Programa de Pós Graduação da Universidade Federal do Paraná – Doutorado
Disciplina: Professores: Katya Isaguirre, Carlos Frederico Marés e Jorge MOntenegro Aluno: Ricardo Cavedon Aula dia:
Texto: BUCK-MORSS, Susan. Hegel y Haití. Buenos Aires: Editorial
Norma. 2005. Ler no mínimo os capítulos 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7. (50 páginas com muitas notas de rodapé)
Sobre o autor:
Susan Buck-Morss é uma filósofa americana e historiadora intelectual. Atualmente é
professora de Ciência Política no Centro de Pós-Graduação da CUNY, e professora emérita do Departamento de Governo da Universidade de Cornell, onde lecionou de 1978 a 2012. Seu trabalho interdisciplinar envolve, mas não se limita aos campos da História da Arte, Arquitetura, Literatura Comparada, Estudos Culturais, Estudos Alemães, História, Filosofia e Estudos Visuais. Ela ganhou um Grant Getty Scholar, um Prêmio Fulbright, e uma bolsa Guggenheim por seu trabalho. Mesmo as leis vigentes na europa não se aplicavam aos escravos das colônias.
Relato do texto:
A autora constrói uma argumentação no sentido de que a modernidade apenas concedeu
liberdade e igualdade aos pensadores e cidadãos europeus. Mas a sistemática e altamente sofisticada escravidão dos povos não europeus (como força de trabalho das colônias) se tem cada vez mais intensificado quantitativa e qualitativamente, chegando ao ponto de que todo o sistema econômico do ocidente se encontra baseado nela, ainda que obscurecida ou maquiada pelos reclames revolucionários, o fato é que o mundo periférico está sob o jugo de uma escravidão econômica muito significativa. Há assim uma contradição absurda entre os discursos liberais de liberdade e a escravidão econômica sofrida pela população dos países periféricos. Em verdade, segundo a autora, a liberdade dos europeus era na verdade a proteção da propriedade privada, e os escravos africanos era objeto desta propriedade privada. As leis protegiam a escravidão e por consequente a liberdade (e nenhuma contradição havia nisso para a sociedade da época). A dependência comercial europeia da atividade escravagista era tamanha, seja com a produção do açúcar, seja com a dependência de mais de 20% da burguesia ligada a alguma atividade comercial relacionada ao escravismo, que os grandes pensadores idealizavam o mito do “bom selvagem” e não se preocupavam com a exploração econômica do trabalho escravo. Ainda que nessa época existissem alguns movimentos isolados abolicionistas que condenavam os excessos do regime escravista, certo que era muito rara uma defesa da LIBERDADE com base na igualdade racial. Os grandes teóricos, como Jaques Rousseau, inclusive apoiaram ideias materializadas nas grandes codificações as quais legalizavam não só a escravidão, mas também o tratamento de seres humanos como propriedade mutável, inclusive a marcação, a tortura, a mutilação física, e o assassinato de escravos por intentarem rebelar-se contra seu status não humano. “Rousseau se referiu aos serem humanos de todo o mundo, mas omitiu os africanos. Falou da tristeza dos povos da Groelandia, olvidando-se dos africanos levados às Índias que redundaram em suicídios, motins, fugas. Declarou a igualdade de todos os homens e considerou a propriedade privada como a origem da desigualdade, mas nunca lhe ocorreu atar cabos e questionar os benefícios econômicos da escravidão na França como um problema central ao argumento da igualdade e da propriedade, o que é possível entender como repulsivo silêncio derivado do racismo. Contudo, a propagação da lógica da liberdade nas colônias acabou por deturpar a lógica da econômica escravista, o que aos poucos espelhou nos movimentos anti escravistas. A independência do HAITi como nação influenciou Hegel, que elaborou escritos atinentes à liberdade. A idéia da dialéctiva entre o amo e o escrevo surgiu uma talvez da revolução no Haiti, mas é preciso reconhecer sua significação central para o discurso político. Foi um acontecimento excepcional digno de contemplação pelos filósofos. A causa foi o espírito de liberdade. “O fato de que esse espírito pudera cruzar o limite não somente entre as raças senão entre escravos e homens livres, foi precisamente o que fez possível argumentar, sem voltar-se até a ontologia abstrata da natureza, que o desejo de liberdade era autenticamente universal. A escritura da fenomenologia do espírito de Hegel foi contundente porque inaugurou como metáfora centra da obra, não a ideia de escravatura versus um mítico estado de natureza (como aqueles que, de Hobbes a Roussau, o haviam feito previamente) mas senão o paradigma do escravo versus amo, escrevendo em seu texto a realidade histórica da época que o rodeava. Nessa obra Hegel entende a posição do amo em termos políticos e econômicos. Em System der Sittlichkeit (1803) ele assinala que: “o amo esta em posição de uma superabundância de necessidades físicas em geral, e o outro (o escravo) carece delas. Em primeiro momento a situação do amo é independente, tem por essência o ser em si, enquanto o outro a posição do escravo, é dependente, e a sua essência é a vida ou o ser para outro. O escravo é caracterizado pela falta de reconhecimento que recebe, é percebido como uma “coisa”, a “coisificação” é a essência da consciência do escravo. Mas a medida em que a dialética se desenvolve, a dominação aparente do amo se inverte com a consciência de que ele é, de fato, totalmente dependente do escravo. A classe possuidora de escravos é totalmente dependente da instituição da escravatura para a superabundância que constitui sua riqueza. Esta classe é então incapaz de ser agente de progresso histórico sem aniquilar a sua própria existência. Mas então os escravos alcançam a autoconsciência ao demonstrar que não são coisas, não são objetos, senão sujeitos que transformam a natureza material. Aqueles que se submeteram à escravatura demonstram sua humanidade quando se arriscam a morrer voluntariamente antes de permanecer subjugados. Hegel admite diante disso que a lei que os reconhece como meras coisas já não pode mais ser aplicada, porque não é mais válida, ainda que era o próprio escravo quem era responsável por sua falta de liberdade por eleger inicialmente a vida sobre a liberdade, por mera autopreservação. Hegel na fenomenologia do espírito insiste que a liberdade não pode garantir-se ao escravo desde cima, é necessário a autoliberação do escravo por intermédio de um “duelo com a morte”. Somente arriscando a vida se mantém a liberdade. O indivíduo que não arrisque a vida pode ser reconhecido como pessoa, mas não alcança a verdade de reconhecimento O objetivo desta libertação, sem escravidão, não pode ser por sua vez a submissão do amo, o que que seria uma mera repetição do ‘impasse existencial’ do amo mas bem deve ser a eliminação completa da escravidão. A pergunta que se faz é porque essa dialética de Hegel com o Haiti, ficou escondida e sem relevância até mesmo para os especialistas em HEGEL.