Você está na página 1de 58

Obras

de Guerra
A úl.ma fase criadora de
Claude Debussy (1862-1918)
e a produção musical francesa
durante os anos da
Primeira Guerra Mundial
(1914-1918)

Profa. Dra. Danieli Longo BenedeJ


A produção pianís/ca de Claude Debussy
durante a Primeira Guerra Mundial
Dissertação de Mestrado
São Paulo: ECA/USP, 2000-2002

Le Tombeau de Couperin (1914-1917) de
Maurice Ravel: obra de uma guerra
Tese de Doutorado
São Paulo: ECA/USP, 2005-2008

Obras de Guerra
A produção musical francesa durante os anos
da Primeira Guerra Mundial
Danieli Verônica Longo BenedeE
ANNABLUME / FAPESP – 2014, 240 p.
As Sociedades Musicais Francesas do início do
século XX: ideologias e consequências
Société Na/onale de Musique - SNM, Schola Cantorum,
Société Musicale Indépendente - SMI,
Revue la Musique pendant la Guerre,
Fes/val de La Musique Française e
Ligue Na/onale pour la Défense de la Musique Française.

Pós-Doutorado ECA/USP – 2011-2014

Société Musicale Indépendante -
SMI (1910-1935):
um percurso entre Guerras

Pós-Doutorado IA-UNESP / CAPES - 2017



O trabalho está fundamentado em material de época (material de
imprensa, correspondência dos compositores envolvidos e
documentos produzidos pelas associações invesWgadas [atas das
reuniões, estatutos, noZcias, informaWvos, programas de
concertos]), coletados por ocasião de estágios de pesquisa de
campo ao acervo privado da
•  Bibliothèque na.onale de France – BnF
-  SíWos Richelieu-Louvois, Ópera e François MiZerand

•  Arquivo parGcular do compositor francês Charles Koechlin
(1867-1950), de posse da
Médiathèque Musicale Mahler

•  Bibliothèque de l ́IRCAM - L'Ins/tut de Recherche et
Coordina/on Acous/que/Musique

•  Bibliothèque de la Sorbonne
Guerra Franco-Prussiana/Germânica
1870-1871
Nacionalismo / Revanchismo

“Todos esses homens foram traumaWzados pela guerra, mais ainda,
humilhados pela derrota. Nasce neles um senWmento de revolta, de
impotência, que grita por vingança.”(Gallois, 2004, p.131)

GALOIS, Jean. Camille Saint-Saëns. Belgique: Mardaga, 2004.

Descreve a historiadora francesa Josele François:

Depois da humilhação de 1871, as crianças francesas passaram a ser
educadas para um único fim: a vingança necessária. Todas as canções
que se escutavam nas festas familiares falavam da Alsácia-Lorena.
A escola primária ensinava a obrigação absoluta do jovem francês de
aceitar o sacriecio pelo seu país, até mesmo o sacriecio de sua própria
vida. Assim, a escola francesa cumpria sua função quando fazia do
jovem um patriota, no sen/do da revolução. Ou seja, um homem
inteligente e consciente que mesmo sendo soldado, não se esqueceria
de que antes de tudo é um cidadão. E assim sendo, quer no regimento,
quer no campo de batalha, esse homem não se deixaria ultrapassar por
ninguém em fidelidade, disciplina, heroísmo. Porém, fazendo a guerra,
quando necessário, ao regressar ao lar, reivindicaria o direito de
maldizê-la, lutando com todas as forças para fazer desaparecer esta
atroz sobrevivência da barbárie (FRANÇOIS, 1980, p. 8).

FRANÇOIS, Josele. Histoire 3e. Paris: EdiWons Fernand Nathan, 1980.
Comuna de Paris - 1871

Comuna 1871
Brasão da Société Na/onale de Musique,
BnF – Rés 2483
(1871-1998)
598 concertos

O compositor Camille Saint-Saëns, um dos fundadores da
Sociedade Nacional de Música, faz um relato em arWgo
publicado pelo jornal Le Voltaire em 27 de novembro de
1880 sobre a dificuldade encontrada pelos compositores
franceses em divulgar seus trabalhos. Ele escreve:

Não faz muito tempo, quinze anos talvez, um
compositor francês que Wvesse a audácia de se
aventurar no terreno da música instrumental não Wnha
outro meio de fazer executar suas obras a não ser
realizando ele mesmo um concerto, convidando seus
amigos e a críWca. Quanto ao público, ao verdadeiro
público, não adiantava sonhar; o nome de um
compositor francês e vivo, impresso sobre um cartaz,
Wnha a propriedade de colocar todos em fuga.
Anteriormente à criação da Societé Na/onale exisWram algumas
sociedades francesas de música porém dedicadas essencialmente a
execução da música germânica.
No referencial trabalho de Michel Duchesneau inWtulado
L’Avant Garde musicale à Paris de 1871 a 1939, o pesquisador
enfaWza:

A SN nasceu da necessidade dos compositores franceses de terem a
disposição uma associação que os permiWssem se manifestar em
condições propícias. O clima nacionalista no qual o meio arZsWco
parisiense se encontra no dia seguinte da derrota de Sedan (1o de
setembro de 1870), seguido da tomada de Paris pelas tropas
prussianas entre setembro de 1870 e março de 1871, oferece a
ocasião a compositores como Camille Saint-Saëns, Jules Massenet,
César Franck e Henri Duparc, de fundar uma sociedade em que os
objeWvos nada mais tem a ver com os das sociedades de música de
câmara então existentes, que difundiam apenas as obras de Haydn,
Mozart e Beethoven. (DUCHESNEAU, 1997: p. 15)
Societé Na/onale de Musique – SNM
Statuts SNM – BnF- Musique
Concerto de estreia
17 de novembro de 1871
Salle Pleyel - Paris

Programa
-  Trio em Si Bemol, op.1, n. 2 - César
Franck;
-  Deux Mélodies, para soprano e piano -
Théodore Dubois;
-  Concerto para violino – Jules Garcin;
-  Cinq Pièces pour piano dans le style
ancien, para piano solo - Alexis de
CasWllon;
-  L’Improvisa/on, para tenor e piano;
-  Marche Héroique, para dois pianos -
Camille Saint-Saëns.

-  BnF – Musique / Programas da SNM


Comitê da Sociedade Nacional de Música
Exercício 1876-1877
Sessão do domingo, 26 /11/1876
Presentes: Senhores Bussine, Fevrier, Bernard, Dubois, Lefebvre,
Franck, d’Indy, Gauvy, Duparc, Lalo, Jicquel, St. Saëns.
Ausentes com jusGficaGva: Bourgault-Ducoudray, Fauré
Ausentes sem jusGficaGva: nenhum
Correspondência:
Resposta a carta pela qual a Sra. Viardot comunica sua demissão.
A redação da carta foi feita pelo comitê.
Admissões
Sócios honorários:
Nome: Sra. de Gironde
Endereço: 29, Bd. Malesherbes
Sócios AGvos
Nome: Sr. Reuchsel (12 vozes/12 sim)
Endereço: 17, R. Bonaparte
Demissões: Sra. Viardot e Sra. Hérile
Decisões:
A pedido dos Secretários, o Comitê decide que cartas informaWvas serão
enviadas aos compositores com o objeWvo de informar sobre a
admissão ou não admissão das obras enviadas ao comitê de leitura. As
cartas conterão trecho do processo verbal, indicando o número de
votantes, o número de sim, o número de não, e o resultado. Elas serão
assinadas “O Comitê”. A proposta trazida pelos Secretários foi aprovada
com a unanimidade dos votos.
Leitura:
Nomes dos autores/Ztulos e designação das obras/votantes/sim/não/
decisão
J. Reucksel / Théme et varia/ons para 4 violoncelos / 10 / 9 / 1 / aceito
J. Reucksel / Concerto para violoncelo / 12 / 2 / 9 / recusada
BnF – RésF994 (A)
Programas SNM – BnF-Musique
Concerto 242/598 – 23 de dezembro de 1894
Corrente Francesa
- Liberdade formal
-  Abandono de uma métrica e estrutura fixa (ex:
frases, períodos)
-  Tempos fortes e fracos deslocados;
-  Liberdade para uma melodia “flutuante”
-  Uso de acordes não funcionais (uso de escalas de
tons inteiros, acordes paralelos, etc)
-  Tratamento solista dos instrumentos de orquestra
(valorização dos diferentes Wmbres)
A Société Na/onale de Musique inaugurou, domingo 23 de dezembro, o
primeiro dos quatro grandes concertos com orquestra que ela deve dar
este ano na Salle d’Harcourt. Não saberíamos como felicitar esta
sociedade por ter se mostrado menos fechada que no passado para
alguns compositores que, apesar de não pertencerem a escola de César
Franck, produziram, no entanto, obras de valor. (...) A críWca que
poderíamos fazer tanto ao Prélude à l’après midi d’un faune (poesia de S.
Malarmé), colocada em música pelo Sr. A. Debussy, quanto à Prière,
poema de Guy Ropartz, é a influencia wagneriana extremamente
preponderante, enlevando assim ao arWsta o esWlo que seria capaz de
ter. Estas são, contudo, composições interessantes, sobretudo a
primeira, denotando nos autores aspirações em direção ao belo e a uma
aversão absolutamente completa pela banalidade, o que nos permite os
felicitar. (IMBERT, 1894, p. 1052) ver p.61

LE GUIDE MUSICALE - 30/12/1894, HUGUES IMBERT
Schola
Schola Cantorum (1894) + SNM (1871)


Vincent d’Indy (1851-1931) par George Villa
Brasão da Société Na.onale de Musique – SNM (1871-1998)
Paris: Le Courrier Musicale, 15/02/1919
BnF – Musique
BnF - Musique
Caderno de registro das primeiras audições da SNM, BnF – Musique

Maurice Ravel (p. 38)
- Sites auriculaires, 2 pianos – 5/03/1898
- Shéherazade (ouverure), orquestra – 27/05/1899 – ver críWca p.77
- 2 Mélodies (Marot) – 27/01/1900
- Pavane pour une enfante défunte – Jeux d’eux, piano solo – 5/04/1902


- Quarteto, cordas – 05/03/1904
- Shéherazade 3 poemes, orquestra – 17/05/1904
- Miroirs, piano solo – 06/01/1906
- Sona/ne, piano solo – 31/03/1906
- Noel des jouets, orquestra – 26/04/1906
- Histoires Naturelles, voz e piano – 12/01/1907
- Gaspard de la nuit, piano solo – 09/01/1909
SMI (1910-1935) – Société Musicale Indépendante
Maurice Ravel, Charles Koechlin, Florent Schimig e Gabriel Fauré
BnF - Musique

Modo de funcionamento
Maior liberdade em relação a escolha das obras e nacionalidade dos compositores

ObjeWvo: divulgar a música


contemporânea sem disWnção de
escola e nacionalidade.

169 concertos realizados

S.I.M. Revue Musicale Mensuelle. L’Actualité musicale.
BnF - Musique, Paris: 15/04/1910. p. 139.
ver tradução p.89

Programa do Concerto de estreia da SMI
1/169 - 20/04/1910
Benede|, Danieli Longo. Société Musicale Indépendante – SMI, sua
fundação, sua bandeira e o testemunho da imprensa especializada em
torno de sua primeira temporada arZsWca.
Revista Vórtex, CuriWba, v.3, n.1, 2015, p.38-69



Programa de estreia da SMI – 20/04/1910
Franz Liszt - Transcrição para piano a quatro mãos do Choeurs des faucheurs
Wrado da ópera Prométhé (1a audição), Louis Aubert e F. Schimil - piano;
Maurice Delage – Trois Mélodies: Intermezzo, Du livre Monelle e Améthistes
(1a audição), Stéphane AusWn – voz e Marcel Chadeigne - piano;
Zoltán Kodaly – Six pièces, para piano solo: Andante poco rubato, Andante
Appassionato, AllegreZo scherzando, Moderato triste, Comodo burlesco
(1a audição), Théodor Szanto - piano;
Roger Ducasse – Pastorale, para órgão (1a audição),
Alexander Guilmant - órgão;
Claude Debussy – D’un cahier d’esquisses, piano solo (1a audição),
Maurice Ravel - piano;
Gabriel Fauré – La Chanson d’Eve, ciclo de 10 peças para voz e piano (1a
audição), Jeanne Raunay – voz e Gabriel Fauré – piano;
Maurice Ravel – Ma Mère l’Oye - Cinco peças infanWs para piano a quatro
mãos (1a audição), ChrisWane Verger (6 anos) e Germaine Durouy (10 anos),
piano;
André Caplet -Septuor (1o Movimento), para cordas vocais e instrumentais (1a
audição), Mellot-Jouber, Jeanne Loth, Chadeigne – voz e o Quarteto Géloso.

C. Debussy. D’un cahier d’esquisses (1903), 54 cps.
Paris: Schol Frères
ex.1: comp. 1-4 (ver comp. 3 e 4) e ex. 2: cps. 41-45
ver p.108
Primeira Guerra Mundial
1914-1918

Custou a França mais de 1.400.000 mortos
Mais de 2.560.000 feridos
Revista La Musique pendant la Guerre
(BnF-Mu, Bp. 106)
Inicialmente mensal, a revista La Musique
pendant la Guerre Wnha como objeWvo
principal elaborar um documento histórico
com a colaboração dos vários músicos
franceses, registrando todos os
acontecimentos musicais durante o conflito e
alimentando o senWmento de repulsa em
relação ao inimigo alemão.

Doze números deste importante documento
foram colocados em circulação.
O primeiro número foi publicado em
10 de outubro de 1915;
O úlWmo em 17 de junho de 1916.
Fundadores Charles Hayet, Francis Casadesus
e Ernest Brodier
BnF Musique
Ligue Na/onale pour la défense de la Musique Française
(BnF. Mu. L.a. Ravel vol. 89, 184)

BENEDETTI, Danieli V. L.
Ravel e a Guerra.
Revista Música em PerspecWva,
vol. 4, n. 2. CuriWba: 09/2011, p. 39-66.

Fundador Charles Tenroc

Dentre os colaboradores os
compositores Vincent d´Indy,
Théodore Dubois, Camile Saint-
Saëns, Gustave CharpenWer,
Xavier Leroux, Charles Lecocq e
tantos outros.
“A Liga foi consWtuída conforme a
lei em sua assembleia de 10 de
março de 1916.”

Fes.val de
Musique Française

“Obje/vo inicial desses fes/vais é manifestar
nossa solidariedade para com os compositores
que, devido as obrigações militares encontraram-
se separados da vida arus/ca há quase dois anos.
Esses fes/vais serão organizados sem nenhum /po
de influência de Escola mas somente inspirando-se
no culto da Arte musical francesa. Eles realizarão a
união de todos os compositores, os mais ilustres,
encontrando assim um meio generoso de
manifestar seus sen/mentos de amizade aos
cadetes.” (La Musique pendent la guerre, 1916, p. 99)

Idealizador do projeto Francis Casadesus
Realização e funcionamento: Camille Saint-Saëns,
Albert Dalimier, Gustave CharpenWer, Jean
Richepin, Claude Debussy e Gabriel Fauré, Charles
Tenroc (fundador da Ligue Na/onale), Vincent
d’Indy, Alfred Cortot, André Messager, Alfred
Bruneau, Charles Hayet e Ernest Brodier.

Datas das 4 edições: 16/06/1916, 14/12/1916,
28/12/1916 e 17/06/1917 - BnF Musique
Fes/val de Musique Française
Fes/vals de Musique Française. In: La Musique Fes/vals de Musique Française. In: La Musique
pendent la guerre, 8bis, Numéro-Programme. pendent la guerre, n. 8ter, Numéro-Programme.
Paris: 14/12/1916. BnF-Mu Bp.106 Paris: 28/12/1916. BnF-Mu Bp.106
Fes/vals de Musique Française. In: La Musique pendent la guerre, 9bis,
Numéro-Programme. Paris: 17/06/1917. BnF-Mu Bp.106

Chants de Guerre des enfants de France – BnF, Musique
Can.ques, Rondes et Chansons- Can.gas, brinquedos de roda e Canções

Idealizado pelo educador Jean Vézère durante os anos de 1914 e 1915 .
Às crianças da França,
Vosso país foi invadido, vossas mães choram, vossos pais e
irmãos mais velhos lutam. Todos sofrem em torno a vós, e
vocês também. É muito di‚cil, sendo pequenos, nada poder
fazer por nossos caros soldados e ter que conWnuar a roWna
com vossas lições de escola e brincadeiras!.....
Este pequeno livro vem até vocês como um amigo. Possam os
cânWcos que ele vos traz ajudar a orar, de toda vossa alma,
àquele que nunca se recusou em favor dos pequeninos.
Possam as canWgas de roda e as canções patrióWcas que ele
vos oferece idealizar vossas brincadeiras, penetrando-as das
preocupações e esperanças do país, vos esWmular ao
reconhecimento em relação aos nossos heróis e vos fazer
amar mais ardentemente ainda nossa França.
(VÉZÈRE, 1915, p. 1)
Após a criação de obras que demonstraram um grande número de
inovações, abrindo novas perspecWvas para os instrumentos quanto
a inovações de Wmbres e sonoridades até então desconhecidos,
destacando-se a obra pianísWca de Maurice Ravel (Jeux d´eau, 1901;
Miroirs, 1904-05 e Gaspard de la nuit, 1908) e Claude Debussy (D´un
cahier d´esquisses, 1903; Reflets dans l´eau, 1904 e os Préludes
1909-1912), assim como suas obras orquestrais; as obras de guerra
parecem renunciar a grandes inovações adotando para estas
procedimentos e formas do passado nacional, fazendo assim o uso
de uma linguagem neoclássica.

Os procedimentos adotados na criação da produção musical francesa
durante os anos da Primeira Guerra Mundial poderiam ser resumidos em:
- interesse pelas tradições francesas do passado.
- interesse pelos mestres franceses do século XVIII como Jean-Phillipe
Rameau e François Couperin, pois seria com estes compositores que a
França, até aquele momento, conheceria o seu apogeu e marcaria a
História da Música com uma escola nacional.
- inspiração na linguagem e nas formas de composição usadas pelos
compositores do século XVIII.
- obras com caracterísWcas tonais.
- influência da corrente literária simbolista nos textos desWnados às obras
vocais, muitas vezes escritos pelos próprios compositores, na qual
notamos a importância e a necessidade destes de se expressarem
verbalmente sobre o conflito. Simbolismo usado igualmente nos Ztulos e
nas citações poéWcas que precedem algumas das composições, como
forma de enfaWzar a mensagem nacionalista destas.
- para estes compositores que lutavam pela criação de uma música dotada
de uma idenWdade nacional tais obras deveriam evitar todo Wpo de
influência vinda do país inimigo.
BENEDETTI, Danieli L. As Sociedades Musicais Francesas do
início do séc. XX: ideal nacionalista ou independência
arus/ca? OPUS, Revista da ANPPOM, vol. 16, n. 2. Goiânia:
dezembro de 2010, p. 102-112.

_________________. Société Musicale Indépendante – SMI,
sua fundação, sua bandeira e o testemunho da imprensa
especializada em torno de sua primeira temporada arZsWca.
CuriWba: Revista Vórtex, v.3, n.1, 2015, p.38-69.


Claude Debussy
22 de agosto de 1862
25 de março de 1918
by Félix Nadar 1908

(...) depois que limpamos Paris desses gringos, fuzilando-os ou expulsando-os, a
cidade imediatamente se tornou um lugar tão charmoso! (DURAND, 1927, p. 124)
Trecho de carta endereçada a Jacques Durand em 18 de agosto de 1914

O compositor escreve a Jacques Durand em 8 de agosto de 1914:
(...). Como você sabe eu não tenho nenhum sangue frio, menos ainda espírito
militar; adicione as lembranças de 70 [Comuna], que me impedem o senWmento
de entusiasmo, a inquietude de minha esposa, tendo o filho e o genro no campo
de batalha! Tudo isto faz com que a minha vida esteja tão perturbada...; o que
faço me parece tão miseravelmente pequeno! Chego a senWr inveja de SaWe, que
vai se ocupar seriamente na defesa de Paris como cabo. (LESURE, 1987, p. 257)

Carta endereçada a Igor Stravinsky em 24 de outubro de 1915:
...Nestes úlWmos anos, quando senW os miasmas austro-germânicos se expandirem
sobre a arte, eu desejaria ter mais autoridade para gritar minha inquietude, para
adverWr sobre o perigo que corremos, sem desconfiar. Como não adivinhamos que
essas pessoas tentavam a destruição da nossa arte, como eles preparavam a
destruição de nossos países? O ódio que sinto por esta raça vai até o úlWmo dos
alemães! ExisWrá um úlWmo alemão? Pois estou convencido que os soldados se
reproduzem entre eles. (LESURE, 1980, p. 266)

Se a guerra não pôde me aGngir fisicamente, ela me demoliu
moralmente: eu me perdi e minhas condições não me permitem
oferecer uma recompensa honesta a quem me reencontrar.
C. Debussy, carta ao amigo J. Toulet, 20/05/1917 (LESURE, 1980, 279)

ÚlGma fase criadora de Claude Debussy


-Six Epigraphes An/ques (1900/1914), piano a
quatro mãos;
-Berceuse Héroïque (1914), piano solo;
-Page d´album (1915), piano solo;
-En Blanc et Noir (1915), para dois pianos;
-Sonata para piano e violoncelo, Sonata para
flauta viola e harpa e Sonata para violino e
piano (1915 e 1916 revisão do 3º mov.);
-Doze Estudos (1915), piano solo;
-Noel des enfants qui n´ont plus de maisons
(1915), piano e voz/coro de crianças;
-Elégie (1915), piano solo.
Debussy escreve entusiasmado de Pourville, em 6 de outubro de
1915, a seu amigo Bernardo Molinari, pois certamente não esperava
mais compor com tamanha inspiração:

Imagine, caro amigo, que eu fiquei quase um ano sem poder fazer
música...Enfim eu precisei quase “reaprender” (termo usado por
Debussy). Foi para mim como uma descoberta, e ela (a música) me
pareceu ainda mais bela! (LESURE: 1987, p. 262)
As Sonatas
… na forma an.ga, flexível, sem a
grandiloquência das sonatas modernas
(LESURE, 1980, p. 262)

A instrumentação das três sonatas


restantes estava já claramente
fixada:

A quarta deveria ser para oboé,
trompa e cravo;

A quinta foi prevista para
instrumentos de sopro (trompete,
clarinete, fagote) e piano;

A sexta tomaria a forma de um
concerto composto por todos os
instrumentos usados nas cinco
sonatas.

12 Estudos
Dedicados à F. Chopin



Livro I
Livro II
Tem como objeWvo principal o
Trabalho de sonoridades e Wmbres
mecanismo digital


7. Pour les degrés chroma/ques
1. Pour le cinq doigs
8. Pour les agréments
2. Pour les /erces
9. Pour les notes répetés
3. Pour les quartes
10. Pour les sonorités opposées
4. Pour les sixtes
11. Pour les arpèges composées
5. Pour les octaves
12. Pour les accords
6. Pour les huits doigts

Algumas palavras...
Intencionalmente, os presentes estudos não contêm nenhum dedilhado; eis aqui,
em poucas palavras, a razão: um dedilhado imposto não pode logicamente se
adaptar aos diferentes formatos das mãos. A pianísWca moderna acreditou
resolver esta questão sobrepondo vários dedilhados; é somente um embaraço...
A música fica com o aspecto de uma estranha operação, onde, por um fenômeno
inexplicável, os dedos deveriam se mulWplicar... (...)
Nossos velhos mestres - eu quero lembrar nossos admiráveis “clavecinistes” –
nunca indicaram o dedilhado, confiaram sem dúvida, na engenhosidade de seus
contemporâneos. Ficaria mal duvidar da engenhosidade dos virtuoses modernos.
Para concluir: a ausência de dedilhado é um excelente exercício, suprime o
espírito de contradição, que nos leva a preferir não colocar o dedilhado do autor;
e confirma essas palavras eternas: “Nunca se é tão bem servido quanto por si
mesmo”.
Vamos procurar nossos dedilhados.
Claude Debussy

Tradução in: Benede|, 2013, p.95
Obras de Guerra – A produção musical francesa durante os anos da Primeira
Guerra Mundial – AnnaBlume/FAPESP, 2013.
Elégie (1915), piano solo
Pages inédites sur la femme et la Guerre
Música Vocal
Noel des enfants qui n´ont plus de maisons (1915),
piano e voz/coro de crianças (Lam - conclui M)
Doux et triste (84 cps.)
Claude Debussy
hlps://www.youtube.com/watch?v=iCVO7Pv6T5M

Trois Chansons
para coro misto sem acompanhamento (1915)
Os textos parodiam com extremo requinte as chansons francesas da Renascença e do
folclore basco infanWl, nos quais esboça, em um período de dificuldades, uma volta ao
passado que a Terceira República Francesa idealizava.
I. NicoleZe (Lam – conclui M)
II. Trois beaux oiseaux du Paradis (Fam)
III. Ronde (LaM) Bois d’Ormonde
Maurice Ravel

Organum melismá/co – sec. XII francês

A melodia contendo o texto, seria
formada por notas longas, enquanto a
voz ou vozes adicionadas com valores
mais curtos desempenhariam a função
de uma melodia secundária realizada
por notas vocalizadas.
As partes vocalizadas deveriam evoluir
por intervalos de quartas, quintas ou
oitavas com a melodia.


BENEDETTI, Danieli V. L. A música vocal francesa no
contexto da Primeira Guerra Mundial. In: Opus, Revista da
ANPPOM, Vol. 13, n. 1, pp.24- 39. Goiânia, 2007.

Obras de Guerra de
Maurice Ravel (1875-1937)

- Le Tombeau de Couperin, para piano solo


(1914-1917);
I – Prélude
II – Fugue
III – Forlane
IV – Rigaudon
V – Menuet
VI – Toccata

- Trio para piano, violino e violoncelo (1914);

-Trois Chansons para coro misto sem
acompanhamento (1915);

- Frontspice, para dois pianos e uma quinta
mão (1918).
•  Maurice Ravel (1862-1937)
Le Tombeau de Couperin (1914-1917), piano solo

1. Prélude - dedicada ao amigo e colaborador Jacques
Charlot;

2. Fugue - dedicada ao amigo Jean Crouppi;

3. Forlane - dedicada ao amigo Gabriel Deluc;

4. Rigaudon - dedicada aos irmãos e amigos Pierre e Pascal
Gaudin;

5. Menuet - dedicada ao amigo Jean Dreyfus;

6. Toccata - dedicada ao amigo Joseph de Marliave.
Le Tombeau de Couperin
Prélude – AB, comp. 12/16, Mim;

Fugue – a 3 vozes, comp. 4/4, Mim;


Forlane – ABACAD, forma rondó, comp.
6/8, Mim;
Rigaudon – ABA, comp. 2/4 - DóM;
Menuet – ABA, comp. 3/4 - SolM;
ToccaZa – comp. 2/4 – Mim, conclui M.

... nenhum monumento de glória poderia tão bem


honrar as memórias francesas quanto estes cantos
luminosos, estes ritmos claros e flexíveis, expressão
perfeita de nossa cultura e de nossa tradição.
(CORTOT, 1981, p. 288)

Le Tombeau de Couperin,
um documento histórico

La Forlane. In:La Revue Musicale.


Paris: 04/1914, pp.11-26

Autor: Jules Ecorcheville (1872-1915)
Maurice Ravel, maio de 1914
Carta ao amigo Cipa Godebski

Eu turbino [expressão usada para dizer que
trabalha intensamente] na intenção do Papa.
Você sabia que este augusto personagem (...)
acaba de lançar uma nova dança: a forlane.
Estou transcrevendo uma de Couperin [grifo
meu]. (CHALUPT, 1956, p. 106)
•  O cravo de François Couperin

-  252 Pièces de Clavecin divididas em quatro Livros


e organizados em 27 ordres, ou suítes, escritas
entre 1713 e 1730;
-  Quadro de Ornamentação de F. Couperin. In:
Premier Livre des Pièces de Clavecin, 1713;
-  Obra didá/ca L´Art de toucher le Clavecin (A Arte
de tocar o Cravo), publicada em 1717;
-  Forlane, dança que integra o 4º Concert Royale
-  Anne Sophie Ganvert - Estudo sobre as formas
musicais do século XVIII;
-  Entrevista com a cravista francesa Elisabeth Joyé,
especialista da obra para cravo de F. Couperin.
“Obras de Guerra"
•  Maurice Ravel (1875-1937)
•  Le Tombeau de Couperin
(1914-1917)
•  Danieli Longo, piano

•  Claude Debussy (1862-1918)


•  Sonate pour violoncelle et
piano (1915)
•  Danieli Longo, piano
•  Ji Yon Shim, violoncelo

•  Noël des enfants qui n´ont plus
de maisons (1915)
•  Danieli Longo, piano
•  Maria Cecília de Oliveira, voz
O interesse em resgatar as tradições do passado
vem ao encontro da necessidade, que toda uma
nação senWa de proteger um território, um
patrimônio, uma tradição e sobretudo um futuro
que deveria nascer. O cenário e a fonte inspiradora
são claramente advindos da Primeira Guerra
Mundial, e tais obras deveriam assim estar imbuídas
e traduzir o que poderíamos denominar música–
testemunho, música-alarme, preocupada em
apreender esse futuro que deveria nascer.
Danieli Verônica Longo Benede|
São Paulo, 23 de agosto de 2018
BENEDETTI. Danieli, V. L. Claude Debussy e o ano de 1915. In: Anais
do XVI Congresso da ANPPOM. Brasília, 2006, pp. 957-963.

_______________. Collage. In: Anais do XXI Congresso da ANPPOM.
Uberlândia – MG: 2011, p. 80-85.

_______________. Fron/spice, experiências... In: Anais do XVIII
Congresso da ANPPOM. Salvador, UFBA, 2008.

_________________. Ravel e a Guerra. Revista Música em
PerspecWva, vol. 4, n. 2. CuriWba: setembro de 2011, p. 39-66.

Le Tombeau de Couperin (1914-1917) de Maurice Ravel: obra de
uma guerra. Tese de Doutorado. São Paulo: ECA/USP, 2008

Você também pode gostar