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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES – SCHLA


DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – DECISO

GABRIEL POMPEO PISTELLI FERREIRA

“NÃO FALE EM CRISE, TRABALHE”: O DISCURSO DA CNI SOBRE A


MODERNIZAÇÃO TRABALHISTA

CURITIBA
2017
GABRIEL POMPEO PISTELLI FERREIRA

“NÃO FALE EM CRISE, TRABALHE”: O DISCURSO DA CNI SOBRE A


MODERNIZAÇÃO TRABALHISTA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à disciplina


TCC II como requisito parcial à conclusão do curso de
Bacharelado em Ciências Sociais, Setor de Ciências
Humanas, da Universidade Federal do Paraná.
Orientadora: Profª Drª Maria Aparecida da Cruz Bridi

CURITIBA

2017
AGRADECIMENTOS

Não me cabe dar a estas páginas que seguem valor maior do que merecem: é apenas
uma monografia, sem pretensão de querer revolucionar e nem chocar o mundo com sua
publicação. Mas, por menor que seja este feito, ele não poderia existir sem a ajuda de tantas
pessoas, às quais sou grato por terem me apoiado em vários momentos específicos desta
trajetória.
Quero primeiro, agradecer aos meus pais por me darem a oportunidade de focar em
meus estudos e por sentirem tanto orgulho imerecido deste incompleto sociólogo. Mesmo que
eu role meus olhos quando algum deles me sugere pesquisas das quais não tenho interesse
algum ou me pedem para resolver uma questão sociológica de extrema complexidade em dez
minutos – como se o saber sociológico fosse originado de um despreocupado gole de cerveja
–, devo confessar a importância de seu entusiasmo para me dedicar aos estudos. Claro, o
grude constante de minha mãe (o qual já pode ser considerado naturalmente alto, mas se
intensificou diante da ausência do Pedroca) não foi de muita ajuda na condução desta
monografia, mas sua prontidão em parar de me chamar quando falava que estava focado na
escrita do TCC me rendeu certa gratidão – e algumas horas a mais no trabalho, também.
Devo agradecimentos, também, a meu irmão gêmeo, Pedro, carinhosamente chamado
de “Pedroca”, companheiro de sonhos socialistas e de interesses sociológicos – mas que,
infelizmente, se perdeu no “labirinto andradiano” do direito, para acabar parando em Brasília,
por ora –, sempre presente com discussões sobre sociologia, marxismo e esta mesma
monografia aqui apresentada. Embora não sejamos muito de falar sobre isso, só gêmeos
próximos como nós podem dizer quanto sofrimento esta distância nos causou. Ah, e claro,
não podia deixar de agradecê-lo, por, nos agradecimentos de sua monografia, colocar um
nível melodramático dificílimo de igualar, do qual não tenho a menor pretensão de superar.
Não há como deixar de falar da minha mãe do coração, Ivone, pelos almoços no
domingo, a companhia no cafezinho da tarde e sua presença constante apesar de suas horas
muito loucas de trabalho – quem a conhece sabe como ela gosta de dormir num sofázinho,
depois de um longo dia de trabalho. Também devo agradecer à minha irmãzinha de coração,
Neli, quando nos brindou com sua presença aqui em casa e recebeu-me com todo carinho em
sua casa.
À amiga Ana Paula também devo imensos carinhos e agradecimentos, por estarmos
tanto tempo juntos neste semestre meio diferente, pelas risadas com histórias da família e
vídeos do youtube finalizado com um novo caminho para nós dois.
Dentro da faculdade de sociologia, enquanto um marxista meio perdido, devo
agradecer à professora Bridi por aceitar a orientação deste modesto trabalho, pela sua
paciência com minhas trapalhadas, demoras e inexperiência sociológica. No último semestre,
em especial, devo reconhecer a importância não apenas de sua presença, mas também dos
outros integrantes do GT da Reforma Trabalhista, todos eles essenciais para me ajudar a trazer
questões e novas possibilidades de pesquisa sobre este tema. Agradeço, também, à banca pela
leitura e avaliação do trabalho, ajudando-me nesta etapa tão importante da minha graduação.

Dentre os amigos do curso, devo especiais menções ao Filipe Klupel, meu parceiro
dos trabalhos de sociologia, e ao Junior Adriano, companheiro de longas e demoradas
discussões de sociologia, por estarem sempre por aí na reitoria para batermos um papo.
Também agradeço àqueles que estiveram comigo, mas que perdi “na poeira das ruas”, seja
por irem para outras áreas, trocarem de curso – como eu – ou simplesmente seguirem suas
vidas.

E, por fim, como não poderia deixar de ser, devo interminavelmente ao povo brasileiro
por garantir meu estudo numa universidade gratuita com a função de servi-lo; devo aos meus
professores, imprescindíveis na minha formação; devo àqueles que lutam todos os dias contra
os ataques ao serviço público e aos direitos da população brasileira, como o que estudo nesta
monografia; e, em especial à classe trabalhadora, que tudo produz.
Um bom propagandista
Transforma um monte de esterco em local de veraneio.
Quando não há manteiga, ele demonstra
Como um talhe esguio faz um homem esbelto.
Milhares de pessoas que o ouvem discorrer sobre as auto-estradas
Alegram-se como se tivessem carros.
No túmulo dos que morreram de fome ou em combate
Ele planta louros. Mas já bem antes disso
Falava de paz enquanto os canhões passavam.

Bertolt Brecht, “Necessidade da Propaganda”

O poeta
declina de toda responsabilidade
na marcha do mundo capitalista
e com suas palavras, intuições, símbolos e outras armas
promete ajudar
a destruí-lo
como uma pedreira, uma floresta,
um verme

Carlos Drummond de Andrade, “Nosso Tempo”


RESUMO

Resumo: O presente trabalho busca apresentar o discurso da Confederação Nacional da


Indústria (CNI) acerca das relações trabalhistas no Brasil, de tal forma a compreender os
motivos e justificativas para as mudanças na legislação trabalhista aprovada pelo governo
Michel Temer, com a Lei 13.467/17. A partir de uma metodologia qualitativa que envolveu a
análise de documentos produzidos e disponibilizados pela CNI sobre o tema de pesquisa,
identificamos suas concepções gerais sobre o Estado, as relações de trabalho no país e, por
fim, suas propostas para garantir o desenvolvimento econômico. Tal análise nos permitiu
entender como este ator (CNI) se posiciona no contexto das transformações econômicas e
políticas ocorridas no Brasil após a redemocratização, e quais são suas bases de produção
ideológica. Com isso, pudemos identificar, nos documentos, a proximidade entre as propostas
e ideias da entidade e a reforma trabalhista brasileira. Nossa abordagem crítica das posições e
paradigma da CNI tomou como referência a literatura sociológica e jurídica produzida que
vem se debruçando sobre as mudanças na CLT e seus efeitos sobre o mercado de trabalho e o
sistema de proteção laboral. Essa pesquisa demonstrou, portanto, a construção do discurso de
modernização trabalhista a partir de um conjunto de bases ideológicas do ator empresarial, e
que se consubstanciou na Lei 13.467/17. A nosso ver, as transformações na CLT advindas
dessa lei, legitimadas sob a desculpa da retomada do desenvolvimento econômico, resultarão
no avanço da exploração e do controle do trabalho na sociedade brasileira.
Palavras-Chave: Sociologia do Trabalho; Relações de Trabalho; Reforma Trabalhista;
Confederação Nacional da Indústria (CNI).
ABSTRACT

Abstract: The following research aims to present CNI’s (Confederação Nacional da


Indústria) discourse towards labor relations in Brazil, therefore comprehending its reasons and
arguments for the changings on labor laws approved by Brazil’s president Michel Temer
government (13.467/17 law). Within a qualitative methodology which involved analysis of
documents produced and published by CNI discussing our theme of research, we identified
this association’s general concepts about the State, labor relationships on Brazil and, finally,
their propositions to guarantee economic development. Our analysis allowed us to understand
how this actor (CNI) positions itself on the context of political and economic transformations
that happened on Brazil after its democratization (1985-today) and which are their ideological
bases. Thus, we could identify, in these documents, proximity between this association ideas
and propositions with the labor law reform happening now on Brazil. Our critical stance of
CNI’s paradigm and ideological bases has taken its reference on the sociological and juridical
literature produced contemporaneously which have been studying these changes on Brazilian
labor laws (CLT) and its effects on labor’s market and welfare system. This research showed,
then, the construction of labor modernization discourse towards a collection of ideologies
from the entrepreneur actor, solidified on 13.467/ 17 law. According to our understanding,
these law changes, legitimated by the argument of economic development resumption, will
end up on labor’s control and exploitation advancement on Brazilian society.

Key-Words: Labor sociology; Labor relations; Labor reform; National Confederation of


Industries (CNI)
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – A INTERDEPENDÊNCIA ENTRE AS REFORMAS.......................................37

FIGURA 2 – AS REFORMAS E O CRESCIMENTO.............................................................38

FIGURA 3 – PRIORIDADES PARA O CRESCIMENTO......................................................41

FIGURA 4 – MAPA ESTRATÉGICO DA INDÚSTRIA (2007-2015)...................................42

FIGURA 5 – MAPA ESTRATÉGICO DA INDÚSTRIA (2013-2022)...................................43

FIGURA 6 – COMPETITIVIDADE DO BRASIL EM COMPARAÇÃO COM OUTROS


PAÍSES.....................................................................................................................................51
LISTA DE TABELAS E QUADROS

QUADRO 1 – DOCUMENTOS DA CNI................................................................................34

GRÁFICO 1 – GANHOS ESPERADOS PELA CNI EM SUAS “101 PROPOSTAS PARA A


MODERNIZAÇÃO TRABALHISTA”....................................................................................49

QUADRO 2 – DESENVOLVIMENTO DOS POSICIONAMENTOS DA CNI ACERCA


DAS RELAÇÕES DE TRABALHO, NOS SEUS DOCUMENTOS......................................56

GRÁFICO 2 - MEIOS DE REDUÇÃO DE CUSTOS PROPOSTOS PELA CNI EM SEU


DOCUMENTO “101 PROPOSTAS PARA A MODERNIZAÇÃO TRABALHISTA”.........65

QUADRO 3 – PROPOSTAS PARA A PRODUTIVIDADE E REDUÇÃO DOS CUSTOS,


PELA CNI.................................................................................................................................68
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho


CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CESIT – Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho
CNI – Confederação Nacional das Indústrias
CUT – Custo Unitário do Trabalho
FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
FMI – Fundo Monetário Internacional
IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial
INSS – Instituto Nacional do Seguro Social
MPT – Ministério Público do Trabalho
MTE – Ministério do Trabalho e Emprego
NR-12 – Norma Regulamentadora 12
NTEP – Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário
OMC – Organização Mundial do Comércio
PEC – Proposta de Emenda Constitucional
PIB – Produto Interno Bruto
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PSD – Programa Seguro-Desemprego
SELIC – Sistema Especial de Liquidação e Custódia
SST – Segurança e Saúde do Trabalho
TST – Tribunal Superior do Trabalho
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................13
2. INDÚSTRIA BRASILEIRA E SUA NOVA FORMA CONTEMPORÂNEA NO
CONTEXTO DA “ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL”: ANOTAÇÕES
PRELIMINARES..............................................................................................................18
2.1. TRANSFORMAÇÕES CAPITALISTAS E CONDIÇÕES DE REPRODUÇÃO DA
INDÚSTRIA NACIONAL.................................................................................................20
2.2. O EMPRESARIADO INDUSTRIAL, A POLÍTICA NA REDEMOCRATIZAÇÃO E AS
NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO: MUDANÇAS NO MERCADO DE
TRABALHO DIANTE DA CORRELAÇÃO DE
FORÇAS.............................................................................................................................26
3. A LEGISLAÇÃO TRABALHISTA PARA A CNI: BASES
IDEOLÓGICAS................................................................................................................33
3.1.DESENVOLVIMENTO, CRESCIMENTO E
INDUSTRIALIZAÇÃO......................................................................................................35
3.2. E O TRABALHO COM ISSO? EVOLUÇÃO DA CONJUNTURA PARA A
INDÚSTRIA.......................................................................................................................44
3.3.PONTOS E MEDIDAS DEFENDIDAS PELA ENTIDADE...........................................53
3.3.1. SEGURANÇA JURÍDICA: TERCEIRIZAÇÃO E NEGOCIAÇÕES
COLETIVAS................................................................................................................58
3.3.2. CUSTOS DO TRABALHO E PRODUTIVIDADE.....................................................63
4. “NÃO FALE EM CRISE, TRABALHE”: O PARADIGMA DA CNI SOBRE AS
RELAÇÕES DE TRABALHO........................................................................................69
4.1.O PARADIGMA DA CNI SOBRE O SISTEMA DE RELAÇÕES DE TRABALHO E O
CONTEÚDO DE SUA REFORMA
TRABALHISTA.................................................................................................................70
4.2. A PERSPECTIVA DA “MODERNIZAÇÃO TRABALHISTA” E A CRÍTICA DOS
ESTUDIOSOS DO TRABALHO: REFORMA TRABALHISTA DO GOVERNO
TEMER...............................................................................................................................77
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................84
13

1. Introdução

No dia 13 de Julho de 2017, a Reforma Trabalhista (PL 6787/16) foi sancionada pelo
presidente da república, Michel Temer, bastando 120 dias para entrar em vigor para todos os
contratos trabalhistas. Em um evento de solenidade, cercado por ministros, empresários e
juristas, o presidente se vangloriou: “ninguém tinha a coragem e a ousadia” para modernizar a
legislação trabalhista, mas ele o fez, “revolucionando o país” (UOL, 2017).
Enfrentando vários obstáculos – dentre eles, escândalos de corrupção, ocupações,
briga entre senadores, sessões suspensas, gafes em falas internacionais, manifestações
silenciadas pela repressão e uma greve geral –, a nova legislação trabalhista passou na Câmara
e Senado, sobrevivendo aos seus oposicionistas. Após passarem por um verdadeiro roteiro
digno de série dramática, os presentes no evento destacavam a “vitória” do povo brasileiro.
Estava (finalmente!) aberto o caminho para a modernidade – o éden paradisíaco das
terras “atrasadas” como a brasileira –, onde o diálogo entre patrão e empregado, o pleno
emprego, a formalização das relações trabalhistas e os avanços na produtividade garantiriam a
alegria e felicidade de todos; enfim, encaminhava-se ao final feliz da história.
Tal cenário, por mais que contasse com o apoio de poderosas figuras – como o
empresariado brasileiro –, chegou, de fato, a ser ameaçado: não por causa do Congresso –
completamente cooptado pelo presidente – ou, ainda, dos clamores das ruas – tranquilamente
ignoradas pelos homens de terno do Palácio da Alvorada –, mas pela incapacidade do governo
Temer garantir sua segurança, sendo alvo constante de acusações e investigações.
Apesar dos pesares, apoio nunca faltou ao seu governo por parte daqueles que
enxergavam a ousadia de seu presidente: mesmo com malas perdidas e encontros escusos no
Palácio do Jaburu, empresários defenderam que o presidente “não cometeu um pecado
mortal”, reforçaram a divisão entre a economia e a política e, claro, pediram efusivamente a
continuação das chamadas “reformas estruturais” capitaneadas pelo governo (ESTADO DE
SÃO PAULO, 2017).
Em tempos de profundo desgaste político, movimentado ao som da insatisfação
popular com nossos políticos – exigindo ética e responsabilidade –, a orquestra da justiça
contra os saqueadores do Brasil, conduzida pela raivosa percussão de batidas de panela,
magicamente se silenciou. Se, no final de 2015, a FIESP levantava seu pato amarelo na
Paulista, bradando contra o “golpe” dado pelo governo Dilma no Brasil – como diria seu
presidente, Paulo Skaf –, em Junho de 2017 o mesmo grupo afirma “não poder opinar” sobre
14

a saída de Michel Temer do poder, restando apenas “defender reformas estruturais para
recuperar a competitividade” (FIESP, 2015; O ESTADO DE SÃO PAULO, 2017).

Esta variação de pesos e medidas para dois diferentes representantes políticos – que,
antes, participaram do mesmo governo – revela consideravelmente o valor conferido às ditas
“reformas estruturais” defendidas amplamente por representantes do mercado e da iniciativa
privada. Esses atores parecem tentar convencer a opinião pública do fato de que o futuro da
nação depende das reformas por eles propostas: como lembra Antonio Casemiro (2011), a
lógica da austeridade se apoia numa profunda ideologia do medo. Porém, a formulação
discursiva destes agentes parece esquecer que existiram várias reformas na base do Estado
brasileiro – muitas delas apoiadas e conduzidas por eles mesmos, como, por exemplo, a
política de austeridade fiscal inaugurada pelo segundo governo Dilma – e, principalmente, dos
direitos trabalhistas no Brasil, os quais, desde a ditadura militar de 64, vêm sofrendo
sucessivos golpes.

Sendo assim, torna-se inevitável que, neste turbilhão de chavões e clichês exagerados,
surja a seguinte questão: por que, depois de tantas sucessivas mudanças na legislação
trabalhista brasileira, articula-se uma nova reforma trabalhista – e, ainda, uma reforma de
conteúdo tão regressivo para a classe trabalhadora (regularização da terceirização, prevalência
do negociado sobre o legislado, trabalho intermitente, etc.)? A resposta para esta questão não
estará presente neste trabalho (sequer é possível respondê-la completamente), cabendo a ele
apenas esboçar novas possibilidades de aproximação à questão, mas ela pode ser considerada
uma importante bússola na condução aos problemas da reforma trabalhista.

Um dos caminhos que nos ajuda na compreensão do motivo desta reforma trabalhista
estar colocada em pauta e ser tão fortemente propagandeada pelo governo é o estudo das
argumentações dos grupos que se mobilizaram pela aprovação desta reforma. E, dentre estes,
destaca-se um agente privilegiado: a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), não apenas
pela grande e duradoura quantidade de material produzido sobre o tema, mas também pela sua
profundidade argumentativa, e influência nos outros grupos (por exemplo, muitos deputados,
para fundamentar seus votos sobre o tema basearam-se em estudos da própria entidade).

Diante desta situação, acredito que o estudo da visão da Indústria acerca da reforma e
relações trabalhistas no Brasil é um caminho recheado de possibilidades de pesquisa. Tendo
15

como objeto a relação entre a reforma trabalhista e seus atores, pode-se ampliar a visão desta:
ela surge não mais apenas como um fenômeno legislativo ou, ainda, como uma reformulação
das relações de trabalho, mas também como ideologia. E tal proposta de estudo da ideologia
por trás da reforma trabalhista não se propõe a dizer apenas sobre o que ela seja,
objetivamente, mas também do que ela significa para os atores que a defendem – e o que se
coloca em disputa nesta discussão.

Sendo assim, minha proposta é que esta reforma trabalhista pode ser explicada pela
própria concepção dos agentes que a defendem: a burguesia industrial brasileira, ao defender
esta reforma, apresenta também seu conteúdo. Antes de querer definir o que ela é a partir de
análises legislativas, empíricas, etc., é possível defini-la pelo discurso dos agentes que a
conceberam anteriormente. Ali está uma chave para a compreensão do sentido desta reforma,
suas ambições e promessas, que, às vezes, por estar longe do método predominante da
sociologia do trabalho – focada em dados empíricos coletados no trabalho de campo –, não é
tão explorada1.

A resposta sobre a reforma trabalhista, sem usar o trabalho de campo, pode ser
complicada, mas a interpretação dos atores em torno dela talvez não o seja tanto – e continua
sendo, ainda, uma afirmação válida sobre este objeto. Então, os problemas que pretendo
resolver aqui não serão desprovidos de materialidade e, mais ainda, propõem a descoberta de
fatos objetivos sobre o objeto de estudo. Mesmo que se realize a defesa de uma figura distinta
da reforma do que ela de fato é – ao menos para a sociologia do trabalho –, o seu discurso
pode apresentar uma representação da realidade que, dita, revela o seu próprio agente (e,
conhecendo o agente, reconheço o objeto)2.

1
Isto se deve mais às características de pesquisa desenvolvidas dentro do campo da sociologia do trabalho
propriamente dita do que a uma limitação metodológica clara e explícita. Sociólogos do trabalho também
realizaram, historicamente, pesquisas documentais, como, por exemplo, Boltanski e Chiapello (2007), que
pesquisaram o novo espírito do capitalismo através, principalmente, dos livros e manuais de gerência lançados
em defesa do “trabalho em rede”. A pesquisa destes autores, assim como esta aqui apresentada, foca-se nos
meios de reprodução da sociedade capitalista, ou seja, na superestrutura, que jamais deixa de se dissociar da
infraestrutura, mas guarda, com relação a ela, relativa autonomia (ALTHUSSER, s.d.d.; GRAMSCI, 1980).
Desenvolverei melhor, mais à frente, minha posição com relação à questão do discurso e ideologia, infra e
superestrutura, mas, por ora, basta notar, nesta nota de rodapé, que meu objeto empírico é diferente daquele da
maioria dos pesquisadores do trabalho: não é a condição material do trabalho, mas a sua forma na ideologia de
um grupo específico.
2
Aqui, é preciso ressaltar o fato de que a linguagem, transformada em discurso e que se corporifica em
ideologia, não se separa do sujeito: ela só existe a partir dele. Em palavras marxistas, a “verdade” – como
propunham os filósofos neohegelianos – não existe dissociada de seu mundo real e daquele que fala (ENGELS;
MARX, 2007).
16

A questão que deve surgir, a partir desta definição, num aspecto metodológico das
ciências sociais, justamente, é: como conhecer e coletar elementos deste discurso sobre o
objeto em questão? Na análise sociológica, este caminho se faria possível por duas frentes:
primeiro, com a realização de entrevistas com os agentes a serem estudados; e, segundo, com
a análise documental de textos produzidos por este grupo (RICHARDSON, 2012). Ambas as
perspectivas são válidas, mas cada uma exige do pesquisador uma série de cuidados e
dificuldades específicos3. Pela riqueza da produção teórica dos atores estudados, escolhi o
segundo caminho a ser seguido nesta pesquisa, atentando-me na reconstrução dos elementos
argumentativos deste grupo4.

De acordo com estas questões metodológicas, e objetivando compreender o caráter da


reforma trabalhista e sua relação com a Indústria brasileira, proponho, neste estudo, responder
a três questões principais: primeiro, o que mobiliza a indústria na construção discursiva sobre
o sistema de relações de trabalho no Brasil; segundo, quais são os componentes principais
deste discurso, sua forma e transformações no tempo; e, por fim, como posso caracterizar este
discurso dentro do universo contemporâneo de interpretação das relações de trabalho, ou seja,
qual é o paradigma deste grupo sobre as relações trabalhistas e como ela se relaciona com os
estudos desenvolvidos pela sociologia do trabalho.

Os capítulos estão divididos em torno destas questões: o primeiro tratará sobre as


condições de produção discursiva e ideológica da entidade da indústria pesquisada (CNI),
levando-se em conta suas características, seu posicionamento na sociedade capitalista
contemporânea e a correlação de forças na época de sua produção; o segundo entrará mais

3
Se é fato que, na entrevista, não se deve esperar encontrar a informação em sua forma “crua”, uma vez que esta,
inevitavelmente, passará por uma sequência de “máscaras” nas quais o entrevistado tentará ganhar a simpatia e
reconhecimento do entrevistador – em especial dependendo da forma que este surge para aquele –, na análise
documental sugerida esta questão se encontra em estado pétreo: toda produção se esforçará pela simpatia do
leitor, tentando convencê-lo da validade de suas teses. E é nesta condição que se pretende desenvolver a
pesquisa, como já foi dito: é a tentativa de convencimento e os enunciados de verdade que me interessam na
pesquisa, para conseguir compreender não o fim último da empreitada (o qual, numa ordem social capitalista,
deve ser o maior lucro possível sem abalar as estruturas de dominação e exploração), mas os meios e os símbolos
em que se busca realizá-lo. Por isso, tomando este cuidado teórico-metodológico, optei pelo estudo documental.
4
É necessário ressaltar que, para conseguir informações profundas sobre o tema, que saíssem do superficial e
senso comum estabelecido pelos atores e sua plateia (GOFFMAN, 1985), neste método, seria preciso um longo
período de trabalho de campo, com método próximo à etnologia, do qual não disponho condições de realizar –
ao menos neste presente momento. É por isso que segui a proposta da análise do discurso foucaultiana: nela, o
que interessa não é desvelar o não-dito, mas, antes, revelar por trás do dito um poder-saber, uma enunciação de
verdade, que, ideologicamente, justifica e perpetua as relações de poder entre um grupo e outro (FOUCAULT,
1999).
17

profundamente nos documentos em questão, detendo-se nas suas concepções gerais sobre o
capitalismo contemporâneo e a estratégia defendida pela indústria brasileira para avançar
nela, nas ideias deste grupo sobre o mercado de trabalho brasileiro e sua legislação, como
também nas propostas defendidas por eles para atingir seus objetivos; e, por fim, no terceiro
capítulo, defino o paradigma das relações trabalhistas defendidas pela CNI e as questões
levantadas pela sociologia do trabalho acerca do tema.
Para responder estas perguntas, foram coletados documentos no site oficial da CNI
(portaldaindustria.com.br), dentre os quais selecionei e dividi em diferentes categorias.
Tendo-se em vista a grande variedade de documentos disponibilizados no site, foquei-me em
escolher aqueles que contivessem posicionamentos explícitos da entidade em torno do
mercado de trabalho contemporâneo do Brasil (com isso, documentos que não tratam sobre o
assunto foram excluídos, assim como documentos puramente estatísticos e outros – que,
embora fundamentem seus posicionamentos, não demonstram aspectos ideológicos).
Organizei o conjunto dos documentos analisados em um quadro, exposto no capítulo
2. Optei em começar a analisar as perspectivas gerais da CNI sobre a economia brasileira (e as
relações de trabalho), visando formar a base ideológica destes sobre a nossa sociedade e
condições da indústria, para, em seguida, analisar suas propostas e divulgações em torno do
tema em si. Este caminho assim foi definido para conseguir unir a compreensão ideológica da
reforma trabalhista com os efeitos esperados e argumentos mobilizados pelo grupo em
questão para defendê-la. Espera-se, com esta esquematização, garantir uma melhor
compreensão do desenvolvimento das noções deste grupo econômico sobre o tema analisado,
dentro do contexto histórico de mudanças econômicas e sociais em nosso país.
Porém, antes de entrar na análise direta dos documentos, conforme já antecipei,
precisa-se esclarecer a nova forma assumida pela burguesia nacional durante a
redemocratização, assim como a da entidade da qual tiramos nossas fontes, e suas condições
de organização e produção do seu discurso.
18

2. Indústria brasileira e sua nova forma contemporânea: anotações preliminares

Neste capítulo, interesso-me na construção da forma contemporânea da Indústria. Esta


questão pode ser colocada em três aspectos centrais: primeiro, na sua forma econômica (aqui,
refiro-me a seu crescimento, sua adaptação ao novo modelo capitalista, etc.); segundo, na sua
forma política (como ela se organiza e reage a estas mudanças econômicas); e, por fim, em
seu modelo ideológico (como ela justifica e constrói seus argumentos e interesses em torno de
seus posicionamentos políticos). O grande foco deste trabalho será, definitivamente, o terceiro
aspecto – não obstante eu não possa me abster completamente de discutir os outros pontos,
uma vez que eles se articulam profundamente com o discurso da indústria e, por conseguinte,
da entidade pesquisada.
Considerando-se meu recorte de pesquisa, devo deixar mais uma vez claro que não
pretendo pesquisar a indústria em si, graças tanto à sua diversidade quanto à metodologia
escolhida para proceder minha pesquisa. Quer dizer, estudo um grupo específico (CNI), no
qual empresários se articulam para defender os interesses da indústria, sem necessariamente
representá-los por completo. Em outras palavras, pesquiso a opinião de um grupo que busca
aglutinar a indústria, ou seja, de intelectuais orgânicos da indústria, que podem ser chamados
de “empresariado” (BIANCHI, 2007).
Sendo assim, devo ressaltar, também, que não me interesso pelo processo decisório de
posicionamento da indústria ou da entidade em questão (ao lidar com os diferentes tipos de
capitais que representa), mas sim com seu momento post festum, quando, em diálogo com a
sociedade civil, articula métodos de divulgação de seus acúmulos e interesses. Por isso, a
relação de forças internas é indiferente para mim, em certa medida: não me importa se este
grupo decidiu suas posições de forma unânime ou não; o que me interessa são suas estratégias
de convencimento de grupos exteriores ao seu grupo político – como a classe trabalhadora,
por exemplo.
Ou seja, o grande aspecto de controle deste discurso não está apenas em seu processo
interno, mas principalmente externo: é através de uma disputa ideológica entre diferentes
intelectuais orgânicos das diferentes classes sociais e grupos políticos organizados na
sociedade brasileira que se produz a interdição (transformação do dito em não-dito) do
discurso destes agentes (FOUCAULT, 1999). O que devo apresentar neste trabalho é o
19

aspecto geral deste discurso, suas transformações no período recente e o significado destas
mudanças.
Isto é, apresento como o contexto de atuação da CNI se transforma, exigindo-se a
variação do discurso por conta da necessidade da reprodução do poder, mediatizada tanto
pelas transformações materiais nas condições capitalistas quanto pela variação na correlação
de forças. Isto significa que, aqui, devo repensar a produção ideológica do empresariado: ela
não é a representação imediata de seus interesses, mas, antes, uma produção discursiva com o
objetivo último de reproduzir as relações de poder existentes. Quer dizer, ela é uma
intersecção entre a ideologia e o discurso: ao mesmo tempo em que postula sua visão de
mundo e seu posicionamento neste, o faz de forma cuidadosa, atendendo aos controles
discursivos presentes na sociedade contemporânea5.
Dito isto, é preciso pensar os posicionamentos da indústria não como ideias avulsas,
fruto imediato, desconexo e voluntarista da cabeça de integrantes da classe empresarial. Não
se misturam aqui apenas interesses e vontades, mas também visões de mundo, construídas a
partir de um sistema de poder-saber que se exerce também sobre as ideologias e permite,
através da construção de verdades, reproduzir as relações de classe existentes no país – as
quais, ao mesmo tempo em que são formadas por este discurso, também o formam, numa
relação dialética (FOUCAULT, 1999; GRAMSCI, 1980; GRAMSCI, 1978; FIORIN, 1998).
Tal constatação vale a pena ser feita para justamente tomar-se um cuidado
metodológico na análise da gramática destes grupos: eles não falam o que falam como uma
representação exata de sua essência (cf. introdução), assim como não possuem estas ideias
fixas em suas cabeças – elas são frutos direto de suas construções e desenvolvimentos

5
Creio ser possível dizer que a diferença entre ideologia e discurso está mais no alcance das ideias pronunciadas:
enquanto a ideologia surge em determinados discursos, ela não é discurso apenas, porque é, também, uma visão
de mundo inserida na mente das pessoas (ou seja, é parte de uma perspectiva macro da sociedade); o discurso,
por outro lado, mesmo que às vezes seja “contaminado” pela ideologia, é o meio pelo qual ela se expressa, seja
em um texto, uma fala, uma produção artística, etc., mas muitas vezes também é realizada sem o objetivo de
transformar a realidade ou interpretá-la em uma escala macro (pelo contrário, o discurso se marca pelo seu
elemento micro e pela sua casualidade – isto é, não é e não pode ser controlado da mesma forma que a ideologia,
sendo mais circunstancial e “poroso”). Sendo assim, enquanto a ideologia precisa necessariamente tratar sobre os
sujeitos que compõem a sociedade e suas relações (em especial as de classe, pelo objeto que me proponho a
estudar), o discurso não: ele depende, antes do acontecimento, isto é, das condições de sua produção discursiva.
Por isso, mesmo que o controle do discurso trate inevitavelmente sobre o poder, mais especificamente sobre a
capacidade de produção da verdade, a ideologia trata sobre o poder material das relações de classe,
especificamente, o que significa que ela já é manipulada, anteriormente, pelo controle discursivo, mas aceita
jogar este jogo em torno de uma disputa sobre o domínio do futuro da comunidade (nas sociedades modernas e
contemporâneas, isto se confunde com o controle do Estado). Mais sobre esse elemento pode ser encontrado em
ENGELS, MARX, 2007; ALTHUSSER, s.d.d.; GRAMSCI, 1978; GRAMSCI, 1980; EAGLETON, 1997;
LOWY, 2000; FOUCAULT, 1999; FIORIN, 1998.
20

históricos, dentro de um sistema capitalista específico (o do capitalismo dependente


brasileiro). Por outro lado, estas representações não são jamais algo estanque ou pura
reprodução do cenário econômico-político no qual este grupo se encontra: por mais que se
afirme a dependência das ideias ao fator material, estes grupos pensam somente a partir de
sua realidade, o que não os impede de desenvolver ideias que pretendam transformá-la ou,
ainda, superá-la – mesmo que esta se trate de uma classe dominante, graças às suas disputas
internas entre frações de classe (GRAMSCI, 1980; LOWY, 2000).
A análise do discurso, no caso, serve para definir o posicionamento destes grupos
acerca dos fatos que o cercam: o que me interessa não é colocá-los como meros reprodutores
de uma ordem social específica, mas sim como agentes presentes nesta, que tentam modificá-
la de acordo com sua ideologia. Sendo assim, as suas verdades são mais do que justificativas
para a forma presente do mundo, uma vez que elas são seus instrumentos de interpretação e
atuação neste6. O que devo responder, neste capítulo, é qual é o contexto que se tem para a
construção deste olhar sobre o mundo, dividindo-o em duas partes (a primeira econômica e
geopolítica; e a segunda política, tratando sobre a disputa ideológica em torno do trabalho).

2.1. Transformações capitalistas e condições de reprodução da indústria nacional

A forma da Indústria assumiu, historicamente, diferentes contornos em nosso país.


Embora não seja objetivo deste trabalho em avançar teoricamente neste ponto, deve-se
ressaltar que nossa industrialização pode ser caracterizada tanto por ser tardia quanto
periférica. Tardia porque os esforços da industrialização apenas atingiram a fase da revolução
industrial durante meados da Primeira República e não se constituíram por um processo
endógeno forte o suficiente para dinamizar a nossa economia (MELLO, 1982; FURTADO,
2003) e periférica porque todas as tecnologias implantadas e utilizadas em nosso processo
industrial não possuíam o mesmo nível das forças produtivas centrais (MARINI, 2008), assim

6
A ideologia, portanto, não pode ser confundida com aquela sua interpretação inicial, que se aproximava à ideia
de “falsificação”, mas deve se aproximar de uma interpretação que a entenda tanto como uma visão de mundo,
no sentido de que permite entender e interpretar os acontecimentos que estão à sua volta, quanto um
posicionamento em torno destas relações sociais (por exemplo, uma ideologia socialista tende a enxergar e a
condicionar a percepção da luta de classes e, com isso, condiciona o sujeito que dela partilha um posicionamento
específico sobre o mundo) (EAGLETON, 1997).
21

como não houve a adaptação às novas formas do capitalismo mundial e às exigências do


capital internacional (CARDOSO, FALLETO, 1975) 7.
A indústria, portanto, não pode existir e atuar numa realidade nacional sem levar em
conta esta simples questão, a qual, por outro lado, não deriva apenas e diretamente da vontade
da indústria ou dos governantes do país, mas de uma sequência de relações sociais e
econômicas instituídas historicamente. São estas relações, em certa medida, que tendem a
formar a ideologia da indústria e a possibilitar (e limitar) suas ações e opinião dentro deste
campo social em que ela atua.
Creio que alguns pontos são importantes para definir a ideologia da indústria e sua
produção discursiva: a) a lógica capitalista de suas relações sociais (própria do modo de
produção capitalista e posição de classe deste grupo); b) a forma do capitalismo em seus
diferentes níveis (abrangendo desde o modo de acumulação [HARVEY, 1993], sistema
mundial até a formação econômico-social [OSORIO, 2012]); e c) as relações de força entre as
classes sociais. Pretendo, aqui, apresentar os elementos que condicionam esta produção
discursiva da CNI, a partir dos dois primeiros pontos apresentados.
Primeiramente, conforme as análises da sociologia clássica, o surgimento do
capitalismo não foi apenas um fenômeno econômico e tecnológico, mas também sociológico,
modificando-se profundamente as relações sociais e a mentalidade dos sujeitos nele inseridos.
A tese mais famosa sobre este fenômeno é a de Max Weber, que correlaciona o surgimento do
ascetismo capitalista à ética protestante: nesta teoria, o capitalismo se marca por incentivar as
ações sociais racionais orientadas para o lucro. Ou seja, a mentalidade capitalista pede uma
calculabilidade e racionalidade inédita anteriormente, em especial nas relações de trabalho
(WEBER, 2004).
Esta lógica, ao contrário do que se pode encontrar em algumas interpretações
sociológicas, não é distante daquela proposta por Marx: nesta, a calculabilidade também
assume um papel fundamental na ação social dos sujeitos inseridos no modo de produção
capitalista – em especial da burguesia, que, movida pela lei da concorrência, necessita buscar

7
Podem-se notar três grandes paradigmas da economia crítica latino-americana, tratando deste tema: primeiro,
uma noção desenvolvimentista, próxima à CEPAL em seus primeiros anos de pesquisa e ao ISEB, que defendia
a substituição de importações e enxergava na ausência de um esforço industrializante o motivo do
subdesenvolvimento; segundo, as teorias da dependência, tanto em suas vertentes marxistas quanto weberianas,
que viam na integração subordinada do Brasil na economia mundial o fundamento do subdesenvolvimento; e,
por fim, uma terceira corrente, marcada pelo desenvolvimento do pensamento cepalino integrado às novas
questões da dependência, ligados à escola de Sociologia de São Paulo. Para entender melhor suas diferenças, cf.
BRESSER-PEREIRA, 2010.
22

o aumento de sua taxa de lucro para reproduzir sua existência8. Contudo, a análise marxista
acrescenta um ponto essencial para este trabalho: a exploração. Uma vez que a classe
trabalhadora é aquela que, materialmente, produz as mercadorias para os capitalistas, é ela
quem cria a riqueza deste modo de produção, o que, por um lado, o possibilita e, por outro, o
debilita, uma vez que fundamenta toda sua possibilidade de reprodução nesta relação
antagônica (MARX, 2013). Por isso, esta exploração também necessita de uma dominação,
que contenha a revolta da classe trabalhadora contra esta situação.
Aplicando-se estas questões à minha pesquisa, devo reconhecer que a classe industrial
compõe, de fato, uma fração de classe da burguesia9, e seus intelectuais orgânicos tem como
grande objetivo não apenas ou necessariamente a expansão da exploração – o capitalismo
pode, também, aumentar os lucros sem aumentá-la, mas, para isso, precisa-se ter um nível de
acumulação minimamente elevado (cf. MARX, 2013) --, mas a manutenção desta
calculabilidade das relações capitalistas, a garantia de sua competitividade com outros
capitalistas (o que, de uma forma ou de outra, pode levar à busca pelo aumento da taxa de
exploração da força de trabalho) e a manutenção da dominação da classe trabalhadora 10.
Pode-se dizer, então, que as articulações deste grupo tendem a levar consigo estes três
objetivos na sua produção discursiva e na escolha de seus programas e ações políticas.

8
Neste caso, a acumulação não equivale à salvação, como no modelo weberiano de análise das religiões
protestantes, mas ao poder. Esta diferença de interpretações pode ser notada, por exemplo, se considerarmos a
distinção que Weber realiza entre as três esferas (classe, partido e estamento), enquanto Marx prefere pensar o
próprio modo de produção capitalista como uma forma de dominação das classes trabalhadoras, em geral sempre
associado ao Estado. Sobre isso, veja-se: MARX, 2013 e WEBER, 1982.
9
Boito Jr. apresenta a diferença entre a “burguesia interna brasileira”, a qual seria uma “posição intermediária
entre a antiga burguesia nacional, passível de adotar práticas anti-imperialistas, e a velha burguesia compradora,
mera extensão do imperialismo no interior desses países” (BOITO JR, 2012b, p. 67) e o “grande capital
financeiro internacional”, incluindo, neste, “a fração burguesa brasileira perfeitamente integrada e subordinada a
este capital, setores dos grandes proprietários de terra e a alta classe média, principalmente aquela alocada no
setor privado mas, também, no setor público” (BOITO JR., 2012a, p. 4). O que marca a diferença entre estas
burguesias, então, no contexto contemporâneo, é que “A grande burguesia compradora tem interesse na
expansão quase sem limites do imperialismo, enquanto a grande burguesia interna, embora esteja ligada ao
imperialismo e conte com a sua ação para dinamizar o capitalismo brasileiro, procura impor limites àquela
expansão” (BOITO JR., 2012b, p. 75). Por isso, a grande burguesia nacional “reúne setores variados – grupos
industriais, bancos, agronegócio, construção civil e outros” (BOITO JR, 2012b, p. 77), tendo como base de
identificação a sua tendência a exigir um controle mínimo do avanço do capital internacional sobre o país.
10
É preciso afirmar que, de fato, não é a classe empresarial que garante esta dominação da classe trabalhadora –
cabendo este papel muito mais a outras frações da classe dominante –, mas, por outro lado, isto não significa que
ela não atue pensando na satisfação das classes subordinadas: basta ver a constante defesa da conciliação entre
estes dois polos em seus documentos, apresentados no segundo capítulo. Ou seja, ela ainda precisa atuar de
acordo com a hegemonia e o consenso geral da sociedade, por mais que se dissocie dos grupos subalternos
(GRAMSCI, 1980)
23

Entretanto, o capitalismo, por mais que mantenha sua forma essencial – que é esta
apresentada acima –, ainda exigirá que seus sujeitos ajam de acordo com o nível de
desenvolvimento das relações capitalistas em que estes grupos estão inseridos. Além disso, a
evolução histórica do capitalismo prova a sua transformação no tempo, em especial no seu
modo de acumulação (HARVEY, 1993). Ou seja, a exploração capitalista, em si, permanece a
mesma (mais-valia do trabalho assalariado), mas a forma pela qual se realiza esta exploração
se modifica (isto é, como se acumula, transforma-se mais-trabalho em mais-valor,
acumulação). Harvey distinguiu dois modos principais, posteriores ao modelo clássico do
capitalismo (ainda limitado pelo nível de desenvolvimento de suas forças produtivas e
disputas políticas com a aristocracia) analisado por Marx: o regime de acumulação fordista,
surgido a partir da década de 1930, e o flexível, iniciado na década de 1970.
Enquanto o “fordismo” se associava à segunda revolução industrial (petróleo, energia
elétrica, etc.), produção extensiva e para estoque, popularização do trabalho assalariado típico,
hierarquia empresarial, expansão da empresa em filiais, etc., o “flexível” se marca pela
terceira revolução industrial (microeletrônica, informática, robótica, etc.), produção just in
time, trabalho atípico e flexível, lógica de cooperação empresarial e trabalho em equipe,
terceirização da produção, etc. Em poucas palavras, as relações sociais capitalistas se tornam
cada vez mais adaptativas e dispostas a se preparar para as necessidades do mercado
(HARVEY, 1993). Pode-se fazer, em certa medida, uma analogia: enquanto no fordismo a
produção gerava a demanda, no modo de acumulação flexível é a demanda que gera a
produção (e, assim, o emprego, a renda, etc.).
Ou seja, as relações capitalistas, neste regime de acumulação – e ainda mais diante da
chamada “mundialização do capital”, decorrente das mudanças provocadas, dentre outras,
pela queda da União Soviética e completa hegemonia da lógica capitalista em um nível global
–, dependem profundamente das relações de mercado mundiais, as quais, assim, tendem a
reforçar o modelo de governo conhecido como neoliberal, no qual a intervenção do Estado (ao
contrário dos tempos fordistas) é reduzida e as relações capitalistas se marcam tanto por sua
financeirização quanto pela expansão da concorrência entre os diferentes capitalistas
mundiais, decorrente da abertura comercial (HARVEY, 1993)11.

11
Quando falo de dois modelos (fordista e flexível) estou me referindo, como Harvey, a dois modelos gerais de
acumulação. Isso não significa, no entanto, assumir a tese de que o fordismo tenha desparecido nas linhas de
produção. Bridi (2009) e outros autores, por exemplo, identificam a prevalência e ou concomitância de práticas
fordistas e toyotistas, fordistas e elementos flexíveis nos processos produtivos de empresas de nova geração,
reestruturadas e ou constituídas como enxutas e flexíveis. Esta situação, inclusive, pode ser associada à condição
periférica da indústria nacional, a qual tende a juntar estes dois elementos para expandir a exploração da força do
24

Produzidos num contexto de hegemonia neoliberal, estes textos estão marcados pela
tentativa deste grupo se inserir dentro do mercado mundial através da aquisição do que
chamam de “competitividade”. Este momento é bastante distinto daquele em que se costumou
a pensar, inicialmente, a burguesia industrial brasileira: este grupo atuava em um mercado
nacional amplamente protegido, com diversas restrições à importação e espaço de manobra
para a atuação do Estado.
Sanções àqueles países que desrespeitem estas convenções são comuns, tanto em seu
modo formal (como, por exemplo, pagamento de multas, restrição de empréstimos e aumentos
de juros e, em casos mais graves, exclusão dos órgãos financeiros mundiais, como o FMI)
quanto informal (fuga de capitais, queda dos investimentos produtivos no país e da bolsa de
valores, etc.) (CHANG, 2002).
Dificulta-se, portanto, na realidade e na visão da entidade pesquisada (CNI), a
ascensão de ideias keynesianas na economia, que defendam uma atuação forte do Estado para
a criação e manutenção de condições favoráveis à economia nacional. Se antes o Estado era
visto como o espaço no qual se regulava a economia nacional, fazendo com que o próprio
empresariado se ligasse profundamente a este, conforme aponta Cardoso (1964) em seu
estudo clássico, hoje o Estado ainda possui uma importância no pensamento da indústria,
como veremos mais à frente, mas de forma diferenciada.
Esta situação, colocada diante da burguesia brasileira, parece aproximá-la da famosa
“burguesia financeira”, na defesa de um Estado no qual a responsabilidade fiscal e a
desregulamentação são fatores essenciais para a reprodução “harmônica” e “saudável” da
economia. Por isso, sua defesa das chamadas “reformas estruturais” (como reforma agrária,
tributária, etc.) – se alguma vez existiu, na verdade – não constitui mais parte efetiva de seu
programa e/ou interesse político (cf. BOITO JR., 2012b), como analiso mais à frente.
O que interessa a este grupo atualmente, a meu ver, não é a transformação do
capitalismo brasileiro através de amplo processo de industrialização feito com o apoio do
Estado, mas sim o aperfeiçoamento gradativo do capitalismo nacional, conferindo a este
“competitividade”, e ampliação da articulação com a burguesia mundial. Ou seja, não
obstante possa-se falar de uma clara tentativa de inserção da indústria brasileira no comércio
internacional, é preciso ressaltar que falamos de uma economia e indústria periféricas dentro

trabalho, buscando adquirir competitividade com relação à concorrência internacional. Sobre isso, cf. ALVES,
2001
25

do mercado mundial: não é ela uma das que acumulam a maior parte do valor produzido
mundialmente e nem é uma das quais comandam a produção mundial (MARINI, 2008;
FURTADO, 2003; MELLO, 1988).
Quer dizer, na articulação deste sistema mundial de produção, a indústria brasileira
precisa lidar com sua posição inferior, exigindo uma inserção subordinada neste processo de
produção. Numa economia regida pela busca pelo lucro, e em disputa com outras nações com
um nível de composição orgânica do capital muito maior, a indústria brasileira tende a agir
em três níveis diferenciados para conseguir disputar a concorrência: a) apoiam-se no Estado
para financiar e estruturar sua produção e seu nível de competitividade, seja através do
protecionismo ou investimentos diretos (caso do desenvolvimentismo); b) aumentam o nível
de sua exploração da força de trabalho, reduzindo os custos de seus produtos, malgrado a
redução de sua qualidade e dependência tecnológica dos países centrais; ou c) apoiam a
incorporação de empresas internacionais no país, tendo em vista o abastecimento do mercado
interno e a expansão de empregos, apesar de perdas para a indústria nacional (MARINI,
2008).
No contexto internacional presente, movido pela acumulação flexível, de forte
discurso de contenção da intervenção do Estado na economia e imensa diferença entre os
níveis de acumulação de bens de capital (em específico, de nível tecnológico, propiciada pelo
investimento em Pesquisa & Desenvolvimento), a indústria brasileira tem pendido, cada vez
mais, para as duas últimas alternativas. Essas medidas são tomadas como forma de resposta à
reprimarização da economia nacional, isto é, da fuga de indústrias do país e falência de
empresas nacionais diante da concorrência internacional – tudo isso possibilitado pela
expansão da importação, resultado tanto da abertura comercial quanto do aumento das
capacidades de infra-estrutura e logística mundiais (BRESSER-PEREIRA, DINIZ, 2009).
Isto significa que o empresariado nacional se encontra mobilizado na contenção de
uma possível “reversão neocolonial” no país, mas a partir de uma forma e estratégia
específicas – que tratarei no segundo capítulo. Contudo, esta estratégia somente pode ser
aplicada se conseguir convencer e articular as outras classes sociais, em especial a classe
trabalhadora, que será aquela mais diretamente afetada pelas mudanças na produção industrial
do país (e, por conseguinte, no Sistema de Relações de Trabalho). Por isso, analisarei agora a
importância da correlação de forças para a construção do discurso da indústria sobre o
trabalho.
26

2.2. O empresariado industrial, a política na redemocratização e as novas relações de


trabalho no Brasil: transformações do mercado de trabalho diante da correlação de
forças.

Dentro da condição histórica que se delineou a partir da década de 1970, marcada pelo
modo de acumulação flexível, a burguesia nacional brasileira assumiu posições distintas
diante da conjuntura política do país: embora não deixe jamais de lado suas propostas gerais
de reforma trabalhista, previdenciária, tributária, etc., sempre presentes nos documentos
analisados, a força e a forma de argumentação em torno destes variará de acordo com a
conjuntura econômica e política do país. Contudo, quando se trata das relações de trabalho, a
condição da economia possui uma importância ainda maior na caracterização destas relações.
Quer dizer, não obstante, de fato, as relações de trabalho numa sociedade capitalista
não se dissociem por completo da hegemonia geral da sociedade, por outro lado, elas
apresentam um aspecto de dominação muito mais ameaçador e que não se reproduz com
exclusividade na legitimidade: a ameaça do desemprego. Este, sendo uma invenção
capitalista12, não serve apenas de meio de disciplinamento da classe trabalhadora, mas
também de controle dos preços da força de trabalho, através do chamado “exército industrial
de reserva”. Por isso, quanto mais desempregados existirem, maior a tendência para redução
dos preços da mão-de-obra, uma vez que, tornando-se mais difícil a aquisição de um emprego,
mais se abre mão de suas condições de trabalho13 (MARX, 2008).
Esta característica guarda efeitos poderosos sobre o consenso e produção discursiva
acerca deste tema, uma vez que, quem emprega não é o trabalhador, mas o capitalista – e este
somente emprega entendendo-se ter um negócio “justo”, que lhe permita ter condições
efetivas de concorrer no mercado. Isto significa que toda relação de emprego é, em última

12
Antes do capitalismo, a inserção social não se dava pelo trabalho, como nota Castels (2003), mas sim pelo
status decorrente do estamento (ou seja, era o estamento que determinava o trabalho, e não o trabalho que
determinava o status). Sendo assim, não era necessária a valorização do trabalho em seu nível moral: esta
interpretação somente surgirá com o capitalismo, tendo em vista o disciplinamento da população para o trabalho
nas fábricas. Aliado à defesa destas noções morais, assim como do controle dos corpos (FOUCAULT, 2010),
estará o desemprego, forçando o proletariado, sem propriedade dos meios de produção, a vender sua força de
trabalho a custos muito baixos.
13
“A procura por homens regula necessariamente a produção de homens assim como de qualquer outra
mercadoria. Se a oferta é muito maior que a procura, então uma parte dos trabalhadores cai na situação de
miséria ou na morte pela fome. A existência do trabalhador é, portanto, reduzida à condição de existência de
qualquer outra mercadoria. O trabalhador tornou-se uma mercadoria e é uma sorte para ele conseguir chegar ao
homem que se interesse por ele” (MARX, 2008, p. 24, grifos do original)
27

medida, uma negociação entre patrão e empregado; e é uma negociação desigual, uma vez
que é o capitalista quem possui a capacidade de empregar, podendo negociar o preço e as
condições de sua contratação, além de que o capital possui uma tendência natural a se unificar
(graças à sua quantificação e acumulação em trabalho morto), enquanto o trabalho não14.
Contudo, a partir da organização da classe trabalhadora em sindicatos e partidos –
inaugurada na metade do século XIX –, esta relação se modificou profundamente, surgindo
leis que regulamentam as relações de trabalho. Não obstante manteve-se, com estas
mudanças, a exploração da força do trabalho – caso contrário, não haveria como o capitalismo
persistir –, estabeleceram-se limites e condições para a disputa capitalista (isto se deu desde
legislações anti-trustes e monopólios até limites na jornada de trabalho e garantia de direitos
definidos). Esta transformação pode ser associada à correlação de forças, e, em especial, à
falha da burguesia em conseguir justificar e legitimar sua exploração nos moldes anteriores
(ou seja, a dominação se enfraquece diante de uma perda de sua legitimidade).
Por isso, a produção discursiva, na área das relações de trabalho, depende não apenas
de elementos ideológicos, mas também econômicos. Isto serve não somente para fundamentar
a rebelião das classes trabalhadoras, mas também as condições de concessão da burguesia –
não à toa, crises econômicas, no capitalismo, tendem a significar mudança nas relações de
trabalho e na correlação de forças, como demonstram farta literatura. Quero dizer, com isso,
que a classe trabalhadora depende de sua organização e das condições econômicas
conjunturais para conseguir suas conquistas dentro do capitalismo. Além disso, as relações de
classe se encontram à mercê das transformações apresentadas na seção anterior.
Sendo assim, o mercado de trabalho brasileiro passou por estas transformações
também: não apenas pela mudança da correlação de forças (o que, veremos mais à frente, foi
um importante fator de mudança das condições de trabalho no Brasil contemporâneo), mas
também pela transição do fordismo para o modo de acumulação flexível, sendo o Brasil um
país em posição periférica no sistema capitalista mundial.
Esta mudança, em um primeiro momento, implicou na ascensão do neoliberalismo no
país, o qual, em geral, realizou as seguintes medidas: a) uma ampla política de privatização

14
“Capitalists, being in control of the process of production in which they combine rationally ‘dead’ and ‘living’
labor, are in a position to constantly evaluate and improve the efficiency of this combination. Whereas capitalists
can (and under the competitive pressure that they put upon each other, must) improve the efficiency of the
process of reproduction of their own labor power. In other words, by introducing (labor-saving) technical change
capital can release itself partially from its dependence upon the supply of labor, thereby depressing the wage
rate. On the other hand, labor cannot release itself from its dependence upon capital’s willingness to employ it,
because there are next to no possibilities of reproducing itself more efficiently, namely on the basis of lower
wages or even outside the labor market” (OFFE; WIESENTHAL, 1980, p. 75-76).
28

das empresas estatais (o que implicou na demissão de uma quantidade considerável de


trabalhadores, jogando-os na instabilidade do mercado e no exército de reserva do capital, o
que levou a expandir a insegurança da classe trabalhadora); b) uma política de redução dos
gastos estatais (com isso, pioram-se as condições dos serviços públicos – o que acaba por
forçar parte da população a gastar dinheiro de seu bolso –, deixa-se de investir na economia e
na mão-de-obra – o que, inevitavelmente, traz uma redução da produtividade imediata); c) um
constante aumento na taxa de juros (SELIC), visando-se conter o aumento da inflação (tal
medida causa um efeito recessivo na economia brasileira – dificulta o crédito e desestimula o
gasto – e expande ainda mais o caráter financeirizado de nossa economia, o que acaba
levando a mudar os investimentos na economia – foca-se mais na especulação); e d) uma
liberalização da economia e das relações de trabalho (FILGUEIRAS, 2006).
Estas sequências de medidas tiveram um efeito profundo nas relações de trabalho no
Brasil: associadas à crise econômica e à crise conjuntural do pensamento de esquerda,
decorrente da queda da União Soviética, elas conseguiram diminuir a capacidade de
resistência da classe trabalhadora (ANTUNES, 2009). Não à toa, vários autores
diagnosticaram nesta conjuntura o surgimento de uma nova tática de atuação dos sindicatos,
marcada pelo pragmatismo e negociação com os patrões. Apelidada como “sindicalismo de
resultados”, este método foi uma forma na qual os trabalhadores se organizaram para buscar a
contenção dos efeitos da crise e da reestruturação produtiva sobre suas vidas. Ameaçados pelo
aumento do desemprego (e consequente redução de postos de trabalho), pela redução dos
salários e novas formas de contratação e gestão do trabalho (durante o governo Fernando
Henrique Cardoso se institui, por exemplo, o contrato de trabalho temporário), os
trabalhadores se viram com poucas opções de organização (CARDOSO e RODRIGUES,
2009; BOITO JR., 1999).
Aqui, a correlação de forças auxiliou a queda das vitórias do trabalho: após conquistar
diversos acúmulos com a ascensão do “Novo Sindicalismo” na década de 80, o avanço do
trabalho foi contido pelas novas táticas capitalistas de produção flexível, como a produção
“just in time”, a flexibilidade no trabalho e a ideologia de integração do trabalhador à empresa
(ALVES, 2001). Como veremos à frente, estas medidas foram parcialmente apoiadas pela
indústria, mas sempre com um descontentamento bastante pronunciado: a ausência de
crescimento econômico adequado.
29

Naquilo que ficou conhecida como a “década perdida” (anos 90) para o
desenvolvimento, o empresariado industrial enxergava elementos positivos (como a
estabilidade fiscal, a contenção da inflação e a redução de controle sobre a economia e o
trabalho), enquanto também se queixava de problemas (a já dita falta de crescimento e
abertura muito radical de nossa economia ao mercado internacional) (DINIZ; BRESSER-
PEREIRA, 2009). Em suma, durante este período o discurso da indústria se marcou pelo
apoio às reformas a serem promovidas pelo governo FHC e inserção da indústria na economia
mundial; enquanto isso, a única oposição seria ao fato de que o Estado precisaria realizar seu
papel de estimulador do desenvolvimento com mais firmeza, mas sem usar os artifícios do
modelo de acumulação anterior (fordista).
Por isso, a indústria não viu com tantos problemas a mudança de modelo econômico,
com a chegada de Lula ao poder, tanto porque se atendeu às suas demandas de maior atuação
do Estado quanto porque se manteve o rigor fiscal e os princípios econômicos de seu
antecessor. Não quero dizer, com isso, que tenha concordado com todas as medidas do
governo, mas sim que se sentia satisfeita diante dos avanços econômicos atingidos durante
este período. Um dos aspectos centrais, creio, que podem ser apontados para este
contentamento era a dominação da classe trabalhadora, que seguiu inserida na ordem
capitalista, sem procurar uma ruptura com esta (OLIVEIRA, 2010). Isto não significa,
entretanto, que suas mudanças (em especial nas relações trabalhistas, distribuição de renda e
consumo) não foram benéficas para a classe trabalhadora, como mostro à frente.
A retomada do crescimento econômico no período mais recente, aquele que marcou os
governos petistas (2003-2014), foi um dos aspectos centrais não apenas para a satisfação do
empresariado, mas também do proletariado, uma vez que foi a partir deste avanço – baseado
em boa parte no boom dos preços das commodities exportadas pelo país, é verdade – que se
tiveram as condições para garantir os avanços em questão. Este crescimento permitiu e foi
retroalimentado com o aumento do investimento estatal na economia, o que, por sua vez,
conferiu a estabilidade de crescimento necessário para ter as devidas condições para a
melhora nas condições do Sistema de Relações de Trabalho (BALTAR; KREIN, 2013).
Essas melhoras podem ser percebidas pelo aumento da renda do trabalho (segundo
dados do PNAD15, houve um crescimento do rendimento real do trabalho, entre 2003 e 2014,
em 43,1%, indo de 1.247 até 1.785), a expansão do salário mínimo (foi de R$ 200,00 para R$
622,00), a redução no índice de desemprego (a taxa de desemprego média anual foi de 12,3%,

15
Os dados a seguir foram todos retirados do mesmo documento do PNAD (IBGE, 2015).
30

em 2003, para 4,8%, em 2014) e, por fim, no aumento da formalidade do trabalho (o índice de
formalidade do trabalho foi de 39,7% em 2003 para 44,1% em 2008, enquanto o número de
trabalhadores que ocupavam posições precarizadas – como trabalho assalariado sem carteira,
trabalhadores domésticos e por conta própria, etc. – caiu de 59% para 49%, entre 2002 e
2012, além de que a porcentagem de empregados com carteira assinada subiu de 55,3% em
2001 para 64,8% em 2013).
Com essas mudanças, então, foi lógico que houvesse um enfraquecimento da oposição
sindical e redução da média de greves (durante o governo Lula, pelo menos, como
comprovam Araújo e Oliveira [2014]), o que contribuiu para convencer os empresários da
validade dos governos em questão – e inclusive os levaram a valorizar cada vez mais este
diálogo e relação com a classe trabalhadora (confira-se as diferenças entre as interpretações
dos primeiros documentos da CNI e de outro editado no auge do governo Lula).
Sendo assim, com o crescimento econômico, expansão dos rendimentos da classe
trabalhadora (salário mínimo, programas sociais, etc.), redução do desemprego e aumento da
formalidade do trabalho, os governos Lula e Dilma permitiram a transformação das relações
de trabalho a favor da classe trabalhadora, em diversos aspectos. Porém, por outro lado, as
contratações denominadas “atípicas” também aumentaram nesta época, o que nos leva
reconhecer o caráter contraditório destas transformações (BIAVASCHI; KREIN, s.d.d.).
Se, reconhecendo estes fatores, pode-se concordar com a análise de André Singer
(2012), de que o lulismo deve ser caracterizado como um “reformismo fraco”, também é um
fato inegável que ele trouxe problemas à constituição histórica do mercado de trabalho
brasileiro e aos meios de dominação burguesa presentes em nosso território. Ao propor a
integração da população brasileira em um mercado instável, precarizado e altamente flexível,
mas com altos níveis de emprego e maior formalidade, o governo Lula – e de sua sucessora
Dilma – e as instituições de regulação do trabalho (Ministério Público do Trabalho, Ministério
do Trabalho e Emprego e Justiça do Trabalho) dificultaram o processo de controle da força de
trabalho a partir da informalidade (BALTAR, et al, 2010).
A cada vez maior atuação destas instituições, em articulação com os sindicatos, na
regulação do mercado de trabalho brasileiro não apenas ajudou a garantir o aumento da
formalidade do emprego no Brasil, mas também incomodou as classes empresariais – como
analisados nos capítulos seguintes desta pesquisa.
31

Dito isto, deve-se notar que esta burguesia nunca adotou, historicamente, uma posição
de ruptura, exceto diante do caso do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, no qual,
principalmente devido ao amplo clamor popular, pôde-se ver desde uma nota condescendente
da CNI sobre o caso (ESTADO DE SÃO PAULO, 2016) até uma manifestação favorável ao
impeachment comandada pela FIESP (ESTADO DE SÃO PAULO, 2015). Este fato se deve,
creio, não apenas ao avanço progressivo da classe trabalhadora, mas, talvez de forma até mais
determinante, ao avanço da crise econômica, que implodiu as estruturas de articulação entre
empresariado e Estado promovidas pela auto-denominada Nova Matriz Econômica. Como
demonstrarei mais à frente, um dos fatos que permite embasar esta tese é, justamente, a
argumentação deste grupo em torno da reforma trabalhista: a constante ênfase na necessidade
do retorno do crescimento, da fuga da crise econômica, parece comprovar, ao menos
parcialmente, o quão fundamental o crescimento é para a Indústria Nacional, sendo este um
dos principais fatores de mobilização deste grupo em torno do governo do país. Um motivo
claro existe para isso, de acordo com Bianchi:
Personificações de um capital particular estão com sua alma dilacerada pelas pressões
decorrentes da contraditoriedade existente entre as necessidades do processo de reprodução do
capital em geral e as necessidades de seu próprio capital (...) Daí a possibilidade de um mesmo
intelectual orgânico expressar, simultaneamente, projetos aparentemente incompatíveis (...) A
viabilidade de tais projetos não depende da argúcia de seus portadores e sim da existência de
relações de forças sociais apropriadas para tal. As formas de associação do capital não são o
resultado de uma tendência espontânea à identificação de interesses comuns e sim o produto
destas relações de forças sociais que motivariam a agregação de interesses antes dispersos e,
até mesmo, conflitantes, bem como da capacidade de liderança de certos intelectuais
(BIANCHI, 2007, p. 126)

Isso significa que, para a burguesia industrial, mais do que a representação imediata de
seus interesses, é importante para ela em um nível ideológico a reprodução efetiva do
capitalismo vigente. Para ela, o que marca a validade de um governo ou período histórico não
é apenas a ligação direta às suas propostas, mas também a sua capacidade tanto de conter a
classe trabalhadora (dominação) quanto à expansão de sua acumulação capitalista. Por isso, a
aceitação dos governos de Lula e Dilma não surge diretamente como identificação deste
grupo aos governos em questão, mas sim de sua satisfação com os rumos da economia e das
relações de força existentes.
Outro aspecto importante é que, não obstante a indústria nacional possa ser
considerada um setor bastante heterogêneo, abrangendo diversos atores sociais que também
disputam ideologicamente dentro de seu campo – seja ele uma entidade, instituição, ou, ainda,
o próprio Estado –, ela possui elementos unitários. Tanto a indústria nacional mais próxima ao
neodesenvolvimentismo – atraída pela tutela do Estado, aproveitamento do mercado interno e
32

expansão das garantias aos direitos – quanto aquela avessa a ele – de caráter mais liberal,
oposicionista aos gastos do Estado, ao aumento de impostos de todo o tipo e controle estatal
das relações de mercado e de trabalho – opõem-se à reversão neocolonial, os juros altos e o
baixo crescimento, por exemplo, os quais Dilma Rousseff não conseguiu evitar em seu
segundo mandato (SINGER, 2015).
Sendo assim, antes de finalmente passarmos à análise dos documentos, é preciso
ressaltar que a CNI não é a representante essencial e exata da classe industrial brasileira: ela é
apenas uma representante dentre muitas federações da indústria – o que significa que, dentro
da heterogeneidade das indústrias brasileiras, ela não consegue representar exatamente o
interesse de todas as indústrias do país. Por outro lado, seu caráter geral e amplo – assim
como o desenvolvimento inegável de um amplo grupo de pesquisa e informação pela entidade
–, parece-me, permite-lhe focar mais profundamente na produção de materiais para a defesa
das propostas da indústria. Isto significa que, embora não possa representar todos os grupos
empresariais do país, ela cumpre um importante papel de difusão de noções gerais deste – e a
reforma trabalhista, pelo apoio conferido pelas entidades, federações e sindicatos patronais
menores, parece ser praticamente uma unanimidade dentro destes setores16.
Por isso, este problema metodológico parece-me ser remediado a partir do momento
em que me proponho a focar na análise de sua opinião sobre a reforma: não obstante possa
existir certo desvirtuamento da concepção de diferentes grupos sobre como usufruir dela – por
exemplo, uma grande empresa multinacional não utilizará a reforma trabalhista da mesma
forma que uma pequena empresa –, seu apoio a esta mudança na legislação passa,
inevitavelmente, pelos mesmos eixos da lógica capitalista de expansão da competitividade dos
negócios. Ou seja, pode-se dizer que indústria acaba se unindo graças às suas vontades
individuais, dentre as quais – em um mundo no qual persiste uma concorrência mundial entre
capitais (e, esta fração de classe, como já falei, se opõe à completa livre disputa entre capital
nacional e estrangeiro) – se destaca o avanço e/ou conservação da competitividade da
indústria nacional17. E é este um dos principais enfoques no capítulo que teremos agora.

16
Pode-se ver apoio à reforma por parte da CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil), a
FEBRABAN (Federação Brasileira dos Bancos), a CNT (Confederação Nacional do Transporte) e CNS
(Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços). Cf. ESTADO DE MINAS, 2017.
17
Aqui, a ideia – esboçada por Offe e Wiesenthal (1980) – de que as associações empresariais se organizam com
mais facilidade por conta do aspecto utilitarista de sua atuação (acumulação) pode ser considerada, em certa
medida, verdade: as diferentes frações da indústria podem até discordar de algumas questões colocadas pela
CNI, mas todas, pode-se dizer, concordam com a promessa de maior liberdade na gestão do trabalho, uma vez
33

3. A legislação trabalhista para a CNI: bases ideológicas

Neste capítulo, pretendo destrinchar, a partir dos documentos da indústria, coletados


em seu site (portaldaindustria.com.br), a ideologia da indústria com relação à condução da
economia, o Estado e as relações trabalhistas no Brasil. A CNI disponibiliza em seu endereço
eletrônico documentos que datam desde 1998, mas o maior número de seus documentos são
recentes, pertencentes à segunda década do século XXI. A ampla e qualificada produção de
documentos e estudos da entidade pode ser considerado fruto do desenvolvimento tanto de
seus conselhos temáticos quanto de seus quadros técnicos (PONT, 2012), o que a credenciou
a discutir problemas e questões nacionais de forma competente, sempre expondo suas
soluções.
Utilizarei, aqui, principalmente os documentos classificados como “Análise de
Conjuntura” na primeira seção deste capítulo, buscando-se a definição do como os
representantes da Indústria entendem o papel desta na condução econômica do país: qual é o
tipo de crescimento econômico que defendem? Quais são os principais pontos que asseguram
o desenvolvimento e crescimento econômico? O que a industrialização deve trazer para a
economia e sociedade brasileiras? Como se poderá ver mais à frente, todas estas perguntas
serão respondidas nestes documentos.
Para dar conta dos meus objetivos e indagações, selecionei um conjunto de
documentos, que podem ser visualizados no quadro abaixo, produzidos pela CNI, que me
permitiu identificar o posicionamento da entidade quanto a uma série de questões elencadas
neste estudo. No quadro, possibilita-se também a identificação dos conteúdos analisados,
nesta pesquisa:

que lhes favorece seu objetivo último. O que pode haver de discordância – e este ponto é interessante, mas não
me cabe desenvolver aqui – é a expansão completa deste modelo de trabalho para todos os empregos no país,
uma vez que, para um número considerável das indústrias, o mercado interno é sua maior base consumidora.
34

QUADRO 1 : DOCUMENTOS DA CNI ANALISADOS


Documento Abrangência Ano Finalidade
A indústria e o Brasil: uma Economia 2002 Análise de
agenda para o crescimento. Conjuntura
Crescimento. A visão da Economia 2006 Análise de
Indústria. Conjuntura
Conclusões do 3º Encontro Economia 2008 Agenda Legislativa
da Indústria
A indústria e o Brasil: uma Economia 2010 Análise de
agenda para crescer mais e Conjuntura
melhor
Mapa Estratégico da Economia 2005 Análise de
Indústria (2007-2015) conjuntura
Mapa estratégico da indústria Economia 2013 Análise de
(2013-2020) conjuntura
Agenda para o Brasil sair da Economia 2016 Agenda legislativa
crise (2016-2018)
101 propostas para a Relações de Trabalho 2012 Agenda legislativa
modernização trabalhista.
Custos do trabalho e Relações de Trabalho 2014 Propostas eleitorais
produtividade
Modernização e Relações de Trabalho 2014 Propostas eleitorais
desburocratização trabalhista
Negociações coletivas: Relações de Trabalho 2014 Propostas eleitorais
valorizar para modernizar
Segurança Jurídica Relações de Trabalho 2014 Propostas eleitorais
Terceirização: o imperativo Relações de Trabalho 2014 Propostas eleitorais
da mudança
Negociação coletiva: o que é Relações de Trabalho 2014 Propostas eleitorais
e porque valorizá-la
FONTE: CNI, 2002; idem, 2006; idem, 2007; idem, 2008; idem, 2010; idem, 2012; idem, 2012b; idem, 2014a;
idem, 2014b; idem, 2014c; idem, 2014d; idem, 2014e; idem, 2014f; idem, 2016. Elaboração própria.

Como se pode ver no quadro, foram coletados 14 documentos, datando desde 2002 até
2014, divididos em 6 categorizados como “análise de conjuntura”, 2 como “agenda
legislativa” e 6 como “propostas eleitorais”. A maioria dos documentos foi publicada na
segunda década do século XXI, em especial os documentos com propostas eleitorais
propriamente ditas, das quais todas foram lançadas pelo menos no ano de 2014. Considerando
que estes documentos são os que mais tratam diretamente sobre as relações de trabalho, pode-
se chegar à conclusão de que a entidade em questão expandiu sua divulgação de materiais
sobre o tema apenas contemporaneamente, sendo seu documento mais antigo tratando com
exclusividade sobre o tema remonta somente até 2012.
35

Em nota explicativa, podem-se definir as diferentes finalidades dos textos a partir dos
seguintes termos: a) Análise de conjuntura: pode ser definida como um documento
interessado na interpretação da situação da indústria do país e de soluções para seus
problemas; b) Agenda: é marcada pela análise e desenvolvimento de propostas específicas
entendidas como benéficas para a indústria, geralmente realizando-se, em conjunto, um
mapeamento das esferas de poder e de meios possíveis para realização de suas propostas; c)
Propostas Eleitorais: é determinada pela busca da definição de um conjunto de propostas
voltadas para a conjuntura analisada pela indústria, em geral lançado durante o período de
eleições, mas nem sempre – diferentemente da Agenda, prende-se apenas à proposição e ao
argumento desta, sem se preocupar em realizá-las.
A partir daí, pretendo apresentar como estas interpretações resvalam sobre o trabalho
na última seção deste subcapítulo. Nesta parte, além dos documentos anteriores, utilizarei as
obras marcadas como “Propostas” e “Agenda”, para, depois, analisar mais apropriadamente
suas propostas – esta parte será apenas no próximo subcapítulo, para facilitar sua
esquematização e seguinte comparação com a reforma trabalhista proposta neste ano.

3.1. Desenvolvimento, crescimento e industrialização: o Estado e a economia para a


Indústria.
Os documentos analisados aqui se marcam por sua tentativa de interpretar a situação
econômica do país e propor uma solução que esteja dentro dos termos e noções ideológicas da
entidade. Por isso, dois pontos podem ser considerados centrais para a definição da visão
deste grupo: seus objetivos e o caminho necessário para alcançá-los. Dentre os objetivos,
destacam-se três em seu texto: a) “consolidar o Brasil como uma economia competitiva e
inovadora”, inserida na sociedade do conhecimento; b) o crescimento sustentável; e c) a
geração de mais e melhores empregos. Dito isto, é reconhecido no texto em questão o fato de
que “a CNI identifica o crescimento como o principal desafio a ser enfrentado” (2002, p. 17).
Isto significa, afinal, que o grande interesse da Indústria para o país, como já anunciei
anteriormente – e ainda mais devido ao contexto de dado documento18 –, é o crescimento
econômico, o qual seria resultado direto da expansão de nossa produtividade interna e
competitividade externa.
18
Diniz e Boschi (2003) apresentam como o governo FHC, apesar de receber apoio graças à sua estabilização da
economia, incomodara aos empresários nacionais graças à intensidade de suas reformas (as quais aumentaram a
vulnerabilidade externa do país) e, principalmente, devido ao baixo nível de crescimento da economia nacional.
Esta será a condição que permitirá o surgimento de Lula como um candidato capaz de representar o
empresariado nacional, quando este consegue garantir o crescimento econômico do país e o aumento de
investimentos na indústria, enquanto mantém a estabilidade fiscal e econômica.
36

O caminho escolhido para atingir estes objetivos, como já se antecipou anteriormente,


se dá a partir de uma proposição neoliberal: o crescimento sustentável deve ser conjugado ao
limite do gasto público, buscando-se, pelo menos, a manutenção de um superávit primário nas
contas públicas. O limite aos gastos públicos é necessário, segundo a entidade, para “manter a
relação dívida/PIB sobre controle (sic)”, aumentar a eficiência do Estado e liberar recursos
para a iniciativa privada (seja através de privatizações ou reduções na tributação) (CNI, 2002).
E, por fim, a manutenção do superávit primário também possui ligação à contenção da dívida,
cumprindo o papel conjunto de estimular capitais para o país, aumentando o investimento.
Outro ponto defendido pela CNI, como visto no mesmo documento (2002), a
desvalorização do câmbio e diminuição da taxa de juros tem como principal interesse
expandir as exportações do país e aumentar a produtividade, a partir da facilitação do acesso
ao crédito para o empresariado. Esta proposta não é, em si mesma, neoliberal, mas possui uma
objetividade distinta a uma proposta desenvolvimentista original, cujo foco seria a
substituição de importações (ou seja, voltada para o mercado interno). Por isso, ainda assim, o
que se tem nesta meta é a proposição de uma economia inserida no mercado mundial e, assim,
presa às exigências deste – de uma economia aberta e “amigável” aos negócios, sem a
interferência, por eles considerada excessiva do Estado. A perspectiva de desenvolvimento da
CNI, pois, tem um foco externo muito forte, uma vez que lhe interessa mais a integração à
economia mundial do que a aquisição de independência do país.
Desta primeira definição de caminhos, a CNI interpreta, também, o tamanho e a
ineficiência do Estado como um problema para a expansão do crescimento brasileiro19. O
documento destaca que a alta carga tributária, aliada ao baixo nível dos serviços públicos (má
qualidade da saúde e educação, por exemplo, em comparação com os gastos nestes setores),
leva à ineficiência do Estado em organizar e promover o crescimento econômico. Dito isto,
exige uma reforma administrativa do Estado brasileiro, visando “modificar e reduzir
estruturas, eliminar superposição de funções e adequar objetivos” (CNI, 2006, p. 26), além de
três reformas interdependentes: tributária, previdenciária e trabalhista. A tese da importância
destas reformas é ilustrada com a seguinte figura, extraída do documento:

19
“O Estado brasileiro é grande, burocrático e lento em suas decisões. Trabalha com baixo nível de eficiência e,
muitas das vezes, com eficácia reduzida” (CNI, 2002, p. 26). Esta ideia se encontra ancorada, claro, no clássico
princípio liberal de que a iniciativa privada é inerentemente mais efetiva do que a iniciativa estatal, o que leva à
constatação de que o desenvolvimento sustentável só é possível com o afastamento do Estado da economia. Isto
não implica, entretanto, que o Estado não deve atuar na economia, como mostrarei a seguir.
37

FIGURA 1: A INTERDEPENDÊNCIA ENTRE AS REFORMAS (CNI)

FONTE: CNI, 2006.

Nesta figura, pode-se perceber que a entidade relaciona estas três reformas (tributária,
previdenciária e trabalhista) com o financiamento do setor público, mas com um adendo: a
reforma trabalhista teria também uma relação direta com o “aumento do emprego formal” e,
com isso, aumentar-se-ia a arrecadação da previdência. Veremos mais desta interpretação à
frente, quando tratarei diretamente sobre a concepção da CNI sobre as relações de trabalho no
país.
Como se pode perceber, a defesa desta perspectiva reformista parte da transição de
uma concepção de desenvolvimento predominantemente macroeconômica
(desenvolvimentismo e/ou keynesianismo) para outra microeconômica (neoliberal e/ou
neoclássica)20, uma vez que percebe na regulação das instituições (e na sua garantia ao

20
Diniz, Boschi e Bresser-Pereira apresentam em seus textos (2003; 2010) uma perspectiva diferenciada:
entendem existir no pensamento deste empresariado uma forte influência macroeconômica. Alguns pontos
devem ser ressaltados: primeiro, a diferença de atores analisados (IEDI e CNI), os quais não apresentarão,
necessariamente, a mesma concepção de desenvolvimento; segundo, na sua análise do mesmo documento aqui
referenciado (CNI, 2002), não leva em consideração as diversas reformas liberalizantes sugeridas no texto, assim
como não se considera a constante afirmação em defesa do mercado e da responsabilidade fiscal, representando-
se o compromisso deste grupo com o modelo neoliberal de desenvolvimento; e, terceiro, não obstante fale-se,
sim, de mudanças macroeconômicas, de relações comerciais, etc., estas não se dão de forma separada ao modelo
neoliberal, sem jamais propor um rompimento exato com este. Se, de fato, defende-se a atuação do Estado na
economia, em setores específicos – como o da inovação –, por outro lado defende que este deixe de regular áreas
de importante valor social (como as relações de trabalho). O que se exige, para o desenvolvimento, é uma
combinação dos dois fatores (macroeconômicos e microeconômicos), como se pode comprovar pela divisão
entre os números de páginas tratando de suas diferentes “estratégias de desenvolvimento” (são gastas, no
documento de 2002, 45 páginas defendendo uma política industrial macroeconômica e 49 especificando uma
“agenda de competitividade” composta por reformas microeconômicas). No documento de 2006, por outro lado,
apenas um capítulo curto (de 8 páginas) é gasto com macroeconomia, enquanto um capítulo longo, com 10
38

liberalismo econômico) um caminho melhor do que a atuação do Estado como agente


planejador do desenvolvimento:
O crescimento não resulta apenas de saídas políticas macroeconômicas. É indispensável
construir um ambiente institucional favorável aos negócios e promover uma política industrial
voltada ao investimento produtivo (CNI, 2002, p. 31).

Elemento interessante para representar a transição deste paradigma pode ser


encontrado, também, na figura publicada no texto da CNI de 2006. Como se vê, praticamente
se equivale investimento (privado, é claro) a crescimento:
FIGURA 2: as reformas e o crescimento (CNI)

FONTE: CNI, 2006.


Esta figura é, também, bastante significativa: propugna uma correlação entre a
redução de gastos do Estado (a qual possibilitaria a redução da dívida e a baixa na taxa de
juros), uma “estrutura tributária eficiente” (da qual se retiraria maior competitividade e
produção) e o aumento de investimentos (o qual, por sua vez, estimularia o crescimento
econômico). Ou seja, o caminho para alcançar o crescimento, para a CNI, passa por uma

prioridades, dentre as quais predominam propostas microeconômicas para aumento da eficiência da economia
brasileira, é dedicado para reforçar a perspectiva neoliberal deste documento. Ao que me parece, portanto, o foco
da proposta da CNI é reformar o Estado brasileiro e tornar as relações econômicas no país mais livres e
amigáveis aos negócios, aumentando-se a eficiência de nossa economia (uma noção claramente próxima às
interpretações microeconômicas do desenvolvimento).
39

reformulação do Estado brasileiro, de tal forma a incentivar a atuação da iniciativa privada em


nosso país. Os autores críticos do neoliberalismo, e sobretudo, da dinâmica da economia
brasileira, revelam, no entanto, que esse crescimento tendeu a ser, historicamente
impulsionado pelo Estado. A questão que se coloca aqui, do ponto de vista sociológico, é de
que reforma do Estado, de um Estado máximo para os mercados e mínimo para o social ou o
seu inverso.
Em outras palavras, a figura da “melhora do ambiente institucional” para a CNI é um
ponto fundamental para a concepção de desenvolvimento deste grupo: ela depende do avanço
da segurança jurídica, que por sua vez, seria melhorada pela reforma trabalhista (não
flexibilizando apenas o trabalho, mas também garantindo ao empresário menos riscos ao
contratar um empregado) e através da segurança da propriedade21. Por isso, defendem tais
reformas sob o argumento de atrair investimentos e negócios ao país (sejam eles nacionais ou
estrangeiros – estas linhas praticamente são borradas nos tempos capitalismo flexível e
alavancar a competitividade de nossa economia, inserindo-a mais apropriadamente ao
mercado mundial.
Sendo assim, estas posições ainda que proponham o desenvolvimento da economia
nacional, o fazem sob o signo do ideário neoliberal: expansão da oportunidade de negócios –
predominando o foco na iniciativa privada –, maximização da eficiência do Estado e da
economia e integração ao mercado mundial e suas regras. Um dos pontos centrais que
corrobora esta perspectiva é, justamente, o foco deste grupo na realização de políticas
econômicas que favoreçam a exportação. Isto confirma, em certa medida, nossa perspectiva
de união relativa deste grupo com outras frações de classe (em especial a burguesia
financeira) e com o imperialismo mundial. Por isso, acredito que suas propostas de
desenvolvimento e crescimento se dão em termos coerentes com as ideias defendidas pelas
grandes instituições mundiais de controle (liberal) do mercado (como a OMC, FMI e outros)
para o desenvolvimento dos países subdesenvolvidos.
Entretanto, apesar da defesa clara desta perspectiva nos documentos analisados (os
quais foram publicados em 2002, 2006 e 2010, no contexto das eleições presidenciais, cf.

21
No texto em questão, nesta parte, enumera-se ipsis literis da seguinte forma os aspectos da segurança jurídica:
“segurança jurídica dos contratos; respeito às regras do mercado; ambiente amplo de segurança física de seus
cidadãos, da propriedade e dos ativos produtivos” (CNI, 2006, p. 31). Estes, claramente, referem-se diretamente
aos direitos da propriedade, dentre eles: o de negociação do trabalho (contrato); de regulação privada da
economia, sem interferência do Estado (respeito às leis do mercado); e, por fim, o direito de dispor livremente de
seus patrimônios e bens, sem ameaças às suas perdas, seja através da garantia do direito penal e de limitações ao
direito civil em intervir na propriedade de outrem (segurança física).
40

quadro 1), e do considerável compromisso dos governos deste período às propostas (em
especial macroeconômicas) da indústria22, a CNI parece manter a exigência de reformas
profundas no Estado brasileiro, através de sua “Agenda de Competitividade”, com o objetivo
último de reduzir o chamado “Custo-Brasil”. Essa foi uma campanha avassaladora na década
de 1990, sobretudo, nos governos Collor e FHC, e que foi retomada com muita força antes e
depois do impeachment de Dilma Roussef.
Ou seja, a perspectiva deste grupo sobre o caminho necessário para o país alcançar o
desenvolvimento permanece o mesmo. Não obstante, em que pese as diversas transformações
da economia brasileira no período, todos os textos possuem o mesmo tom de sempre, de
redução dos custos do Estado, expansão de sua eficiência e de maior incentivo às empresas
para atuar no mercado nacional, com menos empecilhos – sejam eles fornecidos pelo Estado
(tributos, altos juros, etc.) ou deficiências históricas da economia e sociedade brasileiras
(baixo nível de escolaridade, infraestrutura insuficiente e onerosa, etc.) Diante deste fato,
perde-se a capacidade de investimento, como já se demonstrou acima, e, assim, o nível de
produtividade da economia e da indústria brasileiras decresce. Esta dinâmica, própria da
visão deste grupo, parece bem representada na figura a seguir:

22
É necessário ressaltar, aqui, que a manutenção de uma política dentro dos marcos neoliberais (de respeito ao
mercado, forte responsabilidade fiscal e contenção da atuação do Estado na economia) esteve presente em todos
os governos do período analisado, diferindo-se mais o foco desta política do que a política em si: não obstante,
por exemplo, o governo Lula tenha buscado aumentar a renda da população, estimulado o crédito, etc., ele
manteve uma gestão do Estado próxima à do governo FHC. Isto não se deve à proximidade ideológica entre
estes dois governos, mas sim à profunda institucionalização de aspectos neoliberais na política brasileira após a
queda do paradigma desenvolvimentista, o que, afinal, reproduz uma vontade explícita da CNI nos documentos
analisados (SADER, 2013).
41

FIGURA 3: PRIORIDADES PARA O CRESCIMENTO (CNI)

Fonte: CNI, 2002


Como se pode ver, o suporte principal desse crescimento econômico é o ambiente
institucional (localizado na parte de baixo da figura), o qual permite o melhor aproveitamento
das condições da economia mundial. O movimento de adequação deste suporte se dá através
da desburocratização (localizada à esquerda na figura), a qual move o conteúdo geral das
reformas a serem realizadas, tanto para a “melhora no clima de negócios” quanto para os
“ganhos de produtividade”, diferentes lados de uma mesma moeda: o crescimento econômico.
Para melhorar o clima de negócios, estão presentes reformas da chamada “Agenda de
Competitividade”, as quais procuram garantir uma melhor condição de reprodução dos
negócios no país, além da política comercial, que permite às empresas brasileiras atingir
maiores porções do mercado consumidor mundial e expandir as relações econômicas do país
com o mundo. Enquanto isso, para expandir a produtividade, além de algumas reformas
(como a trabalhista e a da infraestrutura) e expansão comercial, esta entidade baseia-se
principalmente no investimento na inovação, na educação e na redução de gastos públicos –
neste, permitir-se-ia a liberação de recursos para a iniciativa privada (mais eficiente do que o
42

Estado), diminuir-se-iam os gastos com a tributação e, por fim, aumentariam os investimentos


do Estado na infraestrutura.
A proposição deste caminho para o desenvolvimento se deu, é claro, a partir das
análises de conjuntura realizadas pela indústria, as quais, por sua vez, só podem compreender
a competitividade a partir de um momento específico das economias brasileira e mundial. Por
isso, deve-se fazer, após todo este processo de construção argumentativa, uma ressalva: as
estratégias de desenvolvimento da indústria, em geral, transformaram-se, em alguns aspectos,
durante o período analisado. Dois documentos que contrastam perfeitamente estas mudanças
são os dois “Mapas Estratégicos da Indústria” publicados pela CNI nesta época – um em
2007, com características mais próximas às apresentadas acima, e outro em 2013, com foco
maior nas mudanças macroeconômicas e na inovação.
Enquanto no primeiro mapa estratégico (figura 4) predomina a perspectiva dos dois
primeiros documentos que apresentei (2002 e 2006), buscando-se reformas institucionais que
permitissem a maior eficiência da economia brasileira, no segundo, pelo contrário, não
obstante não se neguem estas reformas, fala-se muito mais na inovação, no aproveitamento do
potencial do mercado interno brasileiro, etc. Para ilustrar esta diferença, podem-se comparar
as duas diferentes figuras ilustrativas do caminho para o “desenvolvimento sustentável”:

FIGURA 4: Mapa Estratégico da Indústria (2007-2015)

Fonte: CNI, 2005


43

FIGURA 5: Mapa Estratégico da Indústria (2013-2022)

Fonte: CNI, 2013.


Como podemos ver, enquanto uma delas (2013) entende como base do avanço da
indústria nacional a educação, devendo ser seguida pela melhora do ambiente econômico e
redução de custos (por meio das reformas institucionais) e investimentos na economia
brasileira, levará à inovação e o aumento da produtividade, elementos responsáveis por
conferir competitividade à indústria brasileira. Na outra (2005), as reformas das instituições
são colocadas em conjunto à educação e à expansão da liderança empresarial como bases do
desenvolvimento, os quais tenderão a aumentar a produtividade nacional. Esta diferença sutil
possui, na verdade, um significado considerável: um documento foca-se mais nos avanços da
inovação, embora não negue o ambiente institucional; o outro, por outro lado, foca mais no
ambiente institucional, embora tampouco negue a inovação. Isto significa que seu discurso se
modifica, mas também mantém os aspectos essenciais que o marca, dos quais já falei na
subseção anterior: a busca pelo crescimento e competitividade, mudando-se apenas qual seria
o melhor caminho para definir este objetivo.
44

O que define a distância entre estas duas interpretações talvez seja a mudança do
contexto da economia brasileira: se os documentos de 2002, 2006 e 2007 foram escritos em
uma época de pouco destaque econômico do país, os outros dois (2010 e 2013) foram
marcados pelo otimismo do período de crescimento econômico pós-crise mundial de 2008,
em que o Brasil, conciliou investimentos na indústria com crescimento da renda, do emprego
e do consumo do mercado interno. Por isso, os documentos mais tardios possuem um aspecto
mais otimista e com menor peso de exigência de reformas institucionais, ao mesmo tempo em
que predomina uma leitura mais próxima às ideias neodesenvolvimentistas.
Entretanto, apesar de todas estas variações do discurso, o tom destinado à reforma
trabalhista nunca se modificou no mesmo nível. Mesmo com todas as mudanças econômicas e
sociais ocorridas no país durante este período, na ótica empresarial, um dos principais
“obstáculos” ao avanço da competitividade, em todas as análises aqui trazidas, é, justamente,
o sistema de relações de trabalho de nosso país, conforme veremos à frente. A partir da
construção de suas interpretações gerais sobre o trabalho, pretendo definir, afinal, qual é o
modelo de reforma trabalhista ideal para a CNI e quais são as suas justificativas para defendê-
la – e, em seguida, na próxima seção, desenvolverei de modo as propostas exatas da entidade.

3.2. E o trabalho com isso? O sistema de relações de trabalho brasileiro para a CNI
A interpretação da CNI acerca do sistema de relações de trabalho historicamente foi
marcada por um padrão em seu pensamento: não apenas por sua completa compatibilidade
com a sua concepção geral da economia brasileira, conforme desenvolvi acima, mas também
pela persistência da centralidade de determinados temas em diferentes documentos,
publicados em diversos períodos.
Em todas as publicações, independentemente das mudanças legislativas e da
conjuntura econômica e política do país, chega-se à mesma conclusão da necessidade de
reforma da legislação trabalhista. A principal justificativa para esta missão é o suposto fato de
que a CLT está “ultrapassada” e que deveria atender a uma dinâmica própria do capitalismo
globalizado, na qual o trabalho se encontra cada vez mais flexível e informatizado, o mesmo
que se aplicava a um contexto de predomínio, ao menos no campo das expectativas, do
trabalho industrial com contratação por tempo indeterminado e jornada de trabalho limitada23.

23
Como já foi desenvolvido por muitos estudiosos da questão trabalhista (KREIN, BIAVASCHI, etc.), esta
afirmação não é de todo verdade, pois a CLT foi continuamente reformada desde sua promulgação. Isto não
significa, entretanto, que, para a CNI, as reformas tenham sido suficientes: desde seu documento em 2002 exige-
45

A constatação da “velhice” da legislação trabalhista brasileira é, talvez, o principal fio


condutor de seus argumentos: presa ao passado, a legislação brasileira impede o país de
conquistar o futuro. Não obstante possa-se fazer a ressalva de que a entidade superdimensiona
as transformações da economia mundial em relação ao Brasil, é fato que sua concepção de
reforma trabalhista não parte de uma concepção internalista, mas sim – como sua proposta
econômica – externalista. Isto é, o que lhes interessa é a inserção cada vez mais profunda do
Brasil no mercado internacional, através da expansão de nossa competitividade – que, para a
CNI, poderia ser resumida na aproximação das condições de trabalho encontradas nos países
desenvolvidos e/ou em crescimento. Por isso, sua argumentação apresenta, de fato, uma
coerência lógica inegável.
Constatando-se o fato da CLT ser obsoleta, a entidade especifica, afinal, o que isto
significa para as relações de trabalho no Brasil: ela possui um tamanho exagerado, que
impede a dinâmica favorável à economia brasileira, num contexto de produção flexível. Nas
palavras da entidade, em seu documento de 2002, logo após as reformas de FHC, destaca:
Nossas normas trabalhistas são detalhistas, deixando espaço exíguo para o ajuste direto entre as
partes interessadas. Em uma economia aberta e globalizada, torna-se impraticável conviver
com uma legislação feita para uma economia fechada e protegida (CNI, 2002, p. 93)
Por isso, mesmo diante do reconhecimento de “avanços” (banco de horas,
fracionamento de férias, etc.), a CNI enxerga como grande problema a persistência da
extensão da legislação trabalhista brasileira. Tanto é que sua proposta inicial – e em certa
medida principal –, a partir dos documentos analisados, sempre foi a simplificação da
legislação brasileira: ao invés de falar em uma reforma ou flexibilização da legislação, o mais
interessante para este grupo seria uma imediata desregulamentação – a qual ele chama, afinal,
de simplificação trabalhista.
Um dos principais argumentos em torno desta simplificação não é apenas a
competitividade – que, conforme aponta Krein (2001), se mantém viva a partir da exploração
conjunta do trabalho informal –, mas também a diminuição da própria informalidade do
trabalho e a expansão da negociação coletiva. Quer dizer, para esta entidade, o grande
responsável pelos altos níveis de trabalho informal no Brasil e ausência de uma tradição de
negociação coletiva é a legislação “intervencionista e autoritária” (CNI, 2006, p. 93), que não
se propõe a aceitar a flexibilidade de suas regras e normas.

se a continuação de reformas trabalhistas mais profundas, mesmo depois do governo FHC, que, conforme
apresentou KREIN (2001), realizou várias transformações nas relações de trabalho no Brasil.
46

Por isso, o esqueleto de suas propostas é exatamente este: transformar a legislação


trabalhista contemporânea em uma legislação mais aberta ao diálogo entre o trabalhador e a
empresa, sem os limites da lei para impedir os avanços necessários às relações de trabalho,
visando-se a competitividade da indústria brasileira. Nas palavras de Krein (2001), o interesse
principal seria substituir a regulação estatal das relações de trabalho para uma regulação
privada. Esta colocação pode ser considerada correta, de acordo com os documentos da CNI:
busca-se, sim, ampliar a regulação privada, que supostamente, seria mais interessante tanto
para o empregador quanto para o trabalhador, uma vez que estes poderiam, então, combinar,
em conjunto, a sua relação de trabalho, através de um diálogo consolidado pela negociação
entre as partes.
Para garantir a eficiência desse diálogo, entretanto, um aspecto central (já discorrido
na subseção anterior) deve ser desenvolvido: a segurança jurídica. Definindo esta como a
existência de “normas claras e precisas, validade dos contratos e justiça na solução de
conflitos”, de tal forma a se “evitar passíveis ocultos pouco controláveis pela empresa” (CNI,
2002, p.94-96), este conceito também é fundamental para a indústria. Na visão desta, a
segurança jurídica é um elemento favorável aos dois lados das relações de trabalho: ela
garante que os atores saibam exatamente o que esperar de suas relações, sem se perderem em
conflitos e inseguranças decorrentes de uma legislação e/ou interpretações equivocadas.
Dentro da segurança jurídica, esta também só pode ser garantida se se conseguir a
regulamentação de novos tipos de trabalho e contratação (como a terceirização), os quais,
tendo regulação inexistente ou com pouca clareza, acabam por serem evitados pelos
empregadores, receosos com a possibilidade de terem de arcar com o custo de passivos
imprevisíveis. Por isso, estas mudanças na legislação devem garantir, aos empresários,
condições mais seguras de investir e gerenciar o trabalho, permitindo-os adaptar-se à
concorrência e atingir níveis produtivos maiores e mais eficientes, sem se perder nas
complexas exigências da lei.
Porém, se, de fato, a segurança jurídica é um passo importante para o avanço da
legislação trabalhista, na concepção da indústria, por outro ela não basta por si só, assim como
a expansão da negociação coletiva também não é o suficiente. Todas elas só fazem sentido,
para garantir a competitividade da indústria brasileira, se promoverem, conjuntamente, a
redução de custos do trabalho: este é o ponto mais importante da análise das relações
trabalhistas no Brasil realizada pela CNI.
47

Um dos elementos mais importantes para este grupo entender a ausência de


competitividade na indústria brasileira é o descompasso entre a produtividade e os custos de
trabalho. Veremos mais à frente quais são as propostas exatas desta entidade para a solução
deste problema, mas já posso adiantar que, dentro dos vários problemas das relações de
trabalho no Brasil, os principais temas destes documentos são o alto custo da mão de obra, a
baixa qualificação desta e a baixa flexibilidade de gestão do trabalho garantida às empresas.
Estes três problemas comprometem, na visão da indústria, a produtividade do país (e, por
conseguinte, sua competitividade): não obstante esta também dependa de outros fatores (como
a inovação, por exemplo), os altos custos da gestão do trabalho, sem se ter um retorno
adequado (qualificação e produtividade do trabalhador), implicam na pouca eficiência da
legislação trabalhista no Brasil.
Em sua visão, a legislação, antes de defender o trabalhador como uma figura com
menos poder diante da empresa, deve garantir a relação saudável entre estes dois atores, de tal
forma a garantir o desenvolvimento dinâmico e virtuoso da economia brasileira. Sendo assim,
uma legislação truncada, expansiva e exageradamente tentando defender o trabalhador,
significa, afinal, um problema a este: antes de garanti-lo um emprego em uma economia
sadia, pelo contrário, o judiciário trabalhista brasileiro pretende, na visão da CNI, excluir este
ator do mercado de trabalho, ao exigir das empresas a realização de uma sequência de
obrigações de difícil aplicação em uma economia aberta e mundializada. Chega-se, inclusive,
a assim afirmar num documento:
A legislação e as ações sindicais não podem ser canalizadas apenas para a busca da
“globalização de direitos”. É preciso focar também no incentivo à produtividade como forma
de garantia dos níveis de emprego, incentivo à meritocracia e não ao seu combate (CNI, 2010,
p. 113)

Em outro documento, anterior a este, chega-se a afirmar, também, como a legislação


trabalhista “discrimina” os trabalhadores mais vulneráveis, ao exigir que estes sigam os
passos da relação de trabalho considerada típica:
Cumpre lembrar que regulação mais rígida está costumeiramente vinculada a taxas mais
elevadas de desemprego feminino, falta de oportunidade para o jovem e participação mais alta
do setor informal no PIB (...) Ao exceder-se, o regulador beneficia uma parcela menor de
trabalhadores e discrimina grupos mais vulneráveis (CNI, 2006, p. 90, grifos do original)

A redução de custos, por isso, não é favorável apenas para a indústria, de acordo com
ela mesma, mas também para os trabalhadores, já que “a elevação de custos do trabalho pode
levar à queda da produção local e ao aumento das importações, gerando desemprego e outros
efeitos negativos para a economia” (CNI, 2006, p. 110). Este pode ser considerado um
48

paradoxo que possui importância central no pensamento da CNI: o trabalhador deve exigir um
menor valor de custo para a empresa (o qual não necessariamente deriva do salário, diga-se de
passagem), para conseguir mais oportunidades e melhores condições de trabalho.
Defendendo-se a competitividade da empresa, defende-se o emprego do trabalhador; assim, a
legislação trabalhista, ao se negar a pensar o lado da empresa, nega, também, o trabalhador,
que depende desta.
A centralidade da redução de custos pode ser comprovada ainda mais se analisarmos
um documento, publicado pela CNI em 2012, chamado “101 propostas para a modernização
trabalhista”. Nele, discutem-se medidas com o objetivo de recuperar a competitividade da
indústria, buscando-se reverter tanto a desindustrialização nacional quanto os altos custos dos
empreendimentos no país (o chamado “custo brasil”). Elenca-se, neste documento, cerca de
oito “linhas de modernização” para fazer as relações trabalhistas avançarem: a) valorização
dos processos de negociação; b) regras claras, seguras e justas para todos os envolvidos
(segurança jurídica); c) reduzir o risco associado a contratações; d) soluções para o aumento
da produtividade; e) desoneração do trabalho formal; f) redução da burocracia e das
irracionalidades; g) afastar entraves a benefícios aos trabalhadores; e h) políticas públicas pró-
emprego.
Sendo assim, das propostas colocadas pela entidade, podemos perceber diferentes
efeitos esperados com as medidas; ao invés de apresentar a divisão colocadas por eles, preferi
dividi-los em, basicamente, três esferas, já organizados em ordem decrescente de frequência:
a) aumento da segurança jurídica (54); b) redução de custos (48); e c) aumento da
produtividade (26)24. Não obstante o documento cite cerca de oito linhas, elas podem ser
resumidas nestas três porque muitas são meras repetições do mesmo fato. Por exemplo, a
desoneração do trabalho formal nada mais é do que redução de custos, assim como o
fortalecimento da negociação coletiva também é garantia da segurança jurídica. Como

24
O número maior do que 101, na soma das classificações, se deve ao fato de algumas propostas se aplicam a
mais do que uma esfera. Lembro que as propostas organizadas se deram a partir de classificações da própria
entidade, mas, por questões de rigor teórico, algumas propostas foram adicionadas sem ter as palavras no caso
citadas: por exemplo, em caso no qual se falava apenas em “redução de custos com passivos trabalhistas”
classifiquei, também, como segurança jurídica, assim como propostas que trariam a qualificação do trabalho
foram colocadas no eixo de produtividade. As propostas foram classificadas, então, da seguinte forma: a)
Segurança jurídica (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15, 16, 17, 19, 20, 26, 29, 33, 35, 36, 37, 44, 45, 50, 52, 53,
54, 60, 62, 63, 66, 76, 77, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 97 e 99); b) Redução de
Custos (2, 3, 5, 7, 9, 11, 12, 14, 18, 19, 20, 24, 28, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 42, 43, 47, 48, 50,
55, 56, 57, 58, 59, 61, 63, 64, 65, 66, 67, 72, 73, 75, 78, 79, 98, 99 e 100); e c) Produtividade (2, 5, 8, 9, 10, 11,
12, 13, 14, 16, 17, 19, 21, 22, 23, 25, 28, 38, 40, 41, 50, 69, 70, 71, 72 e 74).
49

podemos ver, o grosso das propostas se dão com dois principais objetivos: redução de custos e
aumento da segurança jurídica.

GRÁFICO 1: Ganhos esperados pela CNI em suas “101 propostas para a modernização
trabalhista”.

SJ

RC

PR

SJ + RC

RC + PR

SJ + PR

SJ + PR+ RC

Legenda: SJ: Segurança Jurídica; RC: Redução de Custos; PR: Produtividade; SJ + RC: Segurança Jurídica e
Redução de Custos; RC + PR: Redução de Custos e Produtividade; SJ + PR: Segurança Jurídica e Produtividade;
e, por fim, SJ+ PR+ RC: Todos.
FONTE: CNI, 2012.
Entretanto, a segurança jurídica, como já foi dito anteriormente, não existe à toa, senão
a partir da proposta de redução de custos: de 54 fatores que apresentam ganhos na segurança
jurídica, 18 (SJ+RC e SJ+PR+RC) deles também apresentam – de acordo com a própria
federação –, redução de custos (cerca de um terço deles). Isto, claro, para não falar de outras
propostas duvidosas, como, por exemplo, a que propõe a revisão dos termos que configuram
“trabalho análogo à escravidão”, o que, afinal, poderia ser colocado dentro da redução de
custos – seja por meio do fim de passíveis trabalhista quanto a manutenção da produção (CNI,
2012, p. 84). Mesmo que se fale em correções de leis mal aplicadas ao país, empiricamente
pode-se concluir o fato de que, em muitas propostas de fortalecimento da segurança jurídica,
ocorre, em conjunto, uma menor remuneração do trabalhador, como é o caso das propostas
14, 50 e 53 (“Tempo à disposição do empregador após portaria”, “Trabalho em ambientes
frios” e “Proibição de trabalho a céu aberto [calor]”), as quais propõem a perda efetiva de
remuneração extra ao trabalhador. Por isso, a centralidade da “redução de custos” nas
propostas da entidade é muito maior do que se imagina: também no “aumento de
produtividade”25 (12 [33%] das propostas de produtividade possuem também uma redução de
custos) se vê uma correlação entre estes fatores.
Assim, pode-se deduzir uma simbiose entre estes três conceitos do pensamento da CNI
(competitividade-produtividade-custos): cada um deles depende do outro para garantir o

25
Estas propostas são: 2, 5, 9, 11, 12, 14, 19, 28, 38, 40, 50 e 72.
50

desenvolvimento econômico. No âmbito do trabalho, esta correlação causa questões


fundamentais para o pensamento da entidade: não obstante a redução de custos seja um dos
pilares de seu discurso, tal medida não significa, necessariamente, a redução salarial, o que
implica dizer que esta exigência passa menos pela redução do valor da mão-de-obra do que
pela liberdade na gestão desta, garantindo-se o maior nível de produtividade possível26.
Ou seja, para a entidade – pelo menos até 2012 –, o salário do trabalhador brasileiro
nunca foi um problema considerável, sendo predominantemente preocupante, ao contrário, a
sua produtividade. Na análise deste grupo, os motivos para a baixa produtividade do
trabalhador brasileiro estariam em pelo menos três fatores: a) baixa qualificação da força de
trabalho (decorrente não apenas dos problemas da educação formal, mas também do acesso
limitado a cursos profissionalizantes, a alta rotação dos empregos, etc.); b) ao baixo
investimento em inovação na indústria brasileira (que acaba tendo que disputar com empresas
muito mais qualificadas neste terreno); e c) aos limites da legislação trabalhista brasileira
(impedindo, como já afirmei, o aproveitamento melhorado da força de trabalho através de
medidas flexibilizantes do trabalho e dando garantias exageradas ao trabalhador, como
veremos mais à frente).
Pode-se notar na figura abaixo como a CNI interpreta esta questão, ao colocar o país
como um dos piores colocados na “produtividade da mão-de-obra”, “mercado e relações de
trabalho” – mas como um dos melhores no “custo da mão de obra” – e “educação”, enquanto
coloca-o em posição média na “tecnologia à inovação”.

26
A manutenção (ou até aumento) dos salários, entretanto, não implica, necessariamente, na inexistência de uma
expansão da taxa de exploração da força de trabalho: numa análise marxiana, poder-se-ia dizer que o que a
indústria prega, nestes documentos, não seria o aumento da mais-valia absoluta (aquela que se adquire através da
redução dos salários e aumento de jornada não-remunerada), mas de mais-valia relativa (mediatizada pelo nível
orgânico dos meios de produção e pela dinâmica e organização do trabalho).
51

FIGURA 6: Competitividade do Brasil, em comparação com outros países (CNI)

FONTE: CNI, 2010.


Outros pontos nos quais, de acordo com a imagem, o Brasil deixa a desejar na
competitividade são os de “logística”, “ambiente macro e microeconômicos”, a “carga
tributária” e a “disponibilidade e custo do capital”. Nas “instituições” (composta por “marco
legal e jurídico” mediano e “práticas de governo” ruins, segundo a entidade) e Tecnologia e
52

Inovação (composta por “Recurso e apoio governamental à C&T” e “P&D e inovação nas
empresas”, ambos numa posição mediana) têm-se um desempenho médio.
O aumento de produtividade, a partir de mudanças nestes três aspectos colocados
acima (qualificação, inovação e flexibilização), associada à redução de custos (em especial no
âmbito tributário e jurídico), seria o caminho para a expansão da competitividade do mercado
de trabalho brasileiro. Não à toa, uma das grandes críticas da entidade, nos últimos anos, tem
sido a estagnação da produtividade do trabalhador brasileiro. De acordo com a entidade, o
Custo Unitário do Trabalho do país aumentou mais de 300% entre 2002 e 2014 27, o que
significa que, além da expansão da taxa de câmbio, a produtividade têm se estagnado (a taxa
média anual de crescimento da produtividade, apresentado pela entidade, entre 2000 e 2009,
tem demonstrado o crescimento médio de apenas 1% ao ano) enquanto o salário e outros
custos apenas aumentaram (CNI, 2014a).
Associando o aumento de empregos à expansão da renda, parece evidente que o carro-
chefe do crescimento econômico do país nos últimos anos estivesse associado ao aumento do
mercado interno (BALTAR; KREIN, 2013), o que conseguiu consumir, por algum tempo, os
desejos da indústria – em especial da de construção, mobilizada ainda mais pelo boom de
obras públicas financiadas pelo PAC. Em seu documento mais entusiasmado (2010), a CNI
apontou como estratégia industrial tanto o “aproveitamento do tamanho do mercado
brasileiro” quanto o “foco nos grandes projetos” – temas pouco desenvolvidos ou inexistentes
em seus outros documentos –, mostrando-se sintonia com as medidas mais
desenvolvimentistas dos governos petistas – incluindo-se, aliás, as questões pertinentes ao
trabalho, como a renda do trabalhador, o nível de formalização, diminuição das desigualdades
regionais, etc.
A transição, entretanto, entre esta perspectiva e sua antítese, que vê problemas nestas
medidas desenvolvimentistas, torna-se clara nos documentos de 2012 e 2014 (“101 propostas
para a modernização trabalhista” e “Propostas para a eleição de 2014”, respectivamente), as
críticas às medidas. No primeiro documento citado, afirma-se o seguinte:

27
A entidade assim afirma em seu documento: “O CUT representa o custo do trabalho para a produção da
unidade de um produto. Assim, quanto menor o CUT, maior tende a ser a competitividade das empresas em um
país. O CUI é afetado pela evolução combinada dos preços e custos de produção (inclusive dos custos do
trabalho) e, em comparações internacionais, pela trajetória da taxa de câmbio. Mantido tudo o mais constante,
reduções dos custos do trabalho, aumentos de produtividade e desvalorizações cambiais tendem a reduzir o CUT,
ao passo que movimentos inversos tendem a ampliá-lo” (2014, p. 26)
53

A análise da trajetória do emprego pode ser complementada com uma discussão sobre o
desempenho da indústria de transformação no país, cuja participação do PIB caiu de 35,8%, em
1985, para 14,6% em 2011. Da mesma forma, a participação desse segmento nas exportações
caiu de 64,5%, em 1992, para 36,0%, em 2011. Entre 1996 e 2011, por outro lado, o
coeficiente de importação da indústria de transformação passou de pouco mais de 14% para
mais de 20%. Esses dados sugerem que o expressivo crescimento do consumo de bens
observados no Brasil, ao longo dos últimos anos, foi absorvido por importações. Em diversas
cadeias produtivas, o país vem perdendo participação nas etapas finais – nas quais se agregam
valor e se geram mais emprego e renda – e concentrando-se na produção de matérias primais e
produtos de menor valor agregado. Esse cenário pode ser creditado, em grande medida, à perda
de competitividade decorrente da elevação expressiva dos custos de produção em um contexto
marcado por problemas no ambiente regulatório e por taxas de câmbio sobrevalorizadas
(grifos meus, CNI, 2012, p. 14)

Este trecho do documento, a nosso ver, confirma o descontentamento do grupo


empresarial em questão com as medidas consideradas insuficientes em torno da expansão da
competitividade da indústria brasileira. No outro documento, a crítica, já expressa acima, do
aumento do custo de trabalho e estagnação do nível de produtividade da indústria parece
confirmar a discordância da entidade com a expansão “exagerada” da renda do trabalho nos
últimos anos:
Aumentos salariais acima da inflação são benéficos para o setor produtivo, porque contribuem
para a melhoria dos indicadores sociais para a ampliação dos mercados de consumo. Porém,
nos casos em que esses aumentos superam o crescimento da produtividade, criam-se pressões
de custos que reduzem os níveis de competitividade. Esse tipo de circunstância pode levar a
pressões inflacionárias (em decorrência de repasses de aumentos de custos para os preços) ou
torna inviáveis empreendimentos que não têm espaço pata repasses de aumentos de custos para
os preços (CNI, 2014a, p. 32).

Sendo assim, pode-se afirmar que tais medidas de expansão da renda e manutenção da
legislação trabalhista “arcaica” são, claramente, na visão da CNI, elementos perniciosos à
competitividade da indústria nacional e ao desenvolvimento. Por mais que se tenha realizado,
desde 2003 até 2014, diversas mudanças na sociedade brasileira, para este grupo, estas não
foram suficientes para a garantia do desenvolvimento – em especial no âmbito das relações de
trabalho. O ponto central, portanto, gira em torno do valor da mão de obra.
É a partir deste contexto que pretendo apresentar, agora, as medidas concretas
sugeridas pela CNI para a retomada da competitividade da indústria brasileira, dentro do
universo do trabalho.

3.3. Pontos e medidas defendidas pela CNI: promessas para o desenvolvimento e a


defesa da Reforma Trabalhista
Nesta seção, como já falado, analiso as propostas sugeridas pela CNI para a reforma
trabalhista, de acordo com seus princípios e noções econômicas, dos quais já foram
discorridos acima. Antes de entrar neste ponto, entretanto, sinto a necessidade de apresentar
um mapeamento do desenvolvimento das propostas da indústria a partir dos documentos que
54

analisei e de outros que nos ajudaram na construção desta seção específica. Demonstro, neste
capítulo, as mudanças nas propostas, mas também persistência de alguns eixos que orientam a
CNI.
Nos documentos categorizados como “Análise de Conjuntura”, apresentados
anteriormente, existe uma variação considerável das propostas da indústria para o mercado de
trabalho no Brasil. No primeiro deles, publicado em 2002, já se tinham os pilares das
propostas de reforma trabalhista delineados: a) fortalecimento da negociação coletiva como
uma opção em relação ao modelo de trabalho definido pela lei28; b) fortalecimento das
instâncias extrajudiciais (como mesas de conciliação) para resolver os conflitos trabalhistas;
c) regulamentação de novas formas de contratação (dentre as citadas estão: terceirização,
trabalho cooperado, à distância e por conta própria); c) desoneração do trabalho (redução de
custos)29; e, por último e um pouco por fora, d) incentivo à qualificação da força de trabalho.
Todos esses pontos apresentam-se repetidos nos documentos seguintes, às vezes
especificando e enfatizando algum deles ou adicionando novos pontos.
Por exemplo, em 2006, já se desenvolve a ideia da ampliação da negociação de forma
mais prática: falava-se em “ampliar a possibilidade de negociação pelas partes dos direitos
individuais previsto na Constituição Federal (art. 7º)” (CNI, 2006, p. 99). Também, sobre os
conflitos trabalhistas, adota-se uma posição mais clara, apresentando-se o motivo para a busca
pelos mecanismos extrajudiciais: “[é preciso] reforçar a necessidade de maior equilíbrio nas
decisões da justiça do trabalho, que deve moderar a aplicação do princípio da hipossuficiência
do trabalhador” (CNI, 2006, p. 99). Aqui, pela primeira vez, tem-se, dentro das propostas, a
manifestação de descontentamento com a fiscalização do trabalho. Além de repetir os outros
pontos (redução dos custos de trabalho, novas modalidades de contratação) e defender
explicitamente a regulamentação “sem restrição” da terceirização, fala-se, pela primeira vez
sobre a fiscalização do Ministro do Trabalho e Emprego sobre as condições de trabalho:
“reforçar papel educativo do MTE em lugar do foco exclusivo em ações coercitivas” (CNI,
2006, p. 99).

28
Especificamente, no texto, ainda não se utiliza os termos atualmente em voga – prevalência do negociado
sobre o legislado –, embora indiquem exatamente a mesma coisa. Afirma-se, pois, apenas, a necessidade de
“implementar um novo modelo de negociação flexível que permita ajustes rápidos e o mais particularizados
possível, em nível macroeconômico” (CNI, 2002, p. 98)
29
No texto assim se coloca sobre esta questão: “Rever a estrutura de despesas trabalhistas e previdenciárias, com
desoneração dos salários em benefício da remuneração direta, evitada a isenção indiscriminada de contribuições
sociais que suportam fundos de seguridade e as atividades de formação de capital humano” (CNI, 2002, p. 98)
55

Estas mudanças, entretanto, foram pequenas, se comparadas aos acúmulos


apresentados no documento “Conclusões do 3º Encontro Nacional da Indústria”, em 2008.
Aqui, pela primeira vez, afirma , literalmente, sobre a prevalência do negociado; a
terceirização devendo ser regularizada sem restrição e urgentemente, negando-se a
“inadequada distinção entre atividade meio-fim” (CNI, 2008, p. 55); devendo-se realizar a
desoneração da folha salarial, liberando-se os diversos encargos do trabalho tanto em geral
quanto em situações específicas (primeiro emprego, em contratos atípicos, etc.). Realiza-se,
também, a exigência de aperfeiçoamento da legislação para se evitar a atuação do judiciário
como legislador positivo (ou seja, criador de regras, a partir de suas interpretações).
Repete-se, no texto em questão, as proposições anteriores de atuação fiscal do trabalho
com caráter mais pedagógico, a criação de novas modalidades de contrato de trabalho e o
apoio aos instrumentos extrajudiciais para solucionar os conflitos entre as partes. De
novidade, teremos a sugestão de “revisar a indenização sobre o valor do FGTS na demissão
para estabelecer gradação percentual, em função do tempo do empregado na empresa, e
extinguir adicional de 10% [sobre a multa rescisória]”, assim como a ideia de “aperfeiçoar os
critérios de concessão do seguro desemprego” e “criar condicionalidades para o recebimento
do seguro-desemprego associados à exigência de capacitação” (CNI, 2008, p. 56). No âmbito
da Saúde e Segurança do Trabalho, sugere-se a revisão de suas normas, “com o objetivo de
simplificá-las, desburocratizá-las e facilitar sua aplicação” (CNI, 2008, p. 58).
No documento de 2010, todos os pontos do documento de 2008 se repetem, com
exceção da mudança no Programa Seguro-Desemprego (PSD) e, estranhamente, não se faz
nenhuma menção aos incentivos à qualificação do trabalho. Na terceirização, há a defesa de
sua regulação de forma a evitar a distinção entre atividades meio e fim e estabelecer a
responsabilidade subsidiária à empresa contratante. As negociações coletivas são defendidas
como sempre, em especial como alternativa à excessiva judicialização das relações de
trabalho30, o que destaca, também, sua defesa da resolução dos conflitos por meios
extrajudiciais. A desoneração do trabalho segue, portanto, sendo uma bandeira da entidade,
ainda mais tratando sobre seus efeitos na criação de empregos formais 31. Com relação à
fiscalização do trabalho, fala-se mais em manter a sua aplicação dentro da lei e com

30
Este ponto é defendido a partir da seguinte proposta: “Criar mecanismos que ampliem o escopo das
negociações coletivas, garantam segurança às novas relações de trabalho e reflitam as vontades e necessidades
das partes” (CNI, 2010, p. 124)
31
“O elevado número de encargos incidentes sobre a folha salarial, que operam em cascata (efeito redundante,
uns sobre os outros), estimula a informalidade, prejudicando os trabalhadores, as finanças públicas e as próprias
empresas, que convivem com condições assimétricas de competição” (CNI, 2010, p. 115)
56

uniformidade, enquanto, no âmbito da Segurança e Saúde do Trabalho (SST), defende-se a


criação de incentivos fiscais para aumentar os investimentos nesta área e, além disso, critica-
se a aplicação de novas normas, afirmando que estas aumentam os custos para a empresa.
Todas essas mudanças colocadas podem ser visualizadas com as informações no
seguinte quadro:

QUADRO 2: Posição da CNI acerca das relações de trabalho, nos documentos coletados
e categorizados como “Análise de Conjuntura”: diversos anos
Tema 2002 2006 2008 2010
Terceirização Defende sua Fala na Idem, mas
regularização e a regulamentação adiciona uma
de outras formas sem restrições rejeição à divisão
de contratação. da terceirização entre atividade- Idem, com adição da
e em novas meio e atividade- responsabilidade
modalidades de fim e defende subsidiária
contratação novas
modalidades de
contratação
Negociações Fala-se no “Ampliar a Defende
coletivas fortalecimento da possibilidade de expressamente a
negociação negociação prevalência do
coletiva como pelas partes dos negociado sobre
opção à lei direitos o legislado Idem
individuais
previsto na
Constituição
Federal” (p. 26)
Desoneração Apenas defende a Apenas defende Liberação de
do trabalho desoneração do a desoneração encargos do
trabalho do trabalho trabalho em
forma geral,
redução de
impostos sobre o Idem
trabalho e
incentivos a
condições de
trabalho
específicas
Qualificação Apenas defende o Idem, mas com a
do trabalho incentivo à Idem adição da questão X
qualificação do PSD
57

Fiscalização X Fala-se em uma


do trabalho atuação mais
pedagógica dos Idem Idem
fiscais do
trabalho
Justiça Apoio aos Apoio aos Defende os
Trabalhista mecanismos mecanismos pontos anteriores
extrajudiciais de extrajudiciais e e adiciona o
resolução de pedido de controle da
conflitos “moderação” na atuação do Idem
aplicação do judiciário como
princípio de legislador
hipossuficiência
do trabalhador
Seguro X X Defende-se maior
Desemprego rigidez na X
concessão de
desemprego e
condicioná-lo à
capacitação
profissional
Normas de Pede a revisão Incentivo do
Segurança e das normas, investimento em SST
Saúde do X X pedindo sua através de incentivos
Trabalho simplificação e fiscais e critica às
desburocratização novas normas
FONTE: CNI, 2002; idem, 2006; idem, 2008; idem, 2010.
Como se pode ver, o pensamento da indústria sobre as relações trabalhistas no Brasil,
durante este período, aprofundou-se, mantendo-se sempre sua perspectiva essencial: redução
de custos, expansão da capacidade de gestão do trabalho e aumento da segurança jurídica. São
estes, os pontos pelos quais guiarei a minha condução da próxima seção. Entretanto, destaco
que todos esses documentos não desenvolvem com tanta profundidade as propostas da
indústria para o mercado de trabalho. Considero que suas proposições são, às vezes, gerais e
abstratas demais, possuindo um aspecto pouco prático.
As melhores obras da CNI para discutir propostas efetivas para o mercado de trabalho
somente serão lançadas em 2012, com as já citadas “101 propostas para a modernização
trabalhista”, 2014, com propostas diretas sobre o tema – tendo em vista as eleições de 2014 –,
e 2016, com uma campanha direta sobre a negociação coletiva. Por isso, minha intenção foi
buscar nestes documentos as propostas da indústria e suas justificativas, dentro do discurso
apresentado anteriormente sobre o desenvolvimento e as relações de trabalho no Brasil.
58

3.3.1. Segurança Jurídica: terceirização, negociações coletivas e instituições do trabalho:


a posição da CNI.
Nesta seção, concentro-me nas propostas da entidade em torno da segurança jurídica,
ou, mais especificamente e respectivamente, sobre a regulamentação da terceirização, a
prevalência do negociado sobre o legislado e, por fim, as transformações sugeridas em torno
da Justiça do Trabalho.
A CNI afirma, na introdução de um de seus principais documentos em defesa da
terceirização, o seguinte:
A terceirização é fenômeno irreversível, consequência direta da divisão de trabalho na atual
realidade econômica e produtiva globalizada, na qual a competição não se faz mais entre
fronteiras ou empresas do mesmo setor, mas entre as redes de produção (também conhecidas
como cadeias produtivas de valor) formadas por empresas instaladas em diversas regiões e até
mesmo em diferentes países (CNI, 2014d, p.13).

Neste parágrafo inicial já existem algumas caracterizações significativas da


terceirização: ela não é um fenômeno nacional (antes internacional); é fruto direto da nova
forma do capitalismo (globalizada, mundializado e/ou flexível); e, por fim, é um fato dado, do
qual os diversos países, se desejam adquirir competitividade na economia internacional,
devem se adaptar, de acordo com a CNI. Estas constatações são articuladas nos documentos
analisados com vistas a contrapor às críticas e resistências à terceirização da classe
trabalhadora organizada e de estudiosos do mundo do trabalho, além de operadores do direito
do trabalho, juristas, entre outros, as quais, na visão da entidade, “geram um ambiente de
incerteza jurídica desfavorável aos negócios, além de atrasarem a tão necessária e urgente
modernização da legislação trabalhista” (CNI, 2014d, p. 15). Entretanto, este descompasso
entre a aceitação da terceirização como um “fenômeno irreversível” e as resistências a ele não
significam, afinal, que este seja o único problema encontrado pela entidade – mas apenas um
deles.
O problema geral da entidade, a CNI, pode ser entendido como a desregulamentação
da terceirização, a qual, na prática, não a torna ilegal no país, mas, por outro lado, deixa a
definição de suas práticas a partir da interpretação dos juízes do trabalho sobre a terceirização.
Como já fora demonstrado em diversos artigos sobre o tema (BIAVASCHI; TEIXEIRA,
2015), estas interpretações variaram com o tempo e instituições jurídicas, as quais foram
definindo a forma de instituição desta modalidade de contratação para a economia brasileira.
Sendo assim, não obstante, de fato, não se possa falar numa regulamentação da terceirização,
esta passou por regulamentações (como a súmula 331 do TST), mas nenhuma destas
59

regulamentações ou possuía o caráter direto exigido pela CNI ou pode ser considerada uma
regulamentação fechada e coerente, na qual as indústrias possam prever, efetivamente, qual
interpretação será dada ao seu caso.
A entidade, portanto, mobilizou-se, nos últimos anos, na defesa da regulamentação da
terceirização, atentando-se em especial para dois pontos principais, considerados os maiores
problemas na regulamentação da terceirização no país: primeiro, na distinção entre atividade-
meio e atividade-fim; e, segundo, na exigência de responsabilidade solidária entre as
empresas sobre os encargos trabalhistas.
A distinção entre atividade-meio e atividade-fim é fruto da súmula 331 do TST,
promulgada em 1993, na qual se define que a terceirização somente seria permitida se fosse
realizada em uma atividade considerada subsidiária para a empresa – quer dizer, que não fosse
sua atividade principal –, como, por exemplo, segurança e limpeza. Isto não significa,
entretanto, que esta determinação resolveu a questão da legalidade da terceirização. De acordo
com a CNI, diversas interpretações distintas sobre o que seriam estas atividades para uma
empresa diferiam de caso para caso na justiça, o que impactaria a segurança jurídica das
empresas. Os principais argumentos da entidade sobre os problemas desta interpretação são
que, primeiro, a definição entre atividade-meio e atividade-fim é de difícil objetividade e
pouca clareza e que, segundo, as empresas estão constantemente mudando suas atividades, o
que pode dificultar e prejudicar a terceirização no mercado (CNI, 2014d).
Por sua vez, o estabelecimento de responsabilidade subsidiária à empresa contratante é
importante para a CNI porque isto garantiria uma “dupla proteção” ao trabalhador
terceirizado, enquanto também não oneraria as empresas contratantes como a
responsabilidade solidária. Ao contrário de ter de arcar com todas as consequências legais da
utilização da mão-de-obra terceirizada, a contratante continua obrigada a pagar a estes
trabalhadores seus direitos básicos (como décimo-terceiro, FGTS, etc.), caso a contratada não
os cubra, o que estimularia aquela a fiscalizar esta e impedir a sua ilegalidade na contratação
do trabalho.
Sendo assim, a entidade propõe uma nova legislação sobre a terceirização, contendo as
seguintes características e pontos: a) “regras claras, bem definidas, que não permitam
interpretações díspares”; b) liberação da terceirização em todas as atividades; c) “previsão da
responsabilidade subsidiária como regra”; e d) os empregados terceirizados devem ser
representados por sindicatos referentes à empresa contratada (classe e posição territorial), e
não da contratante (CNI, 2014d)
60

Esta proposta tem como finalidade acabar com a indefinição sobre a regularização da
terceirização, a qual leva muitas empresas, na visão da CNI, a evitar esta modalidade de
contratação. Amparada por sua pesquisa da Sondagem Industrial, a entidade afirma que o
principal motivo para a não contratação de outras empresas para realizar um serviço é o medo
de se receber passivos inesperados, por determinação judicial (outros pontos são: a
preocupação dos custos serem maiores do que se espera e a qualidade do serviço menor), o
que leva à contenção do desenvolvimento da terceirização e das cadeias produtivas de valor
do país, elementos que diminuem nossa produtividade, a criação de empregos e, por fim, a
competitividade da economia nacional.
Outro ponto importante deste documento é sua mobilização discursiva para se
contrapor às teses de que a terceirização precariza o trabalho:
Com a terceirização não se exclui ou reduz os direitos dos trabalhadores. Ao contrário, os
empregados da empresa que presta serviços ou produz bens (contratada) a outra empresa
(contratante) têm assegurados todos os direitos e garantias estabelecidos na legislação
trabalhista e em acordos ou convenções coletivas de suas respectivas categorias profissionais.
A precarização não decorre da terceirização, mas sim da existência de trabalhadores na
informalidade ou quando não respeitada a legislação trabalhista, o que pode ocorrer em
qualquer forma ou modalidade de contrato (CNI, 2014d, p. 52)
Como se pode ver no trecho acima, dois pontos são os principais condutores desta sua
tese: o de que a grande fonte de precarização é a relação informal de trabalho e o de que a
terceirização não enseja perda de direitos, uma vez que se garante, nesta modalidade de
contratação, as mesmas leis trabalhistas que aquelas garantidas aos outros trabalhadores (da
contratante). Por isso, a terceirização serve não para precarizar, mas sim para especializar o
trabalho das empresas e aumentar sua eficiência.
A valorização da negociação coletiva é outra proposta entendida como fulcral para o
avanço da segurança jurídica do país. Defendida por entidades sindicais – em especial aquelas
envolvidas com o novo sindicalismo – como o melhor modelo de gestão das relações de
trabalho (BRIDI, 2009). Entretanto, a negociação coletiva se tornou também uma pauta da
CNI e de outras entidades patronais da indústria. O principal entendimento que move a
constatação da necessidade de valorização deste instrumento é, na visão da entidade aqui
estudada, a defasagem do princípio da hipossuficiência do trabalho, decorrente das mudanças
da classe trabalhadora no Brasil (que deixou de ser, em sua maioria, de origem rural e de
baixo nível de escolaridade). Assim, a entidade patronal se expressa sobre esta questão:
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que completou 71 anos em 2014, baseia-se na
premissa de que todos os trabalhadores seriam hipossuficientes, ou seja, não teriam capacidade
de negociar suas demandas e dialogar para realizar ajustes nas suas condições de trabalho. Foi
61

concebida no início da industrialização brasileira, quando houve grandes transferências de


trabalhadores rurais para um mercado urbano em formação, com pouca qualificação e sem
instrumentos efetivos de diálogo social. Naquele momento, consolidam-se, então, normas
rígidas, fundadas na ideia de que somente a lei poderia garantir os direitos dos trabalhadores e
reger as condições de trabalho (CNI, 2014c, p. 12).

Sendo assim, na visão da entidade, esta interpretação, persistente até hoje, levaria a um
problema profundo para a popularização da negociação coletiva: a rigidez da legislação
trabalhista e excessiva atuação das instituições do trabalho, as quais impediriam o diálogo
entre trabalhadores e empregados. Aqui, nota-se a repetição da crítica em documento anterior
(2010), no qual se opõe à visão de conflito entre estes dois polos das relações de trabalho:
A negociação coletiva não é realizada para se atacar “conquistas trabalhistas” estabelecidas em
lei. Nenhuma norma legal é revogada pela negociação. A negociação, na verdade, para
contextos específicos e de acordo com a vontade das partes, busca estabelecer condições
diferenciadas que atendam o interesse da coletividade envolvida (empresas e empregados), de
forma diferente ao estabelecido em lei, pelo prazo negociado. As partes que negociam têm
autonomia (privada coletiva) e responsabilidade para negociar segundo seus interesses e
prerrogativas. Contudo, não é isso o que ocorre. Em regra, o entendimento é de que a
negociação não pode prevalecer sobre o que é disposto sobre a lei (...) o que se vê no país é
uma atuação constante, por vezes excessiva, de diversas instituições do trabalho que acabam
por enfraquecer esse importante instrumento, anulando a validade de cláusulas livremente
negociadas por empresas e trabalhadores (CNI, 2014c, p. 20)

Esta interpretação serve, justamente, para demonstrar como a CNI enxerga a função da
justiça trabalhista no Brasil, segundo a qual esta não deve interferir nas relações de trabalho
estabelecidas entre patrão e empregado, seja porque o trabalhador já não é mais
hipossuficiente, ou, ainda, porque a negociação coletiva aumenta a produtividade do trabalho
e reduz os conflitos trabalhistas. Ou seja, na visão empresarial, este instrumento poderia servir
para resolver os problemas das relações trabalhistas no Brasil, engessadas por uma legislação
que impede a flexibilidade no trabalho e o avanço dos índices produtivos do país. O
entendimento que os acordos ou convenções coletivos não poderiam permitir o
descumprimento de normas da CLT é problemático para a CNI, não apenas porque é contra o
princípio da autonomia da vontade coletiva, mas também porque seria contrário ao próprio
desenvolvimento da economia brasileira. Esta questão pode ficar mais clara ao se apresentar,
aqui, o segundo problema da entidade com a aplicação da negociação coletiva no Brasil
contemporâneo: a interpretação da súmula 277 do TST32, que entende que as negociações
coletivas passam a integrar o contrato individual.
Um princípio fundamental do processo da negociação coletiva é que ele se baseia em
condições macroeconômicas, aspectos do mercado, ambiente institucional, entre outros fatores,
que definem a correlação de forças das partes dispostas a dialogar. Por isso, os instrumentos

32
A Súmula 277 está “sub judice” no STF, que suspendeu os processos em que se discute a ultratividade das
cláusulas convencionais após a urgência. Por outro lado, a própria trabalhista passada no Congresso Nacional
(lei) já prevê que as cláusulas não se incorporam nos contratos.
62

coletivos representam o retrato daquela composição de forças numa determinada circunstância


e devem valer por um determinado período de tempo. A Súmula 277 do TST, além de
desconsiderar o texto da lei, despreza esses aspectos e eterniza a validade das cláusulas,
partindo de uma visão de mundo estático, estável e completamente previsível (CNI, 2014c, p.
29)

Devido a estas constatações, a CNI chega à conclusão que: a) deve-se aumentar os


processos de negociação coletiva e fortalecer o diálogo social; b) a negociação coletiva deve
ser reconhecida como um meio efetivo de se ajustar a regulação do trabalho às necessidades
das partes; c) as organizações sindicais envolvidas na negociação coletiva devem ser
valorizadas e fortalecidas; e d) deve-se garantir segurança jurídica e autonomia às
negociações coletivas.
Com essas medidas em torno da promoção da negociação coletiva, a CNI afirma que
aumentará o diálogo entre trabalhadores e empregados, garantindo-se a satisfação do
trabalhador com o seu trabalho, ao ajustá-lo às suas necessidades, e, além disso, terá uma
melhora na competitividade da indústria por meio do aumento da capacidade de adaptação da
empresa às necessidades do mercado. Outro ponto importante, com esta mudança consiste na
redução de custos com os passivos trabalhistas cobrados pela Justiça Trabalhista.
Além destas propostas, outras são estipuladas, no documento de 2012, para a
segurança jurídica, incluindo-se desde aquelas bastante específicas (como revogação de uma
determinação de intervalo de descanso para as mulheres), pode-se citar: a) sugestões de
mudança na atuação do judiciário, do INSS e dos auditores do trabalho; b) mudança de
procedimentos diante de acidentes de trabalho e audiências trabalhistas; c) de legislação e
normas sobre SST e contratação de pessoas com deficiência; e d) contenção da atuação
positiva do judiciário e popularização de métodos extrajudiciais para a resolução de conflitos
trabalhistas.
Todas estas propostas, conforme já afirmei anteriormente, não se dão com o propósito
único de solucionar as questões da segurança jurídica, mas conjuntamente prometem a
redução de custos e o aumento da liberdade de gestão da força de trabalho (flexibilização). A
redução de custos, em especial, se dá através da diminuição de passivos trabalhistas e de
gastos jurídicos, diminuindo-se a incidência da justiça no processo produtivo das empresas,
sendo a flexibilidade ou um fruto direto desta (ou seja, esta nova facilidade é adquirida de
forma indireta) ou resultado de uma abertura na regulação de limites ou obrigatoriedades à
contratação (sem, necessariamente, implicar em um custo à empresa).
63

Destaca-se na visão empresarial, outros aspectos importantes destas medidas seriam o


aumento da eficiência do judiciário, impedindo-se tanto o exagero deste nas intervenções na
relação trabalhista quanto a utilização deste pelo trabalhador simplesmente para conseguir
algo a partir da má-fé, e o afrouxamento e/ou aumento de período de adaptação às normas
reguladoras do trabalho (como a NTEP e NR-12). Estas mudanças trariam impactos
profundos nas relações de trabalho, reformulando o modelo jurídico trabalhista brasileiro, seja
aproximando-o de um modelo conciliatório (através de audiências e mesas de conciliação) e
com menor regulação nas relações de trabalho, modificando-se os meios de resolução de
problemas como acidentes de trabalho. Em uma palavra, de fato, aproximar-se-ia mais de um
modelo privatista das relações de trabalho, no qual, supostamente, aumentar-se-ia o diálogo
entre o trabalhador e o empregador e permitiria uma melhor relação entre eles (fim da visão
do conflito entre patrão e empregado) e permitiria a sua adaptação mais pacífica ao novo
modelo de produção mundial, carregado pela flexibilidade, cooperação e multifuncionalidade
do trabalho, como veremos na próxima seção.

3.3.2. Custos do trabalho e produtividade: a desoneração do trabalho e novas formas de


contratação.

As propostas da CNI para o aumento da produtividade e redução dos custos se dão, é


claro, a partir dos pressupostos de suas noções gerais sobre o mercado de trabalho brasileiro.
Conforme já vimos anteriormente, na visão empresarial, este é marcado pela baixa
flexibilidade da gestão do trabalho – a qual aumenta custos e impede a adaptação das
empresas às exigências do mercado –, as altas cargas tributárias sobre o trabalho, pela
insuficiente formação do trabalhador brasileiro e alta rotatividade de empregos – o que leva à
baixa produtividade, uma vez que esta instabilidade no emprego desestimularia as empresas a
investirem em qualificação profissional.
Nos últimos anos, na opinião da entidade patronal, esta situação tem se agravado,
diante do avanço da renda do trabalho sem aumentos significativos na produtividade. Por isso,
em 2012 e 2014, seus documentos contém uma sequência de propostas para lidar com estas
questões. Basicamente, almeja-se solucioná-las através de quatro principais frentes: a)
regularizar a terceirização e a negociação coletiva (já analisadas acima, e, portanto, excluídas
de análise nesta seção); b) desonerar a carga fiscal do trabalho e outros custos adicionais deste
(inclui-se desde a isenção do FGTS em alguns casos específicos – como primeiro emprego,
por exemplo –, a revisão de pagamentos de adicionais – como o de insalubridade e
64

periculosidade – até a revogação completa de algumas determinações – como os salários-


minimos regionais e pagamento de horas in intinere); c) aumentar a liberdade de gestão da
força de trabalho (através da flexibilização de jornada, contratação e aumento da intensidade
do trabalho – em especial por meio da permissão da realização de múltiplas funções por um
empregado); e d) modificar o Programa Seguro-Desemprego (associando-o e condicionando-o
à busca pelo emprego e à realização de qualificação profissional pelo beneficiário deste
programa).
A proposta de desoneração da carga fiscal sobre o trabalho se dá com base nos
seguintes dados apresentados: cerca de quase um terço dos custos do trabalho se dão sobre
impostos, benefícios e indenizações trabalhistas combinados (19,63%, 10,17% e 2%,
respectivamente), ou seja, sem compor o salário direto e fixo que vai ao empregado (CNI,
2014). Ao comparar estes números com os de outros países, a CNI conclui que a carga fiscal
sobre o trabalho no Brasil é muito elevada, o que significaria, afinal, o aumento de custos
sobre a produção. O meio, entretanto, de resolver este problema, conforme já vimos
anteriormente, não se daria cortando apenas os impostos – ou, ainda, apenas aqueles impostos
que incidem diretamente sobre a produção e vão para o caixa do Estado –, mas também certos
benefícios (como os adicionais de insalubridade e periculosidade) e impostos destinados à
previdência e ao FGTS. Isto significa, então, que muitas destas propostas apresentam também
perdas diretas ao trabalhador, seja através da retirada de adicionais ou, ainda, com a baixa
contribuição à previdência e ao FGTS por parte dos empregadores, o que acaba por deixar sob
seus ombros o financiamento de sua aposentadoria e de sua segurança em caso de acidentes
de trabalho e demissão.
Esta interpretação pode ser confirmada a partir da contagem dos meios pelos quais se
busca realizar a redução de custos nas propostas do documento anteriormente analisado (“101
propostas para a modernização trabalhista”). Basicamente, a partir das 48 propostas em que a
própria entidade disse esperar este ganho, dividi-as em cinco métodos: a) flexibilização das
relações de trabalho (o que implica, para a empresa, em aumentar a eficiência do trabalho e
reduzir seus gastos desnecessários); b) retirada de encargos (pagamentos feitos diretamente ao
trabalhador, como o adicional de periculosidade e insalubridade, por exemplo) e redução de
burocracia; c) retirada de gastos voltados ao FGTS e INSS (ou seja, que não vão direto ao
trabalhador e são considerados carga tributária); d) mudança nas normas e procedimentos da
SST (de tal forma a se reduzir os custos com prevenção de acidentes e manutenção das
65

máquinas); e, por fim, e) incentivos fiscais (que seria a retirada de cargas tributárias em
condições específicas e/ou pagamento direto do Estado às empresas)33. Pode-se ilustrar o
resultado desta categorização no seguinte gráfico:

GRÁFICO 2: Meios de redução de custos propostos pela CNI em seu documento “101
propostas para a modernização trabalhista”

Flexibilidade das Relações


Trabalhistas
Encargos e Burocracia

FGTS/INSS

Segurança do Trabalho

Incentivos Fiscais

FONTE: CNI, 2012.

Sendo assim, um dos aspectos principais desta chamada “redução de custos” não pode
ser entendida apenas como um barateamento da força de trabalho (o que ela não deixa de ser,
mesmo que não atinja o salário fixo do trabalhador), mas também a garantia de maior
liberdade na gestão do trabalho, permitindo-se a flexibilidade de contratação e demissão e de
utilização dos trabalhadores em condições determinadas (como, por exemplo, em ambientes
de alta periculosidade). Sendo assim, a redução de custos não pode ser vista separada da
noção de “produtividade” para a indústria, como já falei anteriormente.
Ou seja, a flexibilização das relações de trabalho (tendo em vista a maior
produtividade, superando as “porosidades” do trabalho) é um importante componente na
busca pela redução de custos da indústria e aumento de sua eficiência. Isto implica, por outro
lado, não apenas no famoso axioma de que a diminuição de custos e aumento da eficiência
levam à produtividade, mas também na necessidade, na visão da indústria, de se associar o
reajuste salarial à evolução da produtividade, como já mostrei anteriormente (cf. CNI, 2014a)

33
As propostas que entraram nestas categorizações foram: a) flexibilidade do trabalho: 2, 3, 5, 9, 11, 12, 18, 19,
33, 66, 75, 78, 79 e 99 – 14, no total; b) encargo e burocracia: 7, 14, 20, 24, 28, 42, 50, 63 e 72 – 9, no total; c)
FGTS/INSS: 30, 31, 32, 34, 35, 36, 40, 43, 48, 55, 56, 57, 58, 59, 61, 64, 65 e 100 – no total, 18; d) segurança do
trabalho: 37, 38, 39 e 98 – no total, 4; e e) incentivos ficais: 47, 67 e 73 – no total, 3.
66

Por isso, a produtividade também é alvo das propostas da CNI: somente com o seu
aumento pode-se garantir um avanço na remuneração e nas condições gerais de distribuição
de renda no país. A coesão entre estes diferentes fatores é mais um dos pilares necessários
para o desenvolvimento, na visão da entidade.
Outro ponto importante para expandir a produtividade seria a redução da rotatividade
do trabalho. O motivo para esta interpretação advém do fato que esta rotação “desestimula os
investimentos em capacitação e reduz o comprometimento do trabalhador com o desempenho
da empresa a longo prazo” (CNI, 2014a, p. 38). Temendo gastar dinheiro em um trabalhador
sem garantias de permanência na empresa, os empregadores pouco aproveitam as
oportunidades de qualificação profissional de seus empregados – assim como a constante
rotatividade do trabalho leva à reposição de peças experientes, mais produtivas, por
inexperientes, iniciantes, que ainda não adquiriram o conhecimento necessário para produzir
tanto quanto seus colegas há mais tempo no trabalho. Mas, afinal, na opinião da entidade,
quem é o responsável por esse fato? A resposta é: o trabalhador e o Programa do Seguro-
Desemprego.
Da forma como está desenhado, o Programa do Seguro-Desemprego (PSD), somado aos
ganhos auferidos com o fim do contrato de trabalho (aviso prévio indenizado e FGTS com
multa de 40%), cria um verdadeiro incentivo ao trabalhador que quer ser demitido. Isso ocorre
em especial quando o mercado de trabalho está aquecido e há possibilidades de trabalho na
informalidade, o que permite uma renda significativamente superior à que teria em condições
normais (CNI, 2014a, p. 40).

Daí a solução se encontra na mudança do PSD, mais especificamente “condicionando


a concessão do benefício àqueles que participem de cursos de qualificação disponibilizados e
que não recusem recorrentemente as oportunidades de trabalho oferecidas” (CNI, 2014a, p.
41). Sendo assim, o objetivo desta medida, segundo a entidade, não seria apenas para
aumentar a produtividade e reduzir o nível da rotatividade do trabalho no Brasil, mas também
para reduzir as taxas de informalidade, ao evitar fraudes ao sistema de concessão do seguro-
desemprego.
Entretanto, a solução da entidade, para este problema, não passa exclusivamente por
esta proposta, mas também pela liberalização da gestão da força de trabalho (flexibilidade),
mais especificamente sobre jornada, remuneração e funções a serem exercidas pelo
trabalhador. Elas são, na visão da entidade, o principal método para se conseguir aumentar as
vagas de empregos oferecidos pelas empresas, constrangidas por nossa legislação “obsoleta”.
67

Outras propostas também são levantadas pela CNI, com o objetivo de aumentar a
produtividade através da motivação do trabalhador. Um destes pontos seria a remuneração
diferenciada:
Em todo o mundo, é cada vez mais generalizado o emprego de sistemas de gestão estratégica
de carreira e de remuneração que levam em consideração o mérito profissional e a
produtividade. Isso ocorre porque a remuneração é um evidente sistema de incentivo à
produtividade. Na ausência de sistemas de premiação por mérito, há incentivos para que os
trabalhadores esperem que outros tornem a empresa produtiva sem que eles precisem contribuir
diretamente para isso (CNI, 2014a, p. 41)

Também carregando a bandeira do aumento da produtividade – mas, desta vez, sem


possuir um ponto claro a favor do trabalhador –, a CNI cita a possibilidade de aquisição de
múltiplas funções pelo trabalhador como um ponto importante na mudança da legislação. Não
há, aqui, argumento direto sobre a validade desta medida para satisfazer o trabalhador: ao
contrário, reafirma-se apenas a sua necessidade, em um contexto de produção pós-fordista –
no qual prevalecem as tecnologias eletrônicas e digitais, dentro do modelo de “produção
enxuta”. Na visão da entidade, a principal mudança para os trabalhadores não é a ampliação
de sua carga de trabalho, mas o fato de que “os trabalhadores passaram a deter o controle da
produção, de modo a corrigir problemas de qualidade tão logo os tenham detectado, e não
somente ao final da linha de produção” (CNI, 2014a, p. 45), o que exige deles uma maior
qualificação profissional e envolvimento com a produção. Ou seja, deixa-se implícito que,
participando de todos os processos de produção, o trabalhador se sentiria mais comprometido
com seu trabalho e menos “alienado”.
A variação da jornada, por outro lado, é uma das principais propostas da CNI, no
sentido de supostamente atrair a classe trabalhadora, sendo o meio ideal de conciliar as
necessidades da empresa (produção flexível) com as vontades do empregado:
As alternativas de estabelecimento de jornadas de trabalho diferenciadas são de interesse das
empresas e trabalhadores. As empresas necessitam atuar com agilidade e exercer uma constante
capacidade de adaptação a novas realidades. Os trabalhadores defrontam-se com situações que
preferem adotar sistemas diferenciados em função de interesses pessoais. Esses interesses
decorrem, por exemplo, da necessidade de adequar a jornada de trabalho aos horários das
atividades escolares e ao calendário de férias dos filhos (CNI, 2014a, p. 45)

Seguindo este pensamento da CNI, podemos resumir todo este conteúdo de propostas
no seguinte quadro:
68

Quadro 3: Propostas para a produtividade e redução de custos da CNI, com justificativas.

Proposta Efeito em produtividade Efeito em redução de custos


Negociação Aumento do diálogo entre empregador Redução dos passivos trabalhistas
Coletiva e trabalhador, satisfação do trabalhador
(ajuste às suas necessidades) e
adaptação à demanda do mercado.
Terceirização Criação de redes comerciais; e Redução dos passivos trabalhistas
especialização das empresas e aumentoe competição entre as empresas
na eficiência do serviço. prestadoras de serviço
Flexibilidade de Motivação do trabalhador pelo mérito e
Redução de passivos trabalhistas e
remuneração aumento do incentivo à produtividade condicionante do pagamento ao
mérito
Flexibilidade de Satisfação das necessidades do Redução dos passivos trabalhistas
jornada trabalhador e adaptação à demanda do e dos encargos de hora extra
mercado
Multifuncionalida Maior envolvimento do trabalhador, Redução dos riscos de passivos
de no trabalho inserção no modelo de “produção trabalhistas
enxuta” e incentivo à qualificação do
trabalho
Reforma do Incentivo à qualificação do trabalho e Diminuição dos gastos com
Programa Seguro- redução da rotatividade dos qualificação por conta da redução
Desemprego trabalhadores da rotatividade
FONTE: CNI, 2014.
Estas propostas, por suas características, como já adiantei, possuem, de fato, um
conteúdo liberalizante das relações de trabalho, ou seja, considerando o posicionamento da
CNI, elas são coerentes com suas concepções de mundo. Contudo, antes de poder concluir
qualquer fato sobre os posicionamentos desta entidade quanto às relações de trabalho no
Brasil, primeiro, preciso apresentar os problemas destas suas propostas, sob a visão da
sociologia do trabalho e dos estudiosos do mundo do trabalho.
69

4. “Não fale em crise, trabalhe”: o paradigma da CNI sobre o sistema de relações de


trabalho.

Em seu discurso de pronunciamento como presidente em exercício, Michel Temer


utilizou a seguinte frase: “Não fale em crise, trabalhe”. Buscando representar uma resposta à
crise econômica vigente no país, o que o presidente, então, queria instigar era, justamente,
“reverter o clima da crise”, associando-a a uma crise de confiança. Esta concepção sobre as
crises não é nenhuma inovação de Temer. É, pelo contrário, uma ideia bastante popularizada
nos meios neoliberais e nos grandes meios de comunicação (MESZAROS, 2011, p. 18).
Talvez não houvesse, de fato, frase mais contundente para marcar o retorno agressivo do
neoliberalismo: o problema não é o mercado, mas os gastos excessivos do Estado, que devem
ser contidos para manter a segurança fiscal e se ter um clima de negócios favorável à
competitividade das empresas nacionais. Não à toa, os primeiros movimentos do governo em
questão, permeado pela ideologia neoliberal, foi a aprovação da PEC 55 contra o aumento dos
gastos públicos, redução constante da taxa de juros, mudanças no Ensino Médio e, por fim,
articulação do congresso para discutir as reformas trabalhista e previdenciária.
Estas medidas não podem ser dissociadas de um governo de tipo neoliberal, por mais
que algumas de suas atitudes, por exemplo, sejam opostas àquilo que se associou
historicamente ao neoliberalismo (como, por exemplo, a alta taxa de juros). A partir dos
documentos anteriormente analisados, pode-se ver uma considerável semelhança entre as duas
visões (do governo Temer e da CNI): todos propõem a redução dos gastos públicos, da taxa
de juros e defendem as reformas em questão. Faz sentido, assim, seguir o caminho de Boito
Jr. (2016), e entender que a crise política brasileira foi causada pelo campo neoliberal
ortodoxo, agora presumivelmente à frente no bloco do poder, mas não devemos, com isso,
compreender que a Indústria, por exemplo, se apequenou neste processo, muito pelo
contrário34.
Esta manutenção da posição privilegiada da indústria, entretanto, não parece significar
um modelo mais inclusivo do neoliberalismo, como propõe Pochmann (2017), pois,
atualmente, ao se romper com os modelos anteriores de gastos sociais para focar-se na gestão
financeira do Estado, diverge-se do caminho anteriormente adotado – do qual, aliás, como

34
A aplicação direta de boa parte das propostas da CNI pelo governo Temer demonstram bem isso. Essa tensão
entre a burguesia nacional e a burguesia financeira, por exemplo, pode ser sentida justamente no tema aqui
apresentado: conforme matéria da Folha, investidores americanos se sentiram “frustrados” com a maior
flexibilização das leis trabalhistas da história do país, considerando-a insuficiente. Cf. FOLHA DE SÃO
PAULO, 2017.
70

coloca Boito Jr. (2012a), a indústria tirou diversos frutos. Isto significa, então, que não apenas
as políticas públicas de inserção social e redução das desigualdades sofre um influxo.
Também o caminho do desenvolvimento se transforma, passando-se a seguir as proposições
da CNI, as quais eu já expus anteriormente: o foco no mercado internacional, redução de
gastos do Estado e a liberalização das relações trabalhista tenderão a modificar, de fato, as
relações trabalhistas do país.
O meu objetivo neste capítulo, então, é destrinchar o paradigma de relações de
trabalho da CNI, associando-o brevemente com a reforma levada a cabo pelo Congresso
Nacional em 2017 e apresentando as possíveis críticas às suas propostas (no caso, utilizarei os
argumentos reunidos em três documentos de grupos opostos à reforma trabalhista – por isso,
precisarei realizar este recorte).
Em certa medida, relacionar as propostas da CNI à reforma trabalhista não é uma das
mais difíceis empreitadas. Não apenas podemos ver notas públicas e pronunciamentos da
entidade em favor da reforma, como também há de se notar a clara semelhança entre as
propostas da entidade e os artigos aprovados na reforma. Mesmo com modificações – e em
certa medida até mesmo radicalização –, a reforma trabalhista incorporou os mesmos
princípios da CNI: prevalência do negociado sobre o legislado, terceirização irrestrita,
flexibilizações da remuneração, jornada e contratação flexíveis, aplicação de coerções sobre a
justiça do trabalho (como a contenção de sua atuação positiva – isto é, criando interpretações
que ganham força de lei – a expansão da resolução dos conflitos por meios extra-judiciais,
como as mesas de conciliação) e estabelecimento de sanções para o trabalhador para a
redução de judicialização dos conflitos trabalhistas.

4.1. O paradigma da CNI sobre o sistema de relações de trabalho e o conteúdo de sua


reforma trabalhista.

Antes de definir o paradigma exato da entidade sobre as relações de trabalho, devo


articular melhor o problema já expresso anteriormente: o discurso não equivale à visão exata
do sujeito sobre o tema; nos documentos que analisei, então, o que vejo não é a opinião da
CNI em sua forma nua e crua, mas sim colocada de forma organizada com a intenção de
esclarecer o leitor (seja ele um empresário industrial ou não) da validade de suas propostas.
Esta constatação, que antes ficara no ar, adquire contornos concretos neste exato momento,
após analisar os documentos em questão.
71

Sendo assim, na esteira de Bianchi (2007), e conforme já apresentei anteriormente,


devo reconhecer o fato de que o próprio posicionamento do empresariado tende a ser
ambíguo, uma vez que lhe interessa não apenas a defesa de suas ideias, mas também a
reprodução do modo de produção capitalista em sua forma mais efetiva possível. Isto implica
dizer que, para eles, não basta realizar suas vontades, mas também articular entre os diferentes
agentes sociais, no sentido de se formar um consenso, as regras e possibilidades do jogo
político e econômico.
Em outras palavras, a criação de legitimidade possui centralidade no posicionamento e
argumentação do empresariado acerca da economia, sociedade e, por conseguinte, relações de
trabalho: suas decisões não se dão com base apenas em seus interesses imediatos, mas
também na manutenção do frágil tecido social constituído pela exploração do capital sobre o
trabalho.
Não quero dizer, com isso, que os posicionamentos da Indústria ou de outros setores
burgueses sejam “falsos” ou “enganosos”, mas ao contrário: os sujeitos realmente acreditam
em suas posições conciliadoras e na necessidade de se manter conquistas e desejos de outras
classes sociais. Isto se dá pelo fato de que as ideias e noções de classe não são essenciais a
estes indivíduos: não é a ideologia que forma o sujeito ou a classe, mas, pelo contrário, é a
classe – com suas condições e experiências – que forma a ideologia (ENGELS; MARX,
2007). Com isso, entretanto, não se quer dizer que a ideologia não interfira na organização da
classe, ou, ainda, que ela seja um simples elemento de reprodução das condições materiais: o
que há de ser dito é que ela só pode fazer sentido, mobilizar a realidade se se enraizar nesta
classe e se conseguir representar minimamente a realidade (GRAMSCI, 1978). Sendo assim, a
relação de forças entre as classes sociais é extremamente importante na definição do discurso,
uma vez que ela é um dos aspectos centrais pelos quais se adquire a experiência de uma classe
e se constrói as condições das relações sociais em que estes indivíduos se inserem.
E, além disso, desta mesma relação de forças é que se erige a legitimidade da ordem
social e que se faz possível a dominação do trabalho – aspecto tão central quanto a exploração
desta, em especial no caso do capitalismo contemporâneo. Os discursos do empresariado,
então, se formam a partir deste contexto, articulando os três níveis que já apresentei no
primeiro capítulo, isto é, a lógica capitalista, o tipo e nível de capitalismo no qual se insere e,
por fim, a correlação de forças entre as classes sociais. Sendo assim, devo ressaltar que toda a
possibilidade de defesa de suas propostas e visão de mundo sobre o trabalho dependerá disto.
Entretanto, após analisar os documentos, posso esboçar o paradigma da CNI dentro de três
72

possibilidades históricas, na contemporaneidade: privatista; flexissegurança; e


neoestruturalista.
O paradigma de organização e de regulação do mercado de trabalho defendido pela
CNI seria mais próximo a uma concepção privatista (próximo ao modelo estadunidense, que
defende uma maior liberdade na contratação e demissão dos funcionários, sem ter, em
contrapartida, um forte apoio estatal aos desempregados – seja por Seguro-Desemprego ou,
ainda, por políticas públicas de qualidade) do que a uma da flexissegurança (próximo do
modelo dinamarquês, que defende ampla liberdade de contratação e demissão, mas, ao
contrário do modelo anterior, com uma vasta atuação estatal na garantia do seguro-
desemprego, serviços públicos de qualidade e bons avanços econômicos) ou do
neoestruturalismo (proposto pela CEPAL, que interpreta como papel do Estado a criação de
empregos, aquisição de competitividade da indústria e garantia de formalização das relações
de trabalho) (OLIVEIRA, PRONI, 2016).
No caso do neoestruturalismo, os motivos estão bastante claros e explícitos: a entidade
não defende a atuação direta do Estado na garantia das condições do mercado de trabalho –
pelo contrário, exige a diminuição direta das regulações de trabalho realizadas pelo Estado –,
não obstante reconheça a atuação do poder público na capacitação da força de trabalho, na
industrialização, etc., ou seja, em geral, aceita a atuação deste agente nos investimentos em
produtividade. Por outro lado, rejeita a atuação do Estado de forma contrária aos interesses da
indústria na condução macroeconômica: se opõe aos gastos públicos elevados e prega uma
medida de responsabilidade fiscal (com contenção da inflação e da dívida pública), para atrair
investidores externos; prefere olhar para a exportação em detrimento do mercado interno,
visando inserir-se no mercado mundial, através da aquisição de elementos que realcem sua
“competitividade”. Tudo isto me convence a ver esta entidade distante do modelo
neoestruturalista, com apenas algumas concessões dadas graças à condição subdesenvolvida
de nossa economia. O que, afinal, incentiva os empresários industriais a apoiarem um pouco
mais o auxílio do Estado à industrialização.
Dentro do espectro da “flexissegurança”, o modelo apresentado pela CNI parece
possuir uma relativa influência desta proposta: é ressaltado, diversas vezes, a necessidade de
conciliar a segurança do trabalhador com a flexibilidade exigida pelo mercado. Entretanto, se,
em alguns momentos de seu discurso, vê-se uma proximidade a esta proposta, seu
posicionamento na realidade não parece apresentar a mesma qualidade. O empresariado, por
73

exemplo, não apenas exige- o fim de diversos encargos sociais ao trabalho (como se pode ver
na exigência constante de redução de custos), como também pede a reformulação do seguro-
desemprego (diminuindo a abrangência deste), e, mais do que isto, reformula os investimentos
a serem dados à previdência e FGTS, exigindo a diminuição de repasses a estes – o que é
coerente com sua sugestão de reforma da previdência pública. Ou seja, o tom principal do
discurso da entidade não é o da proteção social, mas o da expansão da eficiência do trabalho
no Brasil. Em uma palavra, o foco de suas atenções está mais no reforço da competitividade
das empresas nacionais do que na garantia das condições de vida dos trabalhadores (como se
pode ver na seção tratando sobre o documento “101 propostas para a modernização
trabalhista”).
Em um contexto de economia subdesenvolvida – e com um mercado de trabalho
profundamente heterogêneo –, o que se busca garantir não é a inserção do grupo “de baixo”
(desempregados, trabalhadores informais, conta própria, etc.) às mesmas condições dos “de
cima”, mas um rebaixamento da condição destes (através da redução de custos, aumento da
flexibilidade e dos contratos atípicos), o que, supostamente, no plano do discurso empresarial
permitiria a inserção de “setores vulneráveis” no mercado de trabalho brasileiro. Esta noção
se apresenta dentro do modelo argumentativo dos textos: se são os custos de trabalho e a
rigidez da legislação que impedem a contratação, de fato, reduzindo-se estes, aumentariam os
empregos e se conseguiria incluir os vulneráveis no mercado de trabalho brasileiro. O
problema desta concepção, entretanto, é que ela não reconhece o fato de que, desta forma,
diminui as proteções reais fornecidas através do trabalho formal, que praticamente deixará,
assim, de possuir as características que marcam a sua qualidade distinta do trabalho informal.
Em uma palavra, teremos um “nivelamento por baixo” das condições de trabalho,
expandindo-se elementos de precariedade da economia informal para a economia formal: se,
por um lado, pode-se incluir um grupo maior no mercado de trabalho e na seguridade social,
estes trabalhadores já formalizados, por outro, já não terão as mesmas condições de antes, sem
garantir a segurança de um rendimento, uma vez que estarão à mercê das condições
econômicas, sob o mantra da flexibilidade do emprego e da contratação, e nem fornecer as
condições adequadas de segurança social. Esta, graças ao subdesenvolvimento brasileiro e
recusa da atuação mais forte do Estado na economia apregoado pela entidade, não terá
condições de garantir as mesmas condições que outros países – como a Dinamarca – possuem
Ou seja, como afirmam Proni e Oliveira:
Convém frisar que, ao contrário dos países precursores da flexicurity, a insegurança sempre foi
uma característica do mercado de trabalho brasileiro, não se restringindo aos trabalhadores sem
74

a proteção da legislação trabalhista oficial. Aqui, portanto, muitos dos problemas no campo
laboral devem-se ao excesso (e não à falta) de flexibilidade, que contribui para manter amplos
segmentos da mão de obra sem uma especialização definida e, ao mesmo tempo, representa
uma dificuldade adicional para muitos assalariados que gostariam de uma trajetória
profissional menos errática (PRONI; OLIVEIRA, 2016, p. 81)

Por isso, o modelo de “flexissegurança” não é, de fato, defendido pela CNI, porque ela
evita responder as perguntas efetivas dentro deste problema: como conciliar um amplo
programa de segurança social com redução de custos do trabalho, impostos, responsabilidade
fiscal, investimentos em capacitação, etc., mediatizados por uma economia com problemas
estruturais (subdesenvolvimento) e um mercado de trabalho cada vez mais flexível e,
supostamente, formalizado, que exigirá um aumento na demanda da segurança social? A
verdade é que esta conciliação seria de extrema dificuldade na realidade brasileira (KREIN,
2001), e o desinteresse da entidade em desenvolver esta questão de forma apropriada é um
sinal evidente de sua distância em relação ao paradigma da “flexissegurança” como modelo
de organização do trabalho no Brasil.
Por isto defendo sua proximidade de uma concepção privatista: não apenas pela
insuficiência de correlação com os outros, mas, principalmente, por causa da sua constante
defesa da atuação livre da economia na definição do modelo de relações de trabalho no Brasil.
Isto está bastante claro tanto na defesa constante do direito de negociação dos termos do
trabalho (através de negociação coletiva e individual, subvertendo-se a noção de
hipossuficiência do trabalhador), quanto na desregulamentação de normas do trabalho e,
também, no afastamento da justiça do trabalho na resolução dos conflitos entre patrão e
empregado. O modelo proposto é exatamente este, muito próximo ao modelo americano, mas
com a diferença de ser aplicado num país com um Estado cujo compromisso social é
nitidamente valorizado pela constituição. Por isso, realiza-se uma adaptação: o que se propõe
é um modelo de relações privadas, com alguns relances de segurança social, buscando ceder
alguns pontos aos grupos que se opõem às suas propostas.
Esta escolha de paradigma, por sua vez, apresenta uma lógica adequada aos princípios
e questões colocadas pela entidade em seus documentos, que vive, em seu discurso, uma
verdadeira encruzilhada entre a busca pela melhora dos níveis capitalistas do país
(desenvolvimento e aquisição de competitividade), o controle da intervenção do Estado na
economia (evitando que este detenha o controle da indústria) e, por fim, da dominação da
75

classe trabalhadora (ou melhor, em sua satisfação). Como já se pôde perceber brevemente, é
exatamente nestes três níveis que suas propostas pretendem atuar.
Por exemplo, na prevalência do negociado sobre o legislado, prega-se a defesa de um
diálogo entre patrão e empregado, como forma de se evitar a intervenção do Estado
(Judiciário Trabalhista) nas relações de trabalho. Por outro lado, não faltam propostas, em
seus documentos, sugerindo a atuação do Estado na qualificação da mão-de-obra e em
diferentes projetos, como os de infraestrutura. A atuação do Estado possui aspecto
fundamental para a CNI, uma vez que deve realizar aquilo que o empresariado não tem
condições de realizar (como articular a economia brasileira com o mundo através de pactos e
acordos comerciais internacionais e oferecer serviços na área de educação e saúde com
qualidade e de forma gratuita) e auxiliá-lo em seus projetos de interesse nacional (como a
infraestrutura, qualificação, etc.), mas deve se afastar da regulação das relações de trabalho e
microeconômicas. Desse modo, ressalta-se aqui a contradição do empresariado em relação ao
papel do Estado.
Com relação ao trabalho, considera a CNI que o Estado deve deixar de atuar com
profundidade na resolução dos casos (preferindo-se avançar mais as resoluções extrajudiciais,
em especial aquelas das mesas de conciliação) e na garantia de certos direitos que são tidos
pelo capital como demasiado, tais como o Programa de Seguro-Desemprego muito amplo, a
limitação de jornada, etc., para focar-se no investimento em produtividade e qualificação da
força de trabalho. O Estado, então, deve possuir uma estreita ligação com as empresas
privadas, encarregando-se de garantir-lhes as melhores condições de competir no mercado
internacional.
Ou seja, sua atuação é comandada pelo suposto interesse imediato no
desenvolvimento, o qual pode ser considerado o principal estandarte da entidade e
supostamente o grande motivo da escolha de seu paradigma das relações de trabalho. A
promessa do desenvolvimento, na realidade brasileira, é o aspecto central porque tanto
satisfaz o desejo da classe trabalhadora de melhorar sua condição de vida quanto a
necessidade da burguesia de manter (ou aumentar) sua acumulação – e , portanto, é um dos
principais instrumentos discursivos de contenção da classe trabalhadora35.

35
Não é à toa que várias entidades, desde sindicatos patronais da indústria até sindicatos de trabalhadores,
defendem a ideia do desenvolvimento: é por ele que se pode garantir não apenas a riqueza e o avanço da
economia brasileira, mas também empregos, distribuição de renda e qualidade de vida. O que diferencia uma
perspectiva da outra, entretanto, é o meio pelo qual se deve garantir este avanço.
76

Mas, para a indústria, este desenvolvimento se prende de forma muito clara ao


crescimento econômico: em seus documentos, como já mostrei, é fulcral a manutenção do
aumento do PIB, dos investimentos, etc. Suas noções, em certa medida, aproximam-se da
proposta da ditadura militar, de primeiro “deixar o bolo crescer” para somente depois reparti-
lo, o que quer dizer ela foca muito mais no aspecto do crescimento do desenvolvimento do
que em sua garantia de uma ordem social justa e de amplas oportunidades para todos os
cidadãos. Mas este discurso não serve apenas como figura de legitimidade da exploração,
senão também como garantia da funcionalidade do sistema capitalista: é somente com estas
tendências de crescimento econômico (acumulação) que se garante a reprodução efetiva do
capital – ainda mais do chamado “capital produtivo”, distanciado da pura especulação das
finanças, que, em determinados momentos de crise econômica, pode lucrar
consideravelmente.
Os documentos analisados afirmam justamente esta questão: a reforma trabalhista é
necessária para garantir o desenvolvimento; este, por sua vez, garantiria mais empregos e
maior renda para o trabalho. Ou seja, em sua construção discursiva, mesmo que a reforma
retire, para a classe trabalhadora, uma sequência de remunerações, por exemplo, ela ainda é
benéfica para os empregados. Esta tentativa de argumentação, entretanto, não existe sem outro
componente fundamental: o do medo do desemprego. Quando se afirma que é necessário
flexibilizar relações de trabalho – diminuindo-se não apenas a remuneração, mas também
garantias trabalhistas – para gerar empregos, afirma-se, indiretamente, que, sem a reforma, os
trabalhadores estarão e continuarão ameaçados pelo desemprego.
Não é à toa que a agenda da reforma trabalhista passou a ser aplicada de forma tão
poderosa no ano de 2017. Diante de uma mudança na correlação de forças entre diferentes
agentes sociais, com visões de desenvolvimento opostas, e de uma crise econômica
ameaçadora ao trabalho, o instrumento discursivo aplicado passa a possuir mais sentido e
ganha terreno nas listas de reformas a serem realizadas pelo governo nacional. Sendo assim, o
trabalho no Brasil tende a ser reconfigurado em um modelo mais próximo ao privatista, graças
à força adquirida por esta tese diante da crise econômica e política, perdendo-se diversos
avanços conquistados anteriormente.
77

4.2. A perspectiva da “modernização trabalhista” e a crítica dos estudiosos do trabalho:


reforma trabalhista do governo Temer.

Não obstante, neste trabalho, interesse-me mais a compreensão discursiva dos


documentos da CNI, não posso deixar de apresentar algumas questões sobre as propostas
elencadas, ainda mais porque servirão para reforçar meu posicionamento com relação ao
paradigma da entidade sobre as relações trabalhistas.
As propostas ligadas à segurança jurídica possuem um problema principal: forçam a
formalidade (valor de diálogo e autonomia da negociação coletiva, liberdade do trabalhador,
aumento da qualificação e produtividade, etc.) sobre a realidade. Um dos exemplos principais
deste abstracionismo é o valor temporário dos acordos ou convenções coletivos. Isto significa,
afinal, que a entidade sugere uma negociação que imponha aos negociantes a sua adaptação à
conjuntura: numa palavra, num contexto de crise, inúmeros direitos poderão ser negociados
para se garantir o trabalho na empresa, sob pena de demissão do trabalhador. Assim alerta
Krein, diante desta proposta:
A questão do novo sistema [valorização da negociação coletiva] ser opcional não garante
maiores salvaguardas para os trabalhadores e suas organizações. Em primeiro lugar, porque o
país já viveu uma experiência histórica parecida com a introdução do FGTS, que tinha – até a
Constituição de 88 – um caráter “opcional”. Mas, como o FGTS – em relação à lei da
estabilidade até então vigente – significava menores custos no ato da rescisão contratual e
maiores facilidades de demissão, o “opcional” virou obrigatório, ou seja, aceitar a “opção” pelo
FGTS era um importante critério para a admissão das pessoas. O caráter “opcional” da atual
proposta – dada a pulverização sindical existente no Brasil e uma relação extremamente
assimétrica entre capital e trabalho, num contexto de forte recessão e desemprego (excedente
de mão-de-obra) –, portanto, teria dificuldade de se efetivar, pois a assinatura de qualquer novo
instrumento normativo coletivo poderia ficar condicionada (inclusive as cláusulas para
manutenção da própria entidade sindical) à “aceitação” do novo sistema (KREIN, 2001, p.
132).

Este pode ser considerado um caso clássico que demonstra, afinal, como a
hipossuficiência do trabalhador não é, de fato, apenas um postulado antigo, mas ainda atual.
Dito isto, precisa-se reconhecer que esta hipossuficiência do trabalhador não é significado de
sua incapacidade de exigir certas demandas e de se organizar, mas somente, sozinho, contra o
mercado, ele não possui meios para garantir as condições mínimas de trabalho que deseja. O
fato é que esta capacidade de exigir suas condições de trabalho depende diretamente do nível
de organização da classe trabalhadora, como bem coloca a ANAMATRA:

Com efeito, como já advertiu João de Lima Teixeira Filho, a funcionalidade das negociações
coletivas guia-se por dois pressupostos básicos: em primeiro lugar, aquele segundo o qual
“quão mais rígida é a organização sindical, mais tormentosa é a negociação coletiva”; e o
78

segundo, aquele segundo o qual “quão mais fortes e representativos são os sindicatos, menor é
a necessidade de intervenção legislativa”. Não é o caso brasileiro. A representação sindical é
falha. Se fortes e representativos fossem todos os sindicatos profissionais brasileiros, a ideia
vazada no PL n. 6.787/2016, quanto à prevalência do negociado sobre o legislado em grande
parte dos direitos trabalhistas típicos, poderia ser oportuna e útil. No entanto, não é o que
acontece. A organização sindical brasileira é extremamente rígida e a unicidade sindical
construiu, no Brasil, uma estrutural sindical frágil e, em muitos casos, de pouca
representatividade. Nesse caminho, todas aquelas hipóteses de negociado sobre o legislado,
vaticinadas para além do que a Constituição expressamente autorizou, servem basicamente
para transformar a negociação coletiva em um caminho bem azeitado para a degradação das
relações de trabalho e para a flexibilização de direitos sociais típicos (ANAMATRA, 2017, p.
10-11)

As propostas em torno da terceirização também pecam na formalidade: a) para contra-


argumentar a tese da precarização, utiliza-se a letra da lei para se contrapor a teses baseadas
em fatos e pesquisas empíricas; b) a entidade também delimita a questão da terceirização à
sua forma jurídica, sem considerar questões econômicas e sociais36; c) ignora e contraria
dados apresentados no próprio texto (86% das empresas terceirizam buscando redução de
custos); e d) desconsidera a possibilidade da empresa contratada utilizar métodos dentro desta
legislação para explorar com maior intensidade a força de trabalho (por exemplo, podendo
apenas realizar contratos temporários). Por isso, o aviso dos pesquisadores do CESIT é uma
boa ilustração dos efeitos possíveis desta mudança na legislação:
A terceirização segue a racionalidade econômica; as empresas só a adotam se essa modalidade
de contratação representar uma redução de custos. Além disso, uma outra motivação pouco
discutida é sua utilização em áreas em que as possibilidades de adoecimento são maiores,
principalmente em linhas de produção com processos produtivos repetitivos. Nessas áreas, em
que trabalham majoritariamente mulheres, é muito comum as empresas terceirizarem toda a sua
linha de produção para evitar passivos trabalhistas futuros. É da própria lógica do capital
desordenar continuamente a organização das empresas. A força de trabalho é deslocada na
medida em que certas qualificações se tornam desnecessárias. As empresas investem em
estruturas que privilegiam empregos dominados por alta qualificação e alta produtividade e
terceirizam as ocupações pouco qualificadas e de baixa produtividade. Com isso, excluem
parcela dos trabalhadores e das trabalhadoras da distribuição do crescimento da renda nacional.
Com a aprovação da terceirização, direitos serão rebaixados, o conceito de categoria
profissional será substituído por prestadores de serviços, levando à desconstrução e à
desestruturação das categorias profissionais e das ocupações da forma como as conhecemos
hoje (CESIT, 2017, p. 38-39)

36
Marx já afirmava, em sua primeira obra econômica: “O trabalhador não precisa necessariamente ganhar com
o ganho do capitalista, mas necessariamente perde quando ele perde” (grifos originais, MARX, 2008, p. 25). A
terceirização livre e indiscriminada reforça este mantra: aumentando-se a concorrência entre capitais na oferta de
seu serviço, cuja base de escolha é a redução de custos – e não apenas a eficiência, como coloca a CNI –, tem-se
uma tendência natural a reduzir os custos deste serviço. Esta situação, dependendo das condições, pode
facilmente levar à busca da redução dos custos do trabalho (incluindo-se, aqui, redução salarial e contratação
informal), o que acabará por implicar numa maior exploração da força de trabalho e, talvez, na precarização do
trabalho.
79

Ademais, como veremos à frente, a legalização irrestrita da terceirização poderá


usufruir de uma sequência de mudanças na legislação trabalhista que lhe permitirá manejar o
trabalho de forma mais econômica e diminuir ainda mais os custos do trabalho.
Com relação às suas outras propostas tendo em vista a segurança jurídica, podemos
perceber que a CNI parece mais interessada não na reestruturação do judiciário trabalhista
brasileiro – uma vez que suas propostas não defendem, necessariamente, a reforma do
judiciário –, mas na contenção da atuação deste em questões trabalhistas. Isto não significa,
entretanto, que esta instituição seja, em si mesma, aliada do trabalhador: existem divergências
e diferentes interpretações dentro deste campo, mas, principalmente, ele é marcado pela
adaptação às condições do capitalismo nacional.
Ou seja, por mais que se garanta um papel minimamente garantista do judiciário
trabalhista a favor do trabalhador, aquele não consegue se colocar, em sua totalidade, de
forma contrária ao modelo vigente das relações de trabalho no país – no caso, um modelo
flexível. Estas reformas do judiciário trabalhista, portanto, não se dão com o papel de
aumentar a eficiência ou transformar, de fato, a atividade jurídica exercida no país, mas
apenas são opções paliativas aos problemas vividos pela indústria diante da chamada
“segurança jurídica”.
O fato é que a insegurança jurídica, em certa medida, sempre existiu no país, graças às
diferentes fontes de interpretação jurídica: os juízes poderiam facilmente escolher diferentes
interpretações sobre o mesmo fato – e, de fato o fazem, muitas vezes inclusive contra o
trabalhador. Contudo, diante de mudanças de interpretação – em especial aquelas contrárias às
medidas empresariais –, vê-se as entidades da indústria criticarem a legislação e o judiciário
trabalhista. A aplicação de uma fiscalização mais rigorosa da segurança do trabalho e da
formalidade, associada a interpretações jurídicas que limitavam a gestão da força de trabalho,
levou, afinal, a um descompasso entre os interesses da indústria e a legislação trabalhista
brasileira. Este descompasso – quando já não pode mais ser resolvido através da
informalidade e, por isso, acaba se tornando um problema considerável à reprodução das
relações capitalistas de produção – é o que motiva a indústria a se mobilizar contra o
judiciário e a legislação trabalhista.
Afetando-se diretamente a possibilidade de uma calculabilidade precisa do processo de
contratação da mão-de-obra e de sua utilização de acordo com as normas internacionais de
exploração da força de trabalho (flexíveis ao último nível), tem-se o aumento do custo do
trabalho no Brasil e a estagnação da produtividade. Quer dizer, diante da perda de
80

competitividade da indústria brasileira, a CNI elege, dentro das relações de trabalho, a missão
não apenas de conseguir melhorar a calculabilidade da mão-de-obra no Brasil, mas, também,
reduzir os custos desta e aumentar sua produtividade, a qual, por outro lado, não é qualquer
uma:
Não existe apenas um conceito de produtividade, mas vários. Ele pode ser compreendido como
uma forma de maximizar o uso de recursos: equipamentos para expandir mercados, aumentar o
emprego, ampliar os ganhos reais de salários e melhorar os padrões de vida da sociedade. Mas
também pode ser visto como uma forma de assegurar ganhos imediatos, sem a introdução de
mudanças mais sistêmicas. Essa concepção parte do pressuposto de que só a quantidade de
trabalho está em condições de variar, portanto, a redução dos custos do trabalho constitui o
principal objetivo a ser alcançado. Essa é a visão que predomina atualmente entre os
empresários. Nesse contexto, a produtividade, é utilizada para reduzir os custos da força de
trabalho através de um intenso processo de intensificação do ritmo de trabalho com a adoção de
mecanismos que eliminem os tempos mortos, adequando a demanda às flutuações de mercado,
reduzindo custos de contratação e dispensa, alterando a jornada de trabalho e as formas de
remuneração através da introdução da remuneração variável como um componente
fundamental (CESIT, 2017, p. 30-31)

Quando trata sobre as questões da produtividade, a CNI entra em um terreno


paradoxal, no qual o bem comum é resultante do tratamento diferenciado a cada empregado:
as propostas colocadas pela entidade – incluindo-se aqui a terceirização e a negociação
coletiva – tendem a fortalecer a desigualdade entre categorias e a realizar a fragmentação dos
trabalhadores em diferentes níveis (trabalhadores estáveis, terceirizados, com diferentes
acordos coletivos, etc.). Na visão da CNI, este espaço de manobra – aliado à redução de
custos – seria o meio perfeito de se exigir a constante qualificação dos trabalhadores e seu
aumento de produtividade, uma vez que a própria noção de competitividade que rege as
relações empresariais seria repassada para as relações de trabalho, associando ainda mais o
destino do trabalhador à empresa e não à sua classe.
Como já foi visto anteriormente, a informalidade é uma questão candente para a CNI,
não apenas pela negação de direitos que são conferidos ao trabalhador, mas também pelo fato
de que o trabalho informal, na visão da entidade, equivale à menor produtividade do
trabalhador brasileiro, Como característica deste modelo de contratação encontra-se a
rotatividade elevada, parco incentivo à qualificação, menor reconhecimento do trabalhador
como parte da empresa, etc. Ou seja, não obstante, de fato, o trabalho informal signifique, em
geral, menores custos para a empresa, ele também traz problemas para esta na condução de
seus negócios – ainda mais se considerarmos as medidas de fiscalização do trabalho, que
dificultam a utilização deste tipo de contratação.
81

Por isso, a posição de redução do trabalho informal a partir da desregulamentação


trabalhista pode ser considerada uma busca de conciliação entre estes dois mundos: objetiva-
se a redução de custos da informalidade (através de novas formas de contratação e/ou
desoneração direta da força de trabalho) e o aumento da produtividade conferido pela
formalidade (evita-se a rotatividade e expandem-se os investimentos em qualificação). A
questão fugidia que a entidade não busca responder é que, se, de fato, ter-se-á a incorporação
de uma sequência de trabalhadores na economia formal, por outro serão aumentadas as
diferenças entre os trabalhadores, permitindo-se uma diversidade muito maior de
contratações, as quais tenderiam a desarticular movimentos e desencorajariam a oposição dos
empregados à empresa, com medo de perder seu status de trabalhadores regulares. Quer dizer:
A defesa de contratos que retiram direitos conquistados e implicam livre rotatividade da mão-
de-obra descaracteriza a identidade profissional do trabalhador e o afasta de sindicatos. A
ampliação da terceirização, bem como a adoção de formas de resolução do conflito sem
participação das instituições públicas, ou ainda os processos de negociação sem respeito a
direitos básicos ou diminuidores do papel dos sindicatos, cumpririam esse papel fragmentador
e desarticulador do coletivo trabalhador (CESIT, 2017, p. 23)
Ou seja, esta proposição de flexibilização da contratação, da remuneração, etc., como
já foi notada amplamente pela Sociologia do Trabalho, tende a colocar os trabalhadores contra
si, individualizando suas condições de trabalho. O maior contra-argumento a esta afirmação –
em especial quando ela se veste com a denúncia da retirada de direitos trabalhistas – está na
afirmação, em defesa da flexibilização da remuneração e da contratação, respectivamente, da
permanência de um salário-base e das instituições de representação sindical. Adicionalmente
a estes argumentos, pode-se ressaltar que esta mudança, como pretende a CNI, se daria sob o
prisma da negociação coletiva, o que supostamente impediria a aplicação desta mudança com
princípios contrários aos estabelecidos pela coletividade dos trabalhadores. Novamente, basta
lembrarmo-nos das considerações anteriormente feitas sobre a negociação coletiva para
reconhecer o problema deste argumento.
Quanto à necessidade de se permitir o exercício de múltiplas funções pelo empregado
em seu trabalho, acaba-se tendo problemas sérios sobre a concepção do trabalho: se, de fato,
interessa ao trabalhador participar de diferentes processos da produção, por outro lado, isto
não significa que lhe interesse acumular funções e trabalho a custas da demissão de outros e
sem o correspondente aumento salarial. Em uma palavra, não obstante não se realize, nesse
processo, nenhuma suposta retirada de direitos, por outro lado aumenta-se a intensidade do
trabalho exigido àquele que realiza diversas operações nas quais, anteriormente, contava com
um maior número de pessoal para auxiliá-lo no processo.
82

Esta percepção, então, esquece-se que o processo de trabalho, coletivo, depende de um


grupo não apenas com qualidade suficiente para realizar as funções de forma satisfatória, mas
também de quantidade. Por isso, a proposta incessante acerca da qualificação não pode ser
considerada, apenas, de aumento de produtividade, mas também de redução de pessoal:
mesmo que indiretamente, ela implica nesta condição. O sentido da exigência da maior
qualificação combina perfeitamente com a redução de pessoal, aumento de funções exercidas
pelo empregado, variação dos modelos de contratação, e, por fim, pela jornada flexível.
Por outro lado, a variação de jornada poderia ser uma medida benéfica ao trabalhador,
se for feita com a condição da redução de seu tempo de trabalho, permitindo-o repor de forma
mais completa suas energias, e aumentar as vagas de emprego disponíveis. Esta opção não é
impossível, dentro de uma lógica capitalista, mas seria praticamente unicamente vista em
contextos de forte crescimento econômico, no qual, com o mercado aquecido, interessa
manter o maior número de trabalhadores possíveis. Em um contexto de crise ou de parco
crescimento econômico, esta tendência inverte-se: o foco diverte-se para o aumento da
jornada e diminuição de contratação da mão-de-obra, para se conseguir a redução de custos e
aumento da taxa de lucro, ajustando-se à menor demanda.
Não se pode negar que as diferentes atitudes diante de diferentes contextos não devem
pesar totalmente sobre os ombros dos empresários, mas, antes, do modo de produção vigente.
Entretanto, isto não significa que, uma vez preferindo a atuação da indústria tendo em vista do
mercado externo – como propõe a CNI –, estes efeitos sejam minimizados a partir de uma
organização do capitalismo nacional e desenvolvimento do mercado interno, mas, ao
contrário, potencializados, graças à dependência externa e caráter volátil da economia
mundial. Isto significa, então, que, buscando estas medidas, o que se terá, afinal, será nada
mais do que esta perda do poder do mercado interno na economia nacional:
O comportamento do mercado de trabalho influencia diretamente a própria demanda agregada,
tendo consequências sobre a pobreza, a desigualdade e a distribuição de renda. A redução dos
empregos formais amplia as inseguranças e a precariedade, produzindo um forte impacto sobre
o mercado de consumo, pois os trabalhadores tendem a gastar o que ganham. O estreitamento
do mercado de consumo pela ausência de demanda forçará, necessariamente, um processo de
reconcentração de renda em mãos do capital, comprometendo o próprio desenvolvimento e
aumentando os níveis de pobreza. Além disso, com a queda brutal do consumo, setores inteiros
deixam de produzir internamente e migram para outros mercados mais rentáveis. Se não há
mercado para os seus produtos, não haverá novos investimentos privados. Paradoxalmente, se
todas as empresas seguirem o mesmo caminho, reduzindo direitos e salários a pretexto de
impulsionar o mercado competitivo, o principal resultado será a perda de mercado interno para
a recessão e a redução do poder de compra da maioria da população (CESIT, 2017, p. 29-30).
83

Os efeitos dessa transformação podem, ao mesmo tempo em que aumentariam a


competitividade da indústria brasileira no mercado externo, afetar o mercado interno e, com
isso, atingir uma porção considerável da indústria nacional. O setor de construção civil, por
exemplo, que avançou com tanta força nestas últimas décadas (cf. SADER, 2013, em especial
os artigos de Pochmann, Barbosa e Araújo), jamais teria condições de crescer da mesma
forma com as medidas propostas. Se é fato, por um lado, que boa parte da demanda interna
por produtos industriais é satisfeita com a importação, por outro o potencial de crescimento
das indústrias a partir do mercado interno será rebaixado, o que, em si, significa que o país
dependeria cada vez mais do comércio internacional, com seus problemas de volatilidade e de
competitividade.
84

5. Considerações finais

Este trabalho se conteve em analisar os discursos da CNI durante os períodos em que


suas medidas – ao menos em relação ao trabalho – não foram realizadas por completo. Diante
do retorno do neoliberalismo ao poder, no Brasil, novas questões devem surgir em torno da
produção deste discurso, assim como da definição de estratégias de desenvolvimento, dentro
desta fração de classe, após a análise do grupo sobre os efeitos destas medidas. Sem poder
dizer nada quanto a isso, devo apenas alertar que, numa realidade dinâmica, suas posições
podem se transformar diante das conjunturas que se apresentarem. Os conflitos entre frações
da classe dominante também pode ser um combustível considerável na cena política nacional,
algo que todos devemos estar atentos para interpretar da melhor forma possível.
Não me cabe, aqui, concluir sobre os efeitos destas medidas, uma vez que meu
interesse esteve muito mais na análise discursiva, porém, de fato, com estas transformações
nas relações de trabalho, tenderemos a ver um novo modelo de organização do capitalismo no
país, mais próximo ao modelo flexível e ao neoliberalismo, mesmo após o colapso financeiro
de 2008. A sociologia do trabalho e os pesquisadores comprometidos com a classe
trabalhadora devem acompanhar tais mudanças de perto, prontos para denunciar seus
problemas e repensar os caminhos da resistência à sanha do capital.
Aqui, me contive, como deve a uma monografia de um mero formando da graduação,
a um tema microscópico: a reforma trabalhista proposta pela CNI. Cabe-me, no futuro,
desenvolver esta pesquisa e aprofundar os pontos colocados acima, em especial sobre o
posicionamento das frações de classe sobre o trabalho; as diferentes estratégias de
desenvolvimento defendida pelas classes sociais e atores no cenário político nacional; os
efeitos desta reforma para as condições de trabalho no Brasil, etc.
Mas, por ora, acredito que me serve finalizar esta monografia com a constatação mais
importante a ser tirada neste meu trabalho: as demandas e pressões pela reforma trabalhista
não vêm de hoje; esta reforma não é uma invenção mágica tirada da cartola de uma dúzia de
economistas burgueses trancados em seus escritórios, mas sim fruto de uma ideologia que se
perpetua no país, segundo a qual o trabalho deve ser desprotegido e jogado livremente ao
capital para que se possa garantir competitividade à economia nacional.
Contudo, se é através deste discurso que se convence, efetivamente, da
necessidade destas mudanças, de tal forma a se evitar o desemprego e a informalidade, na
85

arena discursiva, a construção das verdades (encobertas por suas ideologias) cumpre um papel
tão fundamental no controle social que fica fácil se perder e considerá-las efetivamente
verdades. Porém, se este método pode ser tão bem construído no controle dos “loucos”,
“meliantes” e “doentes”, perde seu poder diante do trabalho, porque, com seu objetivo
máximo de espremer até a última gota de mais-trabalho do proletário, o capital não pode
fabricar completamente sua verdade.
Os efeitos da reforma trabalhista já puderam ser vistos logo após a sua entrada em
vigor: um juiz, na Bahia, resolveu exigir que um trabalhador rural tivesse de pagar pelo seu
acesso à justiça, e pela sua condenação, por supostamente agir por má fé (EL PAÍS, 2017).
Este é apenas um dos variados problemas que a classe trabalhadora enfrentará diante desta
mudança na legislação. No fundo, e isto foi algo que minha pesquisa tentou demonstrar, o que
se percebe neste processo é a retomada de um antigo projeto de controle da classe
trabalhadora. Com a retomada do neoliberalismo em seu estado mais agressivo e,
conjuntamente, uma produção discursiva que enfatiza quase sempre o medo do desemprego e
da recessão, este projeto já está sendo realizado em nosso país.
Muitos problemas podem ser compilados com relação a esta forma de gestão do
trabalho: a redução da inclusão social, graças ao retorno do desemprego e aceitação de
condições de trabalho mais precarizados ou, ainda, de redução de serviços públicos essenciais,
como a Previdência; o mercado interno perde completamente o seu poder de dinamismo, com
a redução da capacidade de consumo da classe trabalhadora, decorrente das novas estratégias
de contenção dos ganhos do trabalho; e, por fim, pode-se ressaltar como, com esta concepção
neoliberal de desenvolvimento – apresentada anteriormente nesta monografia –, tende-se a se
aproximar de um modelo de industrialização marcado pela intensividade da mão-de-obra –
necessitando, portanto, de baixos custos de mão-de-obra para competir no mercado
internacional – enquanto perde-se o foco no avanço tecnológico e inovação, elementos
essenciais de garantia de competitividade no mercado mundial capitalista.
Por isso, o avanço desta ideologia, representada no discurso da CNI, não pode ser
considerada uma derrota apenas para o trabalho, mas para toda a sociedade brasileira, que
tenderá a retornar a seu modelo de desenvolvimento excludente e periférico, no qual a
superexploração da força do trabalho seguirá sendo uma triste realidade.
86

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