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(4) FORMALISMO RUSSO E NEW CRITICISM Arnaldo Franco Junior ,ODUCAO Formalismo Russo e 0 New Criticism caracterizam-se pela defesa de uma abordagem nte da literatura, ou seja, definem seus principios e seu instrumental tedricos e, m, suas propostas metodol6gicas limitando o seu objeto de estudo e investigagio 3 ialidade do texto literatio. uados geogrifica € culturalmente ~ 0 Formalismo desenvolveu-se na Riissia entre 1915-17 € 0; a Nova Critica teve origem nos anos 1920-30, afirmando-se na América do Norte entre as de 1940 © 1950 — esses dois movimentos foram quase contemporineos um do outro, ido, na primeira metade do século XX, uma ruptura radical com a heranca da tradigio da € da historiografia literérias do século XIX (critica impressionista, psicologismo biografista; zretoricista). ach um A sua maneira, os dois movimentos foram, em seus respectivos contextos de agio ¢ freas de influéncia, decisivos para que a teoria literéria se firmasse como disciplina Por parimetros cientificos ao lado da Lingiiistica e das demais Ciéncias Humanas. nto num movimento como no outro, ainda que por perspectivas prOprias ¢ diferentes entre si, 1a base positivista que exige que as hipsteses de investigacio de um determinado objeto de =a literatura, no caso ~ sé se convertam em teses se a argumentacio ¢ a exemplificacio que as fam puclerem ser empiricamente comprovadas e demonstradas. Isso significa que tanto © imo Russo como o New Criticism elegem 0 texto literirio como limite e objeto privilegiado rellexdes, considerando os demais campos aos quais o texto literdrio se vincula como campos igagio secundaria c/ou suplementar. este capitulo, vamos abordar essas duas tendéncias da teoria ¢ critica literdrias, destacando de seus principais aspectos e contribuicées para o estudo da literatura O FORMALISMO RUSSO Entre 1914 € 1917, na Rassia, alguns estudantes fiamdaram o Circulo Lingiistico de (1914-15) e a Associagio para o Estado da Linguagem Poética (OPOIAz ~ 1917), ins isso, um campo para o desenvolvimento de estudos da lingua e da literatura, livre dos comp com a tradigio académica vigente na época € marcado pelo entusiasmo para com o cientii caracterizava a entio emergente disciplina de Lingtifstica na Rassia ¢, também, em out universitirios europeus. © Formalismo Russo desenvolveu-se contemporancamente &s pesquisas ¢ inovagées Futurismo Russo, que teve na poesia a sua ponta de langa de afirmagao dos valores dem modernista em arte. Seu contexto de eclosio est’ marcado por uma forte turbuléncia soi crise do regime czarista ¢ A cmergéncia da revolucio russa, que projetava a utopia de uma livre de classes sociais, capaz de abolir a propriedade privada e as limitag6es, estruturasehi comprometidas com a velha ordem econémica, sociocultural e politica — uma sociedad por um Estado democrético comprometido com os interesses coletivos da sociedade e ty suas agdes, pela racionalidade e pela ciéncia. Revolucio, igualdade, liberdade, sociedades democracia, participagio ativa na construgio da sociedade ¢ da histéria no sio mers 5 nlesse contexto; sio ideais que caracterizaram a agio de muitos dos que se comp com o objetivo de transformar a sociedade, de mudar a historia Pode-se dizer que 0 periodo heréico de combate ¢ afirmagio dos valores, idéiase dos formalistas russos (1914-17 ¢ 1923-25) coincidiu com 0 periodo herdico de afi utopias ligadas a0 projeto de construgio de uma sociedade comunista na — apés a rei 1917 — Unio das Repitblicas Socialistas Soviéticas (URSS). A ascensio de Josef Sti a partir de 1924, a consolidacio do stalinismo € a extensio de seus efeitos a todas asi da entio URSS (1924 — 1953) significou, para os formalistas e, também, para toda distorgio € o dilaceramento de boa parte das utopias projetadas como ideais dun herdica anteriormente citada, © Formalismo Russo pode ser, portanto, dividido em duas fases. A. primeira compe precisamente os anos de 1917 a 1923, momento de afirma abordagem cientifica da literatura diante de uma tradigio académica conservadora e resistente compreende os anos de 1923-25 e 1930, periodo de radicalizacio dos conflitos entre os uma abordagem sociolégica da literatura (¢ ideologicamente comprometida com os ideas di socialista ¢, também, com determinados interesses ligados a0 exercicio do poder pelo membros do grupo formalista, que recusavam e/ou negavam certos principios e pressup abordagem sociolégica. © ano de 1950 ntarca, segundo Schnaiderman “a condenagio piblcad do ‘formalisma’ [...] ¢ sua virtual interdicio” (1976, p. xvii), tendo, como efeito, o abandona} alguns dos membros do grupo e a limitacio dos que permaneceram “a estudos literdrios em estreito, e que nao implicassem em teorizagio” (1976, p. xvi). Feito esse breve histérico, vamos nos deter em alguns dos prinefpios ¢ conceit fandamentais do Formalismo Russo. Segundo Eikhenbaum (1976), 0 Formalismo Russo marcou-se mais. propria afirmagio de determinados principios na abordagem da literatura do que pela propos modelo sistematizado de teoria de cariter dogmitico. Nesse sentido, para os membros formalista, a metodologia sempre ocupou posigio secundaria diante da literatura como) estudo. Os formalistas, segundo Bikhenbaum (1976), nunca hesitaram em transi princfpios ¢ conceitos, caso tal necessidade se impusesse, em razio do estndo de determi ou problema literério. Isso explica 0 fato de que, lidos em conjunto, os estudos apresentam certas nuances e diferencas no que se refere a utilizagio de alguns mesmos pi conceitos tedricos na abordagem de textos e problemas literirios distintos. Dentre os mais importantes principios formalistas, destaca-se a preocupagio com a Ja materialidade do texto literério, que recusi, num primeiro momento, 3s explicag (4) Forwatismo Russo © New Carrrersu A flosotta, a sociol am servi de ponto de partida para a abordagem da obra literati. Hla podria conter esta ow aquela filosotia, refleir esta ov aquela opiniao politica, 2. a psicologia, ete, nio p ponto de vista do estudo litersrio, o que importa era 0 priom, 0% pracesso, isto é, a principio da finindo, com ‘ngimizacio da obra como produto estético, jamais um fator externo (SCHNAIDERMAN, 197%, pix). pmpromissos ificismo que (0s formalistas preocupavam-se cm investigar ¢ explicar o que faz de determinada obra uma obra 1105 nticleos feria, Nos termos de Jakobson: [Apocsia élinguagem em saa furgio esttia, Beste modo, o objeto do estudo lnersrio rio € a literatura, mas a iterariedade, isto 6, aquilo que tora etcminada obra uma obra lterivia, (..] Tudo servia para oe historizdoees da lterturat of costumes, 2 coogi, a politic, a ftesofis, Ens lugs de um estado da hterator,etivaese wm conglomenado de disciplinas nm-acabadas, Pareciase esquecer qne estes elements percencem 3s eléncias correspondents [.] € que ests fc hierarquias, akimss pode, naturalmente, utlizertamioém os monwentosliterSrics como documentos defeituoies ¢ de Se womulads 4 | seginds ordem. Se o estudo da lterara quer tommarse uma cgncia, cle deve reconhecer 0 processo”comno seu pic rogulady nico her6" (AKOBSON, 1921 apud SCHINNDERMAN, 1976, p. be ps estéticas do, hegulado, em sem classes, palavras ou prometeram O termo priom, que Schaiderman traduz como proceso, ficou mais conhecido entre nés como frlinente. Trata-se de um dos mais importantes conceitos dos estudos formalistas, ¢ foi definido Bain famoso ensaio de Chklovski (1976): A arte como procedimento Nese ensaio, Chklovski (1976) reitera a idéia de Jakubinski de que hé uma distingio entre a i € propostas : zua prosaica, A linguagem poética seria distinta da linguagem Giana porque nela a fungio referencial nio se reduziria a0 utilitarismo pragmético nem a0 atismo que caracterizatn esta dltima. A linguagem poética se caracterizaria exatamente pela 1 dda percepgio que se encontra camo que adormecida pelo hibito e pela E cis que para devolver a sensagio de vida, para sentir os objetos, para pravar que pedra & pedra, existe 0 que se chama arte. O objetivo da arte € dar a sensagio do objeto como visio c nio come reconhecimento: 0 procedimento da arte € o procedimento da singuisrizagio ds objetos e © procedimento que consste em ‘obscurecer a forma, aumentar a dificuldade e 2 duracio da percepsio; a arte & um meio de experimentar 0 |» devir do objeto, o que é jf "passado” nio importa para a arte (CHKLOVSK!, 1976, p, 45) panidirios de ida revolugaa’ fote-se, na distingio entre rvonhecimento e visio, a oposigio entre automatismo ¢ percepgio p Estado) © 03 tizada. Segundo ChKlovski (1976), a arte se caracteriza por procedimentos de constracio que i por meio da desautomatizagio da percepcio adormecida pelos hibitos coticlianos, oferecer 20 seu tio uma percepcio mais rica em informages sobre os temas ou assuntos de que tt, Tal visa € ago cua funcio€ oferecer novas informagdes sobre emascobjetns que integram a experiencia lana, mas se encontram como que neutralizados pelo astomatismo da percepeio. procedimentos de singularizacio promovem algo como uma “crise” nos hibitos que regula mportamento humano regido pelas leis da linguagem cotidiana, dificultando, deslocando ow Btomando tais habitos de modo que o receptor da obra seja obrigado a rever as suas expectativas pnceitos e, também, a sua prépria percepcio do mundo. Sio, portanto, os procedimentos de gio que, segundo Chklovski (1976), definem a especificidade da linguagem poética ou 8, Comparem-se, por exemplo, os seguintes textos: ia na Sé ‘ent fe Alessandra P. Caramori Je lembco daquele beijo em plena praga fil ta cidade quando os sinos da igteja Re Nossas linguas Um sino. E dois badalos 95

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