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FERREIRA, Gabriel P. P. Não Fale em Crise, Trabalhe. Versão Final PDF
FERREIRA, Gabriel P. P. Não Fale em Crise, Trabalhe. Versão Final PDF
CURITIBA
2017
GABRIEL POMPEO PISTELLI FERREIRA
CURITIBA
2017
AGRADECIMENTOS
Não me cabe dar a estas páginas que seguem valor maior do que merecem: é apenas
uma monografia, sem pretensão de querer revolucionar e nem chocar o mundo com sua
publicação. Mas, por menor que seja este feito, ele não poderia existir sem a ajuda de tantas
pessoas, às quais sou grato por terem me apoiado em vários momentos específicos desta
trajetória.
Quero primeiro, agradecer aos meus pais por me darem a oportunidade de focar em
meus estudos e por sentirem tanto orgulho imerecido deste incompleto sociólogo. Mesmo que
eu role meus olhos quando algum deles me sugere pesquisas das quais não tenho interesse
algum ou me pedem para resolver uma questão sociológica de extrema complexidade em dez
minutos – como se o saber sociológico fosse originado de um despreocupado gole de cerveja
–, devo confessar a importância de seu entusiasmo para me dedicar aos estudos. Claro, o
grude constante de minha mãe (o qual já pode ser considerado naturalmente alto, mas se
intensificou diante da ausência do Pedroca) não foi de muita ajuda na condução desta
monografia, mas sua prontidão em parar de me chamar quando falava que estava focado na
escrita do TCC me rendeu certa gratidão – e algumas horas a mais no trabalho, também.
Devo agradecimentos, também, a meu irmão gêmeo, Pedro, carinhosamente chamado
de “Pedroca”, companheiro de sonhos socialistas e de interesses sociológicos – mas que,
infelizmente, se perdeu no “labirinto andradiano” do direito, para acabar parando em Brasília,
por ora –, sempre presente com discussões sobre sociologia, marxismo e esta mesma
monografia aqui apresentada. Embora não sejamos muito de falar sobre isso, só gêmeos
próximos como nós podem dizer quanto sofrimento esta distância nos causou. Ah, e claro,
não podia deixar de agradecê-lo, por, nos agradecimentos de sua monografia, colocar um
nível melodramático dificílimo de igualar, do qual não tenho a menor pretensão de superar.
Não há como deixar de falar da minha mãe do coração, Ivone, pelos almoços no
domingo, a companhia no cafezinho da tarde e sua presença constante apesar de suas horas
muito loucas de trabalho – quem a conhece sabe como ela gosta de dormir num sofázinho,
depois de um longo dia de trabalho. Também devo agradecer à minha irmãzinha de coração,
Neli, quando nos brindou com sua presença aqui em casa e recebeu-me com todo carinho em
sua casa.
À amiga Ana Paula também devo imensos carinhos e agradecimentos, por estarmos
tanto tempo juntos neste semestre meio diferente, pelas risadas com histórias da família e
vídeos do youtube finalizado com um novo caminho para nós dois.
Dentro da faculdade de sociologia, enquanto um marxista meio perdido, devo
agradecer à professora Bridi por aceitar a orientação deste modesto trabalho, pela sua
paciência com minhas trapalhadas, demoras e inexperiência sociológica. No último semestre,
em especial, devo reconhecer a importância não apenas de sua presença, mas também dos
outros integrantes do GT da Reforma Trabalhista, todos eles essenciais para me ajudar a trazer
questões e novas possibilidades de pesquisa sobre este tema. Agradeço, também, à banca pela
leitura e avaliação do trabalho, ajudando-me nesta etapa tão importante da minha graduação.
Dentre os amigos do curso, devo especiais menções ao Filipe Klupel, meu parceiro
dos trabalhos de sociologia, e ao Junior Adriano, companheiro de longas e demoradas
discussões de sociologia, por estarem sempre por aí na reitoria para batermos um papo.
Também agradeço àqueles que estiveram comigo, mas que perdi “na poeira das ruas”, seja
por irem para outras áreas, trocarem de curso – como eu – ou simplesmente seguirem suas
vidas.
E, por fim, como não poderia deixar de ser, devo interminavelmente ao povo brasileiro
por garantir meu estudo numa universidade gratuita com a função de servi-lo; devo aos meus
professores, imprescindíveis na minha formação; devo àqueles que lutam todos os dias contra
os ataques ao serviço público e aos direitos da população brasileira, como o que estudo nesta
monografia; e, em especial à classe trabalhadora, que tudo produz.
Um bom propagandista
Transforma um monte de esterco em local de veraneio.
Quando não há manteiga, ele demonstra
Como um talhe esguio faz um homem esbelto.
Milhares de pessoas que o ouvem discorrer sobre as auto-estradas
Alegram-se como se tivessem carros.
No túmulo dos que morreram de fome ou em combate
Ele planta louros. Mas já bem antes disso
Falava de paz enquanto os canhões passavam.
O poeta
declina de toda responsabilidade
na marcha do mundo capitalista
e com suas palavras, intuições, símbolos e outras armas
promete ajudar
a destruí-lo
como uma pedreira, uma floresta,
um verme
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................13
2. INDÚSTRIA BRASILEIRA E SUA NOVA FORMA CONTEMPORÂNEA NO
CONTEXTO DA “ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL”: ANOTAÇÕES
PRELIMINARES..............................................................................................................18
2.1. TRANSFORMAÇÕES CAPITALISTAS E CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO DA
INDÚSTRIA NACIONAL.................................................................................................20
2.2. O EMPRESARIADO INDUSTRIAL, A POLÍTICA NA REDEMOCRATIZAÇÃO E AS
NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO: MUDANÇAS NO MERCADO DE
TRABALHO DIANTE DA CORRELAÇÃO DE
FORÇAS.............................................................................................................................26
3. A LEGISLAÇÃO TRABALHISTA PARA A CNI: BASES
IDEOLÓGICAS................................................................................................................33
3.1.DESENVOLVIMENTO, CRESCIMENTO E
INDUSTRIALIZAÇÃO......................................................................................................35
3.2. E O TRABALHO COM ISSO? EVOLUÇÃO DA CONJUNTURA PARA A
INDÚSTRIA.......................................................................................................................44
3.3.PONTOS E MEDIDAS DEFENDIDAS PELA ENTIDADE...........................................53
3.3.1. SEGURANÇA JURÍDICA: TERCEIRIZAÇÃO E NEGOCIAÇÕES
COLETIVAS................................................................................................................58
3.3.2. CUSTOS DO TRABALHO E PRODUTIVIDADE.....................................................63
4. “NÃO FALE EM CRISE, TRABALHE”: O PARADIGMA DA CNI SOBRE AS
RELAÇÕES DE TRABALHO........................................................................................69
4.1.O PARADIGMA DA CNI SOBRE O SISTEMA DE RELAÇÕES DE TRABALHO E O
CONTEÚDO DE SUA REFORMA
TRABALHISTA.................................................................................................................70
4.2. A PERSPECTIVA DA “MODERNIZAÇÃO TRABALHISTA” E A CRÍTICA DOS
ESTUDIOSOS DO TRABALHO: REFORMA TRABALHISTA DO GOVERNO
TEMER...............................................................................................................................77
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................84
13
1. Introdução
No dia 13 de Julho de 2017, a Reforma Trabalhista (PL 6787/16) foi sancionada pelo
presidente da república, Michel Temer, bastando 120 dias para entrar em vigor para todos os
contratos trabalhistas. Em um evento de solenidade, cercado por ministros, empresários e
juristas, o presidente se vangloriou: “ninguém tinha a coragem e a ousadia” para modernizar a
legislação trabalhista, mas ele o fez, “revolucionando o país” (UOL, 2017).
Enfrentando vários obstáculos – dentre eles, escândalos de corrupção, ocupações,
briga entre senadores, sessões suspensas, gafes em falas internacionais, manifestações
silenciadas pela repressão e uma greve geral –, a nova legislação trabalhista passou na Câmara
e Senado, sobrevivendo aos seus oposicionistas. Após passarem por um verdadeiro roteiro
digno de série dramática, os presentes no evento destacavam a “vitória” do povo brasileiro.
Estava (finalmente!) aberto o caminho para a modernidade – o éden paradisíaco das
terras “atrasadas” como a brasileira –, onde o diálogo entre patrão e empregado, o pleno
emprego, a formalização das relações trabalhistas e os avanços na produtividade garantiriam a
alegria e felicidade de todos; enfim, encaminhava-se ao final feliz da história.
Tal cenário, por mais que contasse com o apoio de poderosas figuras – como o
empresariado brasileiro –, chegou, de fato, a ser ameaçado: não por causa do Congresso –
completamente cooptado pelo presidente – ou, ainda, dos clamores das ruas – tranquilamente
ignoradas pelos homens de terno do Palácio da Alvorada –, mas pela incapacidade do governo
Temer garantir sua segurança, sendo alvo constante de acusações e investigações.
Apesar dos pesares, apoio nunca faltou ao seu governo por parte daqueles que
enxergavam a ousadia de seu presidente: mesmo com malas perdidas e encontros escusos no
Palácio do Jaburu, empresários defenderam que o presidente “não cometeu um pecado
mortal”, reforçaram a divisão entre a economia e a política e, claro, pediram efusivamente a
continuação das chamadas “reformas estruturais” capitaneadas pelo governo (ESTADO DE
SÃO PAULO, 2017).
Em tempos de profundo desgaste político, movimentado ao som da insatisfação
popular com nossos políticos – exigindo ética e responsabilidade –, a orquestra da justiça
contra os saqueadores do Brasil, conduzida pela raivosa percussão de batidas de panela,
magicamente se silenciou. Se, no final de 2015, a FIESP levantava seu pato amarelo na
Paulista, bradando contra o “golpe” dado pelo governo Dilma no Brasil – como diria seu
presidente, Paulo Skaf –, em Junho de 2017 o mesmo grupo afirma “não poder opinar” sobre
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a saída de Michel Temer do poder, restando apenas “defender reformas estruturais para
recuperar a competitividade” (FIESP, 2015; O ESTADO DE SÃO PAULO, 2017).
Esta variação de pesos e medidas para dois diferentes representantes políticos – que,
antes, participaram do mesmo governo – revela consideravelmente o valor conferido às ditas
“reformas estruturais” defendidas amplamente por representantes do mercado e da iniciativa
privada. Esses atores parecem tentar convencer a opinião pública do fato de que o futuro da
nação depende das reformas por eles propostas: como lembra Antonio Casemiro (2011), a
lógica da austeridade se apoia numa profunda ideologia do medo. Porém, a formulação
discursiva destes agentes parece esquecer que existiram várias reformas na base do Estado
brasileiro – muitas delas apoiadas e conduzidas por eles mesmos, como, por exemplo, a
política de austeridade fiscal inaugurada pelo segundo governo Dilma – e, principalmente, dos
direitos trabalhistas no Brasil, os quais, desde a ditadura militar de 64, vêm sofrendo
sucessivos golpes.
Sendo assim, torna-se inevitável que, neste turbilhão de chavões e clichês exagerados,
surja a seguinte questão: por que, depois de tantas sucessivas mudanças na legislação
trabalhista brasileira, articula-se uma nova reforma trabalhista – e, ainda, uma reforma de
conteúdo tão regressivo para a classe trabalhadora (regularização da terceirização, prevalência
do negociado sobre o legislado, trabalho intermitente, etc.)? A resposta para esta questão não
estará presente neste trabalho (sequer é possível respondê-la completamente), cabendo a ele
apenas esboçar novas possibilidades de aproximação à questão, mas ela pode ser considerada
uma importante bússola na condução aos problemas da reforma trabalhista.
Um dos caminhos que nos ajuda na compreensão do motivo desta reforma trabalhista
estar colocada em pauta e ser tão fortemente propagandeada pelo governo é o estudo das
argumentações dos grupos que se mobilizaram pela aprovação desta reforma. E, dentre estes,
destaca-se um agente privilegiado: a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), não apenas
pela grande e duradoura quantidade de material produzido sobre o tema, mas também pela sua
profundidade argumentativa, e influência nos outros grupos (por exemplo, muitos deputados,
para fundamentar seus votos sobre o tema basearam-se em estudos da própria entidade).
Diante desta situação, acredito que o estudo da visão da Indústria acerca da reforma e
relações trabalhistas no Brasil é um caminho recheado de possibilidades de pesquisa. Tendo
15
como objeto a relação entre a reforma trabalhista e seus atores, pode-se ampliar a visão desta:
ela surge não mais apenas como um fenômeno legislativo ou, ainda, como uma reformulação
das relações de trabalho, mas também como ideologia. E tal proposta de estudo da ideologia
por trás da reforma trabalhista não se propõe a dizer apenas sobre o que ela seja,
objetivamente, mas também do que ela significa para os atores que a defendem – e o que se
coloca em disputa nesta discussão.
Sendo assim, minha proposta é que esta reforma trabalhista pode ser explicada pela
própria concepção dos agentes que a defendem: a burguesia industrial brasileira, ao defender
esta reforma, apresenta também seu conteúdo. Antes de querer definir o que ela é a partir de
análises legislativas, empíricas, etc., é possível defini-la pelo discurso dos agentes que a
conceberam anteriormente. Ali está uma chave para a compreensão do sentido desta reforma,
suas ambições e promessas, que, às vezes, por estar longe do método predominante da
sociologia do trabalho – focada em dados empíricos coletados no trabalho de campo –, não é
tão explorada1.
A resposta sobre a reforma trabalhista, sem usar o trabalho de campo, pode ser
complicada, mas a interpretação dos atores em torno dela talvez não o seja tanto – e continua
sendo, ainda, uma afirmação válida sobre este objeto. Então, os problemas que pretendo
resolver aqui não serão desprovidos de materialidade e, mais ainda, propõem a descoberta de
fatos objetivos sobre o objeto de estudo. Mesmo que se realize a defesa de uma figura distinta
da reforma do que ela de fato é – ao menos para a sociologia do trabalho –, o seu discurso
pode apresentar uma representação da realidade que, dita, revela o seu próprio agente (e,
conhecendo o agente, reconheço o objeto)2.
1
Isto se deve mais às características de pesquisa desenvolvidas dentro do campo da sociologia do trabalho
propriamente dita do que a uma limitação metodológica clara e explícita. Sociólogos do trabalho também
realizaram, historicamente, pesquisas documentais, como, por exemplo, Boltanski e Chiapello (2007), que
pesquisaram o novo espírito do capitalismo através, principalmente, dos livros e manuais de gerência lançados
em defesa do “trabalho em rede”. A pesquisa destes autores, assim como esta aqui apresentada, foca-se nos
meios de reprodução da sociedade capitalista, ou seja, na superestrutura, que jamais deixa de se dissociar da
infraestrutura, mas guarda, com relação a ela, relativa autonomia (ALTHUSSER, s.d.d.; GRAMSCI, 1980).
Desenvolverei melhor, mais à frente, minha posição com relação à questão do discurso e ideologia, infra e
superestrutura, mas, por ora, basta notar, nesta nota de rodapé, que meu objeto empírico é diferente daquele da
maioria dos pesquisadores do trabalho: não é a condição material do trabalho, mas a sua forma na ideologia de
um grupo específico.
2
Aqui, é preciso ressaltar o fato de que a linguagem, transformada em discurso e que se corporifica em
ideologia, não se separa do sujeito: ela só existe a partir dele. Em palavras marxistas, a “verdade” – como
propunham os filósofos neohegelianos – não existe dissociada de seu mundo real e daquele que fala (ENGELS;
MARX, 2007).
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A questão que deve surgir, a partir desta definição, num aspecto metodológico das
ciências sociais, justamente, é: como conhecer e coletar elementos deste discurso sobre o
objeto em questão? Na análise sociológica, este caminho se faria possível por duas frentes:
primeiro, com a realização de entrevistas com os agentes a serem estudados; e, segundo, com
a análise documental de textos produzidos por este grupo (RICHARDSON, 2012). Ambas as
perspectivas são válidas, mas cada uma exige do pesquisador uma série de cuidados e
dificuldades específicos3. Pela riqueza da produção teórica dos atores estudados, escolhi o
segundo caminho a ser seguido nesta pesquisa, atentando-me na reconstrução dos elementos
argumentativos deste grupo4.
3
Se é fato que, na entrevista, não se deve esperar encontrar a informação em sua forma “crua”, uma vez que esta,
inevitavelmente, passará por uma sequência de “máscaras” nas quais o entrevistado tentará ganhar a simpatia e
reconhecimento do entrevistador – em especial dependendo da forma que este surge para aquele –, na análise
documental sugerida esta questão se encontra em estado pétreo: toda produção se esforçará pela simpatia do
leitor, tentando convencê-lo da validade de suas teses. E é nesta condição que se pretende desenvolver a
pesquisa, como já foi dito: é a tentativa de convencimento e os enunciados de verdade que me interessam na
pesquisa, para conseguir compreender não o fim último da empreitada (o qual, numa ordem social capitalista,
deve ser o maior lucro possível sem abalar as estruturas de dominação e exploração), mas os meios e os símbolos
em que se busca realizá-lo. Por isso, tomando este cuidado teórico-metodológico, optei pelo estudo documental.
4
É necessário ressaltar que, para conseguir informações profundas sobre o tema, que saíssem do superficial e
senso comum estabelecido pelos atores e sua plateia (GOFFMAN, 1985), neste método, seria preciso um longo
período de trabalho de campo, com método próximo à etnologia, do qual não disponho condições de realizar –
ao menos neste presente momento. É por isso que segui a proposta da análise do discurso foucaultiana: nela, o
que interessa não é desvelar o não-dito, mas, antes, revelar por trás do dito um poder-saber, uma enunciação de
verdade, que, ideologicamente, justifica e perpetua as relações de poder entre um grupo e outro (FOUCAULT,
1999).
17
profundamente nos documentos em questão, detendo-se nas suas concepções gerais sobre o
capitalismo contemporâneo e a estratégia defendida pela indústria brasileira para avançar
nela, nas ideias deste grupo sobre o mercado de trabalho brasileiro e sua legislação, como
também nas propostas defendidas por eles para atingir seus objetivos; e, por fim, no terceiro
capítulo, defino o paradigma das relações trabalhistas defendidas pela CNI e as questões
levantadas pela sociologia do trabalho acerca do tema.
Para responder estas perguntas, foram coletados documentos no site oficial da CNI
(portaldaindustria.com.br), dentre os quais selecionei e dividi em diferentes categorias.
Tendo-se em vista a grande variedade de documentos disponibilizados no site, foquei-me em
escolher aqueles que contivessem posicionamentos explícitos da entidade em torno do
mercado de trabalho contemporâneo do Brasil (com isso, documentos que não tratam sobre o
assunto foram excluídos, assim como documentos puramente estatísticos e outros – que,
embora fundamentem seus posicionamentos, não demonstram aspectos ideológicos).
Organizei o conjunto dos documentos analisados em um quadro, exposto no capítulo
2. Optei em começar a analisar as perspectivas gerais da CNI sobre a economia brasileira (e as
relações de trabalho), visando formar a base ideológica destes sobre a nossa sociedade e
condições da indústria, para, em seguida, analisar suas propostas e divulgações em torno do
tema em si. Este caminho assim foi definido para conseguir unir a compreensão ideológica da
reforma trabalhista com os efeitos esperados e argumentos mobilizados pelo grupo em
questão para defendê-la. Espera-se, com esta esquematização, garantir uma melhor
compreensão do desenvolvimento das noções deste grupo econômico sobre o tema analisado,
dentro do contexto histórico de mudanças econômicas e sociais em nosso país.
Porém, antes de entrar na análise direta dos documentos, conforme já antecipei,
precisa-se esclarecer a nova forma assumida pela burguesia nacional durante a
redemocratização, assim como a da entidade da qual tiramos nossas fontes, e suas condições
de organização e produção do seu discurso.
18
aspecto geral deste discurso, suas transformações no período recente e o significado destas
mudanças.
Isto é, apresento como o contexto de atuação da CNI se transforma, exigindo-se a
variação do discurso por conta da necessidade da reprodução do poder, mediatizada tanto
pelas transformações materiais nas condições capitalistas quanto pela variação na correlação
de forças. Isto significa que, aqui, devo repensar a produção ideológica do empresariado: ela
não é a representação imediata de seus interesses, mas, antes, uma produção discursiva com o
objetivo último de reproduzir as relações de poder existentes. Quer dizer, ela é uma
intersecção entre a ideologia e o discurso: ao mesmo tempo em que postula sua visão de
mundo e seu posicionamento neste, o faz de forma cuidadosa, atendendo aos controles
discursivos presentes na sociedade contemporânea5.
Dito isto, é preciso pensar os posicionamentos da indústria não como ideias avulsas,
fruto imediato, desconexo e voluntarista da cabeça de integrantes da classe empresarial. Não
se misturam aqui apenas interesses e vontades, mas também visões de mundo, construídas a
partir de um sistema de poder-saber que se exerce também sobre as ideologias e permite,
através da construção de verdades, reproduzir as relações de classe existentes no país – as
quais, ao mesmo tempo em que são formadas por este discurso, também o formam, numa
relação dialética (FOUCAULT, 1999; GRAMSCI, 1980; GRAMSCI, 1978; FIORIN, 1998).
Tal constatação vale a pena ser feita para justamente tomar-se um cuidado
metodológico na análise da gramática destes grupos: eles não falam o que falam como uma
representação exata de sua essência (cf. introdução), assim como não possuem estas ideias
fixas em suas cabeças – elas são frutos direto de suas construções e desenvolvimentos
5
Creio ser possível dizer que a diferença entre ideologia e discurso está mais no alcance das ideias pronunciadas:
enquanto a ideologia surge em determinados discursos, ela não é discurso apenas, porque é, também, uma visão
de mundo inserida na mente das pessoas (ou seja, é parte de uma perspectiva macro da sociedade); o discurso,
por outro lado, mesmo que às vezes seja “contaminado” pela ideologia, é o meio pelo qual ela se expressa, seja
em um texto, uma fala, uma produção artística, etc., mas muitas vezes também é realizada sem o objetivo de
transformar a realidade ou interpretá-la em uma escala macro (pelo contrário, o discurso se marca pelo seu
elemento micro e pela sua casualidade – isto é, não é e não pode ser controlado da mesma forma que a ideologia,
sendo mais circunstancial e “poroso”). Sendo assim, enquanto a ideologia precisa necessariamente tratar sobre os
sujeitos que compõem a sociedade e suas relações (em especial as de classe, pelo objeto que me proponho a
estudar), o discurso não: ele depende, antes do acontecimento, isto é, das condições de sua produção discursiva.
Por isso, mesmo que o controle do discurso trate inevitavelmente sobre o poder, mais especificamente sobre a
capacidade de produção da verdade, a ideologia trata sobre o poder material das relações de classe,
especificamente, o que significa que ela já é manipulada, anteriormente, pelo controle discursivo, mas aceita
jogar este jogo em torno de uma disputa sobre o domínio do futuro da comunidade (nas sociedades modernas e
contemporâneas, isto se confunde com o controle do Estado). Mais sobre esse elemento pode ser encontrado em
ENGELS, MARX, 2007; ALTHUSSER, s.d.d.; GRAMSCI, 1978; GRAMSCI, 1980; EAGLETON, 1997;
LOWY, 2000; FOUCAULT, 1999; FIORIN, 1998.
20
6
A ideologia, portanto, não pode ser confundida com aquela sua interpretação inicial, que se aproximava à ideia
de “falsificação”, mas deve se aproximar de uma interpretação que a entenda tanto como uma visão de mundo,
no sentido de que permite entender e interpretar os acontecimentos que estão à sua volta, quanto um
posicionamento em torno destas relações sociais (por exemplo, uma ideologia socialista tende a enxergar e a
condicionar a percepção da luta de classes e, com isso, condiciona o sujeito que dela partilha um posicionamento
específico sobre o mundo) (EAGLETON, 1997).
21
7
Podem-se notar três grandes paradigmas da economia crítica latino-americana, tratando deste tema: primeiro,
uma noção desenvolvimentista, próxima à CEPAL em seus primeiros anos de pesquisa e ao ISEB, que defendia
a substituição de importações e enxergava na ausência de um esforço industrializante o motivo do
subdesenvolvimento; segundo, as teorias da dependência, tanto em suas vertentes marxistas quanto weberianas,
que viam na integração subordinada do Brasil na economia mundial o fundamento do subdesenvolvimento; e,
por fim, uma terceira corrente, marcada pelo desenvolvimento do pensamento cepalino integrado às novas
questões da dependência, ligados à escola de Sociologia de São Paulo. Para entender melhor suas diferenças, cf.
BRESSER-PEREIRA, 2010.
22
o aumento de sua taxa de lucro para reproduzir sua existência8. Contudo, a análise marxista
acrescenta um ponto essencial para este trabalho: a exploração. Uma vez que a classe
trabalhadora é aquela que, materialmente, produz as mercadorias para os capitalistas, é ela
quem cria a riqueza deste modo de produção, o que, por um lado, o possibilita e, por outro, o
debilita, uma vez que fundamenta toda sua possibilidade de reprodução nesta relação
antagônica (MARX, 2013). Por isso, esta exploração também necessita de uma dominação,
que contenha a revolta da classe trabalhadora contra esta situação.
Aplicando-se estas questões à minha pesquisa, devo reconhecer que a classe industrial
compõe, de fato, uma fração de classe da burguesia9, e seus intelectuais orgânicos tem como
grande objetivo não apenas ou necessariamente a expansão da exploração – o capitalismo
pode, também, aumentar os lucros sem aumentá-la, mas, para isso, precisa-se ter um nível de
acumulação minimamente elevado (cf. MARX, 2013) --, mas a manutenção desta
calculabilidade das relações capitalistas, a garantia de sua competitividade com outros
capitalistas (o que, de uma forma ou de outra, pode levar à busca pelo aumento da taxa de
exploração da força de trabalho) e a manutenção da dominação da classe trabalhadora 10.
Pode-se dizer, então, que as articulações deste grupo tendem a levar consigo estes três
objetivos na sua produção discursiva e na escolha de seus programas e ações políticas.
8
Neste caso, a acumulação não equivale à salvação, como no modelo weberiano de análise das religiões
protestantes, mas ao poder. Esta diferença de interpretações pode ser notada, por exemplo, se considerarmos a
distinção que Weber realiza entre as três esferas (classe, partido e estamento), enquanto Marx prefere pensar o
próprio modo de produção capitalista como uma forma de dominação das classes trabalhadoras, em geral sempre
associado ao Estado. Sobre isso, veja-se: MARX, 2013 e WEBER, 1982.
9
Boito Jr. apresenta a diferença entre a “burguesia interna brasileira”, a qual seria uma “posição intermediária
entre a antiga burguesia nacional, passível de adotar práticas anti-imperialistas, e a velha burguesia compradora,
mera extensão do imperialismo no interior desses países” (BOITO JR, 2012b, p. 67) e o “grande capital
financeiro internacional”, incluindo, neste, “a fração burguesa brasileira perfeitamente integrada e subordinada a
este capital, setores dos grandes proprietários de terra e a alta classe média, principalmente aquela alocada no
setor privado mas, também, no setor público” (BOITO JR., 2012a, p. 4). O que marca a diferença entre estas
burguesias, então, no contexto contemporâneo, é que “A grande burguesia compradora tem interesse na
expansão quase sem limites do imperialismo, enquanto a grande burguesia interna, embora esteja ligada ao
imperialismo e conte com a sua ação para dinamizar o capitalismo brasileiro, procura impor limites àquela
expansão” (BOITO JR., 2012b, p. 75). Por isso, a grande burguesia nacional “reúne setores variados – grupos
industriais, bancos, agronegócio, construção civil e outros” (BOITO JR, 2012b, p. 77), tendo como base de
identificação a sua tendência a exigir um controle mínimo do avanço do capital internacional sobre o país.
10
É preciso afirmar que, de fato, não é a classe empresarial que garante esta dominação da classe trabalhadora –
cabendo este papel muito mais a outras frações da classe dominante –, mas, por outro lado, isto não significa que
ela não atue pensando na satisfação das classes subordinadas: basta ver a constante defesa da conciliação entre
estes dois polos em seus documentos, apresentados no segundo capítulo. Ou seja, ela ainda precisa atuar de
acordo com a hegemonia e o consenso geral da sociedade, por mais que se dissocie dos grupos subalternos
(GRAMSCI, 1980)
23
Entretanto, o capitalismo, por mais que mantenha sua forma essencial – que é esta
apresentada acima –, ainda exigirá que seus sujeitos ajam de acordo com o nível de
desenvolvimento das relações capitalistas em que estes grupos estão inseridos. Além disso, a
evolução histórica do capitalismo prova a sua transformação no tempo, em especial no seu
modo de acumulação (HARVEY, 1993). Ou seja, a exploração capitalista, em si, permanece a
mesma (mais-valia do trabalho assalariado), mas a forma pela qual se realiza esta exploração
se modifica (isto é, como se acumula, transforma-se mais-trabalho em mais-valor,
acumulação). Harvey distinguiu dois modos principais, posteriores ao modelo clássico do
capitalismo (ainda limitado pelo nível de desenvolvimento de suas forças produtivas e
disputas políticas com a aristocracia) analisado por Marx: o regime de acumulação fordista,
surgido a partir da década de 1930, e o flexível, iniciado na década de 1970.
Enquanto o “fordismo” se associava à segunda revolução industrial (petróleo, energia
elétrica, etc.), produção extensiva e para estoque, popularização do trabalho assalariado típico,
hierarquia empresarial, expansão da empresa em filiais, etc., o “flexível” se marca pela
terceira revolução industrial (microeletrônica, informática, robótica, etc.), produção just in
time, trabalho atípico e flexível, lógica de cooperação empresarial e trabalho em equipe,
terceirização da produção, etc. Em poucas palavras, as relações sociais capitalistas se tornam
cada vez mais adaptativas e dispostas a se preparar para as necessidades do mercado
(HARVEY, 1993). Pode-se fazer, em certa medida, uma analogia: enquanto no fordismo a
produção gerava a demanda, no modo de acumulação flexível é a demanda que gera a
produção (e, assim, o emprego, a renda, etc.).
Ou seja, as relações capitalistas, neste regime de acumulação – e ainda mais diante da
chamada “mundialização do capital”, decorrente das mudanças provocadas, dentre outras,
pela queda da União Soviética e completa hegemonia da lógica capitalista em um nível global
–, dependem profundamente das relações de mercado mundiais, as quais, assim, tendem a
reforçar o modelo de governo conhecido como neoliberal, no qual a intervenção do Estado (ao
contrário dos tempos fordistas) é reduzida e as relações capitalistas se marcam tanto por sua
financeirização quanto pela expansão da concorrência entre os diferentes capitalistas
mundiais, decorrente da abertura comercial (HARVEY, 1993)11.
11
Quando falo de dois modelos (fordista e flexível) estou me referindo, como Harvey, a dois modelos gerais de
acumulação. Isso não significa, no entanto, assumir a tese de que o fordismo tenha desparecido nas linhas de
produção. Bridi (2009) e outros autores, por exemplo, identificam a prevalência e ou concomitância de práticas
fordistas e toyotistas, fordistas e elementos flexíveis nos processos produtivos de empresas de nova geração,
reestruturadas e ou constituídas como enxutas e flexíveis. Esta situação, inclusive, pode ser associada à condição
periférica da indústria nacional, a qual tende a juntar estes dois elementos para expandir a exploração da força do
24
Produzidos num contexto de hegemonia neoliberal, estes textos estão marcados pela
tentativa deste grupo se inserir dentro do mercado mundial através da aquisição do que
chamam de “competitividade”. Este momento é bastante distinto daquele em que se costumou
a pensar, inicialmente, a burguesia industrial brasileira: este grupo atuava em um mercado
nacional amplamente protegido, com diversas restrições à importação e espaço de manobra
para a atuação do Estado.
Sanções àqueles países que desrespeitem estas convenções são comuns, tanto em seu
modo formal (como, por exemplo, pagamento de multas, restrição de empréstimos e aumentos
de juros e, em casos mais graves, exclusão dos órgãos financeiros mundiais, como o FMI)
quanto informal (fuga de capitais, queda dos investimentos produtivos no país e da bolsa de
valores, etc.) (CHANG, 2002).
Dificulta-se, portanto, na realidade e na visão da entidade pesquisada (CNI), a
ascensão de ideias keynesianas na economia, que defendam uma atuação forte do Estado para
a criação e manutenção de condições favoráveis à economia nacional. Se antes o Estado era
visto como o espaço no qual se regulava a economia nacional, fazendo com que o próprio
empresariado se ligasse profundamente a este, conforme aponta Cardoso (1964) em seu
estudo clássico, hoje o Estado ainda possui uma importância no pensamento da indústria,
como veremos mais à frente, mas de forma diferenciada.
Esta situação, colocada diante da burguesia brasileira, parece aproximá-la da famosa
“burguesia financeira”, na defesa de um Estado no qual a responsabilidade fiscal e a
desregulamentação são fatores essenciais para a reprodução “harmônica” e “saudável” da
economia. Por isso, sua defesa das chamadas “reformas estruturais” (como reforma agrária,
tributária, etc.) – se alguma vez existiu, na verdade – não constitui mais parte efetiva de seu
programa e/ou interesse político (cf. BOITO JR., 2012b), como analiso mais à frente.
O que interessa a este grupo atualmente, a meu ver, não é a transformação do
capitalismo brasileiro através de amplo processo de industrialização feito com o apoio do
Estado, mas sim o aperfeiçoamento gradativo do capitalismo nacional, conferindo a este
“competitividade”, e ampliação da articulação com a burguesia mundial. Ou seja, não
obstante possa-se falar de uma clara tentativa de inserção da indústria brasileira no comércio
internacional, é preciso ressaltar que falamos de uma economia e indústria periféricas dentro
trabalho, buscando adquirir competitividade com relação à concorrência internacional. Sobre isso, cf. ALVES,
2001
25
do mercado mundial: não é ela uma das que acumulam a maior parte do valor produzido
mundialmente e nem é uma das quais comandam a produção mundial (MARINI, 2008;
FURTADO, 2003; MELLO, 1988).
Quer dizer, na articulação deste sistema mundial de produção, a indústria brasileira
precisa lidar com sua posição inferior, exigindo uma inserção subordinada neste processo de
produção. Numa economia regida pela busca pelo lucro, e em disputa com outras nações com
um nível de composição orgânica do capital muito maior, a indústria brasileira tende a agir
em três níveis diferenciados para conseguir disputar a concorrência: a) apoiam-se no Estado
para financiar e estruturar sua produção e seu nível de competitividade, seja através do
protecionismo ou investimentos diretos (caso do desenvolvimentismo); b) aumentam o nível
de sua exploração da força de trabalho, reduzindo os custos de seus produtos, malgrado a
redução de sua qualidade e dependência tecnológica dos países centrais; ou c) apoiam a
incorporação de empresas internacionais no país, tendo em vista o abastecimento do mercado
interno e a expansão de empregos, apesar de perdas para a indústria nacional (MARINI,
2008).
No contexto internacional presente, movido pela acumulação flexível, de forte
discurso de contenção da intervenção do Estado na economia e imensa diferença entre os
níveis de acumulação de bens de capital (em específico, de nível tecnológico, propiciada pelo
investimento em Pesquisa & Desenvolvimento), a indústria brasileira tem pendido, cada vez
mais, para as duas últimas alternativas. Essas medidas são tomadas como forma de resposta à
reprimarização da economia nacional, isto é, da fuga de indústrias do país e falência de
empresas nacionais diante da concorrência internacional – tudo isso possibilitado pela
expansão da importação, resultado tanto da abertura comercial quanto do aumento das
capacidades de infra-estrutura e logística mundiais (BRESSER-PEREIRA, DINIZ, 2009).
Isto significa que o empresariado nacional se encontra mobilizado na contenção de
uma possível “reversão neocolonial” no país, mas a partir de uma forma e estratégia
específicas – que tratarei no segundo capítulo. Contudo, esta estratégia somente pode ser
aplicada se conseguir convencer e articular as outras classes sociais, em especial a classe
trabalhadora, que será aquela mais diretamente afetada pelas mudanças na produção industrial
do país (e, por conseguinte, no Sistema de Relações de Trabalho). Por isso, analisarei agora a
importância da correlação de forças para a construção do discurso da indústria sobre o
trabalho.
26
Dentro da condição histórica que se delineou a partir da década de 1970, marcada pelo
modo de acumulação flexível, a burguesia nacional brasileira assumiu posições distintas
diante da conjuntura política do país: embora não deixe jamais de lado suas propostas gerais
de reforma trabalhista, previdenciária, tributária, etc., sempre presentes nos documentos
analisados, a força e a forma de argumentação em torno destes variará de acordo com a
conjuntura econômica e política do país. Contudo, quando se trata das relações de trabalho, a
condição da economia possui uma importância ainda maior na caracterização destas relações.
Quer dizer, não obstante, de fato, as relações de trabalho numa sociedade capitalista
não se dissociem por completo da hegemonia geral da sociedade, por outro lado, elas
apresentam um aspecto de dominação muito mais ameaçador e que não se reproduz com
exclusividade na legitimidade: a ameaça do desemprego. Este, sendo uma invenção
capitalista12, não serve apenas de meio de disciplinamento da classe trabalhadora, mas
também de controle dos preços da força de trabalho, através do chamado “exército industrial
de reserva”. Por isso, quanto mais desempregados existirem, maior a tendência para redução
dos preços da mão-de-obra, uma vez que, tornando-se mais difícil a aquisição de um emprego,
mais se abre mão de suas condições de trabalho13 (MARX, 2008).
Esta característica guarda efeitos poderosos sobre o consenso e produção discursiva
acerca deste tema, uma vez que, quem emprega não é o trabalhador, mas o capitalista – e este
somente emprega entendendo-se ter um negócio “justo”, que lhe permita ter condições
efetivas de concorrer no mercado. Isto significa que toda relação de emprego é, em última
12
Antes do capitalismo, a inserção social não se dava pelo trabalho, como nota Castels (2003), mas sim pelo
status decorrente do estamento (ou seja, era o estamento que determinava o trabalho, e não o trabalho que
determinava o status). Sendo assim, não era necessária a valorização do trabalho em seu nível moral: esta
interpretação somente surgirá com o capitalismo, tendo em vista o disciplinamento da população para o trabalho
nas fábricas. Aliado à defesa destas noções morais, assim como do controle dos corpos (FOUCAULT, 2010),
estará o desemprego, forçando o proletariado, sem propriedade dos meios de produção, a vender sua força de
trabalho a custos muito baixos.
13
“A procura por homens regula necessariamente a produção de homens assim como de qualquer outra
mercadoria. Se a oferta é muito maior que a procura, então uma parte dos trabalhadores cai na situação de
miséria ou na morte pela fome. A existência do trabalhador é, portanto, reduzida à condição de existência de
qualquer outra mercadoria. O trabalhador tornou-se uma mercadoria e é uma sorte para ele conseguir chegar ao
homem que se interesse por ele” (MARX, 2008, p. 24, grifos do original)
27
medida, uma negociação entre patrão e empregado; e é uma negociação desigual, uma vez
que é o capitalista quem possui a capacidade de empregar, podendo negociar o preço e as
condições de sua contratação, além de que o capital possui uma tendência natural a se unificar
(graças à sua quantificação e acumulação em trabalho morto), enquanto o trabalho não14.
Contudo, a partir da organização da classe trabalhadora em sindicatos e partidos –
inaugurada na metade do século XIX –, esta relação se modificou profundamente, surgindo
leis que regulamentam as relações de trabalho. Não obstante manteve-se, com estas
mudanças, a exploração da força do trabalho – caso contrário, não haveria como o capitalismo
persistir –, estabeleceram-se limites e condições para a disputa capitalista (isto se deu desde
legislações anti-trustes e monopólios até limites na jornada de trabalho e garantia de direitos
definidos). Esta transformação pode ser associada à correlação de forças, e, em especial, à
falha da burguesia em conseguir justificar e legitimar sua exploração nos moldes anteriores
(ou seja, a dominação se enfraquece diante de uma perda de sua legitimidade).
Por isso, a produção discursiva, na área das relações de trabalho, depende não apenas
de elementos ideológicos, mas também econômicos. Isto serve não somente para fundamentar
a rebelião das classes trabalhadoras, mas também as condições de concessão da burguesia –
não à toa, crises econômicas, no capitalismo, tendem a significar mudança nas relações de
trabalho e na correlação de forças, como demonstram farta literatura. Quero dizer, com isso,
que a classe trabalhadora depende de sua organização e das condições econômicas
conjunturais para conseguir suas conquistas dentro do capitalismo. Além disso, as relações de
classe se encontram à mercê das transformações apresentadas na seção anterior.
Sendo assim, o mercado de trabalho brasileiro passou por estas transformações
também: não apenas pela mudança da correlação de forças (o que, veremos mais à frente, foi
um importante fator de mudança das condições de trabalho no Brasil contemporâneo), mas
também pela transição do fordismo para o modo de acumulação flexível, sendo o Brasil um
país em posição periférica no sistema capitalista mundial.
Esta mudança, em um primeiro momento, implicou na ascensão do neoliberalismo no
país, o qual, em geral, realizou as seguintes medidas: a) uma ampla política de privatização
14
“Capitalists, being in control of the process of production in which they combine rationally ‘dead’ and ‘living’
labor, are in a position to constantly evaluate and improve the efficiency of this combination. Whereas capitalists
can (and under the competitive pressure that they put upon each other, must) improve the efficiency of the
process of reproduction of their own labor power. In other words, by introducing (labor-saving) technical change
capital can release itself partially from its dependence upon the supply of labor, thereby depressing the wage
rate. On the other hand, labor cannot release itself from its dependence upon capital’s willingness to employ it,
because there are next to no possibilities of reproducing itself more efficiently, namely on the basis of lower
wages or even outside the labor market” (OFFE; WIESENTHAL, 1980, p. 75-76).
28
Naquilo que ficou conhecida como a “década perdida” (anos 90) para o
desenvolvimento, o empresariado industrial enxergava elementos positivos (como a
estabilidade fiscal, a contenção da inflação e a redução de controle sobre a economia e o
trabalho), enquanto também se queixava de problemas (a já dita falta de crescimento e
abertura muito radical de nossa economia ao mercado internacional) (DINIZ; BRESSER-
PEREIRA, 2009). Em suma, durante este período o discurso da indústria se marcou pelo
apoio às reformas a serem promovidas pelo governo FHC e inserção da indústria na economia
mundial; enquanto isso, a única oposição seria ao fato de que o Estado precisaria realizar seu
papel de estimulador do desenvolvimento com mais firmeza, mas sem usar os artifícios do
modelo de acumulação anterior (fordista).
Por isso, a indústria não viu com tantos problemas a mudança de modelo econômico,
com a chegada de Lula ao poder, tanto porque se atendeu às suas demandas de maior atuação
do Estado quanto porque se manteve o rigor fiscal e os princípios econômicos de seu
antecessor. Não quero dizer, com isso, que tenha concordado com todas as medidas do
governo, mas sim que se sentia satisfeita diante dos avanços econômicos atingidos durante
este período. Um dos aspectos centrais, creio, que podem ser apontados para este
contentamento era a dominação da classe trabalhadora, que seguiu inserida na ordem
capitalista, sem procurar uma ruptura com esta (OLIVEIRA, 2010). Isto não significa,
entretanto, que suas mudanças (em especial nas relações trabalhistas, distribuição de renda e
consumo) não foram benéficas para a classe trabalhadora, como mostro à frente.
A retomada do crescimento econômico no período mais recente, aquele que marcou os
governos petistas (2003-2014), foi um dos aspectos centrais não apenas para a satisfação do
empresariado, mas também do proletariado, uma vez que foi a partir deste avanço – baseado
em boa parte no boom dos preços das commodities exportadas pelo país, é verdade – que se
tiveram as condições para garantir os avanços em questão. Este crescimento permitiu e foi
retroalimentado com o aumento do investimento estatal na economia, o que, por sua vez,
conferiu a estabilidade de crescimento necessário para ter as devidas condições para a
melhora nas condições do Sistema de Relações de Trabalho (BALTAR; KREIN, 2013).
Essas melhoras podem ser percebidas pelo aumento da renda do trabalho (segundo
dados do PNAD15, houve um crescimento do rendimento real do trabalho, entre 2003 e 2014,
em 43,1%, indo de 1.247 até 1.785), a expansão do salário mínimo (foi de R$ 200,00 para R$
622,00), a redução no índice de desemprego (a taxa de desemprego média anual foi de 12,3%,
15
Os dados a seguir foram todos retirados do mesmo documento do PNAD (IBGE, 2015).
30
em 2003, para 4,8%, em 2014) e, por fim, no aumento da formalidade do trabalho (o índice de
formalidade do trabalho foi de 39,7% em 2003 para 44,1% em 2008, enquanto o número de
trabalhadores que ocupavam posições precarizadas – como trabalho assalariado sem carteira,
trabalhadores domésticos e por conta própria, etc. – caiu de 59% para 49%, entre 2002 e
2012, além de que a porcentagem de empregados com carteira assinada subiu de 55,3% em
2001 para 64,8% em 2013).
Com essas mudanças, então, foi lógico que houvesse um enfraquecimento da oposição
sindical e redução da média de greves (durante o governo Lula, pelo menos, como
comprovam Araújo e Oliveira [2014]), o que contribuiu para convencer os empresários da
validade dos governos em questão – e inclusive os levaram a valorizar cada vez mais este
diálogo e relação com a classe trabalhadora (confira-se as diferenças entre as interpretações
dos primeiros documentos da CNI e de outro editado no auge do governo Lula).
Sendo assim, com o crescimento econômico, expansão dos rendimentos da classe
trabalhadora (salário mínimo, programas sociais, etc.), redução do desemprego e aumento da
formalidade do trabalho, os governos Lula e Dilma permitiram a transformação das relações
de trabalho a favor da classe trabalhadora, em diversos aspectos. Porém, por outro lado, as
contratações denominadas “atípicas” também aumentaram nesta época, o que nos leva
reconhecer o caráter contraditório destas transformações (BIAVASCHI; KREIN, s.d.d.).
Se, reconhecendo estes fatores, pode-se concordar com a análise de André Singer
(2012), de que o lulismo deve ser caracterizado como um “reformismo fraco”, também é um
fato inegável que ele trouxe problemas à constituição histórica do mercado de trabalho
brasileiro e aos meios de dominação burguesa presentes em nosso território. Ao propor a
integração da população brasileira em um mercado instável, precarizado e altamente flexível,
mas com altos níveis de emprego e maior formalidade, o governo Lula – e de sua sucessora
Dilma – e as instituições de regulação do trabalho (Ministério Público do Trabalho, Ministério
do Trabalho e Emprego e Justiça do Trabalho) dificultaram o processo de controle da força de
trabalho a partir da informalidade (BALTAR, et al, 2010).
A cada vez maior atuação destas instituições, em articulação com os sindicatos, na
regulação do mercado de trabalho brasileiro não apenas ajudou a garantir o aumento da
formalidade do emprego no Brasil, mas também incomodou as classes empresariais – como
analisados nos capítulos seguintes desta pesquisa.
31
Dito isto, deve-se notar que esta burguesia nunca adotou, historicamente, uma posição
de ruptura, exceto diante do caso do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, no qual,
principalmente devido ao amplo clamor popular, pôde-se ver desde uma nota condescendente
da CNI sobre o caso (ESTADO DE SÃO PAULO, 2016) até uma manifestação favorável ao
impeachment comandada pela FIESP (ESTADO DE SÃO PAULO, 2015). Este fato se deve,
creio, não apenas ao avanço progressivo da classe trabalhadora, mas, talvez de forma até mais
determinante, ao avanço da crise econômica, que implodiu as estruturas de articulação entre
empresariado e Estado promovidas pela auto-denominada Nova Matriz Econômica. Como
demonstrarei mais à frente, um dos fatos que permite embasar esta tese é, justamente, a
argumentação deste grupo em torno da reforma trabalhista: a constante ênfase na necessidade
do retorno do crescimento, da fuga da crise econômica, parece comprovar, ao menos
parcialmente, o quão fundamental o crescimento é para a Indústria Nacional, sendo este um
dos principais fatores de mobilização deste grupo em torno do governo do país. Um motivo
claro existe para isso, de acordo com Bianchi:
Personificações de um capital particular estão com sua alma dilacerada pelas pressões
decorrentes da contraditoriedade existente entre as necessidades do processo de reprodução do
capital em geral e as necessidades de seu próprio capital (...) Daí a possibilidade de um mesmo
intelectual orgânico expressar, simultaneamente, projetos aparentemente incompatíveis (...) A
viabilidade de tais projetos não depende da argúcia de seus portadores e sim da existência de
relações de forças sociais apropriadas para tal. As formas de associação do capital não são o
resultado de uma tendência espontânea à identificação de interesses comuns e sim o produto
destas relações de forças sociais que motivariam a agregação de interesses antes dispersos e,
até mesmo, conflitantes, bem como da capacidade de liderança de certos intelectuais
(BIANCHI, 2007, p. 126)
Isso significa que, para a burguesia industrial, mais do que a representação imediata de
seus interesses, é importante para ela em um nível ideológico a reprodução efetiva do
capitalismo vigente. Para ela, o que marca a validade de um governo ou período histórico não
é apenas a ligação direta às suas propostas, mas também a sua capacidade tanto de conter a
classe trabalhadora (dominação) quanto à expansão de sua acumulação capitalista. Por isso, a
aceitação dos governos de Lula e Dilma não surge diretamente como identificação deste
grupo aos governos em questão, mas sim de sua satisfação com os rumos da economia e das
relações de força existentes.
Outro aspecto importante é que, não obstante a indústria nacional possa ser
considerada um setor bastante heterogêneo, abrangendo diversos atores sociais que também
disputam ideologicamente dentro de seu campo – seja ele uma entidade, instituição, ou, ainda,
o próprio Estado –, ela possui elementos unitários. Tanto a indústria nacional mais próxima ao
neodesenvolvimentismo – atraída pela tutela do Estado, aproveitamento do mercado interno e
32
expansão das garantias aos direitos – quanto aquela avessa a ele – de caráter mais liberal,
oposicionista aos gastos do Estado, ao aumento de impostos de todo o tipo e controle estatal
das relações de mercado e de trabalho – opõem-se à reversão neocolonial, os juros altos e o
baixo crescimento, por exemplo, os quais Dilma Rousseff não conseguiu evitar em seu
segundo mandato (SINGER, 2015).
Sendo assim, antes de finalmente passarmos à análise dos documentos, é preciso
ressaltar que a CNI não é a representante essencial e exata da classe industrial brasileira: ela é
apenas uma representante dentre muitas federações da indústria – o que significa que, dentro
da heterogeneidade das indústrias brasileiras, ela não consegue representar exatamente o
interesse de todas as indústrias do país. Por outro lado, seu caráter geral e amplo – assim
como o desenvolvimento inegável de um amplo grupo de pesquisa e informação pela entidade
–, parece-me, permite-lhe focar mais profundamente na produção de materiais para a defesa
das propostas da indústria. Isto significa que, embora não possa representar todos os grupos
empresariais do país, ela cumpre um importante papel de difusão de noções gerais deste – e a
reforma trabalhista, pelo apoio conferido pelas entidades, federações e sindicatos patronais
menores, parece ser praticamente uma unanimidade dentro destes setores16.
Por isso, este problema metodológico parece-me ser remediado a partir do momento
em que me proponho a focar na análise de sua opinião sobre a reforma: não obstante possa
existir certo desvirtuamento da concepção de diferentes grupos sobre como usufruir dela – por
exemplo, uma grande empresa multinacional não utilizará a reforma trabalhista da mesma
forma que uma pequena empresa –, seu apoio a esta mudança na legislação passa,
inevitavelmente, pelos mesmos eixos da lógica capitalista de expansão da competitividade dos
negócios. Ou seja, pode-se dizer que indústria acaba se unindo graças às suas vontades
individuais, dentre as quais – em um mundo no qual persiste uma concorrência mundial entre
capitais (e, esta fração de classe, como já falei, se opõe à completa livre disputa entre capital
nacional e estrangeiro) – se destaca o avanço e/ou conservação da competitividade da
indústria nacional17. E é este um dos principais enfoques no capítulo que teremos agora.
16
Pode-se ver apoio à reforma por parte da CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil), a
FEBRABAN (Federação Brasileira dos Bancos), a CNT (Confederação Nacional do Transporte) e CNS
(Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços). Cf. ESTADO DE MINAS, 2017.
17
Aqui, a ideia – esboçada por Offe e Wiesenthal (1980) – de que as associações empresariais se organizam com
mais facilidade por conta do aspecto utilitarista de sua atuação (acumulação) pode ser considerada, em certa
medida, verdade: as diferentes frações da indústria podem até discordar de algumas questões colocadas pela
CNI, mas todas, pode-se dizer, concordam com a promessa de maior liberdade na gestão do trabalho, uma vez
33
que lhes favorece seu objetivo último. O que pode haver de discordância – e este ponto é interessante, mas não
me cabe desenvolver aqui – é a expansão completa deste modelo de trabalho para todos os empregos no país,
uma vez que, para um número considerável das indústrias, o mercado interno é sua maior base consumidora.
34
Como se pode ver no quadro, foram coletados 14 documentos, datando desde 2002 até
2014, divididos em 6 categorizados como “análise de conjuntura”, 2 como “agenda
legislativa” e 6 como “propostas eleitorais”. A maioria dos documentos foi publicada na
segunda década do século XXI, em especial os documentos com propostas eleitorais
propriamente ditas, das quais todas foram lançadas pelo menos no ano de 2014. Considerando
que estes documentos são os que mais tratam diretamente sobre as relações de trabalho, pode-
se chegar à conclusão de que a entidade em questão expandiu sua divulgação de materiais
sobre o tema apenas contemporaneamente, sendo seu documento mais antigo tratando com
exclusividade sobre o tema remonta somente até 2012.
35
Em nota explicativa, podem-se definir as diferentes finalidades dos textos a partir dos
seguintes termos: a) Análise de conjuntura: pode ser definida como um documento
interessado na interpretação da situação da indústria do país e de soluções para seus
problemas; b) Agenda: é marcada pela análise e desenvolvimento de propostas específicas
entendidas como benéficas para a indústria, geralmente realizando-se, em conjunto, um
mapeamento das esferas de poder e de meios possíveis para realização de suas propostas; c)
Propostas Eleitorais: é determinada pela busca da definição de um conjunto de propostas
voltadas para a conjuntura analisada pela indústria, em geral lançado durante o período de
eleições, mas nem sempre – diferentemente da Agenda, prende-se apenas à proposição e ao
argumento desta, sem se preocupar em realizá-las.
A partir daí, pretendo apresentar como estas interpretações resvalam sobre o trabalho
na última seção deste subcapítulo. Nesta parte, além dos documentos anteriores, utilizarei as
obras marcadas como “Propostas” e “Agenda”, para, depois, analisar mais apropriadamente
suas propostas – esta parte será apenas no próximo subcapítulo, para facilitar sua
esquematização e seguinte comparação com a reforma trabalhista proposta neste ano.
19
“O Estado brasileiro é grande, burocrático e lento em suas decisões. Trabalha com baixo nível de eficiência e,
muitas das vezes, com eficácia reduzida” (CNI, 2002, p. 26). Esta ideia se encontra ancorada, claro, no clássico
princípio liberal de que a iniciativa privada é inerentemente mais efetiva do que a iniciativa estatal, o que leva à
constatação de que o desenvolvimento sustentável só é possível com o afastamento do Estado da economia. Isto
não implica, entretanto, que o Estado não deve atuar na economia, como mostrarei a seguir.
37
Nesta figura, pode-se perceber que a entidade relaciona estas três reformas (tributária,
previdenciária e trabalhista) com o financiamento do setor público, mas com um adendo: a
reforma trabalhista teria também uma relação direta com o “aumento do emprego formal” e,
com isso, aumentar-se-ia a arrecadação da previdência. Veremos mais desta interpretação à
frente, quando tratarei diretamente sobre a concepção da CNI sobre as relações de trabalho no
país.
Como se pode perceber, a defesa desta perspectiva reformista parte da transição de
uma concepção de desenvolvimento predominantemente macroeconômica
(desenvolvimentismo e/ou keynesianismo) para outra microeconômica (neoliberal e/ou
neoclássica)20, uma vez que percebe na regulação das instituições (e na sua garantia ao
20
Diniz, Boschi e Bresser-Pereira apresentam em seus textos (2003; 2010) uma perspectiva diferenciada:
entendem existir no pensamento deste empresariado uma forte influência macroeconômica. Alguns pontos
devem ser ressaltados: primeiro, a diferença de atores analisados (IEDI e CNI), os quais não apresentarão,
necessariamente, a mesma concepção de desenvolvimento; segundo, na sua análise do mesmo documento aqui
referenciado (CNI, 2002), não leva em consideração as diversas reformas liberalizantes sugeridas no texto, assim
como não se considera a constante afirmação em defesa do mercado e da responsabilidade fiscal, representando-
se o compromisso deste grupo com o modelo neoliberal de desenvolvimento; e, terceiro, não obstante fale-se,
sim, de mudanças macroeconômicas, de relações comerciais, etc., estas não se dão de forma separada ao modelo
neoliberal, sem jamais propor um rompimento exato com este. Se, de fato, defende-se a atuação do Estado na
economia, em setores específicos – como o da inovação –, por outro lado defende que este deixe de regular áreas
de importante valor social (como as relações de trabalho). O que se exige, para o desenvolvimento, é uma
combinação dos dois fatores (macroeconômicos e microeconômicos), como se pode comprovar pela divisão
entre os números de páginas tratando de suas diferentes “estratégias de desenvolvimento” (são gastas, no
documento de 2002, 45 páginas defendendo uma política industrial macroeconômica e 49 especificando uma
“agenda de competitividade” composta por reformas microeconômicas). No documento de 2006, por outro lado,
apenas um capítulo curto (de 8 páginas) é gasto com macroeconomia, enquanto um capítulo longo, com 10
38
prioridades, dentre as quais predominam propostas microeconômicas para aumento da eficiência da economia
brasileira, é dedicado para reforçar a perspectiva neoliberal deste documento. Ao que me parece, portanto, o foco
da proposta da CNI é reformar o Estado brasileiro e tornar as relações econômicas no país mais livres e
amigáveis aos negócios, aumentando-se a eficiência de nossa economia (uma noção claramente próxima às
interpretações microeconômicas do desenvolvimento).
39
21
No texto em questão, nesta parte, enumera-se ipsis literis da seguinte forma os aspectos da segurança jurídica:
“segurança jurídica dos contratos; respeito às regras do mercado; ambiente amplo de segurança física de seus
cidadãos, da propriedade e dos ativos produtivos” (CNI, 2006, p. 31). Estes, claramente, referem-se diretamente
aos direitos da propriedade, dentre eles: o de negociação do trabalho (contrato); de regulação privada da
economia, sem interferência do Estado (respeito às leis do mercado); e, por fim, o direito de dispor livremente de
seus patrimônios e bens, sem ameaças às suas perdas, seja através da garantia do direito penal e de limitações ao
direito civil em intervir na propriedade de outrem (segurança física).
40
quadro 1), e do considerável compromisso dos governos deste período às propostas (em
especial macroeconômicas) da indústria22, a CNI parece manter a exigência de reformas
profundas no Estado brasileiro, através de sua “Agenda de Competitividade”, com o objetivo
último de reduzir o chamado “Custo-Brasil”. Essa foi uma campanha avassaladora na década
de 1990, sobretudo, nos governos Collor e FHC, e que foi retomada com muita força antes e
depois do impeachment de Dilma Roussef.
Ou seja, a perspectiva deste grupo sobre o caminho necessário para o país alcançar o
desenvolvimento permanece o mesmo. Não obstante, em que pese as diversas transformações
da economia brasileira no período, todos os textos possuem o mesmo tom de sempre, de
redução dos custos do Estado, expansão de sua eficiência e de maior incentivo às empresas
para atuar no mercado nacional, com menos empecilhos – sejam eles fornecidos pelo Estado
(tributos, altos juros, etc.) ou deficiências históricas da economia e sociedade brasileiras
(baixo nível de escolaridade, infraestrutura insuficiente e onerosa, etc.) Diante deste fato,
perde-se a capacidade de investimento, como já se demonstrou acima, e, assim, o nível de
produtividade da economia e da indústria brasileiras decresce. Esta dinâmica, própria da
visão deste grupo, parece bem representada na figura a seguir:
22
É necessário ressaltar, aqui, que a manutenção de uma política dentro dos marcos neoliberais (de respeito ao
mercado, forte responsabilidade fiscal e contenção da atuação do Estado na economia) esteve presente em todos
os governos do período analisado, diferindo-se mais o foco desta política do que a política em si: não obstante,
por exemplo, o governo Lula tenha buscado aumentar a renda da população, estimulado o crédito, etc., ele
manteve uma gestão do Estado próxima à do governo FHC. Isto não se deve à proximidade ideológica entre
estes dois governos, mas sim à profunda institucionalização de aspectos neoliberais na política brasileira após a
queda do paradigma desenvolvimentista, o que, afinal, reproduz uma vontade explícita da CNI nos documentos
analisados (SADER, 2013).
41
O que define a distância entre estas duas interpretações talvez seja a mudança do
contexto da economia brasileira: se os documentos de 2002, 2006 e 2007 foram escritos em
uma época de pouco destaque econômico do país, os outros dois (2010 e 2013) foram
marcados pelo otimismo do período de crescimento econômico pós-crise mundial de 2008,
em que o Brasil, conciliou investimentos na indústria com crescimento da renda, do emprego
e do consumo do mercado interno. Por isso, os documentos mais tardios possuem um aspecto
mais otimista e com menor peso de exigência de reformas institucionais, ao mesmo tempo em
que predomina uma leitura mais próxima às ideias neodesenvolvimentistas.
Entretanto, apesar de todas estas variações do discurso, o tom destinado à reforma
trabalhista nunca se modificou no mesmo nível. Mesmo com todas as mudanças econômicas e
sociais ocorridas no país durante este período, na ótica empresarial, um dos principais
“obstáculos” ao avanço da competitividade, em todas as análises aqui trazidas, é, justamente,
o sistema de relações de trabalho de nosso país, conforme veremos à frente. A partir da
construção de suas interpretações gerais sobre o trabalho, pretendo definir, afinal, qual é o
modelo de reforma trabalhista ideal para a CNI e quais são as suas justificativas para defendê-
la – e, em seguida, na próxima seção, desenvolverei de modo as propostas exatas da entidade.
3.2. E o trabalho com isso? O sistema de relações de trabalho brasileiro para a CNI
A interpretação da CNI acerca do sistema de relações de trabalho historicamente foi
marcada por um padrão em seu pensamento: não apenas por sua completa compatibilidade
com a sua concepção geral da economia brasileira, conforme desenvolvi acima, mas também
pela persistência da centralidade de determinados temas em diferentes documentos,
publicados em diversos períodos.
Em todas as publicações, independentemente das mudanças legislativas e da
conjuntura econômica e política do país, chega-se à mesma conclusão da necessidade de
reforma da legislação trabalhista. A principal justificativa para esta missão é o suposto fato de
que a CLT está “ultrapassada” e que deveria atender a uma dinâmica própria do capitalismo
globalizado, na qual o trabalho se encontra cada vez mais flexível e informatizado, o mesmo
que se aplicava a um contexto de predomínio, ao menos no campo das expectativas, do
trabalho industrial com contratação por tempo indeterminado e jornada de trabalho limitada23.
23
Como já foi desenvolvido por muitos estudiosos da questão trabalhista (KREIN, BIAVASCHI, etc.), esta
afirmação não é de todo verdade, pois a CLT foi continuamente reformada desde sua promulgação. Isto não
significa, entretanto, que, para a CNI, as reformas tenham sido suficientes: desde seu documento em 2002 exige-
45
se a continuação de reformas trabalhistas mais profundas, mesmo depois do governo FHC, que, conforme
apresentou KREIN (2001), realizou várias transformações nas relações de trabalho no Brasil.
46
A redução de custos, por isso, não é favorável apenas para a indústria, de acordo com
ela mesma, mas também para os trabalhadores, já que “a elevação de custos do trabalho pode
levar à queda da produção local e ao aumento das importações, gerando desemprego e outros
efeitos negativos para a economia” (CNI, 2006, p. 110). Este pode ser considerado um
48
paradoxo que possui importância central no pensamento da CNI: o trabalhador deve exigir um
menor valor de custo para a empresa (o qual não necessariamente deriva do salário, diga-se de
passagem), para conseguir mais oportunidades e melhores condições de trabalho.
Defendendo-se a competitividade da empresa, defende-se o emprego do trabalhador; assim, a
legislação trabalhista, ao se negar a pensar o lado da empresa, nega, também, o trabalhador,
que depende desta.
A centralidade da redução de custos pode ser comprovada ainda mais se analisarmos
um documento, publicado pela CNI em 2012, chamado “101 propostas para a modernização
trabalhista”. Nele, discutem-se medidas com o objetivo de recuperar a competitividade da
indústria, buscando-se reverter tanto a desindustrialização nacional quanto os altos custos dos
empreendimentos no país (o chamado “custo brasil”). Elenca-se, neste documento, cerca de
oito “linhas de modernização” para fazer as relações trabalhistas avançarem: a) valorização
dos processos de negociação; b) regras claras, seguras e justas para todos os envolvidos
(segurança jurídica); c) reduzir o risco associado a contratações; d) soluções para o aumento
da produtividade; e) desoneração do trabalho formal; f) redução da burocracia e das
irracionalidades; g) afastar entraves a benefícios aos trabalhadores; e h) políticas públicas pró-
emprego.
Sendo assim, das propostas colocadas pela entidade, podemos perceber diferentes
efeitos esperados com as medidas; ao invés de apresentar a divisão colocadas por eles, preferi
dividi-los em, basicamente, três esferas, já organizados em ordem decrescente de frequência:
a) aumento da segurança jurídica (54); b) redução de custos (48); e c) aumento da
produtividade (26)24. Não obstante o documento cite cerca de oito linhas, elas podem ser
resumidas nestas três porque muitas são meras repetições do mesmo fato. Por exemplo, a
desoneração do trabalho formal nada mais é do que redução de custos, assim como o
fortalecimento da negociação coletiva também é garantia da segurança jurídica. Como
24
O número maior do que 101, na soma das classificações, se deve ao fato de algumas propostas se aplicam a
mais do que uma esfera. Lembro que as propostas organizadas se deram a partir de classificações da própria
entidade, mas, por questões de rigor teórico, algumas propostas foram adicionadas sem ter as palavras no caso
citadas: por exemplo, em caso no qual se falava apenas em “redução de custos com passivos trabalhistas”
classifiquei, também, como segurança jurídica, assim como propostas que trariam a qualificação do trabalho
foram colocadas no eixo de produtividade. As propostas foram classificadas, então, da seguinte forma: a)
Segurança jurídica (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15, 16, 17, 19, 20, 26, 29, 33, 35, 36, 37, 44, 45, 50, 52, 53,
54, 60, 62, 63, 66, 76, 77, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 97 e 99); b) Redução de
Custos (2, 3, 5, 7, 9, 11, 12, 14, 18, 19, 20, 24, 28, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 42, 43, 47, 48, 50,
55, 56, 57, 58, 59, 61, 63, 64, 65, 66, 67, 72, 73, 75, 78, 79, 98, 99 e 100); e c) Produtividade (2, 5, 8, 9, 10, 11,
12, 13, 14, 16, 17, 19, 21, 22, 23, 25, 28, 38, 40, 41, 50, 69, 70, 71, 72 e 74).
49
podemos ver, o grosso das propostas se dão com dois principais objetivos: redução de custos e
aumento da segurança jurídica.
GRÁFICO 1: Ganhos esperados pela CNI em suas “101 propostas para a modernização
trabalhista”.
SJ
RC
PR
SJ + RC
RC + PR
SJ + PR
SJ + PR+ RC
Legenda: SJ: Segurança Jurídica; RC: Redução de Custos; PR: Produtividade; SJ + RC: Segurança Jurídica e
Redução de Custos; RC + PR: Redução de Custos e Produtividade; SJ + PR: Segurança Jurídica e Produtividade;
e, por fim, SJ+ PR+ RC: Todos.
FONTE: CNI, 2012.
Entretanto, a segurança jurídica, como já foi dito anteriormente, não existe à toa, senão
a partir da proposta de redução de custos: de 54 fatores que apresentam ganhos na segurança
jurídica, 18 (SJ+RC e SJ+PR+RC) deles também apresentam – de acordo com a própria
federação –, redução de custos (cerca de um terço deles). Isto, claro, para não falar de outras
propostas duvidosas, como, por exemplo, a que propõe a revisão dos termos que configuram
“trabalho análogo à escravidão”, o que, afinal, poderia ser colocado dentro da redução de
custos – seja por meio do fim de passíveis trabalhista quanto a manutenção da produção (CNI,
2012, p. 84). Mesmo que se fale em correções de leis mal aplicadas ao país, empiricamente
pode-se concluir o fato de que, em muitas propostas de fortalecimento da segurança jurídica,
ocorre, em conjunto, uma menor remuneração do trabalhador, como é o caso das propostas
14, 50 e 53 (“Tempo à disposição do empregador após portaria”, “Trabalho em ambientes
frios” e “Proibição de trabalho a céu aberto [calor]”), as quais propõem a perda efetiva de
remuneração extra ao trabalhador. Por isso, a centralidade da “redução de custos” nas
propostas da entidade é muito maior do que se imagina: também no “aumento de
produtividade”25 (12 [33%] das propostas de produtividade possuem também uma redução de
custos) se vê uma correlação entre estes fatores.
Assim, pode-se deduzir uma simbiose entre estes três conceitos do pensamento da CNI
(competitividade-produtividade-custos): cada um deles depende do outro para garantir o
25
Estas propostas são: 2, 5, 9, 11, 12, 14, 19, 28, 38, 40, 50 e 72.
50
26
A manutenção (ou até aumento) dos salários, entretanto, não implica, necessariamente, na inexistência de uma
expansão da taxa de exploração da força de trabalho: numa análise marxiana, poder-se-ia dizer que o que a
indústria prega, nestes documentos, não seria o aumento da mais-valia absoluta (aquela que se adquire através da
redução dos salários e aumento de jornada não-remunerada), mas de mais-valia relativa (mediatizada pelo nível
orgânico dos meios de produção e pela dinâmica e organização do trabalho).
51
Inovação (composta por “Recurso e apoio governamental à C&T” e “P&D e inovação nas
empresas”, ambos numa posição mediana) têm-se um desempenho médio.
O aumento de produtividade, a partir de mudanças nestes três aspectos colocados
acima (qualificação, inovação e flexibilização), associada à redução de custos (em especial no
âmbito tributário e jurídico), seria o caminho para a expansão da competitividade do mercado
de trabalho brasileiro. Não à toa, uma das grandes críticas da entidade, nos últimos anos, tem
sido a estagnação da produtividade do trabalhador brasileiro. De acordo com a entidade, o
Custo Unitário do Trabalho do país aumentou mais de 300% entre 2002 e 2014 27, o que
significa que, além da expansão da taxa de câmbio, a produtividade têm se estagnado (a taxa
média anual de crescimento da produtividade, apresentado pela entidade, entre 2000 e 2009,
tem demonstrado o crescimento médio de apenas 1% ao ano) enquanto o salário e outros
custos apenas aumentaram (CNI, 2014a).
Associando o aumento de empregos à expansão da renda, parece evidente que o carro-
chefe do crescimento econômico do país nos últimos anos estivesse associado ao aumento do
mercado interno (BALTAR; KREIN, 2013), o que conseguiu consumir, por algum tempo, os
desejos da indústria – em especial da de construção, mobilizada ainda mais pelo boom de
obras públicas financiadas pelo PAC. Em seu documento mais entusiasmado (2010), a CNI
apontou como estratégia industrial tanto o “aproveitamento do tamanho do mercado
brasileiro” quanto o “foco nos grandes projetos” – temas pouco desenvolvidos ou inexistentes
em seus outros documentos –, mostrando-se sintonia com as medidas mais
desenvolvimentistas dos governos petistas – incluindo-se, aliás, as questões pertinentes ao
trabalho, como a renda do trabalhador, o nível de formalização, diminuição das desigualdades
regionais, etc.
A transição, entretanto, entre esta perspectiva e sua antítese, que vê problemas nestas
medidas desenvolvimentistas, torna-se clara nos documentos de 2012 e 2014 (“101 propostas
para a modernização trabalhista” e “Propostas para a eleição de 2014”, respectivamente), as
críticas às medidas. No primeiro documento citado, afirma-se o seguinte:
27
A entidade assim afirma em seu documento: “O CUT representa o custo do trabalho para a produção da
unidade de um produto. Assim, quanto menor o CUT, maior tende a ser a competitividade das empresas em um
país. O CUI é afetado pela evolução combinada dos preços e custos de produção (inclusive dos custos do
trabalho) e, em comparações internacionais, pela trajetória da taxa de câmbio. Mantido tudo o mais constante,
reduções dos custos do trabalho, aumentos de produtividade e desvalorizações cambiais tendem a reduzir o CUT,
ao passo que movimentos inversos tendem a ampliá-lo” (2014, p. 26)
53
A análise da trajetória do emprego pode ser complementada com uma discussão sobre o
desempenho da indústria de transformação no país, cuja participação do PIB caiu de 35,8%, em
1985, para 14,6% em 2011. Da mesma forma, a participação desse segmento nas exportações
caiu de 64,5%, em 1992, para 36,0%, em 2011. Entre 1996 e 2011, por outro lado, o
coeficiente de importação da indústria de transformação passou de pouco mais de 14% para
mais de 20%. Esses dados sugerem que o expressivo crescimento do consumo de bens
observados no Brasil, ao longo dos últimos anos, foi absorvido por importações. Em diversas
cadeias produtivas, o país vem perdendo participação nas etapas finais – nas quais se agregam
valor e se geram mais emprego e renda – e concentrando-se na produção de matérias primais e
produtos de menor valor agregado. Esse cenário pode ser creditado, em grande medida, à perda
de competitividade decorrente da elevação expressiva dos custos de produção em um contexto
marcado por problemas no ambiente regulatório e por taxas de câmbio sobrevalorizadas
(grifos meus, CNI, 2012, p. 14)
Sendo assim, pode-se afirmar que tais medidas de expansão da renda e manutenção da
legislação trabalhista “arcaica” são, claramente, na visão da CNI, elementos perniciosos à
competitividade da indústria nacional e ao desenvolvimento. Por mais que se tenha realizado,
desde 2003 até 2014, diversas mudanças na sociedade brasileira, para este grupo, estas não
foram suficientes para a garantia do desenvolvimento – em especial no âmbito das relações de
trabalho. O ponto central, portanto, gira em torno do valor da mão de obra.
É a partir deste contexto que pretendo apresentar, agora, as medidas concretas
sugeridas pela CNI para a retomada da competitividade da indústria brasileira, dentro do
universo do trabalho.
analisei e de outros que nos ajudaram na construção desta seção específica. Demonstro, neste
capítulo, as mudanças nas propostas, mas também persistência de alguns eixos que orientam a
CNI.
Nos documentos categorizados como “Análise de Conjuntura”, apresentados
anteriormente, existe uma variação considerável das propostas da indústria para o mercado de
trabalho no Brasil. No primeiro deles, publicado em 2002, já se tinham os pilares das
propostas de reforma trabalhista delineados: a) fortalecimento da negociação coletiva como
uma opção em relação ao modelo de trabalho definido pela lei28; b) fortalecimento das
instâncias extrajudiciais (como mesas de conciliação) para resolver os conflitos trabalhistas;
c) regulamentação de novas formas de contratação (dentre as citadas estão: terceirização,
trabalho cooperado, à distância e por conta própria); c) desoneração do trabalho (redução de
custos)29; e, por último e um pouco por fora, d) incentivo à qualificação da força de trabalho.
Todos esses pontos apresentam-se repetidos nos documentos seguintes, às vezes
especificando e enfatizando algum deles ou adicionando novos pontos.
Por exemplo, em 2006, já se desenvolve a ideia da ampliação da negociação de forma
mais prática: falava-se em “ampliar a possibilidade de negociação pelas partes dos direitos
individuais previsto na Constituição Federal (art. 7º)” (CNI, 2006, p. 99). Também, sobre os
conflitos trabalhistas, adota-se uma posição mais clara, apresentando-se o motivo para a busca
pelos mecanismos extrajudiciais: “[é preciso] reforçar a necessidade de maior equilíbrio nas
decisões da justiça do trabalho, que deve moderar a aplicação do princípio da hipossuficiência
do trabalhador” (CNI, 2006, p. 99). Aqui, pela primeira vez, tem-se, dentro das propostas, a
manifestação de descontentamento com a fiscalização do trabalho. Além de repetir os outros
pontos (redução dos custos de trabalho, novas modalidades de contratação) e defender
explicitamente a regulamentação “sem restrição” da terceirização, fala-se, pela primeira vez
sobre a fiscalização do Ministro do Trabalho e Emprego sobre as condições de trabalho:
“reforçar papel educativo do MTE em lugar do foco exclusivo em ações coercitivas” (CNI,
2006, p. 99).
28
Especificamente, no texto, ainda não se utiliza os termos atualmente em voga – prevalência do negociado
sobre o legislado –, embora indiquem exatamente a mesma coisa. Afirma-se, pois, apenas, a necessidade de
“implementar um novo modelo de negociação flexível que permita ajustes rápidos e o mais particularizados
possível, em nível macroeconômico” (CNI, 2002, p. 98)
29
No texto assim se coloca sobre esta questão: “Rever a estrutura de despesas trabalhistas e previdenciárias, com
desoneração dos salários em benefício da remuneração direta, evitada a isenção indiscriminada de contribuições
sociais que suportam fundos de seguridade e as atividades de formação de capital humano” (CNI, 2002, p. 98)
55
30
Este ponto é defendido a partir da seguinte proposta: “Criar mecanismos que ampliem o escopo das
negociações coletivas, garantam segurança às novas relações de trabalho e reflitam as vontades e necessidades
das partes” (CNI, 2010, p. 124)
31
“O elevado número de encargos incidentes sobre a folha salarial, que operam em cascata (efeito redundante,
uns sobre os outros), estimula a informalidade, prejudicando os trabalhadores, as finanças públicas e as próprias
empresas, que convivem com condições assimétricas de competição” (CNI, 2010, p. 115)
56
QUADRO 2: Posição da CNI acerca das relações de trabalho, nos documentos coletados
e categorizados como “Análise de Conjuntura”: diversos anos
Tema 2002 2006 2008 2010
Terceirização Defende sua Fala na Idem, mas
regularização e a regulamentação adiciona uma
de outras formas sem restrições rejeição à divisão
de contratação. da terceirização entre atividade- Idem, com adição da
e em novas meio e atividade- responsabilidade
modalidades de fim e defende subsidiária
contratação novas
modalidades de
contratação
Negociações Fala-se no “Ampliar a Defende
coletivas fortalecimento da possibilidade de expressamente a
negociação negociação prevalência do
coletiva como pelas partes dos negociado sobre
opção à lei direitos o legislado Idem
individuais
previsto na
Constituição
Federal” (p. 26)
Desoneração Apenas defende a Apenas defende Liberação de
do trabalho desoneração do a desoneração encargos do
trabalho do trabalho trabalho em
forma geral,
redução de
impostos sobre o Idem
trabalho e
incentivos a
condições de
trabalho
específicas
Qualificação Apenas defende o Idem, mas com a
do trabalho incentivo à Idem adição da questão X
qualificação do PSD
57
regulamentações ou possuía o caráter direto exigido pela CNI ou pode ser considerada uma
regulamentação fechada e coerente, na qual as indústrias possam prever, efetivamente, qual
interpretação será dada ao seu caso.
A entidade, portanto, mobilizou-se, nos últimos anos, na defesa da regulamentação da
terceirização, atentando-se em especial para dois pontos principais, considerados os maiores
problemas na regulamentação da terceirização no país: primeiro, na distinção entre atividade-
meio e atividade-fim; e, segundo, na exigência de responsabilidade solidária entre as
empresas sobre os encargos trabalhistas.
A distinção entre atividade-meio e atividade-fim é fruto da súmula 331 do TST,
promulgada em 1993, na qual se define que a terceirização somente seria permitida se fosse
realizada em uma atividade considerada subsidiária para a empresa – quer dizer, que não fosse
sua atividade principal –, como, por exemplo, segurança e limpeza. Isto não significa,
entretanto, que esta determinação resolveu a questão da legalidade da terceirização. De acordo
com a CNI, diversas interpretações distintas sobre o que seriam estas atividades para uma
empresa diferiam de caso para caso na justiça, o que impactaria a segurança jurídica das
empresas. Os principais argumentos da entidade sobre os problemas desta interpretação são
que, primeiro, a definição entre atividade-meio e atividade-fim é de difícil objetividade e
pouca clareza e que, segundo, as empresas estão constantemente mudando suas atividades, o
que pode dificultar e prejudicar a terceirização no mercado (CNI, 2014d).
Por sua vez, o estabelecimento de responsabilidade subsidiária à empresa contratante é
importante para a CNI porque isto garantiria uma “dupla proteção” ao trabalhador
terceirizado, enquanto também não oneraria as empresas contratantes como a
responsabilidade solidária. Ao contrário de ter de arcar com todas as consequências legais da
utilização da mão-de-obra terceirizada, a contratante continua obrigada a pagar a estes
trabalhadores seus direitos básicos (como décimo-terceiro, FGTS, etc.), caso a contratada não
os cubra, o que estimularia aquela a fiscalizar esta e impedir a sua ilegalidade na contratação
do trabalho.
Sendo assim, a entidade propõe uma nova legislação sobre a terceirização, contendo as
seguintes características e pontos: a) “regras claras, bem definidas, que não permitam
interpretações díspares”; b) liberação da terceirização em todas as atividades; c) “previsão da
responsabilidade subsidiária como regra”; e d) os empregados terceirizados devem ser
representados por sindicatos referentes à empresa contratada (classe e posição territorial), e
não da contratante (CNI, 2014d)
60
Esta proposta tem como finalidade acabar com a indefinição sobre a regularização da
terceirização, a qual leva muitas empresas, na visão da CNI, a evitar esta modalidade de
contratação. Amparada por sua pesquisa da Sondagem Industrial, a entidade afirma que o
principal motivo para a não contratação de outras empresas para realizar um serviço é o medo
de se receber passivos inesperados, por determinação judicial (outros pontos são: a
preocupação dos custos serem maiores do que se espera e a qualidade do serviço menor), o
que leva à contenção do desenvolvimento da terceirização e das cadeias produtivas de valor
do país, elementos que diminuem nossa produtividade, a criação de empregos e, por fim, a
competitividade da economia nacional.
Outro ponto importante deste documento é sua mobilização discursiva para se
contrapor às teses de que a terceirização precariza o trabalho:
Com a terceirização não se exclui ou reduz os direitos dos trabalhadores. Ao contrário, os
empregados da empresa que presta serviços ou produz bens (contratada) a outra empresa
(contratante) têm assegurados todos os direitos e garantias estabelecidos na legislação
trabalhista e em acordos ou convenções coletivas de suas respectivas categorias profissionais.
A precarização não decorre da terceirização, mas sim da existência de trabalhadores na
informalidade ou quando não respeitada a legislação trabalhista, o que pode ocorrer em
qualquer forma ou modalidade de contrato (CNI, 2014d, p. 52)
Como se pode ver no trecho acima, dois pontos são os principais condutores desta sua
tese: o de que a grande fonte de precarização é a relação informal de trabalho e o de que a
terceirização não enseja perda de direitos, uma vez que se garante, nesta modalidade de
contratação, as mesmas leis trabalhistas que aquelas garantidas aos outros trabalhadores (da
contratante). Por isso, a terceirização serve não para precarizar, mas sim para especializar o
trabalho das empresas e aumentar sua eficiência.
A valorização da negociação coletiva é outra proposta entendida como fulcral para o
avanço da segurança jurídica do país. Defendida por entidades sindicais – em especial aquelas
envolvidas com o novo sindicalismo – como o melhor modelo de gestão das relações de
trabalho (BRIDI, 2009). Entretanto, a negociação coletiva se tornou também uma pauta da
CNI e de outras entidades patronais da indústria. O principal entendimento que move a
constatação da necessidade de valorização deste instrumento é, na visão da entidade aqui
estudada, a defasagem do princípio da hipossuficiência do trabalho, decorrente das mudanças
da classe trabalhadora no Brasil (que deixou de ser, em sua maioria, de origem rural e de
baixo nível de escolaridade). Assim, a entidade patronal se expressa sobre esta questão:
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que completou 71 anos em 2014, baseia-se na
premissa de que todos os trabalhadores seriam hipossuficientes, ou seja, não teriam capacidade
de negociar suas demandas e dialogar para realizar ajustes nas suas condições de trabalho. Foi
61
Sendo assim, na visão da entidade, esta interpretação, persistente até hoje, levaria a um
problema profundo para a popularização da negociação coletiva: a rigidez da legislação
trabalhista e excessiva atuação das instituições do trabalho, as quais impediriam o diálogo
entre trabalhadores e empregados. Aqui, nota-se a repetição da crítica em documento anterior
(2010), no qual se opõe à visão de conflito entre estes dois polos das relações de trabalho:
A negociação coletiva não é realizada para se atacar “conquistas trabalhistas” estabelecidas em
lei. Nenhuma norma legal é revogada pela negociação. A negociação, na verdade, para
contextos específicos e de acordo com a vontade das partes, busca estabelecer condições
diferenciadas que atendam o interesse da coletividade envolvida (empresas e empregados), de
forma diferente ao estabelecido em lei, pelo prazo negociado. As partes que negociam têm
autonomia (privada coletiva) e responsabilidade para negociar segundo seus interesses e
prerrogativas. Contudo, não é isso o que ocorre. Em regra, o entendimento é de que a
negociação não pode prevalecer sobre o que é disposto sobre a lei (...) o que se vê no país é
uma atuação constante, por vezes excessiva, de diversas instituições do trabalho que acabam
por enfraquecer esse importante instrumento, anulando a validade de cláusulas livremente
negociadas por empresas e trabalhadores (CNI, 2014c, p. 20)
Esta interpretação serve, justamente, para demonstrar como a CNI enxerga a função da
justiça trabalhista no Brasil, segundo a qual esta não deve interferir nas relações de trabalho
estabelecidas entre patrão e empregado, seja porque o trabalhador já não é mais
hipossuficiente, ou, ainda, porque a negociação coletiva aumenta a produtividade do trabalho
e reduz os conflitos trabalhistas. Ou seja, na visão empresarial, este instrumento poderia servir
para resolver os problemas das relações trabalhistas no Brasil, engessadas por uma legislação
que impede a flexibilidade no trabalho e o avanço dos índices produtivos do país. O
entendimento que os acordos ou convenções coletivos não poderiam permitir o
descumprimento de normas da CLT é problemático para a CNI, não apenas porque é contra o
princípio da autonomia da vontade coletiva, mas também porque seria contrário ao próprio
desenvolvimento da economia brasileira. Esta questão pode ficar mais clara ao se apresentar,
aqui, o segundo problema da entidade com a aplicação da negociação coletiva no Brasil
contemporâneo: a interpretação da súmula 277 do TST32, que entende que as negociações
coletivas passam a integrar o contrato individual.
Um princípio fundamental do processo da negociação coletiva é que ele se baseia em
condições macroeconômicas, aspectos do mercado, ambiente institucional, entre outros fatores,
que definem a correlação de forças das partes dispostas a dialogar. Por isso, os instrumentos
32
A Súmula 277 está “sub judice” no STF, que suspendeu os processos em que se discute a ultratividade das
cláusulas convencionais após a urgência. Por outro lado, a própria trabalhista passada no Congresso Nacional
(lei) já prevê que as cláusulas não se incorporam nos contratos.
62
máquinas); e, por fim, e) incentivos fiscais (que seria a retirada de cargas tributárias em
condições específicas e/ou pagamento direto do Estado às empresas)33. Pode-se ilustrar o
resultado desta categorização no seguinte gráfico:
GRÁFICO 2: Meios de redução de custos propostos pela CNI em seu documento “101
propostas para a modernização trabalhista”
FGTS/INSS
Segurança do Trabalho
Incentivos Fiscais
Sendo assim, um dos aspectos principais desta chamada “redução de custos” não pode
ser entendida apenas como um barateamento da força de trabalho (o que ela não deixa de ser,
mesmo que não atinja o salário fixo do trabalhador), mas também a garantia de maior
liberdade na gestão do trabalho, permitindo-se a flexibilidade de contratação e demissão e de
utilização dos trabalhadores em condições determinadas (como, por exemplo, em ambientes
de alta periculosidade). Sendo assim, a redução de custos não pode ser vista separada da
noção de “produtividade” para a indústria, como já falei anteriormente.
Ou seja, a flexibilização das relações de trabalho (tendo em vista a maior
produtividade, superando as “porosidades” do trabalho) é um importante componente na
busca pela redução de custos da indústria e aumento de sua eficiência. Isto implica, por outro
lado, não apenas no famoso axioma de que a diminuição de custos e aumento da eficiência
levam à produtividade, mas também na necessidade, na visão da indústria, de se associar o
reajuste salarial à evolução da produtividade, como já mostrei anteriormente (cf. CNI, 2014a)
33
As propostas que entraram nestas categorizações foram: a) flexibilidade do trabalho: 2, 3, 5, 9, 11, 12, 18, 19,
33, 66, 75, 78, 79 e 99 – 14, no total; b) encargo e burocracia: 7, 14, 20, 24, 28, 42, 50, 63 e 72 – 9, no total; c)
FGTS/INSS: 30, 31, 32, 34, 35, 36, 40, 43, 48, 55, 56, 57, 58, 59, 61, 64, 65 e 100 – no total, 18; d) segurança do
trabalho: 37, 38, 39 e 98 – no total, 4; e e) incentivos ficais: 47, 67 e 73 – no total, 3.
66
Por isso, a produtividade também é alvo das propostas da CNI: somente com o seu
aumento pode-se garantir um avanço na remuneração e nas condições gerais de distribuição
de renda no país. A coesão entre estes diferentes fatores é mais um dos pilares necessários
para o desenvolvimento, na visão da entidade.
Outro ponto importante para expandir a produtividade seria a redução da rotatividade
do trabalho. O motivo para esta interpretação advém do fato que esta rotação “desestimula os
investimentos em capacitação e reduz o comprometimento do trabalhador com o desempenho
da empresa a longo prazo” (CNI, 2014a, p. 38). Temendo gastar dinheiro em um trabalhador
sem garantias de permanência na empresa, os empregadores pouco aproveitam as
oportunidades de qualificação profissional de seus empregados – assim como a constante
rotatividade do trabalho leva à reposição de peças experientes, mais produtivas, por
inexperientes, iniciantes, que ainda não adquiriram o conhecimento necessário para produzir
tanto quanto seus colegas há mais tempo no trabalho. Mas, afinal, na opinião da entidade,
quem é o responsável por esse fato? A resposta é: o trabalhador e o Programa do Seguro-
Desemprego.
Da forma como está desenhado, o Programa do Seguro-Desemprego (PSD), somado aos
ganhos auferidos com o fim do contrato de trabalho (aviso prévio indenizado e FGTS com
multa de 40%), cria um verdadeiro incentivo ao trabalhador que quer ser demitido. Isso ocorre
em especial quando o mercado de trabalho está aquecido e há possibilidades de trabalho na
informalidade, o que permite uma renda significativamente superior à que teria em condições
normais (CNI, 2014a, p. 40).
Outras propostas também são levantadas pela CNI, com o objetivo de aumentar a
produtividade através da motivação do trabalhador. Um destes pontos seria a remuneração
diferenciada:
Em todo o mundo, é cada vez mais generalizado o emprego de sistemas de gestão estratégica
de carreira e de remuneração que levam em consideração o mérito profissional e a
produtividade. Isso ocorre porque a remuneração é um evidente sistema de incentivo à
produtividade. Na ausência de sistemas de premiação por mérito, há incentivos para que os
trabalhadores esperem que outros tornem a empresa produtiva sem que eles precisem contribuir
diretamente para isso (CNI, 2014a, p. 41)
Seguindo este pensamento da CNI, podemos resumir todo este conteúdo de propostas
no seguinte quadro:
68
34
A aplicação direta de boa parte das propostas da CNI pelo governo Temer demonstram bem isso. Essa tensão
entre a burguesia nacional e a burguesia financeira, por exemplo, pode ser sentida justamente no tema aqui
apresentado: conforme matéria da Folha, investidores americanos se sentiram “frustrados” com a maior
flexibilização das leis trabalhistas da história do país, considerando-a insuficiente. Cf. FOLHA DE SÃO
PAULO, 2017.
70
coloca Boito Jr. (2012a), a indústria tirou diversos frutos. Isto significa, então, que não apenas
as políticas públicas de inserção social e redução das desigualdades sofre um influxo.
Também o caminho do desenvolvimento se transforma, passando-se a seguir as proposições
da CNI, as quais eu já expus anteriormente: o foco no mercado internacional, redução de
gastos do Estado e a liberalização das relações trabalhista tenderão a modificar, de fato, as
relações trabalhistas do país.
O meu objetivo neste capítulo, então, é destrinchar o paradigma de relações de
trabalho da CNI, associando-o brevemente com a reforma levada a cabo pelo Congresso
Nacional em 2017 e apresentando as possíveis críticas às suas propostas (no caso, utilizarei os
argumentos reunidos em três documentos de grupos opostos à reforma trabalhista – por isso,
precisarei realizar este recorte).
Em certa medida, relacionar as propostas da CNI à reforma trabalhista não é uma das
mais difíceis empreitadas. Não apenas podemos ver notas públicas e pronunciamentos da
entidade em favor da reforma, como também há de se notar a clara semelhança entre as
propostas da entidade e os artigos aprovados na reforma. Mesmo com modificações – e em
certa medida até mesmo radicalização –, a reforma trabalhista incorporou os mesmos
princípios da CNI: prevalência do negociado sobre o legislado, terceirização irrestrita,
flexibilizações da remuneração, jornada e contratação flexíveis, aplicação de coerções sobre a
justiça do trabalho (como a contenção de sua atuação positiva – isto é, criando interpretações
que ganham força de lei – a expansão da resolução dos conflitos por meios extra-judiciais,
como as mesas de conciliação) e estabelecimento de sanções para o trabalhador para a
redução de judicialização dos conflitos trabalhistas.
exemplo, não apenas exige- o fim de diversos encargos sociais ao trabalho (como se pode ver
na exigência constante de redução de custos), como também pede a reformulação do seguro-
desemprego (diminuindo a abrangência deste), e, mais do que isto, reformula os investimentos
a serem dados à previdência e FGTS, exigindo a diminuição de repasses a estes – o que é
coerente com sua sugestão de reforma da previdência pública. Ou seja, o tom principal do
discurso da entidade não é o da proteção social, mas o da expansão da eficiência do trabalho
no Brasil. Em uma palavra, o foco de suas atenções está mais no reforço da competitividade
das empresas nacionais do que na garantia das condições de vida dos trabalhadores (como se
pode ver na seção tratando sobre o documento “101 propostas para a modernização
trabalhista”).
Em um contexto de economia subdesenvolvida – e com um mercado de trabalho
profundamente heterogêneo –, o que se busca garantir não é a inserção do grupo “de baixo”
(desempregados, trabalhadores informais, conta própria, etc.) às mesmas condições dos “de
cima”, mas um rebaixamento da condição destes (através da redução de custos, aumento da
flexibilidade e dos contratos atípicos), o que, supostamente, no plano do discurso empresarial
permitiria a inserção de “setores vulneráveis” no mercado de trabalho brasileiro. Esta noção
se apresenta dentro do modelo argumentativo dos textos: se são os custos de trabalho e a
rigidez da legislação que impedem a contratação, de fato, reduzindo-se estes, aumentariam os
empregos e se conseguiria incluir os vulneráveis no mercado de trabalho brasileiro. O
problema desta concepção, entretanto, é que ela não reconhece o fato de que, desta forma,
diminui as proteções reais fornecidas através do trabalho formal, que praticamente deixará,
assim, de possuir as características que marcam a sua qualidade distinta do trabalho informal.
Em uma palavra, teremos um “nivelamento por baixo” das condições de trabalho,
expandindo-se elementos de precariedade da economia informal para a economia formal: se,
por um lado, pode-se incluir um grupo maior no mercado de trabalho e na seguridade social,
estes trabalhadores já formalizados, por outro, já não terão as mesmas condições de antes, sem
garantir a segurança de um rendimento, uma vez que estarão à mercê das condições
econômicas, sob o mantra da flexibilidade do emprego e da contratação, e nem fornecer as
condições adequadas de segurança social. Esta, graças ao subdesenvolvimento brasileiro e
recusa da atuação mais forte do Estado na economia apregoado pela entidade, não terá
condições de garantir as mesmas condições que outros países – como a Dinamarca – possuem
Ou seja, como afirmam Proni e Oliveira:
Convém frisar que, ao contrário dos países precursores da flexicurity, a insegurança sempre foi
uma característica do mercado de trabalho brasileiro, não se restringindo aos trabalhadores sem
74
a proteção da legislação trabalhista oficial. Aqui, portanto, muitos dos problemas no campo
laboral devem-se ao excesso (e não à falta) de flexibilidade, que contribui para manter amplos
segmentos da mão de obra sem uma especialização definida e, ao mesmo tempo, representa
uma dificuldade adicional para muitos assalariados que gostariam de uma trajetória
profissional menos errática (PRONI; OLIVEIRA, 2016, p. 81)
Por isso, o modelo de “flexissegurança” não é, de fato, defendido pela CNI, porque ela
evita responder as perguntas efetivas dentro deste problema: como conciliar um amplo
programa de segurança social com redução de custos do trabalho, impostos, responsabilidade
fiscal, investimentos em capacitação, etc., mediatizados por uma economia com problemas
estruturais (subdesenvolvimento) e um mercado de trabalho cada vez mais flexível e,
supostamente, formalizado, que exigirá um aumento na demanda da segurança social? A
verdade é que esta conciliação seria de extrema dificuldade na realidade brasileira (KREIN,
2001), e o desinteresse da entidade em desenvolver esta questão de forma apropriada é um
sinal evidente de sua distância em relação ao paradigma da “flexissegurança” como modelo
de organização do trabalho no Brasil.
Por isto defendo sua proximidade de uma concepção privatista: não apenas pela
insuficiência de correlação com os outros, mas, principalmente, por causa da sua constante
defesa da atuação livre da economia na definição do modelo de relações de trabalho no Brasil.
Isto está bastante claro tanto na defesa constante do direito de negociação dos termos do
trabalho (através de negociação coletiva e individual, subvertendo-se a noção de
hipossuficiência do trabalhador), quanto na desregulamentação de normas do trabalho e,
também, no afastamento da justiça do trabalho na resolução dos conflitos entre patrão e
empregado. O modelo proposto é exatamente este, muito próximo ao modelo americano, mas
com a diferença de ser aplicado num país com um Estado cujo compromisso social é
nitidamente valorizado pela constituição. Por isso, realiza-se uma adaptação: o que se propõe
é um modelo de relações privadas, com alguns relances de segurança social, buscando ceder
alguns pontos aos grupos que se opõem às suas propostas.
Esta escolha de paradigma, por sua vez, apresenta uma lógica adequada aos princípios
e questões colocadas pela entidade em seus documentos, que vive, em seu discurso, uma
verdadeira encruzilhada entre a busca pela melhora dos níveis capitalistas do país
(desenvolvimento e aquisição de competitividade), o controle da intervenção do Estado na
economia (evitando que este detenha o controle da indústria) e, por fim, da dominação da
75
classe trabalhadora (ou melhor, em sua satisfação). Como já se pôde perceber brevemente, é
exatamente nestes três níveis que suas propostas pretendem atuar.
Por exemplo, na prevalência do negociado sobre o legislado, prega-se a defesa de um
diálogo entre patrão e empregado, como forma de se evitar a intervenção do Estado
(Judiciário Trabalhista) nas relações de trabalho. Por outro lado, não faltam propostas, em
seus documentos, sugerindo a atuação do Estado na qualificação da mão-de-obra e em
diferentes projetos, como os de infraestrutura. A atuação do Estado possui aspecto
fundamental para a CNI, uma vez que deve realizar aquilo que o empresariado não tem
condições de realizar (como articular a economia brasileira com o mundo através de pactos e
acordos comerciais internacionais e oferecer serviços na área de educação e saúde com
qualidade e de forma gratuita) e auxiliá-lo em seus projetos de interesse nacional (como a
infraestrutura, qualificação, etc.), mas deve se afastar da regulação das relações de trabalho e
microeconômicas. Desse modo, ressalta-se aqui a contradição do empresariado em relação ao
papel do Estado.
Com relação ao trabalho, considera a CNI que o Estado deve deixar de atuar com
profundidade na resolução dos casos (preferindo-se avançar mais as resoluções extrajudiciais,
em especial aquelas das mesas de conciliação) e na garantia de certos direitos que são tidos
pelo capital como demasiado, tais como o Programa de Seguro-Desemprego muito amplo, a
limitação de jornada, etc., para focar-se no investimento em produtividade e qualificação da
força de trabalho. O Estado, então, deve possuir uma estreita ligação com as empresas
privadas, encarregando-se de garantir-lhes as melhores condições de competir no mercado
internacional.
Ou seja, sua atuação é comandada pelo suposto interesse imediato no
desenvolvimento, o qual pode ser considerado o principal estandarte da entidade e
supostamente o grande motivo da escolha de seu paradigma das relações de trabalho. A
promessa do desenvolvimento, na realidade brasileira, é o aspecto central porque tanto
satisfaz o desejo da classe trabalhadora de melhorar sua condição de vida quanto a
necessidade da burguesia de manter (ou aumentar) sua acumulação – e , portanto, é um dos
principais instrumentos discursivos de contenção da classe trabalhadora35.
35
Não é à toa que várias entidades, desde sindicatos patronais da indústria até sindicatos de trabalhadores,
defendem a ideia do desenvolvimento: é por ele que se pode garantir não apenas a riqueza e o avanço da
economia brasileira, mas também empregos, distribuição de renda e qualidade de vida. O que diferencia uma
perspectiva da outra, entretanto, é o meio pelo qual se deve garantir este avanço.
76
Este pode ser considerado um caso clássico que demonstra, afinal, como a
hipossuficiência do trabalhador não é, de fato, apenas um postulado antigo, mas ainda atual.
Dito isto, precisa-se reconhecer que esta hipossuficiência do trabalhador não é significado de
sua incapacidade de exigir certas demandas e de se organizar, mas somente, sozinho, contra o
mercado, ele não possui meios para garantir as condições mínimas de trabalho que deseja. O
fato é que esta capacidade de exigir suas condições de trabalho depende diretamente do nível
de organização da classe trabalhadora, como bem coloca a ANAMATRA:
Com efeito, como já advertiu João de Lima Teixeira Filho, a funcionalidade das negociações
coletivas guia-se por dois pressupostos básicos: em primeiro lugar, aquele segundo o qual
“quão mais rígida é a organização sindical, mais tormentosa é a negociação coletiva”; e o
78
segundo, aquele segundo o qual “quão mais fortes e representativos são os sindicatos, menor é
a necessidade de intervenção legislativa”. Não é o caso brasileiro. A representação sindical é
falha. Se fortes e representativos fossem todos os sindicatos profissionais brasileiros, a ideia
vazada no PL n. 6.787/2016, quanto à prevalência do negociado sobre o legislado em grande
parte dos direitos trabalhistas típicos, poderia ser oportuna e útil. No entanto, não é o que
acontece. A organização sindical brasileira é extremamente rígida e a unicidade sindical
construiu, no Brasil, uma estrutural sindical frágil e, em muitos casos, de pouca
representatividade. Nesse caminho, todas aquelas hipóteses de negociado sobre o legislado,
vaticinadas para além do que a Constituição expressamente autorizou, servem basicamente
para transformar a negociação coletiva em um caminho bem azeitado para a degradação das
relações de trabalho e para a flexibilização de direitos sociais típicos (ANAMATRA, 2017, p.
10-11)
36
Marx já afirmava, em sua primeira obra econômica: “O trabalhador não precisa necessariamente ganhar com
o ganho do capitalista, mas necessariamente perde quando ele perde” (grifos originais, MARX, 2008, p. 25). A
terceirização livre e indiscriminada reforça este mantra: aumentando-se a concorrência entre capitais na oferta de
seu serviço, cuja base de escolha é a redução de custos – e não apenas a eficiência, como coloca a CNI –, tem-se
uma tendência natural a reduzir os custos deste serviço. Esta situação, dependendo das condições, pode
facilmente levar à busca da redução dos custos do trabalho (incluindo-se, aqui, redução salarial e contratação
informal), o que acabará por implicar numa maior exploração da força de trabalho e, talvez, na precarização do
trabalho.
79
competitividade da indústria brasileira, a CNI elege, dentro das relações de trabalho, a missão
não apenas de conseguir melhorar a calculabilidade da mão-de-obra no Brasil, mas, também,
reduzir os custos desta e aumentar sua produtividade, a qual, por outro lado, não é qualquer
uma:
Não existe apenas um conceito de produtividade, mas vários. Ele pode ser compreendido como
uma forma de maximizar o uso de recursos: equipamentos para expandir mercados, aumentar o
emprego, ampliar os ganhos reais de salários e melhorar os padrões de vida da sociedade. Mas
também pode ser visto como uma forma de assegurar ganhos imediatos, sem a introdução de
mudanças mais sistêmicas. Essa concepção parte do pressuposto de que só a quantidade de
trabalho está em condições de variar, portanto, a redução dos custos do trabalho constitui o
principal objetivo a ser alcançado. Essa é a visão que predomina atualmente entre os
empresários. Nesse contexto, a produtividade, é utilizada para reduzir os custos da força de
trabalho através de um intenso processo de intensificação do ritmo de trabalho com a adoção de
mecanismos que eliminem os tempos mortos, adequando a demanda às flutuações de mercado,
reduzindo custos de contratação e dispensa, alterando a jornada de trabalho e as formas de
remuneração através da introdução da remuneração variável como um componente
fundamental (CESIT, 2017, p. 30-31)
5. Considerações finais
arena discursiva, a construção das verdades (encobertas por suas ideologias) cumpre um papel
tão fundamental no controle social que fica fácil se perder e considerá-las efetivamente
verdades. Porém, se este método pode ser tão bem construído no controle dos “loucos”,
“meliantes” e “doentes”, perde seu poder diante do trabalho, porque, com seu objetivo
máximo de espremer até a última gota de mais-trabalho do proletário, o capital não pode
fabricar completamente sua verdade.
Os efeitos da reforma trabalhista já puderam ser vistos logo após a sua entrada em
vigor: um juiz, na Bahia, resolveu exigir que um trabalhador rural tivesse de pagar pelo seu
acesso à justiça, e pela sua condenação, por supostamente agir por má fé (EL PAÍS, 2017).
Este é apenas um dos variados problemas que a classe trabalhadora enfrentará diante desta
mudança na legislação. No fundo, e isto foi algo que minha pesquisa tentou demonstrar, o que
se percebe neste processo é a retomada de um antigo projeto de controle da classe
trabalhadora. Com a retomada do neoliberalismo em seu estado mais agressivo e,
conjuntamente, uma produção discursiva que enfatiza quase sempre o medo do desemprego e
da recessão, este projeto já está sendo realizado em nosso país.
Muitos problemas podem ser compilados com relação a esta forma de gestão do
trabalho: a redução da inclusão social, graças ao retorno do desemprego e aceitação de
condições de trabalho mais precarizados ou, ainda, de redução de serviços públicos essenciais,
como a Previdência; o mercado interno perde completamente o seu poder de dinamismo, com
a redução da capacidade de consumo da classe trabalhadora, decorrente das novas estratégias
de contenção dos ganhos do trabalho; e, por fim, pode-se ressaltar como, com esta concepção
neoliberal de desenvolvimento – apresentada anteriormente nesta monografia –, tende-se a se
aproximar de um modelo de industrialização marcado pela intensividade da mão-de-obra –
necessitando, portanto, de baixos custos de mão-de-obra para competir no mercado
internacional – enquanto perde-se o foco no avanço tecnológico e inovação, elementos
essenciais de garantia de competitividade no mercado mundial capitalista.
Por isso, o avanço desta ideologia, representada no discurso da CNI, não pode ser
considerada uma derrota apenas para o trabalho, mas para toda a sociedade brasileira, que
tenderá a retornar a seu modelo de desenvolvimento excludente e periférico, no qual a
superexploração da força do trabalho seguirá sendo uma triste realidade.
86
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