: privatização da geração e da
cessidade de considerar o impacto ambiental; 3) o distribuição de eletricidade; manutenção da pro-
o
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priedade estatal da transmissão de eletricidade; crescimento econômico que se desenvolvia des-


novo modelo regulatório favorável a incrementar de o final de 1999.
a geração termoeléctrica, baseada em gás natural, Em 2001, o Brasil gerou mais de 90% de sua
e a co-geração; quebra do monopólio da Petro- eletricidade a partir de fontes hídricas e continua
brás na produção de petróleo e abertura de novos ocupando um lugar de destaque na hidroeletricida-
campos petrolíferos pelo setor privado. A privati- de mundial (apenas atrás da Noruega e da Áustria).
zação da distribuição de energia elétrica realizou- A expansão do consumo de petróleo e derivados
se segundo o que fora programado, mas a priva- durante a década de 1990 foi significativa devido à
tização da geração sofreu atrasos e resistências expansão do parque de automóveis e a diminuição
por parte de sindicatos e políticos nacionalistas. drástica da produção de carros movidos a etanol.
Os preços da energia elétrica continuaram relati- O plano de expansão de ferrovias e hidrovias para
vamente baixos (fator importante para reduzir a o período de 2000-2010 fará com que o aumento
inflação anual em um ou dois pontos percentuais, do consumo de derivados do petróleo no setor de
entre 1995 e 2000), o que desestimulou o investi- cargas nos próximos anos venha a ser inferior ao
mento em geração. A construção de novas da década de 1990. Por outro lado, a grande ex-
termoeléctricas a gás natural atrasou devido à pa- pansão das termoeléctricas na geração de eletrici-
ralisia decisória relativa ao modelo regulatório dade deverá aumentar as emissões de carbono de-
(risco cambial do gás natural importado). Como rivadas do setor energético.
conseqüência dos preços relativamente baixos da A política externa do governo Cardoso no
energia, da limitada privatização das geradoras e que se referente a questões ambientais tem tido
do atraso na definição do risco cambial do gás, os posições bastante diferenciadas nos foros interna-
investimentos em geração de eletricidade num cionais. Na Comissão de Desenvolvimento Susten-
contexto de expansão significativa da demanda tável da ONU, o Brasil sugeriu propostas neoso-
foram bastante limitados. A não privatização de cialdemocratas e, em contrapartida, no debate so-
grandes geradoras, como Furnas e CHSF, dissua- bre o estabelecimento de padrões mínimos de
diu novos investimentos de porte por parte de proteção ambiental no comércio internacional,
corporações transnacionais, pois a promiscuida- assumiu posições nitidamente neoliberais. No
de potencial entre o Estado e as empresas esta- Mercosul, o país não conseguiu se tornar uma li-
tais criaria uma desvantagem competitiva. Na re- derança capaz de introduzir de modo mais con-
gião Sul, onde a geradora Eletrosul foi comprada tundente a sustentabilidade ambiental na agenda
por uma empresa belga, houve novos investi- da integração. O Protocolo Ambiental do Merco-
mentos privados importantes em geração. O es- sul, negociado em 1996/1999, constituiu-se um
trangulamento da oferta, os níveis de precipita- avanço importante, embora sua assinatura tenha
ção inferiores aos normais nos últimos cinco sido bloqueada no último momento por certa am-
anos e os erros na condução do sistema, que re- bivalência dos setores mais conservadores do em-
duziram perigosamente o nível dos reservatórios, presariado argentino.
provocaram uma crise no abastecimento de ener- O núcleo do governo tem concebido a Ama-
gia elétrica a partir de maio de 2001. O raciona- zônia como uma área destinada basicamente a ser
mento implementado entre junho de 2001 e fe- ocupada por atividades econômicas de modo não
vereiro de 2002 (redução de 20% do consumo) seletivo, desde que não se promovam desmata-
causou duplo impacto: de um lado, havia tanto mentos excessivos que coloque em risco a estabili-
espaço para aumentar a eficiência energética do dade do clima regional e de que haja o mínimo de
conjunto da economia, quanto uma boa disposi- responsabilidade nesta ocupação, como exige a co-
ção da população para colaborar com o raciona- munidade internacional. A correlação de forças
mento; de outro, alguns setores econômicos tive- políticas a respeito da Amazônia se dá por uma
ram de reduzir parcialmente seu nível de ativida- coalizão entre neoliberais e nacionalistas. O cresci-
de, provocando uma brusca parada na curva de mento da demanda por madeira, a existência de
O REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL 37

vastos contingentes populacionais em condições fronteira agrícola e à atividade madeireira inefi-


de pobreza, e, em razão disso, uma tendência ao ciente e predatória, o que indica uma responsabi-
comportamento predatório, a extrema falta de ha- lidade por emissões de carbono per capita e por
bilidade na condução das políticas de instituições unidade de PIB muito superiores à média mun-
como o Ibama e agências ambientais estaduais e, dial. Estas atividades econômicas representam
por fim, a visão de desenvolvimento encerrada menos de 10% do PIB brasileiro.
numa perspectiva de curto prazo por parte das eli- O Estado tem sido irresponsável em relação
tes locais têm sido as causas fundamentais do des- ao controle do crime organizado na Amazônia, e
matamento na Amazônia. Em 1988, a superfície isto se constitui, neste início de século, o principal
desmatada foi de aproximadamente 28.000 Km2, problema para a consistência e a eficiência das po-
equivalente a 0,82% da área total da Amazônia. No líticas públicas na Amazônia. A postura do governo
período de 1989 a 1994, houve uma queda subs- federal favoreceu certa conivência com o narcotrá-
tancial, correspondente a uma média de aproxima- fico nos governos estaduais e municipais da Ama-
damente 0,40% ao ano. Em 1995, o desmatamento zônia, com exceção do Acre (1999-2002), que im-
teve um novo pico, com 27.000Km2 (0,77% da área plementou uma política no sentido contrário (Viola,
total), devido, em grande medida, ao crescimento 1999). A intensificação da guerra civil na Colômbia
econômico relativo à primeira fase do plano Real. a partir de 1997 é um dos fatores que mais promo-
Em 1996 e 1997, verifica-se uma nova queda, com veram o crescimento do narcotráfico na região ama-
uma média anual de 0,40%. A partir de 1998, ocor- zônica. Esta situação agravou-se com a utilização
reu um novo crescimento – 0,47%, em 1998, 0,48%, em grande escala de desfoliantes biológicos contra
em 1999 e 0,62%, em 2000. Assim, observa-se que as plantações de coca, a partir de 2001, por parte do
há uma relação imediata entre o crescimento da Estado colombiano com o apoio dos Estados Uni-
economia nacional e o crescimento do desmata- dos. O uso prolongado desse produto poderá ter
mento na Amazônia. conseqüências mais graves, afetando a integridade
Quanto às emissões de carbono, o país que ecológica de uma parte da floresta. O aumento ex-
se pretende globalizado e moderno tem sido re- ponencial do consumo de drogas ilegais no país
fém daquilo que, em contraposição, podemos também estimula o narcotráfico na Amazônia e em
chamar de tradicional e marginalizado. Em 2000, outras regiões do país, o que confere ao Brasil um
a população brasileira era aproximadamente 2,8% lugar de destaque no ciclo global da cocaína (plan-
da população mundial, com uma economia apro- tação de coca, refino, distribuição local/mundial e
ximadamente 2,9% da economia mundial (PIB consumo). Apenas o plantio da coca ainda está au-
calculado por poder de compra), e as emissões sente do território brasileiro.
de carbono alcançava a taxa em torno de 2,5% A contraposição, já aludida, entre dois brasis,
das emissões mundiais (25% advindo da indústria um globalizado e moderno e outro tradicional e
e da agricultura moderna e 75% da agricultura marginalizado é um dos grandes paradoxos de
tradicional, da conversão de uso na fronteira agrí- nossa época. Tal paradoxo pode ser explicado, do
cola e das atividades madeireiras ineficientes e ponto de vista econômico e ecológico, pelo fato
predatórias). Cerca de 80% da população está de a economia brasileira ter sido, durante mais de
vinculada a atividades produtivas que não depen- quatro séculos, pautada pelo desmatamento, e,
dem de altas emissões de carbono e, conseqüen- agora, passar a reprimir queimadas significa não
temente, o Brasil possui uma taxa de emissão per só romper com uma tradição, mas também gol-
capita e por unidade de PIB bem inferior à mé- pear interesses econômico-sociais, mesmo que de
dia mundial. Isto é, sobretudo, decorrência do pouca importância no presente. O custo econômi-
alto peso da hidroeletricidade na matriz energéti- co da redução da agricultura de queimada, da
ca. Ademais, aproximadamente 20% da popula- conversão irracional de uso na fronteira agrícola e
ção está ligada direta ou indiretamente à agricul- das atividades madeireiras ineficientes seria relati-
tura tradicional, à conversão de uso da terra na vamente pequeno. Para isso seria necessário:
o
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1. Políticas sociais que melhorem o nível educa- nados ao processo negociador. Até 1999, a presi-
cional e acelerem a distribuição de terras e de dência da República não considerou a negociação
tecnologia complementar entre a população do Protocolo uma questão importante sobre a
que hoje depende da agricultura tradicional e qual deveria interferir. A definição do posiciona-
da conversão do uso da terra. mento brasileiro ficou muito restrita entre 1996 e
1999, quase sem a participação de governos esta-
2. Políticas de controle sobre as atividades madei-
duais, empresários ou ONGs. A partir de 2000, a
reiras ineficientes e predatórias acompanhadas
arena de definição ampliou-se com a inclusão, em
de estímulo para convertê-las em atividades efi-
posição secundária, do Ministério do Meio Am-
cientes e relativamente sustentáveis.
biente, do Conselho Empresarial Brasileiro para o
3. Atuação coordenada do Poder Judiciário, do Desenvolvimento Sustentável, de alguns governos
Ministério Público, da Polícia Federal e das For- estaduais da Amazônia e de várias ONGs. Em ju-
ças Armadas para fortalecer o Estado de Direi- nho de 2000, por iniciativa da presidência da Re-
to na Amazônia. pública e do ex-deputado federal Fabio Feld-
mann, foi criado o Fórum Brasileiro de Mudanças
A atuação do Brasil durante a negociação do Climáticas, de caráter multissetorial, que reuniu
Protocolo de Kyoto (1996-2001) orientou-se pela diversos atores governamentais, empresariais, não
definição do interesse nacional segundo quatro governamentais e acadêmicos. Este fórum consti-
dimensões principais: 1) afirmar o direito ao de- tuir-se-á uma inovação tanto em termos de criar
senvolvimento como um componente fundamen- uma arena propícia para a formação do posicio-
tal da ordem mundial, dando continuidade à polí- namento nacional quanto de internalizar o regime
tica externa brasileira; 2) promover uma visão do de clima dentro do país. A partir de outubro de
desenvolvimento associada com a sustentabilida- 2000, o Ministério do Meio Ambiente e governos
de ambiental, em correspondência com o grande de alguns Estados amazônicos questionaram a tra-
crescimento da consciência ambiental no país e dição brasileira de ter um posição contrária à in-
sua tradução em políticas públicas nacionais e es- clusão do ciclo do carbono no Protocolo (sumi-
taduais; 3) promover uma posição de liderança do douros por meio de florestas e do manejo do
Brasil no mundo, em correspondência com o cres- solo). Muitas ONGs, particularmente aquelas que
cimento do prestígio internacional do país duran- têm grande atuação na Amazônia, pressionaram o
te o governo Cardoso; e 4) evitar que o uso das governo para apoiar a inclusão de projetos rela-
florestas seja objeto de regulação internacional cionados à proteção de florestas primárias no Me-
para não correr riscos de que outros países pos- canismo de Desenvolvimento Limpo. Contudo, a
sam questionar o uso econômico da Amazônia. É posição do Ministério de Ciência e Tecnologia e
importante salientar que a entrada das florestas no do Itamaraty continuou predominando.
regime mundial de clima não foi percebida como No Grupo G77/China, o Brasil sempre teve
uma ameaça à soberania nacional por outros paí- uma posição de liderança, e tornou-se uma ponte
ses: Estados Unidos, Canadá, Rússia, Austrália e para o diálogo entre países desenvolvidos e aque-
Costa Rica, entre outros, promoveram com inten- les que mais se confrontavam com estes, como Ín-
sidade a regulação internacional das florestas. As dia, China, Indonésia e Malásia. A comissão brasi-
características específicas do posicionamento bra- leira manteve a opinião de que toda a responsa-
sileiro nas diversas questões do Protocolo de Kyo- bilidade pela redução das emissões era dos países
to são assinaladas a seguir. desenvolvidos e, portanto, opôs-se deliberada-
A delegação brasileira esteve sempre sob o mente aos compromissos de redução da taxa de
comando do Ministério da Ciência e Tecnologia (o crescimento futuro das emissões por parte dos
presidente da Agência Espacial Brasileira, Meira países emergentes. Isto lhe causou vários momen-
Filho, teve um papel fundamental) nos aspectos tos de confronto, particularmente com os Estados
substantivos e do Itamaraty nos aspectos relacio- Unidos, em várias ocasiões, e com a Argentina,
O REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL 39

em 1998/1999. O princípio que norteia as propos- O acordo em torno do MDL foi um momen-
tas do país é de que as emissões de carbono de- to notável de colaboração entre a diplomacia nor-
veriam ser calculadas diacronicamente, ou seja, a te-americana e a brasileira, pois a negociação
partir acumulação de emissão ocorrida desde o fi- implicou uma vitória para todos os países. O com-
nal do século XVIII e não apenas a partir do ano ponente mais flexível e criativo da posição brasi-
base de 1990. Embora esta posição tenha contado leira em todas as negociações do Protocolo reve-
com forte apoio da maioria dos países não perten- lou-se na sua capacidade de articulação política,
centes ao Anexo Um, não é levada a sério pelos sobretudo com a diplomacia norte-americana, em
governos dos países pertencentes ao Anexo Um e, outubro de 1997, quando da elaboração deste me-
assim, não tem tido, no processo negociador, o canismo inovador. Entre 1999 e 2001, o país lide-
impacto esperado, pelo menos até o final de 2001. rou uma proposta vitoriosa para que o MDL fosse
A proposta brasileira é consistente em termos téc- o primeiro dos três mecanismos flexibilizadores a
nicos, legítima do ponto de vista histórico e eqüi- ser implementado e para que, no seu conselho di-
tativa no sentido de apresentar uma abordagem retor, os países emergentes e pobres tivessem uma
teórica baseada em direitos universais da popula- representação mais forte do que a obtida no Glo-
ção mundial ao uso da atmosfera como um bem bal Environment Facility.
público global, mas pode ser considerada, atual- Com relação aos sumidouros de carbono, o
mente, utópica por estar distante da realidade efe- interesse nacional foi o de assumir uma posição
tiva do poder mundial. Apesar disso, é bem pro- defensiva: a floresta amazônica tornou-se mais um
vável que esta proposta acabe contribuindo para ônus por causa do desmatamento do que um
melhorar a capacidade argumentativa dos países trunfo em virtude do serviço global de seqüestro
emergentes na negociação geral sobre a questão de carbono. O que estava implícito nas declara-
dos seus compromissos de redução. ções dos negociadores brasileiros era que o país
Em junho de 1997, o Brasil, como já foi dito, não conseguiria conter de maneira significativa o
fez uma proposta original, o Fundo de Desenvol- desmatamento na Amazônia. Isso levou o Brasil a
vimento Limpo (FDL), que teve grande apoio dos se posicionar contra a inclusão do conjunto de
países emergentes e pobres, mas, como era de se propostas em torno do ciclo do carbono, temen-
esperar, foi extremamente criticada por todos os do que, no futuro, quando se estabelecerem com-
países desenvolvidos. Contudo, em outubro de promissos para os países emergentes, o Brasil
1997, aconteceu um desdobramento inesperado: possa vir a ter um grande passivo advindo do des-
os Estados Unidos e o Brasil articularam uma ver- matamento na Amazônia. Como resultado final do
são alterada do FDL, que passou a se chamar Me- Protocolo a respeito dessas questões, o Brasil e a
canismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), con- União Européia, por um lado, foram derrotados –
siderado uma das novidades do Protocolo de os sumidouros de carbono passaram a fazer parte
Kyoto. O MDL abriu a possibilidade de os países do Protocolo –, e, por outro, saíram vitoriosos –
desenvolvidos cumprirem parte de suas metas de apenas o reflorestamento e o florestamento pode-
redução de emissão por meio do financiamento rão ser considerados atividades de seqüestro de
de projetos de desenvolvimento sustentável nos carbono, ficando de fora do MDL atividades orien-
países emergentes e pobres. Por causa dele o Bra- tadas a evitar o desmatamento de florestas primá-
sil aceitou a proposta de mecanismos flexibiliza- rias. Nesta questão específica, o Brasil ficou em
dores de mercado para complementar os compro- minoria entre os países não pertencentes ao Ane-
missos de redução de emissões dos países desen- xo Um, particularmente na América Latina.
volvidos, e isto significou a ruptura do país em re- Apesar de ser um país em desenvolvimento
lação à sua posição, marcada pela oposição à im- com matriz energética limpa, o Brasil assumiu uma
plementação conjunta (prevista na Convenção do aliança geral com países emergentes com matriz
Rio de Janeiro) e às cotas comercializáveis de energética dependente de combustíveis fósseis
emissão entre os países do Anexo Um. (China, Índia e Indonésia). A vantagem da matriz
o
40 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

energética ficou sempre subordinada à desvanta- como na promoção das negociações entre os di-
gem do desmatamento na Amazônia na formação versos blocos . Além disso, foi liderança na articu-
da posição brasileira. Por isso, o país se aliou, em lação da aliança entre a União Européia e os paí-
geral, com a União Européia contra os países flo- ses emergentes, o que possibilitou o sucesso da
restais com capacidade de controle do desmata- negociação final do Protocolo. Em vários discursos
mento (Estados Unidos, Canadá, Austrália, Rússia, internacionais – antes e depois do 11 de setembro
Japão e Costa Rica) na questão da inclusão dos su- – o presidente Fernando Henrique criticou incisiva
midouros de carbono na contabilidade de emissões e consistentemente a política unilateral do gover-
e, conseqüentemente, na valorização do serviço no Bush em relação ao regime de mudança climá-
global prestado pelas florestas como seqüestrado- tica. Ao se comparar as posições dos dois países
res de carbono. Uma visão alternativa e positiva so- entre 1989 e 2001, observa-se claramente uma in-
bre a Amazônia teria levado o Brasil a uma aliança versão de papéis: em 1989, o governo Bush (pai),
inversa, o que talvez influenciasse sobremaneira o aliado aos outros países desenvolvidos, criticava o
perfil final do Protocolo. governo Sarney pela contribuição do país para a
Com uma posição de forte liderança na mudança climática em virtude do intenso desmata-
questão de reafirmar a necessidade de novos fun- mento na Amazônia; em 2001, o governo Cardoso,
dos financeiros dos países desenvolvidos para o aliado aos países desenvolvidos, criticava o gover-
financiamento de transferência de tecnologias lim- no Bush pela falta de uma atitude responsável em
pas e para o desenvolvimento da capacidade ins- relação ao clima global.
titucional nos países emergentes, o Brasil sobres- Desde 2000, o presidente Fernando Henri-
saiu, obtendo vitórias parciais a este respeito na que tem elevado o nível da participação brasileira
Conferência de Bonn (2001). A ênfase na transfe- no Protocolo de Kyoto, e isto promete bons fru-
rência facilitada de tecnologias produtivas limpas tos para o país. A viabilidade de longo prazo do
é coerente com o objetivo geral da política exter- Protocolo de Kyoto depende do retorno dos Esta-
na brasileira do governo Cardoso, no sentido de dos Unidos ao regime e da aceitação de compro-
promover a inserção competitiva do país na eco- missos de redução da taxa de crescimento futuro
nomia globalizada. das emissões por parte dos países emergentes (as
Reiterando, as relações entre Brasil e Estados emissões poderão continuar a crescer, mas a um
Unidos no âmbito do Protocolo tornaram-se difí- ritmo menor). A posição do Brasil será provavel-
ceis desde meados de 1999. Os Estados Unidos mente decisiva a este respeito, já que, entre os paí-
são favoráveis a compromissos de redução da taxa ses emergentes, é o melhor situado para avançar
de crescimento futuro das emissões para os países no processo de negociação. Entretanto, é essencial
emergentes no primeiro período (2010), enquanto que consiga diminuir o ritmo do desmatamento
o Brasil mantém sua posição contrária; o Brasil na Amazônia, o que contaria com o apoio da
opõe-se à inclusão das florestas nativas no MDL, maioria da população. Com certeza, uma coalizão
ao contrário dos Estados Unidos que, por sua vez, para o uso mais racional da floresta amazônica te-
propõem um regime reduzido de sanções, entran- ria impactos favoráveis não apenas internamente,
do em confronto com a posição da União Euro- mas também no âmbito internacional, elevando o
péia, apoiada pelo Brasil. Finalmente, o Brasil, so- prestígio do país no mundo e ganhando, com isso,
mando força com a União Européia, tentou impor a cooperação internacional em geral.
limites aos sumidouros de carbono para os países
desenvolvidos, o que foi também motivo de con-
flito e disputa com os Estados Unidos durante as Perspectivas do protocolo de Kyoto
negociações. Desde a saída dos Estados Unidos do depois dos acordos de Bonn e Marrakesh
Protocolo (março de 2001) até a conclusão das ne-
gociações (novembro de 2001), o Brasil destacou- Apesar do clima pessimista desde março de
se tanto na crítica da posição norte-americana 2001 causado pelo posicionamento de Bush, a
O REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL 41

maioria das questões principais pendentes do Pro- pão mais dois países (Canadá, Austrália, Ucrânia
tocolo foram negociadas com sucesso na Confe- ou Polônia). Até julho de 2002, a União Européia
rência das Partes em Bonn (julho de 2001 – con- e o Japão já tinham ratificado o Protocolo e havia
tinuação da COP6, suspensa em Haia, em novem- uma boa perspectiva de ratificação por parte da
bro de 2000). Para a realização do Acordo, todas Rússia, da Ucrânia e da Polônia até o final de
as partes contribuíram. A União Européia fez mais 2002. O Canadá e a Austrália talvez não ratifi-
concessões do que em Haia; os países do G77 quem-no. O Congresso brasileiro o validou em ju-
moderaram suas demandas, os países do grupo nho de 2002.
Guarda-chuva abandonaram os Estados Unidos; Resta saber se o Protocolo será um instru-
as ONGs internacionais (principalmente World mento efetivo na luta para atenuar a mudança cli-
Wide Fund for Nature, Friends of the Earth e mática ou se representará apenas os anseios uni-
GreenPeace) diminuíram suas exigências em prol versalistas da humanidade em contraposição à re-
de um acordo; os Estados Unidos aceitaram a der- sistência da política unilateralista norte-americana.
rota e não bloquearam as negociações; e o holan- De fato, a situação é complexa, pois o próprio
dês Pronk, presidente da conferência, teve uma contexto em que se deram as negociações do Pro-
liderança mais firme e incisiva do que em Haia. tocolo é repleto de contradição. É necessário a
Alguns dos pontos específicos, ainda pendentes, consideração de diversas dimensões para se po-
foram negociados com sucesso na VII Conferên- der avaliar com mais densidade o significado do
cia das Partes, em Marrocos (novembro de 2001): atual Protocolo de Kyoto: sustentabilidade de lon-
ampliou-se o teto de contabilidade de sumidouros go prazo em virtude da saída dos Estados Unidos,
de carbono para Rússia e estabeleceu-se, de um principal país emissor de carbono na atmosfera, e
modo genérico, que haveria um regime de da pressão da opinião pública internacional, per-
sanções para os países do Anexo Um que não da potencial de competitividade das empresas eu-
cumprissem os compromissos estabelecidos de re- ropéias e japonesas, que terão mais custos ao mu-
dução de emissões até 2010. Outros pontos espe- dar o processo produtivo rumo a uma diminuição
cíficos ficaram para ser negociados na Primeira da emissão de carbono, capacidade de impulsar
Conferência das Partes depois da ratificação do as medidas por parte de empresas que estão assu-
Protocolo: o regime específico de sanções, o qual mindo compromissos voluntários, consolidação
será agregado posteriormente como uma emenda institucional do mercado de carbono, força relati-
ao Protocolo de Kyoto, e as bases para aprovação va do setor conservador na sociedade norte-ame-
de projetos inseridos no Mecanismo de Desenvol- ricana, emergência de uma proposta alternativa a
vimento Limpo e na Implementação Conjunta. Os Kyoto por parte do governo Bush num futuro
países, liderados pela União Européia, estabelece- próximo e força relativa dos setores que impul-
ram como meta a ratificação do Protocolo para a sionam compromissos de redução da taxa de
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvi- crescimento futura das emissões nos países em
mento Sustentável a ser realizada em Joanesbur- desenvolvimento.
go, em setembro de 2002. Pela primeira vez na história contemporânea
Ao que tudo indica, o Protocolo está em via um tema desvinculado diretamente de questões
de ser ratificado para entrar em vigência em 2003. clássicas, como segurança ou economia, ocupou
Isso requer a ratificação de pelo menos cinqüenta o lugar principal na agenda dos países. Assim
países, dos quais aqueles pertencentes ao Anexo como, pela primeira vez depois da Segunda Guer-
Um devem responder por no mínimo 55% das ra Mundial, os Estados Unidos e a Europa ociden-
emissões deste grupo, segundo o ano base de tal entraram em confronto em torno de uma ques-
1990. Como nesta data os Estados Unidos foi res- tão de alta relevância na arena internacional. A
ponsável por 35% das emissões dos países do política unilateralista de Bush está em desacordo
Anexo Um, o protocolo precisa ser obrigatoria- com a linha adotada pelos Estados Unidos desde
mente ratificado pela União Européia, Rússia e Ja- o final da Guerra Fria. Em dezoito meses de admi-
o
42 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

nistração Bush, o país assumiu posições unilate- mundial. Na Dinamarca, por exemplo, 26% da
rais em pelo menos outras seis questões interna- energia elétrica já é produzida por turbinas eóli-
cionais importantes: 1) decisão de construir o Es- cas, na Alemanha e na Holanda, 4%, e na Espa-
cudo de Defesa Antimíssil – e, conseqüentemen- nha, 3%. Na maioria dos países europeus a ener-
te, quebrar o compromisso do Tratado contra os gia eólica cresce a taxas muito altas desde 1998.
Mísseis Antibalísticos de 1972); 2) decisão de se A assinatura do Protocolo de Kyoto, em
retirar da negociação do Protocolo de Verificação 1997, desencadeou um movimento em setores do
do Tratado contra as Armas Biológicas; 3) oposi- empresariado dos países desenvolvidos em favor
ção a uma convenção eficiente sobre o uso de pe- de novas tecnologias não-carbonizantes, tanto na
quenas armas; 4- saída da Conferência sobre Ra- área energética como no conjunto do ciclo produ-
cismo, em Durban; 4) definição do “Eixo do Mal” tivo. Desde 1999, metas voluntárias de redução de
(Iraque, Irã e Coréia do Norte), incentivando a carbono vêm sendo assumidas por grandes em-
mudança de regime político nesses países; e 6) presas comprometidas com o regime de mudança
envolvimento precário na negociação de um acor- climática e impulsionadas, é claro, pela criação,
do efetivo de paz e de criação do Estado palesti- em Bonn, de um arcabouço internacional obriga-
no, condicionando sua maior participação à subs- tório (BP, Shell, Volvo, Dupont, Cisco, Conoco,
tituição de Arafat na liderança palestina. Apesar Toyota e Honda). Segundo essas empresas, os Es-
de já ter havido outras ocasiões em que os Esta- tados Unidos serão praticamente obrigados a ade-
dos Unidos ficaram isolados politicamente nas úl- rir ao Protocolo de Kyoto em poucos anos, até
timas décadas – Lei do Mar, de 1983, Tratado de mesmo porque o modelo constituído na conferên-
Banimento das Minas Terrestres, de 1997, e o tra- cia de Bonn está muito próximo das posições de-
tado que criou o Tribunal Penal Internacional, de fendidas pelos negociadores norte-americanos
1998) –, nunca isto tinha acontecido em torno de desde 1996, quais sejam, atenção diferencial aos
uma questão de “alta política”, como o Protocolo mecanismos flexibilizadores de mercado (comér-
de Kyoto. Além disso, há uma forte oposição in- cio e certificação ilimitada de cotas de emissão de
terna e externa que está implicando custos impor- carbono entre os países do Anexo Um e garantia
tantes em termos do prestígio do país no âmbito de créditos na balança da redução de emissões
internacional. quando do desenvolvimento de projetos realiza-
Responsável por um quarto das emissões dos em países não pertencentes ao Anexo Um),
globais de carbono, os Estados Unidos são, obvia- consideração do conjunto do ciclo do carbono in-
mente, imprescindíveis na mesa de negociação. cluindo sumidouros e regime de sanções restrito.
Sem ratificar o Tratado, poderá haver um cresci- O incipiente mercado de carbono já produ-
mento das emissões de carbono dos Estados Uni- ziu cerca de sessenta transações que envolveram
dos, ao contrário dos outros países do Anexo Um. aproximadamente 100 milhões de dólares. Soma
Assim, por exemplo, em 2010 as emissões da apenas simbólica, visto que as estimativas sobre
União Européia deverão ser 8% inferiores as de as transações de carbono anuais por volta de 2005
1990 e as dos Estados Unidos (caso permaneça a deverão oscilar entre 5 a 10 bilhões de dólares por
tendência atual) serão cerca de 30% superiores as ano, sem a presença dos Estados Unidos, e entre
de 1990, o que, com certeza, trará dificuldade 40 a 100 bilhões com sua presença. Ademais, o
para a sobrevivência dos acordos estabelecidos valor unitário da tonelada de carbono cairá signi-
no Protocolo, visto que as condições de competi- ficativamente sem os Estados Unidos, assim como
tividade no mercado global se tornariam injustas, o comércio de carbono tornará menor o custo ad-
como já foi dito. Em contrapartida, a energia eóli- vindo do cumprimento das metas de redução (por
ca já se tornou comercialmente competitiva em parte dos países do Anexo Um com mais dificul-
todo o mundo, e uma boa parte da descarboniza- dades para cortar emissões internamente) e criará
ção poderá se dar com o crescimento da propor- novas oportunidades de negócio para empresas
ção das turbinas eólicas na geração energética mais dinâmicas, incentivando energias renováveis,
O REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O BRASIL 43

incrementando a eficiência energética dos equipa- das (e, em particular, a norte-americana) poderão
mentos e melhorando o manejo das florestas e se adaptar sem maiores problemas à mudança cli-
dos solos). Países como Reino Unido, Dinamarca mática e que o custo advindo da redução de emis-
e Noruega lançarão seus mercados internos de são seria muito alto comparado ao da adaptação.
carbono nos próximos meses, e apesar da não ra- Esta visão não se preocupa, evidentemente, com
tificação do Protocolo, os Estados Unidos assistem as dificuldades enfrentadas pelos países em de-
ao surgimento da, Chicago Climate Exchange, ins- senvolvimento e, sobretudo, os de baixa renda.
tituição destinada a promover o mercado de car- Mesmo que de maneira implícita, mas não por
bono entre as empresas norte-americanas que as- isso menos definida, vem à tona a mentalidade
sumiram compromissos voluntários de redução de dos conservadores republicanos, ou seja, justifi-
emissões. Além disso, o Banco Mundial vem de- cam a falta de solidariedade pela incompetência –
senvolvendo, com sucesso, um Programa Piloto e, conseqüentemente, o fracasso – dos países po-
de Mercado de Carbono desde 1999. bres em conduzir sua política e sua economia en-
O Brasil é um dos países não pertencentes volvidas no facciosismo, na corrupção e nas epi-
ao Anexo Um mais ativo no mercado internacio- demias. Os Estados Unidos devem, de acordo
nal de carbono por meio do MDL, e já existem no com esta perspectiva, se manter bem distantes.
país algumas firmas que iniciaram suas operações Duas outras incertezas pairam sobre o Proto-
como brokers. A criação do Fórum Brasileiro de colo de Kyoto. Em primeiro, os negociadores de
Mudanças Climáticas, de caráter multissetorial Bonn deixaram para um futuro incerto a questão
(governo, empresas e ONGs), em 2000, tem con- dos compromissos de redução da taxa de cresci-
tribuído muito para a participação do Brasil no in- mento futuro por parte dos países de renda mé-
cipiente mercado de carbono. Além disso, há um dia. Em segundo, o governo Bush poderia propor,
grande potencial para o desenvolvimento da ener- num futuro próximo, uma alternativa a Kyoto, que
gia eólica por causa de três fatores combinados: enfatizasse menos o controle de emissões no cur-
existência de grandes bacias de vento em quase to prazo e incentivasse a longo prazo o desenvol-
todo o litoral, estímulo do MDL e necessidade de vimento de tecnologias limpas e a transferência de
aumentar rapidamente a oferta de energia devido tecnologia para os países em desenvolvimento.
à crise dos reservatórios de hidroeletricidade em Uma proposta desse tipo poderia obter amplo
2001. Contudo, como mecanismo flexibilizador, o apoio tanto entre os países desenvolvidos mem-
MDL compete em condições desfavoráveis com o bros do grupo Guarda-chuva como entre os paí-
comércio de cotas de emissões, particularmente ses em desenvolvimento, o que, talvez, fosse mais
com a nova proposta russa de Esquema de Inves- eficiente do que o Protocolo de Kyoto sem os Es-
tados Unidos. A situação de derrota experimenta-
timento Verde, que poderá dominar a compra de
da pelo país em Bonn seria revertida pela aprova-
créditos de emissões por parte dos países mais ne-
ção de um novo mecanismo global liderado então
cessitados, como Japão, Canadá e Austrália.
pelos Estados Unidos.
Mas é preciso se perguntar se o mercado de
Portanto, o futuro do Protocolo de Kyoto é
carbono poderá se desenvolver plenamente sem
incerto e dependerá:
uma rápida adesão dos Estados Unidos ao Proto-
colo, ou, ainda, se a existência de mercados de
• A Da capacidade de as elites européias, junta-
carbono nacionais e regionais garantirá o efetivo
mente com as elites globalistas responsáveis
mercado global com normas, padrões e compro-
norte-americanas, persuadirem em seu favor a
missos comuns.
opinião pública dos Estados Unidos.
A todo movimento favorável ao Protocolo de
algum importante setor do empresariado dos paí- • Da capacidade de as elites européias, junta-
ses desenvolvidos observa-se um movimento con- mente com as elites globalistas responsáveis
trário do empresariado conservador norte-ameri- dos países de renda média, persuadirem a po-
cano, que acredita que as sociedades desenvolvi- pulação desses países em favor da necessidade
o
44 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

de compromissos de redução da taxa de cresci- A questão que se coloca então é: qual foi o
mento futuro das emissões. impacto do atentado de 11 de setembro nos Esta-
dos Unidos sobre a população dos países desen-
• Do sucesso de os setores empresariais, já com-
volvidos com relação à sua disponibilidade para
prometidos com as metas estabelecidas, pro-
assumir os custos e as responsabilidades da go-
duzirem no curto prazo inovações tecnológicas
vernabilidade global? A ameaça do comunismo
eficientes.
fez com que, no início da Guerra Fria, os Estados
• Da rapidez com que o setor empresarial de Unidos pagassem parte do custo da reconstrução
energia eólica desenvolva um ambiente regula- da Europa e do Japão, propiciando a queda co-
tório favorável na maior parte do mundo. munismo e a ascensão da democracia no último
• Do sucesso de governos, empresas e ONGs em quarto do século XX. Será o terrorismo uma amea-
desenvolver e consolidar um mercado global ça forte o suficiente para impulsar um comporta-
de carbono. mento similar dos países desenvolvidos no início
do século XXI? (Viola e Leis, 2001). Infelizmente
• Das dificuldades de o governo Bush elaborar as evidências do último ano não condizem com
uma proposta alternativa que seja atrativa para esta expectativa. Há uma tendência protecionista
a maioria dos países-chave. nos setores siderúrgico e agrícola nos Estados
Unidos, pequena disponibilidade dos países de-
Passando para um contexto mais amplo, o senvolvidos a negociar na OMC uma abertura ple-
futuro do regime de mudança climática e do Pro- na de suas economias nos setores agrícola, têxtil
tocolo de Kyoto, em particular, dependerá da ati- e de calçados, justamente onde os países em de-
tude e do comportamento predominantes, a médio senvolvimento e pobres conseguem ser competi-
prazo, nos países desenvolvidos no sentido de as- tivos e, por fim, uma vitória na maior parte dos
sumir os custos e as responsabilidades da governa- países europeus de candidatos orientados por
bilidade global e da produção de bens públicos uma agenda predominantemente defensiva com
globais (como mecanismos para um desenvolvi- relação aos problemas globais.
mento econômico mais inclusivo e para enfrentar
os problemas epidemiológicos e ambientais), além
da reconstrução dos Estados fracassados. Os cus- BIBLIOGRAFIA
tos e as responsabilidades estão vinculados à
emergência de uma ação do tipo “Plano Marshall”, AGRAWALA, S. & STEINAR A. (1999), “Indispensa-
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46 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

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RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS 179

O REGIME INTERNACIONAL THE INTERNATIONAL LE RÉGIME INTERNATIONAL


DE MUDANÇA CLIMÁTICA E O REGIME ON CLIMATE DES CHANGEMENTS
BRASIL CHANGE AND BRAZIL CLIMATIQUES ET LE BRÉSIL

Eduardo Viola Eduardo Viola Eduardo Viola

Palavras-chave Keywords Mots-clés


Políticas públicas, Protocolo de Public Policies, The Kyoto Protocol, Politiques publiques, Protocole de
Kyoto, Acordo de Bonn, Acordo de The Bonn Agreement, The Kyoto, Accord de Bonn, Accord de
Marrakesh, Mudança climática. Marrakesh Agreement, Climatic Marrakech, Changement climatique.
Change

Este artigo analisa o processo de for- This article has three parts. In the Cet article analyse le processus de
mação do regime internacional de first one the author analyses the for- formation du régime international
mudança climática desde as nego- mation of the international regime des changements climatiques depuis
ciações e a assinatura da convenção on climate change since the negoti- les négociations et la signature de la
Quadro das Nações Unidas sobre ations and signing of the United Convention-cadre des Nations Unies
Mudança Climática, no Rio de Nations Framework Convention on sur les Changements Climatiques à
Janeiro (1992), passando pela nego- Climate Change (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (1992), en passant
ciação e assinatura do Protocolo de 1992), passing through the negotia- par la négociation et la signature du
Kyoto (1997), até a conclusão dos tions and signing of the Kyoto Protocole de Kyoto (1997), jusqu’à
pontos pendentes do protocolo na Protocol (1997), till the conclusion la conclusion des questions pen-
VII Conferência das Partes em Mar- of the Protocol pending issues in the dantes du Protocole à la VIIe
rakesh (2001). Também são estuda- 7th Conference of the Parts in Conférence des Parties à Marrakech
dos as políticas públicas relaciona- Marrakech (2001). In the second (2001). Les politiques publiques rel-
das às emissões de carbono no Bra- part the author analyses the public atives aux émissions de gaz car-
sil, na década de 1990, e o posicio- policies related to carbon emissions bonique au Brésil, dans les années
namento brasileiro em relação ao in Brazil during the 1990s and the 1990 et la position brésilienne para
regime de mudança climática. No Brazilian standing in the climate- rapport que régime des change-
Protocolo de Kyoto (1996-2001), o changing regime. The Brazilian ments climatiques, sont également
Brasil propôs o Fundo de Desenvol- standing in the negotiations of the analysées. Dans le Protocole de
vimento Limpo e opôs-se a compro- Kyoto Protocol (1996-2001) was a Kyoto (1996-2001), le Brésil a pro-
missos de redução da taxa de cres- combination of leadership and defen- posé la création d’un Fonds de
cimento futuro das emissões de gás sive positions: the proposal of the Développement Propre et s’est
carbono por parte dos países emer- Clean Development Fund, opposition opposé à des compromis de réduc-
gentes, ao estabelecimento de me- to commitments for the reduction of tion de la taxe de croissance future
canismos flexibilizadores de merca- future growth rates in carbon emis- des émissions de gaz carbonique
do e à inclusão das emissões deriva- sions for emerging countries, initial par rapport aux pays en développe-
das de mudança do uso da terra. Fi- opposition to the inclusion of market ment, à l’établissement de mécan-
nalmente, analisam-se as perspecti- mechanisms for emissions reduction, ismes de flexibilisation du marché et
vas futuras do Protocolo de Kyoto and opposition to the inclusion of à l’inclusion des émissions issues du
depois dos Acordos de Bonn e Mar- emissions derived from land use changement de l’usage de la terre.
rakesh, particularmente em relação changes in the Protocol. In the third Finalement, l’auteur analyse les per-
à sua viabilidade a longo prazo sem part the author analyses the future spectives futures du Protocole de
a presença dos Estados Unidos. perspectives of the Kyoto Protocol Kyoto depuis les Accords de Bonn et
after the Agreements in Bonn and de Marrakech, particulièrement par
Marrakech, particularly in relation to rapport à sa viabilité à long terme
its long-term viability without the re- sans la présence des États-Unis.
entering of the United States.

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